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Referencias do texto : Sarah C.

CHAMBERS, “Cartas y salones :mulheres que leen y


escriben la nación en la Sudamérica del siglo diecinueve”

Resumo :
Este artigo se basa na correspondência de três mulheres latino-americanas do século XIX
(Manuela Sáenz, Mariquita Sánchez de Thompson y Cannen Arriagada ) para analisar as suas
ideias sobre a identidade nacional e o lugar da mulher, no contexto de formaçao dos estados
nacionais nas novas republicas nascidas da independência. Na primeira parte intitulada
“Mulheres que escrevem a nação”, a autora analisa o sentimento nacional de cada uma das três
mulheres conforme expresso em suas cartas, de forma intimamente vinculada à sua rede de
relações sociais concretas com familiares e amigos, e não a conceitos abstratos. Na segunda
parte, intitulada “Inscrição das mulheres na República” , ela analisa o compromisso político
expresso pelas três mulheres na sua correspondência. Expressam um forte compromisso com a
construção de repúblicas estáveis e independentes, criticando a imprensa masculina e os homens
políticos que elas consideram guiados por interesses pessoais e incapazes de ver o interesse
comum. A autora tenta compreender a posição paradoxal dessas mulheres, que ao mesmo tempo
reverteram estereótipos sexuais da sua época, mas fazendo isso destacaram a diferença de
gênero, valorizando a utilidade de qualidades “femininas” na esfera política contra características
consideradas masculinas.

Comentarios sobre estilo :


O estilo da escrita é claro e fluido. O artigo é bem estruturado, o que facilita a sua compreensão.
A autora alterna entre citações/trechos de correspondência das mulheres e análise própria.

Proposição do texto :
O artigo permite uma revisão do olhar comum que opõe esfera pública e privada,
vinculando a ideia que as mulheres sejam confinadas à esfera privada, O artigo destaca o caráter
fluido da fronteira entre os dois. Assim, embora sejam oficialmente excluídas dessa esfera
pública, não todas se retiraram num espaço meramente doméstico. Achei interessante a proposta
do artigo de analisar espaços da sociabilidade feminina como “espaços intermediários” entre
esfera pública e privada. ( salões, correspondência, redes de amizades…) A autora aponta a
especificidade do gênero da carta, intermediário entre esfera pública e privada. Ela questiona a
divisão estreita entre a política associada à esfera pública e ao masculino / esfera privada e
doméstica associada com o feminino. Mostra como mulheres, embora excluídas da imprensa e da
política formal, acharam formas de “fazer política” e expressar opiniões em espaços de
sociabilidade intermediários. O artigo mostra como essa posição intermediária afeta a maneira
em qual as mulheres pensam a nação.
Tomando o gênero em consideração, o artigo traz novas perspectivas sobre o estudo da
formação das identidades nacionais. A autora na introdução lembra a teoria de Benedict
Anderson e Jurgen Habermas que pensaram o sentimento nacional em relação a uma esfera
política abstracta. O estudo da identidade nacional exprimida por essas mulheres revela uma
nova forma de expressão do sentimento nacional, com uma dimensão mais concreta, vinculado
com relações sociais.
Esse artigo traz um novo olhar sobre a atuação das mulheres na independência : ao
contrário da historiografia tradicional que analisa muito “heroínas de guerras”, a autora estuda
aqui as ideias das mulheres através dos seus escritos. A autora destaca que o fato das mulheres
terem sido excluídas dos cânones literários nacionais não significa que foram ignoradas em sua
época.

Questões :
A autora coloca em questão a ambivalência do compromisso dessas mulheres, que ao
mesmo tempo reverteram estereótipos sexuais da sua época, mas fazendo isso destacaram a
diferença de gênero, levando às vezes a uma sorte de essencialização das características de
gênero. Assim, a autora faz um paralelo com a análise de Joan Scott das feministas francesas do
século XVIII-XIX, perguntando como podiam ao mesmo tempo destacar a diferença de gênero e
reclamar a igualdade.
A atuação das três mulheres analisadas apresenta de várias formas uma verdadeira quebra
das normas. Elas mantiveram uma posição inconformista com a ideologia da domesticidade e
exibiam opiniões que se afastaram da crescente idealização das mulheres como mães acima de
tudo. Por exemplo, Sáenz não apenas rompeu com as normas femininas dominantes em seus
escritos, mas viveu abertamente como uma inconformista, e saiu em uniforme para lutar contra
os inimigos de Bolívar. Sanchez e Arriagada também se desviaram dos ideais domésticos em
suas vidas particulares e em escritos semi privados, embora de forma mais discreta do que Saenz.
A autora menciona também o papel das condições históricas e contextuais na mentalidade
dessas mulheres : nasceram na sociedade colonial, que permitia um certo grau de laxidão entre
comportamento privado e aparências públicas.

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