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Amar outra vez

Knight to the rescue


Miranda Lee

Um conquistador preso na própria armadilha

Audrey se considerava feia, sem nenhum atrativo que justificasse ser amada,
até que surgiu em sua vida o homem que podia ser considerado o cavaleiro dos
sonhos de toda garota: Elliot Knight. Sofisticado e experiente, um Don Juan por
profissão, ele se propôs devolver-lhe a auto-estima e o desejo de amar e ser
amada. A aluna superou o mestre, fazendo-o se apaixonar perdidamente por ela.
Elliot não quis reconhecer sua derrota: a palavra amor havia sido arriscada de
seu dicionário...

Digitalização: Carla Matos


Revisão: Gláucia
Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

Copyright © 1992 by Miranda Lee

Publicado originalmente em 1992 pela


Mills & Boon Ltda., Londres, Inglaterra

Todos os direitos reservados, inclusive o


direito de reprodução total ou parcial, sob qualquer forma.

Esta edição é publicada por acordo com a


Mills & Boon Ltda.

Todos os personagens desta obra são fictícios.


Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas
terá sido mera coincidência.

Título original: Knight lo the rescue

Tradução: Clyara Sagan

EDITORA NOVA CULTURAL LTDA.


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Esta obra foi composta na Editora Nova Cultural Ltda.

Impressão e acabamento: Gráfica Círculo

Foto de capa: RJB

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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

CAPÍTULO I

Audrey aguardava Russell do lado de fora da cafeteria. Ele estava atrasado,


como sempre. "Não precisarei mais preocupar-me com seus atrasos depois desse
encontro", ela consolou-se. Russell sairia de sua vida pessoal em definitivo.
"Como pude me envolver com tão óbvio mulherengo?" ela se perguntava.
Mas era fácil a resposta. Bastava reparar na maneira confiante como descia
a rua em sua direção. O terno cinza de trabalho realçava seu aspecto sedutor.
Românticos olhos azuis e cabelos loiros camuflavam um excelente vendedor de
conversa fiada.
Quando havia começado a trabalhar na empresa Modernos Equipamentos
para Escritórios, como representante, alguns meses atrás, havia se tornado, logo,
um favorito entre as moças do escritório. Mas, em pouco tempo, começara a
privilegiá-la entre as demais.
Ao se ver centro de atenções, de início, não ligara. Afinal de contas, havia
tantas moças mais atraentes. Mas ele parecia sincero. E, é claro, ela ficara
lisonjeada. Que ingênua havia sido!
Como detestava sua aparência! A pele muito clara, os olhos castanhos de
corça assustada, a boquinha em forma de coração, como a de uma criança.
Quanto aos cabelos... Haviam sido sempre um desastre. Nascera com belos
cachos castanhos. Mas, no momento, apresentavam um tom vinho e um forte
permanente produzira um emaranhado de anéis sem forma especial ao redor da
cabeça. Seguira os conselhos de Lavínia, que lhe garantira serem a melhor
solução. Audrey não tinha muita certeza. Tampouco sentia-se confortável no
vestido de lã vermelha que a madrasta lhe dera, insistindo que o vermelho a
favorecia. Nenhuma cor parecia ser a sua cor!
Estremecendo, voltou a atenção para Russell, que chegara afinal, exibindo
um amplo sorriso de desculpas.
— Desculpe-me o atraso, querida — ele falou num tom adulador,
inclinando-se para beijá-la na face.
Como havia se sentido feliz a primeira vez em que ele a chamara desta
maneira! Neste momento, a palavra lhe pesava como um punhal traiçoeiro no
coração.
— Ah, Ah — Russell tentava rir ao perceber seu rosto pálido. — Devo ter
feito algo muito errado para provocar uma expressão tão reprovadora. Você me
chamou aqui, bem no meio da tarde, para puxar minhas orelhas?
"Que estranho", Audrey refletiu. ―De repente não o acho mais bonito, ou
charmoso‖.
— Meia hora de atraso, Russell — ela falou com frieza —, não se pode
considerar pouco. Pedi-lhe para me encontrar às três. Já são quase três e meia.
Mas ele parecia não se importar com a irritação de Audrey. Acreditava que
bastava sorrir para que ela recuperasse o bom humor. Irreverente, indagou:
— Mas, eu mereço a espera, não é?
A jovem retraiu-se. Não podia acreditar que já se deixara levar por palavras
desse tipo. Como podia ler sido tão tola? Puro desespero, ela decidiu com

