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O ATO DE CONSTRUIR COMO UMA AÇÃO INTEGRADORA DE CONTEÚDOS NO

CANTEIRO EXPERIMENTAL DA FAU/UFRJ

SILVOSO, Marcos Martinez (1); CORDEIRO, Patrícia Cavalcante (2); ALBUQUERQUE, Rafael
Tavares de (3)

(1) FAU/UFRJ, e-mail: silvoso@fau.ufrj.br; (2) FAU/UFRJ, e-mail: ccordeiro.patricia@gmail.com;


(3) Doutorando PROARQ-FAU/UFRJ, e-mail: raffa.tavares@yahoo.com.br

RESUMO
O trabalho apresenta as atividades do Canteiro Experimental da FAU/UFRJ que busca aplicar
conteúdos das disciplinas – materiais de construção, resistência dos materiais, análise estrutural,
projeto e execução de estruturas de concreto armado e processos construtivos. Apesar da tradição
do curso, a implantação do Canteiro deu-se apenas em 2014, buscando atuar na convergência entre
ensino, pesquisa e extensão. São apresentadas aqui as experiências realizadas na disciplina Processos
Construtivos II, do quinto período do curso. No exercício "Projetar e Construir", os alunos são
estimulados a pensar um mobiliário urbano em concreto armado ou argamassa armada. O exercício
aborda todas as fases de projeto e execução – conceituação, projeto básico e executivo, análise
estrutural, propriedades físicas e mecânicas dos materiais, produção de fôrmas e armaduras,
execução de concretagem e montagem dos elementos. Ao final, o elemento construído é analisado
pelos alunos e avaliado criticamente. São apresentados dados obtidos pela aplicação de variações do
exercício durante três semestres, analisando a evolução dos projetos e sua complexidade. A
experiência prática de construção em escala real torna-se uma ação integradora de conteúdos,
aproximando conceitos das disciplinas de estruturas e de processos construtivos. Ao realizar o ato
construtivo, os alunos superam a abstração teórica, passam a vivenciar a materialização e as
consequências do projeto, ampliando a sua compreensão e estimulando sua capacidade de criação.
Palavras-chave: Canteiro Experimental; Construção; Ensino.

ABSTRACT
This article presents the activities of the FAU/UFRJ Experimental Construction Site that seeks to apply
contents of the disciplines - materials of construction, resistance of materials, structural analysis,
design and execution of reinforced concrete structures and constructive processes. The Construction
Site took place in 2014, seeking to act in the convergence between teaching, research and extension.
We present the experiments carried out in the discipline Constructive Processes II, of the fifth
period. In the "Design and Build" exercise, students are encouraged to think of urban furniture in
reinforced concrete or reinforced mortar. The exercise covers all steps of design and execution -
conceptualization, basic and executive design, structural analysis, physical and mechanical properties
of materials, production of formwork and reinforcement, concreting and assembly of the elements. In
the end, the constructed element is analyzed by the students and evaluated critically. It will be
presented, data obtained by application of variations of the exercise during three consecutive
semesters, the evolution of the projects and their complexity will be analyzed. The practical
experience of real-scale construction becomes an integrative action of contents, approaching
concepts of the disciplines, structures and constructive processes. In carrying out the constructive act
III ENEEEA – Ouro Preto, Brasil, 07 a 09 de junho de 2017.

students overcome theoretical abstraction, they begin to experience the materialization and
consequences of the project, broadening their understanding and stimulating their creative capacity.
Keywords: Experimental Construction Site; Construction; Teaching.

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1. INTRODUÇÃO
O Canteiro Experimental dentro de uma Escola de Arquitetura e Urbanismo assume
diferentes significados, podendo representar um vínculo entre a arquitetura e sua dimensão
social e econômica, a reaproximação entre o trabalho manual e intelectual, a oportunidade
de sentir estímulos sensoriais físicos no ato de construir e conceber, uma vivência em
processos de trabalho de ajuda mútua, um local de experimentação de técnicas construtivas
e materiais de construção, ou mesmo, a conquista da compreensão que o desenho é apenas
um método de representação que procura dialogar com canteiro visando à construção da
arquitetura de fato. O entendimento dos múltiplos significados do Canteiro Experimental
possibilita que este se torne um espaço pedagógico para a formação do estudante de
arquitetura e urbanismo com uma visão sistêmica de seu campo de saber.
Pode-se dizer ainda que o Canteiro Experimental, na medida em que fomenta a
concepção através do ato de construir, possibilita ao estudante a apropriação de conteúdos
muitas vezes considerados abstratos. Em particular, no ensino de Estruturas, os conteúdos
de análise estrutural e dimensionamento de materiais são de difícil compreensão por
estudantes tanto do curso de Arquitetura e Urbanismo quanto dos cursos de Engenharia. Em
parte, tal dificuldade decorre da metodologia tradicional de ensino, onde inicialmente são
ensinados modelos analíticos, sem que haja a compreensão do funcionamento dos
elementos estruturais e das simplificações necessárias para construção de tais modelos.
Os métodos de ensino utilizados na formação técnica e tecnológica dos alunos em
arquitetura e engenharia passaram a ser tão abstratos que, em muitos dos casos, este
aluno não sabe o verdadeiro porquê de se aprender um determinado conhecimento
teórico. O ensino de estruturas passa por grandes dificuldades nos primeiros períodos de
ensino de teoria. Os alunos sofrem para verdadeiramente internalizar o aprendizado de
inúmeros e demasiados procedimentos matemáticos que resultarão em uma base teórica
para aplicação em uma prática que eles, provavelmente, nunca verão até o início de suas
carreiras profissionais.
O Canteiro Experimental como prática pedagógica tem sido utilizado em diferentes
instituições de ensino de Arquitetura e Urbanismo (RONCONI, 2002; RONCONI, 2005;
MINTO, 2009; PISANI et al., 2009; LOPES, 2014) com destaque para o Canteiro Experimental
da FAU/USP e para as experiências da PUC Campinas (LOPES, 2014). O presente trabalho
apresenta algumas atividades desenvolvidas no Canteiro Experimental da FAU/UFRJ que
procuram aplicar conteúdos de diferentes disciplinas, tais como, materiais de construção,
resistência dos materiais, análise estrutural, projeto e execução de estruturas de concreto
armado e processos construtivos.
III ENEEEA – Ouro Preto, Brasil, 07 a 09 de junho de 2017.

