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Betina Schaurich

Psiquismo e Subjetividade em Psicanálise

Introdução

- Profª Luciana Drehmer. Monitoras Lívia (liviakoltermann@hotmail.com, 51


99936-7734) e Sofia (sofia.medeiros@acad.pucrs.br, 51 991079198).

Metapsicologia

- Sujeito da psicanálise: regido pelo inconsciente e movido por pulsões.

- Constituição do psiquismo: as primeiras relações objetais deixam marcas


psíquicas e, a partir do recalcamento originário, constituem-se diques, que
separam espaços psíquicos. Tais inscrições ficam no inconsciente, mas são
significadas a partir de representações do processo secundário.

- Função materna: qualquer um pode desempenhar. Trata-se de um mínimo


necessário. Autoriza a criança a ser alguém diferente dos pais. Forma uma
integração do Eu, pautada no narcisismo e autoerotismo. A criança sente-se “sua
majestade, o bebê”.

- Teoria do apoio: a primeira vinculação da criança com o cuidador é a


necessidade autoconservativa. Quando ela encontra a saciação da fome, ela tem
também um registro de prazer. A partir daí, se constitui a pulsão. É daí que Freud
acredita haver uma sexualidade infantil.

- Sexualidade infantil: Freud fala em organização, não em fases.

Psiquismo e Subjetividade

- Definições:

• Psiquismo: universalidade da estruturação em aparelho psíquico. Atuação do


Inconsciente. O sujeito da psicanálise é o sujeito do desejo, pautado na noção
de Inconsciente e na experiência de prazer e falta. Grava como significantes
certas experiências vividas, formando uma memória e vias de facilitação da
circulação de energia psíquica.

- Ato psíquico: tem duas fases, a primeira inconsciente, um teste de censura e


uma segunda fase consciente. Lógicas diferentes, mas articuladas.

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• Subjetividade: posição frente à cultura, tanto a nível macro como micro. As
relações conferem modos particulares, devido à singularidade da experiência.
A produção de subjetividade se dá na intersecção entre as questões universais
e as reações particulares do aparato psíquico. Tem uma ordem consciente e
uma inconsciente de funcionamento. Contudo, não pode dar conta de como o
sujeito se constitui no aspecto inconsciente. Com as transformações do século
XXI, a subjetividade entrou em risco, porque há uma sociedade da imagem, na
qual não basta encontrar as próprias representações, é preciso buscar a visão
dos outros. Coisificação, desocupação e marginalização.

- Sujeito da psicanálise: trabalha com o sujeito do inconsciente, que surge por


meio das funções maternas. O sujeito desejante surge a partir da ruptura da
noção fantasiosa do Eu ideal, que se dá por meio do registro da falta das
primeiras experiências de castração. Esta experiência de frustração se
registra no aparelho psíquico e faz com que o sujeito passe a ser desejante.
Sempre há mediação por um terceiro. Daí a importância da função materna,
mesmo que não perfeita. A criança reproduz de forma alucinatória o prazer,
que tem a ver com um objeto não totalmente satisfeito. Para Lacan, o sujeito
deseja ser desejado pelo outro. Ao ser muito satisfeito ou muito frustrado, o
sujeito tem uma grande sobra de investimento libidinal.

- Relação: questões universais versus particulares.

Investimento

- Pulsão: processo dinâmico que consiste em uma força que faz o organismo
tender a um objeto, tendo como fonte um estado corporal e como objetivo a
satisfação. Qualquer objeto pode ser o objeto da pulsão. A pulsão em si nunca
pode ser consciente, apenas seu representante. É objeto privilegiado de
recalcamento. A libido seria uma energia única ligada às pulsões sexuais.

• Parcialidade: investida na região erógena, e não relativa a toda a noção de


corpo. Fragmentação da pulsão sexual que funcionam primeiro
independentemente.

• Totalização: na genitalidade, as pulsões são somadas em uma energia única.


Há uma noção de corpo inteiro e a possibilidade de investimento em um
objeto. Troca de investimento que não tem destino só a si mesmo.

- Aparelho psíquico: captura, contém e transforma coisas que vêm de fora.

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- Pontos de fixação: diz respeito ao tempo de grandes marcas na constituição da
sexualidade infantil. Modo de inscrição de certos conteúdos representativos que
persistem no inconsciente de forma inalterada e aos quais a pulsão permanece
ligada. Pontos aos quais tendemos a voltar na vida adulta com a sensação de
privação ou grande satisfação, como uma compulsão à repetição.

Sexualidade Infantil

- Definições: a sexualidade humana é regida pelo princípio do prazer, diferente


dos animais, guiados pela reprodução. Toda conduta que parte de uma região
erógena do corpo e apoia-se em uma fantasia, gerando prazer, é considerada
sexual.

