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GRAVAÇÃO - Aula #010 - O papel crucial do complexo de Édipo na vida humana

Aula anterior:

Foi falado sobre o desenvolvimento da sexualidade e como esse desenvolvimento parte


daquela anarquia sexual infantil e vai na direção da ordem que caracteriza a sexualidade
adulta.

Na quarta lição Freud coloca que alguns daqueles impulsos sexuais que se manifestam na
infância de maneira independente uns dos outros, alguns desses impulsos/tesões da infância
não passam para a vida adulta porque eles são alvo de repressões extremamente enérgicas,
repressões que são sustentadas por sentimentos que desenvolvemos durante o período de
latência (vergonha, nojo e sentimentos morais).

O que acontece na perversões? Nas perversões certos tesões da vida infantil passam para a
vida adulta e na vida adulta eles ocupam o lugar que deveria ser o lugar do tesão genital. O
adulto na sequencia ideal/natural da sexualidade deveria gozar primordialmente por meio do
tesão genital, nas perversões o lugar do tesão genital passam a ser ocupados por outros tesões
como o tesão masoquista, exibicionista e assim por diante. Um desses tesões infantis passa
ocupar o lugar que deveria ser do tesão genital.

Nas neuroses algo semelhante acontece, mas acontece em nível inconsciente. O perverso
manifesta o tesão infantil parcial de forma explicita no lugar do tesão genital, o neurótico não,
o neurótico conserva um apego forte a um certo tesão infantil (que não é o genital) mas o
neurótico conserva esse apego reprimido, e então ele vai seguir sua sequencia de
desenvolvimento sexual. No caso do neurótico o tesão genital vai se estabelecer no lugar
principal mas quando esse tesão genital se deparar com obstáculo na vida adulta, o neurótico
recorre ao tesão infantil ao qual ele ficou fixado mas ele recorre em fantasia, recorre de modo
inconsciente, tudo de baixo dos panos, tudo nos bastidores porque o neurótico se submete à
repressão, o neurótico não é como perverso que transgride a lei, o neurótico se submete à lei
mas por debaixo dos panos, no inconsciente, ele acaba recorrendo a aquele tesão infantil ao
qual ele ficou fixado, e ao se refugiar no tesão infantil pela via da fantasia o neurótico então
adoece. A neurose é justamente a expressão simbólica disfarçada da fantasia infantil. O
perverso expressa essa fantasia de forma explicita/concreta/prática porque ele transgride e
renega a lei, o neurótico de submete e a única forma que o neurótico tem de expressar sua
fantasia infantil ao qual ficou fixado é pela via da neurose, dos sintomas.

Tanto nas perversões quanto nas neuroses teremos a presença do fenômeno chamado fixação.
Freud entendia que nossa libido/energia sexual ela pode se fixar a certos tesões infantis, a
certas formas infantis de satisfação, a nossa libido pode se vincular a esses tesões e
permanecer agarrada a eles. O perverso leva essa fixação na vida adulta e o coloca no lugar do
tesão genital e o neurótico não, o neurótico leva essa fixação pra vida adulta mas de baixo dos
panos. Na neurose temos o gozo de baixo dos panos, o perverso goza explicitamente, isso não
significa que a perversão seja a felicidade pois o perverso tem um conflito com a lei, com a
moral, com a estrutura social e ele se defende da lei trazendo pra vida adulta o tesão infantil.

O neurótico não goza dessa maneira explicita, ele vai gozar de baixo dos panos.

O que é a análise no final das contas se não uma tentativa de levar o sujeito a perceber que ele
goza de baixo dos panos, que de baixo dos panos de sua neurose, de seus sintomas,
sofrimentos, adoecimento, suas inibições temos satisfação, temos gozo? O que é a psicanalise
se não isso? Tanto no neurótico quanto no perverso temos a presença de uma fixação? Os dois
estão fixados na infância, são peter pan fixados na infância. Ambos estão comprometidos em
seu processo de amadurecimento, porque esse processo em tese pressupõe uma saída da
condição infantil. Mas o que o neurótico faz? Ele permanece fixado na infância, não conseguiu
metabolizar esse elemento infantil em algo da vida adulta, esse resto de infância o neurótico
ficou fixado a ele.

