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Resumo
Este estudo busca conhecer inicialmente a historiografia das Irmandades na Igreja
Católica do Centro do Rio de Janeiro e posteriormente analisar os planos de ação pastoral das
Irmandades, no período dos séculos XVII e XVIII, que se traduziam em atividades sociais,
filantrópicas, exercícios espirituais e devocionais; encontrar relações entre suas atividades.
Seu objetivo principal é o aperfeiçoamento do entendimento das influências das Irmandades
na ação pastoral da Igreja. Para tanto, foi estudada a historiografia dos respectivos séculos,
abordando a temática referente às Irmandades por meio da observação de uma vasta
bibliografia consultada; em seguida, realizou-se uma breve leitura do estatuto e a elaboração
de sínteses, que foram realizadas a fim de vislumbrar seus impactos no comportamento dos
membros das Irmandades e suas atividades. Além disso, visou contribuir também para o
desenvolvimento de subsídios para estudos futuros.
Introdução
A pesquisa tem por objeto de investigação as Irmandades nas Igrejas do Centro do Rio
de Janeiro e seu processo evolutivo, sua estrutura e atividades pastorais, durante os séculos
XVII e XVIII, especificamente; Essas organizações foram de singular importância na vida
eclesial e na sociedade.
As irmandades religiosas tiveram uma importância fundamental na expansão católica na
América portuguesa e, assim como suas congêneres lusitanas, reuniam leigos em torno da
adoração aos santos de devoção popular, além de prestarem serviços de ajuda mútua, desde a
realização de festas até a promoção de cerimônias de exéquias e auxílio aos irmãos
necessitados (doentes, presos, cativos). Desse modo, as Irmandades que foram erguidas entre
os séculos XVII e XIX no Brasil foram responsáveis pelas devoções católicas e pela
promoção das festas religiosas, e eram marcadas pela grandiosidade dessas manifestações
exteriores da fé e também pelas questões políticas que envolviam as Irmandades, o Estado e o
poder eclesiástico.
Como a história poderá nos auxiliar a compreender o processo de desenvolvimento e
vida dessas Irmandades? Qual a sua importância na paróquia? Qual o ideal de Igreja? O ideal
seria uma inserção social ou a necessidade de uma vivência do Evangelho? Quais
características apontam a teologia refletida e aderida por estas Irmandades nos séculos XVII e
XVIII? A intenção deste trabalho é a de desvelar estas inquietações, vislumbrando uma
religião cristã, embasada em valores cristãos, pautando-se em reflexões sobre questões
teológicas pastorais e históricas.
Foi realizado um estudo da experiência religiosa, ou “ação pastoral” das Irmandades nos
séculos XVII e XVIII como elemento da Igreja e Estado.
Levou-se em conta a riqueza do leigo inserido nas Irmandades católicas, o que foi
possível observar em inúmeras abordagens: histórica, sociológica, religiosa, étnica e
teológica. Contudo, chega-se a conclusão de que é preciso estar atento a esta multiplicidade
de aspectos.
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Referencial Teórico
O nosso referencial teórico é interdisciplinar, uma vez que entendemos ser este o
caminho possível para responder às questões colocadas na pesquisa. Usamos as contribuições
da história no que se refere à contextualização das origens, presença e ação das Irmandades
nas igrejas do centro do Rio de Janeiro, através de bibliografia que a Igreja pode oferecer e
artigos científicos que também tratam do assunto.
Fez-se uma investigação no intuito de identificar os grupos étnicos predominantes
nessas irmandades nos séculos XVII e XVIII, bem como os seus traços culturais, objetivando,
com isso, perceber como esses aspectos influíam nas irmandades católicas.
As irmandades católicas resistem até hoje. O Padroado, [1] conferindo direitos à Coroa
portuguesa, favoreceu a conquista de uma relativa autonomia das Irmandades com relação à
Igreja, como já foi demonstrado em vários trabalhos realizados sobre o assunto.
As Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia [2] foram geradas a partir do
sínodo de 1707, iniciativa do arcebispo Monteiro e Vide e se compreenderam como um
intento de atualização da Igreja às condições do Brasil, entre elas a presença da escravidão.
