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GOVERNO DO ESTADO DE MINAS GERAIS

SECRETARIA DE ESTADO DE SEGURANÇA PÚBLICA


SUBSECRETARIA DE ATENDIMENTO SOCIOEDUCATIVO
SUPERINTENDÊNCIA DE ATENDIMENTO AO ADOLESCENTE
DIRETORIA DE ABORDAGEM FAMILIAR E ARTICULAÇÃO DE REDE SOCIAL

METODOLOGIA DE
ARTICULAÇÃO DA REDE
E
GARANTIA DE DIREITOS

Belo Horizonte
2017
Governador do Estado de Minas Gerais
Fernando Damata Pimentel

Secretário de Estado de Defesa Social


Sérgio Barboza Menezes

Subsecretário de Atendimento às Medidas Socioeducativas


Danilo Emanuel de Oliveira Santos de Treminio Salas

Superintendente de Atendimento ao Adolescente


Giselle da Silva Cyrillo

Superintendente de Gestão Estratégica do Socioeducativo


Patrícia Costa de Mello

Diretora de Abordagem familiar e Articulação de Rede Social


Maria Aparecida Marques Vasconcelos

Diretora de Formação Educacional


Poliane Inácia da Silva de Sousa Figueiredo

Diretora de Formação Profissional


Wellington Brum Lima

Diretoria de Monitoramento Estratégico do Sistema Socioeducativo


Afonso Rodrigues Mariano Junior

Diretor de Gestão de Parceria


Juliana Ávila Teixeira

Diretoria de Gestão de Vagas e Atendimento Jurídico


Guilherme Rodrigues Oliveira

Diretoria de Gestão Operacional


Fagner Cristiano Rocha

Diretora de Orientação Socioeducativa


Beatriz Imaculada da Paz Sousa

Diretora de Atenção à Saúde


Flaviana Mara da Silva

Diretor de Segurança Socioeducativa


Fasani Lázaro Costa
Equipe de Elaboração

Cristiane Pereira Gabriel, Édina dos Santos Martins, Juliane Cristina Guimarães Silva,
Maria Aparecida Marques Vasconcelos, Marilene Evangelista Meira.
LISTA DE SIGLAS

CEAPA/MG - CENTRAL DE APOIO E ACOMPANHAMENTO ÀS PENAS E MEDIDAS


ALTERNATIVAS DE MINAS GERAIS
CNJ – CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA
CEDCA/MG - CONSELHO ESTADUAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO
ADOLESCENTE DE MINAS GERAIS
CMDCA - CONSELHO MUNICIPAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO
ADOLESCENTE
CODCA/MG – CENTRO DE APOIO OPERACIONAL DAS PROMOTORIAS DE
JUSTIÇA E DE DEFESA DOS DIREITOS DAS CRIANÇAS E DOS ADOLESCENTES
DO ESTADO DE MINAS GERAIS
CONANDA – CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO
ADOLESCENTE
CPC - CENTRO DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE
CRAS – CENTRO DE REFERÊNCIA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL
CREAS – CRENTRO DE REFERÊNCIA ESPECIALIZADO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL
DAF – DIRETORIA DE ABORDAGEM FAMILIAR E ARTICULAÇÃO DE REDE
SOCIAL
DOS – DIRETORIA DE ORIENTAÇÃO SOCIOEDUCATIVA
ECA – ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
GEPAR - GRUPO ESPECIALIZADO EM POLICIAMENTO DE ÁREAS DE RISCO
GIE - GRUPOS DE INTERVENÇÃO ESTRATÉGICA
LA – LIBERDADE ASSISTIDA
LOAS – LEI ORGÂNICA DA ASSISTÊNCIA SOCIAL
MSE – MEDIDA SOCIOEDUCATIVA
PIA – PLANO INDIVIDUAL DE ATENDIMENTO
PMC - PROGRAMA MEDIAÇÃO DE CONFLITOS
PNAS – POLÍTICA NACIONAL DE ASSISTÊNCIA SOCIAL
PPCAAM – PROGRAMA DE PROTEÇÃO À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE
AMEAÇADO DE MORTE
PRESP - PROGRAMA DE INCLUSÃO SOCIAL DE EGRESSOS DO SISTEMA
PRISIONAL
PSC – PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE
SAAD – SUPERINTENDÊNCIA DE ATENDIMENTO AO ADOLESCENTE
SAMRE – SETOR DE ACOMPANHAMENTO ÀS MEDIDAS RESTRITIVAS DE
LIBERDADE
SDH – SECRETARIA DE DIREITOS HUMANOS
SEFIA – SETOR DE FISCALIZAÇÃO E ACOMPANHAMENTO DAS MEDIDAS
SOCIOEDUCATIVAS
SESP – SECRETARIA DE ESTADO DE SEGURANÇA PÚBLICA
SGD – SISTEMA DE GARANTIA DE DIREITOS
SGES – SUPERINTENDÊNCIA DE GESTÃO ESTRATÉGICA DO SOCIOEDUCATIVO
SINASE – SISTEMA NACIONAL DE ATENDIMENTO SOCIOEDUCATIVO
SOFES – SETOR DE ORIENTAÇÃO E FISCALIZAÇÃO DE ENTIDADES
SUAS – SISTEMA ÚNICO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL
SUASE – SUBSECRETARIA DE ATENDIMENTO SOCIOEDUCATIVO
SUPEC - SUBSECRETARIA DE POLÍTICAS DE PREVENÇÃO SOCIAL À CRIMINALIDADE
VIIJ – VARA INFRACIONAL DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE
Sumário

1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 7
2 A DIRETORIA DE ABORDAGEM FAMILIAR E ARTICULAÇÃO DE REDE SOCIAL 9
3 ARTICULAÇÃO DE REDE ................................................................................................ 11
4 A REDE E O TRABALHO SOCIEDUCATIVO ................................................................. 16
4.1 A ASSISTÊNCIA SOCIAL E OS SERVIÇOS DE PROTEÇÃO SOCIAL .................................................. 20

4.1.1 Proteção Social Básica .................................................................................................. 21

4.1.2 Proteção Social Especial ............................................................................................... 23

4.2 O SISTEMA DE GARANTIA DE DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE ............................... 26

4.2.1 CONSELHO TUTELAR .............................................................................................. 28

4.3 PARTICIPAÇÃO DA FAMÍLIA NA ARTICULAÇÃO DA REDE SOCIAL DO ADOLESCENTE ................ 29

4.3.1 ARTICULAÇÃO DE REDE PARA ADOLESCENTES SEM CONTATO FAMILIAR


................................................................................................................................................ 31

4.3.1.1 Orientações gerais para o fluxo – Adolescentes sem contato familiar ....................... 33

4.3.1.2 Orientações no caso de adolescentes que fizeram contato familiar, mas que essas não
exercem função protetiva. ...................................................................................................... 35

4.3.1.3 Orientação no caso de falta de referência familiar e/ou impossibilidade de retorno ao


convívio familiar .................................................................................................................... 35

4.3.1.4 Fluxo para Acionamento da Rede Social nos casos de adolescente sem contato
familiar ................................................................................................................................... 36

5 PROGRAMAS COMPLEMENTARES DA REDE DE ATENDIMENTO AO


ADOLESCENTE ..................................................................................................................... 38
5.1 PROGRAMA ESTADUAL DE ACOMPANHAMENTO AO ADOLESCENTE DESLIGADO DAS MEDIDAS
SOCIOEDUCATIVAS DE INTERNAÇÃO OU SEMILIBERDADE EM MINAS GERAIS – SE LIGA ............... 38

5.2 PROGRAMA DE PROTEÇÃO A CRIANÇAS E ADOLESCENTES AMEAÇADOS DE MORTE (PPCAAM)


.......................................................................................................................................................... 39

5.3 – PROGRAMAS DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE ................................................................... 41

5.3.1 - PROGRAMA MEDIAÇÃO DE CONFLITOS ..................................................................... 42

5.3.2 - PROGRAMA FICA VIVO ................................................................................................ 43

5.3.3 CEAPA.......................................................................................................................... 44
5.3.4 PRESP........................................................................................................................... 45

6 ARTICULAÇÃO DE REDE NAS DIVERSAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS ......... 45


6.1 ARTICULAÇÃO DE REDE DURANTE A INTERNAÇÃO PROVISÓRIA .............................................. 46

6.2 ARTICULAÇÃO DE REDE NA MSE DE INTERNAÇÃO-SANÇÃO ...................................................... 49

6.3 ARTICULAÇÃO DA REDE NA MSE DE SEMILIBERDADE ............................................................... 52

6.4 ARTICULAÇÃO DE REDE NA MSE DE INTERNAÇÃO ................................................................... 57

7 REFERÊNCIAS .................................................................................................................... 63
8 ANEXOS ............................................................................................................................... 65
1 INTRODUÇÃO

Para construção da Metodologia de Articulação da Rede e Garantia de Direitos, observaram-


se os princípios legais que normatizam o cumprimento das Medidas Socioeducativas, de maneira
que o presente documento apresenta orientações gerais para que as equipes das Casas de
Semiliberdade e dos Centros Socioeducativos de Internação Provisória e de Internação possam
pautar suas ações, no que diz respeito à articulação da rede e à garantia de direitos para
encaminhamento qualificado tanto do adolescente como de seus familiares.
Neste sentido, a metodologia aborda, primeiramente, “A Diretoria de Abordagem Familiar e
Articulação de Rede Social”, diretoria esta, que é responsável pela orientação em âmbito estadual
das equipes socioeducativas, no que tange ao atendimento à família e às ações de articulação com
os atores da rede social e do sistema de garantia de direitos. Recupera-se, brevemente, o contexto da
criação da diretoria, bem como apresenta sua competência e suas atribuições, de modo a esclarecer,
minimamente, o lugar que esta ocupa na Subsecretaria de Atendimento Socioeducativo.
No capítulo “Articulação de Rede”, delimita-se qual “rede” é o foco de discussão desta
metodologia, pontuando-se que a rede de atendimento ao adolescente não se limita aos
equipamentos da política de Assistência Social e aos órgãos do Sistema de Garantia de Direitos,
mas que esses são, para este documento, os mais importantes a serem discutidos. Apresenta-se,
suscintamente, a Política de Assistência Social e os Serviços de Proteção Social, destacando-se sua
hierarquização em níveis de complexidade e especificando-se os equipamentos responsáveis pela
prestação dos serviços de Proteção Social Básica e pela Proteção Social Especial de Média e Alta
Complexidade.
No tópico seguinte, intitulado “A Rede e o Trabalho Socioeducativo” são apresentadas
observações gerais sobre o processo de articulação da rede no contexto das medidas
socioeducativas, passando-se por aspectos que são comuns tanto entre à Medida Socioeducativa de
Semiliberdade como à MSE de Internação e que, portanto, devem ser pautadas no trabalho de
ambas as equipes socioeducativas.
Na sequência, apresenta-se o Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente, e
no rol de instituições responsáveis por zelar os direitos, o Conselho Tutelar e a Família. No que diz
respeito à família, trata-se da sua participação no processo de articulação da rede social, destacando-
se a importância de que ela pontue o que já acessou, participe da discussão dos encaminhamentos e
seja orientada quanto aos meios de acessar os serviços, de forma que o processo de

7
encaminhamento à rede implique, necessariamente, na responsabilidade das equipes em
acioná-la, mas também, no compromisso de orientar a família.
Reconhece-se a importância da família para o acompanhamento da medida
socioeducativa (MSE) aplicada ao adolescente, tratando-se, na sequência, da articulação da
rede nos casos em que o socioeducando(a) se encontra sem contato familiar. Destaca-se, neste
caso, que a rede é acionada como colaboradora no processo de localização e sensibilização da
família. Pontua-se a necessidade de que as unidades sejam capazes de apresentar seu trabalho
para os atores da rede, para então colocá-los em busca da família, de forma que a rede
compreenda a importância da ação a ser desenvolvida.
Posteriormente, apresenta-se os programas que complementam a rede de atendimento
ao adolescente, sendo eles: o Programa de Atendimento aos adolescentes egressos das
medidas de semiliberdade e internação (Se Liga) e o Programa de Proteção à Criança e ao
Adolescente Ameaçado de Morte (PPCAAM).
No quinto e último capítulo, que recebeu o nome de “A Articulação de Rede nas
Diversas Medidas Socioeducativas”, são tratadas as ações de articulação da rede com base nas
especificidades de cada uma das medidas socioeducativas, de forma que o tópico possui
quatro subseções: “Articulação de Rede na Internação Provisória”, “Articulação de Rede na
Internação Sanção”, “Articulação de Rede na MSE de Semiliberdade”, e, “Articulação de
Rede na MSE de Internação”. Em cada subseção, são explicitadas as peculiaridades do
atendimento socioeducativo e os objetivos da articulação da rede.
Durante o processo de construção da presente metodologia, a DAF pode contar com a
realização de pesquisa de campo, realizada por estudante da Fundação João Pinheiro, na qual
os diretores de atendimento dos Centros Socioeducativos de Internação Provisória e
Internação, os diretores gerais das Casas de Semiliberdade e representantes das equipes
técnicas, foram convidados a externar suas percepções acerca do trabalho em rede,
enfatizando as expectativas em relação à nova metodologia. Tal pesquisa utilizou como
amostra as unidades de Belo Horizonte e da região metropolitana (Sete Lagoas e Ribeirão das
Neves), de modo que, mesmo não sendo possível abranger todas as unidades socioeducativas
do Estado, acredita-se que as questões levantadas sejam pertinentes à política de atendimento
ao adolescente em cumprimento de MSE privativas de liberdade, de modo que a metodologia
oriente sobre os aspectos mais problematizados. Espera-se que a Metodologia de Articulação
da Rede e Garantia de Direitos possa, de fato, contribuir e enriquecer o trabalho realizado

8
pelas equipes, resultando em ações eficientes e em acesso qualificado do adolescente e seus
familiares aos serviços da rede.

2 A DIRETORIA DE ABORDAGEM FAMILIAR E ARTICULAÇÃO DE REDE


SOCIAL

O trabalho em rede é uma das premissas da prática socioeducativa, prevista nas


legislações e na Política de Atendimento Socioeducativo da SUASE. Trabalhar em rede
significa orientar-se a partir de uma lógica sistêmica e multidisciplinar. É construir para o
cidadão um horizonte interventivo onde a garantia de direitos se dê a partir do acesso a
diferentes políticas. É neste cenário, que nasce a Diretoria de Abordagem Familiar e
Articulação de Rede Social (DAF).
Criada a partir do Decreto 47.088/2016, a DAF está organicamente vinculada à
Superintendência de Atendimento ao Adolescente (SAAD), que juntamente à
Superintendência de Gestão Estratégica do Sistema Socioeducativo (SGES) compõem a
Subsecretaria de Atendimento Socioeducativo1 (SUASE), uma das subsecretarias da SESP. O
texto do referido decreto define:

[...] Art. 59 – A Diretoria de Abordagem Familiar e Articulação de Rede Social tem


como competência planejar e supervisionar a metodologia de inclusão e integração
da família no atendimento ao adolescente em cumprimento de internação provisória
e de medida socioeducativa de internação, internação-sanção e semiliberdade,
coordenar a política dos egressos do sistema estadual de atendimento
socioeducativo, bem como promover uma efetiva articulação com a rede de
atendimento social público e comunitário [...] (MINAS GERAIS, 2016)

O decreto expõe o papel articulador da DAF, de forma a viabilizar que os adolescentes


em cumprimento de medida socioeducativa restritiva ou privativa de liberdade e seus
familiares tenham acesso aos equipamentos e serviços da rede. Neste sentido, os incisos do
Art. 59 do decreto 47.088 estabelecem as atribuições da diretoria, sendo elas:

I – articular, em âmbito técnico, programas e projetos com entidades públicas e


privadas, com o objetivo de contribuir para a política de atendimento ao adolescente;
II – proporcionar ao adolescente, após o cumprimento da medida socioeducativa,
ações que contribuam com a sua promoção social no que se refere a
profissionalização, educação, saúde, trabalho e renda, bem como o fortalecimento de
vínculos familiares e comunitários;
III – promover e orientar ações de inclusão e integração das famílias dos
adolescentes em programas e serviços de proteção social básica e especial, inclusive

1
O organograma da Subsecretaria de Atendimento Socioeducativo pode ser consultado no Anexo 1 desta
Metodologia.
9
aqueles oriundos de outros municípios, de modo que a família seja coparticipante do
processo pedagógico desenvolvido no programa de atendimento socioeducativo;
IV – promover e orientar ações de atendimento às famílias dos adolescentes
estruturadas em conceitos e métodos que assegurem o acesso às políticas públicas
aos integrantes do núcleo familiar;
V – elaborar, coordenar, orientar e acompanhar a implementação da metodologia de
articulação, em âmbito técnico, da rede de atendimento social público e comunitário
para encontrar soluções e encaminhamentos das necessidades dos adolescentes e
seus familiares;
VI – promover aos adolescentes o pleno acesso ao exercício da cidadania. (MINAS
GERAIS, 2016)

Diante da competência e das atribuições estabelecidas para a DAF, a diretoria tem


como perspectiva a atuação junto às equipes técnicas das unidades socioeducativas com o
objetivo de fomentar a articulação constante das redes disponíveis nos municípios de origem
dos adolescentes, tendo em vista o princípio da incompletude institucional. Faz-se necessário
considerar o trabalho em rede, como parte de uma teia que viabilize, além da garantia de
direitos, o fortalecimento dos vínculos sociais, a partir de ações que fomentem o acesso à
cidade. É desta teia que surgem possibilidades de uma inserção qualificada do(a) adolescente
e de sua família, considerando as particularidades que tornam cada demanda única.
O processo de articulação da rede é uma prática que se faz rotina nas unidades
socioeducativas. As equipes técnicas desenvolvem, frequentemente, a ação de diagnosticar,
mapear e articular a rede para que ela atenda as demandas do adolescente e de sua família. Há
momentos em que o processo de construção da rede pode passar por impasses, de modo que a
atuação do técnico encontre limites, não sendo possível alcançar os resultados almejados.
Nestes casos, é importante que as equipes reportem a situação para a Diretoria de Abordagem
Familiar e Articulação de Rede Social, para que a mesma possa atuar no caso, não como
substituta da atuação da unidade, mas desenvolvendo ações em caráter complementar,
principalmente quando for necessária a realização de articulação institucional com os níveis
gerenciais dos serviços da rede.
Ao acionar a DAF, os casos e situações relacionados ao trabalho em rede podem ser
transmitidos através de relatórios e estudos de caso, de modo que a entrada da diretoria seja
produto de uma construção com o corpo técnico, considerando as intervenções realizadas. O
diálogo entre DAF e equipes técnicas é uma ferramenta que permite aproximar a orientação
metodológica da prática e materializar a atuação da diretoria através das demandas que lhe
são endereçadas. Não existe uma atuação institucional eficaz, a partir de práticas isoladas,
sem que os operadores da política dialoguem e trabalhem em conjunto.