O Canteiro Experimental não está previsto no Projeto Pedagógico do curso de Arquitetura


e Urbanismo da UFRJ, vigente desde 2006. Ainda assim, em 2014, foram iniciadas as
primeiras atividades de experimentação construtiva que permitiram sua implantação.
Utilizando como exemplo uma atividade de Canteiro Experimental desenvolvida em uma
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disciplina do Departamento de Tecnologia da Construção, este trabalho pretende discutir
como o ato de construir pode funcionar como uma estratégia de ensino que permite a
integração de conteúdo.
São apresentadas as experiências realizadas no âmbito da disciplina Processos
Construtivos 2, do quinto período curricular do curso de Graduação em Arquitetura e
Urbanismo da UFRJ, em que, a partir do desenvolvimento do exercício intitulado "Projetar e
Construir", os alunos são estimulados a projetar e construir um elemento de mobiliário
urbano. O ato de construir e a necessidade de garantir a funcionalidade do elemento
construído possibilitam a integração de diferentes conteúdos e conceitos.
O ensino nas faculdades de arquitetura e urbanismo ao longo das ultimas décadas vem se
distanciando de uma reflexão teórica que aborde os materiais, métodos construtivos e
sistemas estruturais. As disciplinas ligadas ao eixo da construção vêm perdendo espaço nas
matrizes curriculares dos cursos e sendo colocadas em um papel secundário no aprendizado.
O processo de ensino e aprendizado nas faculdades de arquitetura tem se concentrado no
projeto e deixado de lado a prática construtiva. O ensino de estruturas nesse cenário passa a
ser encarado como algo acessório, na medida em que a materialidade com frequência não é
abordada devidamente em disciplinas de projeto.
Esse distanciamento, que ocorre entre os projetos realizados pelos alunos e o processo
de construção dos mesmos, restringe o pensamento total do projeto. Pela dificuldade de
entender sua materialidade, o aluno cria projetos distantes da realidade construtiva e que só
funcionam no campo da fantasia. Nesse sentido, avanços relacionados com modelagem e
prototipagem digital muitas vezes surtem efeito contrário ao esperado, pois, em muitos
casos, por não tratarem adequadamente os conceitos de escala e desconsiderarem a teoria
de semelhança dos materiais, permitem a construção de modelos que seriam inexequíveis
em tamanho real. Progressivamente, o entendimento da experiência da construção deixou
de ser da responsabilidade do profissional que projeta e passou a ser delegado ao campo da
engenharia, o que restringe as possibilidades de atuação dos arquitetos e urbanistas e leva à
formação de profissionais limitados.
A aprendizagem na prática vem sendo retomada em diferentes faculdades com a vivência
nos canteiros experimentais de obra, reinserindo no ensino a relação entre a reflexão teórica
conceitual e sua aplicação na realidade – resultando em um processo pedagógico simultâneo
de reflexão teórica e prática no processo do fazer arquitetônico, que leva à abordagem de
questões de método, organização do pensamento arquitetônico, execução, detalhamento,
entre outras discussões que surgem das dificuldades reais, pensando o projeto por meio de
sua materialização.
Diversos arquitetos brasileiros tiveram experiências interessantes onde aliaram o
exercício projetual à experiência prática. Lina Bo Bardi montava seu escritório no canteiro de
III ENEEEA – Ouro Preto, Brasil, 07 a 09 de junho de 2017.

obras e ali desenvolvia seus projetos, num exercício interdisciplinar com engenheiros,
técnicos e operários, dando ao projeto um espírito coletivo e experimental. Segundo Lina
apud Camargo (2008):
a vivência de uma obra é muito maior e a colaboração entre todos esses
profissionais é total. Isso acaba também com a dicotomia ridícula entre
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engenheiros e arquitetos, além de se poder verificar de perto as despesas, as
negociações e as eventuais negociatas... [...] Os problemas são resolvidos na obra,
às vezes com desenhos feitos à mão e no local, mas com todas as cotas.

Mas foi João Filgueiras Lima, o Lelé, o arquiteto que mais avançou nesta relação próxima
entre projeto e construção. Projetou e implantou a Fábrica de Equipamentos Comunitários
(Faec), criando um sistema de produção de suporte a sua atividade de projeto e execução de
suas obras, atuando em todos os níveis e etapas da construção. Esta experiência influenciou
uma geração de arquitetos e levou à vontade de que o meio acadêmico incorporasse esta
experiência prática no seu processo didático-pedagógico (CAMARGO, 2008).
Experiências de construção prática nas faculdades de arquitetura existiram de forma
isolada desde a década 1970, mas a maioria não teve continuidade nas escolas de
Arquitetura e Urbanismo. O arquiteto Vitor Lotufo foi o pioneiro em experiências de
construção em escala 1:1, utilizando diversos materiais, numa atividade de prática projetual
e construtiva. Esta atividade seria retomada, junto como arquiteto João Marcos de Almeida
Lopes, na experiência do primeiro canteiro experimental na Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo da PUC de Campinas, em 1978 , conhecido como “Platô” (RONCONI, 2005).
O canteiro experimental da FAU USP, referência nacional para a discussão dos canteiros
nas faculdades de arquitetura, foi criado em 1997, está em funcionamento há 20 anos e foi o
responsável por pavimentar o caminho para que outras universidades implementassem
também o seu canteiro experimental.
As formulações e reflexões vindas desta e de outras experiências influenciaram as
normativas do ministério da Educação, para a definição de um currículo mínimo para os
cursos de arquitetura e urbanismo, onde se explicitam os conteúdos necessários à plena
formação do profissional, na tentativa de incluir a discussão do ensino da construção.
Processo que se inicia na definição das Diretrizes Curriculares que integravam a Portaria
nº1770 de 1994 – diretrizes curriculares e conteúdos mínimos para os cursos de arquitetura
e urbanismo – que recomenda a implantação dos canteiros como essencial para o ensino da
arquitetura e urbanismo, mas sem especificar seu funcionamento.
Este entendimento se consagra no âmbito normativo com a Lei de Diretrizes e bases em
2006 que preconiza que os projetos pedagógicos dos cursos de arquitetura e urbanismo
deverão contemplar “modos de integração entre teoria e prática”, porém o canteiro aparece
ainda timidamente apenas em dois artigos e se apresenta apenas como objeto de visita.
No documento Perfis da Área & Padrões de Qualidade – Expansão, Reconhecimento e
Verificação Periódica dos Cursos de Arquitetura e Urbanismo, define-se de forma mais clara a
exigência da existência dos canteiros nas faculdades de arquitetura e urbanismo:
Por serem indissociáveis da atividade de ensino, serão exigidos programas e
projetos de pesquisa e extensão que envolvam alunos e professores do curso e
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relações de cooperação e intercâmbio com outros departamentos da instituição e


de outras instituições, e com a sociedade. Recomenda-se, ainda, visando apoiar as
atividades de ensino, pesquisa e extensão, que sejam oferecidas oportunidades aos
estudantes para participar de: [...] canteiro de obras de arquitetura e urbanismo.