Passamos então a falar sobre o complexo de édipo. Freud diz “a criança toma seus pais como
objetos de seus desejos eróticos”. Freud está mostrando aqui que apesar de nós sermos
humanos com todas as características que nos distinguem dos outros animais ainda somos
mamíferos e quando estamos na fase inicial da vida, quando somos filhotes de homo sapeins
nos comportamos da mesma forma que outros mamíferos se comporta, existe sexo entre
filhos e pais nos outros mamíferos. Os filhotes de uma cachorra pode copular com essa
cachorra se mantidos no mesmo lugar, porque nos animais não há a lei do incesto, essa lei não
é natural, ela é trazida de fora pra dentro. Nós não desenvolvemos uma aversão natural pelos
nossos pais como objetos sexuais, isso é fruto de um processo educativo porque nossa
disposição natural nos leva a tomarmos nossos próprios pais como objetos sexuais, como
objetos eróticos. É isso que nossa disposição natural nos leva a fazer.

Quando Freud fala do chamado complexo de édipo ele está se referindo tão somente ao fato
natural e espontâneo que é a vinculação de desejos eróticos espontâneos da criança àqueles
que estão à volta dela no início da vida. Os familiares são as primeiras pessoas com as quais a
criança entra em contato então é natural que ela vincule a sua libido, que ela invista os seus
desejos eróticos nessas pessoas, é a isso que Freud está se referindo. Mas Freud menciona de
passagem/sutilmente que essa ligação erótica entre a criança e seus pais é
provocada/estimulada pelos próprios pais. Freud está fazendo referência a algo que depois
dele seria trabalhado por outros analistas que é o papel que o objeto exerce na nossa
sexualidade. O objeto ao qual nos investimos nossa libido, direcionamos nossos desejos
sexuais, esse objeto ao mesmo tempo que é alvo ele é a causa, essa objeto revela à pulsão os
impulsos, revela o desejo de modo que não podemos pensar o sujeito como uma ilha, mas
pensar o sujeito em relação porque embora o desejo venha da criança e nasçam do corpo da
criança quem desencadeia/estimula/provoca esses desejos é o objeto que é o que acontece,
por exemplo, quando você está diante de uma pessoa por quem você sente desejo sexual, a
presença dessa pessoa invoca a você o desejo, o tesão. O tesão é seu mas foi evocado por
aquela pessoa e isso que Freud está mencionando. Freud mostra que os pais desempenham
esse papel de provocadores do impulso sexual infantil. Freud não está dizendo que os pais
abusam sexualmente de seus filhos, trata-se de uma sedução mas não uma sedução violenta,
trata-se de uma sedução necessária. O objeto precisa estar presente evocando a pulsão,
evocando o tesão, evocando o desejo. É isso que fazemos na clínica. O que é a transferência se
não essa contaminação do espaço analítico do setting terapêutico com algo que vem do
sujeito, algo que vem da sexualidade do sujeito. Quem provoca? É a analista. A presença do
analista invoca a sexualidade de seu paciente. “Nós invocamos esses demônios, só não
podemos sair correndo depois de evoca-los”.

E de que maneira os pais evocam isso? Evocam por meio da ternura, por meio daquele carinho
parental, do aconchego do colo, da passada da mão na cabeça, nos cuidados corporais, no
banho. Nesses cuidados a pulsão é envocada. Esses cuidados parentais não são tesão explicito
mas tesão inibido, é uma forma inibida da sexualidade e não há nada de mal nisso, é preciso
que a sexualidade se torne inibida em nós em algumas relações como amizades, filhos, pais.
Graças à expressão da ternura que a pulsão é evocada na criança e aí nos temos o
estabelecimento no que Freud chamará de complexo de édipo.

Aula de hoje:

Os irmãos (quando existem) também tornam alvo dos desejos eróticos da criança.
Dentro do quadro do complexo de édipo os irmãos quando existem também eles vão ser alvos
dos desejos sexuais da criança. A criança não vai investir apenas a sua libido no seu pai e na
sua mãe, ele investirá também nos irmãos porque eles estão ali gravitando em torno da
criança então é natural que o desejo sexual se volte para essas pessoas próximas, a criança
ainda não foi introduzida na lei do incesto, ainda não aprendeu que não pode desejar pessoas
do mesmo clã, ela ainda é o filhotinho de homem sapiens, assim como o filhotinho de desejo
faz isso.

