Livro Agora

Sabrina nº 1138
Sedutor e milionário...
Mistress to a Millionaire
Helen Brooks
Uma amante perfeita...

Daisy prometera a si mesma que
nunca mais se apaixonaria. Por isso,
quando um sexy milionário italiano lhe
pediu para cuidar do filho de seis
Projeto Revisoras
Helen Brooks Mistress to a millionaire
anos em troca de um ótimo salário,

além de casa e comida, ela recusou.
Sabia que viver sob o mesmo teto que
Slade Eastwood seria um convite a
problemas.
Mas Slade não era do tipo que
aceitava uma negativa. Quando queria
algo, não desistia, e era de Daisy que
precisava... Sua doçura a faria a babá
perfeita para seu filho... e a amante
perfeita para ele!
Digitalização: Simoninha
Revisão: Edna F.
Sabrina nº 1138
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Helen Brooks Sedutor e milionário
Querida leitora,
A paixão não manda recado,
simplesmente chega... e arrasa. Por
isso, se você se apaixonar, não
resista, entregue-se. Aproveite a
oportunidade de viver intensamente!
Mesmo que tudo acabar, terá valido a
pena.
Janice Florido
Editora Executiva
Helen Brooks
Sedutor e Milionário.
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Projeto Revisoras
ROMANCES NOVA CULTURAL

Copyright © 1999 by Helen Brooks
Originalmente publicado em 1999 pela
Harlequin Mills & Boon Ltd., Londres,
Inglaterra
Todos os direitos reservados,
inclusive o direito de reprodução
total ou parcial, sob qualquer forma.
Esta edição é publicada através de
contrato com a Harlequin Mills & Boon
Ltd.
Esta edição é publicada por acordo
com a Harlequin Mills & Boon Ltd.
Sabrina nº 1138
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Todos os personagens desta obra são

fictícios. Qualquer semelhança com
pessoas vivas ou mortas terá sido
mera coincidência.
Título original: Mistress to a
Millionaire
Tradução: Nancy de Pieri Mielli
Editor: Janice Florido
Chefe de Arte: Ana Suely S. Dobón
Paginador: Nair Fernandes da Silva
EDITORA NOVA CULTURAL LTDA.
Rua Paes Leme, 524 - 10a andar CEP:
05424-010 - São Paulo - Brasil
Copyright para a língua portuguesa:
2000 EDITORA NOVA CULTURAL
LTDA.
Fotocomposição: Editora Nova
Cultural Ltda.
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Projeto Revisoras
Impressão e acabamento: Gráfica

Círculo
CAPÍTULO I
Daisy respirou fundo e soltou

lentamente o ar até sentir que estava
em condições de ir em frente. Seu
reflexo na vitrine da loja lhe dizia que
estava elegante e que não deveria
desistir de seu intento. Aquele era o
começo do resto de sua vida. Seria
um erro iniciá-lo como se estivesse
fazendo algo errado.
Sabrina nº 1138
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Deu uma última olhada ao vidro. A

imagem daquela mulher alta e
sofisticada, com um vestido comprado
em uma das butiques mais caras de
Londres, não combinava com ela. Mas
aquele não era o momento para
arrependimento.
A decisão havia sido tomada e ela
não voltaria atrás. Assim, ergueu a
cabeça e se misturou aos transeuntes.
Deveria ter sido o esforço sobre-
humano que fizera para se comportar
com naturalidade que a distraiu a
ponto de tentar atravessar a rua sem
olhar para os lados.
Daisy? Pode me ouvir?
Ela estava ouvindo, mas a voz
parecia vir de tão longe que não
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Projeto Revisoras
valeria à pena se dar ao trabalho de

abrir os olhos para ver de quem era.
Além disso, estava tão cansada que
não tinha forças nem sequer para
fazer esse pequeno movimento.
— Ela está voltando a si — a voz
continuou a falar —, mas é provável
que não se lembre do acidente nem de
seu próprio nome. A mente às vezes
reage de maneiras estranhas.
Como não?, Daisy quis responder.
Ela se lembrava de tudo que lhe
acontecera, detalhe por detalhe. Se
não conseguia explicar às pessoas, que
se encontravam por perto que
estavam completamente enganadas,
era por pura fraqueza.
— Já conseguiram localizar a
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família? Ou algum amigo? A moça

deve ter conhecidos ao menos — Uma
outra voz se fez ouvir.
Era grave e bonita. Bem máscula.
Com um ligeiro sotaque. Daisy tinha
certeza de nunca tê-la ouvido antes.
Era o tipo de voz que não dava para
esquecer.
— A polícia está investigando, sr.
Eastwood. Não foram encontrados
documentos em sua bolsa. Não temos
nem sequer certeza de que seu nome
seja Daisy. Esse era o nome que
estava gravado em sua pulseira.
— Pensei que as mulheres
carregassem mais do que produtos de
maquilagem nas bolsas — resmungou o
homem.
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Projeto Revisoras
— Não é o caso desta jovem

misteriosa. Mas a polícia certamente
logo descobrirá quem é.
— Você tem mais fé do que eu
nesse sentido — o homem retrucou
com uma ironia que irritou Daisy.
Afinal, o que ele tinha a ver com o que
ela carregava ou deixava de carregar
em sua bolsa?
Quando Daisy acordou, o quarto
estava em penumbra. Era um quarto
de hospital, isso tinha certeza.
Embora continuasse cansada,
tentou se levantar. Não conseguiu.
Seu corpo inteiro doía.
Percebeu um movimento a seu lado
e se apressou a descobrir de quem se
tratava.
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Era uma enfermeira. Ela estava se

levantando de uma cadeira e se
inclinando sobre sua cama.
— Como está se sentindo, Daisy?
— A mulher perguntou, amável. —
Esse é seu nome, não?
— Sim — Daisy respondeu com
dificuldade. — Estou com sede. Posso
beber um pouco d'água?
— Claro que pode. Mas apenas um
gole por enquanto, está bem?
A enfermeira ajudou-a a sentar e
ajeitou os travesseiros. Em seguida
lhe deu um copinho, desses usados
para café.
A água fresca teve o sabor de um
néctar para Daisy. Ela não se
lembrava de já ter provado uma
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Projeto Revisoras
bebida mais deliciosa antes.

— Você sofreu um acidente,
Daisy. Consegue se lembrar?
— Sim — Daisy respondeu. — Eu
me lembro do que aconteceu.
Atravessei a rua sem olhar. A culpa
foi toda minha.
— Teve sorte — a enfermeira
murmurou. — Poderia ter sido pior.
Daisy quis sorrir, mas desistiu.
Sua cabeça doía. E também seu peito,
braços e pernas. Na verdade, não se
sentia nenhuma afortunada da sorte
naquele momento.
— Há quanto tempo estou aqui?
— Foi trazida para cá ontem de
manhã. Portanto, está conosco há
mais de vinte e quatro horas. — A
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enfermeira ajeitou os lençóis e

tornou a olhar para Daisy. — Estamos
tentando localizar sua família.
— Minha família não vive na
Inglaterra — Daisy explicou. — Eu
acabo de me mudar para Londres. Não
conheço ninguém ainda. Estava a
caminho de uma agência de empregos
quando sofri o acidente.
— Oh, eu sinto muito.
Infelizmente terá de adiar seus
planos de conseguir um emprego por
mais duas ou três semanas. Mas não
deve se preocupar com isso agora.
Pense apenas em ficar boa. O sr.
Eastwood está pagando todas as
despesas.
— Despesas? — Daisy pestanejou.
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Projeto Revisoras
— Sim, você está internada em um

hospital particular, minha jovem.
Era óbvio, Daisy pensou. Não
deveria ter ficado surpresa com a
informação. Não estaria em um
quarto privativo se estivesse em um
hospital público. E não estaria
coberta com lençóis e com um
edredom do mesmo padrão. Muito
menos poderia contar com uma
televisão com controle remoto.
— O sr. Eastwood é...
— O pobre motorista que quase
morreu de susto quando você se
atirou sob as rodas de seu carro.
Daisy e a enfermeira se viraram
para a porta ao ouvirem aquelas
palavras. Nenhuma das duas havia
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dado pela presença do homem.

— Teria sido diferente se você
tivesse se atirado aos meus pés — ele
continuou, em tom de brincadeira.
— Eu sinto muito — Daisy se
desculpou e se calou em seguida. Sua
cabeça estava girando. Não saberia
dizer, contudo, se o sintoma era uma
consequência do abalo que sofrerá, ou
do impacto da visita.
O homem era alto e atraente.
Seus cabelos eram tão pretos que
pareciam azulados. Ele irradiava
arrogância e vitalidade. Os traços
eram fortes. Mas o que mais a im-
pressionou foi a profundidade de seu
olhar.
Ele atravessou o quarto e se
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Projeto Revisoras
colocou à cabeceira da cama. Em

seguida, estendeu a mão.
— Slade Eastwood. Muito prazer.
Foram apenas alguns segundos,
mas o suficiente para Daisy sentir o
toque vibrar por todo o corpo.
— Daisy Summers. Como vai?
Os olhos negros pousaram nos
castanho-claros de Daisy e depois nos
cabelos loiro-platinados que lhe
emolduravam o rosto pálido e
delicado.
— É um bonito nome. Combina com
você.
— Combina comigo?
— Sim. Daisy significa margarida.
Seus olhos se comparam ao dourado
do centro e seus cabelos às pétalas.
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Enquanto Daisy tentava se

recuperar do arrepio que o elogio lhe
causara, Slade Eastwood dirigiu-se à
enfermeira.
— Há quanto tempo ela recuperou
a consciência?
— Há poucos instantes, sr.
Eastwood.
Ele fez um sinal afirmativo com a
cabeça.
— Então não quero cansá-la.
Voltarei amanhã, está bem?
Daisy não conseguiu responder de
imediato, mas reuniu coragem e
chamou-o.
— Por favor! Não posso continuar
aqui, sr. Eastwood. Soube que está
pagando minhas despesas. Não terei
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Projeto Revisoras
condições de lhe devolver o dinheiro

por enquanto, mas assim que...
— Não se preocupe com isso — ele
a interrompeu. — Não quero que me
devolva nada.
— Oh, mas eu não posso continuar
aqui. Este hospital deve ser caro e...
— Foi meu carro que a colocou
nessa situação. Assumo toda
responsabilidade até que se recupere.
— Mas...
— Não pense mais nisso.
— Mas o senhor não teve culpa.
— Chame-me de Slade.
— Você não teve culpa. — Daisy
hesitou. — Eu amassei seu carro?
Slade Eastwood olhou para Daisy
sem esconder o espanto.
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— O que isso importa?

— Oh, eu sabia!
Daisy ficou ainda mais
constrangida ao saber que além do
susto e das despesas com o hospital,
danificara o carro.
— Ele não sentiu nenhuma dor, eu
garanto. — Slade Eastwood deu um
pequeno sorriso. — Infelizmente não
posso dizer o mesmo de você.
Portanto, não sairá daqui enquanto os
médicos não lhe derem alta.
A adrenalina entrou em ação.
Daisy teria continuado tímida e
calada, talvez, se a abordagem
tivesse sido outra, mas o modo
autoritário que ele se dirigiu a ela,
fez seu orgulho reagir.
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Projeto Revisoras
Esquecida momentaneamente das

dores, Daisy endireitou as costas.
— Sinto muito, mas não posso
aceitar sua generosidade, sr.
Eastwood.
Slade obrigou-se a ter paciência
com a jovem. Aquelas eram
circunstâncias extraordinárias, afinal
de contas.
— Sim, você pode, Daisy — ele
retrucou. — Deu-me o maior susto de
minha vida ontem de manhã e as
piores vinte e quatro horas a seguir.
Não gosto de me referir a minha
situação financeira, mas se é para
você se sentir melhor, garanto que
poderia mantê-la aqui
indefinidamente, se fosse necessário.
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A expressão de medo deveria ter

sido tão evidente nos olhos de Daisy
que Slade corrigiu-se no mesmo
instante.
— Mas serão apenas alguns dias.
Uma semana, no máximo.
De repente, Daisy descobriu que
estava cansada demais para
argumentar. Ou, então, fora o tom de
voz dele, subitamente amigável, que a
sensibilizara.
— Está bem. Desde que aceite que
eu lhe devolva o dinheiro aos poucos.
— Conversaremos sobre isso
quando você estiver melhor. — Ele
consultou seu relógio de pulso, —
Tenho uma reunião daqui a poucos
instantes e não posso chegar
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Projeto Revisoras
atrasado. Tenha uma boa noite, Daisy.

Daisy retribuiu o cumprimento
com um leve movimento de cabeça e
adormeceu em seguida.
Daisy alternou o dia entre
cochilos e alguns momentos de
lucidez, mas após uma noite inteira de
sono ininterrupto, acordou em seu
estado normal na manhã seguinte. Ou
quase. Embora já estivesse em
condições de raciocinar e tivesse
recuperado o apetite, ainda sentia
muitas dores quando respirava.
Soube que Slade Eastwood
telefonou várias vezes durante o dia
para se informar sobre seu estado,
mas somente à noite, após um
delicioso jantar de frango assado com
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cogumelos ao molho de vinho branco e

legumes na manteiga, ele apareceu
para visitá-la.
Estava terminando de comer a
musse de chocolate, com a mão
esquerda, pois a direita estava
imobilizada, quando uma batida à
porta anunciou sua presença.
— Entre — Daisy respondeu com
firmeza, apesar da excitação que se
apoderou de seu corpo.
— Oi.
Naquela noite, ele estava usando
calça jeans preta e uma pesada
jaqueta de couro também preta.
Pareceu-lhe ainda mais moreno com
aquela roupa. E mais bonito.
— Oi — Daisy respondeu com um
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Projeto Revisoras
sorriso espontâneo que se

transformou em uma expressão de
timidez ao ver o que ele lhe trouxera.
Botões de rosa cor-de-rosa e marga-
ridas em um arranjo que levava renda
e fitas de cetim. — Oh, obrigada. São
lindas.
— É um prazer oferecê-las — ele
respondeu e fitou-a de um jeito que a
fez corar. Em seguida, puxou a
cadeira para perto da cama e sentou-
se. — Como está se sentindo?
Como estava se sentindo? Até um
minuto antes, ela acreditava que tinha
feito um enorme progresso. Agora,
parecia estar flutuando como no
momento em que voltara a si.
— Bem melhor, obrigada. Estou
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certa de que amanhã poderei ir para

casa.
— Soube que sua família reside
nos Estados Unidos — ele disse, sem
dar importância a suas palavras. —
Devo entender que não há ninguém
com quem possa contar, quando tiver
alta?
Daisy custou a responder.
Precisava encontrar uma saída para
aquela situação. Algo lhe dizia que
Slade Eastwood tinha algo em mente.
O interesse da enfermeira, aquela
tarde, pelo mesmo assunto, lhe
parecera mais do que casual. O mais
provável era que tivesse sido
orientada, ou até mesmo incumbida de
lhe fazer aquela série de perguntas.
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Projeto Revisoras
Deu dê ombros.
— Não preciso de que ninguém
cuide de mim. Já sou uma garota
crescida.
— Uma garota crescida que deve
estar se sentindo como se tivesse
sido atropelada por um trator —
Slade observou. — E como acaba de
se mudar da Escócia, ainda não deve
ter tido tempo para fazer novos
amigos. Londres pode se tornar um
lugar solitário nesse sentido.
Ela estava certa, Daisy pensou. A
enfermeira havia reunido informações
sobre sua pessoa a mando de Slade
Eastwood.
Quanto a estar se sentindo
solitária, ele não podia estar mais
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enganado. Se pudesse escolher, ela

viveria sozinha para sempre. Ou
melhor, teria escolhido viver sozinha
muito antes. Ao menos nos últimos
dezesseis meses.
— Eu ficarei bem, garanto —
Daisy tentou tranquilizá-lo.
Os olhares se cruzaram e ela foi
incapaz de interromper o contato.
— Por favor, não me interprete
mal, sr. Eastwood. Eu lhe sou
extremamente grata, mas...
— Já lhe pedi que me chame de
Slade.
Era a segunda vez em poucos
minutos que ele a interrompia. Daisy
viu-se pensando que estava diante de
um homem que nunca aceitava um não
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Projeto Revisoras
como resposta.
— Mas poderei cuidar de mim sem
nenhum problema quando sair daqui.
— Meu carro ainda apresenta
sinais do quanto você sabe cuidar de
si mesma — ele retrucou.
Daisy não sabia se era de
surpresa ou de indignação a
expressão que se apoderou de seu
rosto. E Slade Eastwood deveria ter
percebido que a chocara pois seu tom
de voz tornou-se mais suave quando
prosseguiu.
— Acho que não soube como
convencê-la.
— Não se trata disso — Daisy
respondeu. — É que eu não gosto de
depender dos outros. Quero lhe pagar
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o quanto antes e...

— Como pretende me pagar se não
tem emprego e não está em condições
de procurar um no momento?
Se ele a interrompesse mais uma
vez, ela o faria ouvir seu protesto,
Daisy decidiu. Não suportava quem se
julgava dono da verdade. Apesar de
saber que a razão estava totalmente
do lado dele.
— Tenho algumas economias e o
médico disse que estarei boa em
poucas semanas.
— Soube que trabalha com
crianças.
Daisy concordou com um gesto de
cabeça. Após aquela conversa,
precisaria tomar cuidado com tudo
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Projeto Revisoras
que dissesse àquela enfermeira!

— Sim. Sou professora. Trabalhei
por dois anos em um colégio, mais
exatamente com a pré-escola.
— Você trouxe consigo o diploma
e alguma referência do colégio?
— Sim.
O que ele estava pretendendo?,
Daisy cogitou. Aquela pergunta
sugeria mais do que um interesse
pessoal.
— Isso é bom.
Ele sorriu, mas Daisy não
retribuiu. A atitude de benevolência
de Slade Eastwood a estava
incomodando mais do que desejaria
admitir.
— Por quê?
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— Talvez você possa me ajudar a

resolver um problema e ao mesmo
tempo estaria resolvendo o seu, uma
vez que faz questão de saldar sua
dívida para comigo, embora eu já
tenha afirmado de que isso não seria
necessário.
— Claro que faço.
Slade Eastwood era o último
homem sobre a face da Terra a quem
ela queria dever algo. E aquele quarto
devia estar custando uma fortuna.
Além disso, ela era a única culpada
pelo acidente.
— Foi o que pensei. E é por isso
que quero lhe fazer uma proposta. A
de levá-la comigo, quando puder sair
daqui. Segundo os médicos — ele
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Projeto Revisoras
continuou antes que Daisy pudesse

retrucar —, você não estará apta a
trabalhar por mais duas ou três
semanas. Como as despesas com
aluguel, alimentação e medicamentos
não lhe darão trégua, terá de fazer
uso de suas economias. Concorda?
Daisy foi forçada a admitir que
ele tinha razão.
— Agora, passaremos ao meu
problema — Slade declarou. — Tenho
um apartamento em Londres, mas
minha residência fica na Itália, onde
se encontra minha família.
Ele era italiano. Não entendia
como não adivinhara antes sua
nacionalidade. A pele morena, os
cabelos pretos e o sotaque deveriam
Sabrina nº 1138
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tê-la alertado.
— Minha mãe é italiana, mas meu
pai é inglês — ele prosseguiu como se
tivesse lido a mente de Daisy. —
Morei na Inglaterra os primeiros
vinte anos de minha vida. Quando meu
pai morreu, minha mãe resolveu voltar
para seu país e ficar perto de seus
parentes. Eu a acompanhei, mas ao
mesmo tempo assumi os negócios de
meu pai, aqui na Inglaterra. Depois
conheci uma garota italiana e casei-
me com ela.
Ele tinha uma esposa e, talvez,
filhos. O que era estranho. Embora
tivessem se encontrado apenas no
hospital, ela não pensara nele nem
sequer uma vez como um homem
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Projeto Revisoras
casado. Uma grande imprudência de

sua parte. Deveria ter imaginado que
um homem bonito como Slade
Eastwood não conseguiria viver
sozinho por muito tempo. Azar o dela.
O último pensamento surpreendeu
Daisy. Mal conhecia aquele homem. De
onde tirara a idéia de que poderia
acontecer algo entre eles? Ainda não
havia aprendido a lição? Não sabia
que homens bonitos significavam
perigo?
— Minha esposa relutou em fixar
nossa residência em Londres. Então,
como já estava acostumado a dividir
meu tempo entre a Inglaterra e a
Itália, decidi continuar com o
esquema. Mais tarde, quando nosso
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filho nasceu, a perspectiva de viver

apenas na Inglaterra, tornou-se ainda
mais remota.
— Você tem um filho?
— Tenho. Ele se chama Francesco
e está com seis anos. Infelizmente é
um garoto de temperamento difícil.
Ficou assim desde que Luísa morreu
em um acidente há dois anos. Não pela
falta da mãe, eu diria, porque ele
ainda era muito pequeno para
entender a situação, mas pelo
excesso de mimos que tem recebido
da avó.
Slade respirou fundo.
— Eu entendo que ele tenha
problemas por causa da falta da mãe,
mas isso não pode continuar. Minha
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Projeto Revisoras
sogra passa a maior parte do tempo

em minha casa desde aquela época e
sua influência não está me parecendo
boa. Além disso, foi ela quem
contratou a babá que está cuidando
de Francesco e quem lhe dá as
ordens.
— E sua mãe? — Daisy quis saber.
— Ela não o está ajudando a cuidar de
seu filho?
— Não. Minha mãe casou-se há
quatro anos e está morando em
Madesimo, perto da fronteira com a
Suíça. A mãe de Luísa e a babá,
Angélica, estão cuidando dele. Há
poucos dias, Angélica me avisou que
está de casamento marcado e que
pretende deixar o emprego em um
Sabrina nº 1138
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mês. Algo que está me parecendo

providencial de certa forma.
Francesco, afinal, não é mais um bebê.
Está na hora de ele começar a
desenvolver seu lado inglês. Venho
pensando há algum tempo em
contratar alguém que cuide dele, em
minha ausência, e que também lhe
ensine nosso idioma. Você seria a
escolha perfeita.
— Eu? — Daisy pestanejou.
— Por que não? Existe alguma
razão que a impeça de aceitar minha
proposta?
Não dava para explicar. Como
dizer a ele que seu sexto sentido
estava alertando-a para fugir do que
poderia ser um perigo?
37
Projeto Revisoras
— Segundo a enfermeira, você não

tem nada que a prenda aqui em
Londres.
Ela teria contado também que sua
decisão de mudar para a Inglaterra
devera-se à necessidade de romper
com o passado e tentar iniciar uma
nova vida?
— Nesse caso — Slade continuou
—, acho que tanto faz você arranjar
um emprego em um lugar ou em outro.
Eu a levaria para a Itália e ficaria
bem mais tranquilo sabendo que
Francesco estaria a seus cuidados e
que deixaria de sofrer as influências
da avó quando viajo a negócios, o que,
aliás, é uma constante.
Aquilo era uma loucura. Ela
Sabrina nº 1138
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deveria estar sonhando.

— Mas você não me conhece —
Daisy protestou.
— Eu diria que a conheci melhor
nessas conversas que tivemos do que
seria capaz de conhecer outras
candidatas durante uma ou duas
entrevistas. Além disso, você não es-
tará assumindo seu posto por
enquanto. O tempo que levará para se
recuperar será o tempo que
Francesco terá para se acostumar
com você. Não há pressa. A atual
babá poderá ficar com ele por mais
trinta dias.
Slade sorriu.
— Suas qualidades me agradam. É
franca e honesta. Sua insistência em
39
Projeto Revisoras
me reembolsar pelas despesas provam

isso. Se as referências estiverem em
ordem, e também seu diploma, eu
direi que nosso encontro foi uma obra
do destino.
Daisy baixou a cabeça para que
Slade Eastwood não visse seus olhos.
Ela não poderia trabalhar para
ele, viver em sua casa, vê-lo com
frequência. Simplesmente não
poderia.
— Sinto muito, sr. Eastwood, mas
jamais me ocorreu trabalhar como
babá. Sou professora. Costumo lidar
com muitas crianças ao mesmo tempo.
— Trabalhar com apenas uma
então será mais fácil. Como pode
saber se gostará ou não da
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experiência, sem tentar? Faríamos um

contrato temporário de três meses.
Depois, se ambas as partes estiverem
de acordo, providenciaremos um
contrato estipulando um período
maior. Eu lhe daria um adiantamento
para que acertasse suas despesas
antes de viajar, mais uma passagem
para a Itália. E você não precisará se
preocupar com meu filho até que se
recupere por completo. Angélica
estará lá e a orientará no que for
necessário.
Daisy não sabia o que dizer. Ele
havia pensado em tudo. Por mais que
tentasse encontrar uma falha em sua
proposta, não conseguia. E quando ele
mencionou a quantia que receberia em
41
Projeto Revisoras
troca de seus serviços, ela se

convenceu de que seria
completamente impossível recusar.
— Meu filho tem um professor
particular. Não pretendo dispensá-lo.
Sua função seria supervisionar suas
lições apenas, acompanhar seu
desenvolvimento e discipliná-lo, como
uma mãe faria.
O modo como Slade falou a fez
pensar que era um militar quem ele
tinha em mente para cuidar do filho,
não uma educadora.
— Sinto muito, sr. Eastwood, mas
não daria certo. Sou-lhe grata pelo
que tem feito por mim, mas...
— Então prove sua gratidão — ele
desafiou-a. — Se está preocupada
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com sua segurança, aviso-a que terá

sua própria suíte com chave e que
minha governanta e seu marido moram
na casa.
Um imenso rubor cobriu-lhe o
rosto.
— Eu não pensei nem sequer por
um segundo que tivesse segundas
intenções ao me fazer a proposta, sr.
Eastwood.
— Não?
— Não.
— Ótimo.
Não era ótimo, era péssimo. Não
fora para viver cercada de pessoas
que viera a Londres. Ao contrário.
Escolhera aquela cidade justamente
porque ali ninguém se preocupava com
43
Projeto Revisoras
ninguém. Se tivesse conseguido o

emprego para onde estava se
dirigindo quando sofrerá o acidente,
estaria mais do que satisfeita.
Trabalharia das nove às cinco,
ganharia seu sustento, e voltaria para
o sossego de seu apartamento, onde
não teria de fazer nada que não
quisesse, muito menos ver pessoas e
se relacionar com elas.
A última coisa que queria era
fazer o papel de mãe de uma criança.
— Desculpe, mas eu não quero
realmente esse tipo de emprego —
Daisy tornou a dizer.
— Pense a respeito. — Foi uma
ordem, mas feita com voz tão
sedutora que Daisy não conseguiu
Sabrina nº 1138
44
recusar em definitivo como gostaria.