Quando descreve o laboratório de tecnologia da construção, o mesmo documento coloca


403 como itens exigidos a presença do Canteiro Experimental. A associação Brasileira de Ensino
de Arquitetura (ABEA) aprofunda a descrição do que deveria ser o canteiro experimental
como um “Espaço físico para canteiro experimental de uso do curso, para realizações de
simulações de processos de construção (...) mais área aberta para ensaios de construção”,
descrevendo os materiais de consumo e os equipamentos necessários a esta atividade.
Em documento mais recente, a “Carta para a Formação dos Arquitetos”, aprovada em
2011 na Assembleia Geral da União Internacional de Arquitetos (UIA), em Tóquio, tendo
como signatários a UNESCO e UIA, explicita-se, nos objetivos da formação dos arquitetos e
urbanistas, “que a formação em arquitetura desenvolve a capacidade nos alunos para
conceber, projetar, entender e realizar o ato da construção, no contexto da prática da
arquitetura que equilibra as tensões entre a emoção, a razão e a intuição dando forma física
às necessidades da sociedade e do indivíduo” (UIA/UNESCO, 2011, s/p).

2. O EIXO CONSTRUÇÃO NA FAU/UFRJ


No atual projeto pedagógico da FAU/UFRJ, vigente desde 2006, o curso de Graduação em
Arquitetura e Urbanismo é dividido em três ciclos: o ciclo de Fundamentação, de caráter
predominantemente introdutório, estende-se até o quarto período e culmina com o
primeiro Trabalho de Integração I (ou Ateliê Integrado I); o ciclo de Aprofundamento que
visa o aprofundamento nos diversos campos da atuação disciplinar, desenvolve-se do sexto
ao oitavo período, em que ocorre o Trabalho Integrado II (ou Ateliê Integrado II); o ciclo de
Síntese, desenvolvido no nono e décimo período com conteúdos de organização profissional
e desenvolvimento do Trabalho Final de Graduação (TFG), com plena liberdade de escolha
do tema e de sua problematização (FAU/UFRJ – Projeto Pedagógico, 2006).
Ao longo dos períodos, as disciplinas estão estruturadas em quatro eixos que se
desenvolvem paralelamente: o eixo Discussão, que agrega as disciplinas de História, Teoria e
Preservação; o eixo Representação, com disciplinas de expressão gráfica, geometria
descritiva e perspectiva; o eixo Concepção com as disciplinas de Projeto Arquitetônico,
Projeto Paisagístico e Planejamento Urbano e Regional; e finalmente o eixo Construção que
agrega todas as disciplinas relacionadas com a tectônica e a materialidade.
Os eixos apresentam apenas um momento de integração, o Atelier Integrado I, que
ocorre no quarto período, e onde o eixo Construção concorre com conteúdos de Processos
Construtivos, Instalações Prediais e Concepção Estrutural. Nesse período, os alunos
desenvolvem um único projeto onde procuram aplicar os conteúdos de disciplinas dos
diferentes eixos. Observa-se que tal integração se dá através de um projeto, resultado final
das disciplinas, mas com poucas práticas pedagógicas conjuntas.
Apesar da experiência do Atelier Integrado I, nos períodos subsequentes, observa-se que
os alunos não aproveitam a experiência adquirida na integração de conteúdos associados à
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materialidade no desenvolvimento de seus projetos. Isso se dá, em grande parte, pelo fato
de tais conteúdos não serem explorados em disciplinas de projeto, contribuindo para a falsa
percepção de que o conhecimento sobre comportamento estrutural e processos
construtivos não faz parte do fazer do arquiteto e pode ser delegado a outros profissionais.
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O distanciamento das disciplinas de Projeto do eixo Construção pode ser considerado como
um retrato da fragmentação de conteúdos presentes na grade curricular do curso de
graduação da FAU/UFRJ.
O eixo Construção agrega conteúdos de tecnologia da construção, mecânica das
estruturas, sistemas estruturais, dimensionamento dos materiais, gerenciamento da
construção, topografia e instalações prediais e tecnologia do meio ambiente (conforto
ambiental). Na grade curricular do curso, no eixo Construção, tais conteúdos são apresentados
ao longo dos nove períodos que antecedem o TFG, em diferentes disciplinas, listadas a seguir:
1o Período – Modelagem dos Sistemas Estruturais; 2o Período – Topografia, Isostática; 3o
Período – Resistência dos Materiais, Conforto Ambiental I; 4o Período – Saneamento Predial,
Processos Construtivos I, Concepção Estrutural; 5o Período – Estruturas de Concreto Armado I,
Processos Construtivos II, Conforto Ambiental II; 6o Período – Estruturas de Concreto Armado
II, Processos Construtivos III; 7o Período – Estruturas de Aço e Madeira, Saneamento Urbano;
8o Período – Sistemas Estruturais; 9o Período – Gestão do Processo de Projeto, Orçamento e
Gerenciamento de Obra.
As disciplinas de estruturas estão distribuídas em três setores: Mecânica das Estruturas
(Isostática e Resistência dos Materiais); Sistemas Estruturais (Modelagem dos Sistemas
Estruturais, Concepção Estrutural e Sistemas Estruturais); e Dimensionamento dos Materiais
(Estruturas de Concreto Armado I e II e Estruturas de Aço em Madeira).
No Setor de Tecnologia da Construção, as disciplinas Processos Construtivos I, II e III (PC
I, PC II e PC III) são responsáveis por apresentar os conteúdos relacionados diretamente
com materiais de construção e processos construtivos. Na disciplina PC I, são
apresentados, de modo introdutório, diferentes sistemas construtivos (concreto armado,
aço, alvenaria estrutural, etc.). Na disciplina PC II, são apresentados aspetos mais técnicos
da tecnologia de materiais de construção, fundações, estruturas e fechamentos. Já na
disciplina PC III, são apresentados materiais e procedimentos utilizados em sistemas de
revestimento, coberturas e proteções.
A disciplina PC II, objeto de análise neste trabalho, agrega um extenso conteúdo, como pode
ser observado a partir da ementa presente no Projeto pedagógico do curso, transcrita a seguir:
Materiais e procedimentos na execução de estrutura de concreto Armado.
Propriedades do concreto fresco e do concreto endurecido. Dosagem do concreto.
Controle tecnológico do concreto. Estudo geotécnico do terreno. Sondagem a
percussão e rotativas. Fundações superficiais e profundas. Estabilidade de talude e
muros de contenção. Materiais e procedimentos da execução de alvenarias.
Materiais e procedimentos na execução de revestimentos argamassados.