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Como instrumentos orientadores para o trabalho das equipes socioeducativas, a DAF
teve a incumbência de produzir a presente metodologia, bem como a Metodologia de
Atendimento à Família, e ainda, formulou o Catálogo de Rede, que sistematiza as
informações acerca dos principais serviços e equipamentos que compõem a rede estadual de
atendimento social, partindo do mapeamento das próprias unidades socioeducativas e
complementando com outras informações pertinentes.
Espera-se que o processo de trabalho com as famílias e a rede possam se tornar
organizados e dinâmicos, nos permitindo rever e construir fluxos e modos de trabalho, não
abstendo da premissa do caso a caso. É possível construir política por meio de um caso, de
uma situação ou mesmo de uma inquietação cotidiana. O trabalho em rede nos ensina isto!

3 ARTICULAÇÃO DE REDE

Os termos “rede” e “articulação de rede” são amplos e genericamente utilizados em


diversos contextos para sustentar discussões variadas. Ao discutir-se a “articulação de rede”
no contexto das Medidas Socioeducativas privativas de liberdade, faz-se necessária a
especificação acerca da “rede” sobre a qual se fala. Neste caso, consideramos “rede social”
como sendo o termo que comporta os serviços, programas e projetos ligados à Política de
Assistência Social, as instituições ligadas ao Sistema de Garantia de Direitos e outras de
caráter civil e que possam prestar serviços pertinentes aos adolescentes e seus familiares.
Destaca-se que, durante o cumprimento de uma MSE, outras redes precisam ser acionadas,
tais como as redes de saúde e de educação, entretanto, o foco desta metodologia é orientar o
processo de articulação da rede social.
No que se refere a “Articulação de Rede” essa metodologia tomou como conceitos
norteadores os seguintes documentos: “Orientações Técnicas: Centro de Referência
Especializado de Assistência Social” e “Orientações Técnicas Centro de Referência de
Assistência Social – CRAS”, que orientam o trabalho dos referidos equipamentos em âmbito
nacional e que nos auxiliam a construir a perspectiva de articulação que devemos adotar no
desenvolver do trabalho socioeducativo. Em tais documentos consta que:

A articulação é o processo pelo qual se cria e mantém conexões entre diferentes


organizações, a partir da compreensão do seu funcionamento, dinâmicas e papel
desempenhado, de modo a coordenar interesses distintos e fortalecer os que são
comuns. (BRASIL, 2009, p.20)

A articulação na rede socioassistencial se traduz por meio de conexões entre as


Unidades do SUAS [...], de forma complementar e continuada [...] com vistas ao

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atendimento integrado, evitando a fragmentação e/ou a sobreposição das ações.
(BRASIL, 2011, p.63)

O trabalho de articulação da rede deve primar por uma conexão que envolve: a
formação dos atores da rede, o alinhamento entre os serviços e a interação constante entre os
diversos parceiros. Outra premissa norteadora da atuação em rede nas MSE está no princípio
da incompletude institucional.

A execução da política de atendimento pressupõe e requer uma articulação orgânica


e permanente com todas as demais políticas e com o sistema de administração de
justiça. É o que chamamos de incompletude institucional das ações desenvolvidas
nessa área por um conjunto de instituições distribuído pelas mais diversas áreas do
Estado brasileiro nos níveis federal, estadual, municipal e também pelas
organizações da sociedade civil que atuam nesse campo. (COSTA, 2011)

Atuar orientado pelo princípio da incompletude institucional significa construir redes,


firmar parcerias, apostar em relações articuladas entre pessoas e grupos, e compreender, além
disto, que estas ações são capazes de promover uma intervenção mais cooperativa e
agregadora, permitindo uma visão ampliada e a atuação mais efetiva sobre a realidade,
contribuindo para a construção de uma teia de novos sentidos para a ação coletiva.
Neste sentido, Murillo Digiácomo pontua que o trabalho em rede não se realiza sem
integração, de modo que

Apenas através da atuação coordenada, articulada e integrada destes diversos órgãos,


autoridades e entidades governamentais e não governamentais, é que se poderá tirar
o máximo proveito das potencialidades de cada um, fazendo com que os problemas
detectados - tanto no plano individual quanto coletivo - recebam o devido
atendimento interinstitucional e interdisciplinar, sem que isto importe quer numa
superposição de ações isoladas, desconexas e ineficazes, quer numa pura e simples
transferência de responsabilidade (o popular “jogo-de-empurra”), como não raro se
vê acontecer. (DIGIÁCOMO, 2017)

Logo, tem-se a articulação de parcerias como um dos pontos centrais, visto que as
instituições socioeducativas não podem se fechar em si mesmas, já que a lógica da
incompletude institucional nos aponta que o trabalho durante o cumprimento da medida passa
por vários atores. Dessa maneira, a articulação em rede deve ser pensada como dispositivo de
intervenção no posicionamento do adolescente diante da prática infracional. Prevê, tanto uma
postura compatível com a doutrina da proteção integral (ao possibilitarmos aos adolescentes o
acesso aos mais diversos direitos em sociedade) quanto a aposta no enlace do adolescente
com outros atores na cidade. Podemos vislumbrar, na articulação em rede, duas dimensões de
trabalho: a institucional e a subjetiva.

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No âmbito institucional, a DAF possui lugar estratégico, mas é necessário que cada
unidade socioeducativa posicione-se como um ponto na rede. Para tanto, torna-se essencial
conhecer os parceiros e estabelecer fluxos com as parcerias, de modo a estreitar a relação
entre as instituições para otimizar o fluxo de atendimento aos adolescentes. Em um primeiro
momento, as parcerias necessárias para o cumprimento dos eixos da medida socioeducativa,
bem como os dispositivos de garantia de demais direitos, devem ser delimitadas. Entendem-se
como parcerias todos os serviços, parceiros e colaboradores que, formal ou informalmente,
influenciam e participam do cumprimento da medida socioeducativa. Como exemplo,
podemos citar a rede de assistência social, entre outros.
Outro ponto que deve ser considerado na articulação com os serviços da rede é o
cuidado que a equipe socioeducativa precisa manter em relação às informações repassadas aos
parceiros. Não se trata de omitir informações, mas de transmiti-las a partir de pareceres
técnicos cautelosos, que possibilitem o entendimento do caso e a construção de
encaminhamentos, sem expor os adolescentes e suas referências familiares, dado o caráter
sigiloso da justiça da infância e da juventude.
Diante da delimitação das parcerias, a unidade socioeducativa deve sistematizar uma
série de informações que são cruciais para a relação desses atores. Tal sistematização, vamos
denominar de Mapeamento. Mapear as parcerias tem o intuito de compreender as articulações
estabelecidas pelas unidades com os diversos serviços e entidades da cidade. Um mapeamento
de parcerias envolve: nome do parceiro, área de atuação, público-alvo, breve descrição da
metodologia de atendimento (o que oferece, como oferece, formas de acesso). Esta
sistematização de informações requer uma organização da unidade, tanto para sua elaboração
quanto para constantes atualizações.
Mapear a rede de parceiros, serviços e colaboradores articulados formal e
informalmente, pela medida socioeducativa, nos auxilia a compreender os pontos de alcance e
impasse na articulação de parcerias; a compreender como estes fatores influenciam e
interferem no atendimento e cumprimento de medida dos adolescentes e a reconhecer
aspectos que demandam articulação e formalização de parcerias pelos gestores.
De modo geral, o mapeamento institui as parcerias, ou seja, é um trabalho de
construção de um laço institucional da unidade socioeducativa com cada ponto da rede,
despersonalizando os avanços da unidade – servindo de base para articulação da instituição,
de modo que o sucesso das articulações passa a independer de quem as efetivam, pois a
relação estabelecida com os atores foi construída de instituição para instituição, e não de uma

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pessoa para outra. Em outro aspecto, o mapeamento nos convoca a saber mais sobre o papel
dos parceiros e o seu modo de atuação, ilustrando de fato onde devemos avançar ou aprimorar
a articulação, pelas lacunas que eventualmente surgem.
Cabe ressaltar que a Diretoria de Abordagem Familiar e Articulação de Rede Social
tem a função de contribuir no mapeamento no que cabe aos aspectos que demandem
articulação e formalização de parcerias entre os gestores da unidade socioeducativa. Ressalta-
se que esta configuração não exclui a participação técnica no processo, no entanto, é
importante salientar a responsabilidade da DAF no que diz respeito ao diálogo com a rede de
atendimento socioassistencial, bem como a atribuição do diretor de atendimento de
“promover e organizar articulações de parcerias para qualificação do atendimento ao
adolescente” e do diretor geral de “articular e representar institucionalmente a unidade nos
espaços políticos, institucionais, entre outras” (SUASE, 2014).
A articulação com os parceiros deve visar à consistência das conexões pretendidas.
Não se trata apenas de encaminhar o adolescente, mas de vislumbrar o seu aproveitamento
neste encaminhamento. Assim, ambos os parceiros devem se debruçar sobre essa questão,
despertados pela iniciativa das unidades socioeducativas. Precisamos lançar mão do diálogo,
eventualmente da flexibilização de critérios, visando à ampliação das possibilidades com o
parceiro e um impacto destas conexões sobre o processo de cumprimento de medida dos
adolescentes.
A lógica dos encaminhamentos deve sempre se pautar no fluxo de referência e
contrarreferência, o que estabelece um trabalho conjunto e contínuo com os atores. Portanto,
um ponto de extrema importância nesta relação é o cuidado com as parcerias, o qual envolve,
desde a articulação para inserção do adolescente e de sua família na rede, o acompanhamento
dos efeitos e dos possíveis impasses, tanto para a inserção, quanto para continuidade no
serviço durante a medida socioeducativa, até a preparação do desligamento do adolescente da
MSE. Processos estes que perpassam, naturalmente, os resultados da articulação no
cumprimento da medida. E é neste ponto que incide a dimensão subjetiva da articulação com
a rede.
A articulação da rede deve levar em consideração o sujeito ao qual deverá atender, e a
construção de intervenções deve considerar a sua história e a trajetória até chegar a MSE. Nas
medidas socioeducativas de semiliberdade e internação a construção do Plano Individual de
Atendimento (PIA), permite que o adolescente e a família apresentem o seu percurso na
cidade através do levantamento dos equipamentos e serviços por onde passaram. Neste

14
sentido, o instrumento nos possibilita identificar a compreensão que cada indivíduo possui
dos seus direitos e deveres, bem como a sua capacidade de buscar auxílios que poderão
intervir em sua condição.
A dimensão subjetiva da articulação de rede é o que permite que o adolescente seja
protagonista das ações e não apenas o objeto da intervenção. É importante tomar a prática do
estudo de caso como um espaço de discussão que envolve, avaliação e construção de cada
articulação realizada, o que convoca cada ator envolvido a medir se a inserção do adolescente
no fluxo das conexões construídas e sustentadas pelas medidas possibilita, de fato, que este se
reconheça no uso dos aparatos sociais, proporcionando a formação de vínculo com demais
equipamentos sociais e o exercício da cidadania. Considerando recursos metodológicos como
os atendimentos, o PIA, os estudos de caso e a construção técnica do caso, aliado ao caráter
subjetivo do trabalho em rede, concluímos que a rede social deve ser pensada para cada
adolescente e com cada um deles.
Uma rede comporta os enlaçamentos do adolescente com a cidade, parentes, amigos e
instituições. Cada sujeito imprime na sua rede uma dinâmica que lhe é própria, devendo ser
levada em consideração no momento de trilhar com o adolescente seu caminho pelos
territórios construídos e reconstruídos na medida socioeducativa. Na prática, precisamos
pensar o que é possível introduzir nesses fluxos para que o adolescente participe e adquira
certa experiência, manejo e desenvoltura na rede. O técnico oferece o serviço, mas será que é
possível de algum modo que alguns pontos do fluxo sejam articulados pelos adolescentes e/ou
família? Esta é uma pergunta que não pode se ausentar do trabalho de articulação em rede.
Faz-se necessário que as unidades socioeducativas se percebam não apenas como
“articuladores da rede”, mas também e, principalmente, como facilitadores do acesso do
adolescente e seus familiares aos serviços que compõem a rede, de modo que, uma vez
finalizada a medida, o adolescente e sua família tenham estabelecido vínculos suficientemente
autônomos com a rede, de maneira que o acesso aos serviços não seja interrompido.
Vale ressaltar que a formação de rede é um processo dinâmico, acontecendo a todo
instante, na composição e decomposição de novos territórios. Logo, é um trabalho que não
tem início, meio e fim, mas é contínuo e exige da unidade, a cada caso, novas articulações.
É importante chamar a atenção para a importância do registro das informações em
relação às ações de articulação. Tal prática deve ser parte da rotina das equipes, de modo que
na ausência do profissional que realizou as articulações ou mesmo na hipótese de
transferência do adolescente de uma unidade para outra, os avanços alcançados no trabalho

15
com a rede não se percam, que os encaminhamentos não sejam interrompidos e as relações
com a rede não sejam descontinuadas.

4 A REDE E O TRABALHO SOCIEDUCATIVO

Na perspectiva de Marília Nogueira Neves (2009), as redes podem “[...] ser


consideradas como sistemas organizacionais capazes de reunir indivíduos e instituições, de
forma democrática e participativa, em torno de objetivos ou realizações comuns.” (NEVES,
2009, p.149). Sendo assim, a ideia de “rede” pressupõe a união de diversos atores em uma
relação horizontal, de modo que cada participante envolvido se comunica com os demais de
forma contínua e não hierarquizada. Disso advém que na estruturação de uma “rede” não
existe saber soberano em relação aos demais, sendo que cada um dos atores possui seu saber e
contribui para o alcance dos objetivos a partir de sua perspectiva, pontuando e atuando sobre
aquilo que lhe é específico. Os atores envolvidos no trabalho em rede devem ter a clareza de
qual é o objetivo a ser alcançado e, desta forma, atuar de maneira cooperativa para que isso
seja possível.
Tecer a “rede” no contexto do trabalho socioeducativo e, especificamente, das medidas
privativas de liberdade, trata-se de oportunizar o estabelecimento de uma relação entre atores
diversos (instituições, serviços, pessoas) que deverão pensar e trabalhar em parceria com o
objetivo de construir possibilidades para o acompanhamento do adolescente e de sua família.
Não se pode ignorar o fato de que o público atendido pelas medidas socioeducativas
possui, em sua maioria, um histórico de violação de direitos, conforme demonstrado pelo
perfil do adolescente apresentado pelo SINASE (2007, p.29). Entretanto, ao se pensar no
trabalho em rede, há que se considerar a individualidade do sujeito atendido e suas
peculiaridades. É importante ressaltar que a “rede” a ser acionada deve ser pensada de forma
individualizada para cada adolescente, considerando que cada sujeito circula pelos
equipamentos sociais e pelos diversos territórios de uma forma particular, de modo que a
trajetória que constrói lhe é peculiar. Diante disso, pode-se assegurar que não é possível a
construção de uma rede única e genérica que atenda a todos os adolescentes.
Ademais, não se pode deixar de reconhecer que o adolescente em cumprimento das
MSE privativas de liberdade, bem como seus familiares, são sujeitos de direitos como
quaisquer outros. A despeito de sua vinculação à prática infracional e de sua situação jurídica,
o trabalho realizado nas unidades socioeducativas não pode prescindir da garantia dos direitos

16
assegurados na legislação pertinente à criança e ao adolescente e nas demais leis destinadas à
sociedade em geral.
Diante disso, o trabalho de acionar e articular a “rede” deve ter por objetivo maior a
criação de estratégias que possam viabilizar e garantir aos adolescentes e seus familiares o
acesso aos serviços, programas e projetos que possibilitem sua inserção qualificada nas
políticas públicas. Ao finalizar a MSE, espera-se que o adolescente possa dar continuidade à
sua vida com autonomia, acesso a oportunidades diversas das que teve até ser judicialmente
restrito ou privado de liberdade e tendo reais possibilidades de fazer escolhas que viabilizem
sua desvinculação da dinâmica infracional. Espera-se, ainda, que o trabalho em rede possa ter
evoluído o bastante para que a família esteja suficientemente fortalecida para apoiar o
adolescente neste processo.
Na prática, o trabalho em rede no contexto socioeducativo é um grande desafio para as
instituições executoras das medidas, pois não raras são as vezes em que o público alvo do
trabalho, o adolescente autor de ato infracional, sofre os efeitos decorrentes da própria prática
que lhe acarretou a aplicação da medida socioeducativa, sendo “mal visto” e “indesejado”
pela sociedade em geral e, às vezes, pelos próprios representantes das políticas públicas.
Entretanto, o SINASE tem como um dos princípios norteadores da execução das MSE
privativas de liberdade a Incompletude Institucional, que pressupõe exatamente que as
unidades socioeducativas façam o movimento de construir a inclusão ou a reinserção social
dos adolescentes “para além dos muros”, promovendo o acesso desses aos serviços prestados
pelas diversas políticas públicas fora do ambiente e do espaço físico das instituições. Neste
sentido, o SINASE, pontua que:
A operacionalização da formação da rede integrada de atendimento é tarefa essencial
para a efetivação das garantias dos direitos dos adolescentes em cumprimento de
medidas socioeducativas, contribuindo efetivamente no processo de inclusão social
do público atendido. (SINASE, 2007, p. 31)

Diante disso, está posto o papel articulador e mediador das unidades socioeducativas,
que no desenvolver do seu trabalho terão a incumbência de identificar, reunir, sensibilizar e
agregar as instituições representantes das diversas políticas setoriais que possam compor a
rede de atendimento ao adolescente. Conforme as orientações técnicas para os CRAS, uma
articulação intersetorial:

“[...] se refere à articulação entre setores e saberes, para responder, de forma


integrada, a um objetivo comum. [...] se materializa mediante a criação de espaços
de comunicação, do aumento da capacidade de negociação e da disponibilidade em
se trabalhar com conflitos.” (BRASIL, 2011, p.26)

17
Neste ponto reside um desafio fundamental para as unidades socioeducativas, pois via
de regra, os adolescentes atendidos pelas MSE são sujeitos que possuem em sua trajetória de
vida o “desenlace” com as políticas públicas como uma constante. Desta maneira, quando não
estiveram totalmente excluídos do acesso aos serviços, programas e projetos sociais, eles
possuem uma passagem precária por esses, marcada por vínculos extremamente fragilizados,
o que, frequentemente, se reproduz na relação de seus familiares com os equipamentos da
rede.
Diante de tal situação, sendo as unidades socioeducativas um dos “nós” que compõe a
rede de atendimento ao adolescente em cumprimento de medida, tais instituições têm por
responsabilidade a busca pela construção e manutenção de espaços e de formas de
comunicação com os atores da rede. O objetivo é que suas ações possam ser coordenadas e
tenham um efeito construtivo para o adolescente e seus familiares, durante e após o
cumprimento da medida, reconhecendo e destacando a importância da continuidade do
atendimento após a finalização da medida socioeducativa.
Deve-se primar pelo cuidado com os atores que compõem a rede de atendimento ao
adolescente, de modo que serviços, instituições e indivíduos que tem a responsabilidade de
colaborar com o desenvolvimento do trabalho sejam tratados de forma adequada, garantindo-
se a participação democrática e horizontalizada nos espaços de discussão. Na construção
coletiva é essencial assegurar o respeito às abordagens e perspectivas diferentes, sem, no
entanto, preterir o objetivo maior do trabalho em rede que é a garantia de direitos ao
adolescente pela sua inclusão qualificada nas políticas públicas pertinentes ao caso.
O trabalho cuidadoso em relação aos parceiros da rede precisa ser realizado
permanentemente, pois toda rede está sujeita a conflitos e pontos de negação e de
inflexibilidade, tendo em vista que a experiência nos mostra que a trajetória infracional do
adolescente pode romper ou fragilizar seus laços com a rede social. Diante desse impasse
reside a importância das articulações institucionais com a participação da direção das
unidades e do núcleo gerencial da SUASE, por meio da Diretoria de Abordagem Familiar e
Articulação da Rede Social. Ademais, deve-se pensar na formação continuada da rede, de
modo que, para além das discussões de caso, haja momentos em que os parceiros se reúnam
para trabalhar a qualificação de todos os atores da rede, promovendo espaços para troca de
experiências e para a transmissão de conhecimento acerca dos serviços, de forma que a equipe
socioeducativa apresente o trabalho da unidade aos parceiros e os parceiros apresentem seu
trabalho à unidade.