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amargura.
— É melhor entrarmos para conversar — ela convidou num loin áspero.
— Claro. Pedirei um capuccino para nós dois.
Tratava-se de uma cafeteria típica de Sydney. A sala retangular
apresentava, de um lado, um longo e brilhante balcão e, do outro, mesas
separadas por divisórias.
Audrey havia pensado que a essa hora o local estaria vazio, oferecendo a
chance de alguma privacidade. Mas, não era o caso, pois quase todos os
reservados estavam ocupados. Apenas os dois últimos estavam vazios.
Ela decidiu-se pelo mais afastado, consciente da tensão nervosa que
aumentava a cada momento. Mas, a penúltima mesa Sambem estava ocupada,
por um homem inclinado sobre um jornal. Ele a olhou de relance quando passou,
mas voltou logo a sua leitura.
Audrey sentou-se com um suspiro cansado, observando, infeliz, Russell
flertar com a garçonete.
Ele acomodou-se no assento cm frente a ela, e indagou:
— Bem? Vai satisfazer minha curiosidade e contar-me a razão deste
encontro?
— Sim — ela aquiesceu tensa, respirando com dificuldade. O coração
parecia querer saltar do peito e sua voz saía estridente e tremula. — Diane me
contou que saiu com você no sábado passado. Na noite que você me disse que ia
a um jantar de negócios.
A expressão de Russell mudou completamente. Seus lábios se contorceram
num sorriso desagradável e os olhos se estreitaram mostrando mesquinharia.
— Então, é por esta razão que você me chamou! Para responder a um
monte de estúpidas acusações. Eu acreditava que você tinha mais bom senso do
que está demonstrando! Imagine, dar atenção à fofoca de uma pessoa vulgar
como Diane!
— Ela não estava mentindo — Audrey contradisse, aborrecida ao perceber
mais esta faceta desagradável de Russell. Havia sempre se preocupado cm
comportar-se como um gentleman. Encurralado, deixava cair a máscara.
— É claro que sim — ele vociferou. — Ela sente ciúme de você. Será que
não tem inteligência suficiente para perceber a verdade?
Este novo insulto a magoou ainda mais. Mas a dor deu-lhe novas forças
para terminar com este homem de uma vez por todas.
— Ela me mostrou o recibo do motel de sábado — prosseguiu abalada, mas
resoluta. — Está assinado por você e conheço bem sua assinatura.
— Audrey — ele começou impaciente, após um curto silêncio. Ela ergueu o
queixo, orgulhosa, tentando controlar o tremor na voz.
— É inútil mentir para mim, Russell. De qualquer modo, nosso caso está
acabado.
— Não acredito que seja esta sua intenção.
— É esta mesmo. Acredito em Diane e continuarei a acreditar, não
importando o que você diga.
— Então é assim? — ele murmurou, desagradável. — Muito bem, dormi
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com ela. E daí?


— Você jurou que me amava. Que queria casar comigo!
— Sim, naturalmente. Você é a filha do patrão. Sua única filha. Não tem
irmãos. Preciso dar mais razões?
Um gemido dolorido escapou dos lábios de Audrey, antes que ela pudesse
rebater tal infâmia. Como não desconfiara da verdade? Imaginara que ele não
passava de um compulsório mulherengo.
— Então, jamais foi sincero? Foi tudo pelo meu dinheiro, apenas?
— Qual é o problema, queridinha? — Ele riu cruel. — Acha mesmo que eu
me envolvi pela sua beleza ou charme? Audrey, cara, você é uma chata! Eu
estava lhe prestando um enorme favor em sair com você e dando-lhe alguma
atenção.
Audrey pensou que iria desmaiar. Reuniu todas as forças para pronunciar
desdenhosa:
— Não se preocupe. Não direi nada a papai. — Pelo menos ainda tinha
algum orgulho. Não muito, era verdade. Mas o suficiente para impedir que o
desespero a invadisse por completo.
— Ainda bem, pois se você me colocar em maus lençóis, abrirei minha boca
e farei com que todos os funcionários da empresa conheçam a mulherzinha
vingativa que é você. E nem pense em espalhar por aí que foi você quem rompeu
comigo, queridinha. Ninguém acreditaria mesmo. Todos sabem que posso
conquistar qualquer mulher que deseje...
Russell continuava sua fala agressiva, mas Audrey deixara de escutá-lo.
Tentava imaginar a sorte de moças como ela, verdadeiros fracassos no que dizia
respeito a homens e ao sexo, mas que possuíam dinheiro. Moças como sua
própria mãe.
Apertava com força a bolsa e estava a ponto de cair de lado, no chão,
quando alguém se aproximou de repente.
Sobressaltada, olhou para cima, atônita ao perceber um homem alto, de
cerca de trinta anos. A boca extremamente atraente exibia um sorriso de
desculpas. Dentes de um branco brilhante sobressaíam num rosto bronzeado,
olhos cinzentos brilhavam inteligentes sob cabelos sedosos negros como a noite.
Mas, além da surpresa pela súbita aparição, estranhou ainda mais as
palavras que ele lhe dirigiu:
— Audrey, querida — falou em voz carinhosa —, não consegui esperar lá
fora no carro nem um minuto mais. Você garantiu que conseguiria acertar tudo
sozinha, mas não me pareceu justo.
Sua expressão, enquanto falava, exibia uma firmeza tal que a compeliu a
entrar no jogo, não revelando que ele era um perfeito desconhecido.
Até ela começou a duvidar se já não o vira antes.
Havia algo familiar cm seus rosto, mas ela não conseguia se lembrar.
Tentou disfarçara própria confusão. Mas, afinal, quem era ele? Como sabia seu
nome?
Assim que ele terminou de falar, voltou-se para Russell, cujo espanto era
evidente, pela expressão desagradável da boca aberta.

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— Este é Russell, não, é? — continuou o estranho sem cerimônia,


