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ARTIGO ESPECIAL Maria Cristina de Paula Scandiuzzi e cols • Detecção precoce de câncer colorretal

CÂNCER COLORRETAL NO BRASIL: PERSPECTIVAS


PARA DETECÇÃO PRECOCE
COLORECTAL CANCER IN BRAZIL: PERSPECTIVES FOR EARLY DETECTION

Maria Cristina de Paula Scandiuzzi, Erika Barbosa Camargo, Flavia Tavares Silva Elias

DOI - 10.5935/2236-5117.2019v56a02

RESUMO Maria Cristina de Paula Scandiuzzi – Scandiuzzi MCP. Médica, Secretaria de


Estado de Saúde do Distrito Federal, Brasília-DF, Brasil.
Introdução. No Brasil, para 2016, registrou- Erika Barbosa Camargo – Camargo EB. Nutricionista. Pesquisadora
se 16.660 casos de câncer colorretal em colaboradora da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Brasília-DF, Brasil.
homens e 17.620 em mulheres. O rastreamento
Flavia Tavares Silva Elias – Elias FTS. Nutricionista. Pesquisadora em saúde
pode reduzir a incidência de câncer invasivo. pública da da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Brasília-DF, Brasil.

Método. Estudo reflexivo sobre os desafios do rastreio


organizado em detrimento do oportunístico. Correspondência: Flávia Tavares Silva Elias. Programa de
Evidências para Políticas e Tecnologias em Saúde (PEPTS), Avenida
L3 Norte s/n, Campus Universitário Darcy Ribeiro, Gleba A,
Resultados. Apesar do rastreio oportunístico
70.904-130, Fundação Osvaldo Cruz – Brasília, Brasília-DF, Brasil.
ser de menor custo, pode não propiciar detecção
precoce. Alguns fatores trazem reflexões, como Internet: flavia.tselias@gmail.com
capacidade da atenção básica, tipos de testes de
sangue oculto disponíveis, estrutura dos serviços,
capacidade financeira e aumento de demanda Conflito de interesses: Os autores declaram que inexistem
conflito de interesses.
para realização de confirmação diagnóstica.

Conclusões. Apesar de a literatura apresentar ensaios


clínicos sobre vantagens do rastreio, o problema precisa
entrar na agenda de países de média renda como Conclusion. Although the literature presents clinical
o Brasil, visando a conhecer barreiras enfrentadas trials on the advantages of screening, the problem
para a detecção precoce, pois são questões que must be included in the agenda of middle-income
sofrem influência do contexto dos sistemas de saúde. countries such as Brazil, in order to cognize the barriers
faced for the early detection, since these are issues
Palavras-Chave. Programas de rastreamento; that are influenced by the context of health systems.
neoplasia colorretal; atenção primária à saúde
Key words. Mass screening; colonic neoplasms; primary
ABSTRACT health care

Background. In 2016, Brazil registered 16,660 cases


of colorectal cancer in men and 17,620 in women.
Screening can reduce the incidence of invasive cancer. CÂNCER COLORRETAL COMO PROBLE-
MA DE SAÚDE PÚBLICA
Methods. Reflexive study of the challenges of
organized screening over the opportunistic. O câncer colorretal é o terceiro mais frequente em ho-
mens, do total de sua incidência mundial, com 746.000
Results. Despite the opportunistic screening, being casos, 10% do total, e o segundo em mulheres, com
of lower cost, there may not provide an early 614.000 casos, 9,2% do total.1 No Brasil, para 2016, foi
detection. Some factors bring reflections such as estimada a incidência de 16.660 casos novos de câncer
basic care capacity, types of available occult blood colorretal em homens e 17.620 em mulheres com taxa
tests, service structure, financial capacity and de incidência padronizada de 16,84 por 100.000 para
the demand increase for diagnostic confirmation. homens e 17,10 por 100.000 mulheres.2