Por isso é muito comum haver brincadeiras sexuais entre irmãos e não tem que ser visto com
escândalo, isso é apenas a expressão da natureza em nós.

Se sinto esse tesão e não tem nada que diz que não posso desejar minha mãe, meu pai, meu
irmão eu vou deseja-los, só vou parar de deseja-los quando eu internalizar a lei do incesto, ou
seja, essa lei vem de fora, ela precisa ser apresentada. Claro que essa apresentação não é feita
de forma explicita mas por meio de indicativos, a criança vai sacando que não pode, algo que o
cachorro não faz porque na lei canina não há lei do incesto. Precisa haver essa lei mas até
acontecer isso a criança é um pequeno édipo.

Quem foi édipo? É aquele personagem da mitologia grega que recebeu a profecia de que iria
se casar com sua mãe e iria matar seu pai e ele procurou fugir do cumprimento dessa profecia.
E como diz uma “filosofa contemporânea” Anna Carolina (mas quando eu fujo eu me aproximo
mais), ele fugia mas ele se aproximava, até que ele chegou de fato concretizar a profecia, não
só de casou mas copulou com sua mãe e matou se pai. Incapaz de conviver com a consciência
desses atos ele acabou se mutilando, mutilando os próprios olhos. Esse é édipo. Toda criança
vive uma fase em que é um pequeno Édipo, desejando sexualmente seus pais e seus irmãos. É
a expressão da nossa condição de mamíferos. Mas esse negócio deixa rastros, permanece em
nós na maioria de nós e ele se tornará permanecendo em nós fonte de doença, fonte de
enfermidade.

E tanto na relação com os pais quanto na relação com os irmãos, sentimentos de hostilidade
também se fazem presentes.
Onde há amor, há ódio. Porque o amor tem essa mania, o amor tem essa característica, ele
exige exclusividade. O chamado “poliamor” é uma invenção moderna dos seres humanos
porque originalmente/naturalmente o amor exige exclusividade. Se eu quero a minha mãe só
eu posso ter minha mãe, eu não posso tê-la e compartilha-la com meu pai. Mas ela não pode
ser só minha, ela não pode ser sequer minha porque não posso tê-la como objeto, vou
aprender que está errado mas antes de aprender que é errado vou aprender que ela já tem
dono que é o pai, e aí passarei a ter raiva, ódio do meu pai porque me toma a mãe, e minha
mãe me abandona para ficar com meu pai, terei ódio. Vou ter ciúme, rivalidade com aqueles
que disputam meu objeto de amor. Vou ter por força da sexualidade sentimento de
hostilidade presente, vou vivenciar um festival de afetos positivos e negativos por isso esse
período deixa marcas.
Não há neuroses entre leões, hienas, gatos, cães, há neuroses nos humanos porque os
humanos não permanecem restritos à condição mamífera, somos alçados a um outro patamar,
ao patamar de sócios da sociedade humana, e pra fazer parte dessa sociedade precisamos nos
submeter às leis, às regras de funcionamento dessa sociedade e dentre essas regras há uma
que é absolutamente fundamental: é a lei que interdita o acesso sexual ao familiares. E aí está
você com 4 anos de idade vivendo uma tempestade emocional com muito tesão, vinculo,
apego, raiva, ciúme, inveja, mágoa tudo isso acontecendo ao mesmo tempo e aí chega até
você informação de que todas essa tempestade emocional que está vivendo é errada, não
deveria acontecer, chega até você a informação de que toda essa tempestade emocional é
contra a lei e aí só resta a você jogar essa tempestade emocional fora, esquecer que ela
aconteceu, fingir para si mesmo que nada disso se passou, é a repressão do complexo de
édipo.