— Você estará saldando sua dívida
comigo, ampliando seus horizontes e
ao mesmo tempo ganhará um bom
salário. Mais tarde, quando se
candidatar a outro emprego, terá
mais referências em seu currículo.
— Entendo que terei vantagens —
Daisy respondeu. — Importa-se de me
dizer por que faz tanta questão de
me contratar?
Slade Eastwood olhou para a
jovem naquela cama de hospital e
hesitou. Se respondesse a verdade,
sua chance de levá-la consigo cairia
por terra. Por outro lado, como
poderia explicar o que não sabia? Sua
única certeza era que não queria
45
Projeto Revisoras
deixar que Daisy desaparecesse de

sua vida. Não ainda, ao menos.
— E por que não? — Ele sorriu. —
Não poderia ser porque a encontrei
no momento certo?
Certo? Um acidente poderia ser
um momento certo?
— Pense um pouco antes de dar
sua resposta, está bem? — Slade
insistiu antes que ela pudesse
protestar. — Meu filho é muito
importante para mim. — Slade se
levantou enquanto dizia aquelas
palavras e se dirigiu à porta. Antes de
sair, virou para trás. — Quero o
melhor para ele e não medirei
esforços para cumprir meu objetivo.
Daisy limitou-se a fitá-lo. Não
Sabrina nº 1138
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saberia o que responder. Aliás, não

conseguia entender a quê,
exatamente, Slade Eastwood estava
se referindo.
— Quero que Francesco cresça
obedecendo a certos valores e
princípios que considero fundamentais
na vida. No momento, ele está frágil e
sentimental em consequência do que
houve e da influência da avó. Não
posso estar com meu filho todos os
dias por causa de meu trabalho.
Quando nos encontramos, em vez de
aproveitarmos o tempo para um feliz
convívio, invariavelmente acabamos
brigando. Isso não pode continuar.
cabeça para não contrariá-lo. Mas sua
47
Projeto Revisoras
opinião já estava formada sobre

aquela relação. Slade Eastwood
estava lhe parecendo um ditador. Sua
simpatia era toda por Francesco e por
sua avó materna.
— Voltarei amanhã à noite com a
minuta de um contrato para que você
a estude. Se estiver tudo em ordem e
decidir aceitar minha oferta,
aproveitaremos para combinar sobre
a viagem.
Era preciso encerrar aquela
história de uma voz por todas. Não
podia permitir que Slade Eastwood
perdesse seu tempo nem que
alimentasse esperanças no sentido de
contratá-la como babá de seu filho.
— Sr. Eastwood, eu não vejo
Sabrina nº 1138
48
nenhuma probabilidade de deixar a

Inglaterra para viver na Itália.
— Não? Mesmo que esteja em
débito comigo? — ele a provocou
deliberadamente. — Sabe que levará
meses, ou até mesmo anos, para
conseguir me pagar. E, no momento,
nem sequer um emprego você tem.
Não posso forçá-la a aceitar minha
oferta, é claro. Por outro lado, você
não poderá me forçar a lhe cobrar o
que me deve. Portanto, caso decida
não ir comigo, eu cancelarei sua
dívida.
— Isso está fora de cogitação —
Daisy declarou.
— Nesse caso, não encontrará
proposta melhor do que a minha.
49
Projeto Revisoras
Procure levar em consideração,

também, que a Itália é melhor do que
Londres para esquecer o que passou e
começar uma nova vida.
Daisy ficou tão chocada com a
observação que não conseguiu falar.
— Eu avisei, Daisy. Amo meu filho
— ele continuou. — Não pensou que eu
a tivesse convidado para ir comigo
para a Itália sem investigá-la antes,
pensou?
— Fez isso? — Daisy perguntou,
incrédula.
— Era preciso. Sei que tem vinte
e quatro anos, que é inglesa e que tem
duas irmãs mais novas. Quando sua
família mudou para os Estados Unidos
quatro anos atrás, você não os
Sabrina nº 1138
50
acompanhou porque estava namorando

e pretendia casar. Um ano depois, o
casamento foi realizado, mas não a
fez feliz. Há duas semanas, você se
divorciou legalmente de seu marido,
Ronald McTavish. Correto?
— Correto.
Parecia fácil dizer. Ele havia
enumerado os fatos mais marcantes
de sua vida como se estivesse lendo a
biografia de alguém que ela nunca vira
antes. Não podia imaginar como ela
estava se sentindo. Não podia avaliar
sua insegurança.
Indignada, Daisy ergueu o queixo.
Era orgulhosa demais para
demonstrar seus sentimentos.
— Tem andado ocupado, não?
51
Projeto Revisoras
— Sempre estou ocupado. Por

isso, conto com pessoas para me
ajudarem.
— Ou seja, você tem espiões.
— Acha errado?
— Quando se trata de minha
pessoa, acho — Daisy respondeu, mal-
humorada. — O que mais seus espiões
disseram?
— O que mais havia para ser dito?
Daisy mordeu o lábio. Estava
lidando com um homem esperto. Aliás,
com um perito em manipulação. Se
insistisse em desafiá-lo, ela sairia
perdendo. O melhor que tinha a fazer
era fingir que não se importava.
— Nada que valha a pena
mencionar.
Sabrina nº 1138
52
Slade olhou mais uma vez para

aquela jovem indefesa e ao mesmo
tempo valente. Se tivesse de lhe dar
uma nota, seria dez. Sua vida não
deveria ter sido nada fácil. As som-
bras por trás de seu olhar a traíam.
Naqueles dias, quando decidira
contratá-la, mandara investigar seu
nome e suas qualidades profissionais.
O resultado havia sido satisfatório.
De repente, porém, as
informações básicas sobre Daisy
Summers não lhe bastavam. Não
descansaria enquanto não soubesse
tudo a respeito daquela adorável
mulher.
53
Projeto Revisoras
CAPÍTULO II
Daisy sentia vontade de gritar de

indignação. Slade Eastwood era um
estranho. Com que direito
intrometera-se em sua vida? Como se
atrevera a contratar um investigador
particular para segui-la e invadir sua
privacidade?
Por um longo tempo, depois que
Slade Eastwood se foi, Daisy
continuou imóvel, repassando a
perturbadora conversa que tiveram.
Por mais que refletisse a respeito,
não conseguia entender como alguém
podia se comportar daquela forma.
Por outro lado, por que estava
surpresa? Já não deveria ter
Sabrina nº 1138
54
aprendido que os homens eram

capazes de tudo?
O pensamento a conduziu ao
passado. A imagem de Ronald surgiu a
sua frente, mas ela a afastou. Ainda
não estava em condições de se
lembrar de Ronald sem querer morrer
ou matar, ou ambas as coisas. E no
momento tudo que ela precisava era
concentrar forças em sua
recuperação para sair logo daquele
hospital.
Era essencial que saísse dali pela
manhã, independentemente da opinião
do médico. Cada dia de tratamento
estava custando uma fortuna. Se não
estivesse sentada no momento que
perguntara o valor da diária à
55
Projeto Revisoras
enfermeira, ela teria caído.

Um mês do excelente salário que
Slade Eastwood lhe pagaria, caso
aceitasse sua proposta, não seria
suficiente para cobrir as despesas de
um único dia de internação.
Agitada, Daisy respirou fundo e
tentou se acalmar. A dor lancinante
em suas costelas a proibiu de
continuar.
— Oh, céus! — Daisy exclamou
consigo mesma Por que Slade
Eastwood não se limitara a socorrê-la,
levando-a a um hospital público? Daria
tudo para estar em uma enfermaria
lotada e barulhenta, naquele
momento. Qualquer lugar seria
preferível àquele quarto tranquilo e
Sabrina nº 1138
56
luxuoso.
A idéia de que estaria
desocupando-o pela manhã foi seu
consolo.
Subitamente, lembrou-se de
alguém que poderia salvá-la.
Stephanie! Ninguém fora mais leal e
companheira do que ela nos últimos
dezesseis meses. Apesar de ser
casada com o melhor amigo de Ronald,
Stephanie também era sua melhor
amiga.
Como pudera ter esquecido dessa
grande aliada naqueles três dias?
Prometera ligar e contar o resultado
da entrevista. O que Stephanie
estaria pensando sobre seu silêncio?
A amiga atendeu ao segundo
57
Projeto Revisoras
toque. Ao ouvir sua voz, Daisy sentiu

uma vontade quase incontrolável de
chorar.
— Sou eu, Stephanie.
— Daisy? Onde você esteve?
Perdi a conta do número de vezes que
lhe telefonei. Não faz idéia de minha
preocupação.
— Eu estou bem — Daisy
respondeu, emocionada por ter ao
menos uma pessoa com quem contar
naquele momento. — Ainda não me
atirei da ponte de Londres.
— Não brinque com um assunto
tão sério — Stephanie censurou-a. —
Eu fiquei realmente preocupada com
você. Depois de tudo que passou, não
seria de admirar se tivesse um
Sabrina nº 1138
58
colapso nervoso. A propósito, como

foi a entrevista? Conseguiu o
emprego?
— Não exatamente. — Daisy
hesitou. — Agora está tudo bem, mas
eu...
Stephanie ouviu-a em absoluto
silêncio. No final do relato, Daisy
tentou amenizar a história. Não
queria que a amiga largasse o que
estava fazendo para vir conferir a
verdade em Londres.
— Juro que estou bem. Você não
pode imaginar como estou sendo bem
tratada. O quarto é luxuoso como o
de um hotel cinco estrelas, eu
imagino. Para ser franca, nunca fui
tão paparicada em minha vida.
59
Projeto Revisoras
Daisy ouviu um soluço do outro

lado da linha.
— Você não merece passar pelo
que tem passado. Primeiro, Ronald.
Agora isso. Não é justo. O homem não
deveria estar pagando apenas as
despesas hospitalares, deveria lhe
dar uma indenização vultuosa.
— A culpa foi minha. Atravessei a
rua sem olhar. Fez-se uma longa
pausa. Do outro lado da linha, Step-
hanie respirou fundo.
— Não sei como lhe dizer, Daisy,
mas Ronald esteve aqui. Ele está a sua
procura. Queria que Malcolm lhe
desse seu endereço.
— Malcolm se recusou a fornecê-
lo, não é? — Daisy indagou, em pânico.
Sabrina nº 1138
60
— Claro que sim. Ele sabe que

colocaria nosso casamento em cheque
se a traísse. Aparentemente, Ronald
deixou Susan. Disse que se
arrependeu e que quer que você lhe
dê uma segunda chance.
Uma segunda chance? Depois do
que ele fizera? Daisy sentiu uma onda
de náusea invadi-la. Só se estivesse
louca.
— Não quero vê-lo, Stephanie.
— Eu tinha certeza disso. — Um
choro as interrompeu. — Como deve
ter percebido, os gêmeos acordaram
— disse a amiga. — Quero lhe fazer
uma visita, Daisy. Pedirei que minha
mãe fique com os bebês por um ou
dois dias.
61
Projeto Revisoras
— Eu agradeço, Stephanie, mas

não é preciso. Eu sei que...
— Eu faço questão — Stephanie
insistiu. — Infelizmente, ainda não
lhe disse tudo. Malcolm me contou
que Ronald está determinado a
encontrá-la e que não aceitará um não
como resposta. Ele quer tê-la de volta
a qualquer preço. Mesmo que for
preciso acampar em sua porta.
— Ele não me terá.
— Eu sei.
A ligação foi interrompida, mas
Daisy demorou a devolver o fone ao
gancho. As palavras de Stephanie
ecoavam em sua mente, assustando-a.
Ronald poderia estar a caminho de
Londres naquele instante. Stephanie
Sabrina nº 1138
62
não era a única a saber seu endereço.

Não acreditava que seus poucos
amigos tivessem informado seu
paradeiro a Ronald, mas não dava para
ter certeza. Não pedira segredo a
ninguém simplesmente porque nunca
lhe passara pela cabeça que Ronald
poderia querer voltar.
O estômago de Daisy deu uma
reviravolta. Precisava ir ao banheiro.
Colocou os pés para fora da cama e
fez menção de descer. O quarto
começou a rodar. Fechou os olhos e
esperou que a tontura passasse e que
as paredes voltassem para seus
lugares.
Pensou em pedir ajuda à
enfermeira, ruas conteve-se. O
63
Projeto Revisoras
chamado certamente constaria do

relatório e isso retardaria ainda mais
sua alta.
Esperou mais um pouco e colocou
os pés no chão, sem soltar a cama.
Deu um passo, aguardou, e deu outro.
Quando não pôde mais contar com o
apoio da cama, substituiu-a pela
cadeira.
Faltavam poucos passos para
alcançar o banheiro. Mais dois ou três
apenas. Deu o primeiro e tudo
escureceu a sua volta. Precisava
voltar e se sentar na cadeira. Mas não
conseguiu. A tontura foi mais forte.
Nunca havia se sentido tão mal em
sua vida.
Slade bateu levemente à porta e
Sabrina nº 1138
64
entrou sem esperar pelo

consentimento. Ao notar que Daisy
não se encontrava no leito, buscou-a
instintivamente com os olhos, Quando
a viu desmaiada no chão, correu para
socorrê-la.
Foi o perfume másculo de uma
loção após barba que a fez recuperar
a consciência. Abriu os olhos. Ao se
ver nos braços de Slade Eastwood,
quase desmaiou outra vez.
Sem dizer nada, ele a colocou na
cama e a cobriu com extrema
gentileza. Daisy demorou alguns
instantes para tornar a abrir os olhos.
Estava sentindo dificuldade para
respirar. Provavelmente por causa da
descarga de adrenalina que a
65
Projeto Revisoras
inesperada presença provocara.

Quando o fez, Slade Eastwood estava
olhando para ela com o cenho
franzido.
— Não faça isso — ela pediu ao
vê-lo estender a mão para chamar a
enfermeira.
Mas ele não atendeu seu pedido e
ela, ridiculamente, sentiu duas
lágrimas deslizarem por seu rosto.
Não queria chorar! Não na frente
dele! Mas foi mais forte do que ela.
— Não fique assim — ela o ouviu
dizer e o viu estender o lenço. — Você
está indo bem.
Ela não queria o lenço, nem as
palavras de conforto, nem que ele se
sentasse na beirada da cama e que lhe
Sabrina nº 1138
66
tocasse os cabelos. Muito menos que

ele a atraísse de encontro ao peito e
que a fizesse deitar a cabeça em seu
ombro.
Mas sentiu-se tão bem ao sentir o
calor e a proteção daqueles braços ao
seu redor que se deixou ficar até que
o bom senso a ordenou a se afastar.
Foi naquele preciso momento que a
enfermeira da noite entrou no quarto.
— Você me chamou, Daisy?
— Eu a chamei— Slade informou,
irritado. — Ao entrar no quarto,
encontrei a srta. Summers desmaiada
no chão. Como isso pode acontecer?
— A culpa foi minha — Daisy
protestou.
— Sinto muito, sr. Eastwood.
67
Projeto Revisoras
— Sentir não basta.

— Asseguro-lhe que não tornará a
acontecer, sr. Eastwood. Assim que a
srta. Summers tocar a campainha,
nós...
— Não quero que ela fique sozinha
nem sequer por um minuto nas
próximas vinte e quatro horas.
Daisy controlou-se para não
gritar. Slade Eastwood e a
enfermeira estavam ignorando-a como
se tivesse ficado invisível. E quem ele
pensava que era para dar ordens no
que dizia respeito a ela?
— Espere um pouco! — Daisy
finalmente protestou. — A
enfermeira não teve culpa. Eu me
levantei porque quis. Não a chamei.
Sabrina nº 1138
68
Queria tentar andar sozinha.

— Você teve uma vertigem.
Quanto tempo ficaria caída no chão
se eu não tivesse chegado?
— Isso é exagero! — Daisy tornou
a protestar. — Eu estou sendo muito
bem cuidada.
— Eu sinto muito — a enfermeira
os interrompeu. — O sr. Eastwood
tem razão.
— Não — Daisy insistiu. — Eu já
estou bem. Não há razão para essa
cena.
Nos minutos seguintes, a
enfermeira quis verificar a tem-
peratura e a pressão de Daisy. Disse
que estavam um pouco altas e que ela
voltaria para repetir o exame na hora
69
Projeto Revisoras
seguinte.
Daisy estava fumegando de raiva
tanto pela arrogância quanto pelo
servilismo da enfermeira. Não era de
admirar que sua pressão sanguínea
estivesse alta. O modo como aquele
homem se comportava irritava-a. Ele
estava parecendo seu dono!
— Posso mandar servir algo? Chá
ou café, talvez? — a enfermeira
ofereceu antes de deixar o quarto.
— Um café seria bem-vindo —
Slade respondeu, de volta às suas
maneiras de cavalheiro.
Assim que a enfermeira saiu e
fechou a porta, ele puxou a cadeira
para perto da cama e se sentou.
— Relaxe — ele disse ao
Sabrina nº 1138
70
surpreendê-la fitando-o com

reprovação. — Não pretendo lhe
fazer nenhum mal.
— Estou relaxada — Daisy mentiu.
— Já conheci muitas mulheres.
Conheço-as o suficiente para saber
que você é de temperamento forte.
Não gosta dos homens em geral ou de
mim, particularmente?
— Gostaria daquele que não fosse
um crápula.
A resposta escapou antes que
Daisy pudesse raciocinar.
— Mas todos são, não é isso que
quis dizer?
— Não — Daisy respondeu. Aquela
conversa estava fugindo ao seu
controle e ela não queria prosseguir.
71
Projeto Revisoras
— Acabo de sair de um processo de

divórcio, como já foi informado. Não
posso evitar que minhas palavras
tenham um sabor amargo.
— Bem, eu trouxe aqueles papéis
de que lhe falei — Slade mudou
drasticamente de assunto e tirou um
envelope do bolso interno da jaqueta.
Daisy abriu-o. Encontrou uma
carta detalhando a proposta de
trabalho temporário e um contrato de
três meses. O valor estipulado para
esse período quase a fez engasgar.
Slade Eastwood havia praticamente
dobrado a oferta inicial. Ela ganharia
mais como babá de seu filho por três
meses do que como professora em um
colégio durante um ano.
Sabrina nº 1138
72
— Não espero que me responda

agora — disse Slade. — Trouxe os
papéis para que você os leia com
calma e reflita sobre as condições. As
despesas de viagem e de hospedagem
correrão por minha conta, é claro. E
também o armazenamento de seus
móveis em um local apropriado, caso
decida rescindir o contrato de aluguel
de seu apartamento.
A oferta era generosa, Daisy foi
obrigada a reconhecer. Era um
presente do céu.
— Seus aposentos em Festina
Lente ficarão ao lado dos de
Francesco. Terá uma suíte completa,
com sala de estar, quarto e banheiro
privativos.
73
Projeto Revisoras
— Festina Lente? — Daisy

repetiu, sem entender.
— E o nome de minha vila.
Significa ir devagar, ter calma —
Slade explicou. — Minha esposa não
aprovava meu estilo de vida. Ela
batizou nossa casa com esse nome
para me lembrar do fato. Luísa era
completamente diferente de mim.
Daisy fez que sim com a cabeça,
mas preferiu não tecer nenhum
comentário.
— Gostaria de ver uma foto de
Francesco? — Slade perguntou ao
mesmo tempo em que tirava a
carteira do bolso e a abria.
Daisy olhou para o garoto de olhos
castanhos e cabelos pretos que
Sabrina nº 1138
74
mirava a câmera com expressão séria

e se apaixonou de imediato.
Francesco Eastwood era pequeno e
frágil. Dava vontade de abraçá-lo.
— Foi tirada há dois meses —
Slade explicou. — Ele está magro e
abatido em consequência dos
problemas pelos quais passou, mas seu
médico garante que logo recuperará o
peso.
Slade estava tentando comovê-la,
Daisy percebeu, mas de certa forma
compreendeu-o. Não deveria ser nada
fácil se ver sozinho com a
responsabilidade de criar uma
criança.
— Lógico que sim — Daisy
procurou animá-lo. — As crianças têm
75
Projeto Revisoras
uma capacidade muito maior do que a

nossa para superar os problemas.
A enfermeira retornou com uma
bandeja. Além de café, ela trouxe
pãezinhos frescos, manteiga e geléia.
Daisy olhou para Slade enquanto a
enfermeira colocava o lanche na mesa.
Havia um sorriso malicioso nos lábios
dele. Isso irritou-a. Não suportava os
homens que se consideravam os donos
do mundo.
Sua vontade era recusar a oferta
de emprego e esquecer que ele havia
pago as despesas com seu
tratamento. Afinal, ele havia dito
mais de uma vez que não esperava
pela devolução do dinheiro. Mas aonde
iria parar seu orgulho?
Sabrina nº 1138
76
Enquanto ele comia dois pãezinhos

e tomava duas xícaras de café, Daisy
obrigou-se a engolir um de cada. Não
conseguia falar. Seu cérebro estava
funcionando a mil por hora.
Ronald estava a sua procura. E ela
o conhecia o suficiente para saber
que conseguia tudo queria. Ele era um
homem determinado. Infelizmente,
descobrira tarde demais que também
era cruel e egoísta. O fato de ela não
querer vê-lo não importava. Seus
sentimento não lhe importavam.
Conheceram-se na universidade.
Ele cursava a faculdade de
Matemática e de Física e ela cursava
Pedagogia. Encontraram-se pela
primeira vez em um barzinho
77
Projeto Revisoras
frequentado pelos estudantes. Bonito

como era, Ronald estava sempre
cercado de garotas. Depois que a viu,
porém, Ronald nunca mais teve olhos
para as outras. Ao menos foi o que a
fez pensar.
Como fora tola! Em vez de se
mudar para os Estados Unidos com
sua família, quando seu pai recebeu
uma oferta irrecusável de trabalho,
ela decidiu ficar. Por causa de Ronald.
Um ano depois, recém-graduados,
eles se casaram. O que ela não sabia
era que Ronald continuara a sair com
outras mulheres não só durante o
namoro, como também durante o
noivado e mais ainda depois do
casamento.
Sabrina nº 1138
78
Ronald era um adúltero

compulsivo. Esse fora o termo
empregado por Stephanie quando a
verdade veio à tona.
Daisy tomou um gole de café e
procurou fazer com que seu coração
voltasse ao batimento normal. Mas
não conseguia se lembrar de que
estava em um hospital ao lado de um
outro homem.
Ela se encontrava na Escócia em
uma noite fria de dezembro,
dezesseis meses antes, lendo uma
carta que encontrara sob a porta ao
retornar do trabalho.
Faltava uma semana para o Natal.
Abriu o envelope, certa de que iria
encontrar um cartão como os muitos
79
Projeto Revisoras
que estavam chegando nos últimos

dias. Mas não. Além da carta, havia
fotos. Fotos de Ronald com outra
mulher.
Olhou para elas por um longo
tempo. Depois se dirigiu à cozinha,
sentou-se e ali ficou à espera do final
de seu casamento.
Ronald gritou com ela e ameaçou
agredi-la durante a horrível briga que
tiveram. Mas não se atreveu. Mentiu o
tempo todo. Alegou que o caso que
tivera com aquela mulher havia
acabado antes de conhecê-la. Depois,
incapaz de persistir com a mentira,
confessou que eles haviam terminado
seis meses antes e que a mulher havia
feito aquilo por ciúme e por vingança.
Sabrina nº 1138
80
Daisy veio a saber poucos dias

depois que o ciúme e a vingança não a
envolviam, mas a uma das amigas da
ex-amante.
Aquela revelação deu margem à
descoberta de inúmeras outras
traições. E quando ela perdeu o bebê,
uma menina que estava esperando,
devido ao choque da descoberta, seu
amor por Ronald se transformou em
ódio.
— Isso estaria bom para você?
Daisy pestanejou. Slade estivera
falando e ela não ouvira nem sequer
uma palavra.
— Desculpe. Poderia repetir o que
disse?
— Eu perguntei se você estaria
81
Projeto Revisoras
pronta para pegar um avião para a

Itália na metade de maio, caso decida
cuidar de meu filho — Slade repetiu.
A paciência não era uma de suas
virtudes, mas algo que lera na
expressão de Daisy o fez entender
que algo realmente sério havia lhe
acontecido.
Daisy olhou para Slade e para as
paredes do quarto. Poderia parecer
incrível, mas o lugar e a situação
chegavam a ser aconchegantes após
suas lembranças.
— Espero que me dê sua resposta
o mais rápido possível. Um mês passa
depressa e os ponteiros do relógio
não param.
Os mesmos ponteiros poderiam
Sabrina nº 1138
82
estar levando Ronald ao encontro

dela.
A idéia amedrontou-a.
Slade estava lhe oferecendo uma
tábua de salvação. A Itália ficava
longe da Inglaterra. Seu ex-marido
não a encontraria naquele país. E lá
tudo seria novo. Nada a faria lembrar
aquela terrível noite.
— Você mencionou um contrato de
experiência, não?
— De três meses — Slade
confirmou. — Dou-lhe minha palavra
de que não a forçarei a ficar nem
sequer um dia mais do que o
combinado, caso você decida não ser
efetivada na função. Garanto-lhe
também a passagem de volta.
83
Projeto Revisoras
— E se você decidir que eu não

sou quem esperava? Os contratos
funcionam para ambas as partes, não
é?
— Sim — ele se limitou a
responder.
Daisy mordeu o lábio. Devia ter
perdido o juízo para estar
considerando a proposta. Não queria
trabalhar para Slade Eastwood nem
cuidar de seu filho, quando não
pudera ter sua Jenny nos braços. Mas
não foi isso que seus ouvidos ouviram.
— Está bem, sr. Eastwood. Eu
aceito sua oferta e espero
corresponder as suas expectativas.
Quanto à viagem, eu iria amanhã
mesmo se fosse possível.
Sabrina nº 1138
84
— Ótimo.
A resposta foi simples, em tom
profissional. De repente, a idéia já
não lhe parecia má. Seria um emprego
como outro qualquer. Se não desse
certo, ela procuraria outro. E ficaria
livre de Ronald.
— Só imponho uma condição —
Slade disse, deixando-a novamente
nervosa. — Esqueça o sr. Eastwood.
Meu nome é Slade.
Então ele sorriu. Um sorriso de
satisfação, dessa vez. E ela descobriu
que seu novo patrão era ainda mais
bonito e charmoso do que pensara.
CAPÍTULO III
85
Projeto Revisoras
Daisy voou direto para o Tirol, no

norte da Itália, assim que teve alta
alguns dias depois. Como seu
passaporte estava em ordem, ela só
precisou passar em casa para apanhar
suas roupas e alguns objetos de uso
pessoal.
A seu pedido, Stephanie desistiu
de visitá-la no hospital. Como medida
de segurança. Ambas conheciam
Ronald o suficiente para saber que ele
não hesitaria em segui-la para
descobrir o paradeiro de sua ex-
mulher.
A viagem foi rápida e confortável,
graças à passagem que Slade lhe
comprara na primeira classe. No
Sabrina nº 1138
86
aeroporto de Verona, o motorista

estaria a sua espera para levá-la a
Merano, a cento e setenta e cinco
quilômetros de distância.
Não foi o marido da governanta,
contudo, quem Daisy encontrou ao
sair da alfândega, mas o próprio
Slade.
Ele estava usando uma calça de
sarja preta justa e camisa creme. O
colarinho aberto deixava à mostra um
tufo de pêlos. Daisy engoliu em seco.
Aquilo era ridículo. Ela havia sido
contratada por aquele homem. Não
podia sentir-se atraída por seu
patrão, por mais bonito e sexy que ele
fosse.
— Olá, Slade — ela cumprimentou-
87
Projeto Revisoras
o com um sorriso natural apesar do

tremor em suas pernas.
— Como foi o voo?
— Bom — Daisy respondeu e
acompanhou-o quando ele a segurou
pelo braço e a conduziu para o saguão.
— Pensei que seu motorista viesse
me buscar.
Estavam chegando ao carro e
Slade não respondeu. Estava ocupado
abrindo o porta-malas para que o
carregador guardasse a bagagem.
— Decepcionada? — ele perguntou
ao lhe abrir a porta.
— Não, é claro que não — Daisy se
apressou a responder.
Ele sorriu e cruzou os braços.
— Sei de algo que irá animá-la. A
Sabrina nº 1138
88
macarronada de Isabella.
Daisy pestanejou não só devido à
luz intensa do sol, mas de
constrangimento.
— Por que diz isso?
— Porque perdeu peso e não
acredito que o acidente seja o único
responsável. Tenho a impressão de
que você não se alimenta bem há
meses.
Daisy estreitou os olhos. Como ele
se atrevia? Como podia fazer
insinuações sobre sua vida particular?
— Diga que estou errado — ele
murmurou.
— Queira desculpar, mas o que eu
como ou deixo de comer não lhe
interessa — Daisy respondeu.
89
Projeto Revisoras
— Acontece que interessa e muito

— ele argumentou. — Daqui a algumas
semanas, estará assumindo uma
grande responsabilidade junto ao meu
filho. Isso me dá o direito de zelar
por sua saúde.
— Não concordo.
— Sei que não.
— Eu conheço meus deveres e
estou plenamente apta a desempenhar
minha função. Sei muito bem como
satisfazê-lo — Daisy se defendeu. Um
instante depois, contudo, quando se
deu conta do duplo sentido que a
frase sugeria, tentou se corrigir.
— Sei o que você quis dizer,
Daisy.
Ele estava olhando para ela com
Sabrina nº 1138
90
expressão séria, mas o riso estava

por trás das palavras. Isso a
enfureceu ainda mais. Mas antes que
pudesse retrucar, Slade ligou o carro.
— Estou contente que esteja aqui.
— Daisy fitou-o, pronta para o ataque.
Mas se arrependeu em seguida da
natureza de seus pensamentos. —
Francesco precisa da estabilidade que
você poderá lhe oferecer.
Era preciso esquecer de uma vez
que Slade Eastwood era um homem
bonito e rico. Ele jamais se
interessaria por uma simples
professora. Agora, uma babá. Slade
Eastwood poderia ter qualquer mulher
que desejasse com um estalar de
dedos.
91
Projeto Revisoras
— Enquanto se restabelece não

poderá assumir plenamente sua
função, é claro. Mas, talvez, esse
impedimento reverta a seu favor e de
Francesco. Ambos terão tempo para
se adaptarem um ao outro, para se
conhecerem. A verdade é que sua
decisão de vir para a Itália assim que
deixou o hospital foi excelente.
Daisy apenas fez um gesto de
assentimento com a cabeça.
— Em duas horas chegaremos a
Merano — Slade afirmou.
— E como acredito que esteja com
tanta fome quanto eu, faremos uma
parada para almoçarmos em um
pequeno restaurante na estrada.
Além de oferecer um cardápio
Sabrina nº 1138
92
delicioso, o ambiente é calmo e

aconchegante.
Daisy mal conseguia prestar
atenção às palavras que Slade dizia.
Seus sentidos não paravam de
detectar o magnetismo, o perfume da
loção após barba e até mesmo os pe-
quenos gestos que ele fazia.
Não acreditava, contudo, que
houvesse algo de errado com ela.
Qualquer mulher, provavelmente,
reagiria da mesma forma na presença
de Slade. Precisava ter isso em mente
e parar de se preocupar.
— Mas eu comi no avião — Daisy
lembrou.
— Não dá para chamar aquelas
bandejas minúsculas de refeição —
93
Projeto Revisoras
Slade retrucou. — E eu não me

alimento desde cedo.
Daisy percebeu que Slade estava
tentando deixá-la à vontade. Apesar
disso, não podia concordar com ele
sobre o serviço durante o voo. Ao
menos com referência à primeira
classe que tivera o privilégio de
conhecer.
— Francesco já tem bons
conhecimentos do inglês — Slade
continuou. — Não será difícil
conversar com ele em seu idioma. Mas
seu contato com a língua se resumiu
às lições dos livros até agora. Você
lhe ensinará o inglês coloquial,
espontâneo.
— Será um prazer.
Sabrina nº 1138
94
— Seu nome — Slade mudou

abruptamente de assunto. — Por que
lhe deram o nome Daisy?
— O nome de minha mãe é Lily,
que significa lírio em inglês. Quando
eu nasci, meu pai achou que seria
interessante se eu também recebesse
o nome de uma flor. Quatro anos
depois, minha irmã foi batizada como
Rose. E após outros dois, nasceu
Violet. — Daisy hesitou. — Meu pai
costumava se referir a nós como seu
precioso buquê de flores.
— Costumava? — Slade fitou-a de
esguelha.
— Ele faleceu há dezesseis meses.
— Vinte e quatro horas depois que ela
perdera o bebê.
95
Projeto Revisoras
— Sinto muito.
Slade parecia sincero em seu
pesar. Daisy engoliu em seco,
emocionada. A impossibilidade de ir à
América e assistir ao funeral a
abalara ainda mais. E também a falta
de sua família a seu lado no momento
que mais precisara. Duas tragédias
aconteceram ao mesmo tempo em sua
vida e ela ainda não havia conseguido
se recuperar do trauma. Acordava
com frequência no meio da noite por
causa de seus pesadelos.
— A paisagem é bonita — disse
Slade, interrompendo suas
divagações. — Por que não aproveita
essa vista para relaxar?
— Eu estou relaxada.
Sabrina nº 1138
96
O modo como Slade a fitou e

depois baixou os olhos para seu colo a
fez perceber que não conseguira
enganá-lo. Suas mãos estavam tão
contraídas que as juntas tornaram-se
brancas.
Não respondeu à observação. De
que adiantaria? Ele estava certo. E,
talvez por causa disso, ela procurou
seguir o conselho.
A medida que os quilômetros eram
percorridos, Daisy viu-se cada vez
mais fascinada com o cenário
montanhoso banhado pela luz dourada
do sol.
Passaram por um ancião com um
burrinho. 0 animal usava um chapéu
engraçado e Daisy sorriu sem
97
Projeto Revisoras
perceber. Coisas boas ainda podiam

acontecer em um lugar como aquele.
Talvez devesse acreditar em
Stephanie e em algumas outras
pessoas que garantiam que ela ainda
encontraria a felicidade.
Sua mãe tentara convencê-la
inúmeras vezes a se mudar para os
Estados Unidos, mas ao contrário
delas que gostavam do lugar, Daisy
sentia que não seria capaz de se
adaptar.
Era uma mulher independente,
além disso, e não saberia mais viver
na mesma casa que sua mãe e suas
irmãs. As duas visitas que fizera à
família, enquanto seu pai ainda era
vivo, foram suficientes para ela
Sabrina nº 1138
98
chegar a essa conclusão.