• Infância: restrita temporalmente.

- Desamparo: estado do lactente de dependência completa de outra pessoa


para romper com suas tensões internas e satisfazer suas necessidades. A
ação específica é o meio pelo qual esses processos podem ser realizados.

- Linguagem: ao nascer, a criança precisa de um outro que lhe dê lugar de


existência, tem necessidade de linguagem.

• Infantil: vem desde a infância, mas, através de marcas no inconsciente,


seguem vigentes no adulto.

- Características:

• Perversa: sem alteridade, toma a si mesmo como objeto de prazer. O outro


está apenas a serviço da sua satisfação e não recebe investimento por parte
do indivíduo perverso. A existência de perversões mostra que a sexualidade
não é necessariamente conectada à reprodução. Analogia com a histeria e
suas somatizações para provar a existência de uma sexualidade infantil.

• Polimorfa: baseada em pulsões parciais.

• Bifásica: duas fases separadas pelo período de latência.

- Organizações pré-genitais: as zonas erógenas têm papel importante, pois


fornecem prazer independente do objeto, o que é importante para o
desenvolvimento do narcisismo. Há avanços e recuos no desenvolvimento. A
cada vez que a criança avança, ela tem defesas mais elaboradas.

• Oral ou canibalesca: Karl Abraham separa em duas fases:

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- Sucção: ligada à função de alimentação. O primeiro componente oral é o
seio da mãe. A mãe é o primeiro objeto de amor da criança, porém já
subtraindo do consciente os fins sexuais do prazer. A fase oral também
movimenta a mãe, que recalca os desejos genitais que seriam provenientes
da estimulação mamilar na amamentação. Transformação do prazer da
criança em autoerótico. Sente prazer em sugar, mesmo que de forma
desligada da alimentação. A criança usa a fantasia para obter prazer
sugando outros objetos que não o seio.

- Canibalística: com o surgimento dos dentes.

• Anal ou sádico-anal: retenção e expulsão de excretas de acordo com seu


desejo (passividade). Diferenciação entre dentro e fora. Sensação de perda de
uma “produção própria”. A satisfação é procurada na agressão e na função
excretória. A criança está mais madura para movimentos musculares do corpo
e seus estímulos psíquicos (atividade).

- Expulsiva.

- Retentiva.

• Fálica: a partir do terceiro ano de vida, a criança já mostra excitação nos


genitais, procedendo à masturbação infantil. Iniciam as investigações sexuais e
as escolhas objetais, sendo as primeiras incestuosas. Os pais e até os irmãos
exercem influência no surgimento da atitude edipiana da criança. A cultura
chega até a criança através do outro, primeiramente pela família. As
concepções de feminino e masculino são passadas dessa forma. Até isso
ocorrer, há uma crença de monismo fálico. Assim, a partir dessa idade, a vida
sexual da criança se assemelha à de um adulto, ainda que falte a organização
genital estável.

- Genitalidade: subordinação de todas as pulsões parciais à primazia dos genitais.


Polarização entre masculino e feminino.

Narcisismo

- Etapas:

• Autoerotismo: relacionado às pulsões parciais, em constituição perverso-


polimorfa. O objeto não é visto como discriminado do Eu. Importante para o
futuro investimento em si mesmo, estando intimamente ligado à autoestima.
Quanto menor a discriminação entre o Eu e o não-Eu, mais narcisismo há na
escolha do objeto.

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• Narcisismo primário: o narcisismo dos pais é o investimento narcisizante
parental para a constituição do Eu. Os cuidadores precisam ter investimento
libidinal em relação à criança e, ao mesmo tempo, representá-la como um
outro, e não como parte da mãe, havendo uma ideia de separação. Os
enunciados identificatórios (o que gostaria de ser), efeitos do discurso dos pais
na organização oral, propiciam o surgimento do narcisismo primário. A partir
deles, o indivíduo torna-se um ser da cultura. Noção de Eu ideal e investimento
de toda a libido em si próprio. A criança fantasia que sua díade com a mãe é
onipotente.

• Narcisismo secundário: por conta da castração oriunda da percepção da


presença de um terceiro, forma-se um registro da falta e da exclusão. Assim, o
Eu ideal passa a ser representado pelo ideal do Eu, em uma tentativa de
recuperar a perfeição narcisista primordial. O ideal do Eu é constituído a partir
de valores, críticas e exigências presentes no sistema de desejos parentais,
reflexo de valores do campo social. Abre, assim, uma dimensão temporal, que
foca em metas futuras. A falta é estruturante do aparelho psíquico, porque, a
partir dela, se passa a desejar e a se fazer escolha objetal (o que gostaria de
ter). É preciso, contudo, manter no Eu uma reserva libidinal para a autoestima.
Ocorre o recalcamento originário, importante para postergar satisfação.
Primeiro, era vista como a angústia dos meninos de perder seu objeto de
prazer; contemporaneamente, é considerada a sensação de perder a plenitude.