18
Para potencializar os efeitos dessa articulação é necessário que seja estabelecido um
fluxograma para subsidiar o relacionamento entre os serviços, e esse deve funcionar
de maneira a criar diversas estratégias, entre elas, reuniões, capacitações, eventos,
palestras, fóruns, enfim qualquer instrumento que exija integração entre as equipes
que atuam na rede. (BRASIL, 2011, p.63)

É importante, ainda, destacar que a rede possui caráter dinâmico e flexível, de modo
que no decorrer do trabalho, considerando os avanços e os limites das ações e dos
encaminhamentos realizados, podem ocorrer transformações na rede. A inserção de novos
atores colabora na atuação sobre aspectos que não tinham sido observados inicialmente, ou
que já vinham sendo trabalhados, mas não avançaram o bastante, demonstrando a necessidade
de ser aprimorados. Para tanto, avaliar o trabalho em rede deve ser uma prática periódica que,
assim como a construção de encaminhamentos, envolve a participação de todos os atores.
Em relação ao acionamento dos equipamentos da rede socioassistencial, este pode
ocorrer de formas diversas, dependendo das peculiaridades e do andamento do caso. Contatos
telefônicos, contatos virtuais (via e-mail), estudos de caso, visitas técnicas institucionais2,
entre outras, são formas de que a unidade socioeducativa pode se utilizar para conversar com
os serviços. Entretanto, importa destacar que à medida que o acompanhamento do adolescente
evolui, as articulações tendem a ser intensificadas e os contatos tendem a ocorrer de forma
mais direta, de maneira que os contatos telefônicos e virtuais devem se tornar meios para a
articulação de espaços de discussões, tais como visitas institucionais, reuniões e estudos
realizados presencialmente, essenciais para o fortalecimento da parceria estabelecida.
Pensando-se no cuidado e na valorização dos parceiros, orienta-se que, sempre que for
possível, as reuniões e estudos com os equipamentos sejam realizadas nas sedes dos serviços
e que a unidade socioeducativa se organize para comparecer ao local com pontualidade.
Quando não for possível os encontros no território, é importante considerar a disponibilidade
de recursos e de deslocamento do parceiro, para que a demanda da unidade socioeducativa
não comprometa o funcionamento do serviço.
Para avançarmos na discussão da “Articulação da rede” se faz necessária a
contextualização dos serviços que perpassam a rede de atendimento ao adolescente. A seguir,
trazemos a descrição de serviços de proteção social disponíveis no Sistema Único de
Assistência Social, aqueles que compõem o Sistema de Garantia de Direitos, bem como
outros que também podem ser convidados a compor a rede, nos casos em que assim for
necessário.

2
As visitas técnicas institucionais devem ser registradas no Formulário de Visita à Rede que encontra-se no
Anexo 2 desta metodologia
19
4.1 A ASSISTÊNCIA SOCIAL E OS SERVIÇOS DE PROTEÇÃO SOCIAL

A Constituição Federal de 1988 deu status de direito garantido a diversas ações que até
então eram executadas no Brasil na perspectiva das benesses e da caridade. Dentre tais ações,
a Carta Magna prevê a Assistência Social como direito da população que dela necessita e
como dever do Estado, de modo que nos artigos 203 e 204 estão postas as definições do
público-alvo, os objetivos, as diretrizes, os princípios e as ações que tal política abarca. Em
1993 foi publicada a Lei 8.742, a Lei Orgânica da Assistência Social que foi alterada
posteriormente pela Lei 12.435 de 2011. A LOAS, como ficou conhecida a Lei 8.742/93,
regulamenta e detalha a forma de organização da Política de Assistência Social. Destaca-se,
dentre outros aspectos, que a LOAS pontua o caráter não contributivo da política e a
necessidade de que haja a sua integração com as demais políticas setoriais para o atendimento
das necessidades básicas das pessoas atendidas.
Em 2004, após a realização de vários eventos para discussão dos aspectos pertinentes à
política de Assistência Social, dentre os quais as Conferências Nacionais de Assistência
Social que envolveram instâncias estatais e da sociedade civil, o Conselho Nacional de
Assistência Social aprovou a Política Nacional de Assistência Social, que criou um modelo
unificado de gestão para a Assistência Social, o chamado Sistema Único de Assistência Social
(SUAS), vigente desde o ano de 2005.
A partir de então, a Assistência Social, política responsável pela garantia da Proteção
Social3, passou a trabalhar numa perspectiva descentralizada e com a prestação de serviços
hierarquizados, de acordo com a complexidade.
Desta forma, o Sistema único de Assistência Social (SUAS), atualmente se divide da
seguinte forma:
SUAS

Proteção Social Básica Proteção Social Especial

Proteção Social Especial Proteção Social Especial


de de
Média Complexidade Alta Complexidade

3
Garantia de inclusão a todos os cidadãos que se encontram em situação de vulnerabilidade e/ou em situação de
risco
20
A articulação entre o sistema socioeducativo e os serviços socioassistenciais contribui
para a troca de conhecimento e enfrentamento das vulnerabilidades sociais, como também
para a identificação e fortalecimento das potencialidades dos membros da família. É
importante que a equipe socioeducativa responda às situações ligadas à vulnerabilidade e
risco social do adolescente e de sua família através de ações articuladas com a rede
socioassistencial, evitando ações fragmentadas entre as Políticas Públicas.

4.1.1 Proteção Social Básica

Conforme descrito na Política Nacional de Assistência Social/2004, “A proteção


social básica tem como objetivos prevenir situações de risco por meio do desenvolvimento de
potencialidades e aquisições, e o fortalecimento de vínculos familiares e comunitários.”
(BRASIL, 2005).
A Proteção Social Básica trata-se, então, do desenvolvimento de um trabalho
territorializado e de caráter preventivo em que, apesar de estar sujeito a situações de
vulnerabilidade, o público a ser atendido não sofreu a efetiva violação de direitos, de modo
que as ações a serem desenvolvidas devem se pautar pela busca da minimização das
vulnerabilidades e pelo fortalecimento dos sujeitos fragilizados.
Quanto ao público a que se destina tal proteção, a Política Nacional de Assistência
Social especifica que a Proteção Social Básica
Destina-se à população que vive em situação de vulnerabilidade social decorrente da
pobreza, privação (ausência de renda, precário ou nulo acesso aos serviços públicos,
dentre outros) e, ou, fragilização de vínculos afetivos – relacionais e de
pertencimento social (discriminações etárias, étnicas, de gênero ou por deficiências,
dentre outras). (BRASIL, 2005)

Importa destacar que a proteção social básica tem por princípio a organização do
serviço com base territorial. De modo que a localização física do equipamento é determinada
com base nos altos índices de vulnerabilidade e risco social dos territórios. Os equipamentos
responsáveis pela prestação dos Serviços pertinentes à Proteção Social Básica são os Centros
de Referência de Assistência Social (CRAS).
O Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) é uma unidade pública estatal
descentralizada da política de assistência social, responsável pela organização e
oferta de serviços da proteção social básica do Sistema Único de Assistência Social
(SUAS) nas áreas de vulnerabilidade e risco social dos municípios e DF. Dada sua
capilaridade nos territórios, se caracteriza como a principal porta de entrada do
SUAS, ou seja, é uma unidade que possibilita o acesso de um grande número de
famílias à rede de proteção social de assistência social. (BRASIL, 2009, p.9)

21
A atuação dos CRAS tem por objetivos “[...] fortalecer a função protetiva da família,
prevenir a ruptura dos seus vínculos, promover seu acesso e usufruto de direitos e contribuir
na melhoria de sua qualidade de vida.” (PORTAL PBH, 2017).
Para tanto, várias estratégias estão previstas no repertório de ações dos CRAS, tais
como “[...] atividades coletivas como palestras, oficinas, campanhas, reuniões e grupos de
reflexão, além de atendimento individual, visitas domiciliares e institucionais [...]”
(PORTAL PBH, 2017).
Na perspectiva do atendimento socioeducativo, a articulação da unidade
socioeducativa com os equipamentos da Proteção Básica é extremamente importante, visto
que frequentemente os CRAS possuem conhecimento acerca do território de origem dos
adolescentes, bem como acerca da situação social da família, sendo que em alguns casos a
família é previamente acompanhada.
A articulação com os CRAS tem papel fundamental na busca de informações sobre a
família do adolescente e para a construção conjunta de intervenções entre as medidas
socioeducativas privativas de liberdade e a Assistência Social. Por se tratar de um dispositivo
público de base territorial, além de promover a organização e articulação da rede
socioassistencial e de outras políticas, a inserção do adolescente e de sua família no CRAS
auxilia na construção de identidades, no processo de pertencimento ao local, além de
contribuir para o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários.
Embora a vulnerabilidade faça parte do perfil do público das medidas socioeducativas,
não raramente nos deparamos com tais situações: adolescentes e seus familiares
desconhecidos pelos equipamentos, assim como, adolescentes e seus familiares que
desconhecem a rede. Ao identificar situações como essas, é importante que a equipe técnica
avalie em conjunto com a família a possibilidade de acionamento do serviço, de modo que
este seja apresentado e que ela seja orientada quanto às formas de acesso antes do
encaminhamento. Paralelo à apresentação do serviço à família, o CRAS deve ser
periodicamente informado dos casos pertencentes ao seu território e que foram admitidos na
unidade socioeducativa.
Na PNAS estão elencados os serviços ofertados pela Proteção Social Básica através
dos Centros de Referência de Assistência Social, aos quais de acordo com a demanda, os
adolescentes e suas famílias poderão ser encaminhados. De acordo com a PNAS (2005), são
serviços que “[...] potencializam a família como unidade de referência, fortalecendo seus
vínculos internos e externos de solidariedade, através do protagonismo de seus membros e da

22
oferta de um conjunto de serviços locais que visam a convivência, a socialização e o
acolhimento, em famílias cujos vínculos familiar e comunitário não foram rompidos, bem
como a promoção da integração ao mercado de trabalho...”. Tais serviços se encontram
listados na Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais (2013), sendo eles:

•Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família (PAIF);


•Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos;
•Serviço de Proteção Social Básica no Domicílio para Pessoas com Deficiência e
Idosas. (BRASIL, 2013)

4.1.2 Proteção Social Especial

De acordo com a PNAS, “Além de privações e diferenciais de acesso a bens e


serviços, a pobreza associada à desigualdade social e a perversa concentração de renda,
revela-se numa dimensão mais complexa: a exclusão social”. (BRASIL, 2005)
A Proteção Social Especial tem uma estreita interface com o Sistema de Garantia de
Direitos. Se constitui enquanto modalidade de assistência destinada a sujeitos em situação de
risco pessoal ou social, ou seja, pessoas que em decorrência de agravos advindos da situação
de vulnerabilidade já se encontram na situação de violação de direitos. A PNAS define o
público alvo da proteção social especial da seguinte forma:

A proteção social especial é [...] destinada a famílias e indivíduos que se encontram


em situação de risco pessoal e social, por ocorrência de abandono, maus tratos
físicos e, ou, psíquicos, abuso sexual, uso de substâncias psicoativas, cumprimento
de medidas sócio-educativas (sic), situação de rua, situação de trabalho infantil,
entre outras. (BRASIL, 2005)

Desta forma, a PNAS delimita a Proteção Social Especial como o conjunto de


serviços, programas e projetos que tem por objetivos contribuir para a reconstrução de
vínculos familiares e comunitários, a defesa de direito, o fortalecimento das potencialidades e
aquisições e a proteção de famílias e indivíduos para o enfrentamento das situações de
violação de direitos.
As demandas relacionadas à proteção social especial são atendidas, a priori, no Centro
de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), entretanto, existe a previsão
legal de que tanto as ações da proteção social básica, quanto as ações da proteção social
especial, possam ser ofertadas, por entidades de assistência social de caráter civil e sem fins
lucrativos.

23
Conforme a lógica da hierarquização dos serviços socioassistenciais previstos na
PNAS, a Proteção Social Especial foi subdivida em duas modalidades, a saber: Proteção
Social de Média Complexidade e Proteção Especial de Alta Complexidade.
A Proteção Especial de Média Complexidade atua em casos em que indivíduos e/ou
famílias encontram-se em situação de violação de direitos, mas em que o vínculo familiar e/ou
comunitário não foi completamente rompido, de modo que as ações desenvolvidas são no
sentido de fortalecer e retomar os vínculos e promover a reinserção dos sujeitos. Neste
sentido, a Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais elenca as seguintes estratégias
de trabalho:

• Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos


(PAEFI).
• Serviço Especializado em Abordagem Social.
• Serviço de Proteção Social a Adolescentes em Cumprimento de Medida
Socioeducativa de Liberdade Assistida e Prestação de Serviços à Comunidade
(PSC).
• Serviço de Proteção Social Especial para Pessoas com Deficiência, Idosas e suas
Famílias.
• Serviço Especializado para Pessoas em Situação de Rua. (BRASIL, 2013)

Levando-se em consideração que os CREAS são responsáveis pela execução das


Medidas Socioeducativas de Meio Aberto (LA e PSC), e que o público alvo da semiliberdade
e da internação, muitas vezes, possuem uma extensa trajetória infracional com aplicação de
outras medidas, frequentemente os adolescentes em cumprimento das MSE privativas de
liberdade possuem passagens pelo CREAS, devido ao cumprimento de medidas em meio
aberto. Desta forma, uma vez que a equipe da unidade socioeducativa identifica que o
adolescente possui em sua trajetória a determinação de uma MSE em meio aberto, fica
evidenciada a importância do contato com o CREAS de referência do adolescente, visto que
as informações técnicas acerca do acompanhamento do adolescente podem contribuir em
diversos aspectos do trabalho nas unidades.
A Proteção Social Especial de Alta Complexidade atua em casos em que indivíduos e
famílias encontram-se em situação de violação de direitos associado ao rompimento dos
vínculos familiares e comunitários. Diante de tal situação, a Proteção Especial de Alta
Complexidade deve garantir proteção Integral, que envolve aspectos como: “[...] moradia,
alimentação, higienização e trabalho protegido para famílias e indivíduos que se encontram
sem referência e, ou, em situação de ameaça, necessitando ser retirados de seu núcleo
familiar e, ou, comunitário.” (BRASIL, 2005)

24
São serviços que compõem a Proteção Especial de Alta Complexidade:

• Serviço de Acolhimento Institucional;


• Serviço de Acolhimento em República.
• Serviço de Acolhimento em Família Acolhedora.
• Serviço de Proteção em Situações de Calamidade Pública e de Emergências.
(BRASIL, 2013)

A articulação com os serviços de acolhimento institucional deve ocorrer sempre que a


unidade socioeducativa tiver ciência de que o adolescente possui histórico de acolhimento
institucional ou quando comprovada a insuficiência familiar, ou seja, casos em que o
adolescente em cumprimento de medida não possui referência familiar que possa acolhê-lo
após o cumprimento da MSE.
Nos casos de adolescentes com histórico de acolhimento institucional, o contato com
as instituições tem por objetivo o levantamento de informações sobre a vida pregressa do
adolescente no meio institucional, bem como a identificação de outras informações acerca de
sua trajetória até a efetivação do acolhimento, que geralmente constam nos registros das
entidades. Tais informações podem subsidiar a equipe socioeducativa na compreensão da
história de vida do adolescente, na construção do caso e na eleição de estratégias para o
acompanhamento durante a MSE.
Há casos em que a equipe constata a inexistência de familiares e de pessoas de
referência que se disponham a se responsabilizar pelo adolescente. Tal constatação deve ser
realizada em conjunto com todos os serviços da rede que, possivelmente, acompanharam esta
família. Soma-se a isso o contato com a Vara Cível da comarca de origem, para qualificar a
avaliação quanto à inexistência de referências familiares e compreender se existe o processo
de destituição do poder familiar.
Uma vez constatada a inexistência de familiares ou de pessoas de referência que se
disponham a se responsabilizar pelo adolescente, deve-se realizar, antes do processo de
desligamento, as articulações necessárias para o encaminhamento dele a uma unidade de
acolhimento institucional, de modo que tenha um local protegido para ser destinado quando
for desligado da MSE.
As articulações, neste caso, devem se dar no sentido de informar à Vara Infracional,
por meio de relatório juntado ao processo de execução do adolescente, quanto às tentativas de
contatos com possíveis referências familiares, as articulações realizadas com a rede para
colher informações sobre o histórico familiar e/ou para construir estratégias que visaram o
restabelecimento dos vínculos familiares, mas que, porventura, não foram eficazes, e, por fim,

25
quanto à necessidade do acolhimento institucional. Uma vez acionada, a Vara Infracional
procederá no sentido de oficiar a Vara Cível da Infância e da Juventude.

