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1. INTRODUÇÃO
O Transtorno do Espectro Autista (TEA), em nossa contemporaneidade é entendido
como uma condição complexa do desenvolvimento que tem como característica uma
variedade de sintomas nas áreas sociocomunicativa e comportamental, incluindo: sintomas
emocionais, cognitivos, motores e sensoriais. Historicamente, o TEA foi descrito pela
primeira vez em 1943 pelo médico Leo Kanner, o qual denominava o autismo como Distúrbio
Autístico do Contato Afetivo, em que haviam características comportamentais com bastante
especificidades, tais como: potencialidade cognitiva, início precoce, solidão, preferência pelo
brincar sozinho e também uma maior incidência no sexo masculino.
Para este estudo nos pautamos no Manual diagnóstico e estatístico de transtornos
mentais (DSM – Diagnosticand Statistical Manual of Mental Disorders), que apresenta em
1952 a primeira história relacionada ao autismo, associando de maneira errônea o TEA com a
esquizofrenia e, somente a partir de 1980, com o DSM- III, em que dicotomiza essa relação,
afirmando que todas as inúmeras repetições em que o autista fazia consigo mesmo, não eram
alucinações, mas sim ecolalias. Mais adiante, com o DSM- IV traz em suas alterações uma
nova proposta de considerar o autismo dentro de uma tríade autística: dificuldade na
socialização, comunicação e interesses restritos e estereotipados, porém, com uma diversidade
de categorias e seções de classificação. E, a fim de suprir motivos políticos, a partir de 2013,
com o DSM-V, não se tem mais essa gama de possibilidades, e, traz apenas o Transtorno do
Espectro Autista, com o intuito de garantir o acesso dos autistas aos tratamentos
especializados.
Pensando nesses aspectos, nas características e nos déficits de cunho
sociocomunicativo, entendemos que o autista demonstra uma maior preferência por objetos, e
não por pessoas. Nesse sentido, as crianças autistas apresentam prejuízos proeminentes no que
diz respeito às brincadeiras imaginativas, jogos de imitação e rotinas simples, em sua maioria,
as crianças com TEA não realizam essas atividades, ou quando as fazem, são de maneira
robotizada. Diante disso elencou-se como objetivo da pesquisa buscar apresentar a
importância da brincadeira e da mediação do professor na perspectiva da Teoria Histórico-
Cultural como instrumento para as crianças autistas se orientarem nas relações sujeito-sujeito
e sujeito-objeto. A metodologia a ser utilizada contemplou a pesquisa qualitativa do tipo
bibliográfica, com respaldo nos fundamentos do método crítico-dialético e sustentada a partir
de livros e periódicos de autores que versem sobre a Teoria Histórico-Cultural, cuja
concepção corrobora ao entendimento de que jogos e brincadeiras são recursos que, pela
mediação docente, podem contribuir com o desenvolvimento do pleno potencial cognitivo,
físico e afetivo das crianças autistas, fomentando sua comunicação e interação social. O
problema consiste em saber como as brincadeiras e os jogos podem auxiliar no processo de
comunicação e interação da criança autista, a partir do olhar da Teoria Histórico-Cultural?
Devido aos prejuízos significativos que este transtorno impõe para o desenvolvimento
global do sujeito, e partindo-se do pressuposto defendido pela Teoria Histórico-Cultural de
que o aprendizado é a mola propulsora do desenvolvimento humano, precedendo-o e o
impulsionando, torna-se relevante que a prática pedagógica seja respaldada por uma mediação
docente, a fim de engajar o sujeito em uma atividade que o estimule. Nesta ótica, salienta-se a
importância dos jogos e das brincadeiras como instrumentos para promover a comunicação e
a interação social dos autistas.
Cada vivência, cada nova experiência da criança exige o trabalho coordenado de todos os
mecanismos psicofisiológicos – a atenção, as percepções, os sentimentos, o pensamento, a
imaginação, a memória, a fala – que transformam as percepções que a criança vai fazendo
do seu entorno em novos níveis de relação com o mundo. (MELLO, 2007, p. 91)
Corroborando neste espeque, Chiote (2013) traz a análise de um estudo sobre o papel
da mediação pedagógica em situações de brincadeiras de uma criança autista, suas professoras
e as demais crianças de uma turma de Educação Infantil do município de Cariacica, no
Espírito Santo, no qual as docentes ao se engajarem diretamente nas brincadeiras criaram e
recriaram oportunidades de aproximação e envolvimento da criança autista com as demais e
vice e versa, fomentando que experiências lúdicas enriquecedoras acontecessem entre elas.