Até o século XIX elas foram a grande referência canônica e pastoral da hierarquia da Igreja
brasileira. Esta comunicação localiza, nos cinco livros das Constituições, as considerações
referentes aos escravos.
Nas colônias, devido ao regime de padroado, [2] a Cúria Romana pouco influenciou a
Igreja local, uma vez que cabia ao rei a autoridade sobre o clero secular e religioso e a
construção de locais de culto. Neste período, a presença de africanos já era expressiva e houve
pressão pela mão de obra escrava.
Durante o século XVIII as atividades desenvolvidas pelos escravos [2] também se
diversificaram. O arcebispo Monteiro e Vide, que foi o gestor do sínodo que definiu o teor das
Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia, justificando-as nas colônias portuguesas
na África e no Brasil, uma vez que havia situações não contempladas na legislação canônica.
Pela forma como os escravos são contemplados no texto é evidente que a relação da Igreja
com eles era uma dessas "situações". Quando chegaram à América, [10] organizaram-se de
forma autônoma em relação ao clero. Antes de 1719 eram regulamentadas pelas Ordenações
do Reino que subordinava as confrarias às autoridades civis, ou seja, o compromisso era
aprovado tanto pela Igreja quanto pelo Estado. Eram vinculadas a uma freguesia, cujo sacrário
lhes competia venerar. Em 1719 foi criado o primeiro Arcebispado na Bahia.
Na perspectiva da história da Igreja na América Latina, [3] nasceram novos fatores que
foram decisivos com a presença dos Bispos, sacerdotes seculares e a nova e pujante
Companhia de Jesus. Em 1622, nasceu a Propaganda Fide para limitar os poderes do
Padroado espanhol e português. Para Dussell, as elites mais conscientes e os que realizaram a
história da América Latina, os hispânicos, crioulos e mestiços são o fundamento da cultura
latino-americana. Permaneceram cristãs. A grande parte dos índios se incorporou em parte à
cultura urbana hispânico-crioula, e com ela organizava seu próprio modo de ser cristão. A
massa índia continuava sua vida semiprimitiva, permanecia nesse estado catecumenal de
maior ou menor consciência de sua fé com maior ou menor grau de instrumentos ou estruturas
sacramentais cristãs, juntamente com os pagãos, cujo fenômeno é chamado de acumulação
eclética no nível das “mediações”. Apareceram, assim, substitutos para litúrgicos – profissões,
culto aos santos, ermidas locais sobre o lugar de antigos cultos (tal como no mundo greco-
romano ou no mundo cananeu), os símbolos, ou seja, as mediações “expressivas” das antigas
religiões estão muito presentes. Afirma que tais religiões não tem aparência mista, sendo um
“contraste” onde não se pode julgar onde começa um polo e termina outro. O chamado
Catolicismo popular não é uma religião mista, senão manifestações temporais de um povo que
anseia o término de uma evangelização. É a manifestação de uma consciência não
inteiramente cristã.
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fundando uma confraria, cujo orago era advogado das moléstias da garganta. As Irmandades
de brancos prestavam assistência médica, jurídica e funeral, e amparo financeiro.
Cada Irmandade dominava uma parcela do espaço no solo da cidade, [9] o qual era sua
base econômica, com produção agrícola, pastoril e de serviços. Acumularam propriedades
imobiliárias, numa forma de expressar a influência ideológica exercida pela religião católica,
formando sua geopolítica colonial. Herdadas da Idade Média, representavam as antigas
corporações de ofício, e por serem associações voluntárias de leigos dedicados à beneficência
social e à mútua ajuda, para Torres (1968) representavam entidades de classes.
Quanto à estratificação, [9] houve processos de acumulação e de parcelamento do
patrimônio fundiário, causando um paradigma, pois no período colonial a paisagem urbana
estava muito vinculada à presença de religiosos. As Igrejas eram responsáveis pelos avisos
das horas, dos incêndios, dos nascimentos e das mortes transmitidos pelos seus sinos.