Slade foi um companheiro
agradável durante toda a viagem. Ele
respeitava seu silêncio. Quando
tentava iniciar uma conversa, seus
assuntos eram leves e interessantes.
Pouco a pouco, Daisy foi sendo
invadida por uma sensação de paz e
de bem-estar.
— Estamos chegando ao
restaurante de que lhe falei — Slade
anunciou e indicou a pequena e antiga
construção em pedra à beira da
estrada. Havia muitas árvores ao
redor. Daisy ficou surpresa com o
perfume que elas exalavam.
— Que lugar adorável! E que
perfume!
99
Projeto Revisoras
— São laranjeiras — Slade

explicou e desceu do carro para lhe
abrir a porta. — Encontrará muitos
recantos bonitos nesta parte do
mundo.
Daisy detectou uma nota de
orgulho na voz. Era tocante descobrir
que Slade não era o homem frio que
aparentava ser.
Daisy afugentou imediatamente o
pensamento. Ronald também lhe
parecera um homem sensível e o
tempo lhe dissera que seu
comportamento inicial fora apenas
uma fachada. Não aprendera a lição,
de uma vez por todas, que ninguém
sabia exatamente o que se passava na
mente de outras pessoas?
Sabrina nº 1138
100
— O canelone é uma especialidade

da casa. E também o carpaccio.
Ninguém os prepara como Alberto.
Slade a segurou pelo braço para
ajudá-la a descer e não o soltou
enquanto caminhavam em direção ao
restaurante. Daisy sentiu uma onda
de calor lhe subir pelo corpo ao
contato, mas não se atreveu a se
afastar.
— O que é carpaccio?
— Nunca provou? — Slade
balançou a cabeça como se
lamentasse o fato. — Estou vendo que
terei de educá-la para as coisas boas
da vida, srta. Summers — brincou. —
É um prato que leva fatias de filé
finas como papel com molho de
101
Projeto Revisoras
maionese, alho e queijo parmesão.

Uma delícia. Principalmente se for
acompanhado por um tipo de vinho
tinto. Aliás, os vinhos desta região
são os melhores que já provei.
Daisy havia notado as extensas
vinícolas e os pomares a perder de
vista durante o trajeto. Frutas, em
especial as uvas, deveriam ser o
principal produto da região.
O interior da casa, pintada em
ocre, era tipicamente italiano com
suas paredes caiadas de branco, piso
em cerâmica terracota e vasos com
flores espalhados por todo o
ambiente.
Slade levou-a a uma mesa junto à
porta que se abria para o terraço.
Sabrina nº 1138
102
Mas antes de se sentarem, ele a fez

examinar a paisagem mais uma vez,
dourada pelo sol de maio.
Aquele era realmente um outro
mundo, Daisy pensou. Um mundo de
luz, de cores e de calor. A Inglaterra
e todas as tristezas dos últimos
meses, de repente, pareceram deixar
de existir.
— Assim é melhor.
— O que disse? — Daisy virou-se,
distraída.
— Você finalmente começou a se
soltar — Slade murmurou com
expressão sorridente.
Alberto, um homem simpático, de
meia-idade, se aproximou com o
cardápio e eles precisaram parar de
103
Projeto Revisoras
falar.
O carpaccio estava delicioso. Pela
primeira vez, desde que seu
casamento naufragara, Daisy comeu
com apetite.
— Estava maravilhoso. Adorei sua
sugestão. Obrigada, Slade.
— De nada. Foi um prazer vê-la
comer com tanta satisfação. Presumo
que não seja do tipo que vive fazendo
dieta.
— Pensou que eu fosse? — Daisy
perguntou. Slade deu de ombros.
— Não seria a primeira mulher
nem a última que vive de folhas de
alface e de cenoura para ser magra
como um pernilongo.
— Deve preferir as gordas, sem
Sabrina nº 1138
104
dúvida — Daisy retrucou, irritada.

— Não se trata disso. Acho que as
pessoas, tanto homens quanto
mulheres, devem ser como Deus as
fez. Gordas, magras, altas, baixas,
não importa. Quando a pessoa se
sente bem consigo mesma, de corpo e
alma, sua beleza interior reflete-se
em suas formas.
Daisy franziu o rosto. Não
acreditava em nada do que Slade
estava dizendo.
— Quer que eu acredite que
aprecia tanto as mulheres feias
quanto as bonitas?
O modo como Slade a encarou foi
o suficiente para que ela entendesse
que havia ido longe demais.
105
Projeto Revisoras
— A última namorada que tive

antes de conhecer minha esposa foi a
garota mais linda que conheci. Os
outros diriam que sua beleza era
comum, mas eu tive a oportunidade de
ver seus olhos.
— Por que, então, casou-se com
sua esposa e não com ela? — Daisy
indagou, irônica. Um segundo depois,
baixou a cabeça e pediu que Slade a
desculpasse. Ela não significava nada
para ele. Era apenas a babá de seu
filho. Como se atrevera a fazer uma
pergunta tão íntima? E rude, ainda
por cima?
— Sinto muito. O que fiz foi
imperdoável.
Ele encarou-a por um longo tempo.
Sabrina nº 1138
106
Daisy chegou a se encolher, na

expectativa da explosão. Algo que não
aconteceu.
— Foi uma indiscrição apenas —
Slade afirmou. — Você não fez nada
de imperdoável. A conversa que
estávamos mantendo deu abertura a
perguntas pessoais.
— Ainda assim, peço que me
desculpe.
— Eu perdi Josephine em um
acidente — Slade explicou. — Ela
praticava esportes aquáticos e
morreu no mar.
Daisy jamais havia sentido tanto
calor no rosto. Tinha certeza de que
suas faces estavam afogueadas.
— Eu sinto muito.
107
Projeto Revisoras
— Nós namoramos quatro meses

apenas e eu não saberia dizer se
nossa relação teria chegado ao
casamento, mas foi bom enquanto
durou.
Daisy assentiu com um gesto de
cabeça. Não estava se sentindo à
vontade com aquela conversa. Tudo
que queria era sair daquele
restaurante e prosseguir viagem em
silêncio.
Seu marido tivera muitas
aventuras e todas as mulheres haviam
sido ricas ou lindas. Ambas as coisas,
muitas vezes. Mas isso não significava
que não existiam homens bonitos,
ricos e carismáticos, como Slade
Eastwood, que mostravam o que havia
Sabrina nº 1138
108
por trás de um rosto e de um corpo

perfeito. Por que, então, tinha
dificuldade em crer nisso?
— E você?
— Eu o quê? — Daisy perguntou,
sem entender.
— O que as mulheres procuram
nos homens que desejam como seus
parceiros? O que você procura?
Daisy torceu as mãos.
— Não sei. Acho que bondade e
ternura.
Slade suspirou.
— Não perguntarei se seu marido
reunia essas qualidades porque esse
assunto não me diz respeito, mas eu
duvido.
Alberto interrompeu o diálogo
109
Projeto Revisoras
naquele instante. Estava trazendo

queijo e frutas para eles. E Slade
aproveitou para pedir que o café
fosse servido em seguida.
Quinze minutos depois, saíram do
restaurante e entraram no carro.
Daisy sentiu-se aliviada. Falar sobre a
paisagem e sobre o dia-a-dia em
Festina Lente era bem mais fácil.
Conhecera a vida de casada e a
experiência quase a matara. Preferia
a solidão de sua vida atual. Ao menos
poderia ter paz de espírito.
Chegaram a Merano no meio da
tarde e Daisy ficou fascinada com o
que viu. A cidade era linda, cercada
de montanhas e de vinícolas. As ruas
eram arborizadas e havia profusões
Sabrina nº 1138
110
de flores nos jardins das casas e nos

inúmeros parques.
A vila de Slade ficava nos
arredores.
Ao passarem pelo portão, Daisy
prestou atenção a tudo que
encontrava. A casa não podia ser vista
da entrada. Era preciso percorrer um
caminho em curva.
O ar que respirou era morno e
balsâmico. Um perfume adocicado
impregnou suas narinas. Não saberia
dizer de qual flor, tantas elas eram.
— Festina Lente — Slade anunciou
quando a casa surgiu à frente deles.
— Gostaria de dizer que ela pertence
a minha família há diversas gerações,
mas estaria faltando com a verdade.
111
Projeto Revisoras
Apenas meu filho poderá afirmar que

a herdou.
Daisy sorriu, constrangida.
Imaginara que a casa fosse grande e
bonita, mas o que viu superava
qualquer expectativa.
A construção parecia obedecer
aos desenhos encontrados em contos
de fadas. As paredes eram brancas e
o telhado era vermelho. Ao seu redor
havia roseiras em flor. De todas as
cores.
Grades de ferro com motivos
florais protegiam os terraços dos
quartos no primeiro e no segundo
andares. Para enfeitá-los, havia vasos
de gerânios.
Naquela parte da propriedade, o
Sabrina nº 1138
112
perfume dominante era das flores de

laranjeiras e de limoeiros.
Daisy fechou os olhos por um
instante e sentiu um nó lhe fechar a
garganta ao pensar que viveria ali por
algum tempo.
Havia magia naquele lugar. Era
como se estivesse sonhando. Tinha a
impressão de que estava dormindo e
de que aquela casa havia sido fruto de
sua fantasia.
Sem que ela notasse, Slade
estivera examinando suas reações
durante toda a viagem e mais ainda
depois que entraram em sua
propriedade. Parecia ter ficado
satisfeito. Quando desceu para abrir
a porta, seu rosto estava calmo e
113
Projeto Revisoras
descontraído.
Eles ainda não haviam dado mais
do que dois passos e as portas da
frente foram abertas por uma mulher
robusta de cabelos grisalhos e por
uma jovem alta e magra. No meio
delas, sem lhes dar as mãos, estava
Francesco, o filho de Slade.
Daisy o conhecera pela
fotografia, mas a impressão que teve
ao vê-lo em pessoa era de um menino
ainda mais frágil.
Ele olhou para a babá e para a
governanta. Em seguida se aproximou
deles. Em vez de abraçar o pai, como
seria de esperar, colocou-se diante
de Daisy e estendeu a mão.
— Muito prazer. Sou Francesco.
Sabrina nº 1138
114
Estou contente que esteja conosco.

Daisy hesitou. Não havia dúvida
de que as palavras haviam sido
decoradas. O menino estava
repetindo o que lhe mandaram dizer.
Movida por sua intuição, Daisy
abaixou-se e se colocou de modo a
poder olhar nos olhos do garoto.
— Olá, Francesco. — A
semelhança com o pai era im-
pressionante. Fitou-o por um instante,
depois pegou a pequena mão e
apertou-a. Sem soltá-la, atraiu
Francesco de encontro ao peito.
Ele enrijeceu por um instante.
Depois ergueu os braços e enlaçou-a
pelo pescoço em um rápido abraço.
Daisy segurou-o junto a si por um
115
Projeto Revisoras
momento. Depois soltou-o gentilmente

e sorriu.
— Adoraria conhecer sua casa,
Francesco. Poderia mostrá-la para
mim?
Novamente ele olhou para o pai e
esperou por seu consentimento.
— Mostrarei seu quarto em
primeiro lugar, signorina Summers.
— Francesco. — Slade
interrompeu o filho. — O que foi que
eu disse? Inglês apenas. Você sabe
como se dirigir às pessoas.
— Si. Quero dizer, sim, papai. — A
espontaneidade que mal começara a
aflorar foi sufocada pela repreensão.
— Eu lhe mostrarei seus aposentos
agora, srta. Summers.
Sabrina nº 1138
116
— Meu nome é Daisy, Francesco. É

assim que meus amigos me chamam. E
nós seremos amigos, não é?
— Sim, mas meu pai...
— Seu pai não sabia como eu
desejava ser chamada. — Daisy
forçou um sorriso em direção a Slade.
Percebeu que ele não concordava com
sua atitude, mas não fez caso disso.
— Agora que ele sabe, não haverá
nenhum problema que você me chame
de Daisy.
Fez-se absoluto silêncio, mas
Daisy não esmoreceu. Era evidente
que a criança tinha medo do pai. O
que era um absurdo. Se Slade pensava
que ela se deixaria intimidar por sua
prepotência, estava muito enganado.
117
Projeto Revisoras
Afinal, como ele esperava que fosse

substituir a figura materna, se Fran-
cesco tivesse de chamá-la de maneira
formal?
— Antes de mostrar os aposentos
à srta. Summers, por favor encontre
Mário e peça que ele apanhe a
bagagem no carro — Slade pediu,
sério. — Nós aguardaremos na sala de
estar.
— Sim, papai.
O menino não se moveu, contudo,
até que Slade terminasse de fazer as
apresentações. Ele se afastou, então,
com Angélica, a babá, enquanto
Isabella se dirigia à cozinha para
providenciar duas xícaras de café.
A governanta seguiu à frente pelo
Sabrina nº 1138
118
hall de mármore e os deixou na sala

de estar.
Tudo era tão lindo que Daisy não
sabia para onde olhar.
Mas assim que ficaram a sós,
Slade a fez esquecer a decoração e a
magnificência da casa.
— Queira se sentar, por favor.
Acho que é preciso esclarecer alguns
pontos antes de mais nada.
Daisy já esperava por isso.
Permaneceu de pé, de queixo erguido.
— Sim?
— Como eu lhe disse, Francesco
foi excessivamente mimado pela mãe
de minha esposa. Para que ele cresça
e se torne o homem que espero, será
preciso lhe ensinar disciplina.
119
Projeto Revisoras
Daisy enfrentou o olhar de Slade

sem pestanejar.
— Entendeu o que eu disse? — ele
indagou em tom irritado. — Quero
total respeito e obediência.
— Acha que eu o incentivei a ser
desobediente e desrespeitoso só
porque pedi que me chamasse por meu
primeiro nome? — Daisy perguntou,
surpresa.
— Não exatamente — Slade
respondeu hesitante. — É que eu não
quero que ele se dirija aos
empregados à maneira de sua avó.
— Não estou entendendo, Slade —
Daisy confessou.
— Bem, depois de passar algumas
semanas em casa da avó, Francesco
Sabrina nº 1138
120
voltou diferente. Eu o vi se dirigindo

a Mário de uma maneira que não me
agradou.
Agora Daisy estava começando a
entender. Slade queria educar o filho,
mas em sua tentativa, estava apenas
agindo de maneira oposta aos sogros.
De um lado, Slade tinha permissão
para tudo. De outro, Slade não tinha
permissão para nada.
— Como Mário reagiu às ordens
de Francesco?
— Ele riu, mas eu fiquei indignado
e Francesco percebeu logo.
— Slade, ele só tem seis anos.
— Fará sete no mês que vem.
— Mas não é de disciplina apenas
que ele precisa. Seu filho precisa de
121
Projeto Revisoras
amor — Daisy retrucou, indignada

com a insensibilidade de seu patrão.
— Seria ridículo obrigá-lo a me
chamar de srta. Summers. O fato de
me chamar de Daisy não significa
desrespeito. Acho que você está
certo em querer lhe ensinar a ter
disciplina e eu o farei me obedecer,
mas pela afeição e não pelo medo. O
melhor método de ensinar algo a
alguém é pelo exemplo. Tenho certeza
de que Francesco aprenderá a ser
responsável e obediente pela simples
observação às regras desta casa.
— Você não o conhece ainda. Ele
se mostrou gentil ao recebê-la, mas é
voluntarioso.
Tal pai, tal filho, Daisy pensou.
Sabrina nº 1138
122
Algo em sua expressão deveria

ter traído seus pensamentos, pois
Slade concordou com um gesto de
cabeça.
— Sim, os Eastwood são famosos
por sua determinação, mas é preciso
canalizar esse temperamento na
direção certa. Como meu pai fez
comigo.
— Eu concordo com você — Daisy
respondeu —, mas insisto em ser
chamada de Daisy. E quero deixar
claro, desde já, que no momento que
assumir a responsabilidade sobre
Francesco, precisarei ter carta
branca quanto a sua educação.
Slade fez menção de interrompê-
la. Daisy ergueu a mão em sinal para
123
Projeto Revisoras
que esperasse.
— Não serei fraca com ele. Não
se preocupe. Não considero amor e
carinho como fraqueza. A atenção e o
riso são essenciais para qualquer ser
humano, em especial para as crianças.
— Você está me acusando de ser
severo com ele — Slade murmurou. —
Espere e verá.
— Acho que nós dois teremos de
esperar para ver — Daisy respondeu
com firmeza e se preparou para ouvir
recriminações sobre sua ousadia. Mas
Slade a surpreendeu com um riso
franco.
— Sob a aparência frágil,
esconde-se uma leoa, não? — Slade
balançou a cabeça. — Eu não me
Sabrina nº 1138
124
enganei a seu respeito.

Daisy se limitou a encará-lo. Não
sabia como interpretar aquela
repentina demonstração de bom
humor. Pelo que aprendera sobre
Slade Eastwood, ele não era do tipo
que tolerava desafios, principalmente
por parte daqueles que lhe serviam.
— Tenho minhas próprias opiniões,
se é a isso que se refere — Daisy
murmurou. — E não vejo nada de
engraçado nisso.
Slade parou de rir no mesmo
instante.
— Não estava me divertindo a sua
custa, se foi isso que pensou.
Sim, ele estava, mas não era esse
o problema. O que a preocupava era
125
Projeto Revisoras
Slade Eastwood, o homem. Ele era

atraente demais para ser confiável.
Conviver com ele seria se arriscar
todos os minutos.
Ele sorriu.
— Por que tenho a impressão de
que não gostaria de saber o que você
está pensando, se pudesse ler seus
pensamentos?
A pergunta foi tão certeira que
Daisy sentiu que corava.
— Parece que adivinhei, não? —
Slade deu dois passos na direção dela
e a pegou de surpresa quando colocou
um dedo sob seu queixo e a obrigou a
encará-lo. — Não sou seu inimigo.
Daisy sentiu-se ainda mais
vulnerável ao fascínio de Slade
Sabrina nº 1138
126
naquele momento. Gostaria de

permanecer firme diante dele, como
ele se comportava diante dela. A
verdade, porém, era que estava
tremendo por dentro.
— Eu sei...
— Não, você não sabe — ele a
interrompeu. — Não gosta de mim.
Mas isso não importa. O importante é
que goste de Francesco e que o
eduque bem. Meu filho está acima de
tudo para mim. Ao menos nisso
concordamos?
Daisy fez que sim com a cabeça,
incapaz de falar.
Slade sorriu e inclinou-se para lhe
dar um beijo no rosto, como se
acabassem de fazer um pacto.
127
Projeto Revisoras
Justamente nesse instante, Daisy

resolveu tranquilizá-lo sobre
Francesco.
Os lábios de Slade pousaram nos
dela, sem que houvesse a intenção. O
resultado foi inesperado. Uma
corrente elétrica os uniu e foi
impossível se separarem.
O toque leve se transformou em
um beijo ansioso e profundo. Slade a
segurou pelos braços e ela fechou os
olhos em uma entrega absoluta.
Terminado o beijo na boca,
beijou-a nas faces, nos olhos, nas
orelhas e no pescoço. Não satisfeito,
tornou a reclamar seus lábios.
As mãos se afastaram dos braços
e percorreram toda a extensão das
Sabrina nº 1138
128
costas até pararem nos quadris.

Quando ele a pressionou de encontro
à rigidez de suas coxas, Daisy abriu
os olhos, assustada.
Era chegado o momento de voltar
à realidade.
O que ela estava fazendo? Como
pudera permitir aquela intimidade?
Antes que eles pudessem dizer
algo, a voz de Francesco se fez ouvir
no hall.
— Papai, agora eu posso mostrar a
casa para Daisy?
A porta foi aberta no exato
instante que Daisy acabava de se
sentar em uma das poltronas e fingia
procurar algo na bolsa.
Não se sentia em condições de
129
Projeto Revisoras
andar. Suas pernas não paravam de

tremer. Como pudera se comportar
daquela forma? O que Slade estava
pensando a seu respeito? Se a terra
se abrisse a seus pés, seria uma
bênção.
— Posso chamá-la de Daisy, papai?
Se eles haviam conversado antes,
ela não escutara nada. Agora, Slade
estava dando sua permissão ao filho e
repetindo a ordem para que ele só
usasse o idioma inglês quando se
dirigisse a ela.
— O Signor de Sica continuará a
lhe ensinar as outras matérias,
inclusive o francês. Mas é muito
importante que você melhore seu
inglês, Francesco.
Sabrina nº 1138
130
O beijo não o afetara, Daisy

pensou. Essa certeza a deixou ainda
mais corada De humilhação. Por outro
lado, assim seria melhor. De outra
forma, ela não poderia continuar
naquela casa.
O beijo não significara nada para
ele nem para ela. Precisava colocar
isso na cabeça. Não estava ali para
ter uma aventura, mas para trabalhar.
E se Slade pensava que seus serviços
incluíam favores sexuais, teria de
mudar rapidamente de idéia.
— Está pronto para me levar para
meus aposentos, Francesco? — Daisy
perguntou com um sorriso que não
traía suas verdadeiras emoções.
— Si. Quero dizer, estou — o
131
Projeto Revisoras
menino respondeu e sorriu,

encabulado.
— Sei o que quis dizer, Francesco
— Daisy replicou —, mas como você
parece estar sempre se esquecendo
de usar apenas o inglês comigo, talvez
seja preciso pensarmos em um
lembrete.
A contrariedade no rosto do
menino era prova de que ele estava
pensando que o recurso seria algum
tipo de castigo.
— Que tal uma contagem de
pontos? — Daisy sugeriu. — Conforme
seus erros e acertos, marcaremos o
número de pontos que você conseguiu
ao final de cada dia. De zero a cinco,
digamos. Cinco significaria que você
Sabrina nº 1138
132
não disse nenhuma palavra em

italiano. — Daisy fez uma pausa. —
Então, quando a contagem chegar a
cem, você terá direito a um prêmio.
— Um prêmio? — O rosto do
menino se iluminou. — Que prêmio?
— Ainda não sei qual será — Daisy
respondeu. — Mas fique avisado de
que não será fácil ganhá-lo. Sou uma
professora muito exigente. Todos
meus alunos poderão lhe dizer isso.
Eu só recompenso aqueles que se
esforçam por merecer.
— Você morou nas casas de todos
seus alunos? — Francesco perguntou
após alguns instantes.
— Não. Com você, será a primeira
vez. Espero que possamos nos divertir
133
Projeto Revisoras
muito juntos.
— Sim — ele respondeu, sério. Em
seguida, deu um amplo sorriso e
puxou-a pela mão. — Venha. Quero lhe
mostrar toda a casa. Mas
começaremos por meu quarto. Tenho
um videogame e uma porção de
brinquedos.
Antes de saírem da sala, Daisy
precisou olhar para trás. Slade
parecia estar pensando em voz alta.
— Eu estava certo a seu respeito,
Daisy Summers.
Daisy não quis saber a que Slade
estava se referindo.
Mas o rubor, que havia
desaparecido de seu rosto enquanto
conversava com Francesco, tornou a
Sabrina nº 1138
134
voltar.
Não seria fácil. Mas estava
determinada a permanecer naquele
emprego até o fim de seu período de
experiência, no menos. Seu pai a
ensinara a enfrentar todos os tipos
de situações. Não era mulher de fugir
de um desafio.
Em quatro semanas, teria de se
apresentar a um médico para ter sua
alta definitiva. Nesse dia, teria início
o contrato de três meses.
Seria um longo verão.
CAPÍTULO IV
Uma hora depois, Angélica chamou

135
Projeto Revisoras
Francesco para o banho e para o chá e

Daisy teve sua primeira oportunidade
para ficar sozinha em sua suíte.
Fiel a sua palavra, Francesco lhe
mostrou toda a casa. Todo o castelo,
propriamente. A construção exibia
quatro torres; Os ambientes eram
distribuídos pelas alas norte, sul,
leste e oeste, segundo a informação
que Francesco lhe deu, orgulhoso e
compenetrado.
Das inúmeras janelas, Daisy
admirou os extensos jardins, a piscina
imensa e a quadra de tênis.
De volta à ala oeste onde ficaria
hospedada, Daisy pensou que não
seria capaz de dar nem sequer um
passo mais. Estava cansada e as
Sabrina nº 1138
136
costelas doíam.
Mas não foi seu estado físico que
a fez vacilar quando Francesco parou
diante de sua porta.
A suíte era magnífica. Não ficava
nada a dever aos demais cômodos.
Ficara impressionada com o luxo e
com a beleza de tudo que vira até
aquele momento, admitia, mas
somente depois de conhecer seus
aposentos, o sentido de realidade a
tocou.
A sala de estar e o quarto eram
decorados em tons de azul, muito
suaves. Uma cama de casal dominava o
quarto. Não teria um armário comum
para guardar seus pertences, mas um
closet. E o banheiro, também em tons
137
Projeto Revisoras
de azul, era completo. Havia até

mesmo uma banheira de
hidromassagem.
A colcha que enfeitava a cama era
tão bonita que ela não conseguiu
afastar os olhos do tecido por um
longo tempo. De cada lado da cama,
havia tapetes persas que combinavam
com a colcha e com as cortinas.
Para completar, flores haviam
sido espalhadas por todos os
ambientes, como um presente de
boas-vindas.
— Tudo isso é para mim? — Daisy
perguntou a Francesco e a Angélica
com um nó na garganta.
— Si, si — respondeu a moça. —
Foi Isabella quem o arrumou. O
Sabrina nº 1138
138
quarto é bonito, não?

— É lindíssimo — Daisy concordou
com um suspiro.
Enquanto realizavam o tour pela
casa, Angélica contou a Daisy que a
mãe de Francesco contratara os
melhores arquitetos e decoradores
de Roma para cuidarem dos projetos
de decoração e que o patrão não
medira os custos para satisfazê-la.
Daisy entendia a que Angélica
estava se referindo. O quarto de
Francesco era um exemplo da
exclusividade a que os decoradores se
obrigaram.
A cama do menino tinha o formato
de um carro esporte Lamborghini e
contava até mesmo com dois faróis,
139
Projeto Revisoras
que serviam como abajures.