A partir da análise do Projeto Pedagógico e considerando sua separação por eixos de


conhecimento, observa-se um distanciamento entre as disciplinas de projeto e as disciplinas
relacionadas com a prática da construção. Fica evidente a necessidade de aproximação, o
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que só será possível a partir de estratégias pedagógicas que permitam atividades


interdisciplinares e integradas com ações de extensão e pesquisa.

3. O CANTEIRO EXPERIMENTAL DA FAU/UFRJ

405 O Canteiro Experimental da FAU/UFRJ é vinculado ao Laboratório de Ensaios de Materiais


de Construção e Estudo dos Solos (LEMC) do Departamento de Tecnologia da Construção e
procura centrar suas atenções na experimentação prática construtiva como ação de
convergência entre ensino pesquisa e extensão na formação do arquiteto urbanista. O
Canteiro Experimental, além de ser um espaço pedagógico, busca representar um território
de investigação e ação para demandas internas, fruto de pesquisas e exercícios de disciplinas
curriculares, e àquelas relacionadas com extensão universitária.
As ações de experimentação são realizadas no LEMC e em sua área externa, onde está
localizado o Canteiro Experimental. O LEMC é constituído por uma área de cerca de 400 m2,
dividida em um salão principal, uma sala de aula, uma sala de projetos, depósito e câmara
úmida. O Canteiro experimental é constituído por uma área de aproximadamente 1.000 m 2,
contando com um módulo de apoio com cerca de 60 m2 e um radier de cerca de 300 m2,
área pavimentada com blocos intertravados e área verde (ver Figura 1).

Figura 1 – Vista geral do Canteiro Experimental no início de suas atividades em 2014

Fonte: Os autores, 2017.

O módulo de apoio é também um protótipo experimental que foi executado com o


sistema construtivo "light steel framing" (construção com aço leve). O protótipo visou a
avaliação de desempenho do sistema construtivo e a incorporação de elementos inovadores
relativos a: iluminação natural, desempenho térmico, aproveitamento de água da chuva,
microgeração de energia. O armazenamento da água da chuva é particularmente importante
para as ações de canteiro, visto que toda a água utilizada nos concretos e argamassas
utilizadas nos experimentos é proveniente do tanque de captação.
No canteiro experimental da FAU/UFRJ, são desenvolvidas atividades didático-
pedagógicas nas disciplinas obrigatórias Processos Construtivos 2 e 3 e da disciplina optativa
Tecnologia da Construção com Terra, apoio a TFG (Trabalho Final de Graduação), oficinas de
construção, pesquisas de Iniciação Científica e atividades de extensão. O layout foi planejado
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a partir do espaço disponível, atrás do Bloco D do edifício da FAU/UFRJ, inicialmente na


Projeção do LEMC, tendo posteriormente se expandido, conforme layout da Figura 2.

Figura 2 – Layout de implantação do Canteiro Experimental da FAU/UFRJ

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Fonte: Os autores, 2017.

4. ESTUDO DE CASO: A DISCIPLINA PROCESSOS CONSTRUTIVOS II


Conforme exposto, os exercícios de canteiro experimental da disciplina Processos
Construtivos 2 procuram integrar conteúdos de diferentes Disciplinas, tais como: materiais
de construção, resistência dos materiais, estruturas de concreto armado e processos
construtivos. A partir do desenvolvimento do exercício intitulado "Projetar e Construir", as
equipes de alunos são estimuladas a projetar e construir um elemento de mobiliário urbano
em concreto armado ou argamassa armada. O exercício aplicado desde o segundo período
de 2015 procura abordar todas as fases de projeto e execução, com o desenvolvimento da
conceituação, elaboração de projeto básico e executivo (plantas de fôrmas, detalhamento
das armaduras e quantitativo de materiais), análise estrutural, projeto do material com
avaliação experimental de suas propriedades físicas e mecânicas, produção de fôrmas e
armaduras, execução de concretagens, desforma e montagem dos elementos.
Nos três períodos em que foi aplicado (2015.2, 2016.1 e 2016.2), o exercício foi
desenvolvido por equipes entre 6 e 10 alunos. O enunciado do exercício consiste em projetar
e construir elementos de mobiliário urbano elaborados com produtos à base de Cimento
Portland, como concreto e/ou argamassa, com ou sem armadura. Os elementos podem ser
pré-moldados, ou moldados no local, e devem ser dimensionados de modo a suportar os
esforços aos quais serão submetidos em função de seu uso. O consumo de cimento para
cada equipe fica limitado a um saco de cimento (50 kg), o consumo de aço a 1,0 kg, e a altura
dos elementos é restrita a 1,5 metros. O Canteiro Experimental fornece os materiais
constituintes (Cimento Portland, areia, brita, aço, fibras de aço, pigmentos, adições minerais,
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etc.), enquanto os alunos são responsáveis pelo material necessário para execução de
fôrmas, que podem ser executadas com diferentes materiais em função dos projetos
desenvolvidos, sendo estimulada a utilização de materiais recicláveis.
Desde a sua primeira aplicação, o exercício sofreu algumas variações nos tipos de
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elementos construídos. Em 2015.2, foram propostos os seguintes elementos: Banco (lugares
de descanso, socialização ou contemplação); Lixeiras (separadores de lixo); Bicicletário
(guardar ou compartilhar bicicletas); Mesa; Equipamentos de Ginástica (equipamentos para
a prática de exercícios físicos); Brinquedos infantis (equipamentos para playground);
Jardineira vertical (elemento vertical para o cultivo de plantas). Em 2016.1, além dos
elementos propostos em 2015.2, foram acrescentados os seguintes: Luminária (poste
sinalizador limitado a 1,5 metros de altura); Escada (protótipo); Bebedouro urbano.
Em 2016.2, foram propostos novos tipos de elementos e também foi introduzida uma
modificação, incorporando ao exercício temas de seminários de pesquisa sobre técnicas
construtivas e materiais de construção. Dessa forma, foram desenvolvidos os seguintes
temas no exercício de canteiro experimental: Piscina/ Sistemas de contenção do solo;
Espreguiçadeira/ Argamassa armada; Churrasqueira/ Concreto com fibras; Luminária/
Concreto leve; Bebedouro/ Concreto de alto desempenho (CAD); Aparelho de ginástica/
Gerenciamento de Resíduos na Construção Civil/ RCD; Brinquedo para crianças/ Concreto
colorido; Escada/ Pré-fabricação de Estruturas de concreto armado; "Orelhão" de celular/
Concreto de alto desempenho (CAD); Estante/ Pré-fabricação de Estruturas de concreto
armado; Brinquedo para jovens/ Concreto com fibras.
As modificações realizadas no período de 2016.2 buscaram incorporar as sugestões feitas
pelos alunos durante as entregas dos trabalhos dos períodos anteriores. Também procurou
desenvolver mais fortemente o caráter de pesquisa e experimentação através dos temas de
seminário que, ao serem aplicados no exercício de Canteiro Experimental, representam uma
possibilidade de aplicação prática dos conceitos pesquisados.
As entregas dos exercícios são realizadas em diferentes etapas: Estudo preliminar com
apresentação de croquis iniciais, conceito e referências; Anteprojeto com definição da forma
representada em planta e perspectiva; Projeto executivo, incluindo a representação final do
projeto (planta, corte e perspectiva), plantas de fôrmas, plantas de armação, quantitativo de
materiais e cronograma de execução; Entrega final realizada no Canteiro Experimental com
apresentação dos Protótipos e análise crítica.
As entregas preliminares (Estudo preliminar e anteprojeto) são apresentadas em sala de
aula em formato digital (slides). Já a entrega do Projeto executivo é realizada em uma
prancha resumo apresentando sucintamente o projeto no formato A2 vertical (ou dois A3
combinados) e um caderno com as demais informações, sendo apresentado em sala em
arquivo digital (slides). No projeto executivo, pede-se: memorial descritivo abordando os
principais conceitos da proposta; perspectivas e desenhos cotados do objeto, com as
informações necessárias para a execução do mobiliário (planta baixa, cortes, vistas e
perspectivas); perspectivas e desenhos cotados das fôrmas, com as informações necessárias
para a execução do mobiliário (planta baixa, cortes, vistas, e perspectivas); planta de
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montagem das armaduras; memórias de cálculo; quantitativo e custo estimado do elemento