- Adolescência: grande retomada do narcisismo. No início da adolescência, as


relações são parciais e narcísicas, ainda não dentro da genitalidade.

Complexo de Édipo

- Definição: primeira neurose vivenciada, em que há tensão entre o prazer de


fantasiar e a ideia de ser punido. Inicialmente, era uma teoria muito concreta,
pautada nos pais e no corpo da criança. Depois, passou-se a ver como uma
relação entre desejo e frustração.

- Falo: representado no mundo concreto pelo pênis e pelo clitóris. Indica poder.

- Sexos: os pais teriam uma parcialidade sexual no trato com os filhos, que se
traduziria em uma predileção natural para com o filho do sexo oposto ao seu.

• Masculino: em um primeiro momento, há amor pelo pênis. Conclui que a


menina tinha um pênis, mas que ele lhe fora retirado, o que o faz defrontar-se
com a possibilidade de sua própria castração. Tal angústia ocorre também por
conta da desaprovação dos adultos pela manipulação de seus genitais. Por

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conta disso, acaba renunciando à mãe, prevalecendo o amor narcísico como
forma de sobrevivência. Assim, o narcisismo do corpo interrompe o Édipo, e as
pulsões autoconservativas prevalecem sobre as sexuais. Há submissão à lei do
interdito do incesto, recalcando desejos, fantasias e angústias. O pai é um
rival, mas também um modelo. Não basta saber que o pai tem um pênis, mas
que ele é desejado pela mãe.

• Feminino: em Freud, fala-se de inveja do pênis, que não é mais uma leitura
predominante na contemporaneidade. Segundo essa teoria, a menina
inicialmente veria o clitóris como igual ao pênis, mas depois sentiria-se inferior,
vendo-se como castrada. O narcisismo da imagem de si possibilita o início do
Édipo. O desejo da menina tenderia primeiro à mãe, mas se dirigiria ao pai
posteriormente. A dessexualização da mãe ocorre primeiro, enquanto a do pai
só é feita mais tarde. Tentaria compensar a falta do pênis com o desejo de que
o pai lhe dê um bebê. Abandonaria o complexo de Édipo ao perceber que esse
desejo nunca é atendido e quando desejasse outro homem que não seu pai.
Para Freud, o Édipo só se resolve quando ela engravida, passando a ser fálica.
Todavia, a gestação em si é uma experiência de castração, pois a mulher não
tem nenhum controle sobre o que acontece em seu corpo, experiencia uma
passividade. Ela se identificaria com a mãe, castrada, pois ela é valorizada pelo
pai, fálico.

- Tipos: toda criança vive ambos, que são universais e necessários. Dependendo
do objeto de desejo, o “rival” varia.

• Positivo: tradicional. Para a menina chegar nessa situação, precisa ter


superado o período anterior negativo.

• Negativo: desejo pelo genitor do mesmo sexo. O que a criança quer frente à
castração é preservar seu narcisismo. Quando isso falha, ela se volta para
outro.

- Diferenças: a criança percebe as diferenças biológicas, entre gerações e do


tempo, superando o monismo fálico. Na teoria clássica, é a percepção de seres
possuidores de falo e seres castrados ou privados de falo.
Contemporaneamente, não representa binarismo, é apenas perceber que nem
todo mundo é igual a si. Diante da diferença, age-se com preservação narcísica,
pensando que o “errado” é o outro. É preciso abandonar o ideal de que se tem
todas as manifestações de prazer. É importante que a criança estabeleça essa
diferença para que ela possa assumir uma posição sexuada e assim,
posteriormente, poder questioná-la, visto que os parâmetros sexuais que existem
não são totalizantes, permitindo deslizamentos de sentido e arranjos singulares.

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- Angústia de castração: ocasionada pela quebra do Eu ideal, a noção de
diferença e o impedimento da díade.

- Estratégias:

• Formar uma aliança com o membro da díade e excluir o terceiro.

• Formar uma aliança com o terceiro e excluir o membro da díade.

- Saída: as catexias de objeto são substituídas por identificações. com aquele que
parece ter as características que sonhamos ter. A autoridade dos pais é
introjetada, formando um Superego que proíbe o incesto, levando à
dessexualização e sublimação das tendências libidinais. Assim, o indivíduo tem
como tarefa desvincular-se dos pais para, dessa forma, tornar-se membro da
comunidade social.