As Irmandades foram influentes na previdência, [9] ao garantir a sobrevivência das
esposas e a educação dos filhos quando da morte de um de seus irmãos. Havia imbricação
entre o poder civil e o eclesiástico, pela divisão da cidade em freguesias de acordo com as
paróquias. A não distinção entre poder civil, militar e eclesiástico pode ser assinalada pelas
ordenações militares, não pagas, recrutadas na população local em diversos bairros. Fundaram
e mantiveram casas de abrigo, [10] hospitais e leprosários para assistência aos pobres e
doentes. Também cuidavam da manutenção de pontes e caminhos como serviço aos viajantes
e peregrinos.
A questão trabalhista ocorria de modo particular. As antigas corporações de ofício pela
matéria ou instrumento [7] (denominados bandeira) – levavam a bandeira do seu santo
protetor, porque à época não existiam partidos políticos ou sindicatos. Considerando as
opiniões e direções políticas [11] impressas por Araújo Lima, interessa sublinhar que a ideia
de cidadão dos tempos idos, leia-se, da sociedade colonial, implicava desigualdade,
confundia-se com o morador ou vizinho da cidade e não incluía o conjunto dos habitantes da
cidade e seu termo. No Brasil oitocentista vimos como o conceito de raça foi coetâneo e
correlato à discussão dos direitos civis e políticos inerentes à cidadania dos novos Estados
liberais nas Américas.
Neste ponto, recorda-se brevemente que [11] a história das Irmandades na América
portuguesa começa no reino, se mistura com a história das corporações de ofício e remonta à
Idade Média. É necessário recuperar o assunto em busca de uma abordagem que relacione
ofícios e Irmandades. Apesar da separação Estado/Igreja, as Irmandades se organizavam a
partir das estruturas administrativas da monarquia, e respondiam aos interesses de diversos
grupos sociais.
Podemos ter como exemplo a Irmandade de São José (de pardos), [11] onde os oficiais
mecânicos constituíam não só uma categoria profissional, mas uma identidade social marcada
por um estigma social negativo, que se contrapunha à honra da nobreza e aos privilégios
jurídicos associados a este grupo. Num longo movimento pela história, sua análise demonstra
que os oficiais mecânicos tinham acesso em determinados momentos a distinções e
privilégios que não resultavam da descaracterização do defeito mecânico. Muito pelo
contrário, o acesso a eles estava relacionado ao caráter atribuído às funções de representação
exercidas na cidade. Para o mestre exercer a profissão na cidade, era exigida uma carta, sendo
o documento concedido pelo juiz e escrivão do ofício. Ela é dada àquele que pagou as taxas
(entrada na irmandade, taxa de exame), foi examinado (pelo juiz ou por um avaliador
escolhido), realizou juramento sobre os Evangelhos e obteve confirmação da sua carta de
exame no Senado da Câmara. Esta confirmação é também denominada licença. Como o é a
licença provisória expedida pelo Senado da Câmara, sem o processo anterior preconizado
pelas irmandades.
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Para Ramos: “os conceitos de ‘branco’ e ‘preto’, envolvem aspectos sociológicos [4] e
não puramente biológicos. São eles, como vimos indicativos de ‘casta’ e ‘classe’, e não
servem, portanto, para a caracteri ação de fen menos biológicos de raça. Dizer que a
população brasileira se tornará ‘branca’, em alguns séculos, envolve preconceitos e atitudes
análogos aos dos defensores da teoria da nossa negralização.” Já Renato da Silveira, em seu
trabalho sobre “Pragmatismo e milagres da fé” (in Escravidão e invenção da liberdade, Reis,