Em Belo Horizonte foi pactuado o fluxo de encaminhamento dos adolescentes ao


acolhimento institucional4, o qual foi construído a partir das discussões realizadas pelo Fórum
Permanente Socioeducativo por meio da Comissão de Convivência Familiar e Participação da
Família na Medida Socioeducativa. O referido fluxo encontra-se anexo a este documento e
contempla os adolescentes de Belo Horizonte que são desligados das MSE de semiliberdade e
internação.

Tal fluxo não se aplica aos adolescentes de outros municípios e àqueles acautelados
provisoriamente. No que diz respeito aos desligados das medidas de internação e
semiliberdade de outros municípios, não existe um fluxo firmado até o momento. Nos casos
de adolescentes desligados da internação provisória, a equipe da unidade deve informar a
situação de inexistência de referência familiar à Vara Infracional, por meio de relatório, a fim
de que, caso o adolescente seja desligado sem aplicação de alguma medida socioeducativa, o
judiciário possa prosseguir com os tramites para o acolhimento institucional do adolescente.

4.2 O SISTEMA DE GARANTIA DE DIREITOS DA CRIANÇA E DO


ADOLESCENTE

O Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente - SGD é formado pelo


conjunto de instituições governamentais e da sociedade civil que tem por objetivo a garantia
dos direitos de crianças e adolescentes em todo território brasileiro. O artigo 1º da Resolução
nº 113/2006 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança do Adolescente conceitua:
Art. 1º O Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente constitui-se
na articulação e integração das instâncias públicas governamentais e da sociedade
civil, na aplicação de instrumentos normativos e no funcionamento dos mecanismos
de promoção, defesa e controle para a efetivação dos direitos humanos da criança e
do adolescente, nos níveis Federal, Estadual, Distrital e Municipal. (CONANDA,
2006)

O SGD é composto pelas instituições que têm a responsabilidade de zelar e garantir os


direitos de crianças e adolescentes, desta forma, faz parte do Sistema de Garantia de Direitos:
a família, as organizações da sociedade civil, os Conselhos de Direitos, Conselhos Tutelares,

4
Vide Anexo 3
26
Delegacias Especializadas, Defensorias Públicas, Varas e Promotorias Especializadas da
Infância e da Juventude e os Centros de Defesa da Criança e do Adolescente.
O Sistema de Garantia de Direitos possui três eixos que são norteadores da atuação das
entidades que dele fazem parte, a saber: Eixo da Promoção dos Direitos, que agrega todas as
ações do poder executivo que promovem a efetivação dos direitos (saúde, educação,
assistência social, etc.); o Eixo do Controle e Efetivação do Direito, em que as ações são
realizadas tendo em perspectiva o controle social em relação à efetivação dos direitos de
crianças e adolescentes; e o Eixo da Defesa dos Direitos Humanos, que abrange as instituições
que atuam na defesa dos direitos de crianças e adolescentes.
Embora seja importante que o trabalho socioeducativo esteja atento a todos os eixos
do Sistema de Garantia de Direitos, na prática, as articulações ocorrem com maior frequência
e intensidade com as instituições do eixo da Defesa dos Direitos Humanos. O artigo 6º da
resolução do CONANDA delimita do que trata tal eixo, afirmando que ele

[...] caracteriza-se pela garantia do acesso à justiça, ou seja, pelo recurso às


instâncias públicas e mecanismos jurídicos de proteção legal dos direitos humanos,
gerais e especiais, da infância e da adolescência, para assegurar a impositividade
deles e sua exigibilidade, em concreto. (CONANDA, 2006)

No artigo 7º a resolução trata dos órgãos que compõem a frente de trabalho no Eixo da
Defesa dos Direitos Humanos, sendo eles:

[...] I - judiciais, especialmente as varas da infância e da juventude e suas equipes


multiprofissionais, as varas criminais especializadas, os tribunais do júri, as
comissões judiciais de adoção, os tribunais de justiça, as corregedorias gerais de
Justiça;
II - público-ministeriais, especialmente as promotorias de justiça, os centros de
apoio operacional, as procuradorias de justiça, as procuradorias gerais de justiça, as
corregedorias gerais do Ministério Público;
III - defensorias públicas, serviços de assessoramento jurídico e assistência
judiciária;
IV - advocacia geral da união e as procuradorias gerais dos estados
V - polícia civil judiciária, inclusive a polícia técnica;
VI - polícia militar;
VII - conselhos tutelares; e
VIII - ouvidorias. (CONANDA, 2006 )

Pensando-se na especificidade do trabalho socioeducativo, cabe observar que a


articulação com alguns órgãos do SGD, tais como a Vara da Infância, promotoria e defensoria
pública, terá um caráter relativamente compulsório, visto que a própria medida socioeducativa
imposta ao adolescente possui caráter jurídico, tendo sido imposta judicialmente após
transcorrido o processo legal.

27
As articulações com as instituições do Sistema de Justiça devem ser realizadas na
perspectiva de se garantir ao adolescente o acesso à justiça conforme previsto no art. 141 do
Estatuto da Criança e do Adolescente, no qual se prevê “Art. 141. É garantido o acesso de
toda criança ou adolescente à Defensoria Pública, ao Ministério Público e ao Poder Judiciário,
por qualquer de seus órgãos.” (BRASIL, 1990)

4.2.1 CONSELHO TUTELAR

Para além das instituições do Sistema de Justiça, o Conselho Tutelar se destaca como
órgão do SGD que é de grande relevância na articulação da rede no contexto socioeducativo,
pois, não raramente, os conselheiros conhecem os adolescentes e seus familiares, possuindo
informações acerca da trajetória de vida e das situações de vulnerabilidade e risco social a que
a família está submetida, tendo o dever “zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do
adolescente” definidos no Estatuto da Criança e do Adolescente. (BRASIL, 1990)
O Conselho Tutelar é um órgão que compõe o Sistema de Garantia de Direitos da
Criança e do Adolescente e possui previsão legal na Lei 8069/90 (Estatuto da Criança e do
Adolescente). O Estatuto da Criança e do Adolescente preconiza que todos os municípios
brasileiros tenham ao menos um Conselho Tutelar instituído, de modo que tal órgão atue na
defesa dos direitos de crianças e adolescentes na perspectiva da descentralização político-
administrativa e da municipalização do atendimento.
Deste modo, o Ministério Público de Minas Gerais divulgou uma cartilha informativa
sobre o Conselho Tutelar, na qual reitera que os conselhos tutelares são órgãos municipais que
têm “por função primordial representar a sociedade na proteção e garantia desses direitos,
no âmbito municipal. Deve ser o braço forte da sociedade para promover ações que busquem
prevenir e impedir situações de risco para crianças e adolescentes.” (CAODCA/MG)
De acordo com a referida cartilha que foi intitulada “Conselho Tutelar Perguntas e
Respostas” e publicada através do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de
Defesa dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes do Estado de Minas Gerais
(CAODCA/MG), o Conselho Tutelar:

[...] é um órgão público municipal, de natureza colegiada, integrante do Sistema de


Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente, composto por [...] conselheiros
tutelares eleitos pela população local (art. 132,ECA). É um órgão de participação
popular, fruto da democracia participativa (arts. 227, § 7º c/c art. 204, CR/88). [...]
Tem por missão institucional representar a sociedade na proteção e garantia dos
direitos de crianças e adolescentes (art. 131, ECA), sendo a porta de entrada para o
recebimento de denúncias e para a aplicação de medidas de proteção (art. 136, I,
ECA). Compete ao Conselho Tutelar fiscalizar e tomar as providências necessárias
28
para impedir e combater situações de risco social e pessoal de crianças e
adolescentes, dentre outras atribuições. (CAODCA/MG,2017)

Cabe ressaltar que o Conselho Tutelar possui três características fundamentais: a


permanência, a autonomia e o não exercício de jurisdição. Como órgão permanente, uma vez
instituído o Conselho Tutelar não pode ser extinto, sendo de responsabilidade do município
garantir a sua manutenção, bem como a renovação ou substituição do mandato dos
conselheiros.
Sendo órgão autônomo, o Conselho Tutelar não sofre a intervenção de outros órgãos
ao tomar suas decisões, entretanto, obviamente essas não podem conflitar com a legislação e
devem sempre observar princípios da doutrina da proteção integral e o melhor interesse da
criança/adolescente.
Finalmente, como órgão não jurisdicional, não compete ao Conselho Tutelar arbitrar
conflitos de interesses, cabendo tal tarefa, quando for o caso, apenas à autoridade judicial,
devendo o representante do conselho tutelar realizar o devido encaminhamento.
O acionamento do Conselho Tutelar pode ocorrer de formas diversas, dependendo das
peculiaridades e do andamento do caso. Contatos telefônicos, contatos virtuais (via e-mail),
estudos de caso, visitas técnicas, etc., são formas de que a unidade socioeducativa pode se
utilizar para conversar com os Conselhos Tutelares. Entretanto, importa destacar que à
medida que o acompanhamento do adolescente evolui as articulações podem ser
intensificadas e os diálogos acontecerem de forma mais direta, de maneira que os contatos
telefônicos e virtuais devem se tornar meios para a articulação de espaços de discussões, tais
como reuniões e estudos de caso realizados presencialmente.
Pensando-se no cuidado e na valorização dos parceiros, orienta-se que, sempre que
possível, as reuniões e estudos com o Conselho Tutelar sejam realizadas na sede do órgão ou
em local próximo a ela, e que a unidade socioeducativa se organize para comparecer ao local
com pontualidade. Quando não for possível os encontros no território, é importante considerar
a disponibilidade de recursos e de deslocamento dos conselheiros tutelares, para que a
demanda da unidade socioeducativa não comprometa o trabalho ou o funcionamento do
serviço.

4.3 PARTICIPAÇÃO DA FAMÍLIA NA ARTICULAÇÃO DA REDE SOCIAL DO


ADOLESCENTE

A família é uma das instituições responsáveis pela efetivação dos direitos da criança e
do adolescente, sendo a que, primordialmente, desenvolve as funções de cuidado e proteção
29
para este público. A Constituição Federal de 1988 define como responsabilidade da família,
da sociedade e do Estado a garantia do bem-estar de crianças e adolescentes, evidenciando o
caráter prioritário e integral da atenção a esses. Conforme expresso no artigo 227 da referida
lei:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao
adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao
respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a
salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade
e opressão. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010) (BRASIL,
1988).

Faz-se imprescindível trabalhar a participação da família na articulação da rede, com


vistas a garantir que esta possa desempenhar suas responsabilidades, mesmo durante o
período em que o adolescente está em cumprimento da MSE e sob responsabillidade do
Estado. Tal possibilidade vai ao encontro do objetivo de se desenvolver, durante o
cumprimento das MSE privativas de liberdade, o fortalecimento dos vínculos e a convivência
familiar aos socioeducandos. A inserção do adolescente na rede de serviços diz da
necessidade de seu acompanhamento por outras políticas, sendo elas complementares ao
cuidado familiar.
Nesta perspectiva, o envolvimento da família no cumprimento da medida
socioeducativa é fortalecido quando esta participa com a unidade dos encaminhamentos aos
serviços da rede propostos ao adolescente. Por meio da estratégia de incentivo à participação
familiar na inserção do adolescente na rede, a equipe pode promover a independência dos
membros familiares em relação à medida socioeducativa, convocando tanto esses, como o
adolescente a acessarem os diversos tipos de serviços e direitos estabelecidos.
Cabe à unidade avaliar e situar os momentos em que o envolvimento da família nas
articulações propostas ao adolescente poderá ocasionar uma participação ativa e menos
objetalizada, no intuito de trazê-la para responder, conjuntamente, pela adesão do adolescente
ao serviço, bem como esclarecê-la sobre a função do encaminhamento proposto e os modos
de acessar a rede específica. Trata-se de promover o empoderamento da família e do
adolescente em relação ao acesso aos serviços da rede, de modo que, mais do que mobilizar
os parceiros a fim de acolhê-los, implica em orientá-los e mobilizá-los para que saibam como,
quando e onde demandar aquilo de que necessitam.
O ato de encaminhar pode vir a ser formalizado, especialmente quando os familiares
apresentarem dificuldades de compreender as orientações da equipe. Nestes casos, para além
das orientações, a família deve receber da unidade socioeducativa um documento em que
30
conste a motivação do encaminhamento, as informações acerca do serviço ao qual ele se
destina (endereço, telefone, horário de funcionamento), bem como a pessoa de referência do
equipamento. É importante, também, que a equipe faça o contato prévio com os serviços,
informando-o, minimamente, da realização do encaminhamento, de modo que eles estejam
cientes e sensíveis para acolher a família quando ela fizer o movimento de acessá-los.
Na prática, para que o adolescente e a família possam circular de forma autônoma pela
rede, é importante que esta seja pensada e construída junto à família, de maneira que ela tenha
a oportunidade de identificar e referenciar os dispositivos os quais já possui acesso, bem como
aqueles que consideram importantes de incluir. Muitas vezes a família não detém
conhecimentos acerca dos equipamentos disponíveis na rede, de modo que cabe à equipe
técnica da unidade provocar o movimento contrário, mapeando e apresentando a rede para a
família, ofertando informações qualificadas que possam despertar nesta o interesse pelos
serviços, de acordo com suas necessidades.
Ao proporcionar aos familiares o acesso às informações pertinentes sobre os serviços
da rede, a unidade trabalha a lógica do acesso qualificado e permanente, que ultrapassa o
tempo da medida. Isto significa que, ao envolver a família no trabalho com a rede durante a
MSE, a equipe tem a oportunidade de promover a autonomia dela no que concerne ao acesso
aos diversos benefícios, serviços e programas sociais, de modo que uma vez finalizada a
medida, ela tenha reunido condições suficientes para manter uma circulação independente
pela rede, sendo assistida naquilo que reconhece como sendo sua necessidade.
Por outro lado, a participação da família na rede, tal como é idealizada, possibilita a
intervenção na relação adolescente-família, de modo a propiciar novos posicionamentos
diante dos problemas colocados, bem como a possibilidade de trabalhar aspectos passíveis de
fortalecimento no que concerne ao vínculo entre eles. Entretanto, nos casos em que não for
possível o envolvimento dos familiares, ou que esses se recusem a participar, a unidade não
deve se furtar de realizar o encaminhamento. Contudo, cabe às equipes traçar as melhores
estratégias para sensibilizá-los, além de não se esquivar de buscar a inclusão deles no
processo de encaminhamento e de acompanhamento do adolescente nos serviços.

4.3.1 ARTICULAÇÃO DE REDE PARA ADOLESCENTES SEM CONTATO


FAMILIAR

É sabido que a participação da família no acompanhamento da MSE é fundamental


para que o adolescente consiga se reposicionar diante da prática infracional e evoluir em seu

31
processo de responsabilização. Desta forma, as equipes técnicas desempenham papel de suma
importância no que concerne ao processo de sensibilização da família para comprometer-se
com a MSE. Isto pode ocorrer de forma imediata, quando há informações corretas sobre a
localização e formas de contato com a família, facilitando que ela se faça presente desde o
início da MSE. Por outro lado, pode se constituir em um grande desafio, quando tais
informações não acompanham o adolescente, quando a família não se coloca disponível ou
não exerce sua função protetiva.
Nos casos em que o adolescente é acautelado provisoriamente ou em que ele recebe
MSE restritiva ou privativa de liberdade, mas a equipe técnica da unidade não consegue de
imediato o contato e a localização da família, é importante que se tracem estratégias para este
fim. Desta forma, é essencial que sejam realizadas articulações com a rede de serviços
disponíveis no território de residência do adolescente e de sua família, de modo que os
equipamentos públicos e comunitários possam colaborar na busca por seus familiares.
Reconhecendo a importância da participação da família no acompanhamento da MSE,
durante as discussões que deram embasamento para a revisão da Metodologia de Atendimento
à Família, foram debatidos e desenhados fluxos para nortear a busca pela família dos
adolescentes acautelados através da articulação com os equipamentos da rede, de modo que o
objetivo de tais é agilizar a localização dos familiares para que eles se façam presentes na
MSE o mais rapidamente possível, entendendo que a participação familiar é essencial para o
processo de responsabilização do (a) socioeducando (a).
Cabe ressaltar que esses fluxos desenhados para as medidas socioeducativas com o
objetivo de orientar o trabalho com os adolescentes sem contato familiar, também contribuem
para o trabalho com as famílias que não exercem função protetiva, ou seja, não se
corresponsabilizam e nem participam do cumprimento da medida socioeducativa. Destaca-se
que os fluxos servem para orientar o trabalho, mas que as equipes devem manter a autonomia
para desempenhar outras ações, tendo em vista que, ocasionalmente, os direcionamentos neles
presentes podem não ser suficientes para alcançar o objetivo ao qual se prestam, sendo
necessárias outras intervenções, de modo que a existência destes fluxos não deve engessar o
trabalho.
Desta forma, apresenta-se a seguir as orientações acerca dos fluxos, conforme
discutido na Comissão de Revisão da Metodologia de Atendimento à Família.