Latência

- Duração: algumas crianças permanecem em latência por muito tempo.

- Amnésia infantil: há recalcamento da memória dos primeiros anos de vida, até


cerca de seis a oito anos. Contudo, essas experiências não deixam de ser
determinantes para o desenvolvimento posterior.

- Sublimação: não é uma organização, pois não é focada em nenhuma zona


erógena, de forma que a sexualidade se constitui de uma forma além do próprio
corpo. Ainda existe sexualidade, mas sua evolução é pausada, e ela é deslocada
por via da sublimação. O recalque é intensificado. Dessa forma, a criança procura
atividades que não envolvam o incesto e o parricídio, iniciando o
desenvolvimento de relações de objeto dessexualizadas, pautadas na ternura.

- Superego: aparecem sentimentos de pudor e repugnância, bem como


aspirações morais e estéticas.

- Brincadeira: jogos de regras. Verdade ou consequência é um jogo de transição


entre latência e adolescência.

Winnicott

- Grupo dos independentes: havia, na época, uma dicotomia entre psicanálise


kleiniana e annafreudiana, na qual Winnicott não se incluía.

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- Ambiente: embora a psicanálise lide com relações e, portanto, de alguma forma,
lide com o exterior, Winnicott privilegiou um olhar sobre a influência do ambiente.
Ainda assim, há tendências inatas no desenvolvimento.

- Teoria do amadurecimento pessoal: trabalhou, durante a guerra, com crianças


refugiadas sem a presença materna. Todo ser humano tem uma tendência inata
ao amadurecimento, que se expressa se o ambiente for suficientemente bom. Se
for de excesso ou de grande privação, ele não conseguirá amadurecer.

- Preocupação materna primária: preparação durante a gravidez. Inicialmente há


um grande investimento - que, em outra circunstância, seria considerado
patológico. Depois, a mãe se retira, para que o bebê possa tolerar frustrações.
Primeiro modelo de relação. A vinculação não precisa ser necessariamente com a
mãe. É importante que cuidadores contratados estejam em consonância com a
comunicação dos pais.

- Mãe suficientemente boa: aguarda que o bebê dê sinais de suas necessidades


e satisfaz pelo menos algumas delas. A criança introjeta que pode confiar no
cuidado da mãe. Um bebê não existe sem a mãe, devido à relação que constrói
com ela.

• Criatividade: está ligada ao ambiente suficientemente bom e permite a ilusão


de onipotência, pois há uma crença da criança de que o que existe é criado
por ela.

• Handing: manejo dos desejos da criança e o ambiente.

• Holding: contenção e sustentação.

- Desenvolvimento: a vida psíquica inicia no momento em que o Ego começa a se


desenvolver.

• Dependência absoluta: primeiros seis meses de vida. Objeto subjetivamente


percebido. O bebê não se dá conta, mesmo inconscientemente, da sua
dependência. Há um estado de desintegração-fusão do Ego, que não está
suficientemente íntegro e maduro. Por isso, o Ego do bebê é amparado pelo
Ego materno, tornando-se forte. É necessário, portanto, que o cuidador esteja
em preocupação materna primária e seja suficientemente bom, do contrário o
desenvolvimento do bebê torna-se muito mais complicado.

• Dependência relativa: dos seis meses aos dois anos. Objeto objetivamente
percebido. A realidade já está posta na relação com os cuidadores. Há um
início da separação entre Eu e não-Eu, vendo a mãe como um objeto. Como
resposta ao desenvolvimento do bebê, há falha gradual da mãe. Assim,
quebra-se a ilusão de onipotência.

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- Espelho da mãe: a criança percebe, através do rosto da mãe, o que ela
deveria sentir. Ao olhar os olhos da mãe, a criança deve ver ela própria, não
a imagem do outro.

• Rumo à independência: dos dois anos até o resto da vida.

- Falso self: comunicação falha que leva a mãe a entregar à criança algo que ela
não é. A pessoa não sabe quem é, mas se adequa às exigências do meio em que
se encontra. Se o ambiente é ameaçador, cria-se uma proteção. Não há
consciência de que não existe um registro do Eu.

Klein

- Biografia: primeira psicanalista mulher e sem nenhuma formação médica.


Considerável contribuição para a escola inglesa de psicanálise.

- Psiquismo: muito precoce. Baseado em fantasias. Foi criticada por não dar tanta
relevância ao ambiente da criança, inclusive sem incluir os pais no tratamento.
Muitas vezes, esta crítica é vazia, porque ela fazia uma investigação com os pais.

