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XIX – (8) A DISSOLUÇÃO DO COMPLEXO DE


ÉDIPO (1924)
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NOTA DO EDITOR INGLÊS
DER UNTERGANG DES ÖDIPUSKOMPLEXES
(a) EDIÇÕES ALEMÃS:
1924 Int. Z. Psychoanal., 10, (3), 245-52.
1924 G.S., 5, 423-30.
1926 Psychoanalyse der Neurosen, 169-77.
1931 Neurosenlehre und Technik, 191-9.
1940 G. W., 13, 395-402.
(b) TRADUÇÃO INGLESA:
‘The Passing of the Oedipus Complex’
1924 Int. J. Psycho-Anals., 5 (4), 419-24. (Trad. de Joan Riviere.)
1924 C.P., 2, 269-76. (Reimpressão da tradução acima.)
A presente tradução inglesa, com o título modificado, baseia-se na de 1924.
Este artigo, escrito nos primeiros meses de 1924, foi, em sua essência,
elaboração de uma passagem de O Ego e o Id ([1]). Reivindica ainda nosso
interesse especial por dar ênfase, pela primeira vez, ao curso diferente
tomado pelo desenvolvimento da sexualidade em meninos e meninas. Essa
nova linha de pensamento foi levada adiante, cerca de dezoito meses mais tarde,
no trabalho de Freud sobre ‘Algumas Conseqüências Psíquicas da Distinção
Anatômica entre os Sexos’ (1925j). A história das opiniões cambiantes de Freud
sobre esse assunto é debatida na Nota do Editor Inglês ao último artigo ([1]).
A DISSOLUÇÃO  DO COMPLEXO DE ÉDIPO
Em extensão sempre crescente, o complexo de Édipo revela sua importância
como o fenômeno central do período sexual da primeira infância. Após isso, se
efetua sua dissolução, ele sucumbe à regressão, como dizemos, e é seguido
pelo período de latência. Ainda não se tornou claro, contudo, o que é que
ocasiona sua destruição. As análises parecem demonstrar que é a experiência de
desapontamentos penosos. A menina gosta de considerar-se como aquilo que
seu pai ama acima de tudo o mais, porém chega a ocasião em que tem de sofrer
parte dele uma dura punição e é atirada para fora de seu paraíso ingênuo. O
menino encara a mãe como sua propriedade, mas um dia descobre que ela
transferiu seu amor e sua solicitude para um recém-chegado. A reflexão deve
aprofundar nosso senso da importância dessas influências, porque ela enfatizará
o fato de serem inevitáveis experiências aflitivas desse tipo, que agem em
oposição ao conteúdo do complexo. Mesmo não ocorrendo nenhum
acontecimento especial tal como os que mencionamos como exemplos, a
ausência da satisfação esperada, a negação continuada do
bebê desejado, devem, ao final, levar o pequeno amante a voltar as costas ao
seu anseio sem esperança. Assim, o complexo de Édipo se encaminharia para a
destruição por sua falta de sucesso, pelos efeitos de sua
impossibilidade interna.
Outra visão é a de que o complexo de Édipo deve ruir porque chegou a hora para
sua desintegração, tal como os dentes de leite caem quando os permanentes
começam a crescer. Embora a maioria dos seres humanos passe
pelo complexo de Édipo como uma experiência individual, ele constitui um
fenômeno que é determinado e estabelecido pela hereditariedade e que está
fadado a findar de acordo com o programa, o instalar-se a fase seguinte
preordenada de desenvolvimento. Assim sendo, não é de grande
importânciaquais as ocasiões que permitem tal ocorrência ou, na verdade, que
ocasiões desse tipo possam ser de algum modo descobertas.
A justiça dessas opiniões não pode ser discutida. Ademais, elas são compatíveis.
Há lugar para a visão ontogenética, lado a lado com a filogenética, de
conseqüências bem maiores. Também procede que, mesmo no nascimento, o
indivíduo está inteiramente destinado a morrer, e talvez sua disposição orgânica
já possa conter a indicação daquilo que deve morrer. Não obstante, continua a
ser de interesse acompanhar como esse programa inato é executado e de que
maneira nocividades acidentais exploram sua disposição.