Freud afirma que esse complexo de sentimentos e desejos intrafamiliares é objeto de


repressão, mas “continua a agir do inconsciente com a intensidade e persistência”.
Não pode fazer parte da sociedade humana trazendo consigo os sentimentos positivos e
negativos vivenciado entre pais e irmãos. Tem que fazer uma escolha, uma escolha forçada
mas é uma escolha: ou você entra na sociedade humana ou você fica mamífero, se quiser
permanecer com esses sentimentos com tesão pelo pai, mãe, irmão ou ódio, se quer
permanecer nesse festival incestuoso, se quer ficar na terra do nunca então não entre na
sociedade, ou o gozo infantil ou a pertença à sociedade. Ou a participação naquilo que Lacan
chama de “Grande Outro”.

E a gente não aceita ter que fazer essa escolha, melhor dizendo, alguns de nós aceitam mais e
outro aceitam menos mas ninguém aceita 100%.

O grande Outro, a sociedade, a civilização, a cultura gostaria que você jogasse o complexo de
édipo fora, que você desse adeus a ele, que você o sepultasse ou eliminasse... imagina uma
sociedade de pessoas sem complexo de édipo? Mas nenhum de nós consegue fazer isso, todos
nós reprimimos e reprimir é conservar.

O complexo de édipo age na vida da pessoa com a intensidade e persistência. Alguns de nós
vão conseguir graças à história de cada um, dar um destino criativo, útil, satisfatório a esse
complexo na sua vida adulta e não vai adoecer mas muitos de nós não conseguirão dar esse
destino criativo para o complexo de édipo a não ser que se submetam ao tratamento
psicanalítico. O neurótico é o sujeito que não conseguiu digerir, metabolizar, que não
conseguiu dar um destino ao complexo de édipo. Inconscientemente ele permaneceu preso à
forma bruta do complexo de édipo, a esse elemento infantil. O neurótico não conseguiu fazer
transformar esse elemento infantil em algo possível de ser aproveitado na vida adulta, ele só
conseguiu transformar em doença, sintoma, inibição, relacionamento doentio... esse é o
neurótico. Esse sujeito que vai nos procurar pedindo ajuda para crescer, amadurecer para dar
um destino diferente para esse negócio que todos nós reprimimos e portanto conservamos.

Apesar de, neste momento, Freud ainda não nomear esse complexo como “complexo de
édipo”, ele já suspeita que ele seja “o complexo nuclear de cada neurose”.
Embora Freud não nomeie esse termo nas lições, ele já suspeita que se trata do complexo
nuclear de cada neurose. No núcleo, ou seja, no centro da neurose é isso que está em jogo, o
apego excessivo ao complexo de édipo. O complexo de édipo não é a menina gostar de papai e
menino gostar de mamãe, é mais complexo que isso, é essa tempestade emocional que
acontece na vida da criança em seus 4 anos de idade onde vincula os desejos sexuais às
pessoas à sua volta.

Essa tempestade emocional não fica pra trás, nós reprimimos e conservamos e é dali que vai
brotar a neurose, essa é uma chave clinica. Toda vez que se escuta um paciente neurótico tem
que ter em mente o complexo de édipo, esse festival emocional relacionado às figuras
parentais. É ali que está a gênese. Freud vai dizer que nessa época tem outras coisas
acontecendo com a criança.

Freud aponta ainda que, na época do complexo de édipo, a criança constrói “teorias sexuais
infantis” como respostas para suas investigações sexuais.
A criança está extremamente interessada em entender as coisas da sexualidade, nessa época
que coincide com a famosa fase dos “porquês” de Piaget. E aí ela começa a se perguntar,
sobretudo se tiver um irmãozinho. “De onde ele veio?” “de onde eu vim?” nós adultos
paramos de fazer essas perguntas porque são respondidas pela religião e a criança não tem
religião, a criança é muito mais cientifica, ela quer entender a lógica natural das coisas. E aí de
repente ela vê uma mulher grávida, e então conclui “ah, então se ela está com barrigão e tem
um neném lá dentro é porque ela comeu o neném e agora ele está na barriga dela, e como
esse bebê vai sair? Ele vai sair pelo ânus”.

Outra teoria é a teoria de que o ato sexual é um ato agressivo e violento, essa é uma teoria
que é facilmente construtivel se nós levarmos em conta que nas relações sexuais as pessoas
gemem, há barulhos que faz suspeitar até de uma agressão e a criança ouve esses barulhos
vindo do quarto dos pais.

A teoria da castração em que o menino constrói a principio de que todas as pessoas tem pênis
e quando depara com a mãe ou a menina ele imagina que o pênis foi cortado.