J. 1988) afirma que “brancos e mestiços” é um concepção ao mesmo tempo racial e social.
Mas, haveria um modo adequado pelo qual a mestiçagem, [4] sem ser considerada
inferior, poderia ser abordada? Ramos pensa que sim, reivindicando uma análise científica
para o problema. Tal análise se pauta, inicialmente, na ideia de que é fundamental superar os
preconceitos e estereotipias, para que se possa estabelecer em termos corretos a questão, o que
facilitaria o trato do material a ser analisado. Parte deste material, acredita Ramos, é de ordem
histórica, facultado inclusive pela pesquisa genealógica, mas deve-se, também, empregar com
rigor um critério de exame das condições sociais e culturais ligadas ao fenômeno da
mestiçagem. Ademais, o autor já postulava aqui o emprego de certos exames em condições
laboratoriais dadas: verificando-se, por exemplo, índices de variação e homogeneidade, ou
falta de homogeneidade dos tipos examinados em processos estatísticos. Com isso, pretendia
incorporar à análise da mestiçagem fatores ligados aos condicionamentos social e histórico,
econômico, geográfico, alimentar, cultural e corrigir o critério estreito do fator racial. Assim,
concluirá ele: “As grande as e misérias do homem brasileiro, de qualquer mati epidérmico,
são injunções e resultados de múltiplas influências que nada têm a ver com raça. O estudo da
mestiçagem física tem que ser corrigido e completado com o da ‘mestiçagem cultural’, neste
vasto capítulo da antropologia que hoje chamamos aculturação”.
O Brasil, nação multiétnica, é um país que, até 1872, [12] não tinha informação
demográfica para mensurar a quantidade das comunidades raciais e culturais distintas.
Objetivo Geral
Investigar a atuação pastoral das Irmandades nas Igrejas do Centro do Rio de Janeiro
nos séculos XVII e XVIII, compreendendo o processo histórico e evolutivo pastoral, seu
papel na construção da identidade do catolicismo, conhecer as atividades pastorais, suas
influências, identificar seus agentes, dando relevância à religião para a vida de uma sociedade,
e descobrir novas fontes.
Objetivos Específicos
Analisar o modelo da ação pastoral vigente nos séculos XVII e XVIII.
Perceber as influências dessas Irmandades na sociedade e a influência do Estado nas
Irmandades.
Identificar seus agentes.
Buscar fontes diversas e retirar delas informações: estratificação geopolítica, histórico,
análise do estatuto e outros registros.
Conhecer a história e processo evolutivo das pastorais nas Irmandades das paróquias.
Caracterizar estas Irmandades nas paróquias e descrevê-las.
Metodologia
Para compreender a proposta de analisar as atividades pastorais das Irmandades nas
paróquias, foi necessária, como metodologia, a utilização de múltiplas fontes, que são
essenciais para o desenvolvimento de uma pesquisa.
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Resultados e Discussões
Os resultados obtidos estão apresentados no cronograma desse relatório, conforme
demonstrado abaixo.
irmandade de Santa Cecília; Igreja de São Brás – 1698; Igreja Nossa Senhora do Monte do
Carmo, hoje Irmandade da Ordem do Carmo – 1648. No século XVIII encontramos as
seguintes Igrejas: Igreja nossa Senhora da Conceição e da Boa Morte – 1700; Igreja Nossa
Senhora da Lapa dos Mercadores – 1747; Igreja Nossa Senhora do Carmo da Lapa e do
Desterro - 1750, com capela do Divino Espírito Santo; Igreja Santa Efigênia e Santo Elesbão
– 1740; Irmandade de Santo Eloy – 1776, situada na Igreja de Santa Luzia; Irmandade Nossa
Senhora dos Remédios (da Nação Mina) – 1788, situada na capela de Santa Efigênia;
Irmandade Nossa Senhora do Hospício - 1729; Irmandade Nossa Senhora Mãe dos Homens –
1782; Irmandade do Senhor Bom Homem ou Bom Jesus do Calvário – 1719, embandeirada;