Brinquedos de todos os tipos e
valores existiam naquele quarto.
Francesco possuía tudo que um
menino de sua idade poderia desejar.
Materialmente...
Francesco não era um menino
feliz. Bastava olhar em seus olhos. Ele
não sabia o que significava um lar
normal. De um lado, era mimado em
excesso pela avó, o que certamente
confundia seus valores. Do outro, era
tratado com mão de ferro pelo pai.
Bastou pensar em Slade para o
coração de Daisy bater mais
depressa. Precisava expulsá-lo de sua
mente. Precisava esquecer os beijos
que trocaram. Aquilo não poderia
Sabrina nº 1138
140
continuar. Estava naquela casa para

trabalhar, não para renovar seus
problemas. Se Slade tentasse se
aproximar dela novamente, faria suas
malas e voltaria para Londres no
mesmo dia.
Daisy tomou dois analgésicos que
o médico inglês receitara e deitou na
cama. Estava cansada demais até
mesmo para tomar um banho. Antes
precisaria dar um cochilo.
O cansaço deveria ser muito
maior do que imaginara pois quando
acordou com Isabella colocando uma
bandeja sobre o criado-mudo, a
luminosidade no quarto havia
diminuído.
— Oh, eu sinto muito.
141
Projeto Revisoras
Daisy apressou-se a se sentar na

cama.
— Está tudo bem, signorina —
disse Isabella com um sorriso. —
Apenas o signore mandou que eu lhe
trouxesse o chá.
A governanta apontou para a
bandeja. Daisy encontrou um bule de
chá, outro de leite, açúcar, um
pratinho com bolachas e outro com
sanduíches cortados em quadrados
pequenos.
— Ele pediu que a avisasse que o
jantar será às oito horas.
— Obrigada — Daisy agradeceu.
Se não estivesse tão sonolenta, teria
feito a pergunta que a vinha
perturbando desde o primeiro
Sabrina nº 1138
142
momento que chegara àquela casa. Ela

também era uma empregada. Slade
Eastwood a contratara para cuidar de
seu filho. Por que, então, tanto
Isabella quanto Angélica a tratavam
como se fosse uma hóspede? Não
haviam sido informadas sobre sua
posição?
A lógica dizia que sim. Aquele
comportamento especial era uma
consequência do acidente. Assim que
ela estivesse recuperada por
completo e começasse realmente a
exercer sua função, tudo seria
diferente.
Se Slade estava cobrindo-a de
atenções era por generosidade, nada
mais.
143
Projeto Revisoras
Após tomar duas xícaras de chá e

comer vários sanduíches e bolachas,
que estavam deliciosos, Daisy se
encaminhou para o banheiro para
tomar o banho que se prometera.
Seria um banho digno de uma
princesa, pensou, enquanto abria as
torneiras para encher a banheira.
Ficaria relaxando naquela água morna
e perfumada por trinta minutos.
Aproveitaria e lavaria os cabelos.
Havia tempo de sobra para se
preparar para o jantar.
Não havia se lembrado de
perguntar a Isabella se ela, Mário e
Angélica costumavam fazer as
refeições na cozinha ou na pequena
sala de jantar com o patrão. A
Sabrina nº 1138
144
grande, provavelmente, deveria ficar

reservada às grandes ocasiões.
Bem, isso não importava. Usaria
seu vestido de jérsei de seda
ferrugem que, apesar de ter custado
barato, era bonito e elegante. Nos
pés, calçaria sandálias pretas de
salto.
O banho de imersão pareceu
aliviar um pouco os músculos
doloridos. Foi tão bom que Daisy só
resolveu sair da água quando ela
começou a esfriar.
Vestiu, então, o robe e enrolou os
cabelos com uma toalha, feito um
turbante.
Estava se dirigindo ao quarto
quando ouviu alguém bater à porta.
145
Projeto Revisoras
Antes que pudesse abri-la, ouviu a voz

de Angélica..
— Scusi, signorina. Posso ajudá-la
com o banho?
Daisy abriu a porta.
— Obrigada, Angélica. Eu já
terminei. Mas, por favor, chame-me
de Daisy.
A jovem fez que sim com a cabeça
e olhou para Daisy como se tivesse
algo mais para dizer.
Daisy entendeu a que Slade se
referia quando lhe contou que a sogra
a dominava. Angélica era muito nova
ainda, além de tímida e insegura.
— Algum problema?
— O menino. Ele quer vê-la.
— Está querendo me dizer que
Sabrina nº 1138
146
Francesco pediu que eu fosse ao

quarto dele?
— Si, si. Ele está impossível.
— Impossível?
— Não pára de gritar e de atirar
coisas.
Era evidente que a babá estava
nervosa e que não conseguia controlar
a criança. E como o quarto de
Francesco ficava ao lado, não lhe
custaria nada ir até lá e acalmar a
ambos.
A gratidão de Angélica quase a
levou às lágrimas. Daisy franziu o
cenho. Não gostaria que em seus
primeiros contatos com Francesco
tivesse de ser rígida, mas era preciso
impor sua vontade a ele desde o
147
Projeto Revisoras
início, ou ele pensaria que faria com

ela o mesmo que fazia com a atual
babá.
Entretanto, bastou olhar para o
menino sentado na cama, vestido com
um pijama estampado de ursinhos
para Daisy hesitar. Ele parecia tão
inocente e desamparado que sua
vontade foi pegá-lo no colo.
Respirou fundo e se encaminhou
para ele com o olhar firme.
— Não consigo acreditar no que
acabei de ouvir. É verdade que gritou
com Angélica?
— Eu não gritei com ela —
Francesco respondeu, cabisbaixo. —
Eu gritei porque ela não queria
chamar você. Sabe, Leonardo não
Sabrina nº 1138
148
parava de chorar porque queria lhe

dizer boa-noite.
Daisy mordeu o lábio. Leonardo
lhe fora apresentado durante o tour.
Era um coelho de pelúcia. O bichinho
de estimação de Francesco.
— Entendo. — Era sua primeira
noite em Festina Lente, teria quase
quatro meses para ser firme com
Francesco. — Acha que ele dormirá
como um bom coelho se eu lhe contar
uma história?
O menino aprovou a idéia com
entusiasmo.
— Que acha de eu lhe contar uma
sobre alguns parentes dele que vivem
em uma grande floresta na
Inglaterra?
149
Projeto Revisoras
Francesco fez que sim com

entusiasmo ainda maior.
— Antes de tudo, precisamos nos
acomodar. — Daisy o fez recostar nos
travesseiros e sentou-se ao lado dele,
colocando um braço ao redor dos
pequenos ombros.
— Uma vez, o primo inglês de
Leonardo, chamado Bob, meteu-se em
uma terrível encrenca...
Daisy sempre tivera facilidade em
inventar histórias. E aquela sobre o
primo de Leonardo ganhou total
atenção. Daisy tinha prática com
crianças e grande criatividade. Con-
tara histórias a suas duas irmãs e
depois a seus alunos.
Ela havia acabado de contar a
Sabrina nº 1138
150
história e estava dando um beijinho

em Francesco quando uma voz grave e
profunda abalou a tranquilidade do
ambiente.
Daisy sentiu o rosto afoguear.
Slade estava entrando no quarto e se
colocando ao lado dela junto à cama.
Não o vira entrar.
— Eu costumava contar uma
história para minhas irmãs todas as
noites.
O que antes lhe parecera natural
e confortável, agora a estava
deixando perturbada. Embora não
desse para notar, ela estava
completamente nua sob o robe.
Sua primeira reação foi apertar o
cordão ao redor da cintura e ajeitar o
151
Projeto Revisoras
decote, mas não fez isso porque sabia

que o gesto atrairia os olhos escuros
de Slade.
— Meninas de sorte — Slade
caçoou. Em seguida, curvou-se sobre o
filho, fez um carinho em seus cabelos
e beijou-o na testa.
— Agora, Daisy precisa se
arrumar para jantar. Diga boa-noite.
— Boa noite, Daisy. — Francesco
mergulhou na cama, abraçado ao
coelho. — Obrigado pela história.
— De nada, Francesco. Durma
bem.
A expressão amorosa de Daisy
não passou despercebida a Slade. Em
seguida, ele a ajudou a se levantar e a
acompanhou até a sala de estar da
Sabrina nº 1138
152
suíte, onde Angélica estava lendo um

livro.
— Pode apagar a luz, Angélica. E
nada de copos de água ou visitas ao
banheiro. Meu filho precisa aprender
a obedecer uma ordem.
— Si, signore.
Os dois saíram para o corredor.
Diante da porta de sua suíte, Daisy se
preparou para ouvir uma reprimenda.
Teve uma agradável surpresa ao
receber um elogio, em vez disso.
— Você lidou muito bem como ele.
Ela virou-se para Slade sem
disfarçar a surpresa.
— Não esperava que eu a
elogiasse?
— Sinceramente, não — Daisy
153
Projeto Revisoras
confessou. — Tive a impressão de que

iria receber uma crítica por não ter
sido firme o bastante.
Naquele momento, ela teve de
apertar o cordão. Sentia-se
vulnerável demais junto a Slade
usando apenas um robe e vendo
aqueles lábios sorrirem quando poucas
horas antes haviam provado o calor
dos dela.
— Pensou isso? — Ele estreitou os
olhos. — Que estranho. Mas, afinal,
você ainda não me conhece.
Daisy quase entrou em pânico.
Para uma mulher que já havia passado
pela experiência de um casamento,
uma gravidez, uma traição e um
divórcio, ela estava se comportando
Sabrina nº 1138
154
como uma adolescente ingênua.

A culpa era de Slade Eastwood.
Ele estava flertando com ela. Ou não?
Ele a surpreendia. Era o homem mais
enigmático que conhecera.
Daisy procurou raciocinar e se
portar com naturalidade. Enquanto
não fizesse aquela pergunta a Slade
não teria paz, embora tivesse certeza
de que estaria fazendo papel de tola.
— Slade, acho que é preciso
esclarecer um ponto. Estou aqui
apenas para cuidar de Francesco, não
é?
— Claro que sim — ele respondeu
com fingida inocência. — Pensei que
tivesse deixado claro que Isabella e
seu marido se encarregam de todos
155
Projeto Revisoras
os outros serviços da casa.

Não era às atribuições domésticas
que Daisy se referira e Slade sabia
disso.
— Não fazem tudo sozinhos, é
lógico — Slade explicou. — Temos
duas faxineiras que vêm e vão
diariamente e Mário conta com um
ajudante para os serviços de
jardinagem.
Daisy não estava interessada no
número de empregados que zelavam
pela limpeza e pelos cuidados com a
casa. Slade estava rindo à sua custa.
— Não foi isso que eu quis dizer
— Daisy murmurou com cuidado para
não trair sua irritação.
— Não? — Slade apoiou o ombro
Sabrina nº 1138
156
na porta e cruzou os braços. — O quê,

então, você quis dizer?
Aquilo não era atitude de um
cavalheiro, Daisy pensou, em pânico. E
agora? Como se sairia daquela
situação?
— O que houve esta tarde... Não
quero que você pense que... Oh!
Incapaz de continuar falando e se
submetendo ao olhar malicioso de
Slade, Daisy abriu a porta, entrou em
seu quarto, e bateu-a com um
movimento seco e nervoso. Seria
capaz de apostar que Slade estava
rindo do outro lado.
Furiosa, Daisy pôs-se a andar de
um lado para o outro do quarto. A
toalha caiu de seus cabelos e a fez
157
Projeto Revisoras
olhar inconscientemente ao espelho.

Estava horrível! Por ter ficado
muito tempo com a toalha, os cabelos
estavam grudados na cabeça. E seu
rosto estava rosado e brilhante.
Na hora seguinte, Daisy tornou a
lavar os cabelos e recorreu a alguns
truques de maquilagem. Era preciso
apagar a impressão que deixara em
Slade Eastwood. Não que quisesse
impressioná-lo. Mas também não podia
permitir que ele ficasse em dúvida
sobre ter contratado uma pessoa que
não tinha noções de como se
apresentar em público.
A escada parecia infinita quando
Daisy desceu os degraus, com cuidado
para não virar os pés. Só lhe faltava
Sabrina nº 1138
158
rolar pelos degraus para completar

aquele dia desastroso.
— Tem uma virtude rara para uma
mulher — Slade murmurou. — É
sempre pontual?
Tornou a acontecer. Slade
assustou-a, materializando-se as suas
costas.
— Detesto impontualidade —
Daisy respondeu, sem trair seu
nervosismo.
Slade havia se trajado com
formalidade. Estava usando terno
preto e gravata. Ao vê-lo, Daisy
tornou a se arrepender por ter
aceitado a proposta que ele lhe fizera
em Londres.
Tentou se acalmar, dizendo a si
159
Projeto Revisoras
mesma que tudo mudaria assim que os

médicos a liberassem para assumir
sua posição de babá de Francesco.
Quando isso acontecesse, ela não
mais veria Slade com tanta
frequência. Aliás, ele logo deveria
retomar seus negócios que o prendiam
em Londres.
— O coquetel está a nossa espera
na sala de estar — ele disse e a
segurou pelo braço. — Vamos?
Daisy sentou-se em uma das
poltronas antigas, estilo Luís XV, que
haviam sido trazidas da França.
Sorriu e agradeceu quando Slade lhe
entregou uma taça alta com uma
bebida cor-de-rosa e perfumada.
Slade sentou-se, felizmente,
Sabrina nº 1138
160
longe dela.
— Sempre se veste com
formalidade para jantar? — Daisy não
conseguiu conter a curiosidade.
— Agora não mais — ele
respondeu. Com as mãos apoiadas nos
braços da poltrona, Slade parecia
ainda mais másculo. — Quando minha
esposa era viva, costumava oferecer
jantares quase todas as semanas. Sua
mãe a ensinou a gostar de festas
cerimoniosas que obedecem ao
protocolo. Luísa aprendeu a ser
formal desde que era bebê. Eu
prefiro a descontração. Mas esta
noite é especial.
Sim, ele estava flertando com ela,
Daisy decidiu. Era preciso colocar um
161
Projeto Revisoras
ponto final naquela situação.

— Eu vim para cá para ser apenas
mais uma de suas empregadas, Slade.
Mas não posso deixar de lhe
agradecer por suas atenções.
— Não, Daisy — Slade retrucou.
— Você não é apenas mais uma de
minhas empregadas. — Ele se deteve,
mas logo continuou a falar ao
perceber a expressão desconfiada. —
É a mais importante de todas porque
cuidará do meu Francesco.
cabeça.
— Angélica também janta com
você?
Ele sorriu.
— Não, Angélica não janta comigo.
Sabrina nº 1138
162
Nunca jantou — ele respondeu e se

calou como se isso explicasse tudo.
Slade estava brincando com ela,
Daisy pensou. Aquilo estava
parecendo um jogo, do qual ela sairia
perdedora.
— Nesse caso, não deveria ter me
convidado para jantar com você esta
noite. Não quero despertar
comentários maldosos entre os outros
empregados. São boas pessoas, mas a
maledicência faz parte da natureza
humana.
— Não vejo por que pensariam mal
de nós. Mas esse assunto poderá ficar
para outra oportunidade. Por agora,
basta que saiba que é essencial que
jante comigo não apenas esta noite,
163
Projeto Revisoras
como durante todo o tempo que

estiver aqui.
Daisy quis protestar, mas Slade
não deixou.
— Minha sogra precisa entender
que estou delegando a você a tarefa
de cuidar de Francesco e que sou o
único a quem deverá se reportar.
Angélica é uma boa moça, mas sua
timidez e insegurança impedem que
exerça alguma autoridade sobre meu
filho. O fato de sua mãe ser
empregada de minha sogra agrava
ainda mais o problema. Quero frisar a
Cláudia que a posição que você ocupa
nesta casa é completamente
diferente da de Angélica.
Daisy estreitou os olhos.
Sabrina nº 1138
164
— Estou enganada ou você está

querendo insinuar a sua sogra que
existe algo mais entre nós além de
uma relação patrão/empregada? —
Foi difícil encontrar coragem para
fazer aquela pergunta, mas Daisy
precisava saber a verdade.
Enigmático como era, Slade
escapou mais uma vez de uma
resposta direta.
— Eu quero que ela veja você
como uma amiga em quem confio não
apenas minha casa, mas meu filho.
Daisy franziu o cenho. Conhecia
várias palavras que eram usadas com
o mesmo sentido. Amigos, bons
amigos... Não fora isso que Ronald
dissera a respeito de Susan quando as
165
Projeto Revisoras
suspeitas começaram? Que ela era

apenas uma boa amiga?
— Esqueça — Daisy respondeu,
quase agressiva.
Pela primeira vez, Slade Eastwood
pareceu inseguro a sua frente.
— O quê?
Daisy se levantou.
— Eu disse para esquecer, sr.
Eastwood. Não estou de acordo com
seu plano. Espero poder voltar para
Londres no primeiro voo disponível.
Slade se levantou em seguida.
Quando se dirigiu a ela, sua voz
estava surpreendentemente calma.
— Sr. Eastwood? O que houve com
Slade?
Outro homem teria desistido
Sabrina nº 1138
166
diante do olhar que Daisy lhe dirigiu

antes de fazer menção de ir embora.
Mas Slade não era um homem
qualquer. Mal ela deu um passo, ele a
segurou pelo braço.
— Espere um minuto.
Se ele tivesse sido gentil no toque
e no tom de voz, talvez ela tivesse
esperado. Mas, em seu presente
estado de espírito, Daisy ergueu a
mão e atingiu-o no rosto.
No mesmo instante, ela se
arrependeu do que fizera. Por outro
lado, aquela voz em sua mente, que
passara a existir após a traição de
Ronald, afirmava que Slade tivera o
que merecia.
O que não era, certamente, o que
167
Projeto Revisoras
ele pensava, a julgar pelo modo como

a estava encarando. Slade estava
furioso. Não fosse um homem
controlado, talvez já tivesse lhe dado
o troco.
— Sente-se! — ele ordenou.
Ao contrário do que acontecia
sempre que alguém tentava intimidá-
la, Daisy obedeceu. E também ao
contrário do que esperava, não foi
demitida nem criticada. Slade apenas
perguntou o porquê de sua atitude,
frio como gelo.
— Não estou aqui para ter um
caso com você — Daisy declarou com
um fio de voz.
— Eu pedi que tivesse, por acaso?
— Você disse...
Sabrina nº 1138
168
— Eu disse que queria que Cláudia

e os outros empregados a
respeitassem como minha porta-voz
quando eu não estivesse presente. Ao
menos foi o que eu me ouvi dizer. Por
que não me diz o que você ouviu?
— O que aconteceu esta tarde...
— Daisy tentou se defender, mas
estava tremendo tanto que não
conseguiu continuar.
— Esta tarde cometemos um erro.
Pensei que tivéssemos entendido isso
e que não fosse necessário
discutirmos a respeito. Mas como fez
questão de trazer o assunto à baila,
sinto-me no direito de lembrar que
você errou tanto quanto eu.
Ela merecia aquele sermão. Não
169
Projeto Revisoras
podia mentir.
— Para sua informação, jamais me
aproveitei de minha posição para
forçar uma mulher a manter relações
sexuais comigo. Será que fui claro?
Ele estava lívido. Nunca vira
alguém mais zangado em sua vida e
controlado ao mesmo tempo.
— Fui? — Slade insistiu.
— Eu... eu pensei...
Ela não pôde prosseguir,
imobilizada pela força daqueles olhos
escuros.
— Nós dois sabemos o que você
pensou, mas para sua informação não
tenho necessidade de contratar
mulheres para esse fim.
— Não — Daisy admitiu com um
Sabrina nº 1138
170
fio de voz. — É claro que não.

Fez-se um longo silêncio. Quando
tornou a falar, Slade estava mais
calmo e gentil.
— Seu marido a magoou muito,
não?
— Ele não é mais meu marido.
— Ainda bem. Assim mesmo, leva
tempo para curar as feridas.
Daisy assentiu com a cabeça. Ao
menos nesse particular, eles
concordavam inteiramente.
— Então agora está tudo bem
entre nós?
— O quê? — Daisy ergueu
rapidamente a cabeça. Seria possível?
Depois do que fizera, Slade estava
falando como se fosse o único
171
Projeto Revisoras
culpado?
— Devo entender que prefere
continuar brigando? — ele indagou em
tom de brincadeira.
— Não, não. Claro que não.
— Nem eu. — Slade sorriu. —
Isabella preparou um prato delicioso
para o jantar. Espero que me faça
companhia. Depois, infelizmente,
terei de deixá-la. Há um compromisso
importante em minha agenda para
esta noite.
Um compromisso. À noite. Uma
mulher. Aquela roupa elegante que ele
estava usando não era para ela, então.
Era para a outra.
Daisy sentiu-se mortificada e ao
mesmo tempo envergonhada de seu
Sabrina nº 1138
172
ciúme. Afinal, por que um homem

como Slade Eastwood se interessaria
por uma mulher como ela? Dúzias de
mulheres lindas e solteiras deveriam
se atirar a seus pés todos os dias. Por
que ele escolheria alguém com pro-
blemas causados por ex-maridos?
Naquele instante, Daisy sentiu-se
uma perdedora.
— Antes, porém, eu a convido para
mais um drinque — disse Slade.
Daisy tentou sorrir. Era preciso
superar o passado de uma vez por
todas. Ronald não merecia que ela
parasse de viver ou que meramente
existisse.
Slade inclinou-se para lhe servir a
bebida e ela estremeceu com a
173
Projeto Revisoras
proximidade. A reação foi tão forte e

inesperada que deixou algumas gotas
caírem em seu vestido.
— Relaxe, Daisy — ele disse
baixinho. — Precisa aprender a
relaxar.
— Eu estou bem — ela mentiu.
— Não, não está. Não ainda. Aos
poucos aprenderá. Não há pressa.
Cada dia que passar em Festina Lente
será uma aula nesse sentido.
— Espero que sim — Daisy
respondeu. — Espero que sim.
— Talvez aprenda a gostar da
Itália também. E dos italianos.
Ela entendeu o que Slade estava
querendo dizer. E ele deveria ter
entendido a expressão de seu rosto,
Sabrina nº 1138
174
pois o sorriso que lhe deu a fez corar.
CAPÍTULO V
Quatro semanas passaram em

completa paz e tranquilidade. A razão
principal disso era ter sido chamado
para resolver problemas urgentes nas
subsidiárias de sua empresa no
Canadá e nos Estados Unidos.
Ele telefonava todas as noites
para Festina Lente, mas a não ser
pela expectativa desses telefonemas,
os dias transcorriam de maneira
absolutamente agradável.
A segunda razão que contribuía
para a harmonia da atmosfera era a
175
Projeto Revisoras
presença jovem e entusiástica do

professor de Sica que vinha dar aulas
a Francesco todas as manhãs.
Naquele dia, Daisy e Angélica
haviam aproveitado para ir à cidade e
reunir idéias para a compra de um
presente de aniversário para
Francesco.
No meio da manhã, as duas
resolveram descansar e tomar um
café em um local pitoresco com mesas
na calçada com vista para o rio
Passiria.
Longe do trabalho, Angélica se
revelou uma acompanhante
surpreendente. Ela lhe confessou que
se sentia sufocada em Festina Lente
porque tinha medo da avó de
Sabrina nº 1138
176
Francesco.
— Ela é o que os ingleses chamam
de dragão, você me entende? —
Angélica confidenciou. — Minha mãe
também tem medo dela. Por causa
disso, vive dizendo que eu não devo
dizer nada que possa deixá-la
zangada. Minha posição é muito difícil
naquela casa. Principalmente porque o
signor Eastwood não percebe isso.
Daisy, entretanto, entendia
plenamente o dilema da jovem.
— Meu noivo não quer que eu
continue com esse trabalho depois
que nos casarmos. E eu confesso que
me curvarei de bom grado a sua
vontade. Ao menos minha mãe não
poderá se aborrecer comigo. Eu
177
Projeto Revisoras
arrumei um bom motivo para fazer

meu pedido de demissão.
Mais tarde, de volta a Festina
Lente, Daisy estava na cozinha com
Isabella e com Angélica, quando a
campainha soou.
Isabella se levantou para atender.
Bastou Daisy ouvir a voz estranha
para saber que a sogra de Slade
estava na casa.
Isabella retornou, afobada, para
junto delas.
— A signora Morosini está aí. Ela
veio buscar o bambino para passear.
Quer que você o apronte em cinco
minutos, Angélica. Enquanto isso, ela
quer ver você, Daisy, na sala de estar.
Daisy endireitou os ombros. As
Sabrina nº 1138
178
instruções de Slade haviam sido

claras nesse sentido. Assim que ele
partia em viagem, a sogra entendia
que devia assumir o controle sobre a
casa e os empregados. Muitas vezes,
aparecia sem avisar, como naquele
momento, e levava o neto, embora
estivesse no meio de uma aula.
— Francesco não poderá sair
agora — Daisy disse a Angélica que já
estava se levantando. — Vá à sala de
aula e diga ao professor que ele deve
prosseguir normalmente com as
lições. O pai de Francesco deixou
ordens para que as aulas não sejam
interrompidas sem motivos sérios. A
sra. Morosini sabe disso. Ele avisou-a
mais de uma vez que ela poderia ver o
179
Projeto Revisoras
neto sempre que quisesse, mas fora

do horário das aulas. E isso inclui os
fins de semana.
Daisy se levantou e fingiu ignorar
os olhares preocupados que as duas
trocaram.
— Eu irei conversar com ela agora.
Ao contrário da imagem que
passara, Daisy saiu da cozinha
tremendo. Sabia que a conversa com a
avó de Francesco seria difícil e
desgastante.
Ao abrir a porta, viu a senhora de
costas, olhando para um retrato da
filha, frágil e bonita, com Slade e com
Francesco no colo. Cumprimentou-a.
Ela demorou alguns instantes para se
voltar e retribuir o cumprimento. Seu
Sabrina nº 1138
180
olhar era de complacência ao lhe

pedir que sentasse.
— Soube que meu genro a
contratou.
O olhar frio e perscrutador dizia
que a mulher não aprovara a atitude
de Slade. Daisy sentiu um nó de
ansiedade no estômago.
— É verdade. Sou a nova babá de
Francesco.
Cláudia Morosini ergueu o queixo e
estreitou os olhos. Era óbvio que a
desenvoltura de Daisy não a agradara.
Principalmente porque Daisy não havia
se sentado, como ela indicara.
— E eu sou a avó dele, como já
deve estar ciente. Na ausência de
minha filha, sinto-me no direito de
181
Projeto Revisoras
zelar mais de perto por meu neto.