chocando ainda mais Audrey pelo conhecimento do nome de seu ex-namorado.
Ela engasgou, provocando um olhar de advertência do estranho, que lhe
ordenava calar-se.
— Sinto muito, meu velho, mas esse tipo de coisa acontece. Audrey e eu
nos conhecemos no sábado passado, mas foi amor à primeira vista, para nós
dois. Nunca acreditei nesse tipo de histórias românticas, mas precisei rever meus
conceitos sobre o assunto. Não é mesmo, Audrey, minha doçura?
Audrey, minha doçura, estava tão surpresa que só conseguia manter-se
calada, os olhos de corça assustada bem abertos, os lábios bem apertados, como
se temesse revelar o que se passava em seu íntimo.
Porém Russell, igualmente espantado, não se reduzia ao silêncio.
— Audrey! Quem é este homem? Não ouse me contar que esteve se
encontrando com alguém pelas minhas cosias!
— Audrey, sua pirallinha(*) — o estranho interrompeu com firmeza, mas
num tom de quem se divertia apesar de tudo —, você ainda não lhe contou nada?
— Deu de ombros num gesto eloqüente, chamando a atenção da jovem para suas
roupas informais, mas atraentes. Calça preta larga, combinando com uma
camisa negra de gola pólo, cinto de couro trabalhado, acentuando a fina linha
dos quadris.
— Então, Russell, não é mesmo a pequena que conhecemos? — ele
prosseguiu irreverente. — Ela detesta tanto ferir os sentimentos de outra pessoa.
Olhe, talvez nós dois devêssemos dar um pulo lá fora para que você possa se
exprimirá(*) vontade. Nós ambos sabemos como Audrey é sensível e talvez o
melhor seja conversarmos de homem para homem.
Russell saltou da cadeira, confuso. Ao lado do estranho, ele parecia
insignificante, para estranheza de Audrey que sempre o considerara alto. Mas o
estranho devia ter com certeza um metro e noventa, os ombros largos e o corpo
bem estruturado reduzindo ainda mais o tamanho do outro.
— Não há necessidade alguma de conversarmos. — Russell tinha plena
consciência de sua situação ridícula e demonstrava claramente seu desagrado. —
Já entendi bem a situação. De qualquer maneira seja bem-vindo. Nem com todo
dinheiro do mundo ela vale à pena.
Com rapidez inesperada, o estranho ergueu a mão esquerda, apertando o
pulso esquerdo de Russell, chamando a atenção de Audrey para seus dedos
longos e fortes. Era visível a dor que Russell sentia à medida que o aperto se
estreitava.
— Eu não diria uma palavra a mais, se fosse você — o desconhecido
ameaçou, em voz baixa, mas nem por isso menos assustadora. — Também sugiro
que você se retire daqui bem depressa, antes que eu me esqueça de comportar-
me como um gentleman na presença de uma lady.
Russell começou a abrir a boca, mas refletiu melhor e calou-se. Lançando
um olhar irado a Audrey, afastou-se zangado. O estranho o observou retirar-se
com evidente satisfação.
— Quem... quem é você? — Audrey indagou aflita, porém aliviada por ser
capaz afinal de liberar a ansiedade que a domiuivii(*). Apenas a satisfação de

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assistir a retirada infeliz de Russell a mantivera em silêncio.


— Apenas um amigo — ele falou sorridente, sentando-se á mesa, a sua
frente.
Ela se reclinou para trás, apoiando-se no assento de couro verde e o fitou
atônita. Já haviam se encontrado antes? Seria ele algum conhecido de negócios
do pai? Jamais o teria esquecido se o tivesse conhecido.
— Tenho certeza que não o conheço...
— Ah, sim. É verdade. Acreditaria se eu dissesse que sou seu anjo da
guarda, vindo à Terra para ajudá-la a se livrar de um vilão mal-intencionado?
— Você não se parece em nada com um anjo — ela declarou, sorrindo ante
a idéia de que seu salvador, vestido todo de negro, mais parecia um visitante da
região das Trevas.
— Que tal, então, um cavaleiro andante, salvando uma pobre dama em
apuros? — ele propôs, com um sorriso tão atraente, que provocou uma leve
convulsão no estômago de Audrey.
— Que há de tão engraçado? — ela indagou, ingênua. — Oh, já sei —
prosseguiu subitamente séria —, é porque estou muito longe de ser uma bela
dama...
— Que tolice, Audrey — ele suspirou, claramente exasperado.
— Não é nada disso! Acontece que meu nome é Knight. Elliot Knight. Não
entendo por que você não se qualificaria como uma linda dama. Ora, tem uma
lindíssima pele macia, os mais adoráveis olhos castanhos que já admirei e uma
boca extremamente beijável.
Sem refletir, a jovem cobriu os lábios com as mãos. O que desejaria tal
homem? Sentia-se confusa e tomada de pânico.
— Não faço a menor idéia de quem seja, ou como conheça meu nome e
tudo o mais, mas acho que já é hora de retornar ao trabalho! — ela falou,
pegando a bolsa e começando a se levantar.
— Deixe de agir como uma tolinha! Desculpe-me — ele pediu com um
suspiro cansado — não pretendia feri-la. Mas mande tudo às favas! Por que voltar
ao escritório, para assistir ao desdém de Diane? Já são quase quatro horas de
sexta-feira. Você é filha do patrão. Pegue algumas horas de folga. Na segunda-
feira, o término de seu caso com Russell já serão águas passadas. Venha a minha
casa tomar uma bebida, junto à lareira e depois eu a levarei para casa. Vamos,
aceita minha proposta?
Ela ainda o contemplava aflita. "Como sabia ele tantas coisas a meu
respeito? Sobre Russell? E sobre Diane?"
Poucas emoções transpareciam nos belos olhos cinza. Frustração. Irritação.
E, afinal ... resignação cansada.
— Estava sentado no reservado anexo — ele confessou relutante.
— Ouvi toda a conversa com seu namorado. Ele enfureceu-me a tal ponto
que decidi dar-lhe uma lição.
Então por isso ele parecia tão familiar! Audrey quase sentia alívio ante a
explicação do estranho. Mas, ao dar-se conta dos fatos íntimos que ele conhecia,
sentiu-sc embaraçada. O rubor cobriu suas faces.

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— Meu Deus! — ela murmurou, desviando o olhar, envergonhada.