A participação das professoras nas brincadeiras desfez a resistência de algumas
crianças em brincar com a criança autista, favorecendo que elas a colocassem na brincadeira,
uma vez que a criança autista não se aproximava das demais crianças nem demonstrava,
expressa ou claramente, o desejo de com elas brincar. Ao investirem para que a criança autista
“[...] pudesse vir a realizar ações implicadas no jogo, adultos e crianças proporcionaram inter-
relações repletas de significados que só podem ser compreendidos no contexto das próprias
brincadeiras” (CHIOTE, 2013, p. 69), e no imitar ações, a criança autista sinaliza que está
internalizando regras e desenvolvendo processos autorregulatórios, o que de acordo com a
autora, além de indicar a (re)ssignificação de práticas sociais e culturais desta criança,
converteram-se em balizadores para o avanço do trabalho mediador de suas professoras.
A mediação pedagógica nas situações de brincadeiras dentro das escolas de Educação
Infantil não só orientam o aprendizado para as possibilidades do que a criança autista pode vir
a construir, rompendo com as limitações impostas pelo próprio diagnóstico, como também
permite a reelaboração de novos sentidos em relação ao olhar que se lança para a imagem do
outro, ao mesmo tempo em que a imagem que o outro tem de si também é reelaborada.
Ressaltando, o professor e sua atuação junto à criança, valorizando o educar e o cuidar passa a
potencializar habilidades, conhecimentos e experiências que contribuem para o
desenvolvimento pleno da criança, contribuindo assim, para uma prática pedagógica que
priorize a humanização da criança, sujeito de direitos e entendida como cidadã.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Desde que nascemos, somos inseridos em um contexto sociocultural construído
historicamente, a família é entendida como o centro de maior importância de nossa sociedade,
onde os indivíduos criam e conseguem desenvolver sua identidade. Nessa perspectiva,
analisando o contexto histórico social de nossa contemporaneidade, vemos as crianças
adentrando cada vez mais a etapa da Educação Infantil e a escola, juntamente com a família,
assumindo a responsabilidade de educar as crianças pequenas. A partir disso, faz-se
necessário a compreensão da importância das relações sociais para as crianças em seu
processo de desenvolvimento e aprendizagem, entende-se, portanto, que não basta apenas o
contato físico e sim, estabelecer uma relação sujeito-sujeito e relação sujeito-objeto. Nesse
sentido, partimos da ideia da mediação do professor para envolver e engajar o sujeito em uma
atividade.
O brincar que não sucede espontaneamente em crianças típicas, sendo adquirido a
partir de experiências em situações de interação com adultos e/ou outras crianças, nas crianças
autistas, afigura-se em um processo que além de árduo, acaba sendo longo e desanimador para
os sujeitos envolvidos. Os déficits nas áreas sociocomunicativa e comportamental podem
propiciar que se caminhe na direção contrária, desacreditando da importância do brincar na
constituição desses sujeitos, uma vez que, segundo Vigotski (1983), deve-se envolver a
criança com autismo em situações de brincadeiras, o que exige um maior investimento do
outro nos processos de significação das ações e tentativas de interação estabelecidas pela
criança. Assim, partindo das singularidades das crianças autistas, entende-se que o brincar
assiste ao desenvolvimento delas, ou seja, criamos as oportunidades a partir de experiências
concretas e nos processos de interação e comunicação social. Esse estudo, portanto, visa
questionar como são as relações sujeito-objeto e sujeito-sujeito, de que maneira são realizadas
as mediações pedagógicas para promoção da socialização no contexto escolar, além de
contribuir significativamente na formação de profissionais da educação e aumentar o
repertório de estudos nessa temática.
REFERÊNCIAS
MARTINS, Alessandra Dilair Formagio . GÓES, Maria Cecília Rafael de. Um estudo sobre
o brincar de crianças autistas na perspectiva histórico-cultural. Revista Semestral da
Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional, SP. Volume 17, Número 1,
Janeiro/Junho de 2013: 25-34.
PRESTES, Zoia Ribeiro. Quando não é a mesma coisa: análise de traduções de Lev
SemionovitchVigotski no Brasil: repercussões no campo educacional. 2010. 295 f. Tese
(Doutorado em Educação)- Universidade de Brasília, Brasília, 2010.
VIGOTSKI, L. S. Obras escogidas III: história del desarrolho de las funciones psíquicas
superiores. Madri: Visor, 1983.