• Experiências emocionais: os mecanismos que regem o aparelho psíquico são


os de introjeção e projeção dos objetos externos. As relações objetais, no
sentido do narcisismo primário, sempre existem, desde o nascimento. Cada
vivência emocional adquire significado conforme objetos internos, ou seja, nem
sempre o que a criança sente tem a ver com a realidade. A criança fantasia
como meio de organizar suas ansiedades. A primeira experiência de ansiedade
é o nascimento, quando se passa de um papel passivo a uma situação de
solidão. Os bebês têm impulsos agressivos muito fortes, ansiedade e
dificuldade de tolerar frustração. Ser desamparada e fragmentada faz com que
a criança tenha ansiedade por não poder satisfazer-se. As experiências de
gratificação e frustração geram impulsos de amor e ódio. Todos nascem com a
pulsão de morte, mas as relações de amor vão mitigar as de ódio. O primeiro
objeto introjetado é o seio da mãe, que forma a base do Superego. Assim,
introjeta-se o que é bom e projeta-se o que é ruim, de forma a construir o Ego
e o Superego. O desmame já geraria angústia de castração antes do tempo
estipulado por Freud, no complexo de Édipo. O Superego, assim, existiria
desde a fase oral.

- Culpa: resultado da pressão que o Superego faz sobre o Ego. Para Klein, o
Superego é sempre tanático. Ao projetar a raiva no objeto, a criança sente
que ele possa atacá-la, daí a grande regulação do Superego.

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- Ansiedade: medo de aniquilamento. A criança se sente perseguida por seu
próprio Superego. No recém nascido, já se experimenta ansiedade. O Ego
usa como defesas contra a ansiedade a cisão, a projeção, a introjeção, a
idealização, a negação e a onipotência. Posteriormente, faz uso também da
repressão. Quando as ansiedades vão perdendo força, os objetos tornam-se
menos idealizados e aterrorizantes, e o Ego, mais unificado.

- Posições: flutuações dialéticas entre elas, rompendo com a ideia de


desenvolvimento linear. A fantasia é um recurso.

• Esquizoparanoide: de zero a quatro meses. Funcionamento psíquico mais


primitivo, baseado no estabelecimento de relações objetais entre realidade e
fantasia. Não ter a capacidade de juntar o que se gosta e o que não se gosta
na mesma pessoa. Evita a angústia de pensar que a pessoa que se ama faz
algo que não se goste, usando, para isso, defesas primitivas para o proteger
da ambivalência. Cisão (esquizo) do objeto interno, similar ao seio bom e seio
mau, em fantasias separadas e ilusão de perseguição do que é ruim
(paranoide), distorcendo a experiência de mundo. Na identificação projetiva, o
seio bom é o que se tenta introjetar, e o mau, projetar. O bom reconhecido
como seu favorece um momento de integração (vida), que tem um papel
organizador e estruturante, garantindo a sobrevivência do Ego em momento de
fragilidade. De forma geral, a experiência de mundo fica distorcida com essa
cisão, alternando entre a satisfação com o mundo idealizado e a frustração
com o mundo ameaçador. Contudo, é também possível projetar partes boas, o
que permite à criança desenvolver relações estáveis com os objetos
necessários à constituição do Eu.

• Depressiva: a partir de seis meses. Percepção da ambivalência, ampliando o


conhecimento de mundo e trazendo novas ansiedades. Amor e ódio
destinados à mesma pessoa, vista, agora, como um objeto completo. A
mesma mãe que priva é a que satisfaz. Os processos de integração envolvem
a mitigação da agressão pela libido, bem como na identificação com o objeto.
O efeito depressivo se dá por conta de tolerar a própria culpa. Noção de
alteridade, percebendo que a existência do outro independe de si próprio.
Reconhece-se sua dependência, além da própria hostilidade.

- Transferência: trabalhada precocemente, tanto em termos de idade quanto de


tempo de tratamento.

- Brincadeira: o brincar deve ser interpretado. Como não existe associação verbal,
o brinquedo cumpre essa função.

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Lacan

- Influências: filosofia e linguística.

- Psicologia do Ego: se o Ego é responsável pelos mecanismos de defesa, a


análise deveria se dirigir a ele.

- Palavras: compostas por significado e significante, sendo este muito maior do


que o primeiro, que reduz a palavra a questões individuais.

- Estádios do espelho: o Ego é um lugar de desconhecimento. Até os seis meses,


um espelho não representa nada para a criança. Entre os 6 e 18 meses, a criança
reconhece a si mesma e o ambiente espelhado. Wallon concluiu que, à medida
que a criança amadurece, ela toma conta de aspectos da realidade circundante,
o que pode ser observado pelo espelho. Para Lacan, o mais importante que se
podia tirar disse não é que a criança toma conta da realidade circundante, mas
que toma conta dela própria. Ver-se no espelho é ver-se, pela primeira vez,
inteiro, antecipando uma integração que ainda não se tem de si próprio. Relação
com o narcisismo.