— Você nada fez de errado. Estava apaixonada pelo rapaz e acreditava ser
correspondida. É Russell quem merece toda censura, não você.
— Talvez — Há muito tempo tinha consciência da sua falta de atrativos
para os homens. Como se deixara iludir, acreditando em falsas declarações de
amor?
— Livrou-se dele, Audrey — continuou seu companheiro, no mesmo tom
gentil.
— Acredito que sim, mas ainda dói.
— Sim — ele concordou com um aceno de cabeça. — Sei... Havia tanta
compreensão na voz de seu salvador, que Audrey esqueceu-se por um momento
de Russell para avaliar o que Elliot Knight havia realizado a seu favor. Sentiu-se
profundamente comovida. Aquele estranho demonstrara compaixão e procurara
ajudá-la. E como sido galante! Colocara o inimigo em debandada, e ainda fizera
com que ela se sentisse melhor, elogiando sua aparência.
— Acredito que você seja de fato um cavaleiro vestido numa armadura
brilhante. — Ela procurou demonstrar seu agradecimento, encarando-o com
ternura. O cumprimento o surpreendeu por um momento. — Mas não precisa
continuar me salvando, sr. Knight. Já fez muito. — Mordeu o lábio inferior ao
sentir as lágrimas aflorarem, inesperadas.
— Vamos... — ele segurou-lhe a mão, atraindo-a para fora do reservado. —
Irá a minha casa, por um momento apenas e está resolvido. Não moro muito
longe.
— Mas, não posso, sr. Knight. Eu... eu...
— É inútil discutir comigo, Audrey. É para seu próprio bem. E, por favor,
chame-me Elliot! E, antes que pergunte, não, não sou casado. Nem tenho
namorada que possa se sentir traída. Isto encerra sua hesitação?
Audrey poderia ter resistido, mas, na verdade, não desejava voltar ao
escritório. Também não acreditava que Elliot possuísse algum motivo obscuro
para levá-la a sua casa.
Apenas ao avistar o esportivo Saab Cabriolet, estacionado do lado de fora,
ela hesitou, retirando a mão que Elliot ainda prendia.
— É este o seu carro? — perguntou, com voz tremula. Ele fitou-a surpreso,
e depois ao carro.
— Sim, é este mesmo. Há algo de errado nisto?
— Não, não, suponho que não — ela retrucou tensa e, num gesto
determinado, entrou no carro. Entretanto, o temor se apoderou de seu corpo,
enquanto o carro se dirigia pela estreita estrada lortuOHH(*) beirando os
rochedos que iam de Newport até Avalon Beach. Audrey se indagava se algum dia
conseguiria vencera fobia que a dominava.
Acreditava estar conseguindo esconder muito bem seus sentimentos
durante o curto trajeto, mas sentiu-se aliviada quando Elliot dirigiu o carro para
fora da estrada principal e em direção a um caminho íngreme.
O carro se deteve do lado de fora de uma imponente casa de frente para o
oceano. Elliot utilizou o controle remoto para abrir a porta da garagem, entrou
com o carro e finalmente desligou o motor. Ela suspirou, profundamente aliviada.
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— É uma passageira bastante nervosa — ele comentou, olhando-a de


soslaio, e voltando-se para apanhar um jornal no banco de trás.
— Sim, a velocidade me deixa nervosa — ela admitiu. — Em geral, as
pessoas que possuem carros esporte dirigem em alta velocidade. Não é seu caso,
porém. Bom, você também parece diferente dos outros homens.
— Realmente? Duvido disso Audrey. Duvido muito. — E lançou-lhe um
estranho olhar, antes de descer do carro.
Enquanto se deixava guiar pela escada interna, em forma espiral, tentava
entender o sentido da observação que ouvira e do olhar enigmático. Chegaram ao
andar inferior da moradia de dois patamares. Quais seriam suas reais intenções?
Seria igual a Russell? Acreditaria que valeria a pena seduzir uma herdeira, ainda
que pouco atraente?
Apesar de não acreditar em suposições tão cínicas sobre seu belo cavaleiro,
a nova Audrey, que saíra de uma experiência Ião ingrata, determinava-se a
manter uma atitude alerta.
Mas, a visão da enorme sala de estar, de teto alto e paredes recobertas de
madeira, voltou a tranqüilizá-la, assim como a mobília e os tapetes; todos
antiguidades valiosas. Pessoas não alugavam casas cheias de tais tesouros, ela
decidiu. Possuíam tais casas.
— Deve ser muito rico, Elliot — ela comentou, os olhos examinando o
aposento. Impressionante, se ela não estava enganada, havia um Renoir na
parede. E um Gauguih! Não pareciam reproduções.
— Muito — ele anuiu, andando em largas passadas pela sala e atirando o
jornal sobre uma mesa de café, trabalhada no estilo eduardiano. — Fique à
vontade. — Ele acenou na direção de um sofá de couro marrom colocado â frente
da lareira.
— Qual é, exatamente, sua atividade de trabalho? — ela perguntou,
sentando-se.
Elliot se aproximava da lareira, quando ouviu a ouviu. Lançou-lhe um
olhar esquisito e inclinou-se para acender o fogo.
— Deseja saber o que faço? — murmurou displicente. — Vejamos... —
Ergueu-se e encarou-a, exibindo um sorriso sardónico. — Bem, não tenho feito
muita coisa nos últimos tempos. Quinze dias atrás esquiei. Ontem, li um livro
excelente. Amanhã, tentarei a sorte nas corridas de cavalo.
— Não trabalha?
— Digamos que não precise trabalhar, a menos que sinta vontade, e isto
ainda não ocorreu nenhuma vez este ano.
— Incrível! Você nasceu rico?
— Em absoluto. — Elliot dirigiu-se ao bar. — O que gostaria de tomar?
Gim? Vodca? Um copo de vinho branco?
— Oh, vinho branco seria bom.
Ele se voltou, retirando uma garrafa de Riesling(*) de uma geladeira
embutida na parede. Abriu a garrafa com a perícia de alguém que possuía muita
experiência. Colocou a bebida em dois copos e os levou para o sofá.
Os olhos fascinados da jovem acompanhavam todos os movimentos. Ele

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exibia uma graça inconsciente e exalava masculinidade.