32
4.3.1.1 Orientações gerais para o fluxo – Adolescentes sem contato familiar

 Quando for necessário colher informações sobre a família com a rede, pois o
adolescente está sem contato, além do contato telefônico, devem-se utilizar
instrumentos5 que formalizem o pedido de informações pela unidade sobre
acompanhamentos ou atendimentos realizados com o adolescente e sua família. Nestes
instrumentos deve estar especificada a instituição socioeducativa a qual está se
representando e, brevemente, a contextualização do trabalho realizado na medida
socioeducativa, de forma a esclarecer aos serviços que irão disponibilizar as
informações.
 A articulação da rede não é hierarquizada, ou seja, não tem uma ordem quanto aos
serviços que devem ser acionados. Portanto, cada caso guiará quais serviços e
equipamentos serão acionados.
 A busca ativa através da visita domiciliar deve ser utilizada como um recurso para o
trabalho na falta de contato com a família, com o objetivo de levantar possíveis
referências do adolescente, iniciar o trabalho de sensibilização da família e conhecer
os equipamentos da rede.
 Caso a rede apresente atrasos ou dificuldades para enviar informações, como também
nos momentos em que forem necessárias articulações para construção do caso,
orienta-se que a equipe realize uma visita institucional e/ou proponha a realização de
um estudo de caso com os serviços da rede.
 A Diretoria de Abordagem Familiar e Articulação de Rede Social da SUASE deve ser
acionada pela equipe socioeducativa em caso de dificuldade na localização de
familiares, como aparato gerencial para articulação de fluxos institucionais com os
municípios, no que compete aos serviços territoriais, assim como quando houver
empecilhos na articulação da rede.
 As dificuldades de inserção e acompanhamento dos adolescentes e seus familiares, em
serviços, programas e equipamentos da rede, mesmo após articulações permanentes,
devem ser informadas no PIA e/ ou nos relatórios de acompanhamento da medida.
 Quando a unidade não consegue contato com a família, a rede de saúde pode ser
acionada como parceira no processo de busca. Neste caso, os equipamentos da
Atenção Primária terão mais condições de ofertar informações sobre a família por ser

5
Vide anexo 4.
33
um serviço territorializado, mas o contato com a rede de saúde pode ser estendido, de
acordo com o caso.
 Em relação aos adolescentes que apresentem trajetória de vida nas ruas e que não
possuam contato com a família, a unidade deve ampliar a rede de proteção ao
adolescente, através do acionamento dos serviços de proteção à pessoa em situação de
rua disponíveis no município, tais como: a Abordagem Social6; CREAS POP7;
Consultório de Rua8; o Centro POP Miguilim9 (presente em Belo Horizonte) e
serviços similares.
 Quando o adolescente ainda continua sem contato familiar, mesmo após as
intervenções, articulações e ações realizadas, a equipe técnica deve informar ao
Judiciário, por meio de relatório circunstanciado, as dificuldades encontradas para
realizar contato com a família, assim como para corresponsabilizá-la, além de
contextualizar o trabalho realizado pela unidade para garantir a convivência familiar
do adolescente. Além disso, o Conselho Tutelar de referência do território do
adolescente deve ser informado oficialmente. Especificamente, na internação
provisória, esse informe deve ser formalizado nos relatórios que são protocolados para
as audiências, mantendo a informação oficial ao Conselho Tutelar.

6
A Abordagem Social é um serviço da Proteção Social Especial da Política de Assistência Social,
atende ou acompanha pessoas de qualquer faixa etária, inclusive crianças e adolescentes que se
encontram em trajetória de vida nas ruas. O método de trabalho mais presente é a busca ativa e o
acompanhamento dos usuários no ambiente da rua. Em Belo Horizonte o serviço conta com equipes
para cada regional, sendo garantido atendimento em turnos alternados entre manhã, tarde e noite.

7
O CREAS POP é um serviço que oferta ao público em situação de vida nas ruas atendimento,
orientação individual e grupal, atividades direcionadas para o desenvolvimento de sociabilidades.
Espaço para guarda de pertences, higiene pessoal, alimentação, provisão de documentação e endereço
institucional para utilização como referência.

8
O Consultório na rua é uma estratégia da Política de Saúde com vistas a ofertar os serviços básicos de
saúde para as pessoas em situação de vida nas ruas, de modo que equipes multiprofissionais que
desenvolvem ações integrais de saúde frente às necessidades dessa população.
9
O Centro Pop Miguilim caracteriza-se por ser um serviço de retaguarda da Abordagem Social, pois
este que realiza o acompanhamento psicossocial mais sistemático, ou seja, no ambiente da rua. Destina-
se a crianças e adolescentes de 7 a 17 anos que se encontram em trajetória de vida nas ruas. No local, o
público alvo tem acesso à garantia de necessidades básicas, como alimentação e higiene pessoal. O local
também conta com oficinas e demais atividades, além de contar com uma equipe técnica formada por
uma psicóloga e uma assistente social que realiza o acompanhamento psicossocial, principalmente
voltada para a articulação da rede social. As informações sobre funcionamento e localização do Centro
Pop Miguilim constam no Catálogo de Rede.

34
4.3.1.2 Orientações no caso de adolescentes que fizeram contato familiar, mas que essas
não exercem função protetiva.

 O fluxo para articulação de rede de adolescentes sem contato familiar orienta as


equipes para o trabalho com as famílias que são contatadas, mas que não exercem sua
função protetiva. Portanto, nos casos em que não há participação da família e esta não
se corresponsabiliza pelo cumprimento da medida, a equipe técnica deve realizar a
articulação com a rede socioassistencial, assim como com o Conselho Tutelar. Estes
contatos tem o objetivo de levantar informações sobre os acompanhamentos já
realizados pela rede, além de executar o trabalho em parceria com esta para construção
de estratégias, principalmente a fim de atuar na sensibilização da família quanto aos
seus deveres e direitos.
 A visita domiciliar deve ser utilizada também como um recurso para o trabalho com os
familiares que não exercem a função protetiva, como forma de sensibilizá-los quanto a
necessidade de corresponsabilização pelo cumprimento de medida do adolescente,
assim como para levantar possíveis referências para ele e conhecer os equipamentos da
rede para agregá-los ao trabalho com a família.
 Quando a família do adolescente permanece sem exercer função protetiva, mesmo
após as intervenções, articulações e ações realizadas em prol disto, a equipe técnica
deve informar ao Judiciário, por meio de relatório circunstanciado, as dificuldades
encontradas para sensibilizar a família quanto ao exercício de sua responsabilidade e
participação no cumprimento da MSE, além de contextualizar o trabalho realizado
pela unidade para garantir a convivência familiar do adolescente. Além disso, o
Conselho Tutelar de referência do território do adolescente deve ser oficialmente
informado. Especificamente, na internação provisória, esse informe pode ser
formalizado nos relatórios que são protocolados para as audiências, mantendo a
informação oficial ao Conselho Tutelar.

4.3.1.3 Orientação no caso de falta de referência familiar e/ou impossibilidade de


retorno ao convívio familiar

Há casos recebidos pelas medidas socioeducativas nos quais os adolescentes


apresentam um histórico de vínculos familiares fragilizados ou rompidos, de maneira em que
são necessárias articulações com a rede, inclusive com o Conselho Tutelar em prol da

35
sensibilização da família para o exercício de suas responsabilidades em relação ao
adolescente. No entanto, quando as ações desenvolvidas não alcançam seus objetivos,
caracterizando a ausência de referência familiar e impossibilidade de retorno ao convívio, a
unidade socioeducativa deve avaliar, em conjunto com a rede, a necessidade de sugestão de
medida protetiva para acolhimento institucional.
Sendo este o caso, a equipe deverá dar ciência dessa demanda nos relatórios
encaminhados à Vara Infracional, a qual acionará a Vara Cível da Infância e Juventude da
comarca de origem do adolescente, caso ela corrobore com a avaliação da equipe
socioeducativa. Em Belo Horizonte, as unidades devem observar o fluxo de encaminhamento
para o Acolhimento Institucional estabelecido a partir das discussões da Comissão de
Convivência Familiar e Participação da Família na Medida Socioeducativa, a qual integra o
Fórum Permanente do Sistema de Atendimento Socioeducativo de Belo Horizonte.

4.3.1.4 Fluxo para Acionamento da Rede Social nos casos de adolescente sem contato
familiar

Considerando as orientações supracitadas, apresenta-se a seguir o fluxo geral


referente ao acionamento da rede nos casos em que as unidades se deparem com adolescentes
sem contato familiar. Orienta-se que o fluxo é aplicável para todas as unidades
socioeducativas.

36
Adolescente
Chega na Unidade

Internação Provisória/Semiliberdade/
Internação
Acolhida

Adolescente tem Contato com a


Familia

Sim Não

Agendamento da Visita.
Orientação sobre o local, funcionamento da unidade, Contato com a rede Socioassistencial, Rede de Saúde, Conselho
sensibilização para comparecer na unidade, presenças Tutelar, Escolas, Abrigo, Projetos Sociais, Consultório de Rua,
autorizadas. Abordagem Social, etc.
Agendamento de atendimento presencial à família, informar
sobre audiências, levantamento de informações, orientação sobre Levantamento de possíveis referências para o(a) adolescente
a medida. (Amigo, Tio, Vizinho, Etc.); Visita domiciliar.

Adolescente ainda sem


contato?

Sim Não

Agendamento da Visita.
Orientação sobre o local, funcionamento da
Acionar a Diretoria de Abordagem Familiar e unidade, sensibilização para comparecer à
Articulação de Rede Social da SUASE. unidade e orientação sobre quais são as
Informar o Judiciário por meio de relatório. presenças autorizadas.
Informar oficialmente o Conselho Tutelar. Agendamento de atendimento presencial à
família, levantamento de informações,
orientação sobre a Medida.
37
5 PROGRAMAS COMPLEMENTARES DA REDE DE ATENDIMENTO AO
ADOLESCENTE
A atuação em rede como eixo de trabalho de uma política de atendimento, nos
convoca a trazer outros atores para o acompanhamento, de modo que os objetivos sejam
comuns e que os esforços empreendidos para o seu alcance sejam adequados, evitando a
fragmentação de ações e o uso improdutivo de recursos. Soma-se a isto a observação e
avaliação permanente das intervenções, considerando a assertividade dos encaminhamentos
propostos. Compreender que nenhuma política, sozinha, atende as necessidades globais do
indivíduo, justifica, por si só, a articulação da rede.
Para avançarmos nesta discussão apresentamos, a seguir, uma contextualização dos
serviços que perpassam a rede de atendimento ao adolescente.

5.1 PROGRAMA ESTADUAL DE ACOMPANHAMENTO AO ADOLESCENTE


DESLIGADO DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS DE INTERNAÇÃO OU
SEMILIBERDADE EM MINAS GERAIS – SE LIGA10

O Programa Se Liga destina-se aos adolescentes que cumpriram integralmente as


MSE de semiliberdade ou internação, tendo sido judicialmente desligados das referidas
medidas. Deste modo, o acesso ao programa deve ser proporcionado a todos os
adolescentes que são desligados das medidas e que residem na área de abrangência do
programa.
O Se Liga tem as sedes organizadas em regionais no Estado de Minas Gerais. Cada
sede constitui como o espaço de trabalho do técnico e do coordenador regional, onde são
realizados os atendimentos aos adolescentes.
Conforme a metodologia do programa, o Se Liga tem por objetivo o
acompanhamento aos adolescentes que concluíram a medida de semiliberdade ou
internação em Minas Gerais. Como acompanhamento entende-se tanto a dimensão do
atendimento individual, quanto a articulação contínua da rede social em torno do(a)
adolescente/jovem.
O Programa Se Liga é uma ferramenta de suporte à trajetória do adolescente após o
desligamento da medida socioeducativa restritiva ou privativa de liberdade, possibilitando
diversas articulações e conexões com a cidade, com a sociedade, com a família, entre outras.

10
Vide Metodologia do Programa de Acompanhamento ao Adolescente Desligado das Medidas Socioeducativas
de Internação ou Semiliberdade em Minas Gerais – Se Liga.
38
Trata-se de um programa de livre participação, que acompanhará o adolescente por um
período máximo de 1 (um) ano, contado a partir da data de sua inclusão no Programa Se Liga.
O prazo para acompanhamento é baseado no caráter pontual do programa que, ao não se
estender no tempo e à totalidade na garantia dos direitos do adolescente, operando na ótica da
incompletude institucional, permite que ele se vincule aos demais serviços disponíveis na rede.
Logo, o Se Liga se constitui como um suporte ao adolescente, trabalhando para que ele consiga
construir suas escolhas, sem envolvimento com a criminalidade.
A proposta é que cada adolescente possa ser livre para escolher o uso que fará do
programa, considerando os eixos: profissionalização, educação, trabalho e renda, saúde, cultura,
esporte, lazer e família, visando contribuir para o fortalecimento de suas relações sociais. Apesar
de intervir nos mesmos eixos que as medidas socioeducativas, o Se Liga não se constitui como
uma continuidade destas, tanto por ser um programa de livre participação, quanto por não ter
como objeto de trabalho a responsabilização do adolescente por um ato infracional. Assim, os
encaminhamentos e as articulações do Se Liga serão realizados a partir da elaboração em
atendimentos de seus pontos de interesse, levando em consideração a prévia construção e
discussão do caso com a equipe da unidade socioeducativa.
É importante ressaltar que o acompanhamento do adolescente após o seu desligamento
se articula com o seu percurso durante o cumprimento da medida socioeducativa, já que uma
das funções do programa é trabalhar com ele as escolhas realizadas durante a medida
socioeducativa, contribuindo para que possa sustentá-las, quando for o caso.
O Se Liga opera de modo a corroborar a construção de alternativas ao ato infracional,
envolvendo a continuidade das ações iniciadas e/ou apontadas pela Unidade, assim como novas
escolhas do adolescente que surgem diante do desligamento da medida. O trabalho em rede é
ponto crucial do programa, sendo que sua atuação tem foco no território do adolescente, assim
como ocorre durante o trabalho socioeducativo.

5.2 PROGRAMA DE PROTEÇÃO A CRIANÇAS E ADOLESCENTES AMEAÇADOS


DE MORTE (PPCAAM)

O Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte (PPCAAM)


foi implantado em Minas Gerais no ano de 2003, tendo sido oficialmente criado pela Lei
Estadual 15.473/2005 e regulamentado pelo Decreto Estadual 44.838/2008. O PPCAAM
objetiva efetivar ações, em articulação com o Sistema de Garantia de Direitos, para a
preservação da vida de crianças e adolescentes em situação de ameaça de morte, atuando pela

39
perspectiva da proteção integral, conforme o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº
8.069, de 13 de julho de 1990) e a Constituição Federal de 1988.
Na cartilha “PPCAAM e as Portas de Entrada: O Ponto de Partida para a Proteção”,
elaborada pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH) em 2014,
define-se que
O PPCAAM trabalha mediante dois pilares: (a) a garantia do direito à vida, através
da retirada imediata do ameaçado de morte do local de risco, transferindo-o para
uma nova localidade, em segurança, e (b) a proteção integral, que inclui a efetivação
da inserção social dos protegidos, através de uma ação intersetorial com o SGD, no
sentido de garantir direitos individuais e sociais básicos a quem está protegido.
(SECRETARIA DE DIREITOS HUMANOS, 2014)

A inclusão de um adolescente no PPCAAM está condicionada à realização de uma


prévia avaliação da ameaça pela equipe técnica do programa. Para tanto, as portas de entrada
são responsáveis pela solicitação e pelo encaminhamento do adolescente para avaliação da
ameaça, sendo elas: o Poder Judiciário, os Conselhos Tutelares e o Ministério Público. Essas
instituições são responsáveis pela fiscalização e garantia dos direitos das crianças e dos
adolescentes no SGD. De acordo com a SUASE, no documento “Metodologia para relatórios”
de autoria da Diretoria de Orientação Socioeducativa (DOS) em 2012, “[...] Em casos de
adolescentes em cumprimento de medida de internação provisória ou medida socioeducativa,
caberá, exclusivamente, ao Juiz da Vara Infracional determinar o atendimento do
PPCAAM.” (SUASE, 2012, p.16). Uma vez identificado que o adolescente possui uma
ameaça contra si, as equipes socioeducativas devem construir um relatório que circunstancie a
situação da ameaça o qual deverá ser encaminhado à Vara Infracional.
O relatório construído deve reunir elementos que possibilitem ao judiciário e, também,
ao programa de proteção uma visão geral da configuração da ameaça (o que a gerou, quem é o
ameaçador, como o adolescente se posiciona diante dela, se o responsável legal está disposto
a aderir ao programa com o adolescente), bem como das intervenções já realizadas no sentido
de superá-la.
Outro ponto importante que deve ser trabalhado com o adolescente e sua família antes
da solicitação da avaliação do programa é a questão da sensibilização em relação à adesão,
dado que a metodologia de trabalho do PPCAAM estabelece como uma das ações primordiais
o afastamento do adolescente do local da ameaça, o que, frequentemente, coincide com o
local de moradia da família. Conforme a cartilha sobre o programa, elaborada pela Secretaria
dos Direitos Humanos no PPCAAM,

40
A proteção é efetuada retirando a criança e o adolescente ameaçado de morte do
local de risco, preferencialmente com seus familiares, e inserindo-os em comunidade
segura. Prima-se pela garantia de sua proteção integral através de inclusão de todos
os protegidos em serviços de saúde, educação, esporte, cultura e se necessário, em
cursos profissionalizantes, políticas de assistência social e mercado de trabalho.
(SECRETARIA DOS DIREITOS HUMANOS,2014)

Diante disso, é importante que a família seja, minimamente, esclarecida sobre o que é
o programa, de modo que ela possa refletir sobre sua necessidade. É muito pertinente que
antes do acionamento do PPCAAM a equipe tenha explorado com o adolescente e sua família
a existência de alternativas, tais como a mudança do território de ameaça pelo núcleo familiar
ou mesmo a mudança do adolescente, com a indicação de outros familiares ou de pessoas de
seu convívio que possam se responsabilizar por ele em um outro território que não seja o do
local da ameaça.
Uma vez avaliado a inclusão do adolescente no PPCAAM, o programa emite seu
parecer, de modo que, caso o parecer seja favorável, a inclusão ocorrerá logo após a
progressão ou desligamento da medida socioeducativa. A inclusão do adolescente pode
ocorrer juntamente com seu núcleo familiar ou na modalidade individual. No primeiro caso, o
adolescente e sua família são colocados sob proteção em um novo território, em que o
PPCAAM avalie que não exista risco e assim será desenvolvido o acompanhamento no
sentido de promover a inserção social de toda família no novo local de moradia.
Na hipótese em que a família não se disponha a aderir ao programa ou em que o
adolescente não possua referência familiar, ele pode fazer a adesão de maneira individual.
Neste caso, o adolescente será encaminhado a uma unidade de acolhimento institucional,
sendo que o PPCAAM desenvolverá as intervenções previstas no trabalho de proteção em
parceria com a unidade na qual o adolescente tenha sido acolhido.
Destaca-se que a inclusão do adolescente em cumprimento de MSE privativas de
liberdade no PPCAAM, caso seja avaliada como pertinente pela equipe do programa, somente
ocorrerá a partir do desligamento do adolescente da medida de semiliberdade ou de
internação, visto que a restrição/privação da liberdade é incompatível com a proteção, dado
que o adolescente já se encontra sob a responsabilidade do Estado, mas em local conhecido, o
que é conflitante com o caráter sigiloso do programa de proteção.