Irmandade Nossa Senhora das Dores da Candelária 1780; Irmandade de São Pedro dos
Clérigos – 1732, demolida em 1943; Irmandade do Glorioso Santo Antonio da Moraria dos
Homens Pretos -1716, ereta na Igreja N. Senhora do Rosário e ocupavam apenas um altar na
Igreja N. Sra. Rosário dos Homens Pretos; Irmandade do Terço – 1722; Irmandade de Nossa
Senhora da Lampadosa – 1748; Irmandade da Gloriosa Virgem Santa Cecília – 1787, situada
na Igreja N. Senhora do Parto; Irmandade Santa Rita de Cássia – 1721, tomada pela
Irmandade do Santíssimo Sacramento em 1751; Irmandade de São Jorge (1753) e São
Gonçalo Garcia: se uniram em 1854; Irmandade do Santíssimo Sacramento – 1775; Venerável
Irmandade da Imaculada Conceição - em 1721 junto com a Igreja de N. Senhora da Boa
Morte fundaram uma capela atualmente N. Senhora da Conceição e da Boa Morte, sendo o
primeiro projeto em 1738; a Irmandade N. Senhora da Conceição dos Homens Pardos já
existia desde 1700 e era abrigada pela Antiga Sé (1755) do Rio no Castelo; quando foi
transferida a Sé do Rio a Irmandade ocupou a capela; Irmandade São Francisco de Paula –
1754, e ficou um ano na Igreja Cruz dos Militares; Irmandade dos Mártires São Crispim e São
Crispiniano – antes de 1754; Irmandade Santa Sé – possível construção em 1755, e em 1770
houve uma construção onde havia pequena ermida de N. Senhora do Ó, pedra fundamental
em 1771, após foi Capela Real, Capela Imperial e Catedral Metropolitana até 1970, e
restaurada em 2006; tem confraria Nossa Senhora da Cabeça; Ver século: Irmandade Nossa
Senhora da Misericórdia (1545) e Santa Isabel (Igreja N. Sra. Bonsucesso).
O lugar da fixação das Irmandades representava poderio e, [9] nesse sentido, a
valorização da área colonial dependia da existência desses marcos ideológico. As Irmandades
de elite, que se estabeleceram intramuros, perto do topo ou nos morros, são: a do Carmo, do
Santíssimo Sacramento da Freguesia da Candelária, da Misericórdia, a Militar da Vera Cruz
(dos oficiais e soldados da guarnição) e a de São Pedro Gonçalves (dos comerciantes e
navegantes). As Irmandades dos mais pobres são: São Francisco (dos mulatos) e seu
cemitério, que instalaram-se no rocio. A primeira Irmandade de escravos é a de Nossa
Senhora do Rosário, fundada antes de 1639 e que, antes de 1667, uniu-se com a confraria de
São Benedito: ambas tinham altar na Santa Sé. A Irmandade da Santa Casa da Misericórdia
possuía caráter médico-filantrópico, seus irmãos tinham direito a alimentação e promovia
apoio espiritual aos condenados; recebia donativos, possuía muitos bens imóveis e terrenos. A
Irmandade de São Jorge, modesta, surgiu para congregar os pardos livres e representava,
dentre outros, oficiais serralheiros, ferreiros, seleiros, barbeiros; destacava-se, nas suas festas,
percorrendo os trajetos das áreas mais nobre da cidade e pela riqueza da vestimenta dos
irmãos. A Irmandade dos mais pobres e negros, a Lampadosa dos Homens Pretos e
Obrigações, no início não aceitavam negros de Angola, mas após a mudança de seu
Compromisso passou a aceitar negros libertos e portugueses. A Irmandade mais popular e
numerosa da cidade era a Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos e acolhia apenas os
homens e mulheres de Angola. Promovia a congada (desfile do Rei Congo e seu séquito)
acompanhada de percussão, o que, no entendimento de muitos autores, deu origem ao
carnaval carioca, e foi proibida em 1820. No século XVIII, a Santa Casa permitiu à
Irmandade do Rosário sepultar seus irmãos no cemitério da Irmandade e em esquife próprio,
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vigários não fazia sermões nem pregações, seja por precária formação cultural, seja porque a
função principal era manter a fé através dos ritos.