— Em verdade — ele prosseguiu, estendendo-lhe um copo e acomodando-
se à frente do fogo crepitante —, fui casado com uma mulher muito rica.
— Está querendo me dizer que se casou com uma mulher pelo seu
dinheiro? — Audrey indagou, chocada, a ponto de lhe tremerem os dedos que
seguravam o copo.
— Não, é claro que não — ele contradisse, irritado. — Por favor, não pense
tal coisa. — Estava apenas tentando explicar a origem de uma parte de meu
dinheiro. Moira morreu, entenda bem. No fim do ano passado. De pneumonia
viral — ele completou tenso, antecipando a pergunta.
Audrey estranhou que uma pessoa morresse nos dias atuais, em que
existem os antibióticos, de tal doença.
— Minha esposa sofria já algum tempo de esclerose múltipla — ele
confidenciou relutante — e havia desenvolvido aversão a médicos. Eu estava
viajando quando ela adoeceu, e imaginou que se tratasse de um simples
resfriado. Amigos comuns me contaram que ela se recusou a chamar um médico.
Quando voltei para casa, ela estava muito doente. Levei-a rapidamente para o
hospital, mas ela faleceu algumas horas depois.
— Deve ter sido terrível para você...
— Sim — ele confirmou, sentindo-se desconfortável com a compaixão da
moça, apertando os dedos ao redor do copo. — Sim, foi muito difícil.
Refletiu que qualquer morte súbita era terrível. Ninguém estava preparado
para o vazio deixado por uma existência que se encerrava abruptamente.
Se continuasse a pensar no assunto acabaria chorando. Esforçou-se para
se concentrarem outra coisa. Acomodou-se melhor, endireitando os ombros e
respirando fundo. Percebeu que Elliot a observava atento. Ergueu seu copo e
sorveu um pouco da bebida, sentindo-se embaraçada.
— Vocês não tinham filhos? — ela indagou.
— Não — ele redarguiu tenso. — Moira não tinha condições de engravidar.
Será que podemos mudar de assunto? — ele inquiriu brusco.
— Sim, é claro — ela anuiu, culpando-se pela insensibilidade. Percebia que
ele amara muito a esposa. Audrey mergulhou num silêncio embaraçado.
— Conte-me sobre Russell — ele convidou afinal.
— Preciso falar sobre ele? — ela indagou, estremecendo.
— Acho uma boa ideia — ele determinou decidido. — Talvez isto possa lhe
propiciar uma perspectiva diferente, mostrando-lhe que não merece um coração
destroçado.
— Acredite-me, já cheguei a tal conclusão.
— E quanto a seu pai?
— Meu pai?
— Ele estava a par que você saía com esse sujeito?
— Sim.
— E ele aprovava?
— Ele parecia contente que algum homem se interessasse por mim — ela

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deu os ombros, tentando diminuir a tensão. — Meu pai é daqueles homens que
acham que uma mulher não é nada, a não ser que se case. Ele me considera uma
solteirona em potencial — completou com um riso amargo.
— Que rematada tolice! — ele exclamou. — Atualmente as mulheres não
precisam se casar cedo. Ou mesmo não precisam se casar em absoluto. E, de
qualquer modo, você não passa de uma mocinha.
— Completarei vinte e um anos na próxima semana.
— Positivamente idosa — ele deixou escapar uma risada seca.
— Sim, se você encarar a questão de meu ponto de vista. Lavínia costuma
dizer que uma moça comum, com dinheiro, pode ate parecer atraente. Mas, com
o tempo, ela só faz decair.
As palavras de Audrey provocaram faíscas de fúria nos olhos de seu
companheiro.
— E quem é Lavínia?
— Minha madrasta.
— Sua madrasta — as sobrancelhas se ergueram, sardónicas. — E sua
madrasta lhe disse que é uma moça comum, sem atrativos?
Audrey percebia o que ele imaginava. Que Lavínia se comportasse como
uma perversa madrasta.
— Não, Lavínia jamais seria tão cruel. Ela é muito bondosa comigo. Tenta
com empenho ajudar-me, dando conselhos sobre meu cabelo e minhas roupas.
Mas sou um caso perdido. Nada me fica bem.
Enquanto argumentava, ela percebia que Elliot não se convencia.
— E qual a idade de sua madrasta? — ele indagou. — Essa tal que a ajuda
com os cabelos e as roupas.
— Ela está perlo dos quarenta anos. Mas parece muito mais jovem. É muito
bonita e confiante em si mesma.
Um suspiro invejoso escapou dos lábios de Audrey, sem que ela pudesse
evitar. Mas tantas vezes desejara possuir ao menos a metade dos encantos de
Lavínia.
— Não compreendo de onde tirou a ideia de que não é atraente, Audrey.
— Por favor não tente me lisonjear — ela pediu ressentida. — Não é
necessário. Sei muito bem o que sou e como pareço.
De repente, não havia como impedir as lágrimas que ameaçavam surgir
durante toda a tarde. Ela tentava abafar o som de seus soluços. Mas em vão.
Livrou-se do copo e escondeu o rosto com as mãos. Parecia tão desamparada,
dobrada sobre si mesma, chorando lágrimas amargas e silenciosas.
— Audrey, não se desespere — Elliot resmungou, aninhando-a em seus
braços. Ela correspondeu de modo automático, abraçando-o com todas as forças.
Quando ele acariciou-lhe os cabelos num gesto confortador, Audrey
surpreendeu-se com a própria reação. Apesar de seu sofrimento, ela excitou-se
ante seu toque e, quando ele lhe sussurrou palavras de conforto ela estremeceu
num prazer secreto.
— Você é bonita, Audrey. Eu não a estava lisonjeando...
Como acontecera o momento seguinte? Ele ergueu-lhe o rosto molhado de
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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