Ultimamente nos tornamos mais claramente cônscios que antes, de que o
desenvolvimento sexual de uma criança avança até determinada fase, na qual o
órgão genital já assumiu o papel principal. Esse órgão genital é apenas o
masculino, ou, mais corretamente, o pênis; o genital feminino permaneceu
irrevelado. Essa fase fálica, que é contemporânea do complexo de Édipo, não
se desenvolve além, até a organização genital definitiva, mas é submersa, e
sucedida pelo período de latência. Seu término, contudo, se realiza de maneira
típica e em conjunção com acontecimentos de recorrência regular.
Quando o interesse da criança (do sexo masculino) se volta para os seus órgãos
genitais, ela revela o fato manipulando-os freqüentemente, e então descobre que
os adultos não aprovam esse comportamento. Mais ou menos diretamente, mais
ou menos brutalmente, pronunciam uma ameaça de que essa parte dele, que tão
altamente valoriza, lhe será tirada. Geralmente, é de mulheres que emana a
ameaça; com muita freqüência, elas buscam reforçar sua autoridade por uma
referência ao pai ou ao médico, os quais, como dizem, levarão a cabo a punição.
Em certo número de casos, as mulheres, elas próprias, mitigam a ameaça de
maneira simbólica, dizendo à criança que não é o seu órgão genital, que na
realidade desempenha um papel passivo, que deve ser removido, mas sim sua
mão, que é o culpado ativo. Acontece com especial freqüência que o menininho
seja ameaçado com a castração, não porque brinca com o pênis com a mão, mas
porque molha o leito todas as noites e não pode ser levado a ser limpo. Os
encarregados dele se comportam como se essa incontinência noturna fosse
resultado e prova de ele estar indevidamente interessado em seu pênis, e
provavelmente têm razão. De qualquer modo, a enurese na cama, de longa
duração, deve ser igualada à polução dos adultos, e é uma expressão da mesma
excitação dos órgãos genitais que impeliu a criança a masturbar-se nesse
período.
Bem, é minha opinião ser essa ameaça de castração o que ocasiona a destruição
da organização genital fálica da criança. Não de imediato, é verdade, e não sem
que outras influências sejam também aplicadas; pois, para começar, o menino
não acredita na ameaça ou não a obedece absolutamente. A psicanálise
recentemente ligou importância a duas experiências por que todas as crianças
passam e que, segundo se presume, as preparam para a perda de partes
altamente valorizadas do corpo. Essas experiências são a retirada do seio
materno – a princípio de modo intermitente, e mais tarde, definitivamente – e a
exigência cotidiana que lhes é feita para soltarem os conteúdos do intestino. Não
existe, porém, prova que demonstre que, ao efetuar-se a ameaça de castração,
essas experiências tenham qualquer efeito. Somente
quando uma nova experiência lhe surge no caminho, que a criança começa a
avaliar a possibilidade de ser castrada, fazendo-o apenas de modo hesitante e
de má vontade, não sem fazer esforços para depreciar a significação de algo que
ela própria observou.
A observação que finalmente rompe sua descrença é a visão dos órgãos genitais
femininos. Mais cedo ou mais tarde a criança, que tanto orgulho tem da posse
de um pênis, tem uma visão da região genital de uma menina e não pode deixar
de convencer-se da ausência de um pênis numa criatura assim semelhante a ela
própria. Com isso, a perda de seu próprio pênis fica imaginável e a
ameaça de castração ganha seu efeito adiado.