projetado; cronograma de execução do exercício, considerando a data da entrega final.
A entrega final, realizada com a presença dos alunos de todas as turmas da disciplina,
representa o momento de análise critica do projeto desenvolvido, com apresentação dos
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aspectos positivos e negativos da experiência. A Figura 3 ilustra um desses momentos, onde
se observa a apresentação de um dos trabalhos.

Figura 3 – Entrega dos trabalhos da disciplina Processos Construtivos 2 (julho de 2016)

Exercício PC2 – 2016.2

Fonte: Os autores, 2016.

Durante o desenvolvimento dos projetos e ao longo da execução dos elementos


projetados, os alunos são estimulados a aplicar e integrar conteúdos de diferentes
disciplinas. Não como uma obrigação, mas como uma forma de projetar e executar
adequadamente. A experimentação é estimulada, no entanto, evita-se que seja utilizado o
empirismo em situações onde conceitos podem ser aplicados diretamente. Assim, por
exemplo, é possível verificar que os alunos espontaneamente buscam ferramentas de
análise estrutural e auxílio dos professores da disciplina Estruturas de Concreto Amado para
identificar os esforços solicitantes nos elementos e assim projetar adequadamente o reforço
de aço e detalhar as plantas de armação.
Alguns conteúdos, presentes na grade curricular do curso e períodos mais avançados, são
trabalhados nos exercícios, notadamente aqueles relacionados com gerenciamento e
orçamento na construção e detalhamento de projeto. Com relação a conteúdos relacionados
com história e teoria, já bastante conhecidos por parte dos alunos e explorados em
disciplinas anteriores, observa-se pouca utilização nos estudos preliminares, na conceituação
do projeto e em suas referências. Com relação aos conteúdos de projeto, observa-se que os
alunos usam conhecimentos já adquiridos na concepção do projeto, com domínio formal e
de representação, porém, apresentam bastante dificuldade com o detalhamento e o
entendimento a materialidade dos elementos. Alguns conteúdos, como aqueles
relacionados com instalações prediais, só podem ser aplicados em exercícios específicos.
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A Figura 4 apresenta o quadro de análise desenvolvido de modo a sistematizar a análise da


aplicação e integração dos conteúdos nos 28 exercícios realizados nos três períodos. Na sequência,
são apresentados alguns exemplos de trabalhos que ilustram os projetos desenvolvidos.

Figura 4 – Quadro analítico da integração de conteúdos


409 2015.2 2016.1 2016.2

JARDINEIRA VERTICAL

ORELHÃO - CELULAR
JARDINEIRA colmeia

ESPREGUIÇADEIRA
CHURRASQUEIRA
BRINQ. INFANTIL

BRINQ. INFANTIL

BRINQ. INFANTIL
JARDINEIRA PET

BRINQ. JOVENS
EQ. GINÁSTICA

EQ. GINÁSTICA

EQ. GINÁSTICA
BICICLETÁRIO

BICICLETÁRIO

BEBEDOURO

BEBEDOURO
LUMINÁRIA

LUMINÁRIA

ESTANTE
ESCADA

PISCINA

ESCADA
LIXIERA

LIXIERA
BANCO

BANCO
MESA

MESA
SETORES - CONTEÚDOS

01. Tecnologia da Construção


02. Sistemas Estruturais
03. Mecânica das Estruturas
04. Dimensionamento dos Materiais
05. Gerenciamento da Construção
06. Topografia
07. Instalações Prediais
08. Tecnologia do Meio Ambiente
09. Projeto de Arquitetura
10. Projeto Pasagístico
11. Projeto de Urbanismo e Planejamento Urbano
12. Expressão gráfica, geometria descritiva e perspectiva
13. História, Teoria e Preservação

Legenda O conteúdo foi a pl i ca do a dequa da mente


O conteúdo foi a pl i ca do pa rci a l mente
O conteúdo nã o foi a pl i ca do

Fonte: Os autores, 2017.

4.1 Brinquedo Infantil – 2015.2


O projeto do brinquedo infantil “trepa-trepa” consistiu em um elemento formado por
quatro pilares cilíndricos, interligados por vigas cilíndricas compondo um quadro em planta.
As vigas cilíndricas funcionam como suportes para os apoios das cordas e redes em sisal que
serviriam de auxílio para a escalada da criança sobre o brinquedo.

Figura 5 – Projeto e desenvolvimento da execução do brinquedo infantil em 2015.2.

Fonte: Acervo dos autores, 2017.

No projeto, os alunos utilizaram tubos de PVC de 150 mm como fôrmas para o


desenvolvimento dos pilares de suporte e tubos menores de 100 mm para as vigas. Ainda no
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mesmo projeto, foram desenvolvidas quatro sapatas de concreto para apoio do brinquedo
no solo do canteiro experimental. A Figura 5 ilustra o desenvolvimento do exercício.
Durante a execução do brinquedo, alguns problemas foram percebidos pelos alunos, que
tiveram dificuldade em montar a armadura dos pilares cilíndricos. A necessidade de elaborar
410
os estribos pequenos o suficiente para caber no interior das fôrmas e ainda assim manter o
cobrimento mínimo exigido por norma foi bastante desafiador aos alunos. Outro ponto
crítico na execução foi a concretagem dos pilares de concreto no local, com dificuldade no
ajuste dos prumos. De um modo geral, o exercício atingiu satisfatoriamente o seu objetivo,
faltando apenas as cordas e as redes de acabamento, que foram suprimidas da execução por
falta de espaço no canteiro de obras. O experimento do brinquedo exigiu dos alunos a
utilização de diversos conhecimentos obtidos em muitas disciplinas como estrutura,
processos construtivos, topografia, projeto, expressão gráfica e outras.