5.3 – PROGRAMAS DE PREVENÇÃO À CRIMINALIDADE

A Política de Prevenção Social à Criminalidade se baseia em um conjunto integrado


de estratégias e de ações do Poder Público, com a participação da sociedade civil, as quais

41
têm como foco a intervenção direta nos fatores ou nas dinâmicas sociais ligados à violência e
à criminalidade. O objetivo geral desta Política é a prevenção e a redução de violências e
criminalidades e o aumento da sensação de segurança no Estado de Minas Gerais, sendo que o
seu público alvo são os grupos mais vulneráveis a violências e criminalidades (SUPEC,
2017).
Esta Política complementa as políticas de Proteção Social, mas não as substitui. A
diferença é que a primeira atua com o público que está vivenciando diretamente em
panoramas de violências e de criminalidade e sobre a dinâmica do fenômeno criminal, além
de favorecer o acesso deste público às políticas de proteção social (SUPEC, 2017).
Os programas da Política de Prevenção à Criminalidade da Secretaria de Estado de
Segurança Pública de Minas Gerais são considerados pontos da rede social de grande
relevância para o trabalho das medidas socioeducativas privativas de liberdade. Essa
afirmação se revela na possibilidade de serem realizadas articulações pelas equipes
socioeducativas com esses programas que visem à busca de informações sobre a dinâmica e o
histórico familiar do adolescente, já que tanto ele quanto sua família podem ter sido ou estar
sendo atendidos e/ou acompanhados pelos programas de prevenção social. Especificamente,
o Programa de Mediação de Conflitos e o Fica Vivo!, as quais compõem esta política de
prevenção, tem base territorial e são localizados nos Centro de Prevenção à Criminalidade,
portanto, podem contribuir para a análise das configurações do território do adolescente e
assim, auxiliar na construção do trabalho técnico nas medidas socioeducativas.
A articulação de rede com os programas da prevenção também permite a construção
de estratégias conjuntas para o acompanhamento dos adolescentes e de suas famílias,
principalmente, aqueles mais vulnerabilizados pelas situações de violência e pela dinâmica da
criminalidade.
Deve estar claro para as equipes das unidades socioeducativas as funções e os
objetivos desses programas, bem como o alcance para o atendimento ao adolescente e de suas
famílias. Neste sentido, apresentamos as principais características de cada programa que
compõe essa Política.

5.3.1 - PROGRAMA MEDIAÇÃO DE CONFLITOS

O Programa Mediação de Conflitos (PMC) da Secretaria de Estado de Segurança


Pública está presente nos Centros de Prevenção à Criminalidade e atua por meio de atividades
que proporcionam o acesso a direitos, a mediação de conflitos e a organização comunitária.
42
Neste Programa, a Mediação de Conflitos realiza a mediação comunitária, na qual tem
destaque o diálogo, a compreensão da realidade do território e a participação social com a
finalidade de construir meios pacíficos de resolução de conflitos.
O PMC tem base territorial e tem como objetivo prevenir e reduzir os índices de
violência doméstica e de violência geral, de modo a impedir que o conflito se desenvolva para
violações de direitos e criminalidade.
As formas de atuação do Programa são: atendimento individual (ações que visem
contribuir na busca de soluções para a demanda); atendimento coletivo (atuação nos casos que
envolvem interesses coletivos); projetos institucionais (ações estratégicas desenvolvidas nas
comunidades); projetos temáticos (encontros que tem como objetivo lidar com temas que
envolvem o surgimento de conflitos nos territórios). Cabe ressaltar que o PMC não tem como
objetivo ofertar soluções prontas para os conflitos apresentados pelos habitantes do território,
mas sim colaborar para que as pessoas atuem na busca de soluções para os seus problemas,
assim como a fim de que realizem uma análise coletiva e compartilhada de seus objetivos
comuns, de modo a se organizarem e se mobilizarem para enfrentar os conflitos.

5.3.2 - PROGRAMA FICA VIVO

O Programa Fica Vivo! atua tendo como público alvo jovens de 12 a 24 anos,
moradores de territórios vulneráveis e com altos índices de criminalidade onde funcionam os
Centros de Prevenção Social à Criminalidade (CPC). O trabalho desenvolvido no programa
possui foco “ [...] na prevenção e na redução de homicídios dolosos de adolescentes e jovens
[...] em áreas que registram maior concentração de homicídios.” (SUPEC, 2017)
Para tanto, o Fica Vivo! desenvolve suas ações em dois eixos de trabalho, a saber, o
eixo da Proteção Social e o eixo da Intervenção Estratégica.
No eixo Proteção Social, a partir da análise da dinâmica social das violências e da
criminalidade dos territórios, o programa promove oficinas de esporte, cultura e arte; realiza
projetos locais, de circulação e institucionais; faz atendimentos individuais dos jovens e
promove Fóruns Comunitários. Além disso, o programa articula com os serviços públicos
para encaminhamentos de adolescentes e jovens. (SUPEC, 2017)
Nota-se que no referido eixo de trabalho o foco das ações é a promoção de espaços em
que o exercício da cidadania, bem como a oportunidade de escuta e da qualificação do trânsito
social sejam ofertados aos jovens, de modo que o programa se coloca como mais um
equipamento na rede de atendimento que promove o acesso a direitos.
43
Já o eixo da Intervenção Estratégica tem como foco a “ampliação da sensação de
segurança e a legitimidade do policiamento preventivo e das ações preventivas”, de modo que
“contempla a operacionalização de Policiamento Preventivo Especializado, realizado pelo
Grupo Especializado em Policiamento de Áreas de Risco da Polícia Militar “ (GEPAR). Para
que tais ações sejam possíveis, o Programa Fica Vivo! articula interinstitucionalmente a
Secretaria de Estado de Segurança Pública (SESP), as Polícias Militar e Civil, Ministério
Público, Poder Judiciário e órgãos municipais de Segurança Pública. (SUPEC, 2017)
[...] esse eixo contempla também a formação e funcionamento dos Grupos de
Intervenção Estratégica (GIE), que têm como principal objetivo a prevenção e redução de
conflitos e rivalidades violentas por meio da ampliação da assertividade e tempestividade das
ações repressivas realizadas nas áreas de abrangência do Programa.
O acesso ao Fica Vivo! ocorre por demanda espontânea, de modo que os jovens que
desejam participar das ações desenvolvidas pelo programa podem se apresentar tanto na sede
do CPC, como nos locais em que acontecem as oficinas. As oficinas do programa
desenvolvem atividades diversificadas e que ocorrem em pontos estratégicos do território de
abrangência do CPC justamente para proporcionar proximidade dos jovens atendidos com os
responsáveis pelo desenvolvimento destas.
O Programa Fica Vivo! pode ser mais um ator a contribuir com o trabalho
socioeducativo no que diz respeito à a identificação, tanto das peculiaridades do território de
residência do adolescente, como das relações que ele estabelece em seu cotidiano. Desta
forma, o acionamento do programa pode auxiliar a equipe no processo de construção e
qualificação do caso, visto que as informações fornecidas pelo programa podem agregar ao
trabalho técnico aspectos observados na rotina do adolescente em seu território, entendendo-o
como um construto não apenas físico, mas também social e cultural.

5.3.3 CEAPA

O CEAPA (Central de Apoio e Acompanhamento às Penas e Medidas Alternativas de


Minas Gerais) oferece meios para o cumprimento integral de penas e medidas alternativas de
pessoas em cumprimento de penas restritivas de direitos encaminhadas pelo Poder Judiciário.
O objetivo deste Programa é fortalecer e consolidar as penas e medidas alternativas à prisão
no Estado de Minas Gerais através da materialização e do monitoramento das penas não
restritivas de direitos e do investimento em ações de responsabilização com liberdade.

44
Importante pontuar que o público alvo do programa tem a oportunidade de manter os
vínculos familiares e sociais, exercer sua cidadania, acessar a rede de proteção social e
cooperar com a instituição que será beneficiada com suas atividades. Além disso, um dos
objetivos específicos do Programa é trabalhar por meio da mitigação das vulnerabilidades
sociais através da promoção social. (METODOLOGIA PROGRAMA CEAPA/MG – Central
de Apoio e Acompanhamento às Penas e Medidas Alternativas de Minas Gerais).

5.3.4 PRESP

O PRESP (Programa de Inclusão Social de Egressos do Sistema Prisional) tem como


público alvo pessoas que sofreram processos de criminalização e cerceamento de liberdade. O
trabalho é realizado por meio da articulação com a rede proteção social e do incentivo ao
acesso de serviços que apontem para o aumento da escolaridade e da qualificação
profissional, com vistas à inclusão social dos egressos do Sistema Prisional e à mitigação de
vulnerabilidades referentes ao processo de criminalização e agravadas pelo regime carcerário.
O programa trabalha com indivíduos que sofreram processos de criminalização e
cerceamento de liberdade. Tem por objetivo favorecer o acesso a direitos e promover
condições para inclusão social de egressos do Sistema Prisional, minimizando as
vulnerabilidades relacionadas a processos de criminalização e acentuadas pelo
aprisionamento.
Um dos objetivos do PRESP é fortalecer os vínculos familiares de seus usuários e o
suporte sócio comunitário, além de clarificar e sensibilizar os equipamentos públicos quanto
ao atendimento as suas demandas, promovendo assim, ações que visem à minimização do
estigma posto sobre os egressos do Sistema Prisional.

6 ARTICULAÇÃO DE REDE NAS DIVERSAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS

Neste ponto da metodologia abordaremos as particularidades do trabalho em rede de


acordo com cada medida socioeducativa. Busca-se evidenciar, minimamente, as
peculiaridades das intervenções, dos processos e dos objetivos da articulação de rede dadas as
características específicas de cada medida socioeducativa isoladamente.
Para as medidas de Internação e Semiliberdade, o PIA, como um instrumento que
compõe a metodologia de trabalho da equipe técnica, deve considerar em sua construção a

45
trajetória do adolescente e de sua família na rede de atendimento. É necessário analisar a
circulação no território e nos serviços da rede, onde fizeram laço, tiveram impasses, quais
serviços acionar e por quê. Cabe verificar como se deu até então o acompanhamento realizado
pela rede de atendimento à família, de modo a balizar futuras articulações de rede na unidade
socioeducativa.

6.1 ARTICULAÇÃO DE REDE DURANTE A INTERNAÇÃO PROVISÓRIA

A atuação da equipe dos centros de internação provisória com as famílias visa


trabalhar as relações entre o adolescente e seus familiares. O referido trabalho parte da
premissa da corresponsabilidade da família em relação à medida imposta ao filho, como
descrito no ECA.
Tratando-se de um público alvo preponderantemente advindo de realidades marcadas
por diversas violações de direito, como ilustra o perfil do adolescente apresentado no SINASE
(2007, p.29), e diante da dificuldade de mudança dessa situação mesmo durante o
cumprimento da medida, como enfatizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ/2012), não
raro surgem, no atendimento das famílias, questões que convocam a equipe para que, além do
acompanhamento da medida, trabalhe o esclarecimento sobre as formas de acesso da família à
rede social.
Assim, o técnico depara-se com realidades familiares muito diversas, sendo recorrente
a necessidade de atuação de outras políticas públicas para trabalhar as questões levantadas.
Ainda que a Internação Provisória tenha como função uma abordagem mais centrada nas
relações do adolescente com a família, muitas questões paralelas perpassam tal relação, sendo
imprescindível a atuação da equipe técnica, visando o direcionamento adequado dos
problemas apresentados pela família às demais políticas públicas.
Durante o período em que o adolescente estiver acautelado provisoriamente, deve-se
realizar a orientação da família quanto ao modo de recorrer à rede socioassistencial nas
dificuldades apresentadas, priorizando o incentivo à autonomia durante o processo. Nessa
perspectiva, o acesso da família à rede não é restrito à violação de direitos: deve ser
desenvolvida em uma visão ampla, de acesso básico a serviços públicos nas áreas de saúde,
educação, assistência social, previdência, trabalho e segurança. Na perspectiva da garantia e
da promoção dos direitos, deve-se pensar na rede que precisa ser convocada a atuar e nas
orientações que devem ser repassadas aos adolescentes e seus familiares, conforme for
pertinente a cada caso.

46
Considerando-se a peculiaridade da Internação Provisória, prazo máximo de 45 dias, é
importante ter em perspectiva que a articulação da rede deve ocorrer de maneira ágil. Desta
forma, no período em que o adolescente estiver acautelado provisoriamente, a equipe
socioeducativa deve se empenhar em identificar os pontos essenciais da rede, com destaque
para os serviços nos quais a família possui vínculos e acioná-los, seja com o objetivo de
reunir informações que deverão constar no relatório interdisciplinar a ser enviado ao
judiciário, ou para sensibilizar os serviços em relação a alguma demanda identificada pela
equipe no atendimento ao adolescente ou à família, garantindo-se que ambos sejam orientados
quanto ao funcionamento, às formas de acesso a eles e os serviços ofertados.
É importante ainda, realizar a orientação da família em relação a serviços dos quais ela
pode se valer para superar alguma situação de vulnerabilidade identificada pela equipe, mas
que até então lhes são desconhecidos, de maneira que caso o adolescente seja liberado ao final
do período da internação provisória, a família possa minimamente ter ciência da rede que
pode vir a acessar.
Assim, cabe destacar que os encaminhamentos do adolescente devem ser discutidos
em equipe e com a família, para que esta se aproprie da ação e dê continuidade a ela, ainda
que o adolescente não receba uma medida socioeducativa. Logo a articulação, “[...]deve
contribuir para o alcance de maior grau de independência familiar e pessoal e qualidade nos
laços sociais, devendo, para tanto, primar pela integração entre o acesso a serviços [...]”
(Caderno do CREAS, 2011, p.25).
Isso posto, podem-se elencar alguns elementos imprescindíveis para trabalhar a
temática da rede com as famílias:

a) Conhecer os equipamentos e serviços da rede na cidade: a preparação para a


articulação da rede envolve o conhecimento e o mapeamento prévios dos serviços
disponíveis na cidade sede da unidade bem como na de origem do adolescente. Um
mapeamento de parcerias, serviços e colaboradores articulados, formalmente e
informalmente, envolve: nome do parceiro, área de atuação, público-alvo, breve
descrição da metodologia de atendimento (o que oferece, como oferece), e formas de
acesso.
Essa sistematização de informações necessita de constante atualização por parte da
Unidade como também de monitoramento, para identificar os pontos de alcance e
impasse na articulação das parcerias. Isso permite compreender como estes fatores

47
influenciam e interferem no atendimento às famílias e aos adolescentes para, então,
reconhecer a demanda de articulações em âmbito político-institucional por parte dos
gestores.

b) Conhecer a rede social da família: partindo do conhecimento e estudo prévio da rede


social na cidade, o técnico deve abordar, em atendimento com as famílias, o percurso
pela rede e as relações sociais que estabelecem em sua comunidade. Os serviços pelos
quais os familiares já passaram têm muito a acrescentar no acompanhamento dos
casos, sendo possível identificar com quais políticas o adolescente e sua família têm
relação preestabelecida, e quais as eventuais demandas apresentadas.
Conhecer a trajetória da família na rede não tem, necessariamente, como objetivo
imediato o encaminhamento, mas sim entender o modo como a família se desloca em
suas dificuldades, a quem recorre, quais as políticas que já foram acessadas pelos
adolescentes, como é a sua relação com os demais equipamentos da rede, entre outros.

c) Orientações para acesso da família à rede: O direcionamento das famílias para os


serviços da rede pública deve ser realizado com informações claras e detalhadas e,
sempre, precedido de um contato da equipe técnica com as referências dos respectivos
serviços.
Para a identificação dos serviços necessários para cada família, é imprescindível
respeitar as peculiaridades de cada uma delas, não tendo como objetivo encaixá-las em
padrões preestabelecidos socialmente. Assim, as famílias devem ser esclarecidas quanto ao
melhor atendimento de sua demanda identificada, sendo fundamental sua participação nessa
decisão, retirando-a do lugar de mero objeto de intervenção. Para tanto, a escuta da família
tem um lugar primordial, visto que em seu discurso será possível identificar suas
fragilidades e potencialidades, de modo que os encaminhamentos possam ser realizados com
vistas a minimizar as fragilidades e a reforçar as potencialidades, objetivando que as
famílias possam se elevar à condição de protagonistas de suas próprias ações,
desenvolvendo autonomia em relação à medida socioeducativa.
Deve-se, ainda, evitar a judicialização dos encaminhamentos, recorrendo à justiça
somente nos casos em que a família já não responde à unidade ou em situações que
ultrapassem nossa mediação (casos de violência intrafamiliar, entre outros).
Em casos de dificuldade de acesso à rede ou de sensibilização da família, a aplicação de uma

48
medida protetiva poderá ser solicitada ao Poder Judiciário por meio do Relatório
Interdisciplinar que circunstancie a necessidade de aplicação da medida protetiva.
É importante ressaltar que a medida de Internação Provisória é atravessada pela
imprevisibilidade do tempo e, portanto é essencial a identificação da demanda dos direitos
violados da família e do adolescente e a intervenção da equipe, sempre que necessária,
visando à fluidez e à autonomia na relação entre a família e a rede de atendimento.
Dado o caráter altamente dinâmico da rotina e do fluxo de adolescentes nos centros de
internação provisória, pensar em articulações complexas torna-se um enorme desafio. Diante
disso, é importante reiterar que as articulações realizadas devem ser construídas com o
adolescente e também com a família, de modo que eles se reconheçam enquanto sujeitos de
direitos e possam investir na busca pelos serviços da rede mesmo que o adolescente seja
desligado da medida de internação provisória sem ser sentenciado a nenhuma outra medida
socioeducativa.