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A falta de acesso ao diagnóstico precoce faz a maioria lha para o rastreamento no Sistema Único de Saúde.7
das pessoas o obterem quando seus sinais e sintomas Essa norma é ambígua, ou seja, não há hoje consenso
aparecem. Isso torna seu tratamento complexo, dis- sobre qual o método de escolha para o rastreamento
pendioso e invasivo, com necessidade de intervenção populacional na área da saúde pública no País, tam-
cirúrgica, quimioterapia e radioterapia, o que produz pouco sobre o tipo de rastreamento que deve ser
impacto econômico, psicológico e social negativos. implementado. Apesar da recomendação, desconhe-
No entanto, o câncer colorretal pode ser considerado ce-se que, no País, exista programa de rastreamento
como doença passível de detecção precoce ou de pre- de base populacional para o câncer colorretal efetiva-
venção secundária, e parte das mortes pode ser evi- mente implantado em municípios ou estados. Nosso
tada na medida em que se conhece a história natural objetivo é apontar desafios para a incorporação do
da doença.3 rastreio organizado no Brasil.

O aparecimento do adenoma, seu crescimento e sua Tipos de estratégias e métodos de rastreio do câncer
transformação em câncer podem ter curso de dez a colorretal
quinze anos. Nesse período, é possível realizar uma
intervenção adequada por meio de política pública de A classificação do risco de desenvolvimento do câncer
rastreamento, com identificação de lesões precoces colorretal leva em consideração fatores epidemiológi-
ou localmente avançadas e ressecção destas e, por- cos e de biologia molecular. O rastreamento deve ser
tanto, prevenção e tratamento precoce do câncer.4 Es- individualizado segundo o risco de desenvolvimento
tima-se que 75% dos casos ocorram em pessoas sem da doença. Como população de baixo risco entende-se
fatores de risco elevado de desenvolvimento do cân- pessoas com idade superior a 50 anos sem outros fa-
cer colorretal, e 20% dos casos ocorrem em pessoas tores de risco de câncer colorretal. Por risco modera-
com história familiar.5 do classificam-se as pessoas com história familiar de
câncer colorretal em um ou mais parentes de primeiro
A idade é certamente o maior fator de risco de desen- grau, história pessoal de pólipo maior do que um cen-
volvimento do câncer colorretal, e a probabilidade de tímetro ou múltiplos pólipos de qualquer tamanho e
desenvolvê-lo em idade jovem é baixa.6 Entre indiví- indivíduos com antecedente pessoal de câncer color-
duos com 45 a 55 anos de idade, a incidência de cân- retal, tratados com intenção curativa. Como alto ris-
cer colorretal é de 25 por 100.000 por ano. No entan- co, são classificadas as pessoas com história familiar
to, em indivíduos com idade de 75 anos ou superior, a de câncer colorretal hereditário na forma de polipose
taxa de incidência é de 300 por 100.000 por ano.4 adenomatosa familiar (PAF) ou câncer colorretal here-
ditário não polipose (HNPCC), ou com diagnóstico de
O rastreamento é uma ação dirigida à população as- doença inflamatória intestinal na forma da pancolite
sintomática na fase subclínica da doença. Seu obje- ou colite esquerda.6
tivo é reduzir a incidência de câncer invasivo e a taxa
de mortalidade na população, descobrindo-o em seus A incidência, a fase pré-clínica longa, a lesão precur-
estádios iniciais. O exame de rastreamento não é sora reconhecida e facilmente tratável, os altos custos
diagnóstico, havendo, portanto, necessidade de exa- envolvidos no tratamento da doença e a correlação da
mes complementares. Deve ter como característica mortalidade com o estadiamento da doença são ca-
ser pouco invasivo, ter baixo custo e fácil aceitação racterísticas que favorecem a incorporação de rastreio
pela população. Seu sucesso depende de recrutamen- organizado para detecção de câncer colorretal.
to populacional adequado, da realização de exames
apropriados, que sejam bem aceitos, e do seguimento Os autores discutem a importância e os desafios do
dos pacientes com resultados alterados nesses tes- rastreio organizado em detrimento do oportunístico.
tes, além da repetição dos exames em intervalos pre- Este último ocorre quando o profissional de assistên-
estabelecidos.6 cia ao paciente aproveita o momento em que a pessoa
procura o serviço assistencial por algum outro motivo
No Brasil, o Caderno de Atenção Primária Rastrea- visando ao diagnóstico ou ao tratamento de alguma
mento, emitido pelo Ministério da Saúde, recomenda doença ou agravo. Nesse caso, usuários do sistema
o rastreamento do câncer de cólon e reto em adultos de saúde são avaliados em termos de sinais e sin-
de 50 a 75 anos de idade, usando-se pesquisa de san- tomas relacionados à suspeição de câncer colorretal
gue oculto nas fezes, colonoscopia ou sigmoidoscopia. e encaminhados a exames de triagem e diagnóstico.
Declara não haver consenso sobre o método de esco- Ocorrem, nesses casos, ações de rastreio em diversas