lágrimas, e inclinou a boca procurando seus lábios. Audrey sentiu-se enregelar


por um instante. Mas seus lábios eram tão suaves. Ela suspirou dentro deles,
correspondendo, enquanto suas mãos subiam para o pescoço másculo.
De repente o beijo mudou. A boca de Elliot tornou-se exigente, apertando o
abraço. Ele forçou a língua em sua boca e mergulhou profundamente.
O pânico tomou conta de Audrey, que começou a lutar contra ele, batendo
com as mãos em seu peito, num pavor crescente. Quando ele a soltou afinal, ela
o fitou chocada e confusa. Elliot movimentou a cabeça num gesto de desgosto.
— Desculpe-me Audrey. Peço-lhe mil desculpas. — A posição de seus
ombros demonstrava o cansaço e a frustração da voz. — Deixei-me a levar.
— Mas, por quê? — ela inquiriu indecisa, fitando-o. — Quero dizer...
— Há mais uma lição que está aprendendo a respeito dos homens — ele
falou, o rosto contraído numa máscara sardônica. — No que se refere a sexo, eles
não passam basicamente de animais. Algumas vezes querem o que querem
quando querem. E não importa quem seja a parceira no momento. Há quase um
ano estou vivendo em celibato. Julgando pelo que acaba de acontecer creio que
minha vida monástica está para terminar.
Após um curto silencio, acrescentou, fitando-a com seriedade:
— Mas não vai ser com você, minha pequena e querida jovem. Venha. Vou
levá-la para casa.

CAPÍTULO II

Na manhã de segunda-feira, Audrey despertou confusa. Não queria ir


trabalhar, porém, não podia passar o dia fingindo que tudo estava bem.
Virou-se de lado, na cama, enterrando o rosto nas mãos. Não lhe restavam
mais lágrimas. A noite de sexta-feira fora a pior. Não conseguira dormir. Chorara
ate esgotar todas as energias c emoções.
Passara o dia de sábado mergulhada em profunda depressão. E o domingo
não fora melhor.
Porém, uma nova semana estava por se iniciar e sua vida precisava
continuar, quer quisesse ou não. Não tinha alternativa. Precisava reunir forças e
enfrentar a verdade.
Movimentou a cabeça, sentindo uma estranha dor no coração. O que a
magoara mais? ela se indagava. A traição e o comportamento execrável de
Russell? Ou a maneira como Elliot Knight se despedira o mais rápido possível de
sua companhia?
Não conseguia decidir. Sentia-se insegura a respeito de tudo. Só lhe restava
o conhecimento que sempre tivera sobre si própria. No que dizia respeito aos
homens, não passava de um completo fracasso. Russell só se aproximara dela
movido pela ganância. Elliot, pela piedade. Russell...
Sentia dificuldades para lembrar-se dele, em pcasar(*) como havia agido.
Ou, pior ainda, recordar o que ela lhe permitira fazer. Não passara de uma tola,
uma estúpida!
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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

Os cumprimentos de Elliot, que ele insistira serem sinceros, não passavam


de puro consolo. Afirmara que sua pele era adorável, seus olhos lindos e sua boca
muito desejável. Teriam sido, mesmo, simples lisonjas, para ajudá-la a sentir-se
melhor? Ou seriam a expressão de seus sentimentos?
Levantou-se e caminhou hesitante para o espelho no canto, do quarto.
Passou a mão sobre a face e a boca, fitando a si própria.
Em sua opinião, a pele era clara demais, os olhos muito grandes e a boca
infantil. Mas, sim... talvez não fosse tão feia.
Estremeceu ao contemplar os cabelos. Havia neles cores em excesso.
Chega de depressão, de auto-piedade, de confusões românticas e de
desilusões. Admoestou-se, pensando que era saudável, jovem e que sua
aparência não era de todo má. Um dia encontraria alguém digno de amar, que lhe
retribuiria idêntico sentimento. Já era hora de acabar com as lamúrias! Devia
descer e tomar o café da manhã. Devia adotar uma atitude objetiva e prática!
Quando ela chegou à saleta ensolarada, onde costumavam tomar a
primeira refeição, o pai já se encontrava ali, comendo com prazer seu habitual filé
com ovos estrelados. Elsie aguardava ao lado, enchendo a xícara de café quando
necessário.
— Bom dia — cumprimentou a jovem, numa atitude de alegria deliberada.
— Apenas café e uma torrada para mim, Elsie.
— Claro, meu bem. — Elsie saudou, apressando-se a atendê-la. Tendo
trabalhado como cozinheira a vida toda, Elsie já atravessara momentos difíceis.
Mas era uma pessoa generosa e Audrey a amava com sinceridade.
— Você não estará contraindo anorexia, Audrey? — repreendeu-a o pai,
franzindo as sobrancelhas, contrariado.
Warwick Farnsworth, na faixa dos cinqüenta anos, era um belo homem.
Ombros largos e corpo esguio, exibia uma espessa cabeleira castanha,
entremeada de fios prateados e perscrutadores olhos azuis. Por um breve
momento, Audrey desejou ser parecida com o pai.
Mas, apenas no físico. Não na falta de tato.
Ele não fazia a menor idéia de como se relacionar com a filha. A maioria de
suas conversas se iniciavam com uma questão exasperadora.
— Não sou doente, pai. Tenho um metro e sessenta e três e peso cinqüenta
quilos. Estou muito bem.
Audrey aprendera a responder ao pai usando fatos. Pois ele era um homem
objetivo.
— Hum! — ele balbuciou, pegando a xícara e voltando à leitura do jornal
aberto na seção de negócios.
Elsie chegou com a torrada e o café. Audrey espalhou margarina e geléia na
fatia. Quando o pai mergulhava no jornal, toda conversação cessava. Por isso, ela
se surpreendeu, quando ele voltou a falar.
— Você já percebeu, Audrey, que Lavínia tem tido muito trabalho para
preparar a festa de seu aniversário, na próxima sexta à noite?
Audrey esforçava-se para não se permitir invadir por pensamentos
ingratos. Tímida em qualquer situação social, pedira para não haver