6.2 ARTICULAÇÃO DE REDE NA MSE DE INTERNAÇÃO-SANÇÃO

A internação-sanção é medida privativa de liberdade que pode ser aplicada


judicialmente quando há descumprimento reiterado e injustificado de medida socioeducativa
(menos gravosa) anteriormente imposta ao adolescente. Destina-se aos adolescentes em
descumprimento das MSE de Liberdade Assistida, Prestação de Serviços à Comunidade ou de
Semiliberdade. Conforme estabelecido no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei
8069/90), a internação-sanção é medida privativa de liberdade e que, assim como a internação
provisória, também comporta a determinação de prazo, não podendo sua duração exceder a
três meses (90 dias).
O trabalho da unidade que executa a internação-sanção pauta-se, principalmente, na
articulação da rede social para desenvolver alternativas junto aos adolescentes para o
descumprimento da medida socioeducativa a qual foi inicialmente sentenciado. Sendo assim,
a unidade em que o adolescente cumpre a internação-sanção, desde o início, está colocada
como parte de uma rede que tem como objetivo o cumprimento da medida socioeducativa
pelo adolescente. Seu ponto de partida, assim, é a provocação de outra medida, menos
gravosa, que, diante de impasses no cumprimento da mesma, busca a inserção desta
instituição na trajetória do adolescente para intervir junto aos casos.
Trata-se de uma intervenção que é conjunta, ao lado, não se constituindo hierarquias
entre os parceiros envolvidos, mas sim um compartilhamento do trabalho em relação ao

49
adolescente. Disso advém que o trabalho em parceria é um pressuposto básico para as
unidades executoras da internação-sanção, de maneira que o contato com os demais serviços,
principalmente com a medida de origem do adolescente, e a criação de espaços de discussão e
construção coletivas, são essenciais para a realização de intervenções a contento.
Assim sendo, o trabalho em rede na internação-sanção exige abertura e disponibilidade
dos atores envolvidos, dado que no período de cumprimento, embora o adolescente esteja em
uma medida privativa de liberdade, ele não deixa de estar ligado à MSE de origem, de modo
que deve manter-se em perspectiva o seu retorno para a medida anterior. De imediato esse
fato já nos implica com a manutenção e com o fortalecimento do vínculo do adolescente com
a MSE de origem, bem como com os encaminhamentos construídos antes de ser configurado
o descumprimento. Desta forma, verifica-se que objetivo central da internação-sanção é
contribuir para que a conversão da trajetória do adolescente em relação ao descumprimento
das MSE seja possível.
Para tanto, um modelo de rede mais atual se faz necessário, o qual supõe relações mais
horizontalizadas e exige disposição para uma articulação socioeducativa que:

 Abre-se para acolher a participação de várias políticas públicas setoriais;


 Derruba limites de serviços que agem isoladamente;
 Inclui a participação da família e da comunidade;
 Acolhe o território no qual se localizam os adolescentes.

Além de ter a medida de origem como ponto de partida da internação-sanção, o


trabalho das unidades executoras deve voltar-se à consolidação de conexões do adolescente
com a cidade, que o permitam concluir a medida de origem, e ir além dessa medida,
despertando-o para um projeto de vida alheio à criminalidade. Tais articulações deverão ser
discutidas com as equipes das medidas de origem para garantir a continuidade e o
acompanhamento destes processos após o cumprimento da internação-sanção.
Na internação-sanção é possível que a equipe realize a articulação com a rede para o
adolescente, mas o efetivo encaminhamento dele somente será possível após o período da
sanção. Desta forma, a articulação com a rede durante a internação-sanção deve primar para a
construção do retorno do adolescente para a medida de origem. Assim, todos os parceiros
envolvidos no acompanhamento do adolescente devem se debruçar sobre esta questão,
despertados pela iniciativa da unidade socioeducativa. Apesar do adolescente não ser

50
encaminhado durante a internação-sanção, a construção da rede ocorre a partir da admissão do
adolescente, considerando-o sujeito ativo no processo, de modo que ele tende a apontar as
intervenções necessárias e se reconhecer nas articulações propostas, resultando em maior
possibilidade de adesão, bem como em mais efetividade nas ações.
É importante, ainda, considerar a rede enquanto território pelo qual o adolescente e
seus familiares circulam voluntariamente, de modo que do lado de cada adolescente, a
unidade realizará um levantamento dos equipamentos da rede por onde ele e sua família já
estiveram, efetuando o contato com estes parceiros quando pertinente ao caso.
Um ponto de extrema importância nesta relação é o cuidado com as parcerias. A
lógica dos encaminhamentos, quando houver, deve sempre se pautar no fluxo de referência e
contra referência, preferencialmente os que já foram estabelecidos pelas medidas de
Liberdade Assistida, Prestação de Serviços à Comunidade ou Semiliberdade, o que estabelece
um trabalho conjunto e contínuo com os parceiros da instituição e com as equipes das diversas
medidas socioeducativas. Tal cuidado parte da ideia de valorização dos parceiros, dando a
cada um a possibilidade de contribuir com o trabalho a partir de sua perspectiva de atuação.
Neste ponto, é essencial localizar junto aos técnicos da medida cujo descumprimento
gerou a internação-sanção os encaminhamentos realizados e como o adolescente vem
conduzindo sua circulação pela rede, no intuito de reforçar os possíveis vínculos do
adolescente com a rede ou construir novas possibilidades, sempre cuidando de articular as
ações com a equipe da medida de origem, visto a necessidade tais sejam contínuas e
emancipatórias, para que o adolescente desenvolva autonomia na sua circulação pela rede,
transcendendo o tempo e as intervenções das medidas socioeducativas.
Uma rede comporta os enlaçamentos do adolescente com a cidade, parentes, amigos e
instituições. Assim, cada sujeito imprime à sua rede uma dinâmica que lhe é própria, devendo
ser levada em consideração no momento de traçar com o adolescente seu caminho pelos
territórios construídos e reconstruídos na medida socioeducativa de origem. Entre as ações de
articulação previstas para a internação-sanção, pode-se citar:

 Estudos de caso intersetoriais, principalmente envolvendo a medida


socioeducativa de origem;
 Pactuação de fluxos específicos com parceiros próximos, como saúde,
educação, assistência social, garantir a inclusão do adolescente no final da
internação-sanção;
 Mapeamento de parceiros externos referentes aos eixos da medida;

51
 Apresentação institucional do trabalho realizado pela unidade a demais
parceiros, como saúde, assistência social, educação, entre outros.
 Mapeamento junto ao adolescente e à medida de origem, dos equipamentos e
serviços pelos quais ele e sua família já passaram.

Deste modo, a equipe da unidade deve buscar localizar pontos de embaraço do


adolescente em relação à rede, construindo com ele novas possibilidades a partir da oferta de
um espaço diferenciado de escuta.
É essencial que a equipe da unidade se articule com a equipe da medida de origem, a
fim de possibilitar ao adolescente vislumbrar o seu retorno a ela, terminado o prazo da sanção.
Para tanto, o trabalho da equipe que encontra o adolescente neste momento peculiar da
internação-sanção passa por apresentar a rede ao adolescente, bem como às suas famílias, para
que lhes seja possível articular e manejar a rede de maneira autônoma, para isso, estratégias
de sensibilização dos adolescentes e suas famílias devem ser cuidadosamente traçadas, para
que a o resultado seja exitoso. O trabalho da equipe da internação-sanção passa, ainda, pelo
processo de sensibilização da rede em relação às demandas da família. Para que a mesma seja
devidamente acolhida quando buscar os serviços, a unidade não pode se furtar de lidar com os
embaraços e com as inflexibilidades que podem surgir nas articulações, de modo que não
raramente terá que lidar com situações conflituosas, mas que devem ser mediadas pensando
no retorno do adolescente a seu território.

6.3 ARTICULAÇÃO DA REDE NA MSE DE SEMILIBERDADE

A medida socioeducativa de semiliberdade constitui-se em medida restritiva de


liberdade, na qual o adolescente está sob responsabilidade compartilhada entre Estado e
família, possuindo a prerrogativa de acessar os serviços disponíveis para a população em
geral. Neste sentido, a articulação da rede social compreende um trabalho ativo da casa de
semiliberdade, na busca de parcerias para realizar os encaminhamentos necessários para cada
adolescente, na perspectiva da garantia dos direitos.
Na semiliberdade, a intersetorialidade é o princípio norteador da formação de rede. A
articulação da rede e a interação com parceiros precisa ser constante, considerando que os
eixos da medida só são possíveis se trabalhados em conjunto com as diversas instituições que
colaboram para o alcance do objetivo deste trabalho. É indispensável que haja o acionamento
de políticas, tais como: educação, saúde, assistência social, entre outros exemplos. Costa
(2011) ilustra que:

52
A execução da política de atendimento pressupõe e requer uma articulação orgânica
e permanente com todas as demais políticas e com o sistema de administração de
justiça. É o que chamamos de incompletude institucional das ações desenvolvidas
nessa área por um conjunto de instituições distribuído pelas mais diversas áreas do
Estado brasileiro nos níveis federal, estadual, municipal e também pelas
organizações da sociedade civil que atuam nesse campo. (COSTA, 2017)

Logo, tem-se na semiliberdade a articulação de parcerias como um dos pontos centrais


para que as casas de semiliberdade não se fechem em seus muros, já que a lógica da
incompletude institucional nos aponta que o trabalho durante o cumprimento da medida
precisa passar por vários atores. A semiliberdade trabalha a partir da inserção do adolescente
na cidade, sendo fundamental o estabelecimento de alianças efetivas com parceiros e serviços
da rede local, que possibilitem a sua inserção e circulação nos espaços de forma qualificada,
reconhecendo-o como um cidadão, um sujeito de direitos.
Considerando-se que o público alvo da MSE é frequentemente advindo de realidades
marcadas por diversas violações de direito, como ilustra o perfil do adolescente apresentado
no SINASE (2007, p.29) e diante da dificuldade de mudança dessa situação mesmo durante o
cumprimento da medida, não raro surgem no atendimento das famílias questões que
convocam a equipe para que, além do acompanhamento da medida socioeducativa, trabalhe o
esclarecimento e encaminhamento da família à rede social, considerando as diferentes
realidades familiares, comuns no cotidiano de trabalho da semiliberdade.
Cabe ressaltar que o encaminhamento à rede deve estar pautado, para além da garantia
de direitos, no “respeito à autonomia das famílias e indivíduos, tendo em vista o
desenvolvimento das capacidades e potencialidades para o enfrentamento e superação de
condições adversas oriundas das situações vivenciadas” (Caderno CREAS, 2011, p.24). Trata-
se de fomentar o acesso e de incentivar e promover a busca autônoma da família e do
adolescente pelos serviços dos quais necessitam.
Durante o acompanhamento dos adolescentes e de suas famílias na semiliberdade cabe
eleger intervenções e espaços que proporcionem à família e ao adolescente o lugar de
protagonistas, de modo que ambos possam se reconhecer como parte essencial do processo,
dado que é imperioso trabalhar a autonomia dos sujeitos em relação às MSE, buscando-se que
família e adolescente continuem a acessar qualificadamente a rede, mesmo após o
desligamento.
Nessa perspectiva, o encaminhamento da família à rede não é restrito à violação de
direitos, mas pressupõe uma perspectiva ampla, de acesso básico a serviços públicos nas áreas
de saúde, educação, assistência social, previdência, trabalho e segurança, e outras que sejam

53
pertinentes a cada caso. Na semiliberdade, encaminhar um familiar à rede pode significar
também uma extensão do atendimento ao adolescente em cumprimento de medida
socioeducativa, criando-se outras possibilidades de abordagem e escuta para o adolescente e
sua família, que podem contribuir, respectivamente, para os processos de responsabilização e
corresponsabilização objetivados pela medida.
A construção de encaminhamentos na semiliberdade deve ser discutida em equipe e
com a família para que essa se aproprie da ação e realmente faça um uso do serviço. Para uma
maior qualificação do encaminhamento, é preciso que o acompanhamento esteja presente
nesse processo. Logo, “o acompanhamento [...] deve contribuir para o alcance de maior grau
de independência familiar e pessoal e qualidade nos laços sociais, devendo, para tanto, primar
pela integração entre o acesso a serviços [...]” (Caderno do CREAS, 2011, p.25).
Isto posto, pode-se elencar alguns elementos imprescindíveis para trabalhar rede com
as famílias:
a) Conhecer os equipamentos e serviços da rede na cidade: a preparação para a
articulação da rede envolve o conhecimento e o mapeamento dos serviços
disponíveis na cidade sede da unidade bem como na de origem do adolescente
quando for o caso. Um mapeamento de parcerias, serviços e colaboradores
articulados, formalmente e informalmente, envolve: nome do parceiro, área de
atuação, público-alvo, breve descrição da metodologia de atendimento (o que
oferece, como oferece), e formas de acesso.
Essa sistematização de informações necessita de constante atualização por parte da
Unidade como também de monitoramento, para identificar os pontos de alcance e
impasse na articulação das parcerias. Isso permite compreender como estes fatores
influenciam e interferem no atendimento às famílias e aos adolescentes para,
então, reconhecer a demanda de articulações em âmbito político-institucional por
parte dos gestores.

b) Conhecer a rede social da família: partindo do conhecimento e estudo prévio da


rede social da cidade, a equipe deve abordar em atendimento com cada família seu
percurso na rede. Nesse momento, pode-se localizar melhor tanto a trajetória do
adolescente no seio familiar, quanto os movimentos da família na comunidade em
geral.
Os serviços pelos quais os familiares já passaram têm muito a acrescentar no

54
acompanhamento dos casos, sendo possível identificar com quais políticas o
adolescente e sua família tem relação preestabelecida, e quais as eventuais
demandas apresentadas. Conhecer a trajetória da família na rede não tem como
objetivo imediato o encaminhamento, mas sim entender o modo como a família se
desloca de seus impasses, a quem recorrem, quais as políticas que já foram
acessadas pelos adolescentes, como é a relação das famílias com os demais
equipamentos da rede, entre outros. Como resultado dessas ações espera-se que as
referências do caso possam identificar as demandas da família e contrapô-las com
os serviços disponíveis e os serviços já acessados, de modo que conjuntamente à
família possam ser construídas alternativas e encaminhamentos que possam
efetivamente impactar as demandas. Este trabalho deve ser realizado de acordo
com os prazos previstos no PIA, sendo orientado pelo Levantamento de Dados
iniciais e pela Avaliação Inicial.

c) Encaminhamentos da família à rede: os encaminhamentos não são o ponto de


partida do trabalho do técnico da semiliberdade com as famílias dos adolescentes
em cumprimento de medida. Contudo, como representantes de uma política
pública essencialmente integrada à rede, a equipe da unidade deve estar atenta às
eventuais necessidades que se apresentam durante os atendimentos aos familiares.
O ato de encaminhar um familiar à rede pauta-se na prevenção do agravamento das
situações atendidas (Caderno do CREAS, 2011). Para tanto, não se trata apenas de
direcionar as famílias para demais serviços, mas sim de uma condução e manejo
qualificados de forma a aumentar a eficácia do encaminhamento pretendido. Ou
seja, encaminhar familiares não deve estar pautado no cumprimento de ordens, no
“cumpra-se”. O técnico é corresponsável por aquilo que identifica e encaminha à
rede, sendo necessário um trabalho qualificado no momento de redirecionar as
demandas dos familiares.
Para tanto, é imprescindível respeitar as peculiaridades da família, não tendo
como objetivo encaixá-las em padrões estabelecidos socialmente. Assim, as
famílias devem se identificar nos encaminhamentos realizados pela equipe técnica
da semiliberdade. A ação de encaminhar, então, deve ser construída em
atendimento, sendo fundamental que a família participe dessa decisão, não como
objeto de intervenção, mas como sujeito capaz de opinar sobre sua própria vida.

55
Para tanto, deve-se evitar a judicialização dos encaminhamentos, recorrendo à
justiça apenas nos casos em que a família já não responde à unidade ou em
situações que ultrapassem nossa mediação (casos de violência intrafamiliar, entre
outros).
Para que a família possa desenhar seu percurso na rede mais ativamente, ainda
que conduzida pela unidade, é necessário que o fluxo com o parceiro esteja claro e
estabelecido, para não ocasionar maiores prejuízos, como o não atendimento da
família. Desta forma, a unidade precisa delimitar quando é o caso de chamar a
família à rede e quando é o caso de chamar a rede para a família.
Trata-se de uma nuance que perpassa os diversos tipos de encaminhamentos,
sendo que a família é encaminhada à rede quando houver essa possibilidade
colocada e trabalhada anteriormente pela unidade com o parceiro. Já o outro
movimento, chamar a rede para a família, torna-se muito importante nos casos em
que o percurso da família já é extenso na rede, a não adesão aos serviços se repete,
ou há qualquer problema no fluxo estabelecido entre a casa e o parceiro. Assim,
nesses casos, antes de colocar a família novamente no movimento de ir até outro
serviço, é crucial que os serviços estejam alinhados para afinar as propostas e o
direcionamento da atuação, o que de imediato já coloca em destaque a
necessidade de comunicação e de articulação da casa de semiliberdade com os
serviços e equipamentos da rede.

d) Acompanhar o encaminhamento: após encaminhar uma família à rede, o técnico


tem por função acompanhar o retorno desse encaminhamento, balizando seus
efeitos no cumprimento da medida do adolescente e na corresponsabilização da
família pela medida do adolescente. A forma como a conversa com a rede se dará,
seja através de contato telefônico, visita institucional ou estudo de caso, deve ser
planejada de acordo com os apontamentos do caso. Em muitos deles será
necessário esclarecer aos parceiros acerca da medida socioeducativa de
semiliberdade, tanto no sentido de apresentá-la, quanto no sentido de desconstruir
os possíveis pré-conceitos que possam surgir. Porém, há que se considerar, na
articulação com a rede, o caráter sigiloso da Justiça da Infância e da Adolescência,
o que impossibilita a revelação do ato infracional que gerou a medida, de modo
que a equipe da unidade deve observar no processo de trabalho a pertinência das

56
informações que socializa, bem como a necessidade de que as mesmas sejam
compartilhadas.

Considerando-se que a MSE de semiliberdade possui a peculiar prerrogativa de


permitir que o adolescente circule sem monitoramento por diversos espaços da cidade,
destaca-se o potencial promotor de autonomia que tal medida possui, especialmente no que se
refere ao encaminhamento e inserção do adolescente e de sua família na rede social. É
importante ressaltar que a medidas socioeducativas são perpassadas pelo princípio da
brevidade. Assim, o trabalho de inserção do adolescente e da família na rede intersetorial, ou
a mediação da relação família/rede, deve se dar de modo a possibilitar que os sujeitos
construam relações com a rede que possam sustentar autonomamente após o encerramento da
MSE aplicada ao adolescente. Vale lembrar que o sinônimo de encaminhamento é “ensinar o
caminho a”, devendo o trabalho ser conduzido de forma a contribuir para a promoção do
protagonismo da família.

6.4 ARTICULAÇÃO DE REDE NA MSE DE INTERNAÇÃO

A MSE de internação é uma medida privativa de liberdade, que não comporta


determinação de prazo, podendo ter duração máxima de três anos. O tempo de cumprimento
da internação varia de acordo com a capacidade de resposta do (a) adolescente frente aos
eixos norteadores da MSE, a partir dos quais se constroem os objetivos e as pactuações do
Plano Individual de Atendimento. No decorrer do trabalho socioeducativo a articulação da
rede social é uma estratégia tanto para garantir que sejam dadas aos (às) adolescentes as
oportunidades de acessar espaços e serviços que contribuam para o cumprimento da MSE,
como para despertá-los quanto a outras alternativas de vida, colaborando com a construção de
cidadania e com a defesa e a garantia de seus direitos, que precisa extrapolar os limites
temporais e físicos da intervenção socioeducativa.