Entende isso, não é?
Daisy se limitou a um gesto
afirmativo com a cabeça.
— Não considero apropriado que
todos os assuntos referentes à
educação de meu neto sejam
entregues a empregados — a mulher
continuou em tom de proposital
intimidação. — Estou aqui, portanto,
para apanhar Francesco. Pretendo
levá-lo para minha casa por uns dias
juntamente com Angélica. Como não
precisarei de seus serviços, aproveite
e descanse. Afinal, ainda não está
recuperada por completo, não é?
— Sinto muito, sra. Morosini. —
Daisy obrigou-se a manter a voz
Sabrina nº 1138
182
calma e controlada, embora seu rosto

estivesse queimando de indignação. —
O sr. Eastwood deixou bem claro que
Francesco não está mais em idade de
interromper suas aulas a não ser nas
férias e em pontes de feriados. Se
quiser levá-lo no final de semana,
estou certa de que Francesco terá
muito prazer em acompanhá-la.
A perplexidade impediu a sra.
Morosini de retrucar no primeiro
momento.
— Não pretendo esperar até o
final da semana para ter meu neto
comigo. Parece que você esqueceu
com quem está falando.
— Sinto muito, sra. Morosini, mas
o sr. Eastwood deixou essa ordem.
183
Projeto Revisoras
Talvez deva conversar com ele a esse

respeito após seu retorno. Até lá,
devo cuidar para que Francesco não
falte às aulas.
— Cuidar? — A mulher estreitou
os olhos. — Que impertinência!
— Não sou impertinente, senhora
— Daisy se defendeu. Precisava
demonstrar segurança a qualquer
preço, embora sua vontade fosse dar
vazão aos tremores que a dominavam
por dentro. — Estou apenas
cumprindo ordens.
— É mesmo?! Assim como Angélica
e o professor estão cumprindo as
suas? Quem pensa que é para me
desafiar?
— Não é uma questão de desafio,
Sabrina nº 1138
184
mas de obediência ao sr. Eastwood —

Daisy respondeu.
— Essa é sua última palavra? — A
mulher não esperou pela contestação.
— Saiba que se arrependerá do que
fez no dia de hoje, srta. Summers.
Cuidarei disso pessoalmente.
Cláudia Morosini foi embora
deixando atrás de si um rastro de
perfume e de ódio. Daisy permaneceu
onde estava, pálida e com a
respiração suspensa.
Quando Slade telefonou naquela
noite, Daisy relatou o incidente
palavra por palavra. Slade aprovou sua
atitude e agradeceu por sua firmeza.
Ao desligar, Daisy obrigou-se a
esquecer o episódio.
185
Projeto Revisoras
No sábado, Cláudia Morosini

mandou seu motorista e uma criada
buscarem Francesco e o
procedimento se repetiu todos os fins
de semana subsequentes. Não foi
preciso lembrá-la de que o neto
precisaria estar de volta ao final das
tardes dos domingos.
Colocar Francesco na cama no
horário adequado não foi uma tarefa
fácil em nenhuma das noites, mas
pouco a pouco, ele começou a
entender que seus achaques de mau
humor não mudariam a situação.
Inteligente como era, ele logo
adivinhou que Daisy, apesar de
boazinha, não cedia a sua vontade.
Junho chegou, finalmente, e Daisy
Sabrina nº 1138
186
passou por uma consulta com o médico

particular dos Eastwood. Ao receber
alta completa, ela voltou para casa e
passou a assumir a responsabilidade
pelos cuidados com Francesco.
Angélica ainda não havia deixado o
emprego, mas sua função agora era a
de uma simples ajudante.
Slade estava por chegar. Em seu
último telefonema, avisara que
pretendia ficar em casa durante todo
o mês, em necessárias e merecidas
férias.
Daisy encontrava-se à janela de
seu quarto, apreciando os jardins e a
piscina que brilhava ao sol da tarde.
Em dez minutos, Francesco e ela
iriam para a piscina por uma hora.
187
Projeto Revisoras
Logo depois da partida de Slade,

como fazia muito calor, Daisy havia
convidado Francesco para nadarem
juntos. Para seu espanto, o menino
disse que tinha medo de água.
De acordo com Angélica, o próprio
pai havia tentado várias vezes vencer
aquela fobia, mas acabara desistindo
diante do pavor do filho.
Daisy escutou as explicações com
atenção. Um plano desenhou-se em
sua cabeça após alguns dias. Deu,
então, uma série de telefonemas e
uma semana depois, com a ajuda de
Mário, resolveu fazer uma surpresa
para Francesco.
Assim que sua obra ficou pronta,
convidou-o para tomar chocolate com
Sabrina nº 1138
188
biscoitos ao ar livre.
Ao ver o playground em que se
transformara a piscina, a expressão
do garoto se iluminou.
Além de espalhar brinquedos
infláveis coloridos de todos os
tamanhos pela água, como um
dinossauro, um cavalo-marinho, uma
poltrona e um pequeno barco, Daisy
mandou instalar três escorregadores
no lado raso da piscina. Do lado de
fora, para que Slade pudesse
descansar e tomar seus sucos, Daisy
comprou uma mesa infantil com
quatro cadeiras e um guarda-sol.
Francesco tomou o lanche sem
tirar os olhos do cenário nem sequer
por um instante. Assim mesmo,
189
Projeto Revisoras
precisou de cerca de uma hora para

se armar de coragem e entrar na
água.
Daisy não o apressou. Sem dizer
nada, seguiu-o até a borda, e sentou-
se. Os dois ficaram ali, com os pés na
água, por um longo tempo, apenas
conversando.
Sem convidá-lo, ela entrou na
piscina, deu algumas braçadas e fingiu
ter uma luta com uma comprida
serpente marinha de listras azuis e
amarelas.
Francesco ficou radiante. Seu riso
foi espontâneo e maravilhoso. Sem
que esperasse, Daisy sentiu-se
dominar por uma onda de ternura tão
forte que a amedrontou. Era como se
Sabrina nº 1138
190
uma voz a estivesse aconselhando

para não se permitir esse sentimento,
para que se lembrasse que aquilo era
apenas um emprego.
Mas Daisy não quis dar ouvido à
voz da razão. Que mal havia, afinal,
em gostar de seu trabalho? Quando
fosse necessário, ela voltaria para sua
casa e arrumaria outro emprego.
Os momentos passados na piscina
se tornaram os melhores de cada dia.
Após o contato inicial com a água,
Francesco concordou em aprender a
nadar. As aulas de natação passaram
a fazer parte da rotina deles a partir
daquele instante.
Satisfeita com o excepcional
progresso de Francesco, Daisy havia
191
Projeto Revisoras
acabado de dar sua autorização para

que ele tentasse nadar sem os
flutuadores, quando viu uma figura
alta e morena caminhando pelo
gramado em direção a eles.
A surpresa foi tão grande que
Daisy se atrapalhou com a respiração
e engoliu água. Por sorte, os gritos de
alegria de Francesco abafaram sua
tosse.
— O que estou vendo? — Slade
sorriu, feliz, e acompanhou os gestos
do filho que se apressou a subir os
degraus para sair da piscina e correr
para seus braços.
Sem se importar em molhar o
terno, Slade se abaixou e abraçou o
filho de encontro ao peito.
Sabrina nº 1138
192
— Eu aprendi a nadar! Daisy disse

que já posso tentar dar minhas
braçadas sem os flutuadores! Não
tenho mais medo da piscina, papai.
— Isso é muito bom, Francesco,
muito bom.
Daisy não gostou da emoção que a
invadiu ao ouvir aquelas palavras pelas
quais ela, certamente, era a
responsável. E o modo como Slade a
fitou, em seguida, sobre o ombro do
filho, a deixou com a respiração
suspensa.
Estava usando apenas um maiô
enquanto ele estava de terno e de
gravata. Não era um maiô ousado. Ao
contrário. E ela nunca havia se
envergonhado de seu corpo e de sua
193
Projeto Revisoras
feminilidade, mas não pôde evitar a

sensação de estar nua diante dele.
Slade olhava para seu corpo,
principalmente para os seios, sem
tentar disfarçar. E ela, de repente,
sentiu que o sangue estava circulando
tão depressa em suas veias, que a
fazia corar.
Não saberia dizer como chegou à
cadeira onde deixara sua toalha e sua
canga, meia hora antes.
— Olá, Slade.
— Olá, Daisy. Se não tivesse visto
com meus próprios olhos, confesso
que não acreditaria! — Ele fez um
gesto amplo em direção à piscina com
uma das mãos, enquanto segurava
Francesco com a outra. — A idéia foi
Sabrina nº 1138
194
sua?
Ela fez que sim com a cabeça.
Isabella não fizera segredo dos
esforços e das frustrações do patrão
quando falhara em todas suas
tentativas de vencer o medo de
Francesco com relação à água.
Receava que ele não fosse reagir bem
ao saber que uma estranha havia
conseguido o que ele não conseguira.
— Não pode avaliar o quanto me
sinto grato a você.
O que Slade não podia avaliar era
a extensão de seu prazer ao ouvir
aquele elogio, ao sentir aquele olhar
em seu corpo.
— Então você agora é um peixe,
hein? — Slade brincou com o filho e
195
Projeto Revisoras
lhe deu um abraço apertado. — Por

que não nada para mim, meu querido
peixinho?
Francesco olhou para o pai e
segurou-lhe a mão.
— Você vem comigo?
Daisy parou de respirar enquanto
esperava a resposta. Se Slade fizesse
a vontade do filho, ela o veria apenas
de sunga...
— Claro! Dê-me apenas cinco
minutos para que eu tire esta roupa e
vista um maiô, ok?
Antes de se afastar, Slade
endereçou-lhe um sorriso que a
deixou novamente sem fôlego. Por
sorte, Francesco a fez voltar a si ao
puxá-la pela mão.
Sabrina nº 1138
196
— Venha, Daisy, vamos brincar

enquanto papai não vem para que eu
lhe mostre que já sei nadar.
Daisy obrigou-se a recordar que
era uma mulher de vinte e quatro
anos e não mais uma criança. Que
precisava se comportar como uma
adulta e agir com naturalidade.
Não foi com espontaneidade,
porém, que tornou a desamarrar a
canga e entrar na piscina.
Francesco se pôs a gritar,
eufórico, quando viu o pai se
aproximar.
— Depressa, papai! Pule aqui!
Slade não se apressou. Seus
passos eram lentos e seguros, como
os de alguém que estava bem consigo
197
Projeto Revisoras
próprio e com o mundo.

Seu corpo moreno era musculoso e
bronzeado. O peito era másculo, bem
peludo, mas os pêlos diminuíam à
medida que se aproximavam da sunga
preta.
Era a primeira vez que Daisy via
Slade sem roupa, apenas com um
traje de banho, e viu-se forçada a
admitir o que já sabia desde que o
conhecera. Que sentia-se atraída por
ele como nunca se sentira atraída por
outro homem. E que essa atração
aumentava dia-a-dia.
Era algo puramente físico. Uma
resposta sexual ao fascínio másculo
que ele irradiava. E, por isso, poderia
ser controlado. Ela era uma mulher
Sabrina nº 1138
198
forte, afinal. O que estava

acontecendo era natural e saudável.
Bastava não se deixar envolver. Aliás,
deveria se sentir aliviada por estar
reagindo como uma pessoa normal
depois do trauma que fora seu
casamento.
Slade mergulhou e emergiu ao
lado dela como um deus. Daisy tentou
sorrir, mas acabou apenas engolindo
em seco ao deparar com aquele par de
olhos pretos voltados para os dela.
— Não sabia que você nadava.
— Nunca me perguntou — Daisy
respondeu.
— É verdade. Eu nunca perguntei.
Alegria e diversão foram as
palavras de ordem nos sessenta
199
Projeto Revisoras
minutos seguintes. Francesco não

cabia em si de felicidade com a volta
do pai. Daisy não permaneceu todo
esse tempo na piscina. Depois de
jogarem bola por cerca de dez
minutos, ela preferiu sair e tomar sol
em uma das espreguiçadeiras.
Mesmo de olhos fechados, ela
continuou vendo a imagem de Slade,
com seu corpo másculo e seus
músculos rijos. Ele deveria se
exercitar com assiduidade. Não
deveria pesar nem sequer um quilo a
mais da tabela correspondente a sua
altura.
Daisy queria parar de pensar
tanto em Slade, mas não conseguia. O
pior era que estava começando a
Sabrina nº 1138
200
fantasiar. Tentava imaginá-lo

abraçando-a, acariciando-lhe os seios,
as costas e as coxas.
Fizera isso, muitas vezes,
imaginando-se nos braços de um ou
outro artista de cinema. Mas Slade
era real. E eles estavam vivendo sob o
mesmo teto!
— Francesco se tomou uma outra
criança. Você operou um verdadeiro
milagre — disse Slade, obrigando-a a
abrir os olhos. — Até algumas
semanas atrás, seria impossível
convencê-lo a se aproximar de uma
piscina, quanto mais mergulhar e
nadar.
— Foram os brinquedos que o
fizeram mudar de idéia — Daisy
201
Projeto Revisoras
explicou.
— Não, foi você — Slade
retrucou. — Você o compreende.
Sempre teve facilidade no
relacionamento com crianças?
— Procuro usar meu bom senso
apenas — Daisy respondeu. — E me
lembrar de que elas precisam de
atenção e de amor por mais
independentes e rebeldes que
pareçam ser. São as de
temperamento mais difícil, em geral,
e que se comportam de modo que os
adultos consideram inaceitável, que
mais precisam de nós. Se as
castigamos, ou pior, se as taxamos de
impossíveis, o problema se agrava.
Slade demorou alguns instantes
Sabrina nº 1138
202
para responder.
— Acho que acabo de ser
repreendido, não?
— Não, é claro que não. — Daisy
desviou os olhos e sorriu para
Francesco que, naquele exato
momento, para chamar a atenção,
lutava com a baleia inflável.
Slade deitou-se na
espreguiçadeira ao lado e apoiou-se
no cotovelo. O simples gesto de
afastar uma mecha de cabelos que lhe
caíra na testa fez o coração de Daisy
acelerar.
— Seja como for, Daisy, o fato é
que meu filho parece outro desde que
você chegou. Admito que sabe lidar
com ele melhor do que eu. Aliás, não
203
Projeto Revisoras
apenas com ele — Slade acrescentou

com um sorriso malicioso. —
Conseguiu lidar com o dragão que
sempre atormentou todos os dias e
noites da pobre Angélica.
Daisy corou ao perceber que
Slade conhecia o apelido que Angélica
colocara em sua sogra.
— Sei de tudo que acontece nesta
casa, Daisy — ele murmurou e ela
preferiu não responder.
Slade fitou-a e cogitou contar o
que lhe acontecera na Inglaterra, mas
decidiu que aquele não era o momento.
Daisy não confiava nele. Não se sentia
à vontade em sua presença. Apesar de
que, no primeiro dia...
Tentou afugentar a lembrança que
Sabrina nº 1138
204
ameaçava excitá-lo. O que quer que

tivesse acontecido no passado, não a
tornara uma mulher frígida. Disso ele
tinha certeza. Daisy tinha um
temperamento ardente e apaixonado.
Ao mesmo tempo era frágil e doce...
— Acho que já chega de piscina
para Francesco por hoje. — Daisy se
levantou e Slade precisou se obrigar a
não sorrir. Ela também era
contraditória. E muito, muito
desconfiada. Seu ar ingênuo o atraía.
Achava-o provocante e adorável.
Fazia um longo tempo que não se
preocupava em se insinuar para uma
mulher, mas sempre que estava ao
lado dela, sentia uma necessidade
absoluta de impressioná-la. E ab-
205
Projeto Revisoras
surda. Não era mais um garoto, afinal.

— Eu ficarei aqui mais um pouco.
Estou precisando relaxar.
— Tudo bem.
Daisy se afastou, constrangida.
Ele havia ficado aborrecido com ela.
Notara isso. Seria por causa do que
acontecera com relação a Cláudia
Morosino?, Daisy se perguntou en-
quanto se dirigia à borda da piscina e
chamava o relutante Francesco para
acompanhá-la.
Mas fora Slade quem trouxera o
nome da sogra à baila, não ela. O que
a levava a pensar que fora a conversa
sobre suas habilidades com as
crianças que o perturbara.
Sim, só podia ser isso. Ele deveria
Sabrina nº 1138
206
estar receoso de que ela fosse tomar

seu lugar no coração do filho.
Francesco tomou banho e jantou.
Quando o colocou na cama e começou
a lhe contar uma história, como fazia
todas as noites, Slade entrou no
quarto.
— Por favor, faça de conta que
não estou aqui.
Ao vê-lo parado à porta, Daisy
havia se levantado da cama. Os
protestos de Francesco não
tardaram. Ele queria saber o que
acontecera com o personagem da
história em seu primeiro dia de aula.
Daisy voltou a se sentar e
prosseguiu com a narração que, como
não podia deixar de ser, perdeu em
207
Projeto Revisoras
número de brincadeiras.
Por mais que tentasse, Daisy não
conseguia ignorar a figura sensual que
a ouvia com interesse, sentada em
uma poltrona junto à janela.
Slade estava esperando-a para
que jantasse com ele. Algo que
aconteceria durante toda a extensão
das férias segundo o estabelecido em
seu primeiro dia naquela casa.
A mera expectativa daquele mês
que estava se iniciando deixou-a
abalada. O que não deveria acontecer.
Para Slade, aqueles momentos a sós
não significariam nada. Ele podia ter
mulheres elegantes e sofisticadas.
Por que se interessaria por ela?
— Bem, para acabar nossa
Sabrina nº 1138
208
história, Bob foi para casa com seus

irmãos e com suas irmãs e todos
tomaram um delicioso chocolate com
pãezinhos doces que acabavam de sair
do forno.
— Posso tomar chocolate e comer
pãezinhos doces quentes amanhã em
meu lanche? — Slade quis saber. —
Como Bob e sua família?
— Falarei com Isabella — Daisy
prometeu com um sorriso.
— Quantos pãezinhos poderei
comer?
—Amanhã pensaremos nisso, está
bem? É hora de dormir — disse Slade.
Francesco não tentou
desobedecer a ordem. Sabia que não
adiantaria. Conformado, sorriu para o
209
Projeto Revisoras
pai e estendeu os braços para Daisy.

Aquilo havia se tornado um ritual para
eles. Todas as noites, ela contava uma
história e lhe dava boa-noite com um
forte abraço.
Muitas vezes, lembrava-se do
bebê que havia perdido e sentia uma
grande tristeza, mas o calor daqueles
bracinhos ao redor de seu pescoço
era bom demais para não ser
retribuído.
Ela se afastou para dar lugar a
Slade. Os dois se abraçaram e Slade
beijou o filho. Antes que se
separassem, Daisy ouviu Francesco
dizer:
— Algum dia terei irmãos, papai?
Daisy fechou os olhos. Bom Deus,
Sabrina nº 1138
210
o que Francesco perguntaria a seguir?

— Talvez — Slade respondeu com
fingida espontaneidade.
Daisy percebeu de imediato que a
pergunta o havia tocado.
— Quando? — Slade insistiu. —
Logo?
— Eu respondi talvez, Francesco.
— É preciso um pai e uma mãe
para nascer um bebê, não é? — o
menino continuou como se não tivesse
ouvido o pai. A gata, que a irmã de
Mário comprara, havia tido gatinhos e
Mário o levara para vê-los no dia
anterior. A idéia de um bebê havia lhe
parecido próxima. — Daisy poderia
ser a mãe?
— Basta, Francesco — o pai
211
Projeto Revisoras
respondeu com uma rispidez que fez o

menino estremecer de susto. No
mesmo instante, Slade o acariciou na
tentativa de corrigir seu erro. — Fa-
laremos sobre isso depois, ok?
Quando você não estiver tão cansado.
É tarde e eu confesso que também
estou cansado e com fome. Ainda não
jantei. Além disso, antes de tudo,
precisamos conversar sobre o
presente que você gostaria de ganhar
em seu aniversário. Mais três
semanas e você fará sete anos. Já
sabe o que quer?
— Já — Francesco respondeu sem
titubear. — Quero um dos gatinhos
de Guinevere. Mário disse que a irmã
dele me dará qualquer um que eu
Sabrina nº 1138
212
escolher. Se você deixar, é claro — o

menino acrescentou com um gesto de
timidez para insistir, como todas as
crianças fazem, em seguida. — Por
favor, papai. Eu quero um gatinho
mais do que qualquer coisa no mundo.
— Também falaremos sobre isso
amanhã.
Daisy sabia que Slade havia
comprado um jipe a pilha, grande o
suficiente para comportar Francesco
na direção. .Sabia também que
crianças, principalmente na idade de
Francesco, sonhavam com bichinhos
de estimação de verdade.
Ela não precisaria nem sequer
perguntar qual o gatinho que
Francesco escolheria se o pai
213
Projeto Revisoras
concordasse que adotasse um. Era

uma gatinha, aliás, de patinhas e
cauda brancas, embora o resto do
corpo fosse preto.
— Eu comprarei uma cama para
ela com meu próprio dinheiro, papai. E
a colocarei para dormir em meu
quarto. Cuidarei bem dela.
— Amanhã, Francesco. Agora você
precisa dormir.
Francesco abriu a boca mais uma
vez para argumentar, mas o olhar
sério do pai o fez desistir de seu
intento.
No corredor, ao se encaminharem
para a sala de jantar, Slade
surpreendeu Daisy com uma
informação que nada tinha a ver com
Sabrina nº 1138
214
Francesco.
— Eu pensei em lhe contar esta
tarde, logo que cheguei, mas preferi
esperar que estivéssemos longe de
Francesco. Seu ex-marido apareceu
no hospital esta semana e fez um
estardalhaço porque se recusaram a
lhe fornecer seu endereço. Eu
estranhei isso. Você, por acaso,
deixou ordens para que lhe negassem
a informação?
Daisy sentiu que empalidecia.
— Sim.
— Infelizmente, alguém
mencionou meu nome — Slade
continuou. — Mas eu adivinhei seus
motivos e apenas confirmei o que ele
já sabia: que foi meu carro que a
215
Projeto Revisoras
atropelou.
— Ele... Você... Foi muito
desagradável?
— Em absoluto — Slade
respondeu, sem acrescentar que
sentira uma antipatia instintiva pelo
outro homem. As maneiras de Ronald
McTavish lhe pareceram melosas
demais. Repugnantes. Fora ele o
responsável pelo coração partido de
Daisy. E não havia como saber se ela
ainda amava aquele patife.
— Ele não desconfiou que eu estou
morando com você? — Daisy
perguntou para corar em seguida ao
se dar conta da ambiguidade da
pergunta.
— Não — Slade respondeu. Era a
Sabrina nº 1138
216
primeira vez que Daisy falava sobre

seu ex-marido e ele estava curioso
por saber mais. — Eu respeitei sua
vontade. Se deixou instruções para
que o hospital mantivesse sigilo sobre
seu paradeiro, não seria eu a traí-la.
— Slade fez uma pausa. — Ele disse
que o divórcio foi um erro. Que os
advogados a manipularam.
— É mentira — Daisy se apressou
a negar. — Eu quis o divórcio.
Slade sentiu a tensão inundar o
ambiente. Os motivos de Daisy
deveriam ser sérios. Até mesmo
graves.
O motivo teria sido uma mulher?
Mulheres? Sexo podia se tornar uma
arma terrível em mãos erradas. Ele
217
Projeto Revisoras
havia mandado investigar Ronald

McTavish e não descobrira nada de
anormal. Por outro lado, ninguém
podia saber o que acontecia entre
quatro paredes.
O pensamento provocou uma
contração em seu estômago.
— Ele parece ter certeza de que
ainda há uma chance de vocês
voltarem — Slade murmurou e se
descobriu ansioso por ouvir a
resposta.
— Não há — Daisy declarou com
firmeza.
O que havia com ele? Por que
estava sentindo alívio e raiva ao
mesmo tempo?
— Faz muito bem — viu-se
Sabrina nº 1138
218
dizendo. — Você vale muito mais do

que aquele homem.
— Eu sei perfeitamente disso —
Daisy respondeu com uma
agressividade que chocou a si própria.
Sem que nenhum dos dois
esperasse, viram-se muito próximos
um do outro.
Daisy tentou se afastar, mas não
conseguiu. Slade a segurou pelos
braços e impediu que se movesse.
— O que houve, Daisy? O que ele
fez que a deixou assim?
— Não há nada de errado comigo
— Daisy se defendeu.
— Você tem medo.
— Não, não tenho medo dele. —
Na verdade, era dela própria que
219
Projeto Revisoras
sentia medo. Não sabia qual seria sua

reação se tornasse a ver Ronald. Na
época que perdera o bebê, tivera
vontade de matá-lo. Mas o tempo
passara.
— Ele ameaçou-a fisicamente? —
Slade perguntou.
— Não. — Por que Slade insistia
em tocar naquele assunto? E por que
não se afastava? Embora suas mãos
estivessem quentes, seu toque a fazia
tremer. — Está tudo acabado entre
nós e não quero vê-lo nunca mais.
Daisy sentiu os olhos de Slade
pousados em seu rosto. Ele estava
sendo bom para ela. Provavelmente
sentia compaixão. A esse pensamento,
balançou a cabeça.
Sabrina nº 1138
220
Não deveria ter aceitado aquele

emprego. Não deveria ter concordado
em morar naquela casa. O convívio
familiar não a ajudaria. Apenas
pioraria sua situação.
— Você está precisando se
distrair e eu acabo de ter uma idéia.
— Slade soltou-a e recuou dois
passos. — Haverá um concerto na
cidade esta noite e eu ganhei dois
ingressos.
Daisy engoliu em seco.
— Está me convidando para sair?
Apenas nós dois?
Ele sorriu e lhe deu uma piscada.
— Seria tão ruim assim? Mas não
precisa responder. Na verdade,
ganhei os ingressos de um amigo que
221
Projeto Revisoras
toca na orquestra. Após o espetáculo,

ele reunirá algumas pessoas.
— Oh, nesse caso, talvez seja
melhor eu não ir. Será uma festa
entre amigos.
— Você irá comigo, Daisy. Não
será uma intrusa. — O tom de voz de
Slade era de quem não admitiria uma
recusa. E, no fundo, ela não queria
recusar. Uma noite de música e de
festa era que ela mais precisava para
distrair seus pensamentos.
— Então está bem. Eu agradeço
seu convite. — Ela hesitou. — O que
deverei usar? Não estou acostumada
a esse tipo de coisa.
— Vale tudo em ocasiões como
essa. Encontrará pessoas em trajes
Sabrina nº 1138
222
de noite e outras de jeans e camiseta

no teatro. Para a festa, deverá usar
algo bonito. Esporte chique, eu me
arriscaria a dizer.
Houve um momento de silêncio.
Slade aproximou-se e ela recuou até
encostar na parede.
— Seja você mesma — Slade
sussurrou —, e estará bem em
qualquer lugar.
Daisy tentou se afastar, mas
Slade apoiou-se na parede com o
braço e lhe bloqueou a passagem. Não
foi difícil adivinhar o que iria
acontecer. Era o que Daisy vinha
esperando desde o primeiro dia. Que
Slade a beijasse outra vez. Que a
fizesse sentir o que nunca sentira
223
Projeto Revisoras
antes por outro homem.

Fechou os olhos e ergueu o rosto
para oferecer os lábios. Sentiu um
vazio no peito quando, em vez de
beijá-la, Slade se afastou.
— Precisaremos sair às oito horas
em ponto para não chegarmos
atrasados. Avisarei Isabella para
preparar algo leve para comermos,
uma vez que após o concerto iremos à
festa.
Daisy abriu os olhos e fez que sim
com a cabeça. Estava tremendo. Sua
vontade era fugir e se esconder no
quarto.
A humilhação fez com que levasse
ambas as mãos ao rosto, na tentativa
de esfriá-lo. Por sorte, Slade não
Sabrina nº 1138
224
virou para trás.

E se ele tivesse notado que ela se
oferecera para o beijo?, perguntou-
se enquanto examinava suas roupas no
armário.
Sentia-se grata a Stephanie,
naquele momento, por tê-la obrigado a
renovar seu guarda-roupa e a adotar
um novo corte de cabelos após o
divórcio. Nunca havia gastado di-
nheiro consigo mesma. A amiga a
convencera a investir em si mesma e
ela não se arrependia por tê-la ouvido
e se livrado ao menos das roupas do
passado.
Escolheu um modelo de tule
marrom-café sobreposto a um vestido
justo com decote tomara-que-caia,
225
Projeto Revisoras
que lhe pareceu perfeito para aquela

noite.
Quando Slade a visse com ele,
saberia se valera a pena comprá-lo.
Ela havia gastado uma boa parte de
suas economias, afinal, ao aceitar a
sugestão de Stephanie.
Mas não queria se iludir. Slade a
convidara para aquela festa por pena.
Ele não sentira sequer vontade de
beijá-la.
De qualquer forma, faria com que
não se envergonhasse de sua
acompanhante. Conversaria sobre
assuntos interessantes e provaria a
todos que ela e Slade se davam bem.
Por outro lado, deixaria bem claro que
o que havia entre eles era puramente
Sabrina nº 1138
226
platônico.
Olhou para o relógio sobre o
criado-mudo e começou a correr.
Teria apenas quinze minutos para
ficar bonita. Estava determinada a se
divertir. Ao menos por uma noite
esqueceria o passado e se recusaria a
considerar o futuro, para se
concentrar apenas no presente.
CAPÍTULO VI
— Você está linda!

Daisy estava no meio da escada
quando ouviu a voz grave de Slade
vinda do hall. Não havia notado que
ele se encontrava lá, a sua espera.
227
Projeto Revisoras
Agradeceu e se esforçou por dar

um sorriso sereno. Slade também
estava atraente com um terno grafite
e camisa branca de seda.
Ela estava se sentindo segura de
si com o vestido sofisticado, com as
sandálias douradas de salto alto, e
com seus brincos e com sua pulseira
de ouro. Os cabelos estavam presos
no alto da cabeça por uma fivela
dourada. Deixara alguns fios soltos na
nuca e nas têmporas para quebrar a
sobriedade do penteado.
Sentia-se melhor agora com os
cabelos cortados à altura dos ombros.
Os cachos estavam mais bonitos,
livres do peso. Antes, ela os usava até
a cintura.
Sabrina nº 1138
228
Não exagerou na maquilagem.

Aplicou apenas algumas pinceladas de
sombra marrom nas pálpebras, rímel
nos cílios e uma camada de pó no
rosto. Nos lábios, o batom vermelho a
fez pensar que não era mais a mesma
mulher, quando mirou-se ao espelho.
— Isabella nos preparou uma
salada de abacate com queijo
parmesão — Slade anunciou — e
rosbife. Pensei em abrir uma garrafa
de champanhe para brindarmos a
noite. O que me diz?
— Champanhe? — Daisy
estranhou, mas lembrou-se em se-
guida de que aquela seria uma noite
especial. — Por que não?
Por princípio, Daisy nunca tomava
229
Projeto Revisoras
mais do que dois copos de vinho.