- Complexo de Édipo em Lacan: diferente de Freud. Tem três tempos, não


etapas, pois são estruturais.

• Primeiro: a criança é o falo do cuidador. O significante falo é o lugar do que é


poderoso para aquela pessoa, em uma ideia de sentir-se completo. Muito mais
da constituição da subjetividade da criança do que da mãe. Existem muitas
circunstâncias em que as pessoas podem se sentir fálicas, não é uma questão
apenas de maternidade. Trata-se da criança representar algo importante para
seu cuidador. Relacionado ao narcisismo e ao imaginário.

• Segundo: não se pode sentir fálico para sempre dentro de uma relação. É
necessário que o cuidador comece a se interessar por outras coisas e a não
ficar satisfeita somente com esta relação dual. Assim, para a criança, sobra
espaço para poder ser quem se é, e não apenas o que agrada ao cuidador.
Saída da alienação (“moi”). Relacionado ao simbólico. A criança começa a falar
para chamar o cuidador, pois o ser humano simboliza para ter o que não tem.
O sujeito do inconsciente (“je”) entra em questão.

• Terceiro: relacionado ao real, que não é passível de simbolização, embora não


seja sinônimo de realidade. O real é o que não se explica, por isso Lacan
considerava-o o mais difícil de explicar.

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Brincadeira

- Comunicação: expressa o mundo interno da criança e cria um mundo próprio,


que, como fantasia, pode ser diferente da realidade material. O jogo é
representante do desejo, e a fantasia é um meio de acesso ao inconsciente. Há
uma cisão que a criança faz entre ela mesma e a brincadeira, e é problemático
que isso não exista. A falta de criatividade de uma criança para construir uma
brincadeira preocupa. Cada criança tem seu jeito, e há muitos recursos para ela
se expressar. Para além da linguagem oral, representa, assim como o sonho, o
desejo. A inscrição das representações das vivências é feita pelo brincar.
Conforme Lacan, há um sistema simbólico em que tudo se ordena. Para Klein, a
brincadeira é o equivalente à associação livre do adulto. Quando uma criança
não se comunica com o mundo externo, avalia-se o ambiente.

- Elaboração de conflitos: a criança não brinca apenas para viver situações


satisfatórias. Há uma busca de recursos para lidar com angústias e apropriar-se
da situação dolorosa ou traumática. Antecipação da ausência no jogo de fort-da
relaciona a brincadeira à pulsão de morte, que, diferente da pulsão sexual, é uma
energia desligada. A criança faz a si mesmo o que fizeram a ela, há uma
passagem do passivo para o ativo e, assim, transforma-se o desprazer em
prazer. Esta tentativa de elaborar relaciona-se à compulsão à repetição. Sob a
ótica de Klein, os objetos internos são projetados sobre os brinquedos. Para
Winnicott, o brincar é curativo em si mesmo e está ligado à expressividade do
self verdadeiro, além de transformar elementos destrutivos em atividades
construtivas.

- Nexo temporal: não existe na brincadeira, assim como no inconsciente.

- Tipos de brincadeira:

• Autoerótica: indiferenciação do mundo externo, tomando a si como objeto de


prazer, bem como partes do corpo da mãe, sem haver distinção nítida entre
eles. Com a percepção do afastamento da mãe provocada pelo desmame,
com cerca de seis meses, tenta mitigar seu desamparo com novas
brincadeiras, iniciando atividades lúdicas. Passa a brincar com o seu corpo e
com objetos. Ao descobrir que objetos podem ser ocos, há ansiedade de
perda e esvaziamento. Pode haver uso de objeto transicional, conceito de
Winnicott.

• Pré-edípica: a relação com o cuidador já é mais claramente vista como de


afastamento, podendo haver ansiedade de separação e temor de abandono.
Afastamento e retorno são possibilitados pelo engatinhar. Controle

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esfincteriano. Brincadeiras de encaixar, misturar, construir, que vão se
complexificando. Jogo paralelo entre crianças.

• Edípica: representação é a típica brincadeira edípica, com dramatização


envolvendo duplas e exclusões. Mesmo que não interaja com outras pessoas,
há inclusão de outros elementos, de forma que há um cunho social. Na idade
pré-escolar, iniciam-se jogos sexuais, como papai e mamãe. Criação de
amigos imaginários.

• Latência: após a castração e o contato com a lei, estabelece-se o princípio da


realidade e surgem, assim, os jogos de regras. A relação com os pares assume
importância. Coleções são formas de se ter controle para reprimir impulsos
sexuais.

