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Introdução
Desde 2006, quando conheci Alina Paim, através
da professora Ana Leal, eu fiquei fascinada, queria ler
tudo, saber como viveu, onde estava, e como eu venho
de uma linha de pesquisa da Literatura e Sociedade
com a professora Belmira Magalhães, na UFAL eu
comecei a ler com esse olhar, enquanto as pesquisas
desenvolvidas naquele momento eram direcionadas
para as questões míticas, acabei não me envolvendo
tanto. Porém conti111nuava a ler, escrever artigos,
participar dos congressos, dos Seminários Mulher e
Literatura, quando começou a inquietação pela busca
da estética literária dos romances de Paim.
A nossa proposta inicial para esta pesquisa era de
realizar uma análise das manifestações e das relações
sociais, e as condições de trabalho para as mulheres a
partir das personagens presentes nos romances
Estrada da liberdade (1944) Simão Dias (1949) e Sol
do meio-dia (1961), diante desse desafio, traçamos a
análise de suas personagens, que vão do sonho de
serem professoras ao de se tornarem escritoras, com
marcas autobiográficas presentes nessas obras,
observando o romance de artista, o que durante a
banca de qualificação tivemos a orientação da
professora Eliane Campello para observarmos que não
estava construído de forma completa no texto de Paim
e precisaríamos lapidar os estudos teóricos, quando
decidimos aprimorar e ampliar as reflexões sobre a
articulação da “escrita de si” presente nos textos de
Alina Paim a fim de resgatar seu pioneirismo ao
representar o cotidiano de mulheres trabalhadoras que
deixam rastros da atuação dessa escritora, enquanto
intelectual. A partir desse lugar, Alina Paim aborda
discussões sobre a importância da luta pelos direitos
femininos por meio de uma literatura que, mesmo se
filiando aos princípios da literatura socialista, rompem
com essa estética ao priorizar a construção psicológica
de suas personagens femininas.
As fortes relações entre os dados biográficos e a
ficção de Alina Paim vêm ganhando mais destaque nos
últimos anos por ampliarem seus estudos para as
questões da recepção e das escritas de si. Essa relação
pode ser identificada na forma direta da citação de
bairros, de nomes de parentes e cidades onde habitou,
ou de forma subliminar nos ideais de suas
protagonistas. Essa flexível fronteira entre literatura e
história faz parte da criação literária de seus dez
romances. Por essa constatação, fomos percebendo
peculiaridades de uma escrita intimista que se voltava
para o social. Tais marcas são próprias de uma
“esccrita de si” de resistência tanto ao sistema
patriarcal conservador como aos rígidos critérios da
estética socialista como defendemos nesta tese.
Repensarmos como uma ativista e intelectual do
PCB conseguiu se desviar das pressões patriarcais e
partidárias e machistas para produzir uma literatura
particular voltada para o universo da mulher, por isso a
investigação dos textos da romancista, destacando seu
engajamento social e político por meio da “escrita de
si” nesses romances. Enquanto intelectual engajada,
sua literatura teve uma recepção inicial que rendeu
premiações nacionais, tradução de dois romances para
o búlgaro, russo, alemão e chinês. Mesmo com a forte
influência da estética socialista, destacamos que sua
obra supera os limites de uma literatura doutrinária ao
privilegiar a instrospecção das personagens femininas
que desejam também ser escritoras. A nossa tese está
estruturada em 4 capítulos.
1º O primeiro capítulo tem como título
“CONTEXTO SOCIAL E ATUAÇÃO
INTELECTUAL DE ALINA PAIM” aqui
desenvolvemos uma discussão a partir da atuação da
romancista enquanto intelectual no meio político e
cultural do país, ganhando expressivo destaque para o
romance inaugural, com destaque sobre a estética
realista e os conflitos com as mulheres escritoras,
discutimos a relação entre a autora e o texto literário,
observando a “escrita de si” como processo de
resistência e de engajamento da intelectual presente nos
romances de Alina Paim, levando em conta sua atuação
no PCB e seu desejo de uma literatura voltada para o
social. Por ser uma intelectual de esquerda, Alina Paim
ficou à sombra de seus colegas intelectuais, merecendo
mais estudos para avaliarmos como ela conseguiu
resistir a uma censura partidária e se libertar da fórmula
imposta nos anos 1950 pelo PCB.
Com a filiação ao Partido Comunista Brasileiro
(PCB), na seção Rio de Janeiro, Alina Paim tornou-se
membro do Departamento Feminino do Comitê
Democrático Botafogo-Lagoa, em 1944; ela inicia uma
atuação intelectual engajada com as causas do partido.