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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

comemorações. Mas Lavínia insistira num jantar festivo, com convidados do


escritório. Audrey cedera apenas quando Russell se mostrara entusiasmado com
a idéia.
— Ela tem sido uma boa madrasta para você — prosseguiu o pai. — Muito
boa. Mesmo no início, quando você não se mostrava receptiva. Ela jamais perdeu
a paciência.
O ressentimento cresceu dentro de Audrey. Sentia dor, isso sim, devido aos
ferimentos provocados pelo acidente de carro em que morrera a mãe. Sem
comentar a tristeza pela perda da adorada mãe. Mas, é claro, o pai jamais
entenderia. Demonstrara sua insensibilidade ao voltar a casar-se, apenas seis
meses após tornar-se viúvo.
Durante toda a vida, Audrey ouvira rumores sobre o casamento dos pais.
Mas, sempre achara que eram apenas comentários maldosos. Porém, quando ele
anunciara o novo matrimônio, a jovem chegou à conclusão de que não se tratava
apenas de rumores. Não adiantava negar que o pai jamais havia amado a mãe.
Ele havia se casado por interesse, visando a empresa que lhe pertencia.
Ergueu a cabeça, fitando o pai, reconhecendo nele um mercenário
ambicioso, incapaz de amar. Talvez nem mesmo amasse Lavínia. A madrasta era
uma figura meramente decorativa, um corpo belo e conveniente para dispor no
leito, uma posse, tal como as pinturas e obras de escultura que ele se dedicara a
colecionar nos últimos tempos.
Apesar de enxergar com clareza a personalidade do pai, Audrey não
conseguia se impedir de amá-lo. E tal sentimento a irritava, como um sintoma de
fraqueza.
— Lavínia contou-me que você cancelou o convite de Russell para o jantar
de comemoração — ele comentou. — É verdade?
— Sim.
— Por quê?
— Nós rompemos — ela retrucou evasiva, o coração aos saltos.
— Por quê?
Ela estava a ponto de apresentar uma fraca desculpa, quando sentiu algo
se rebelar cm seu íntimo.
— Encontrei outra pessoa...
— Você encontrou? Quem? — o rosto do pai exprimia imensa surpresa.
— Você... você não o conhece. — Audrey hesitou, percebendo que dera um
passo no escuro.
— Bem, qual o nome dele? Onde o encontrou? O que ele faz?
— Ele se chama... Elliot Knight. Mora em Avalon Beach e é um homem rico.
— Então ele é rico...
— Sim, é isso mesmo.
— E, ainda assim, ele se interessa por você.
Um intenso desconforto apoderou-se de Audrey. Então o pai soubera o
tempo todo que Russell estivera interessado apenas cm seu dinheiro. Ainda assim
permitira que o relacionamento prosseguisse. A única emoção que já inspirara
num homem fora a de piedade. Esse sentimento levara Elliot a ajudá-la, a beijá-
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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

la. Piedade...
Desejava chorar de desespero, mas o pai a encarava com atenção. De
repente, sentiu uma nova força surgir, talvez como resultado da amarga
experiência que acabara de atravessar. Levantou a cabeça e, olhando o pai com
firmeza, declarou:
— Ele está muito interessado.
— Então, por que não o convida para sua festa?
— Convidar quem? — indagou Lavínia, entrando na saleta, envolvida cm
seu glamouroso négligè de cetim negro. Alta e voluptuosa, a sedosa cabeleira
negra chegando ate os ombros, era uma figura sensual e arrebatadora.
Audrey fitou-a com inegável inveja. Oh, como devia ser bom ser tão segura
de si mesma, tão elegante e sexy!
— Audrey tem um novo namorado — anunciou o pai, num tom em que se
mesclava surpresa e orgulho paterno. — Ela confidenciou-me que ele está muito
interessado.
Audrey piscou os olhos, nervosa. Percebera que estava em apuros. Lavínia
voltou-se, encarando a moça com descrença.
— Realmente? Alguém que eu conheça?
— Já fiz a mesma pergunta. Ela afirma que não. Pelo jeito, trata-se de um
rico playboy.
— Mas, como Audrey encontraria alguém assim? — Lavínia indagou
perplexa. — Ela não freqüenta o ambiente social de Sydney. Parece tudo muito
estranho.
Audrey detestava quando o pai e Lavínia falavam dela como se não
estivesse presente. Normalmente, mergulhava num silêncio rancoroso ou se
distraía. Mas tal atitude não cabia nessa manhã.
— Por que eu haveria de mentir, Lavínia? — ela desafiou.
— É mesmo, por quê?
— Terei o maior prazer cm falar sobre Elliot. Basta apenas que me
pergunte.
Lavínia arqueou as sobrancelhas escuras e encaminhou-se com indolência
para a mesa, trazendo seu café.
— Bem? — conciliou. — Conte-nos, então. Onde se conheceram? Audrcy
engoliu em seco, sentindo faltar-lhe a coragem. Mas o brilho sardônico nos olhos
negros de Lavínia restauraram-lhe as forças.
— Nós nos conhecemos numa festa no sábado à noite — ela explicou,
usando a mesma mentira que Elliot utilizara com Russell. Duas semanas atrás.
— Mas nessa noite você não saiu — Lavínia ponderou. Audrey buscou na
memória o que acontecera nessa data. O pai havia saído com Lavínia para um
clube. Só haviam retornado após a meia-noite e, com certeza não haviam se
preocupado em verificar se ela eslava em seu quarto. A única criada dormindo na
casa era Elsie, que sempre se recolhia cedo.
Apesar de temerosa, conseguiu apresentar uma atitude indiferente.
— Eu não pretendia sair, mas, depois que vocês saíram, uma velha amiga
de escola me telefonou, convidando-me para uma festa de improviso. Assim,
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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

fiquei conhecendo Elliot, uma pessoa fascinante.