• Puberdade: o brinquedo é abandonado em prol das experiências amorosas. O


brinquedo é substituído pelo corpo. Há uma transição através de jogos
interacionais, como verdade ou consequência.

Adolescência

- Definição: fenômeno que abrange modificações psíquicas e mudança nas


relações no sentido da alteridade. Não se limita à puberdade, que constitui a
marca física pré-púbere. É um termo recente.

- Puberdade ou pré-adolescência: luto pelo corpo e pela identidade infantil. A


transformação do corpo faz uma grande exigência psíquica, pois dá inscrições a
que o aparelho psíquico deve dar significado. Contudo, não é apenas através da
própria percepção que passa-se a sentir diferente, os enunciados externos são
importantes. O processamento do corpo exige muito o toque, o que gera
transbordamento de afetos e comportamentos. Muitas defesas vêm da atuação,
a transformação em atos. Fase inicial marcada por esportes e agitação.

• Transtornos alimentares: uma das formas pelas quais principalmente meninas


demonstram sofrimento. A anorexia é uma postergação da própria
adolescência, pois resulta em um corpo infantil.

- Adolescência inicial: corpo já bem organizado, com perda de força da pré-


genitalidade. A pulsão começa a buscar satisfação no campo genital, mas,
apesar da hipersexualização, não há forma de dar vazão a ela. É muito comum
haver retrocessos em meio à transformação gradual.

• Relação com a família de origem: luto pelos pais idealizados da infância. Pode
haver dificuldade se os pais adolescerem junto aos filhos, já que eles tentam se

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diferenciar. Como as primeiras relações foram realizadas com a mãe, e essa
díade foi rompida, há uma tentativa, na adolescência, de não se vincular
novamente a ela. Isso aparece mais na menina, já que o modelo de
identificação do menino também é o pai. A busca de novos modelos
identificatórios pode ser vista como um perigo ao narcisismo dos pais, e é um
processo doloroso para ambas as partes. Os pais devem permitir que os filhos
se independizem, mas, ao mesmo tempo, ser ponto de referência e
continência. O diálogo é importante.

• Relação com grupos: função de identificação, que já não é mais possível com
os pais. As amizades são adesivas, narcísicas, pois se escolhe como amigos
aquilo que se quer ter para si. Fenômenos de massa levam a comportamentos
que não seriam desempenhados pelo adolescente sozinho, por dividirem a
culpa superegoica com os demais. Os vínculos exogâmicos indicam o quanto
a pessoa tem uma quantidade libidinal que é passível de investimento em
outros.

• Relacionamentos amorosos: os desejos incestuosos ficam mais temíveis. Há


reedição da conflitiva edípica, com retorno do desejo por uma vinculação
afetiva em uma relação pautada no narcisismo e, posteriormente, da sensação
de castração. Os relacionamentos amorosos são inicialmente de ordem
platônica, pois isso evita frustrações e por não haver necessidade de
considerar o outro para além da própria idealização. A masturbação, além de
forma de conhecer o próprio corpo, serve para postergar o encontro com o
outro. Caso o recalcamento do complexo de Édipo tenha sido bem sucedido, o
adolescente não verá os relacionamentos como fonte da frustração que foi o
relacionamento com a mãe. A partir disso, é feito um ensaio para as relações
futuras. Contudo, nessa fase já passa a haver relações voltadas ao outro.

• Introspecção: o adolescente precisa se desconectar para destinar energia a si


próprio. Há uma supervalorização de si mesmo. O jovem questiona sobre si
mesmo, pois sua identidade pré-adolescente precisa ser abandonada tal qual a
infantil. No entanto, ainda não sabe como ser adulto.

- Adolescência propriamente dita: há maior conhecimento de si. Não há tanto


ataque aos pais, porque eles já estão internalizados. Vivência mais profunda e
relativamente estável dos relacionamentos, investindo no outro enquanto outro,
não de forma idealizada. Assim, há um equilíbrio de investimento do Ego e do
objeto. O outro é visto como parte integrante de si, e não como complemento.

- Adolescência final: os limites entre o Eu e o outro ficam bem mais definidos.


conquista da estabilidade do somatório das pulsões parciais, atingindo a
genitalidade. Há, assim, um retorno do complexo de Édipo, a partir de um objeto

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Betina Schaurich
que não é mais só seu. O adolescente tem maior tolerância à frustração e
capacidade de adiamento.

Narcisismo Relações Objetais Relações com Pais

Autoerótico, para fins As escolhas ainda não Desqualificação dos


d e d e fi n i ç ã o d e aparecem, estão pais como formação
identidade. Desamparo postergadas. As reativa. Afastamento
Pré-adolescência
mais presente nesta relações de objeto são devido à angústia
fase por não saber por identificação. Amor frente a um corpo
quem é. platônico. adulto.