A medida de internação [...] leva, no mais das vezes, à necessidade de satisfação de


direitos no interior de Unidades de atendimento. No entanto, assim como nas demais
medidas socioeducativas, sempre que possível esse atendimento deve acontecer em
núcleos externos, em integração com a comunidade e trabalhando os preconceitos
que pesam sobre os adolescentes sob medida socioeducativa [...] (SINASE, p.24)

Para tanto, a atuação da equipe técnica com as famílias, durante o cumprimento da


medida de internação, visa trabalhar as relações entre o(a) adolescente e seus familiares. Esse
trabalho parte da corresponsabilidade da família em relação à medida imposta ao (à)

57
socioeducando(a), conforme descrito no ECA. Contudo, para alcançar a corresponsabilidade
não basta às equipes convocar a família para o acompanhamento da medida, faz-se necessário,
localizar, na dinâmica familiar, os pontos passíveis de fortalecimento, para que a família
possa auxiliar o(a) adolescente em seu percurso na medida socioeducativa.
Considerando-se que o público alvo da MSE de internação é, frequentemente, advindo
de realidades marcadas por diversas violações de direitos, como ilustra o perfil do adolescente
apresentado no SINASE (2007, p.29) e diante da dificuldade de mudança dessa situação
mesmo durante o cumprimento da medida, não raro surgem no atendimento às famílias
questões que convocam a equipe para que, além do acompanhamento da medida
socioeducativa, trabalhe o esclarecimento e encaminhamento da família à rede social.
Assim, a equipe depara-se com realidades familiares muito diversas, sendo comum a
necessidade da atuação de outras políticas públicas para trabalhar as questões levantadas.
Ainda que os técnicos da medida socioeducativa de internação possuam como função uma
abordagem mais centrada nas relações do adolescente com a família, muitas questões
paralelas - de cunho afetivo, social, econômico, dentre outros - perpassam tal relação, sendo
imprescindível o direcionamento correto dos problemas apresentados pela família às políticas
públicas pertinentes.
Cabe ressaltar que o encaminhamento à rede deve estar pautado, para além da garantia
de direitos, no “respeito à autonomia das famílias e indivíduos, tendo em vista o [...]
desenvolvimento das capacidades e potencialidades para o enfrentamento e superação de
condições adversas oriundas das situações vivenciadas” (Caderno CREAS, 2011, p.24).
Trata-se, pois, de fomentar o acesso e de incentivar e promover a busca autônoma da
família e do(a) adolescente pelos serviços dos quais necessitam. Os encaminhamentos devem
ser realizados de maneira que a família aprenda o modo de recorrer à rede social em suas
dificuldades, incentivando sua independência em relação à medida socioeducativa de
internação. Então, o trabalho refere-se, primordialmente, a eleger intervenções e espaços que
proporcionem à família e ao (à) adolescente, dentro do possível, o lugar de protagonista, de
forma que ambos possam se reconhecer como parte essencial do processo, dado que é
imperioso que a autonomia dos sujeitos em relação às MSE seja fortalecida para que, mesmo
quando a MSE vier a ser encerrada, a família e o (a) adolescente continuem a acessar a rede
qualificadamente. Esse trabalho de construção do reconhecimento pelo (a) adolescente e de
sua família como integrantes do processo de inclusão na rede pode ser realizado através de

58
atendimentos com ambos, de forma a esse processo ser realizado simultaneamente e para que
todos possam expor seus interesses, necessidades e objetivos.
Nessa perspectiva, o encaminhamento do(a) adolescente e da família à rede não é
restrito às situações de violação de direitos, pressupondo atuação em uma perspectiva ampla
de acesso básico aos serviços públicos nas áreas de saúde, educação, assistência social,
previdência, trabalho e segurança, e outras que sejam pertinentes a cada caso. Encaminhar um
familiar à rede pode significar também, uma extensão do atendimento ao (à) adolescente em
cumprimento de medida socioeducativa, criando-se outras possibilidades de abordagem e
escuta para o(a) socioeducando(a) e sua família, contribuindo, respectivamente, para os
processos de responsabilização e corresponsabilização objetivados pela medida, os quais
constituem o foco das ações estratégicas pactuadas no Plano Individual de Atendimento.
A construção de encaminhamentos na internação deve ser discutida em equipe e com a
família para que esta se aproprie da ação e realmente faça um uso qualificado do serviço.
Sempre que for possível, a família deve ser envolvida na execução dos encaminhamentos
propostos, acompanhando efetivamente o(a) adolescente. Os momentos em que será
pertinente a participação da família devem ser definidos após avaliação da equipe
socioeducativa, preferencialmente, realizada em estudo de caso em que participem a equipe
técnica e a equipe de segurança. A proposta do encaminhamento ao (à) adolescente deverá ser
discutida com este e sua família por meio de atendimento técnico, sendo uma estratégia de
sensibilização dos familiares quanto à corresponsabilização pela MSE, assim como para
integrá-los ao processo de inclusão do(a) socioeducando (a) nos diversos espaços.
Para uma maior qualificação do encaminhamento, é preciso que o acompanhamento
esteja presente nesse processo. Logo, “o acompanhamento [...] deve contribuir para o alcance
de maior grau de independência familiar e pessoal e qualidade nos laços sociais, devendo,
para tanto, primar pela integração entre o acesso a serviços [...]” (Caderno do CREAS, 2011,
p.25).
Isto posto, pode-se elencar alguns elementos imprescindíveis para trabalhar rede com
as famílias:
a) Conhecer os equipamentos e serviços da rede na cidade: a equipe técnica deve
estar preparada para a articulação da rede. Sendo assim, é necessário que haja
conhecimento prévio e um mapeamento dos serviços disponíveis na cidade em que a
unidade se localiza e na de origem do adolescente.

59
Um mapeamento de parcerias envolve: nome do parceiro, área de atuação, público-
alvo, breve descrição da metodologia de atendimento (o que oferece, como oferece),
formas de acesso. Essa sistematização de informações necessita de constante
atualização, cabendo à unidade se organizar, periodicamente, de modo a manter o
mapeamento em dia.
Mapear a rede com os atores, serviços e colaboradores articulados, formalmente e
informalmente, pela unidade de internação, nos auxilia a compreender os pontos de
alcance e impasse na articulação e a compreender como esses fatores influenciam e
interferem no atendimento às famílias.
Destaca-se que, ao se reconhecer aspectos que demandam articulação e formalização
de parcerias e a construção de fluxos interinstitucionais, os gestores da unidade
socioeducativa (Diretor Geral e Diretor de Atendimento) e Diretoria de Abordagem Familiar e
Articulação de Rede Social deverão participar das discussões e articulações com a instituição
com a qual será realizado o trabalho. Ressalta-se que esta configuração não exclui a
participação técnica no processo, no entanto, é importante salientar a responsabilidade da
DAF no que diz respeito ao diálogo com a rede de atendimento socioassistencial, bem como a
atribuição do diretor de atendimento de “promover e organizar articulações de parcerias para
qualificação do atendimento ao adolescente” e do diretor geral de “articular e representar
institucionalmente a unidade nos espaços políticos, institucionais, entre outras” (SUASE,
2014).
b) Conhecer a rede social da família: partindo do conhecimento e estudo prévio da rede
social da cidade, a equipe deve abordar em atendimento com cada família seu percurso
na rede. Nesse momento, pode-se localizar melhor tanto a trajetória do adolescente no
seio familiar, quanto os movimentos da família na comunidade em geral.

Os serviços pelos quais os familiares já passaram têm muito a acrescentar no


acompanhamento dos casos, sendo possível identificar com quais políticas o (a)
adolescente e sua família têm relação preestabelecida, e quais as eventuais demandas
apresentadas.
Conhecer a trajetória da família na rede não tem como objetivo imediato o
encaminhamento, mas sim entender o modo como a família se desloca de seus
impasses, a quem recorrem, quais as políticas que já foram acessadas pelos
adolescentes, como é a relação das famílias com os demais equipamentos da rede,
entre outros.
60
Como resultado dessas ações espera-se que os técnicos de referência do caso possam
identificar as demandas da família e contrapô-las com os serviços disponíveis e os
serviços já acessados, de modo que conjuntamente à família possam ser construídas
alternativas e encaminhamentos que possam efetivamente impactar as demandas. Este
trabalho deve ser realizado de acordo com os prazos previstos no PIA, sendo orientado
pelo Levantamento de Dados iniciais e pela Avaliação Inicial.

c) Encaminhamentos da família à rede: os encaminhamentos não são o ponto de


partida do trabalho do técnico com as famílias dos adolescentes em cumprimento de
medida de internação. Contudo, como representantes de uma política pública
essencialmente integrada à rede, deve-se estar atento às eventuais necessidades que se
apresentam durante os atendimentos aos familiares.
O ato de encaminhar um familiar à rede pauta-se na prevenção do agravamento das
situações de vulnerabilidade identificadas (Caderno do CREAS, 2011). Desta forma,
na construção do encaminhamento da família à rede, há que se ter clareza do alcance
do trabalho pelas instituições acionadas e das possibilidades de enfrentamento que o
encaminhamento apresenta.
Desta forma, não basta apenas direcionar as famílias para os serviços, é preciso que a
equipe adote uma postura comprometida, realizando uma condução e um manejo
qualificados de forma a contribuir para a eficácia do encaminhamento pretendido.
Para tanto, é imprescindível respeitar as peculiaridades da família, de modo que as
ações não visem padronizar comportamentos e “encaixar” as famílias em modelos
preestabelecidos socialmente.
É fundamental que as famílias participem da construção dos encaminhamentos
realizados pela unidade para que elas possam se identificar com eles. Desta forma, a
ação de encaminhar deve ser construída em atendimento, sendo importante que a
família compreenda sua finalidade e participe dessa decisão, não como objeto de
intervenção, mas como sujeito capaz de fazer escolhas e opinar sobre sua própria vida.
Sendo assim, deve-se evitar a judicialização dos encaminhamentos, recorrendo à
justiça apenas nos casos em que a família já não responde à unidade ou em situações
que ultrapassem nossa mediação (casos de violência intrafamiliar, entre outros).
É necessário que o fluxo com os atores da rede esteja claro e estabelecido a fim de que
a família possa desenhar seu percurso na rede mais ativamente, ainda que conduzida
pela unidade, como também para não ocasionar maiores prejuízos, como o não
61
atendimento da família. Dessa forma, a unidade precisa delimitar quando é o caso de
chamar a família à rede e quando é o caso de chamar a rede para a família. Trata-se de
uma nuance que perpassa os diversos tipos de encaminhamentos, sendo que a família é
encaminhada à rede quando houver essa possibilidade colocada e trabalhada
anteriormente pela unidade com o parceiro. Já o outro movimento, chamar a rede para
a família, torna-se muito importante nos casos em que o percurso da família já é
extenso na rede, a não adesão aos serviços se repete, ou há qualquer problema no fluxo
estabelecido entre a unidade e o parceiro. Assim, nesses casos, antes de colocar a
família novamente no movimento de ir até outro serviço, é crucial que os serviços
estejam alinhados, para afinar as propostas e o direcionamento da atuação, o que de
imediato já coloca em destaque a necessidade de comunicação e de articulação do
centro socioeducativo com os serviços e equipamentos da rede.
d) Acompanhar o encaminhamento: após encaminhar uma família à rede, o técnico
tem por função acompanhar o retorno dessa ação, balizando seus efeitos no
cumprimento da medida do adolescente e na corresponsabilização da família pela
medida. É importante ainda, retomar com os parceiros o momento da efetivação dos
encaminhamentos, identificando possíveis pontos de trabalho com o adolescente e
com a família. Ressalta-se, mais uma vez, que anteriormente ao encaminhamento é
necessário esclarecer aos parceiros acerca da medida socioeducativa de internação,
tanto no sentido de apresentá-la, quanto no sentido de desconstruir os possíveis pré-
conceitos que possam surgir. Evitando que no momento em que a família ou o
adolescente se apresente aos serviços eles possam ser tratados de forma inadequada e
preconceituosa.

É importante ressaltar que a medida socioeducativa é perpassada pelo princípio da


brevidade. Assim, o trabalho de inserção do (a) adolescente e da família na rede social ou a
mediação da relação família/rede deve-se dar de modo a possibilitar que os sujeitos construam
vínculos com a rede os quais possam sustentar, autonomamente, após o desligamento do (a)
adolescente. Vale lembrar que o sinônimo de encaminhamento é “ensinar o caminho a”,
devendo o trabalho ser conduzido de forma a contribuir para a promoção do protagonismo da
família.

62
7 REFERÊNCIAS

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http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm >. Acesso em
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http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8069.htm >. Acesso em 14/08/2017.

BRASIL. Norma Operacional Básica. Sistema Único de Assistência Social. Brasília, 2005.

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Nacional de Assistência Social. Brasília, 2009.

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Social. Secretaria Nacional de Assistência Social. Brasília, 2011.

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DIGIÁCOMO, Murillo José. O Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do


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63
http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Cadernos/Perguntas_Servi
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POSSÍVEL?. Revista da Católica, Uberlândia, v. 1, n. 1, p. 147-165, 2009.

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SECRETARIA DE DIREITOS HUMANOS. PPCAAM e as Portas de Entrada: O Ponto de


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inclusão social dos egressos do sistema prisional. Disponível em:
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Disponível em: < http://www.seds.mg.gov.br/ajuda/page/32-Servi>. Acesso em 06/12/2017.

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Disponível em: < http://www.seds.mg.gov.br/2013-07-09-19-17-59/ceapa >. Acesso em
06/12/2017.

SECRETARIA DE ESTADO DE DEFESA SOCIAL DE MINAS GERAIS. Metodologia


Programa CEAPA/MG – Central de Apoio e Acompanhamento às Penas e Medidas
Alternativas de Minas Gerais. Disponível em: <
http://institutoelo.org.br/site/files/arquivos/22b28acd2d1e121884acbba2b11fb32f.pdf >.
Acesso em 06/12/2017.

SINASE - Sistema Nacional De Atendimento Socioeducativo / Secretaria Especial dos


Direitos Humanos – Brasília-DF: CONANDA, 2006.

SUASE – Subsecretaria de Atendimento Socioeducativo. Metodologia para relatórios.


Minas Gerais, 2012.

SUASE – Subsecretaria de Atendimento Socioeducativo. Metodologia do Programa de


Acompanhamento ao Adolescente Desligado das Medidas Socioeducativas de
Internação ou Semiliberdade em Minas Gerais – Se Liga. Belo Horizonte, 2016.

SUPEC – Subsecretaria de Políticas de Prevenção à Criminalidade. Política de Prevenção


Social à Criminalidade. Belo Horizonte, 2017. Disponível em: <
http://www.seds.mg.gov.br/images/seds_docs/Prevencao/Portflio%20-
%20Preveno%20Social%20%20Criminalidade%202017.pdf >. Acesso em: 06/12/2017.
64
8 ANEXOS

Anexo 1: Organograma da Subsecretaria de Atendimento Socioeducativo

65
Anexo 2: Formulário de Visita à Rede

66
Anexo 3 Fluxo de Encaminhamento para Acolhimento Institucional em Belo Horizonte

 Relatório do Caso

Tão logo as equipes das unidades de Semiliberdade ou Internação entendam


que o(a) adolescente, cujo cumprimento da medida foi marcado pela ausência de
referência familiar (impossibilitando o seu retorno para o meio familiar), está
caminhando para o desligamento, fará contato com a técnica de referência do(a)
mesmo no Setor de Acompanhamento às Medidas Restritivas de Liberdade/SAMRE
para agendar estudo de caso. Além do SAMRE, deverão ser convidados a participar do
estudo, representantes do Setor de Fiscalização e Acompanhamento das Medidas
Socioeducativas/SEFIA, Setor de Orientação e Fiscalização de Entidades/SOFES,
Gerência de Abrigamento e do programa Se Liga.
O objetivo deste estudo é discutir o caso para construir um relatório que deverá
esclarecer ao Judiciário a falta de referência familiar do adolescente e apontar para
necessidade de acolhimento institucional. Esta ação deverá respeitar o período
mínimo de 60 dias antes da proposição de desligamento do(a) adolescente.

 Encaminhamento Vara Infracional da infância e Juventude/VIIJ

A unidade deverá protocolar o referido relatório na VIIJ no Processo de


Execução do adolescente. O processo terá seu andamento legal, Ministério Público,
Defensoria Pública e Juiz. Se houver determinação do juiz, o processo será
encaminhado ao SAMRE para parecer sobre o caso, se ele entender que há
necessidade de maiores esclarecimentos.

 Determinação da vaga

Se o pedido for deferido pelo Juiz da Vara Infracional da Infância e Juventude,


será expedido um ofício e encaminhado ao Juiz Titular da Vara Cível, aos cuidados do
Setor de Orientação e Fiscalização de Entidades/SOFES, acompanhado do relatório
técnico da unidade e toda a documentação do adolescente, para a abertura de um

67
processo legal, solicitando a disponibilização da vaga. Este pedido deve ser feito com
antecedência mínima de 30 dias.

 Processo na Vara Cível da Infância e Juventude

Quando a solicitação chegar à Vara Cível da infância e Juventude, o Juiz


responsável dará vistas ao Ministério Público para manifestação acerca da requisição
de vaga no serviço de acolhimento institucional. O Setor de Orientação e Fiscalização
de Entidades/SOFES irá acionar a central de vagas, solicitando a vaga para o(a)
adolescente.
Tão logo a vaga seja disponibilizada, a unidade socioeducativa deverá ser
informada sobre a referida vaga para o repasse do caso à unidade de acolhimento
indicada, e início do processo de enlaçamento do adolescente com a instituição. Este
processo envolverá a unidade socioeducativa, a unidade de acolhimento e o Programa
Se Liga, devendo ser incluídas, durante o mesmo, visitas do adolescente à instituição
de acolhimento.

 Relatório de Desligamento

O relatório de proposição de desligamento da Unidade deve ser feito somente


após esta articulação. Apontando, inclusive, a unidade de acolhimento onde a vaga
está reservada, e as possíveis articulações/encaminhamentos realizados com esta.

 Entrega do(a) adolescente

Havendo a determinação de desligamento, a unidade socioeducativa procederá


com a entrega do adolescente à unidade de acolhimento.
Obs.: Considerando o fato de que no horário que a unidade socioeducativa
receberá o ofício de desligamento pode não haver nenhum representante da equipe
técnica na unidade de acolhimento, o juiz poderá estabelecer o prazo de 24hs para que
a unidade socioeducativa efetue a entrega do(a) adolescente na instituição, visando um
melhor acolhimento do(a) mesmo(a).

68
Anexo 4: Instrumentos de Formalização de pedido de Informações à Rede

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