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ocasiões e deixam-se outros pacientes que poderiam de uma estratégia para abarcar toda a população saudá-
ser beneficiados. Diferentemente acontece com o ras- vel a partir de 60 anos etários pode trazer barreiras de
treamento organizado, pois se trata de uma estratégia acesso devido à estrutura dos serviços e à capacidade
sistematizada, que independe de as pessoas procura- do usuário em realizar os testes de confirmação diag-
rem os serviços assistenciais, pois são de abrangên- nóstica, principalmente os que requerem equipamentos
cia populacional, visando-se à detecção precoce de e laudo especializado.
determinada doença. Em geral, os rastreamentos or-
ganizados são realizados por instituições da área da Alguns testes de sangue oculto nas fezes requerem
saúde que têm a responsabilidade de prover a todas preparo específico, com jejum de carne vermelha e
as pessoas incluídas no programa a continuidade do seus derivados além de alimentos com corantes. Em
processo diagnóstico até o tratamento do problema laboratório, a análise por imuno-histoquímica detecta
quando confirmado. Estabelecer um programa de ras- resíduos de sangue que podem estar presentes nas
treamento somente se justifica quando há condições fezes, o que indica necessidade de realização de co-
de oferta de diagnóstico definitivo e de tratamento lonoscopia, para confirmação do diagnóstico de lesão
para a condição rastreada.7 Usualmente, o exame de precursora ou de câncer. Nesse sentido, por ser mais
rastreamento é pouco invasivo e, por isso, é importan- barato e mais acessível, o exame para pesquisa de
te considerar a característica operacional dos testes sangue oculto nas fezes poderia funcionar como um
disponíveis aliados ao conhecimento da prevalência processo de triagem populacional, indicando quem, de
da doença. fato, deve ser encaminhado à colonoscopia. Isso re-
quer adesão da população na autocoleta.
O exame de sangue oculto nas fezes é o mais habitu-
almente usado como exame inicial para rastreamento Quando se observa a perspectiva das pessoas, a ade-
do câncer colorretal. É de baixo custo inicial, não inva- são significa aceitação de uma ideia, a manifestação de
sivo e pode ser realizado em casa pelo próprio pacien- aprovação ou apoio e o reconhecimento de uma inter-
te, exigindo-se poucos recursos. venção. No campo da saúde, a adesão ao tratamento
pode estar relacionada a três componentes principais,
Dentre os demais exames existentes disponíveis para a saber, a noção de doença que atinge o paciente, a
o rastreamento do câncer colorretal, além do teste de ideia de cura ou de melhora, o lugar do profissional e
pesquisa de sangue oculto nas fezes, há os exames dos serviços em seu campo imaginário.8 Esses compo-
de imagem do cólon, sendo eles o exame contrasta- nentes são interpretados como relação de parceria e
do com ar e o enema baritado, a colonografia com- vínculo entre o paciente e o profissional que o assiste
putadorizada (CCT ou colonoscopia virtual), a retosig- e, ainda, os que atuam como fator estruturante do pos-
moidoscopia flexível e a colonoscopia. São exames de sível processo de rastreamento de câncer, por exemplo.
custos mais elevados que os de sangue oculto nas fe- Situações centradas em pessoas, como orientação, es-
zes, que exigem maior aporte tecnológico de imagem clarecimentos, suporte social e emocional, podem tam-
e especialistas nas áreas de radiologia e endoscopia bém serem fatores importantes no processo de adesão
ou coloproctologia (quadro 1). ao rastreamento de câncer de colo.