Vigência de grande Relações plenamente Desinvestimento nos


narcisismo. narcísicas. Amizades pais.
Adolescência Inicial adesivas baseadas em
escolher para perto de
si aquilo que lhe falta.

Maior equilíbrio dos Relações mais Os pais começam a


investimentos no Eu e maduras e não tão ser internalizados, o
no outro, porque a idealizadas. A escolha que significa que, com
Adolescência noção de si está mais começa a ser os limites do
Propriamente Dita integrada. alteritária, ou seja, o desemparo, introjeta-
o u t ro p a s s a a s e r se um pouco dos
escolhido pelo que ele cuidados que os pais
é. já deram.

E q u i l í b r i o d o s Relações alteritárias. Aproximação com os


investimentos no Eu e pais, que passam a ser
no outro. Desamparo figuras mais reais e
Adolescência Final b a s t a n t e p re s e n t e , não tão fantasiadas.
pois o sujeito se vê de
novo com limites,
agora dentro de si.

- Saída: reconhecer sua identidade e suas escolhas de objeto. A entrada na vida


laboral fornece uma identidade, bem como independência financeira.

• Legado: maior definição do Ego, pois há uma nova organização identitária.

- Ideação suicida: muito mais preocupante em adolescentes, pois as defesas


ainda estão se formando.

Amor e Paixão

- Definições:

• Sexo: descarga de pulsões não sublimadas. Nem sempre é uma relação de


intimidade.

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Betina Schaurich
• Paixão: idealizada e mais intensa. O investimento libidinal está muito mais
direcionado ao outro do que ao Eu.

• Amor: não tão idealizado, partindo para o objeto real. Há maior equilíbrio de
investimentos no Eu e no outro.

- Correntes pulsionais: as correntes afetiva e sensual precisaram ser separadas a


partir do complexo de Édipo, recalcando a parte desejante. A tarefa do
adolescente é reintegrá-las, de forma a amar e desejar a mesma pessoa.
Impotência psíquica é a impossibilidade de fazer esta integração e, em alguma
medida, ela é universal, porque mesmo os que conseguem nunca atingem a
plenitude da satisfação, como ocorria no Eu ideal.

Sexualidade e Gênero

- Modelo de sexo único: a mulher serviria apenas para reproduzir homens,


enquanto o macho era o gerador.

• Diversidade sexual: em uma leitura naturalística de macho e fêmea.

- Igualdade: com a ideia de igualdade formal, a hierarquia de sexos era uma


contradição, mas não deixou de existir.

- Feminilidade e masculinidade: hoje se entende que estão presentes em ambos


os sexos. A construção - necessariamente uma construção - de um homem ou
de uma mulher precisa passar pelo narcisismo, angústia de castração e
recalcamento. Primeiro, parte de uma ideia de sair do lugar de ideal e procurar
modelos identificatórios. Importa o que foi aprendido sobre o que é ser mulher ou
homem a partir de enunciados identificatórios. Falar do masculino e do feminino
não deveria estar na lógica da normatização, mas na das diferenças. É a partir do
momento em que se diferencia do outro que se passa a ter noção de Eu.

• Masculinidade: é vista como natural, o que leva a uma escassa bibliografia


sobre a sexualidade masculina. Contudo, o corpo não dá essa garantia.

- Conjugalidade: é importante que se constitua a diferença, independente do sexo


dos membros do casal.

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Betina Schaurich

Parentalidade

- Maternidade: muitas vezes, aparece atrelada à feminilidade, como se fosse algo


inerente a ela, quando na verdade não é. É construída, como qualquer aspecto
da subjetivação.

• Replicação: mesmo em casais homossexuais se replica uma estrutura


heteronormativa com divisão de papéis relacionados à maternidade e à
paternidade.

- Transmissão cultural: é preciso estabelecer limites, que são parte de uma


cultura que ora frustra, ora satisfaz. Mesmo com a tentativa dos pais de eliminar
a frustração dos filhos, ela nunca deixa de existir. O que é antigo acalma os
questionamentos, mas deve ser atualizado para abranger questões novas.

- Horizontalidade: leva a uma situação de desamparo.

Envelhescência

- Passagem do tempo: grande registro de castração. Algumas pessoas reagem


com uma saída maníaca.

- Ressignificação: o Ego diz respeito à modificação corporal. O Inconsciente é


atemporal, mas o corpo é temporal. A sexualidade, antes muito genital, passa a
ser transformada, devido à baixa hormonal. O corpo não corresponde ao desejo,
de forma que às vezes é difícil falar de forma sublimatória sobre o prazer.

- Autonomia: a família considera o idoso uma criança.

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