Nas festas dos santos das Irmandades dos homens pretos e pardos, [18] as tradições
africanas se manifestavam, e tornaram-se expressão de sincretismo religioso do Brasil
colonial dos cultos afros, expressas na origem do Candomblé, nas manifestações afro-
brasileiras como o maracatu e o congado (...). Para Durkheim, as festas teriam surgido da
necessidade de separar o tempo em dias sagrados e profanos (1989). Referindo-se ao descanso
religioso, Durkheim lembra que “o caráter distintivo dos dias de festa corresponde, em todas
as religiões conhecidas, à pausa no trabalho, suspensão da vida pública e privada à medida
que estas não apresentam objetivo religioso”. Para Durkheim, as festas surgiram pela
necessidade de separar, no tempo, “dias ou períodos determinados dos quais todas as
ocupações profanas sejam eliminadas”. Adiante afirma: “O que constitui essencialmente o
culto é o ciclo das festas que voltam regularmente em épocas determinadas”.
No catolicismo brasileiro, [16] a figura dos leigos tinha maior importância que a do
clero, porque não desejavam subordinação à Igreja e o Estado lhes concedia prerrogativas, e
assim limitavam o poder eclesiástico.
Em 1622 nasceu a Propaganda Fide que limitava [3] os poderes do Padroado espanhol
e português. A Companhia de Jesus se mostrou distinta nas suas obras, pois nunca logrou se
integrar na totalidade da Igreja concreta, episcopal e nas outras ordens religiosas.
Segundo Dussell, o monopólio ideológico [3] que a metrópole possuía nas colônias –
especialmente o Tribunal da inquisição – impediu a entrada do protestantismo e das filosofias
francesas ou inglesas. Alguns africanos e seus descendentes, [12] no entanto, sustentaram
elementos das tradições religiosas politeístas, fundindo-os com os do catolicismo. Isso
resultou na criação de credos sincréticos, como o candomblé. Algumas tribos resistiram à
assimilação do islaminsmo e fugiram mais para oeste, onde eles eram capazes de manter as
suas diversas crenças politeístas ou se restringiam a aldeamentos (reservas), onde
eventualmente eram convertidos ao catolicismo.
Ferretti, em Droogers e Siebers (1991), [8] menciona que a religião popular é sempre
definida em contraste com a religião oficial e não se pode discutir sobre religião popular sem
referências à dimensão do poder. Em sua forma popular a religião influencia e é influenciada
pela sociedade e pela cultura.
Em Droogers e Siebers mostram que, no campo religioso, [18] a expressão popular é
usada pelo menos em dois sentidos. Por um lado se refere às pessoas que não pertencem ao
grupo dos especialistas da religião – o clero, os sacerdotes – e este sentido se relaciona, por
exemplo, com o catolicismo popular. Em outras formas populares, como nas religiões afro-
brasileiras e nas igrejas Pentecostais, onde a religião popular não está relacionada a uma
forma erudita, a conotação popular se refere ao sentido de grupos dominados na sociedade,
especialmente nas relações entre as classes sociais, e tem sido visto como uma fonte de
resistência e de liberação. A ideia de Gramsci de hegemonia é também aplicada aqui. O que
há de comum em ambos - FERRETTI e Gramsci - os significados do conceito de popular é a
questão do prestígio.
Religião popular e sincretismo [18] têm sido usados como termos polêmicos, quase
como sinônimos de heresia e superstição. As formas populares de religião são consideradas
como de menor prestígio na sociedade. Ferretti menciona Satriani que define a religião
popular como a religião das classes subalternas de determinada sociedade. Em Droogers e
Siebers, para Rolim (1980), os excluídos na produção econômica são muito produtivos na
área religiosa. Tendo em vista a dificuldade em se definir o conceito de popular, Montoya
propõe substituir a noção de religiosidade popular por religiosidade tradicional. Para a Igreja
Católica a religiosidade popular é considerada como inculturação ou enraizamento da religião
na cultura local.