Segundo dados coletados no Sistema de Gerencia-


Desafios para o rastreamento organizado no Brasil mento da Tabela de Procedimentos, Medicamentos
(SIGTAP), Órteses, Próteses e Materiais Especiais
Situações críticas sobre organização de serviços no con- (OPM) do SUS, o teste de sangue oculto nas fezes ba-
texto do rastreamento no Sistema Único de Saúde (SUS) seado em guaiaco estão disponíveis e custam R$1,65
devem ser objeto de reflexão para que ações sejam ali- por exame. No entanto, existem testes imunoquími-
nhadas e pensadas de acordo com a magnitude do pro- cos que têm maior adesão pelos usuários,9 mas ainda
blema. Apesar de as estratégias de rastreio oportunístico não incluídos no SUS. Em países de alta renda, a taxa
serem de menor custo ao compará-lo com a estratégia de participação foi significativamente maior no gru-
organizada de base populacional, podem não propiciar a po de pessoas que realizaram o teste imunoquímico,
detecção precoce do câncer de colo. Isso ocorre prova- comparado ao guaiaco (risco relativo 1,21, intervalo
velmente devido ao vinculo da qualidade da prestação de confiança 95% 1,09-1,33, I2 = 95%).10
de serviços com a capacidade das equipes de saúde da
família em realizar uma triagem adequada e com isso in- Ao se analisar os requisitos de incorporação de tec-
dicar um método de rastreio. Do mesmo modo, a adoção nologias no SUS percebe-se que há elementos dis-

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poníveis para uma análise baseada em evidências de A Força Tarefa Canadense em Saúde Preventiva, em
acurácia, efetividade, segurança e custos comparati- recente revisão de literatura, ocupou-se com a análise
vamente entre os dois tipos de teste.3 A incorporação das várias estratégias para rastreamento disponíveis.
tecnológica dos tipos de testes de sangue oculto nas Concluiu-se que o rastreamento realizado com tes-
fezes teria que passar por uma avaliação econômica te de sangue oculto nas fezes, baseado em guaiaco
comparativa à perspectiva do SUS.11 Ultrapassadas a cada dois anos, limita o diagnóstico de câncer co-
todas essas barreiras, para a incorporação no SUS a lorretal a estadiamentos avançados e morte por essa
lei ainda estabelece a exigência do registro prévio do causa. O número necessário para rastreio foi 2.655
produto na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (íntervalo de confiança 95%: 1.757 a 6.244) no grupo
(Anvisa), o que também não parece ser uma barreira. etário de 45 a 59 anos e 492 (intervalo de confiança
95%: 326 a 1.157) no grupo etário de 60 a 80 anos,
A partir de reflexões acerca da política brasileira, os com a estratégia de rastreamento com sangue oculto
argumentos levantados nos permitem observar a nas fezes baseado em guaiaco bienal.12 Nesse ultimo
complexidade de uma decisão sobre o tipo de rastreio grupo, seria necessário rastrear 492 pessoas para evi-
adotar, mas, ao mesmo tempo, quando se analisa a tar um óbito. Conclui que o benefício do rastreamento,
magnitude relacionada à elevação da incidência e a embora seja inequívoco, ao estratificá-lo nas faixas
transcendência em relação à mortalidade, pensa-se etárias de 50 a 59 anos e de 60 a 74 anos, é muito
sobre o valor de uma incorporação no SUS que pode mais impactante na faixa etária maior, devido à maior
trazer benefícios. Outra dimensão ao se estabelecer incidência de câncer com o envelhecimento.12
um programa de rastreamento é garantir condições de
oferta de diagnóstico definitivo e de tratamento para Questionam-se então as prioridades de incorporação
a condição rastreada. Além disso, requer sistemas de no SUS quando se considera o perfil de incorporação
informação para o monitoramento e avaliação de de- da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias
sempenho em um panorama populacional. no SUS (Conitec) e a possibilidade de atender a um
problema que tem magnitude crescente no Brasil.
A Agência Internacional para Pesquisa em Câncer
(International Agency for Research on Cancer – Iarc) CONSIDERAÇÕES FINAIS
determina que, para implementar um programa de
rastreamento organizado de base populacional, de- O rastreamento com o teste de sangue oculto nas
ve-se atender aos seguintes procedimentos: estabe- fezes, ao longo dos anos, produz maior número de
lecer uma política explícita com categorias de idade, diagnóstico de câncer em estadiamento inicial, o
métodos de rastreio e periodicidade; definir a popu- que possibilita a cura com medidas menos invasivas
lação-alvo; estabelecer uma equipe responsável pela e menos mutilantes. A adesão ao rastreio é fator
implementação; estabelecer uma equipe de especia- determinante de sucesso para atingir os objetivos
listas responsável pelas decisões, cuidado e segui- de redução do número de mortes por câncer color-
mento dos pacientes com testes de rastreio positivos; retal. Mesmo em cenários controlados, a adesão
estruturar a qualidade de cada etapa envolvida no mostrou-se como um desafio. Para a implemen-
processo; estabelecer um processo de monitoramen- tação do rastreamento por meio de intervenções
to, avaliação e identificação da ocorrência de câncer simples – como carta-convite do médico de família,
na população.1 telefonemas-convite, vídeos, intervenções indivi-
duais e coletivas que sensibilizam as pessoas e as
Nas avaliações de tecnologias – duras no que se re- direcionam ao conhecimento a respeito do câncer
fere aos testes e leves no que se refere às estratégias colorretal – são eficazes em aumentar o número
de implementação –, existem questões sobre bene- de adesões ao rastreamento. As intervenções são
fícios a serem reveladas. Uma delas trata da eficácia particularmente úteis para aqueles que recusaram
dos testes de sangue oculto e demonstra acurácia na o primeiro convite para realização do rastreamen-
estratégia oportunística de diagnóstico e no rastreio to. Outro ponto importante para aumentar a taxa
da base populacional. Outra se refere aos custos das de adesão está no perfil do teste de sangue oculto
duas estratégias. Esses custeios podem ser estima- nas fezes. Testes com guaico, que requerem maior
dos por meio do número necessário para screening, manipulação de fezes, tendem a ser menos aceitos.
ou seja, quantas pessoas devem ser examinadas para Em relação aos sistemas de saúde, há desafios em
haver detecção precoce, isto é, captada ainda no início relação ao acesso e à cobertura mesmo em países
da doença. de alta renda.