Sabia do perigo de beber em excesso,
principalmente com o estômago vazio.
Slade a fez apoiar a mão em seu
braço ao conduzi-la para a sala de
jantar. E ela obedeceu com
desenvoltura. Estava determinada a
comer e a beber e a não pensar que
era apenas uma simples empregada
para Slade.
Iriam a uma festa após o
concerto. Qual o problema? Mais
tarde, poderia se servir apenas de
refrigerantes.
Sim, faria isso. Naquele instante,
um drinque seria bem-vindo. E
champanhe também era feito de uvas,
como o vinho.
Sabrina nº 1138
230
O champanhe que Slade lhe serviu

era excelente. Embora não fosse uma
grande conhecedora de bebidas,
reconheceu a qualidade superior
daquela marca.
Era tão delicioso que ela tomou a
segunda taça logo após a primeira.
Tinha certeza de que nunca havia
provado nada tão bom antes.
Quando Mário os levou à cidade,
Daisy percebeu que estava relaxada
como há muito não se sentia. Parecia
uma criança no dia de seu aniversário.
O convite, o vestido, o champanhe e
principalmente o homem a seu lado
eram os responsáveis.
O concerto foi maravilhoso.
Conforme Slade havia lhe
231
Projeto Revisoras
explicado, as pessoas estavam usando

os trajes mais diferentes possíveis. E
opostos. Muitas mulheres usavam
grifes como Gucci e Armani. Outras
pareciam estar com suas roupas
diárias.
Aparentemente, todos conheciam
Slade e faziam questão de
cumprimentá-lo. Ele, contudo, não
parecia notar que era alvo das
atenções.
Tanta indiferença seria genuína?,
Daisy cogitou ao ver uma ruiva
estonteante passar por ele e lhe
sorrir com sensualidade.
— O que foi que eu fiz? — Slade
perguntou baixinho.
Daisy sentiu um arrepio lhe
Sabrina nº 1138
232
percorrer as costas quando ouviu o

sussurro perto de seu ouvido.
— Por que disse isso?
— Sei reconhecer um olhar de
reprovação. Mas não sei o que o
motivou. Poderia esclarecer minha
dúvida?
Daisy tentou não corar, mas foi
uma causa perdida.
— Reprovação?
— Sim, reprovação — ele
confirmou e a conduziu a um recanto
escondido. — O que foi que eu fiz?
— Não seja bobo, Slade — Daisy
respondeu. — Você não fez nada.
— Você me deixa assim — Slade a
surpreendeu dizendo. — Não estou
sabendo como me comportar com
233
Projeto Revisoras
você.
Daisy encarou-o, certa de que se
tratava de uma espécie de
brincadeira. Não era.
— Não sei de que você está
falando. Juro. Eu disse algo que não
devia?
Slade olhou para Daisy e se
esforçou por não se trair. Estava com
uma vontade louca de beijá-la, de
tocá-la. A pele de Daisy era macia e
aveludada. E ela estava usando um
perfume irresistível.
— Você olha para mim como se
esperasse que eu fizesse algo errado.
— Engano seu. — Daisy olhou para
os lados. — Não deveríamos nos
misturar aos outros? Você não
Sabrina nº 1138
234
deveria estar cumprimentando seus

amigos?
— Você é a única pessoa com quem
estou interessado em conversar agora
— Slade respondeu. — Quero que
saiba que entendo o trauma pelo qual
passou. E que os homens não são
todos iguais.
— Eu sei...
— E que não é crime admirar uma
mulher bonita e desejável.
Daisy limitou-se a encará-lo.
— Não posso mentir, Daisy. Eu
sonho com você em minha cama. Mas
isso não significa que a forçarei a
fazer algo contra sua vontade. Existe
uma atração muito forte entre nós.
Percebeu isso tanto quanto eu. Não
235
Projeto Revisoras
negue.
Daisy não podia acreditar que
estavam conversando sobre algo tão
íntimo.
— Não há nada entre nós —
afirmou com um fio de voz. — Eu
trabalho para você. Nada mais.
Slade moveu-se para mais perto
dela. Quando suas pernas se tocaram,
Daisy recuou como se tivesse levado
um choque.
— Percebeu?
Daisy engoliu em seco. Slade podia
ser convencido e arrogante, mas
estava certo. Apenas não podia
admitir isso. A atração se
estabelecera entre eles desde o
primeiro momento. Mas atração era
Sabrina nº 1138
236
algo por demais perigoso. Ela também

havia se sentido atraída por Ronald e
o resultado fora desastroso.
— Atração física não significa
nada — falou sem se dar conta.
— Desculpe, mas discordo de você
— Slade declarou. — Admito que o
sexo não é tudo em uma relação, mas
é uma parte importante.
— Sua resposta é tipicamente
masculina — Daisy caçoou.
— Não posso falar pelos outros
homens, apenas por mim mesmo, mas
falo por experiência.
A expressão de Slade era séria.
Daisy não pôde permanecer calada.
— O que está querendo dizer? —
perguntou, zangada consigo mesmo
237
Projeto Revisoras
pelo interesse. Não podia se

apaixonar por Slade, não podia se
emocionar com suas atitudes
amorosas para com o filho. Precisava
antipatizar com ele.
— Tive um irmão, Giuseppe. Ele
era mais novo do que eu. Quando
nosso pai faleceu e nossa mãe
retornou para a Itália, ele pareceu
esquecer seu sangue inglês. Ele e o
irmão gêmeo de Luísa, minha esposa,
fizeram uma grande amizade. Os dois
eram iguais. Só pensavam em
aventuras e divertimentos. Sofreram
um acidente quando escalavam uma
montanha e nós os perdemos.
Daisy suspirou.
— Sinto muito, Slade. Não sei o
Sabrina nº 1138
238
que dizer.
— Luísa veio de uma grande
família. Tinha mais seis irmãos, além
de Lorenzo, mas sentia um amor
especial por seu gêmeo. Foi difícil
para ela. E para mim também, que
tinha apenas Giuseppe. Nós nos
confortamos mutuamente. Era apenas
amizade o que nos unia, mas Luísa se
apegou a mim.
A confissão estava sendo difícil
para ele. Daisy ouviu-o no mais
completo silêncio.
— Quando percebi como Luísa se
sentia a meu respeito, tentei me
afastar embora não quisesse
interromper a amizade. A reação dela
foi inesperada. Fechou-se em si
239
Projeto Revisoras
mesma e entrou em processo de

depressão. Eu fiquei com pena e voltei
para junto dela. Gostava de Luísa,
afinal, e sabia de casamentos que
haviam dado certo com bases menos
sólidas.
— Você foi feliz?
— Luísa foi. Ela entendeu.
— Sinto muito, Slade.
— Não sinta — Slade respondeu.
— Nós nos demos bem. Poderia ter
sido pior.
De repente, Slade balançou a
cabeça e tirou o copo vazio da mão de
Daisy.
— Vou lhe apanhar outro drinque.
Daisy sorriu e seguiu-o com o
olhar enquanto ele se misturava à
Sabrina nº 1138
240
multidão que se agrupava nos jardins

da casa onde estava acontecendo a
festa.
A noite estava quente e
enluarada. O ar estava perfumado de
magnólias e grama recém-cortada.
— Vamos dançar?
A voz de Slade interrompeu seus
pensamentos, ainda voltados para
Luísa de quem ela não deveria, mas
sentia ciúme.
Ele havia depositado os dois copos
em uma mesinha e lhe estendia a mão.
— Está ficando tarde. Não
deveríamos...
— A noite ainda é uma criança. E
eu adoro música clássica,
especialmente valsas. Pode ser
241
Projeto Revisoras
antiquado, mas tenho a mesma

predileção que meu amigo Vittorio por
esse tipo de música.
A música e o ambiente eram
românticos demais para serem
seguros. E Slade ainda mais. Mas ela
não dançava uma valsa havia anos...
Slade atraiu-a de encontro ao
peito, gentil e ao mesmo tempo firme.
Revelou-se um dançarino perfeito. Ela
o acompanhou como se sempre
tivessem dançado juntos.
As árvores estavam enfeitadas
por milhares de luzinhas. Daisy se
sentia como se estivesse sonhando e
não queria acordar. Era bom demais
se entregar àquele cenário de magia,
àqueles braços que lhe sugeriam um
Sabrina nº 1138
242
prazer sensual.
Continuaria dançando com Slade
pelo resto de sua vida, se pudesse
escolher. Estava se sentindo como se
fosse princesa de um conto de fadas.
Amada e desejada por seu príncipe.
E Slade a desejava. O pensamento
invadiu sua mente apesar do controle
a que ambos se submeteram. De
repente, ela se viu desejando-o como
nunca desejara ninguém.
A música terminou, mas Slade
ainda demorou a soltá-la. Quando lhe
falou, sua voz soou rouca.
— Vamos comer algo? E beber
uma taça de vinho? Francamente, não
acho justo tomar refrigerante quando
Vittorio se esmerou nos pratos.
243
Projeto Revisoras
Daisy tentou sorrir, mas não

conseguiu.
Slade estava olhando fixamente
para ela. Havia uma expressão sensual
em seu rosto que fez soarem sinos de
alarme.
Antes que ela pudesse reagir,
Slade se inclinou e depositou um beijo
rápido em seus lábios. Em seguida a
puxou pela mão.
Aquilo não podia estar
acontecendo! Ela não podia se
apaixonar por Slade. Não era uma
simples atração. E ela sabia qual era o
resultado de um amor traído. Não
suportaria uma segunda experiência.
Esvaziou a taça de vinho que
Slade lhe serviu.
Sabrina nº 1138
244
— Você estava com sede e não

dizia nada — Slade brincou.
— Poderia tomar mais uma? —
Daisy perguntou.
Slade não respondeu de imediato.
— Claro que sim. Mas antes
precisa comer e dançar mais uma
valsa comigo.
— Eu não estou com fome.
— Você precisa se alimentar,
Daisy, mesmo que para isso eu tenha
de ajudá-la — Slade retrucou em tom
de voz que não admitia réplica. —
Está comigo e bebeu demais.
Precisamos resolver esse problema
imediatamente e ir para casa não é
uma das alternativas. Quero tê-la a
meu lado, quero dançar com você.
245
Projeto Revisoras
Esta noite, Daisy, você será minha

mulher.
Daisy não conseguiu responder,
mas seus olhos falaram por ela e
Slade leu a mensagem.
— Eu não quis dizer o que você
está pensando — Slade apressou-se a
esclarecer o equívoco. — Não tenha
medo. Sabe que eu não seria capaz...
A menos, é claro, que você também
queira.
Do susto, Daisy passou para o
constrangimento. Slade sorriu.
— A conversa está encerrada, ok?
Que tal darmos uma espiada no bufê?
Mas a noite não estava encerrada.
Ao contrário. Cada minuto que
passava ela se tornava mais
Sabrina nº 1138
246
fascinante e envolvente.
A comida estava deliciosa e o
champanhe magnífico. Os amigos de
Slade eram pessoas adoráveis e
simples apesar dos diamantes que
ostentavam e dos modelos Dior. Mas
era a companhia de Slade que fazia
de cada momento, um momento
especial.
Eram três horas da manhã e Daisy
ainda estava nos braços de Slade ao
som de uma música. Era um número
lento, romântico e seu rosto
repousava no ombro dele.
Ele a havia beijado duas vezes
durante a festa e brincado com seu
pescoço e com as orelhas. Mas apesar
dos toques serem leves e
247
Projeto Revisoras
entremeados por risos, Daisy sentiu a

pulsação acelerar.
Se Slade conseguia excitá-la com
gestos inocentes, como seria se ele a
levasse para a cama e a submetesse a
sua experiência sexual? Como se
sentiria se Slade a tocasse e lhe
fizesse todas as coisas que seus olhos
prometiam?
Um caso. Daisy considerou essa
possibilidade pela primeira vez.
Precisava ser prática. Um homem
como Slade tinha casos, não
romances. Ele era livre e ela também.
Não havia nada que os impedisse de
um breve interlúdio. Poderia durar
dias, semanas ou meses. Isso não
importava.
Sabrina nº 1138
248
Para ele.
Daisy desejaria pensar assim. Que
a duração do envolvimento não
importava. Que fosse bom enquanto
durasse. Naquele momento, dançando
com ele, sentindo seus braços fortes
ao redor de seu corpo,, sentindo seu
perfume, Daisy desejou ser o tipo de
mulher que ele esperava.
Mas ela não era!
Ronald fora seu primeiro e único
homem. Para ela, o amor exigia
entrega total. Corpo, mente e alma.
Jamais se envolveria com alguém
apenas por sexo.
— Posso saber em que está
pensando?
A voz rouca de Slade a fez voltar
249
Projeto Revisoras
à realidade. Ele estava olhando para

ela com ternura. Havia um sorriso em
seus lábios.
Uma ternura inesperada inundou o
coração de Daisy. Ela procurou
ignorá-la. Não podia desejar o
impossível. Isso significaria
sofrimento e ela não suportaria outra
decepção. Precisava colocar um fim
nessa débil esperança que teimava em
se infiltrar em seu coração.
— Não vale a pena — Daisy
respondeu e encolheu os ombros.
O beijo de Slade a tomou de
surpresa. E dessa vez foi profundo e
exigente, embora também de curta
duração.
— Vamos sair daqui — ele
Sabrina nº 1138
250
murmurou. — Quero ficar sozinho

com você.
Daisy tentou se mostrar alegre e
jovial ao se despedir dos amigos de
Slade, mas assim que se viu na rua de-
serta e escura, o medo a dominou.
Não de Slade, mas de si mesma.
— Festina Lente fica a meia hora
daqui — disse Slade ao mesmo tempo
em que a fazia apoiar a mão na curva
de seu braço. — A noite está linda. O
que acha de irmos a pé? Tenho
certeza de que você gostará de ver
minha cidade banhada pelo luar.
— Tudo bem para mim. Depois do
que você me fez comer, uma
caminhada é ideal — Daisy respondeu,
tentando não demonstrar seu
251
Projeto Revisoras
nervosismo.
A noite estava realmente linda. O
céu parecia um veludo negro bordado
com pedrarias. A lua brilhava em sua
plenitude e a brisa carregava o
frescor da madrugada e o perfume da
vegetação.
Era uma noite para os amantes,
Daisy pensou. E o pensamento de
Slade deveria ser o mesmo.
— Está com medo de mim, Daisy?
Estavam caminhando de mãos
dadas, completamente sozinhos,
envolvidos em total silêncio. Daisy não
soube o que responder.
— Está? — Slade se deteve e a
fez encará-lo.
Ela respondeu com um movimento
Sabrina nº 1138
252
negativo de cabeça. Não conseguiu

falar. Um nó havia se formado em sua
garganta. Não tinha medo de Slade,
mas de algo que não sabia definir.
Algo ligado ao passado e aos
pesadelos que ainda a atormentavam
quando menos esperava, fosse dia ou
noite.
— Não quero magoá-la. Acredita
em mim, não? — Slade perguntou.
Daisy sustentou-lhe o olhar. Podia
acreditar? Era fácil dizer que não
havia intenção de mágoa. Ninguém
desejava magoar uma pessoa
propositalmente. Mas isso não
impedia que a mágoa acontecesse,
quando o amor acabava para um dos
parceiros.
253
Projeto Revisoras
— A questão não é relevante,

Slade. Eu não sou nada para você.
Apenas fui contratada para cuidar de
seu filho.
Slade estreitou os olhos.
— Talvez eu não a queira apenas
como babá para Francesco.
Daisy fez um movimento com os
ombros e retomou a caminhada sem
esperá-lo. Alguns instantes depois,
Slade a alcançou. E continuaram lado
a lado. Ele com as mãos nos bolsos.
— Seu casamento foi muito ruim?
— O final foi péssimo.
O silêncio se estendeu ao
intolerável. Daisy se deteve e virou-
se abruptamente.
— Não quero me envolver com
Sabrina nº 1138
254
mais ninguém. É bom você ter isso em

mente desde já ou não poderei
continuar em sua casa.
Fez-se uma pausa significativa.
— E amizade? — Slade propôs. —
Você tem algo contra a amizade?
— E você?
Ele sorriu.
— Oh, sim. Sou perfeitamente
capaz de me controlar, se houver
necessidade. A paciência é própria
dos sábios. E também a perseverança.
Então? Amigos?
Daisy não soube o que responder.
Inclinou a cabeça apenas e fez que
sim.
No mesmo instante, Slade voltou a
segurar sua mão.
255
Projeto Revisoras
— Vamos continuar nosso passeio

agora? Como velhos amigos. E como
amigo, quero lhe mostrar alguns
lugares bonitos deste país nas
próximas semanas.
Ele estava caçoando dela. Era
preciso esclarecer aquela história de
uma vez por todas.
— Slade...
— Sim?
Ele parecia um garoto, todo
sorrisos. Ela não teve coragem para
criticá-lo.
— Nada.
Quando chegaram a Festina
Lente, Daisy sentiu o coração
disparar novamente. Depois daquela
conversa, eles haviam feito o
Sabrina nº 1138
256
restante do trajeto em silêncio. Em

vez de diminuir, sua tensão havia
aumentado. Suas pernas mal
conseguiam sustentá-la.
Slade abriu a porta e ofereceu um
café antes mesmo de acender a luz.
— Não, obrigada — Daisy
apressou-se a dizer. — Vou direto
para a cama. Obrigada pela noite
adorável.
— Boa noite, Daisy.
Daisy virou-se para subir a
escada, mas Slade a segurou pelo
braço.
— Um beijo de boa-noite? Entre
dois amigos?
O beijo foi breve e doce, mas não
poderia ser chamado de casto. E
257
Projeto Revisoras
Daisy não estava disposta a se

arriscar. Havia muito em jogo. Sua
paz de espírito, por exemplo, e sua
estabilidade emocional.
Desvencilhou-se e subiu quase
correndo a escada. Slade não tentou
detê-la dessa vez.
— Tenha bons sonhos, Daisy.
Bons sonhos! A audácia de Slade a
deixou furiosa. Ele não tinha o direito
de beijá-la. Não depois de prometer
que seriam apenas amigos.
Ela fora direta e objetiva em seus
termos. Estabelecera parâmetros.
Slade precisava parar de pensar que
ela era como as outras mulheres, que
se deixavam levar pela lábia dos
homens.
Sabrina nº 1138
258
Abriu a torneira e preparou um

banho perfumado de imersão.
Precisava relaxar de alguma forma. E
tentar encontrar um meio de frear
Slade. Esse era o principal problema
com os homens acostumados ao poder.
Eles não aceitavam um não como
resposta.
CAPÍTULO VII
Fiel a sua palavra, Slade se

comportou como um cavalheiro nas
semanas seguintes. Os momentos que
passaram juntos foram perfeitos. Ele
a levou e também Francesco a vários
passeios pela cidade e pelas
259
Projeto Revisoras
montanhas que a rodeavam, e

participaram de várias festas e
churrascos oferecidos por seus
muitos conhecidos.
Houve noites aconchegantes em
casa, mas na maioria das vezes, Slade
a levou a restaurantes caros, a
teatros, cinemas e também a galerias
de arte.
Em nenhuma das ocasiões, ele se
aventurou a lhe dar mais do que um
platônico beijo no rosto.
Daisy estava pensando, na última
quinta-feira daquele mês de junho, o
dia do aniversário de Francesco, que
deveria ser grata a sua sorte.
Ela havia se levantado cedo aquela
manhã. Muito antes dos outros. Nem
Sabrina nº 1138
260
mesmo o sol havia nascido ainda.

Quando percebeu que os primeiros
raios estavam tentando se infiltrar
por sua janela, olhou para o céu e foi
invadida por uma súbita sensação de
vazio.
O que estava acontecendo? Por
que estava lamentando que Slade não
tivesse tentado fazê-la mudar de
idéia? Por que estava se sentindo
decepcionada pelo fato de Slade não
estar mais atraído como no início? Por
que estava preferindo que ele não
aceitasse todos os convites que lhe
faziam para festas e churrascos? Por
que a convivência de Slade com outras
mulheres lhe despertava ciúme?
Daisy se afastou da janela com um
261
Projeto Revisoras
movimento brusco, irritada com o

rumo que seus pensamentos estavam
tomando.
Angélica deixaria aquela casa no
dia seguinte e ela assumiria a total
responsabilidade pelos cuidados com
Francesco.
Algumas semanas antes, quando
Slade chegara de viagem, ela estava
plenamente convicta de que sua
permanência não ultrapassaria o
período de experiência. Agora, com a
mudança de comportamento de Slade
e com sua afeição por Francesco que
aumentava a cada dia, a idéia de ir
embora não mais a seduzia.
Tudo estava bem. Por que, então,
se sentia tão inquieta e ansiosa? Por
Sabrina nº 1138
262
que não conseguia entender suas

emoções e acalmá-las?
Um súbito movimento no jardim
lhe chamou a atenção. Slade estava
chegando e trazia consigo uma caixa
de papelão. Não entrou pela porta da
frente como de costume. Em vez
disso, deu a volta.
A gatinha, é claro! Ele havia
combinado com a irmã de Mário que
iria buscá-la aquela manhã bem cedo
para que Francesco a encontrasse ao
acordar e tivesse a manhã toda para
brincar com ela antes de sua festa.
No exato momento de entrar pela
porta lateral que dava na cozinha,
contudo, Daisy o viu parar e colocar a
caixa no chão. Com cuidado, olhou
263
Projeto Revisoras
para dentro e introduziu o braço. Com

a janela fechada, não dava para ouvir
nenhum som, mas ela seria capaz de
apostar que ele estava tentando
acalmar a gatinha com uma carícia.
Após todos aqueles dias de
convivência, das vezes que saíram
juntos, a sós ou com Francesco, Daisy
não saberia explicar o que a fez
descobrir seu verdadeiro sentimento
por Slade. Amava-o. Não era apenas
atração física o que sentia por Slade.
Era amor.
Queria estar perto dele sempre,
queria acordar com ele todas as
manhãs e ir para a cama com ele
todas as noites. Queria pertencer a
Slade, fazer parte de sua vida, ajudá-
Sabrina nº 1138
264
lo a criar Francesco...
Não! Estava enganada! O que
sentia por Slade era uma atração
muito forte. Mas nada mais do que
atração. Ele era bonito, inteligente,
charmoso e rico. Qualquer mulher se
interessaria por ele. Não havia nada
de errado com ela. Apenas não queria
amar mais ninguém em sua vida. Não
depois da experiência que tivera.
Amar era sinônimo de vulnerabilidade,
de perda de controle. Uma vez
bastara.
Além disso, Slade não a amava.
Duvidava, inclusive, que ele tivesse
sentido atração por ela algum dia.
Felizmente. Caso contrário, ela já
teria sido obrigada a deixar seu em-
265
Projeto Revisoras
prego e precisava sobreviver.

Por sorte, ele estava para voltar
ao trabalho. Vê-lo apenas em fins de
semana seria bem mais fácil do que
terem encontros diários.
Às oito horas, quando desceu para
tomar o café, Daisy estava pronta
para assumir seu posto. Slade havia
dado instruções para que ela passasse
pelo quarto de Francesco todas as
manhãs para que os três fizessem
juntos a primeira refeição.
Francesco acordou animado com a
perspectiva da festa que aconteceria
à tarde. Quando desceu e viu a pilha
de presentes que o esperava em seu
lugar à mesa, correu para eles.
— Papai! São todos meus? — Ele
Sabrina nº 1138
266
não sabia qual pacote abrir primeiro.

De repente, viu o jipe e não conteve
um grito de júbilo.
Durante dez minutos, tudo que se
ouvia na sala eram os gritos de
felicidade, as risadas e o barulho das
rodas do jipe ao serem testadas.
A expressão de Slade era de
profundo amor e ternura pelo filho.
Daisy estava olhando para ele sem que
percebesse. Mas foi surpreendida.
Slade lhe deu uma piscada e
tornou a sorrir para o filho.
— Agora Daisy lhe dará seu
presente. Ela quis deixá-lo para o fim
porque é muito especial. Você quer
vê-lo agora, Francesco?
— Si, si! Isto é, sim, papai.
267
Projeto Revisoras
O presente de Daisy, em comum

acordo com Slade, seria um lindo
cesto para a gatinha e dois potes, uma
para a comida e um para a água. Ela o
entregaria a Francesco e Slade traria
em seguida a dona genuína daquelas
peças.
No entanto, quando Daisy entrou
na cozinha para apanhar os objetos,
Isabella avisou-a que a gatinha
também deveria ser entregue por ela.
— Não foi isso que combinamos —
Daisy estranhou.
A governanta apontou para a
gatinha que dormia no cesto e fez um
movimento afirmativo com a cabeça.
— O signore quer que você a
entregue ao bambino.
Sabrina nº 1138
268
Daisy sentiu-se emocionada com a

generosidade do gesto.
Ele sabia, tanto quanto ela, que
aquele presente seria o mais
importante para Francesco.
Isabella ajudou-a com os
presentes. Além dos potes, Daisy
também havia comprado uma bolinha e
um pequeno rato de borracha.
Conforme o esperado, os olhos de
Francesco se iluminaram ao ver os
presentes.
— Feliz aniversário, Francesco —
Daisy disse com a voz embargada.
Aprendera a amar aquela criança, tão
parecida com o pai. Francesco era um
menino adorável. Poderia ser seu
filho...
269
Projeto Revisoras
O pensamento a fez balançar a

cabeça. Estava pensando demais em
amor e família aquela manhã. Aquilo
não podia continuar. Gostava de
Francesco. Sentia grande afeição por
ele. Mas não podia amá-lo.
Francesco ficou deslumbrado com
a gatinha. Escolheu um nome para ela
assim que a pegou no colo. Ou, talvez,
o nome já tivesse sido escolhido e ele
o guardara em segredo.
— O nome dela será Queenie —
ele disse, orgulhoso. — Ela será minha
pequena rainha.
— E quem cuidará dela? — Slade
perguntou. — Isabella?
— Oh, não. Ela é minha. Eu
tomarei conta de minha Queenie
Sabrina nº 1138
270
direitinho!
Francesco havia agradecido a
Daisy no momento que ela lhe
entregara o cesto. Mas quando se
sentaram à mesa, ele olhou para ela e
se atirou em seus braços.
— Obrigado, Daisy. Prometo que
cuidarei bem dela.
— Quero que saiba que foi seu pai
quem deu a palavra final, Francesco.
Se ele não concordasse, não teria
sido possível.
Os olhares se travaram. A
mensagem que ela leu a fez perder o
fôlego. Havia paixão nos olhos escuros
de Slade. A intensidade com que ele a
fitava era quase palpável. Era como se
ele estivesse lhe fazendo amor.
271
Projeto Revisoras
Apesar de não estar mais

trabalhando naquela casa, Angélica
aceitou o convite para a festa de
aniversário de Francesco e se
ofereceu para ajudar Daisy.
Seu presente foi um jogo.
Francesco fez questão de jogar uma
partida com ela assim que
terminassem de tomar o café.
Daisy aproveitou para se ocupar
com outros afazeres. Afinal, quanto
mais trabalhasse, menos tempo teria
para pensar em Slade.
Mais do que qualquer gesto,
chocara-a descobrir que o
comportamento gentil, mas puramente
platônico de Slade, durante o mês,
havia sido apenas fachada. Estava
Sabrina nº 1138
272
assustada com essa inesperada

revelação. Mas excitada ao mesmo
tempo, era preciso admitir. Agora
teria de vigiar seus pensamentos
ainda mais. Cada minuto, cada
segundo. Não podia permitir que seu
coração dominasse sua mente. Não
estava pronta para um homem como
Slade Eastwood. Não estava pronta
para nenhum homem.
Eram pouco mais de onze horas
quando a mãe e o padrasto de Slade
chegaram. Slade daria uma grande
festa para o filho, ao estilo italiano.
Não viriam apenas os amiguinhos,
portanto, mas também os parentes,
tanto adultos quanto crianças. E
Cláudia Morosini!
273
Projeto Revisoras
Mas não era na sogra de Slade

que Daisy estava prestando atenção,
e sim em sua mãe naquele instante.
A simpática senhora, a quem Daisy
fora apresentada, chamou-a assim
que abraçou o filho e o neto e
examinou todos os presentes que
Francesco mostrava com imensa
satisfação.
Aloysia, esse era seu nome,
segurou o braço de Daisy e puxou-a
de lado.
— É um prazer conhecê-la. Slade
me contou sobre os progressos de
Francesco. Ele está muito grato a
você e eu também. Vejo que ele não
exagerou nos elogios. Francesco
nunca esteve tão bem.
Sabrina nº 1138
274
— Obrigada, sra. Marella.

Como a mãe de Slade era
diferente de sua sogra!
— Por favor, chame-me de
Aloysia. Não gosto de formalidades.
— Obrigada — Daisy tornou a
agradecer e se sentou no sofá a um
gesto dela.
— Fale-me sobre você, querida.
Como conheceu meu filho?
Daisy detectou de imediato que
havia algo errado na situação. A mãe
de Slade estava se dirigindo a ela
como se fosse algo mais que a babá de
seu neto. A namorada do filho, por
exemplo. O que Slade teria lhe
contado?
O almoço foi servido à beira da
275
Projeto Revisoras
piscina. Antes, Francesco fez questão

de mostrar para a avó seus
progressos na arte da natação. Tanto
ela quanto o marido eram pessoas
agradáveis e educadas, mas Daisy não
conseguia se sentir à vontade entre
eles por mais que se esforçasse.
Foi com alívio que viu a refeição
chegar ao fim. Essa seria sua
oportunidade de se afastar com
Francesco, insistindo que ele
descansasse para a festa. Aliás, não
foi preciso insistir muito. A permissão
de levar a gatinha consigo tornava a
retirada um prêmio.
Daisy não conseguia parar de
pensar, contudo, na impressão que
Slade dera aos parentes sobre sua
Sabrina nº 1138
276
posição na casa.
Uma coisa era Slade autorizá-la a
enfrentar sua sogra no que dizia
respeito à educação de Francesco.
Outra era deixar os outros
desconfiados de que ela sua amante.
Essa dedução a fez empalidecer.
Se Slade era capaz de manipular as
pessoas como estava pensando, então
ele não era muito diferente de
Ronald.
Mal a imagem se formou em sua
mente, Daisy se arrependeu do
pensamento. Slade não era igual a
Ronald. Em nada. E antes que sua
insegurança desse margens a outros
julgamentos descabidos, dirigiu-se à
cozinha para ajudar Isabella.
277
Projeto Revisoras
— Daisy?
A porta do escritório estava
aberta: Ao vê-la passar, Slade se
levantou da escrivaninha e chamou-a.
— Poderia vir aqui um momento,
por favor?
E agora? Daisy hesitou no hall.
Havia muito a ser feito ainda para a
festa de Francesco. Acima de tudo,
não queria ser vista a sós com Slade
por ninguém.
— Feche a porta.
A ordem foi dada em voz baixa e
gentil, mas Daisy detectou algo mais
que lhe provocou um arrepio. 0
chamado não fora o de um patrão a
uma empregada. E a conversa não
seria sobre trivialidades. Mas era
Sabrina nº 1138
278
tarde demais para voltar atrás.

— Feche a porta, Daisy.
Apesar de ouvir a ordem pela
segunda vez, ela ainda hesitou em
obedecer. Slade notou isso. Daisy
estava olhando para ele com medo,
como se ele fosse um predador. Como
gostaria de convencê-la de que não
corria perigo a seu lado! Como
gostaria que ela soubesse que por
mais que a desejasse, ele jamais a
forçaria. Seu consolo e sua esperança
se baseavam nas poucas vezes que a
tocara e que fora correspondido.
— Sinto muito sobre minha mãe.
Espero que compreenda. No fundo,
acho sua curiosidade em saber quem é
a mulher que está vivendo nesta casa
279
Projeto Revisoras
comigo perfeitamente natural.