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Conclusão
Analisando os resultados, observou-se uma forte presença da fé e das crenças como
elementos influenciadores na ação pastoral das Irmandades estudadas, assim como a marcante
religiosidade popular e o fenômeno do sincretismo. Com isso, percebe-se que as Irmandades
foram importantes: para o africano, às correntes favoráveis à libertação dos escravos, na
administração de fundos para compra de cartas de alforrias de irmãos cativos, na luta pela
ocupação do espaço social, de caráter agregativo e objetivos religiosos, na continuidade de
valores culturais e na constituição de identidade étnica, importante para afirmação de seu
poder. Arthur Ramos, sobre a repartição dos grupos étnicos no Brasil diz: “Muito têm
discutido os nossos sociólogos sobre a proporcionalidade desigual dessas misturas, no
decorrer dos tempos, acenando alguns para uma ‘progressiva ariani ação’ ou um progressivo
‘branqueamento’ das populações brasileiras, em virtude do estancamento da entrada do Negro
e as crescentes afluências do imigrante europeu; procurando, ainda, provar o progressivo
‘branqueamento’ das populações mestiças, pela reversão ao tipo branco que seria o
‘dominante’, em face das leis de Mendel”.
O Compromisso das Irmandades era um documento que regulamentava as normas de
existência. Com o Padroado Régio, o Compromisso era aprovado pela Igreja e pelo Estado.
Portanto, estavam sujeitas ao poder temporal do Estado e ao poder espiritual (hierarquia
eclesiástica). Com as Igrejas construídas pelas Irmandades, os leigos não abriam mão de suas
prerrogativas, porque quando o Estado instalava paróquias nas suas Igrejas ou delegava
construção em lugares públicos para o culto, os pedidos delas tinham que ser atendidos. Havia
também uma disputa entre elas e desejo de autonomia.
As pessoas que aqui na terra haviam sido fiéis à religião Católica, oficializada pela
Coroa lusitana, inseridos na própria estrutura da Cristandade, constituindo-se ao mesmo
tempo seus promotores e defensores, ocupariam um lugar principal na Divina Corte Celeste.
Os demais seriam distribuídos conforme suas dignidades e méritos. A vida cristã na terra ou
militante, já sacralizada, era transferida e perpetuada na visão do reino da glória celeste:
“assim na terra, como no céu”. Eis a Teologia da Salvação constituída como complemento
final da Teologia da Cristandade. Essa concepção teológica de que após a vida terrena as
almas receberiam um prêmio ou castigo eterno era comumente aceita pela sociedade colonial.
Percebe-se que as Irmandades, segundo os tecidos pesquisados, provocam reflexos
crescentes no universo social e político, e dominaram uma parcela diferenciada no solo
carioca, daí a geopolítica ideológica. O desenvolvimento das atividades apareceu em todos os
textos lidos, e, muitas vezes, foi seguido por uma segunda motivação que pode ser entendida
como busca de um poder político de dominação racional e mansa, onde o papel do
catolicismo seria absolutamente decisivo para a aceitação, com otimismo, da presença de
santos católicos nos terreiros de candomblé. Ressalta o primeiro etnólogo brasileiro, Nina
Rodrigues, com linguagem social da época, que era prática comum entre cristãos transformar
os santuários “pagãos”, para efeito de controle ideológico, em santuários cristãos, de acordo
com Vittorio Lanternari, Occidente e Terzo Mondo, Bari, Dedalo Libri, 1972.
A religiosidade popular latino-americana tem um fundamento histórico católico, com
forte influência indígena, com elementos como o messianismo e influências cósmicas e
africanas, que acentua entre outros elementos a festividade, a música e o culto aos
antepassados. É difícil, porém, definir palavras como povo, popular, religiosidade. Para
Dussell, surgiram na cultura latino-americana estruturas sacramentais cristãs com os pagãos
como mediações “expressivas” através de uma manifestação consciente do catolicismo
popular, de uma consciência não inteiramente cristã.
Isso era prática comum do colonialismo português e de todos os conquistadores com os
africanos. As pesquisas corroboraram com os estudos, confirmando o fato de que as
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Referências
9 - FRIDMAN, F. Donos do Rio em nome do Rei: uma história fundiária da cidade do Rio
de Janeiro Rio de Janeiro: Garamond/Jorge Zahar Editor, 1999. 302p.