Em 1947 ela foi eleita secretária da nova diretoria da
Associação Brasileira de Escritores (ABDE), para o
biênio seguinte. Nesse espaço de tempo outros
intelectuais integravam a diretoria, como Graciliano
Ramos, Astrojildo Pereira, Manuel Bandeira e
Orígenes Lessa. Uma representação do que foi A
ATUAÇÃO INTELECUAL DE ALINA PAIM,
nosso item 1.1
Além disso, ela foi representante nos congressos
da ABDE; em 1952 participou da Conferência
Interamericana pela Paz, em Montevidéu, atuando
como delegada da comissão; em janeiro de 1963
participou do Congresso de Mulheres, em Havana, com
a temática do progresso das mulheres na sociedade. Foi
à URSS e Tchecoslováquia em excursão com outros
intelectuais do PCB. Como percebemos, Alina Paim
esteve envolvida em diversas ações partidárias, que lhe
renderam divulgação de sua obra no Brasil e nos países
socialistas.
Pela perspectiva do realismo socialista, a literatura
engajada de Paim segue orientações de uma estética
didática que ensina valores da luta trabalhista e
revolucionária, por isso também traz preocupações em
torno do papel da intelectual em seus romances
escritos na década de 1950. Entre os teóricos que nos
ajudam a pensar essa questão, buscamos a perspectiva
de Jean Paul Sartre, a partir do ensaio “O que é
literatura?” (1947), no qual ele inicia dintinguindo os
tipos de escritores, dentre eles está o escritor engajado
e o puro. Considerando o engajado como aquele que
reconhece suas responsabilidades diante da sociedade
e utiliza a sua escrita, a sua obra como ferramenta,
como mecanismo para promover mudanças e
denunciar as injustiças. Enquanto o escritor puro é o
que se isola do mundo externo e busca somente a
expressão estética, sem preocupações políticas e
sociais.
Para Edward Said (2005), em “Representações do
Intelectual”, o papel do intelctual é de
comentar/envolver-se nas questões políticas de seu
tempo, assumindo um papel de liderança, isto é um
intelectual “orgânico”. Na concepção de Said, o
intelectual deve representar e articular uma mensagem
para o público, deve ser movido por ideais coerentes e
com seus valores, não pode ser atraído por governos
ou outros sistemas, deve estar preocupado com a
mudança social, confrontando e contestando a
autoridade e o poder político.
Considerando que a obra de Alina Paim vai
DO REALISMO SOCIAL À ESTÉTICA
SOCIALISTA, não podemos deixar de notar que o
compromisso da escritora com as questões políticas
deve ser relativizado para que sua literatura não fique
a mercê de uma ideologia. Sartre discute também essa
problemática ao defender o conceito de liberdade na
literatura, argumentando que o escritor é livre para
escolher o que escrever, mas ao mesmo tempo é
prisioneiro das circunstâncias históricas e culturais que
moldam sua visão de mundo. Sendo assim, a literatura
não apenas reflete a realidade, mas também a
interpreta e a transforma, oferecendo novas
perspectivas e possibilidades de compreensão do
contexto histórico onde a obra nasce.
De acordo com Gabriel Moura Silva, no fim dos
anos 1940 e durante a década seguinte, o PCB se
aproveitou da legalização do partido para divulgar
uma literatura de cunho panfletário, pois havia um
espaço político para divulgação do comunismo no
Brasil por meio das produções literárias, que se
inspiraram inicialmente no modelo da literatura
regionalista, pois “acreditavam na existência de uma
certa correspondência entre o modelo estético
soviético e os romances sociais brasileiros,
amplamente produzidos a partir de 1930” (2019, p.
96). Todavia, esse modelo estético não dava conta das
preocupações políticas que eram propostas pela
estética socialista, já que o problema social era muito
grave, era necessário transformá-los e um dos
caminhos era a revolução proletária.
Enquanto AS LUTAS DAS MULHERES NO
MODERNISMO BRASILEIRO, O texto literário,
principalmente escrito por mulheres, tem se mostrado
como um lugar promotor de profundas discussões
sobre assuntos relacionados aos diversos estratos
sociais, culturais, políticos e sobre a trajetória
intelectual da mulher. Acerca disso, Constância Lima
Duarte (2003), ao delinear o percurso dos textos
escritos por mulheres, investigou e identificou os
elementos, os recursos estéticos comuns entre as
escritoras e o movimento feminista, a fim de incluir na
historiografia da literatura brasileira as obras literárias
escritas por mulheres; assim evidenciamos que a
literatura das escritoras do século XX tem sido
produzida a partir de experiências pessoais, reflexões
sobre momentos históricos, questionamentos acerca da
ordem social, insatisfações pessoais.