— Não posso compreender, Slade
— Daisy murmurou. — Não sou uma
mulher aqui, mas a babá de Francesco.
Estou trabalhando para você. Sua
mãe, porém, parece pensar que ocupo
outra posição. E você é o responsável
por esse equívoco. Se tivesse lhe
contado a verdade, não estaríamos
tendo esta conversa.
— Está enganada. — Slade saiu de
trás da escrivaninha. Parou bem perto
de Daisy e olhou em seus olhos. Mas
não a tocou. — Se está preocupada
que minha mãe possa estar pensando
que estamos tendo um caso, esqueça.
Minha mãe é uma mulher inteligente.
Ela sabe reconhecer o caráter das
Sabrina nº 1138
280
pessoas.
Daisy engoliu em seco. Por mais
que tentasse afastar seus olhos dos
de Slade, não conseguia.
— Eu estou apaixonado por você.
A reação foi violenta.
— Não!
— Sim, Daisy. Sim.
— Você não sabe o que está
falando.
— Eu sei, Daisy. Não sou homem
de confundir sentimentos. Não me
apaixono por todas as mulheres que
conheço. Se quer saber a verdade,
não dormi com ninguém desde que
minha esposa se foi. O que sinto por
você, no entanto, não é apenas desejo,
pela falta de sexo. Eu realmente me
281
Projeto Revisoras
apaixonei por você. Eu te amo, Daisy.

Daisy fechou os olhos.
— Eu poderia ter tido muitas
mulheres nesses anos — Slade
continuou —, mas ao contrário do que
pensa a meu respeito, não costumo
levar para a cama qualquer mulher que
conheço só porque é bonita ou
interessante. Eu acredito no amor. Eu
te amo. Jamais disse isso a alguém em
minha vida. Mas é um fato e eu espero
que acredite, pois não pretendo
implorar para que o faça.
— Por favor, Slade, não diga mais
nada — Daisy murmurou.
— Por quê? — ele insistiu. — Diga-
me. No início, quando a trouxe para
cá, pensei que não gostasse de mim.
Sabrina nº 1138
282
Sabia que havia atração física entre

nós, mas não tinha certeza sobre
haver um sentimento maior. Esse
último mês, no entanto, que passamos
juntos, descobri que meu receio não
tinha fundamento. Você gosta de mim.
Mais do que isso. Atrevo-me a dizer
que também está apaixonada por mim.
— Não — Daisy negou em pânico.
— Sim — Slade retrucou. — Fiz
tudo como você queria. Aceitei fazer
de conta que era apenas amizade o
que nos ligava. Obedeci as regras até
não aguentar mais.
— Não era um jogo de faz-de-
conta! — Daisy protestou.
— Oh, sim, era. Cada dia, cada
hora, cada minuto! Eu quero você,
283
Projeto Revisoras
Daisy. Quero-a em todos os sentidos.

Amizade é pouco para mim. E não diga
que não me quer, porque nós dois
sabemos que isso seria uma mentira.
Daisy mal conseguia respirar,
quanto mais raciocinar. Mas era
preciso encontrar uma saída para
aquela situação!
— Seu casamento foi infeliz.
Entendo isso. — Slade colocou um
braço ao redor da cintura de Daisy e
com a outra mão a segurou pelo
queixo. — Mas é preciso deixar o
mundo de sombras e procurar a luz.
Ele pousou os lábios nos dela com
suavidade. Ela os apertou. Não
conseguia controlar os tremores que a
invadiam.
Sabrina nº 1138
284
Permanecia inerte e imóvel nos

braços de Slade, apenas sentindo os
lábios carinhosos deslizarem por suas
faces, por suas pálpebras, pelo
pescoço.
A um suspiro seu, Slade a atraiu
com força de encontro ao peito e
mudou imediatamente a forma de
beijá-la.
Na primeira oportunidade, quando
Daisy tentou protestar, Slade invadiu
sua boca.
A mão em suas costas começou a
se mover para baixo, lenta e
eroticamente, sem apressá-la, mas
deixando-a perceber o quanto era
desejada. E foi justamente esse
domínio paciente e amoroso que a fez
285
Projeto Revisoras
ceder.
Daisy relaxou o corpo e se
entregou pouco a pouco às emoções.
As mãos de Slade agora estavam em
seus seios, e os polegares
massageavam os mamilos por cima da
roupa. Mas era como se ela estivesse
nua. Eles reagiram às carícias,
enrijecendo. E ela esqueceu suas
reservas, gemendo baixinho e
enlaçando-o pelo pescoço.
No mesmo instante, Slade deixou
escapar um grunhido e aprofundou o
beijo, tomando sua língua e sugando-a.
Os beijos tornaram-se ardentes e
infinitos. Depois de estarem juntos e
ao mesmo tempo distantes durante
semanas, sem se tocarem, sem
Sabrina nº 1138
286
trocarem nem sequer um gesto de

carinho, não conseguiam se sentir
saciados...
— Você me ama, Daisy, diga isso
— Slade implorou, rouco de desejo. —
Diga que me quer tanto quanto eu te
quero. Preciso ouvir você dizer.
Ela ouviu as súplicas, mas não
respondeu. Não queria falar. Para
isso, teria de parar para pensar e
refletir, e ela não queria parar.
Queria sentir os braços de Slade ao
redor de seu corpo, queria se sentir
dominada pela virilidade dele, queria
continuar vivendo naquele mundo
mágico onde o tempo deixava de ter
importância, onde apenas o presente
existia.
287
Projeto Revisoras
De olhos fechados, ela se

aconchegou mais uma vez a ele e lhe
ofereceu os lábios. Mas nada
aconteceu.
Ela abriu os olhos e viu os dele.
— O que foi?
— O que está vendo, Daisy? —
Slade perguntou baixinho.
Ela pestanejou.
— Este sou eu — ele mesmo
respondeu. — Slade. Não sou o homem
que se disse seu marido. Por que não
fala comigo? Por que não consegue
admitir que algo de bom está
acontecendo conosco? Ainda não
confia em mim?
Foi mais uma afirmação do que
uma pergunta. O efeito não poderia
Sabrina nº 1138
288
ter sido pior.

— Isso importa? Você disse que
me queria. Era de esperar que
estivesse satisfeito.
— Com beijos e carícias apenas?
— Slade a interrompeu. — Você
entendeu tudo errado. Não quero ter
uma aventura com você. Não se trata
de sexo, Daisy. Quero amar você e
ser amado. Quero-a em minha vida.
— Eu vivo em sua casa. De certa
forma, faço parte de sua vida.
— Claro que não! Estamos vivendo
uma farsa. Fui paciente todo esse
tempo e não me arrependo disso. Mas
cheguei a meu limite. Estou louco por
você. — Slade respirou fundo. — Não
sou como seu ex-marido. Não a farei
289
Projeto Revisoras
sofrer. Mais cedo ou mais tarde, você

terá de confiar em mim.
Isso não aconteceria. Era algo
acima de suas forças. Amava-o demais
para confiar em suas promessas.
Confiara em Ronald e o amara. Sabia
agora que o amor que lhe dedicara não
era tão poderoso e completo como o
que sentia por Slade. Mas a decepção
a marcara para sempre. Por causa da
traição de Ronald, ela perdera sua
filha.
Um nó lhe fechou a garganta e os
olhos se encheram de lágrimas.
— Não chore, Daisy. Por favor,
não chore.
Sentia-se culpada. De acordo com
o médico, o aborto fora provocado
Sabrina nº 1138
290
por estresse. Por causa de Ronald, ela

havia perdido seu bebê. Deveria ter
sido mais forte. Se não tivesse se
preocupado tanto com seu casamento
fracassado, agora teria sua filha nos
braços.
— Daisy, pare com isso! — Ela
voltou a si com Slade abraçando seu
corpo sacudido pelos soluços. — 0 que
você tem? Fale comigo!
A dor e a culpa finalmente se
apresentaram. Daisy chorou como
nunca havia chorado antes. Slade não
fez mais perguntas. Apenas a
manteve junto a seu peito e lhe
acariciou os cabelos como faria com
uma criança.
Passou-se muito tempo até que
291
Projeto Revisoras
Daisy conseguisse se acalmar. Ela

deixou-se abraçar e consolar sem
protestos. Aquela seria a última vez
que Slade a abraçava. Sabia, agora,
com absoluta clareza, que nunca mais
entregaria suas emoções nas mãos de
um homem.
— Sinto muito — desculpou-se e
deu um passo para trás. — Perdi o
controle. Não consigo explicar o que
deu em mim.
— Chega de rodeios, Daisy —
Slade protestou. — Nós dois sabemos
que você voltou ao passado.
-- Não sei de que você está
falando.
Slade passou uma das mãos pelos
cabelos. Seria possível que tivessem
Sabrina nº 1138
292
voltado à estaca zero?

— Você sabe.
Daisy balançou a cabeça e se
encaminhou para a porta.
— Preciso ir. Tenho muito o que
fazer.
Ele voltou para a escrivaninha e
apoiou-se nela.
— E só isso que tem para me
dizer?
Daisy não respondeu de imediato.
Amava Slade como jamais amara
outro homem. Era por isso que estava
em pânico.
— Não, não é. — Era preciso
colocar um fim naquela situação de
uma vez por todas. — Você é meu
patrão, mas não é meu dono. Não tem
293
Projeto Revisoras
o direito de invadir minha pri-

vacidade. Não tem o direito de exigir
que eu lhe conte o que se passa em
minha mente. Se prefere que eu
deixe de cuidar de Francesco, serei
perfeitamente capaz de entender.
Basta dizer e eu irei embora.
Havia uma expressão nos olhos de
Slade que Daisy não conseguiu
decifrar. Incapaz de enfrentá-los, ela
baixou a cabeça.
— Talvez essa fosse a melhor
solução — Slade murmurou —, mas
tenho de pensar em Francesco. Não
estou em condições de lhe dar uma
resposta agora.
— Então posso me retirar?
— Você é livre para fazer o que
Sabrina nº 1138
294
quiser, Daisy. Eu nunca a obriguei a

nada.
Daisy saiu do escritório e não
olhou para trás. Não poderia. Não
sabia se agira bem ou se cometera o
maior erro de sua vida. Sua única
certeza era de que seu coração
estava mais partido do que nunca.
CAPÍTULO VIII
Daisy precisou ficar meia hora

sozinha em seu quarto até se sentir
em condições de descer e de
enfrentar as pessoas.
Por sorte, Angélica se oferecera
para ajudá-la aquele dia e Francesco
295
Projeto Revisoras
subira com ela para descansar.

— Ele é muito parecido com
Slade, você não acha? — perguntou a
mãe quando Daisy a encontrou no
jardim, onde a festa seria realizada.
— O temperamento, contudo, lembra
mais o de Luísa.
Daisy sentiu-se constrangida ao
ouvir o comentário. Tinha certeza de
que Aloysia não estaria lhe falando
naqueles termos se soubesse que ela
era apenas uma babá. Por outro lado,
como poderia se antecipar e explicar
que não estava envolvida com seu
filho, como ela pensava?
— Ainda bem que Francesco é
apenas uma criança agitada. A mãe
vivia deprimida. Acho que sua única
Sabrina nº 1138
296
alegria foi casar com Slade. —

Subitamente, como se tivesse se dado
conta de que estava falando demais,
Aloysia se deteve. — Peço que me
desculpe, querida. Preocupo-me
demais com a felicidade de meu filho.
Daisy ficou surpresa com o
desabafo. Não fora um deslize.
Aloysia falara sobre o casamento
infeliz de Slade, de propósito.
Era compreensível e louvável. Ela
também achava que Slade merecia ser
feliz. E aquela era mais uma razão
para que os dois não se envolvessem.
Não estava de bem com sua vida. Não
estava em condições de se doar.
— Com razão — Daisy murmurou.
— Tenho certeza de que seu filho
297
Projeto Revisoras
encontrará alguém um dia que seja

uma boa esposa para ele e uma boa
mãe para Francesco.
— Algum dia? — Aloysia olhou
para ela com expressão surpresa.
— Sim — Daisy respondeu sem
hesitar.
Aloysia assentiu com um
movimento de cabeça.
— Só espero que a mulher que ele
escolher seja capaz de corresponder
a seus sentimentos. Slade é como o
pai, o tipo de homem que ama apenas
uma vez na vida.
Daisy se levantou. Não queria
continuar com aquela conversa.
Esboçou um sorriso e se desculpou.
— Preciso ver Francesco.
Sabrina nº 1138
298
Os parentes e amigos não paravam

de chegar. Em pouco tempo o jardim
ficou repleto. Os mais velhos
preferiram o frescor e o conforto da
casa, mas os mais jovens, e princi-
palmente as crianças, que pareciam
centenas, corriam de um lado para o
outro.
O bufê contratado prepararia um
churrasco ao anoitecer, mas os
drinques e salgadinhos já estavam
sendo servidos.
O sol ainda brilhava no céu azul,
sem nuvens. Os convidados vestiam
roupas coloridas. A atmosfera era de
franca alegria e excitação.
Daisy sorria para todos, mas
estava se sentindo muito mal. Seu
299
Projeto Revisoras
coração estava pesado. Por mais que

tentasse não pensar, uma voz não
parava de dizer que assim que a festa
terminasse, ela precisaria tomar uma
decisão. Depois do que houvera, seria
impossível continuar vivendo na
mesma casa que Slade.
Mas, e Francesco? Ela não queria
deixá-lo. O garoto já havia sofrido
demais. Apegara-se a ela. Seria capaz
de abandoná-lo e de ser a responsável
por mais uma decepção em sua vida?
Slade havia contratado um show
com mágicos e palhaços. Daisy estava
tão distraída olhando para Francesco
que havia sido chamado para ajudar
em um truque, que teve um so-
bressalto ao ouvir a voz de Slade as
Sabrina nº 1138
300
suas costas.
— Não sou o bicho-papão. — Slade
zombou. — Não tenha medo.
Não, ele não era. Na verdade,
Slade era tudo que queria em seus
sonhos de adolescente quando ainda
acreditava em amor eterno e
devotado.
— Ele está se divertindo muito —
Daisy murmurou sem olhar para
Slade. Percebia que ele estava se
comportando como se a cena do
escritório não tivesse acontecido.
Mas isso estava além de suas forças.
— E você? — Slade quis saber.
Daisy olhou ao redor. Estavam
completamente sozinhos naquele
instante sob a sombra de uma árvore.
301
Projeto Revisoras
— Eu? — Ela forçou um sorriso. —

Não é minha festa. Não importa se
estou me divertindo ou não.
— Sua vida não tem sido uma
festa há muito tempo, não é?
Ela encolheu os ombros. Estava
ciente de que Slade não era do tipo
que desistia com facilidade quando se
empenhava em conseguir algo. Isso
significava que, mais cedo ou mais
tarde, não escaparia de uma conversa
séria e definitiva. De repente, uma
voz fez com que ambos se virassem.
Era a sogra de Slade. Ela havia
telefonado pela manhã e avisara
Isabella que não poderia comparecer
à festa por não estar se sentindo
bem. Quem a visse naquele momento,
Sabrina nº 1138
302
porém, jamais pensaria que havia algo

de errado com sua saúde.
— Ciao, Cláudia — Slade
cumprimentou e manifestou seu
prazer em recebê-la, da mesma forma
que saudara os outros convidados.-
Daisy gostaria de se desculpar e
se afastar depressa do local, mas
assim que apertou a mão de Cláudia,
Slade a segurou pelo braço.
— Está melhor de sua
indisposição? — ele perguntou à
sogra.
Foi o olhar hostil que alertou
Daisy de que a indisposição fora um
pretexto e que algo de errado estava
acontecendo ou para acontecer.
— Espero não ter sido
303
Projeto Revisoras
inconveniente — a mulher olhou para

Slade com malícia —, mas trouxe
alguém comigo. Você não o conhece,
mas eu não diria o mesmo sobre sua...
sobre a babá de Francesco.
Antes mesmo de ver o
acompanhante de Cláudia, Daisy soube
de quem se tratava. O sangue
congelou em suas veias de tal forma
que não conseguiu falar nem se mover
quando Ronald saiu de trás de uma
árvore e começou a andar em direção
a ela.
Slade enrijeceu a seu lado.
— Que diabos...
Foi preciso Slade ameaçar perder
o controle para Daisy reagir.
— Está tudo bem. Não se
Sabrina nº 1138
304
preocupe.
Ele cerrou os punhos.
— Você tem um minuto para se
retirar de minha propriedade — Slade
ordenou sem preâmbulos. — O mesmo
se aplica a você, Cláudia.
A perplexidade da mulher teria
sido cômica se o assunto não fosse
tão sério. Daisy duvidava que alguém
tivesse tido a coragem de se dirigir a
ela naqueles termos antes.
— Eu só quero trocar algumas
palavras com minha esposa — Ronald
insistiu embora o olhar de Slade o
tivesse feito recuar dois passos.
— Ex-esposa — Slade corrigiu. —
O tempo está passando. Agora você
só tem cinquenta segundos para
305
Projeto Revisoras
desaparecer de minha frente!

— Daisy, por favor, eu preciso
falar com você.
Ao ouvir Ronald suplicar, Daisy
percebeu que estava em suas mãos
salvar a festa de Francesco.
— Deixe-o falar, Slade — Daisy
pediu. — Não podemos permitir que
ele estrague a festa de Francesco.
— Eu preciso lhe falar a sós —
Ronald pediu com uma humildade que
não mais a convencia. O que era um
alívio. Aliás, passado o choque inicial,
Daisy estava descobrindo que a
presença de Ronald não a afetava
como tanto temera. Agora, quando
olhava para Ronald, não via o homem
atraente por quem se apaixonara, mas
Sabrina nº 1138
306
o homem egoísta, vaidoso e cruel que

a traíra. Não conseguia entender
como pudera se apaixonar por ele um
dia. Ou melhor, entendia. Apaixonara-
se pela imagem que fizera dele. Tudo
mudara depois que aprendera a
conhecê-lo. O que realmente não
entendia era a razão por ter fugido
de um encontro.
— Você quer falar com ele a sós?
— Slade perguntou.
— Não — Daisy respondeu, firme
e fria. — Não há nada pessoal a ser
dito entre nós. O que quer que ele
tenha a dizer, pode ser dito diante de
todos.
— Daisy, você sabe o que sinto por
você — Ronald protestou, corado. —
307
Projeto Revisoras
Eu te amo. Sempre te amarei. Precisa

acreditar em mim.
— Então eu sinto muito, Ronald,
porque você não sabe reconhecer
seus próprios sentimentos. Está
enganado. Não me ama e nunca me
amou. Pela simples razão que só é
capaz de amar a si mesmo.
— Dê-me mais uma chance, Daisy.
Eu lhe provarei que está errada.
Cláudia se manteve em silêncio
durante todo o tempo, mas não
desviou os olhos nem sequer uma vez
de Daisy. Algo que não passou
despercebido a ela.
— Não sei qual era sua intenção,
sra. Morosini, nem faço idéia do que
Ronald lhe disse para convencê-la a
Sabrina nº 1138
308
trazê-lo consigo à festa de seu neto,

mas ele não significa mais nada para
mim. Ele simplesmente deixou de
existir em minha vida.
Daisy tornou a se dirigir ao ex-
marido.
— Não lhe darei outra chance,
Ronald. Nem agora nem nunca. Eu o
odiei nos últimos meses de nosso
casamento. E me arrependi de sofrer
por sua causa porque você não
merecia meus sentimentos. Você me
traiu com Susan. Deveria ter ficado
com ela depois do divórcio. Ambos se
merecem.
— Divórcio? — Cláudia repetiu,
atônita. — Ele me disse que você era
sua esposa!
309
Projeto Revisoras
Daisy não suportou mais aquela

cena. Suas pernas estavam tremendo
e seu estômago estava enjoado. Não
queria que Ronald a visse naquele
estado. Ela o surpreendera com sua
firmeza. Não queria colocar tudo a
perder. Era preciso manter a calma
até o fim.
— Então você trouxe esse sujeito
aqui com o único intuito de prejudicar
Daisy? — Slade acusou a sogra. —
Pensou que ela fosse uma esposa
fugitiva? Uma adúltera talvez? Como
pôde, Cláudia? Se não fosse avó de
meu filho, juro que nunca mais a
deixaria colocar os pés em minha
casa. Quanto a você — ele se dirigiu a
Ronald —, seus sessenta segundos
Sabrina nº 1138
310
estão esgotados.
Ronald nem sequer tentou
argumentar. Ao ouvir o lembrete,
virou-se e foi embora.
— Quer que eu me retire, Slade?
— Cláudia perguntou, pálida.
— Isso quem decide é Daisy —
Slade respondeu ao mesmo tempo que
a enlaçava pela cintura.
Daisy não evitou o toque. Assim
como não proibiu a mulher de
participar da festa do neto. Não
queria ser a causa de uma discórdia
na família.
— Fique, sra. Morosini. Francesco
precisa ter toda a família ao seu
redor.
Não era do feitio de Cláudia
311
Projeto Revisoras
Morosini se desculpar, mas sua

atitude ao baixar os olhos e assentir
com a cabeça deu essa mensagem.
— De certa forma foi bom —
Slade murmurou. — A partir de agora
nosso relacionamento será mais fácil.
Mais fácil para ele e para
Francesco, Daisy pensou. Não para
ela, pois seu futuro não estava ligado
ao deles. Sabia disso agora, mais do
que antes.
CAPÍTULO IX
As semanas seguintes foram

difíceis. A vida em Festina Lente em
certos aspectos era mais tranquila
Sabrina nº 1138
312
sem a presença de Slade. Mas a

angústia que oprimia o peito de Daisy
parecia aumentar quando ele não
estava.
Tudo a fazia lembrar Slade
naquela casa. Principalmente
Francesco. Não se passava nem
sequer um minuto sem que ela
pensasse em Slade de uma forma ou
de outra. E quanto mais o tempo
passava, maior era sua certeza de que
precisaria ir embora.
Esse era o grande dilema. Como
deixar o garoto a quem tanto se
afeiçoara? Cada vez que pensava
nisso, obrigava-se a afastar a idéia.
Tivera inúmeras aulas na faculdade
nesse sentido. Mas a teoria não
313
Projeto Revisoras
adiantara. Na prática, ela não tivera

escolha. Francesco era uma criança
adorável. Cuidar dele não era uma
obrigação, mas um prazer. Francesco
era simplesmente um encanto.
Teimoso e desobediente às vezes
como qualquer criança, mas um doce
de criatura.
Naquele momento, ele estava
rolando na grama com Queenie e
Daisy não conseguiu conter um sorriso
apesar de sua melancolia.
O jardim estava repleto de rosas
de todas as cores. O cenário não
poderia ser mais lindo e tranquilo.
Pena que toda aquela tranquilidade
não conseguisse alcançá-la, Daisy
pensou.
Sabrina nº 1138
314
Por mais que repetisse a si mesma

que aquela forma de reagir dava a
vitória a Ronald, não conseguia mudar
seu comportamento. A razão dizia
uma coisa, mas o coração dizia outra.
Ele se recusava a ouvir a lógica. Por
mais que soubesse que Slade era
diferente de Ronald, o medo de
sofrer novamente a impedia de se
abrir para o amor.
Daisy suspirou e fechou os olhos.
Não sentia apetite, não sentia sono à
noite. Estava detestando se sentir
assim, mas não podia evitar.
Pensou no envelope que deixara
sobre a penteadeira na noite anterior.
Ele continha sua carta de demissão e
seria entregue a Slade assim que ele
315
Projeto Revisoras
retornasse de sua viagem a negócios.

Estava disposta a aguardar até que
ele encontrasse outra pessoa para
cuidar de Francesco. Depois disso,
não ficaria naquela casa nem sequer
um minuto mais. Aloysia lhe dissera
que Slade precisava de uma mulher
que o fizesse feliz. E ela sabia que
não era essa mulher. Acabaria
destruindo-o com suas suspeitas, com
sua falta de confiança, com medo que
a história se repetisse.
Daisy deveria ter cochilado no
banco, pois quando se deu conta
Francesco estava perto dela, avisando
que alguém se aproximava.
Ela não conseguiu reconhecer a
pessoa de imediato porque o sol
Sabrina nº 1138
316
incidiu em seus olhos. Quando

percebeu de quem se tratava, deu um
pulo e um grito.
— Mamãe!
— Olá, querida. — A mãe abraçou-
a como se sua presença em Festina
Lente fosse algo natural. Como se ela
não tivesse atravessado meio mundo
para chegar lá.
— Mamãe? — Daisy repetiu,
incrédula. — Veio sozinha?
— Não. Violet e Rose estão vindo
para cá. Com Slade.
— Slade? Ele está aqui?
Daisy não cabia em si de espanto.
O que estava acontecendo? Como sua
mãe e suas irmãs a encontraram? E
por que não lhe deram nem sequer um
317
Projeto Revisoras
telefonema antes avisando?

As perguntas ficariam para
depois. No momento, tudo que
importava era abraçar a mãe e rir e
chorar de alegria por vê-la depois de
um longo tempo.
— Muito prazer. Eu sou
Francesco. É um prazer conhecê-la.
As duas mulheres pararam. Daisy
corou. Aquele era um lembrete de que
ela não havia sido educada,
esquecendo-se de apresentá-lo.
Violet e Rose vieram correndo
para abraçá-la. Slade ficou para trás,
mas ela não pôde deixar de notar seu
sorriso e seu olhar apaixonado.
— Achei que você gostaria de ver
sua família. E que sua mãe gostaria de
Sabrina nº 1138
318
umas férias. — Slade explicou ao se

aproximar. — Quisemos lhe fazer uma
surpresa.
— Mas elas moram nos Estados
Unidos! — Daisy exclamou.
— A idéia foi de Slade — a mãe
informou-a. — Ele insistiu que
viéssemos e fez questão de pagar as
passagens. Mal pudemos acreditar.
Era maravilhoso, realmente, mas...
— Nós ainda não estamos
conseguindo acreditar em nossa sorte
— disse Violet. — Agora poderemos
conhecer a Itália de verdade e não
apenas pelas descrições que nos faz
em suas cartas.
— E também esta vila — disse a
mãe. — Ela é linda.
319
Projeto Revisoras
— Obrigado.
Slade estava sorrindo para sua
mãe. E também para suas irmãs. Sem
que pudesse evitar, Daisy sentiu o
coração pulsar mais depressa por ele.
— Nós voamos juntos para cá —
contou a mãe. — Ele estava em
Washington e nos procurou.
Daisy mal conseguiu olhar para a
mãe enquanto ela falava.
— Obrigada, Slade. Não sei o que
dizer.
Ele fez um movimento com os
ombros.
— A casa é grande e Isabella
adora cozinhar para bastante gente.
É uma italiana genuína. De vez em
quando eu tento agradá-la.
Sabrina nº 1138
320
Não era Isabella que Slade

pretendia agradar e todos eles
sabiam disso. Os sorrisos eram uma
prova. Ele havia seduzido toda sua
família. Era preciso terem uma
conversa o quanto antes!
— Está me dizendo que não existe
nada entre vocês? — Rose perguntou,
incrédula. — Que Slade é um homem
livre e desimpedido?
— Basta, Rose — disse Lily
Summers à filha do meio.
— O que foi que eu fiz? — a
garota protestou.
— Sei o que está se passando em
sua mente. Deveria se envergonhar! E
Dean? Já o esqueceu?
Dean era o namorado de Rose
321
Projeto Revisoras
havia dezoito meses. Da última vez

que Rose lhe escrevera, eles estavam
pensando em marcar o noivado para a
época do Natal.
— Bem, eu não tenho nenhum
Dean — disse Violet e piscou para
Daisy pelas costas da mãe.
— Ora, menina! Você acaba de
entrar na faculdade. Precisa se
concentrar nos estudos.
Daisy sorriu. Como era bom ter
sua família junto de si. Slade se
encarregara de Francesco para que
ela pudesse se reunir a elas nos
primeiros momentos. Slade era mais
do que um patrão, era mais do que um
amigo.
Não acreditava ter conseguido
Sabrina nº 1138
322
convencer sua mãe e suas irmãs de

que não havia nada entre eles.
Principalmente sua mãe. E não tinha
dúvidas de que ele a enfeitiçara por
completo.
A conversa não podia ser adiada.
Desculpou-se no mesmo instante e foi
procurá-lo.
— Por que está me olhando desse
jeito? — Slade perguntou.
Não foi preciso procurá-lo. Do
alto da escada, Daisy o viu sentado na
sala, lendo o jornal, elegantíssimo em
um terno cinza.
— Onde está Francesco?
— Tomando chá com Isabella e
Mário. Mas você não respondeu. Por
que está me olhando desse jeito?
323
Projeto Revisoras
— Você sabe o porquê. Não

deveria tê-las trazido para cá. Foi um
gesto amável, é claro. Mas as
despesas com as passagens... Você não
devia ter feito isso.
— Discordo de você.
O tom de voz dizia que a conversa
estava terminada. Para completar,
Slade se levantou e começou a se
afastar. Como Ronald fizera. Na hora
que ela mais precisara.
— Não posso mais continuar aqui
— disse antes que perdesse a
coragem. — Por favor, tente
entender. Estou lhe entregando,
neste momento, meu pedido de
demissão.
Slade pestanejou como se tivesse
Sabrina nº 1138
324
levado um golpe. Ela procurou ser

mais gentil.
— Ficarei até que encontre
alguém para me substituir. Não se
preocupe.
— Tomou essa decisão só porque
eu decidi lhe fazer uma surpresa? Só
porque trouxe sua mãe e suas irmãs?
— Slade indagou, incrédulo.
— Claro que não!
— Mas é o que parece.
— Sinto muito se lhe dei a
impressão errada. — Daisy apertou os
lábios. Fazia duas semanas que não o
via. Se pudesse ceder aos seus
anseios, se atiraria nos braços dele e
não o deixaria nunca. — Mas como sua
empregada, tenho o direito de
325
Projeto Revisoras
desistir do emprego e de ir embora

assim que cumprir meu aviso prévio.
Se faz questão de saber, eu decidi
redigir meu pedido de demissão
ontem à noite para lhe entregar assim
que voltasse.
— Não lhe importa o que eu sinto
a respeito?
— Não — Daisy respondeu. Não
sabia de onde estava tirando forças
para sustentar aquela posição quando
seus sentimentos clamavam pelo
contrário. — Não importa.
— Você me ama, Daisy?
Ela fingiu não ter escutado.
Precisava mentir e tinha medo de que
seus olhos a traíssem.
— Você me ama? — ele insistiu.
Sabrina nº 1138
326
— Não.
Uma pequena palavra que continha
o poder de destruição de uma bomba
nuclear. Slade empalideceu.
— Não acredito em você.
Incapaz de sustentar aquele olhar
ferido, Daisy baixou a cabeça.
— Sinto muito.
Ele demorou um longo tempo para
responder. Quando o fez, sua voz
soou fria.
— Tudo bem quanto a mim. Mas e
Francesco? Francesco é importante,
você não acha?
— Lógico que é — Daisy se
apressou a concordar.
— Colocarei um anúncio no jornal
imediatamente em busca de alguém
327
Projeto Revisoras
para substituí-la. Mas até que

encontre uma pessoa qualificada,
espero que tenha paciência. Não
quero que Francesco sofra mais do
que o estritamente necessário.
— Sim, é claro — Daisy se
apressou a concordar.
Slade apertou os olhos.
— Prefiro que Francesco não saiba
sobre sua decisão de nos deixar até
que se acostume com a nova babá. A
substituição será gradativa como
aconteceu com você e Angélica.
Daisy assentiu com um gesto de
cabeça. Slade encarou-a por um
instante. Quando começou a se
afastar, Daisy chamou-o.
— Eu o reembolsarei pelas
Sabrina nº 1138
328
despesas que teve com minha mãe e

com minhas irmãs. E elas voltarão
para casa hoje mesmo, é claro.
— Você está me ofendendo! —
Slade protestou. — Elas são minhas
hóspedes. Eu as convidei para
passarem duas semanas aqui e elas
não irão embora nem sequer um dia
antes do prazo combinado. Quando às
despesas, não quero mais ouvi-la falar
nesse assunto. A idéia de convidá-las
foi minha, não sua. Quanto a minha
presença, não tema. Estarei partindo
para Geneva amanhã de manhã e
ficarei fora por três ou quatro
semanas.
Aquilo estava se tornando um
pesadelo...
329
Projeto Revisoras
— Slade, por favor!