Todas essas teorias sexuais infantis que a criança constrói como pequeno cientista, a criança
constrói para responder as perguntas que ela própria faz. E isso não é só coisas de criança, é
coisa de adulto porque Freud nos faz ver, e a clínica evidencia que essas teorias sexuais infantis
permanecem no inconsciente e muitas vezes serve de parâmetro para construção de sintomas
para o enquadramento do relacionamento com o outro. Você vai encontrar, por exemplo, em
muitos casos dificuldade para ter ereção, dificuldade de ejacular vai encontrar a presença da
teoria do ato sexual como sendo um ato de violência que é uma teoria infantil, mas pode
encontrar essa teoria presente inconscientemente na mente de muitos homens.

Assim como uma pessoa de repente pode falar “eu vou me precaver contra a covid19, vou
tomar todo dia água limão e mel” é uma teoria, a pessoa está se comportando em uma teoria
que construiu na própria cabeça.

Da mesma forma pode se deparar na clinica com uma pessoa que está sofrendo, apresentando
sintomas, que está em um relacionamento patológico porque ela está em influência de uma
teoria sexual infantil que foi reprimida mas que foi conservado e assim serve de referencia
para o desenrolar da vida do sujeito.

Voltando ao complexo de Édipo, Freud afirma que, no futuro, os pais servirão como modelo
para a escolha de objeto do sujeito.
Os pais que no complexo de édipo são visto como objeto na vida adulta eles servirão como
modelo para a escolha de objeto definitiva/futura do sujeito, isso não significa que a menina
vai escolher seu parceiro com base no seu pai, não necessariamente, pode ser com referencia
à mãe. Ou muito mais frequentemente uma mescla dos dois. O mais importante que quero
destacar é que o que Freud está nos mostrando é que se lá na infância os pais eram objetos
sexuais, no desenvolvimento saudável eles se tornam agora referenciais, modelos. Essa
escolha portanto não foi feita de maneira aleatória, não é por acaso, portanto as queixas que a
pessoa tem em relação ao seu parceiro amoroso são da mesma ordem das queixas que a
pessoa tem a si mesma. Da mesma forma que uma pessoa se queixa do seu excesso de
ansiedade, compulsões alimentares ela se queixa do marido/namorado, eles também são
sintomas. Isso é algo que temos que ajudar nossos pacientes a ver, que a parceria amorosa é
sintomática porque é um representante do édipo.

Não posso pegar papai nem mamãe mas posso pegar alguém parecido com eles, eu posso
pegar alguém que tenha semelhanças, traços, posso pega-los como modelos. E dessa maneira
eu prolongo de certa forma o complexo de édipo na minha vida, não estou pegando papai e
nem mamãe mas estou pagando-os como modelos e aí pode ser que consiga arrumar
parcerias amorosas que tenham sido escolhidas tomando como modelo papai e mamãe e dar
certo demais ou a relação pode ser doentia, e geralmente é patológica quando há muito
proximidade entre aquela figura que o sujeito escolheu e o modelo de papai e mamãe. Em
outras palavras, quando seu parceiro ou parceira amorosa tem muitos traços parecido com os
pais é provável que essa relação seja sintomática, quando se consegue ver papai e mamãe
muito presentes.

Agora posso fazer também como Édipo e tentar fugir do meu destino e querer alguém que seja
o oposto de papai e mamãe, e nisso estou tomando eles como modelos da mesma forma, não
tem escapatória. Eles vão estar sempre servindo como referencial, é o destino do complexo de
édipo em nossas vidas.

Também de passagem, Freud afirma que a influência dos pais é o “principal fator de
repressão”.
A influência dos pais é o principal fato da repressão, aqui Freud introduz uma ideia que só vai
desenvolver em 1923 quando vai introduzir o conceito de superego, mas ele já nos brinda com
essa ideia. O mecanismo do recalque é uma realidade inevitável e necessária para sair de
nossa condição mamífera e ascender a condição de sócio da sociedade humana precisamos
reprimir e colocar algumas coisas de baixo dos panos. Ele diz que a influencia dos pais é o
principal fator da repressão.