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Este artigo teve como alvo mostrar desafios para a chemotherapy costs on the cost savings of
implantação do rastreio de câncer colorretal de base colorectal cancer screening. J Natl Cancer Inst
populacional no Sistema Único de Saúde. A análise [Internet]. 2009;101(20):1412-22.
dos impactos do câncer colorretal em cada estado da 4. Habr-Gama A. Câncer coloretal: a importância de
federação brasileira é necessária e, com base nessa sua prevenção. Arq Gastroenterol. 2005;42(1):2-
análise, sugere-se a realização de um estudo de im- 3.
pacto econômico para a implantação de um programa 5. Lin JS, Piper MA, Perdue LA. Screening for
de rastreamento organizado de base populacional. colorectal cancer: a systematic review for the U.
S. Preventive Services Task Force, n.o 135, 2012.
Apesar de os autores terem encontrado vários dados 6. Wilson JM, Jungner YG. Principles and practice
na literatura contendo ensaios clínicos sobre aumen- of mass screening for disease. Bol Oficina Sanit
to na taxa de participação em rastreio de câncer de Panam. 1968;65(4):281-393.
colorretal, o problema precisa entrar na agenda de 7. Ministério da Saúde do Brasil, Secretaria de
países de média renda como o Brasil, visando-se a co- Atenção à Saúde, Departamento de Atenção
nhecer barreiras enfrentadas para a detecção precoce Básica. Rastreamento, vol. 29, 2010. 95 p.
8. Lustosa MA, Alcaires J, Costa JC. Adesão do
e para o seguimento longitudinal das pessoas com o
paciente ao tratamento no Hospital Geral. Rev
diagnóstico de câncer colorretal nesses países, pois
SBPH, Rio Janeiro. 2011;14(2):27-49.
são requisitos influenciados por questões do contexto
9. Hoffman RM, Steel S, Yee EFT, Massie L, Schrader
dos sistemas e dos serviços de saúde.
RM, Murata GH. Colorectal cancer screening
adherence is higher with fecal immunochemical
REFERÊNCIAS tests than guaiac-based fecal occult blood tests:
a randomized, controlled trial. Prev Med (Baltim)
1. Ferlay J, Soerjomataram I, Ervik M, Dikshit R, [Internet]. 2015;50(5-6):297-9.
Eser S, Mathers C, et al. In: GLOBOCAN 2012, 10. Vart G, Banzi R, Minozzi S. Comparing participation
vol. 1. Cancer incidence and mortality worldwide: rates between immunochemical and guaiac
IARC CancerBase, n.o 11, vol. 11, Lyon, France: faecal occult blood tests: a systematic review
International Agency for Research on Cancer and meta-analysis. Prev Med. 2012;55:87-92.
(Iarc), 2013. http://globocan.iarc.f. 11. Silva HP, Petramale CA, Elias FT. Avanços e
2. Ministério da Saúde, Instituto Nacional de Cancer desafios da política nacional de gestão de
José Alencar Gomes da Silva, INCA - Estimativa tecnologias em saúde. Revista de Saúde Pública.
2016, 124 p. Disponível em http://www.inca. 2012;46:83-90.
gov.br/estimativa/2014/sintese-de-resultados- 12. Canadian Task Force on Preventive Health Care.
comentarios.asp Recommendations on screening for colorectal
3. Lansdorp-Vogelaar I, van Ballegooijen M, Zauber cancer in primary care. Canadian Medical
AG, Habbema JDF, Kuipers EJ. Effect of rising Association Journal. 2016;188(5):340-8.