— Por favor, digo eu! Se tornar a
dizer que sente muito, não
responderei por mim — Slade
interrompeu-a, brusco. Mas bastou
notar a tristeza nos olhos de Daisy
para que ele recuperasse o controle.
— Você foi honesta comigo e não há o
que fazer. Acabou. — Antes que Daisy
pudesse dizer algo, Slade continuou
como se nada de pessoal houvesse
acontecido entre eles. — Isabella se
ofereceu para colocar Francesco na
cama enquanto tomamos um drinque
com sua família. Em seguida ela
descerá e servirá o jantar. Você
poderia subir e trocar de roupa, por
favor? Assim que sua mãe e suas
Sabrina nº 1138
330
irmãs estiverem prontas, leve-as à

sala de estar.
— Está bem.
Por que ela fora escolher aquela
hora para esclarecer a situação?
Como pudera ser tão insensível? E
agora? O que deveria fazer?
— Slade? Nós precisamos
conversar. Você precisa entender...
— Não, Daisy. — Ele começou a
andar em direção ao escritório, mas
no meio do caminho, virou-se. — Não
temos mais nada para conversar. Você
foi clara o suficiente.
Daisy sentiu o chão desaparecer
sob seus pés. A visão embaciou. Mas o
clique da porta ao ser fechada a fez
despertar para a realidade. Para o
331
Projeto Revisoras
vazio. Para a escuridão. Slade estava

perdido para ela, assim como qualquer
esperança de felicidade no futuro.
Estava tudo acabado. Ela havia
conseguido o que queria. Slade não
tentaria demovê-la de sua decisão.
Não mais. Uma sensação de ter
cometido o maior erro de sua vida a
invadiu naquele instante. Repeliu-a.
Não podia fraquejar. De qualquer
modo, agora era tarde demais. Fizera
o que era preciso. A decisão estava
tomada e era irrevogável.
— O jantar estava delicioso,
Slade. Isabella é uma cozinheira de
mão-cheia. Será um prazer passar
duas semanas aqui. Em todos os
sentidos — Rose acrescentou com um
Sabrina nº 1138
332
sorriso que indicava que Dean se

encontrava completamente ausente
de seus pensamentos. Quatro anos
mais nova do que Daisy, Rose havia se
tornado uma jovem bonita e adorável.
Sem problemas e sem lembranças
amargas que a atormentassem. Ela
era tudo que um homem poderia
desejar.
Daisy obrigou-se a não sentir
ciúme da irmã. O simples pensamento
a envergonhava. Amava-a. Rose não
tinha culpa por ela não ser mais capaz
de sentir felicidade.
Desviou o olhar de Rose por um
instante e o que viu fez o ar lhe
faltar. Slade não estava olhando para
sua irmã, mas para ela. E daquele
333
Projeto Revisoras
mesmo jeito horrível de algumas

horas antes.
Virou-se imediatamente para
Violet e tentou se comportar como se
tudo estivesse bem entre eles, mas só
ela sabia quanto o esforço estava lhe
custando.
O jantar havia sido servido na sala
que era usada apenas quando Slade
recebia visitas. O brilho da prataria e
dos cristais sobre a fina toalha de
damasco era um lembrete constante
da gentileza de que Slade era capaz
não só para agradá-la, como também
as pessoas que lhe eram caras.
Sua mãe estava fascinada por ele.
Fazia muito tempo que não a via tão
contente e descontraída.
Sabrina nº 1138
334
Suas irmãs estavam se divertindo

como nunca antes. Quando Slade
propôs que se dirigissem à sala de
estar para ouvirem música, elas
aceitaram de pronto.
Quando cerca de uma ou duas
horas depois, Slade tirou o paletó e a
gravata e desabotoou alguns botões
da camisa, Daisy sentiu uma onda de
calor lhe subir ao rosto.
Nunca havia imaginado que fosse
capaz de sentir ciúme de uma irmã,
mas no momento que Rose pediu que
Slade dançasse com ela, Daisy sentiu
ímpetos de se colocar entre eles.
Ainda mais. De empurrar sua irmã de
volta para o sofá e de proibir que
continuasse a beber o vinho excelente
335
Projeto Revisoras
que Slade abrira especialmente para

elas.
O fato de Slade não demonstrar
entusiasmo para atender o pedido não
vinha ao caso. Precisava se afastar
daquele cenário antes que perdesse o
controle.
— Peço que me desculpem, mas
estou exausta. Vou subir para meu
quarto. Boa noite a todos.
Boa noite! Cada minuto daquela
noite havia sido um tormento para ela!
Estava se sentindo só e abandonada.
E ridícula. Slade tinha o direito de
dançar com qualquer mulher que
quisesse. Ele era livre. E Rose
também. Se havia uma culpada pela
situação, era ela, Daisy. Mais ninguém.
Sabrina nº 1138
336
Entrou em seu quarto e fechou a

porta, mas não acendeu a luz. Não
sentia sono. Ao contrário do que
dissera, sua mente estava alerta.
Estava sendo uma covarde. Não
tinha coragem para fazer o que seu
coração mandava. Entre se entregar
novamente a um relacionamento que
poderia fazê-la sofrer, e viver
sozinha e solitária, mas em controle
de si própria, seria preferível o
controle.
Mas, por que, então, estava se
sentindo tão deprimida?
Não saberia dizer por quanto
tempo ficou sentada na sala, imersa
em sombras. Só voltou a si quando
ouviu uma leve batida à porta.
337
Projeto Revisoras
Levantou-se de imediato. Ninguém

batia à porta de uma pessoa no meio
da noite a não ser por um bom motivo.
Sua mãe ou uma de suas irmãs deveria
estar doente. Não se tratava de
Francesco. A babá eletrônica já a
teria avisado se esse fosse o caso.
No instante, porém, que sua mão
tocou a maçaneta, a intuição lhe disse
que não era sua mãe nem suas irmãs.
— Daisy? Posso entrar por um
momento?
Daisy precisou de um minuto para
abrir a porta de tanto que seu
coração batia.
— É tarde, Slade. — Tentou
ganhar tempo. Ouvira-o dizer a sua
mãe que partiria antes das oito horas.
Sabrina nº 1138
338
Talvez pudesse fugir a uma nova

conversa. — Amanhã nos falaremos.
— É importante. Eu quero...
— Por favor! — ela o interrompeu.
Precisava daquelas semanas de prazo
para ordenar seus pensamentos.
Slade fitou-a por um longo
momento.
— Está bem. Talvez seja melhor
esperarmos até amanhã. Descanse.
Você está precisando.
Ele deu um passo e ela não
conseguiu fechar a porta. De repente,
ele se virou e voltou. Não houve
tempo para recuar. Slade a tomou nos
braços e beijou-a sem esperar por
seu consentimento.
Tentou empurrá-lo. Debateu-se
339
Projeto Revisoras
por alguns instantes. Mas o desejo foi

mais forte e ela o enlaçou pelo
pescoço.
As carícias de Slade não foram
iguais às dos encontros anteriores.
Não havia controle, nem delicadeza.
Uma voz, no fundo de sua consciência,
avisou-a que Slade não pararia, se ela
não o fizesse parar.
E ela não queria fazê-lo parar.
Seria uma noite apenas. Por que
negar-se uma lembrança de amor que
poderia levar consigo pelo resto de
sua vida?
Slade estava gemendo de paixão.
Ou seria ela? Estavam tão juntos um
do outro que não dava para saber.
A razão a havia abandonado. Deu
Sabrina nº 1138
340
um passo para trás. Depois outro.

Estava convidando-o para entrar em
seu quarto, sem palavras.
— Quero você, Slade — Daisy
murmurou. — Quero levar isto comigo
quando me for. Abrace-me, faça amor
comigo...
Os lábios de Slade pareceram se
transformar em pedra sobre os dela.
Suas mãos pararam de acariciá-la.
— Levar isto com você? — ele
perguntou, rouco.
Um arrepio percorreu as costas
de Daisy. Ela abriu os olhos e quase
tornou a fechá-los quando viu a
expressão com que Slade a fitava.
Nunca vira alguém mais furioso
em sua vida. Slade largou-a
341
Projeto Revisoras
abruptamente.
— Para você, seria apenas uma
noite, não é?
— Eu... Você sabe como me sinto
— Daisy tentou se defender.
Ele encarou-a sem dizer nada por
um longo minuto. Quando tornou a
falar, não havia raiva em sua voz, mas
uma frieza de gelo.
— Não quero seus favores, Daisy.
Mas também não quero ser usado.
O choque a fez empalidecer.
— Não era essa minha intenção.
— Não? Como me explica, então,
sua decisão de tornar nosso
relacionamento uma aventura de uma
só noite? Não era isso que eu queria
de você. Para esse tipo de relação,
Sabrina nº 1138
342
bastaria eu procurar uma mulher de

programa.
Ela queria explicar, mas como?
Nem ela mesma conseguia entender
seus motivos.
— Boa noite, Daisy.
Slade se despediu com voz
novamente calma e suave. Uma
vontade imensa de chorar a invadiu,
mas ela se conteve.
Slade saiu do quarto e ela
permaneceu onde estava por um longo
tempo. Não poderia se mover mesmo
que quisesse. Suas pernas não a
obedeciam.
O que Slade estaria pensando a
seu respeito?
Dirigiu-se lentamente ao quarto e
343
Projeto Revisoras
despiu-se como se fosse um

autômato. Apesar do avançado da
hora, decidiu tomar um banho. Talvez
a água quente a relaxasse e a fizesse
parar de tremer.
Mas não adiantou. Ainda
permaneceu um longo tempo
acordada, sob os lençóis, até que o
sono a vencesse.
CAPÍTULO X
Foi a claridade do sol sobre seu

rosto que a acordou às onze horas na
manhã seguinte.
Algo dizia a Daisy que era tarde e
que deveria se levantar, mas seu
Sabrina nº 1138
344
subconsciente insistia que

continuasse na cama, protegida sob as
cobertas.
Fizera papel de tola na noite
anterior. Não sabia se algum dia
encontraria coragem para olhar
novamente para Slade depois de seu
comportamento.
Pouco a pouco, abriu os olhos e se
sentou na cama. Abraçou os joelhos e
tornou a fechar os olhos. Atirara-se
nos braços de Slade, sem mais nem
menos, e ele se recusara a aceitar sua
oferta.
De repente, algo a fez olhar para
a mesa de cabeceira. Deu um pulo de
susto. Onze e quinze! Levantava-se
sempre às sete horas para estar
345
Projeto Revisoras
pronta para tomar o café com

Francesco às oito! Além disso, sua
mãe e suas irmãs estavam hospedadas
ali. Como pudera esquecer? Não só
delas, mas também do despertador? E
por que ninguém a acordara?
Afinal, onde estavam todos?
Levantou-se com a rapidez de um
míssil. Onde estava Francesco? Por
que a casa estava tão silenciosa?
Estava se vestindo quando um
pensamento a acalmou em parte. A
essa altura, Slade já havia partido.
Ao alívio mesclou-se a dor e a
saudade. Nunca se sentira tão
dividida em suas emoções.
Atrasada como estava, Daisy não
aplicou nem sequer um batom nos
Sabrina nº 1138
346
lábios. Escovou rapidamente os

cabelos e prendeu-os em um rabo-de-
cavalo.
— Por fim! Se fosse inverno,
pensaria que você havia decidido
hibernar.
— Slade! — Daisy se agarrou ao
corrimão para não cair.
— Pensei que você estivesse
voando para Geneva. Não disse que
sairia cedo?
— Mudei de idéia.
— Onde estão minha mãe e minhas
irmãs?
— Mário e Isabella as levaram
juntamente com Francesco para um
tour pela cidade e para um piquenique
no campo. Pelo tamanho do cesto que
347
Projeto Revisoras
Isabella preparou, não acredito que

voltem antes do anoitecer.
— Mas é o primeiro dia delas aqui!
— Daisy protestou. — E eu não as
vejo há séculos! Por que elas... —
Daisy parou de falar ao ler a
expressão nos olhos de Slade. — Você
inventou esse piquenique, não é? E não
deixou que me acordassem?
— Eu apenas sugeri que
aproveitassem este belo dia de sol e a
oportunidade de conhecerem
Francesco melhor. Elas aceitaram com
entusiasmo.
— Eu também teria aceitado! —
Daisy protestou.
— Quer saber por que fiz isso?
— Não, mas tenho certeza de que
Sabrina nº 1138
348
você fará questão de dizer — Daisy

respondeu, tensa.
Slade aprendera a conhecer
Daisy. Sempre que estava perturbada,
ela esfregava a ponta do nariz. Ao vê-
la fazer isso naquele instante, seu
coração se encheu de ternura.
— Eu faço — ele confirmou. —
Mas antes você precisa comer. Não se
alimentou direito ontem à noite. Pensa
que não percebi que mal tocou no
jantar?
Daisy pestanejou. Ainda não
estava conseguindo acreditar que
Slade tivesse desistido da viagem e
que dera um jeito para ficar a sós
com ela.
— O que eu como ou deixo de
349
Projeto Revisoras
comer não é de sua conta! —

respondeu, zangada. Mas se
arrependeu em seguida. Precisava se
acalmar. Não podia tratar Slade
daquela forma indelicada. — Tenho um
milhão de coisas para fazer. E você
também, com certeza. A que horas
sairá seu avião?
— Esqueça meu avião e trate de
comer. Não é um pedido. É uma
ordem.
— Está bem. Se me der licença,
eu...
— Eu preparei um pequeno almoço
para nós
Slade a interrompeu.
— Você? — Daisy perguntou,
surpresa.
Sabrina nº 1138
350
O sorriso que Slade lhe deu a

deixou sem fôlego.
— Venha comigo. — Ele a puxou
pela mão e a levou não à cozinha, mas
ao quiosque no jardim, onde uma mesa
muito bonita os esperava. Em seguida
a fez sentar e pediu que aguardasse
um minuto.
Quando Slade voltou, trazia uma
bandeja com uma garrafa de vinho,
um omelete de queijo e presunto, uma
tigela com espaguete, outra com
salada verde e a última com fatias de
carne assada.
— Não espera que eu acredite que
você preparou tudo isso — Daisy
murmurou.
— Você ainda não sabe de que sou
351
Projeto Revisoras
capaz — Slade respondeu em tom

misterioso.
Daisy descobriu, assim que
começou a comer, que estava com um
grande apetite. Talvez porque a
comida estava deliciosa. Ou, talvez,
porque Slade não poderia ser mais
gentil e atencioso.
Quem os visse, almoçando ao ar
livre e bebendo vinho, pensaria que
eram um casal em lua-de-mel.
Daisy obrigou-se a afugentar
aquele pensamento. No mesmo
instante, o mal-estar tornou a se
apoderar de sua vontade. Havia algo
na voz de Slade que lhe dizia que ele
tinha um plano e que seus
pensamentos nada tinham a ver com
Sabrina nº 1138
352
as palavras que estavam trocando.

Estavam terminando o café
quando Daisy resolveu encerrar o
encontro.
— Obrigada pelo almoço.
— Não quero falar sobre isso
agora, Slade. Estava ótimo. A que
horas será seu voo?
Ele estendeu a mão e segurou a
dela por cima da mesa.
— Eu fui ao seu quarto ontem à
noite para lhe fazer um pedido.
— Não, Slade — Daisy implorou.
— Eu preciso saber, Daisy. Quem
é Jenny?
Daisy sentiu que empalidecia. Não
se dera conta de ter falado o nome
de sua filha.
353
Projeto Revisoras
— Quem é Jenny? — Slade

repetiu. — A mulher com quem seu
marido a traiu?
— Como soube? — Daisy
perguntou com um fio de voz.
— Ninguém me falou sobre ela —
Slade respondeu. — Esse é o
problema. Ontem à noite, quando você
se recolheu, Rose perguntou a sua
mãe se havia algo de errado. Eu a ouvi
mencionar esse nome. Quando quis
saber quem ela era, as três se
fecharam.
Daisy não queria falar, mas Slade
insistiu.
— Quem é Jenny? Por que ela
ainda é tão importante em sua vida?
Você disse que não ama mais seu ex-
Sabrina nº 1138
354
marido.
— E verdade. Não amo Ronald.
— Então por que não desabafa
comigo?
— Não posso.
— Nesse caso, sou obrigado a
concordar com sua família. Jenny é a
chave de seu problema. Enquanto não
partilhar com alguém esse segredo,
não conseguirá prosseguir com sua
vida.
Daisy rezou mentalmente para que
Slade desistisse de pressioná-la. Sua
prece não foi ouvida.
— Fale comigo, Daisy. Não sairei
daqui enquanto não tiver uma
resposta. E não tente mentir porque
eu saberei.
355
Projeto Revisoras
Ela engoliu em seco. Slade estava

falando sério. Nunca vira alguém falar
mais sério.
— Aprendi a conhecê-la, Daisy, e
depois do que houve ontem à noite sei
que é amor o que sente por mim. Não
pode esperar que eu desista de você
só porque uma tal de Jenny...
— Não fale assim! — Daisy o
interrompeu, mas não pôde continuar
porque os soluços não permitiram.
Slade a tomou nos braços sem
dizer nada. Ela tentou se
desvencilhar. Quando percebeu que
sua luta era inútil, abandonou-se ao
pranto até esgotar suas forças.
— Jenny era minha filha — disse
por fim e então contou sobre o
Sabrina nº 1138
356
choque que a fizera perdê-la logo

depois de receber as fotos que eram
a prova irrefutável da traição de seu
marido.
Slade esperou que ela terminasse
de falar. Abraçou-a com força e
depois a fez encará-lo.
— Não sei o que dizer, minha
querida. Eu te amo. Gostaria de poder
apagar o que aconteceu. Eu te amo
demais. Deixe-me ajudá-la a superar
o que houve. Nós poderemos ter
outros bebês.
— Não! Por favor não diga mais
nada! Eu não sou capaz. Não pude
salvá-la.
Slade calou-a com um beijo.
Quando tornaram a olhar um para o
357
Projeto Revisoras
outro, Daisy percebeu o quanto ele

estava emocionado.
— Você não teve culpa — Slade
murmurou. — Acredite em mim.
Acredite em si mesma. Você teria
dado sua vida para salvá-la, se
pudesse. Você não fez nada de
errado.
— Os médicos disseram que foi
meu estado emocional que provocou a
interrupção da gravidez. Entende
agora?
— O que eu entendo é que você
está se punindo por algo que não
estava em suas mãos resolver. Talvez
o problema tivesse acontecido mesmo
que você continuasse casada com
aquele homem. Talvez estivesse
Sabrina nº 1138
358
escrito. Ninguém pode saber. Mas se

alguém fosse culpado, seria seu
marido, não você. Não pode se afastar
do mundo para se punir de uma falta
que não cometeu.
— Você não entende.
— Eu entendo. Minha vida não tem
sido fácil. Eu também tive dificuldade
em superar meus problemas. Também
me senti culpado por não ter amado
minha esposa. Lutei muito para me
recuperar de sua morte, mas consegui
e você também poderá. Eu a farei
admitir que não teve culpa mesmo que
tenha de passar o resto de minha vida
repetindo isso.
Daisy negou com um gesto de
cabeça. Estava chorando outra vez.
359
Projeto Revisoras
— Não posso, Slade. Não posso.

Ele ergueu-lhe gentilmente o
queixo.
— Você acredita que estaria
traindo Jenny se voltasse a ser feliz.
Não consegue enxergar que foi tão
inocente quanto ela.
Daisy queria acreditar nas
palavras de Slade mais do que
qualquer coisa, mas de que jeito? Os
soluços sacudiam-lhe o corpo.
Slade a fez deitar a cabeça em
seu peito e esperou que se acalmasse.
Depois tornou a encará-la.
— Não permitirei que estrague
nossas vidas nem a de Francesco. Não
deixarei que fuja de nós. Nós
superaremos isso juntos.
Sabrina nº 1138
360
— Não, não é justo. — Ela disse

sem conseguir controlar as lágrimas.
— Não tenho forças para tentar
confiar em você, para ter esperança...
— Então eu terei esperança por
nós dois. — Slade a beijou nos lábios.
— Não deixarei que se afaste. Nem
agora nem nunca. Não tenho pressa.
Mais cedo ou mais tarde você será
minha esposa. E nós seremos felizes.
Prometo.
— Não posso...
— E esta foi a última vez que você
disse isso.
— Sua vida será horrível ao meu
lado.
— Prefiro ser infeliz a seu lado do
que feliz com outra mulher.
361
Projeto Revisoras
O modo como Slade respondeu a

fez sorrir apesar de tudo. Ele a fitou
com profunda emoção.
— Será sempre assim, Daisy. Eu a
farei sorrir sempre. Eu a compensarei
por tudo que já sofreu.
Slade abraçou-a com ímpeto.
— Diga que será minha esposa.
Diga sim.
Era impossível raciocinar nos
braços de Slade, sentindo seu
perfume e seu calor. Confiar nele e
em seu amor era o que mais desejava
no mundo.
— Conheço-a melhor do que você
conhece a si mesma, Daisy — Slade
continuou. — Você nasceu para mim.
Você nasceu para ser feliz comigo.
Sabrina nº 1138
362
Isso não significa que deverá amar

Jenny menos do que ama. Ela vive em
seu coração assim como espero que eu
e Francesco e os outros filhos que
teremos também viverão.
Os olhos de Daisy estavam turvos
de emoção.
— Preciso de você. Não posso
continuar vivendo sem seu amor.
Estive esperando-a durante toda
minha vida. Não suportaria se me
deixasse.
Foi naquele exato momento que a
esperança voltou realmente ao
coração de Daisy.
— Você me ama? — Slade
perguntou baixinho.
Incapaz de responder, Daisy fez
363
Projeto Revisoras
que sim com a cabeça.

— Você quer casar comigo?
— Sim — ela respondeu por fim. —
Sim, eu quero casar com você.
Ela teria dado essa mesma
resposta quantas vezes Slade
quisesse ouvi-la. Mas, de alguma
forma, ele preferiu a confirmação
com beijos. Muitos beijos.
EPÍLOGO
Slade e Daisy casaram naquele

outono. Pouco a pouco, no decorrer
dos meses e anos, a promessa que ele
fizera foi inteiramente cumprida. A
recuperação de Daisy não aconteceu
Sabrina nº 1138
364
da noite para o dia, mas a chegada de

um irmãozinho para Francesco, três
anos depois, fez parte do processo.
Depois de Giuseppe, veio Marie. E
depois de Marie as gêmeas, Liliana e
Catherine.
A vida tornou-se maravilhosa para
Daisy. Havia momentos que ela não
conseguia acreditar em tanta
felicidade.
— Mal posso crer que Francesco
tenha entrado na faculdade — Daisy
disse a Slade enquanto olhava para os
filhos que brincavam na piscina. — As
crianças sentirão falta dele.
Slade sorriu para ela e beijou-a.
Nunca se cansava de olhar para Daisy
e de beijá-la.
365
Projeto Revisoras
— Chegou a hora de Francesco

bater as asas — Slade murmurou. —
As crianças terão uma à outra.
E ela tinha Slade.
— Você é meu sol, minha lua, meu
tudo, meu amor.
Os olhos de Slade estavam
brilhando de emoção.
— Amor com amor se paga. Não é
o que dizem? Eu te amei tanto que
meu amor acabou sendo
correspondido. Você é o ar que
respiro. Você é...
— Sua esposa, sua amiga, sua
amante, sua mãe — Daisy concluiu a
frase, rindo. — Já sei.
Slade piscou.
— Por falar em amante, que acha
Sabrina nº 1138
366
de irmos para o quarto? Francesco

está cuidando muito bem das
crianças.
Daisy se levantou. Seu sorriso
dizia tudo.
367
Projeto Revisoras
HELEN BROOKS mora em

Northamptonshire, Inglaterra, é casada
e tem três filhos. Como cristã devotada,
dona de casa e mãe, seu tempo livre é
escasso, mas Helen consegue encontrar
algumas horas para se dedicar a seus
hobbies que incluem leitura, natação,
jardinagem e caminhadas diárias com
seus dois cachorros. Seu sonho de
tornar-se escritora transformou-se em
realidade quando Helen, aos quarenta
anos, enviou à editora Mills & Boon o
fruto de seu esforço.
Sabrina nº 1138
368

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Sabrina nº 1138

Uma amante perfeita...

anos em troca de um ótimo salário,

ROMANCES NOVA CULTURAL

Todos os personagens desta obra são

Impressão e acabamento: Gráfica

Daisy respirou fundo e soltou

Deu uma última olhada ao vidro. A

valeria à pena se dar ao trabalho de

família? Ou algum amigo? A moça

— Não é o caso desta jovem

Era uma enfermeira. Ela estava se

bebida mais deliciosa antes.

enfermeira ajeitou os lençóis e

— Sim, você está internada em um

dado pela presença do homem.

colocou à cabeceira da cama. Em

Enquanto Daisy tentava se

condições de lhe devolver o dinheiro

— O que isso importa?

Esquecida momentaneamente das

A expressão de medo deveria ter

atrasado. Tenha uma boa noite, Daisy.

cogumelos ao molho de vinho branco e

sorriso espontâneo que se

certa de que amanhã poderei ir para

enganado. Se pudesse escolher, ela

o quanto antes e...

que dissesse àquela enfermeira!

— Talvez você possa me ajudar a

continuou antes que Daisy pudesse

casado. Uma grande imprudência de

filho nasceu, a perspectiva de viver

sogra passa a maior parte do tempo

mês. Algo que está me parecendo

— Segundo a enfermeira, você não

deveria estar sonhando.

me reembolsar pelas despesas provam

experiência, sem tentar? Faríamos um

troca de seus serviços, ela se

com sua segurança, aviso-a que terá

ninguém. Se tivesse conseguido o

recusar em definitivo como gostaria.

deixar que Daisy desaparecesse de

saberia o que responder. Aliás, não

opinião já estava formada sobre

nenhuma probabilidade de deixar a

Procure levar em consideração,

acompanhou porque estava namorando

— Sempre estou ocupado. Por

Slade olhou mais uma vez para

Daisy sentia vontade de gritar de

aprendido que os homens eram

enfermeira, ela teria caído.

toque. Ao ouvir sua voz, Daisy sentiu

colapso nervoso. A propósito, como

Daisy ouviu um soluço do outro

— Claro que sim. Ele sabe que

— Eu agradeço, Stephanie, mas

não era a única a saber seu endereço.

chamado certamente constaria do

entrou sem esperar pelo

inesperada presença provocara.

tocasse os cabelos. Muito menos que