Podemos pensar que a sociedade que faz a repressão que é a civilização? Sim, a lei está
presente na sociedade civilização, no grande outro mas é preciso que essa lei seja encarnada, é
preciso que alguém encarne e seja o porta voz dessa lei e as pessoas que encarnam a função
do Grande Outro são justamente os pais. Então se quero entender todo o mecanismo e
engenharia de repressão que esteve em jogo na historia de vida de uma pessoa é preciso olhar
para seus pais, quem foram os pais, como se comportaram, como eles agiram com o sujeito e
como foi essa vinculação da lei. São os pais que introduzem o piniquinho, as roupas, são os
pais que introduzem a lei, eles que encarnam essa função e então se tornam o principal fato da
repressão. Portanto, se tenho repressão em excesso, onde tenho que buscar a origem dessa
repressão em excesso? Todo mundo precisa de repressão mas não excesso de repressão e na
história de muitas pessoas tem excesso de repressão que está na influência dos pais.

Freyd finaliza a lição IV com uma fórmula intrigante. Ele diz que a psicanálise o “simples
aperfeiçoamento educativo destinado a vencer resíduos infantis”.
O que Freud está dizendo é que a psicanalise existe porque a civilização não faz o trabalho dela
direito. Ou seja, a civilização não promove o processo educativo que seja bom, satisfatório
para muitas pessoas e isso leva algumas pessoa a desenvolverem neuroses. A neurose é então
fruto de uma falha no processo educativo. Freud vai chamar a psicanalise de “pós-educação”
pois o que fazemos com os nossos pacientes é “pós-educa-los”.

Como entendemos educação? Educação no sentido amplo, no sentido da transformação do


mamífero em sócio significa um conjunto de possibilidades, de recursos, de dispositivos, de
oportunidades para que o sujeito possa dar uma destinação para seus resíduos infantis. Uma
sociedade ideal, utópica seria aquela que ofereceria essa oportunidade para todos, a
possibilidade fazer algo de produtivo, útil com seus resíduos infantis, com seu complexo de
édipo, seus tesões infantis fixados.. Essa seria uma sociedade utópica que oferecesse a todos
essa possibilidade.

Quando Freud fala de vencer podemos ter a impressão de que ele quer eliminar, de acabar
com os resíduos infantis e o sujeito se tornar 100% adulto, mas o próprio Freud em outros
momentos diz explicitamente que não dá pra ser 100% adulto, que o inconsciente vai sempre
permanecer infantil, o inconsciente é esse resto de infância que fica em nossas vidas, não dá
pra ser 100% adulto, até porque que chata a vida seria se fossemos 100% adultos, o que
tempera a vida é justamente esse resto de infância.

A passagem de mamífero para a condição de sócio deveria ser feita de tal maneira que a gente
conseguisse nessa passagem encontrar um lugar criativo pro resto de infância, pro resto de
mamífero que permanece em nós. O ideal seria isso e muitas pessoas conseguem fazer isso,
muitas pessoas passam pela vida sem adoecerem neuroticamente. Há outro grupo enorme de
pessoas que não sabe o que fazer com o resto de infância e acaba a transformando esse resto
de infância em sofrimento, em sintoma, em relacionamento doentio, em inibição, em
ansiedade, é pra essas pessoas que a psicanalise existe, pra fazer o trabalho que não foi feito
pela civilização.

A psicanalise é um aperfeiçoamento educativo, ajudamos nossos pacientes a criarem um


destino para o seu resto infantil, isso que no final das contas ajudamos nossos pacientes s
fazer. A criarem trilhas, a inventarem formas, a produzirem uma coisa nova a partir disso que é
tão velho. Por isso que na psicanalise a gente não fica querendo eliminar/curar sintomas, a
gente quer ajudar o paciente de fazer seu sintoma alguma coisa produtiva/criativa, porque o
que a gente percebe no sintoma é a presença do resíduo infantil que é inapagável, é a chama
que mantem o indivíduo vivo porque há vida no sintoma. Só que é uma vida que está
amortecida, adoecida e precisa ser libertada criativamente. Isso que ajudamos nossos
pacientes a fazerem, isso que algumas pessoas conseguiram por sorte fazer sozinhas, isso que
os artistas fazem, fazem da sua vida uma obra de arte.

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