4.2 Jardineira Vertical – 2015.2


O projeto da jardineira vertical surgiu com uma proposta sustentável de aproveitamento
das águas pluviais como elemento natural de irrigação para as plantas utilizadas como
elementos decorativos dos blocos. O desafio de criar um material à base de cimento
permeável e capaz de permitir a passagem da água de chuva através das paredes dos blocos
norteou a concepção do objeto projetado. A ideia básica consistiu em blocos de concreto
armados permeáveis que, seguindo uma forma modular, seriam encaixados uns aos outros,
montando uma espécie de parede jardim. Cada bloco foi projetado para conter em sua área
vazada uma pequena jardineira e a água proveniente das chuvas irrigaria os blocos superiores
e, por percolação, seguiria para os demais inferiores. A Figura 6 ilustra aspectos da concepção
do projeto e diferentes fases de execução durante o desenvolvimento do exercício.

Figura 6 – Projeto e desenvolvimento da execução da jardineira vertical em 2015.2.

Fonte: Acervo dos autores, 2017.

Os conceitos teóricos da disciplina de Processos Construtivos 2 relacionados com


tecnologia do concreto foram diretamente empregados. Os alunos se viram diante do
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desafio de produzir um concreto poroso suficiente para permitir a percolação adequada da


água, mas sem perder as propriedades estruturais que o bloco de concreto exigia em sua
demanda inicial de projeto. Outra dificuldade foi o processo complexo de desmoldagem das
peças e a necessidade de reaproveitamento das fôrmas. Durante o processo de elaboração
411
das fôrmas, houve a necessidade de refazer o trabalho devido à falta de resistência em seu
modelo inicial de isopor, sendo que uma solução em madeira foi produzida para a realização
das réplicas subsequentes.

4.3 Mesa – 2015.2


O projeto da mesa foi concebido em uma estrutura de encaixe de concreto armado, que
serviria de suporte tanto para o tampo único de madeira como para os seus pés de apoio.
Dessa forma, foi desenvolvido um elaborado e complexo processo de montagem de fôrmas
em madeira para uma concretagem única de cada peça estrutural do protótipo. Os desenhos
das fôrmas foram criados através do uso da gráfica digital como ferramenta de auxílio.
Para o projeto desta peça armada, os alunos utilizaram os conceitos ensinados em
isostática e sistemas estruturais, utilizando uma ferramenta de análise estrutural para obter
os diagramas de momentos fletores e cortantes para posterior definição do posicionamento
das armaduras de tração na peça de concreto. Como havia uma limitação de material
imposta pelo exercício, a análise estrutural foi primordial para a economia de material na
peça final. A mesa (Figura 7) consistia basicamente em quatro peças monolíticas de concreto
unificadas em formação de um único bloco de apoio para o tampo.
O processo de fabricação das peças de concreto se deparou com diversos problemas na
concepção inicial da forma estrutural. Dentre eles, os mais importantes foram as correções
de desenho para alívio nos pontos de tensão das quinas da forma. O peso final e excessivo
da mesa também foi um grande problema na hora de sua execução.

Figura 7 – Projeto e desenvolvimento da execução da mesa em 2015.2

Fonte: Acervo dos autores, 2017.

4.4 Bebedouro – 2016.1


O exercício proposto era um bebedouro com instalação hidráulica simplificada. O projeto
partiu do conceito da dobra e propôs uma forma semelhante a um origami japonês
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conhecido como Tsuru. O projeto previa um bebedouro acessível em duas alturas que
pudesse ser acessado tanto por uma pessoa em pé como por uma criança ou uma pessoa
em cadeira de rodas. A jardineira central previa o reaproveitamento de parte da água que
seria descartada; sendo assim, foi proposta uma instalação que dividiria essa água: parte
412
passando pela jardineira e parte indo diretamente para o esgoto. Utilizou concreto armado,
madeira para as bandejas, tirantes metálicos para a junção dos perfis, instalação hidráulica
simplificada (mangueira de borracha) e vegetação (Figura 8).

Figura 8 – Projeto e desenvolvimento da execução do bebedouro em 2016.1

Fonte: Acervo dos autores, 2017.

O objeto executado atendeu plenamente o objetivo funcional, teve um bom projeto


executivo e uma execução bem coordenada, terminando antes do prazo previsto. Previu
uma instalação hidráulica simplificada e agregou uma jardineira para o reaproveitamento
parcial da água. Além disso, o resultado estético foi muito bom.
O único ponto fraco do projeto foi o fato de que o grupo não previu os furos necessários
para passagem dos tirantes ainda na etapa da concretagem. Assim, posteriormente, foi
necessário executar as perfurações nos elementos utilizando brocas, causando pequenas
fissuras, mas sem comprometimento estrutural.

4.5 Brinquedo Infantil – 2016.1


O exercício propôs o desenvolvimento de um brinquedo infantil. O projeto previu duas
paredes que pudessem ter aberturas pequenas para escalada e uma abertura grande para
que permitir a passagem de crianças. As duas paredes seriam presas uma a outra por barras
de aço, onde a criança poderia se pendurar e “atravessar”. Tais barras também cumprem o
papel de estabilizar as paredes. Uma parede foi realizada com o material dado para o
exercício (1 saco de cimento) e a outra foi feita com investimento do grupo. O grupo fez
pequena uma fundação onde as placas foram encaixadas e concretadas.
O grupo teve bastante dificuldade na execução. A começar pela madeira das fôrmas, que
foi toda reaproveitada de sobras encontradas na própria faculdade, mas o principal
problema foi o prazo. O grupo foi sendo esvaziado ao longo do período e por fim só contava
com 4 pessoas (os demais grupos tinham 8), o que obviamente reduziu a capacidade de
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trabalho e atrasou a entrega. No dia determinado, o grupo apresentou o trabalho


incompleto e, na semana seguinte, já nas férias, terminou a execução. Embora tenham tipo
estes contratempos, o trabalho ficou muito bem executado, e o envolvimento e persistência
do grupo foi admirável (Figura 9).
413
Figura 9 – Projeto e desenvolvimento da execução do brinquedo em 2016.1

Fonte: Acervo dos autores, 2017.