Não devemos ser tão míopes quanto a pessoa encarregada da criança, que a
ameaça com a castração, e não devemos desprezar o fato de que, nessa época, a
masturbação de modo algum representa a totalidade de sua vida sexual. Como
pode ser claramente demonstrado, ela está na atitude edipianapara com os pais;
sua masturbação constitui apenas uma descarga genital da excitação sexual
pertinente ao complexo, e, durante todos os seus anos posteriores, deverá sua
importância a esse relacionamento. O complexo de Édipo ofereceu à criança
duas possibilidades de satisfação, uma ativa e outra passiva. Ela poderia
colocar-se no lugar de seu pai, à maneira masculina, e ter relações com a mãe,
como tinha o pai, caso em que cedo teria sentido o último como um estorvo, ou
poderia querer assumir o lugar da mãe e ser amada pelo pai, caso em que a mãe
se tornaria supérflua. A criança pode ter tido apenas noções muito vagas quanto
ao que constitui uma relação erótica satisfatória, mas certamente o pênis devia
desempenhar uma parte nela, pois as sensações em seu próprio órgão eram
prova disso. Até então, não tivera ocasião de duvidar que as mulheres
possuíssem pênis. Agora, porém, sua aceitação da possibilidade de castração,
seu reconhecimento de que as mulheres eram castradas, punha fim às duas
maneiras possíveis de obter satisfação do complexo de Édipo, de vez que ambas
acarretavam a perda de seu pênis – a masculina como uma punição resultante e
a feminina como precondição. Se a satisfação do amor no campo
do complexo de Édipo deve custar à criança o pênis, está fadado a surgir um
conflito entre seu interesse narcísico nessa parte de seu corpo e a catexia
libidinal de seus objetos parentais. Nesse conflito, triunfa normalmente a
primeira dessas forças: o ego da criança volta as costas ao complexo de Édipo.
Descrevi noutra parte como esse afastamento se realiza. As catexias de objeto
são abandonadas e substituídas por identificações. A autoridade do pai ou dos
pais é introjetada no ego e aí forma o núcleo do superego, que assume a
severidade do pai e perpetua a proibição deste contra o incesto, defendendo
assim o ego do retorno da catexia libidinal. As tendências libidinais
pertencentes ao complexo de Édipo são em parte dessexualizadas e
sublimadas (coisa que provavelmente acontece com toda transformação em
uma identificação) e em parte são inibidas em seu objetivo e transformadas em
impulsos de afeição. Todo o processo, por um lado, preservou o órgão genital –
afastou o perigo de sua perda – e, por outro, paralisou-o – removeu sua função.
Esse processo introduz o período de latência, que agora interrompe
o desenvolvimento sexual da criança.
Não vejo razão para negar o nome de ‘repressão’ ao afastamento do ego diante
do complexo de Édipo, embora repressões posteriores ocorram pela maior
parte com a participação do superego que, nesse caso, está apenassendo
formado. O processo que descrevemos é, porém, mais que uma repressão.
Equivale, se for idealmente levado a cabo, a uma destruição e
abolição do complexo. Plausivelmente podemos supor que chegamos aqui à
linha fronteiriça – nunca bem nitidamente traçada – entre o normal e o
patológico. Se o ego, na realidade, não conseguiu muito mais que
uma repressão do complexo, este persiste em estado inconsciente no id e
manifestará mais tarde seu efeito patogênico.
A observação analítica capacita-nos a identificar ou adivinhar essas vinculações
entre a organização fálica, o complexo de Édipo, a ameaça de castração, a
formação do superego e o período de latência. Essas vinculações justificam a
afirmação de que a destruição do complexo de Édipo é ocasionada pela
ameaça de castração. Mas isso não nos livra do problema; há lugar para uma
especulação teórica que pode perturbar os resultados a que chegamos ou colocá-
los sob nova luz. Antes de nos fazermos a esse caminho novo, contudo, devemos
voltar-nos para uma questão que surgiu no decorrer desse debate e que até
agora foi deixada de lado. O processo descrito refere-se, como foi
expressamente dito, somente a crianças do sexo masculino. Como se realiza o
desenvolvimento correspondente nas meninas?