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Quadro 1. Estratégias para rastreamento de câncer colorretal

Testes fecais Frequências Considerações Complicações

Sangue oculto baseado em Cada um ou dois anos Requer dieta e manipulação de Diretamente sem potencial de
guaiaco múltiplas amostras de fezes. causar complicações. Necessita
Pode ser feito em casa. de complementação com exames
por endoscopia.

Sangue oculto imunoquímico Cada um ou dois anos Dispensa dieta. Maior acurácia

Sangue oculto imunoquímico Cada um, dois ou três anos Mais falsos positivos em relação
DNA aos testes imunoquímicos.
Nenhum ECR* reporta benefício
na mortalidade

Testes de verificação por visão


direta

Enema baritado Exame em desuso Detecta lesões de grandes Complicações relacionadas ao


dimensões. Não é um bom preparo. Necessita de comple-
teste para rastreio. Exige dieta mentação com exame endoscó-
e preparo. Nenhum ECR reporta pico ou intervenção cirúrgica
benefício na taxa de mortalidade

Colonografia computadorizada Cada cinco anos Requer dieta e preparo. A Achados extracolônicos comuns
radiação é pequena, porém, (em 40% a 70% dos exames)
com as repetições, pode haver levam a intervenções desneces-
problemas. Nenhum ECR reporta sárias em até 37% dos casos. Ne-
benefício na taxa de mortalidade cessita de complementação com
exame endoscópico ou cirurgia

Sigmoidoscopia Cada dez anos, associada ou Requer dieta e preparo. Num Danos diretos e indiretos: desi-
não a exame de sangue oculto mesmo procedimento, podem dratação, distúrbios hidroeletro-
imunoquímico ser feitos o rastreio e o trata- líticos, eventos cardiovasculares,
mento dos achados perfuração intestinal (0,001%),
sangramento intestinal maior
(0,009%), morte (0,015%)

Colonoscopia Cada dez anos Requer dieta e preparo. Num Danos diretos e indiretos: desi-
mesmo procedimento, podem dratação, distúrbios hidroeletro-
ser feitos o rastreio e o trata- líticos, eventos cardiovasculares,
mento dos achados. Nenhum perfuração intestinal (0,061%),
ECR reporta benefício na taxa de sangramento intestinal maior
mortalidade (0,11%), morte (0,035%)

Fonte: Canadian Task Force on Preventive Health Care10


*ECR – ensaio clínico randomizado

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