4.6 Estante de apoio – 2016.2


A proposta do exercício era o projeto e execução de uma estante de apoio em concreto
armado. A opção do grupo foi o desenvolvimento de um módulo que pudesse, ao ser
empilhado, servir a função requerida, mas que também pudesse ser utilizado para outras
funções como assento, mesa e jardineira. O desenho do objeto surgiu da desconstrução do
bloco a partir de angulações para gerar encaixes e apoios. O sistema de pré-fabricação foi
condicionante para o sucesso da execução do projeto. Foram confeccionadas duas fôrmas
em madeira com cantos arredondados em chapa metálica. As armaduras foram
confeccionadas com barra de aço, dobradas no formato da peça e amarradas com os
estribos formando uma gaiola. Foram executadas duas concretagens em cada fôrma,
gerando ao total de quatro peças. Todo o processo do projeto à execução foi realizado pelos
alunos com orientação dos professores e técnicos do laboratório (Figura 10).

Figura 10 – Projeto e desenvolvimento da execução da estante em 2016.2

Fonte: Acervo dos autores, 2017.


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A execução da primeira peça teve problemas com o adensamento do concreto o que


ocasionou a segregação do material em um trecho, sendo que a peça foi reparada com o uso
de uma argamassa e a procedimento foi corrigido para as demais peças que foram
executadas sem problemas.
414 A premissa de Vilanova Artigas de que “Arquitetura se aprende é no canteiro” é com
certeza a essência do que foi o curso de Processos Construtivos 2. Todo o trabalho
desde a ideia inicial até o produto final trouxe à tona uma série de questões nunca
antes levantadas no curso, ou quando foram, nunca de maneira tão próxima da
realidade. São muitos detalhes e técnicas de execução não imaginadas ou
representadas antes da vivência projetual prática, apesar de tudo podemos dizer que
conseguimos edificar o projeto inicial com êxito. (...) No geral o resultado foi muito
positivo e o objetivo alcançado. De fato o curso de PC2 é aprender a arquitetura no
canteiro, como disse Artigas (Texto do grupo sobre a experiência).

4.7 Luminária – 2016.2


A proposta do exercício consiste no projeto de uma luminária urbana com altura limitada
em 1,50 m em razão da segurança no canteiro. Esta luminária (Figura 11) deveria utilizar
obrigatoriamente o concreto leve que era tema de um seminário também apresentado pelo
grupo. O partido da luminária surgiu do desenho de uma árvore e suas ramificações,
conforme texto do grupo: "o suporte da base quadrada representaria o caule enraizado na
terra e demarcado pelos canteiros, suas hastes sobrepostas uma a outra seriam os galhos
que vão ganhando vida. Já a luz (lâmpada) seria como o fruto concebido por essa árvore”.

Figura 11 – Projeto e desenvolvimento da execução da luminária em 2016.2

Fonte: Acervo dos autores, 2017.

O trabalho atendeu todas as expectativas, tanto do ponto de vista estético quanto


funcional. O projeto foi muito em pensado e detalhado e a execução foi bem-sucedida. A
principal dificuldade foi a montagem das fôrmas, embora estivessem bem detalhadas no
projeto executivo, a madeira comprada para as fôrmas não era adequada e fez com que a
equipe tivesse um trabalho muito maior que o necessário para evitar as deformações na
III ENEEEA – Ouro Preto, Brasil, 07 a 09 de junho de 2017.

concretagem. Foi necessária a confecção de peças extras para estrutura a fôrma e evitar a
perda da forma final da peça. Este contratempo gerou certo atraso na concretagem, mas
nada que comprometesse o resultado final e a entrega na data prevista.
O uso do concreto leve também foi outro desafio da execução, para diminuir o peso da
415
haste parte do agregado graúdo, foi substituído por argila expandida e parte da areia
substituída por vermiculita. Como estes elementos entram na mistura já hidratados, a
quantidade de água do traço era algo a ser observada. Além da armadura, foi também
executada a instalação elétrica da luminária, incluindo as lâmpadas, acesas no dia da
entrega do trabalho.

4.8 Espreguiçadeira – 2016.2


O exercício proposto consistia no projeto de uma espreguiçadeira em argamassa armada
(Figura 12). O desenho do projeto seguiu um traçado orgânico e se apropriou das
possibilidades formais oferecidas pela argamassa armada. Conforme apresentado pelos
alunos, “Lapidar a forma do mobiliário proposto até que a sensação de dureza e de
desconforto do concreto fosse substituída por algo mais receptivo e a prazível visualmente.
Os ângulos acentuados foram substituídos por curvas de tamanho médio e o espaço de
deitar-se se manteve como principal sinuosidade orgânica”.
O projeto era a execução de um objeto monolítico em argamassa e para isto foi
construída uma “super fôrma”, combinando trechos retos com trechos curvos, o que foi um
grande desafio para a equipe. O grupo teve soluções inovadoras para a confecção das
curvas. A “armadura” foi feita com a utilização de uma tela metálica.

Figura 12 – Projeto e desenvolvimento da execução da espreguiçadeira em 2016.2

Fonte: Acervo dos autores, 2017.

O desafio era pensar uma espreguiçadeira que tirasse partido das possibilidades da
argamassa armada: neste sentido, o exercício foi muito satisfatório. O projeto executado
atendeu às expectativas, embora tenha ruído no momento da apresentação por excesso de
carga. A “armadura” utilizada foi uma tela de aço fina, que se mostrou insuficiente para
garantir a resistência da peça. Ao sentarem três pessoas, a peça ruiu em pedaços.
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4.9 - Piscina – 2016.2


Um dos exercícios mais desafiadores, proposto pelos próprios alunos, foi o projeto e a
construção de uma piscina (ou, ao menos, uma parte dela). O projeto apresenta uma
proposta relativamente simples, com dois níveis de profundidade (40 e 60 cm) com uma
416 forma curva em uma das faces, visando à construção de um espaço de lazer e um referencial
lúdico dentro do Canteiro Experimental. As paredes foram executadas em alvenaria de
blocos com posterior revestimento argamassado e a face curva foi executada em concreto
armado moldado no local. A terra escavada foi ensacada e posteriormente utilizada nos
exercícios da disciplina de tecnologia de construção com terra (Figura 13).

Figura 13 – Projeto e desenvolvimento da execução da piscina em 2016.2

Fonte: Acervo dos autores, 2017.

O exercício mostrou-se completo. Durante sua execução, foram aplicados e vivenciados


diretamente conteúdos de diversas disciplinas: projeto, topografia, estudo dos solos,
contenção de solos, projeto de estruturas, processos construtivos, instalações prediais,
impermeabilização, planejamento de tempo e de custos. O exercício foi realizado dentro do
cronograma esperado, mesmo tendo sido necessárias diversas etapas de execução: locação,
escavação e nivelamento do solo, preparação da base, execução de lastro de concreto,
execução de alvenarias, preparação de fôrma curva, projeto e execução de estruturas de
concreto, execução de revestimento e impermeabilização, projeto de sistema de drenagem.
Rapidamente, os alunos se deram conta da importância do planejamento e da divisão das
tarefas para conseguirem construir o projeto proposto.