Nesse ponto nosso material, por alguma razão incompreensível, torna-se muito
mais obscuro e cheio de lacunas. Também o sexo feminino desenvolve um
complexo de Édipo, um superego e um período de latência. Será que também
podemos atribuir-lhe uma organização fálica e um complexo de castração? A
resposta é afirmativa, mas essas coisas não podem ser as mesmas como são nos
meninos. Aqui a exigência feminista de direitos iguais para os sexos não nos leva
muito longe, pois a distinção morfológica está fadada a encontrar expressão em
diferenças de desenvolvimento psíquico. A anatomia é o destino’, para variar um
dito de Napoleão. O clitóris na menina inicialmente comporta-se exatamente
como um pênis, porém quando ela efetua uma comparação com um
companheiro de brinquedos do outro sexo, percebe que ‘se saiu mal’  e sente
isso como uma injustiça feita a ela e comofundamento para inferioridade. Por
algum tempo ainda, consola-se com a expectativa de que mais tarde, quando
ficar mais velha, adquirirá um apêndice tão grande quanto o do menino. Aqui,
o complexo de masculinidade [[1]] das mulheres se ramifica. Uma criança do
sexo feminino, contudo, não entende sua falta de pênis como sendo um caráter
sexual; explica-a presumindo que, em alguma época anterior, possuíra um
órgão igualmente grande e depois perdera-o por castração. Ela parece não
estender essa inferência de si própria para outras mulheres adultas, e sim,
inteiramente segundo as linhas da fase fálica, encará-las como possuindo
grandes e completos órgãos genitais – isto é, masculinos. Dá-se assim a
diferença essencial de que a menina aceita a castração como um fato
consumado, ao passo que o menino teme a possibilidade de sua ocorrência.
Estando assim excluído, na menina, o temor da castração, cai também um
motivo poderoso para o estabelecimento de um superego e para a interrupção
da organização genital infantil. Nela, muito mais que no menino, essas
mudanças parecem ser resultado da criação e de intimidação oriunda do
exterior, as quais a ameaçam com uma perda de amor. O complexo de Édipo da
menina é muito mais simples que o do pequeno portador do pênis; em minha
experiência, raramente ele vai além de assumir o lugar da mãe e adotar uma
atitude feminina para com o pai. A renúncia ao pênis não é tolerada pela menina
sem alguma tentativa de compensação. Ela desliza – ao longo da linha de uma
equação simbólica, poder-se-ia dizer – do pênis para um bebê. Seu complexo
de Édipoculmina em um desejo, mantido por muito tempo, de receber do pai
um bebê como presente – dar-lhe um filho. Tem-se a impressão de que
o complexo de Édipo é então gradativamente abandonado de vez que esse
desejo jamais se realiza. Os dois desejos – possuir um pênis e um filho –
permanecem fortemente catexizados no inconsciente e ajudam a preparar a
criatura do sexo feminino para seu papel posterior. A intensidade
comparativamente menor da contribuição sádica ao seu instinto sexual, que fora
de dúvida podemos vincular ao crescimento retardado de seu pênis, torna mais
fácil, no caso dela, transformarem-se as tendências sexuais diretas em
tendências inibidas quanto ao objetivo, de tipo afetuoso. Deve-se admitir,
contudo, que nossa compreensão interna(insight)desses processos
de desenvolvimento em meninas em geral é insatisfatório, incompleto e vago.
Não tenho dúvida de que as relações cronológicas e causais, aqui descritas,
entre o complexo de Édipo, a intimidação sexual (a ameaça de castração), a
formação do superego e o começo do período de latência são de um gênero
típico, porém não desejo asseverar que esse tipo seja o único possível. Variações
na ordem cronológica e na vinculação desses eventos estão fadadas a ter um
sentido muito importante no desenvolvimento do indivíduo.
Desde a publicação do interessante estudo de Otto Rank, The Trauma of
Birth [1924], a própria conclusão obtida através dessa modesta investigação, no
sentido de o complexode Édipo do menino ser destruído pelo temor da
castração, não pode ser aceita sem maior discussão. Não obstante, parece-me
prematuro entrar atualmente em um debate tal e talvez desaconselhável iniciar
uma crítica ou uma apreciação da opinião de Rank nessa conjuntura.

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