5. CONSIDERAÇÕES
Ao propor um problema no qual os alunos são desafiados a construir aquilo que
projetaram, estes são colocados frente a uma situação real prática. Assim, aqueles
conteúdos apresentados em diferentes disciplinas passam a ser necessários para a solução
do problema. Por exemplo, o cálculo de esforços solicitantes deixa de ser uma abstração
para tornar-se uma ferramenta que irá possibilitar uma análise estrutural e garantir a
estabilidade do elemento projetado. Ao experimentar, com formas e seções diferentes
III ENEEEA – Ouro Preto, Brasil, 07 a 09 de junho de 2017.

daquelas convencionalmente ensinadas nas disciplinas de dimensionamento em concreto


armado (vigas de seção retangular constante, lajes planas, pilares retangulares), os alunos
são obrigados a compreender efetivamente o comportamento do material e assim
dimensioná-lo adequadamente.
417
O exercício permite uma aplicação direta dos conteúdos relacionados com a disciplina,
isto é: propriedades dos materiais de construção, tecnologia do concreto, execução de
estruturas, execução de alvenarias e revestimentos, estudos dos solos, e execução de
fundações. Também os temas abordados nos seminários de pesquisa sobre materiais de
construção e tecnologias são incorporados ao projeto, representando uma forma de
aplicação da pesquisa realizada.
Conteúdos relacionados com a gestão do processo de projeto e gerenciamento e
orçamento de obras, pela grade curricular do curso, são formalmente aprendidos apenas no
nono período. No entanto, o exercício propõe que o projeto e construção sejam realizados
dentro de um único semestre e, assim, o gerenciamento do tempo passa a ser fundamental.
A necessidade de construir “quebra” o paradigma existente em disciplinas de projeto, em
que os alunos se habituam a finalizar um projeto apenas ao final do período.
Os alunos são responsáveis pela execução de todas as fases da construção: montagem
das fôrmas; corte, dobra e montagem das armaduras; pesagem dos materiais e preparação
de concretos e argamassas; concretagens; desfôrma; transporte e posicionamento dos
elementos construídos; limpeza e preparação do terreno; escavação e movimentação do
solo; execução de fundações; e limpeza. Apesar do estranhamento inicial de alguns alunos, a
realização dos trabalhos manuais, ao longo do desenvolvimento do exercício, torna-se algo
natural, um fator de aproximação entre os alunos e de “quebra” do distanciamento da
relação aluno-professor. Para além da aplicação mais direta de conteúdos, a experiência
permite aos alunos vivenciarem também a importância do trabalho coletivo, da ajuda
mútua, da coordenação e planejamento durante a execução. Observa-se ainda uma
valorização da aproximação entre o trabalho manual e intelectual e a descoberta por alguns
alunos de habilidades e vocações que ainda não haviam sido percebidas.
Relatos de diferentes alunos, na apresentação final dos trabalhos, refletem que a
oportunidade de construir lhes permitiu compreender melhor a importância do projeto, de
suas consequências e seus impactos durante a execução. O projeto não é mais uma
representação no papel, ou uma imagem tridimensional digital, passando a ser algo real,
com forma, peso, textura e cor, ditados pelos materiais utilizados e pelo processo
construtivo empregado.
A experiência realizada no Canteiro Experimental reforça a importância da prática da
construção como um modo de integrar conteúdos e promover uma aproximação entre o
ensino de projeto, construção e estruturas. Os resultados obtidos levam à discussão sobre a
possibilidade de implantação na FAU/UFRJ de um Ateliê Integrado de Construção, onde os
alunos, divididos em grupos e com temas variados, poderiam trabalhar todas as disciplinas
de um determinado período no desenvolvimento de um projeto visando sua posterior
construção em uma ação coletiva de Canteiro Experimental. Tal estratégia pedagógica
III ENEEEA – Ouro Preto, Brasil, 07 a 09 de junho de 2017.

interdisciplinar surge como uma ideia para o necessário debate sobre um novo projeto
pedagógico para a FAU/UFRJ.

AGRADECIMENTOS
418 Os autores agradecem: à Direção da FAU/UFRJ pelo apoio na implantação e consolidação
do Canteiro Experimental; a agências financiadoras de bolsas de pesquisa, CAPES, CNPq,
FAPERJ; ao arquiteto Paulo Costa do LEMC pelo apoio técnico no desenvolvimento dos
trabalhos; aos alunos da FAU/UFRJ, em especial aos monitores de PC2 e àqueles envolvidos
no desenvolvimento dos projetos apresentados neste trabalho.

REFERÊNCIAS
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escolhidos de Lina Bo Bardi 1943-1991. São Paulo: CosacNaify, 2009.
CAMARGO, M. J. A construção como uma possibilidade de reflexão e criação. Revista Pós, São Paulo,
2010. Disponível em: <http://www.revistas.usp.br/posfau/article/viewFile/43719/47341>. Acesso
em: 20 jun. 2017.
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LIMA, J. F. O que é ser arquiteto: memórias profissionais de Lelé (João Filgueiras Lima). Rio de
Janeiro: Record, 2004.
LOPES, J. M. A. Quando menos não é mais: tectônica e o ensino tecnológico da Arquitetura e do
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LOTUFO, T. A. Rural Studio: Um novo ensino para uma outra prática. In: Encontro Latinoamericano de
Edificações e Comunidades Sustentáveis, Paraná, 2013. Disponível em:
<http://www.elecs2013.ufpr.br/Anais/edifica%C3%A7%C3%B5es/147.pdf>. Acesso em: 20 jun. 2017.
MINTO, F. C. N. A experimentação prática construtiva na formação do arquiteto. 2009. Dissertação
(Mestrado) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2009.
PISANI, M. A. J.; CORRÊA, P.; CALDANA, V.; VILLÀ, J.; GRAZIOSI, J. Canteiro Experimental: Prática ou
Invenção?. In: III Fórum de Pesquisa FAU Mackenzie, São Paulo, 2007. Disponível em:
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RONCONI, R. L. N. (apresentação). O canteiro experimental: 10 anos na FAUUSP. São Paulo: FAUUSP,
2008. (Coletânea)
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urbanista. Revista Pós, São Paulo, 2005. Disponível em:
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UIA; UNESCO. Carta para a Formação dos Arquitetos. In: Assembleia Geral da União Internacional de
Arquitetos (UIA), Tóquio, 2011. Disponível em: <http://www.abea.org.br/?page_id=304>. Acesso em:
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