— Se este Elliot estava assim tão interessado, por que você passou o último
fim de semana sozinha em seu quarto? — Lavínia desafiou. Por que não a
convidou para sair?
— Ele viajou, para esquiar. — Audrey sentia o estômago contorcer-se. —
Eu não quis ir. Detesto esquiar.
— Parece que, afinal, Audrey encontrou alguém — o pai declarou
impressionado. — Podemos esperar uma declaração formal para breve?
— Realmente, pai... — Audrey ruborizou-se. — Acabamos de nos conhecer.
— Tudo bem. E quando ele retorna?
— Ele deve retornar ainda hoje — afirmou Audrey temerária. Sem dúvida
alguma, a prática ajudava a mentir com mais facilidade. — Chegará no fim da
tarde.
— Então poderá telefonar-lhe à noite, para convidá-lo para a festa —
Lavínia propôs com suavidade.
— Oh, mas eu... mas com certeza...
— Ora, Audrcy! — o pai interveio, exasperado. — É perfeitamente aceitável
que uma moça convide um rapaz, nos tempos atuais. E, afinal de contas, será
sua maioridade. Sem dúvida, este jovem não imaginará que você está atrás dele,
só por convidá-lo para comemorar seus vinte e um anos.
— Quem sabe você mesma ache que Elliot não virá — Lavínia comentou
irônica. — Audrey fitou a madrasta. Estranho, acreditara sempre que Lavínia a
amasse. Mas era impossível ignorar o brilho malicioso nos olhos escuros, ou o
sarcasmo evidente da voz. Tudo isso, porém, provocou uma atitude de feroz
determinação.
— Ele virá — declarou a jovem, decidida, ela mesma impressionada com a
nova força que sentia. — Não se preocupe com isso.
Lavínia retraiu-se. Por um momento, Audrey saboreou sua vitória.
Conseguiria que Elliot comparecesse. Ainda que precisasse implorar-lhe. Tentaria
todos os meios possíveis, ainda que menos dignos, como subornar, ou morder,
refletiu divertida.
Porem, dez horas mais tarde, Audrey se surpreendia com a própria
mudança. Toda a coragem desaparecera. Ao pegar o telefone de cabeceira, em seu
quarto, sentia tremer-lhe a mão. De repente, desistiu. Deixou-se cair no leito,
sobre a colcha, fitando, mais uma vez a página aberta da lista telefônica, apoiada
sobre o travesseiro.
Um círculo rodeava o nome KNIGHT E H. O único E Knight na lista,
morando no subúrbio de Avalon. Precisava ser ele.
Mais uma vez, respirando fundo, e tentando firmar a mão, alcançou o
aparelho e retirou o fone do gancho. Discou os números com movimentos
bruscos. O irritante som de chamar passou a soar no outro lado da linha.
Estaria ele cm casa, em plena segunda-feira à noite? Imaginara que ele
estaria. Ainda era muito cedo para sair, se fosse jantar fora, é tarde o suficiente
para haver retornado, caso houvesse saído à tarde. As seis horas da tarde, em
pleno mês de julho, em Sydney, já estava escuro. Afinal, encontravam-se em
pleno inverno. A cada toque, aumentava a agitação de Audrey. Estava dividida
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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

entre o desejo que ele atendesse e outro que ele houvesse viajado para a Suíça,
pelo resto da temporada de esqui.
No sétimo toque, alguém respondeu.
Audrey prendeu a respiração.
Uma voz masculina repetiu o número que ela acabara de discar.
— EI... Elliot? -— conseguiu emitir, num esforço desesperado. Seguiu-se
um curto e brusco silencio, que elevou a tensão da moça às nuvens.
— Audrey? É você? — o tom denotava o desagrado pela chamada.
— Sim, sou eu — ela confirmou, caindo em doloroso silêncio.
— Então? — ele indagou afinal. — Em que posso te ajudar? — De repente,
ela percebeu que estava agindo como uma tola. Porém, a idéia de falhar era
impensável. Como enfrentaria Lavínia, com a notícia de que Elliot não viria?
— Eu... estou com um problema.
— Sim?
Sentimentos de derrota a dominaram, avassaladores. Ele recusaria. Por
que se humilhar, pedindo-lhe algo que ele não aceitaria mesmo?
Sentiu-se desolada. Se, ao menos, fosse bonita e sexy. Se Elliot não tivesse
dinheiro mas, ao contrário, precisasse aceitar o que ela pudesse lhe dar; como
Russell. Se houvesse alguma maneira de conseguir que ele desejasse vir por
vontade própria!
— Você me disse que eu poderia chamar, caso necessitasse de ajuda — ela
titubeou.
— Sim?
— Eu preciso.
— De que maneira?
— Você se lembra que eu mencionei que logo completaria vinte e um anos?
Bem, acontecerá na próxima sexta-feira, e Lavínia organizou um jantar especial
para mim, aqui em casa. Pretendia trazer Russell, e, você sabe, não tenho
ninguém mais para convidar e pensei que... Bem, tinha a esperança que você
pudesse vir no lugar de Russell.
— Acreditei ter deixado bem claro, Audrey — ele falou entre os dentes —,
que não estou a fim de substituir Russell em nada.
Ainda bem que Elliot não podia vê-la nesse momento. Audrey sentiu o calor
subir à face. As palavras de Elliot provocaram em sua imaginação cenas
ardentes.
— Não poderia convidar outra pessoa? Alguém de sua idade?
— É impossível — ela replicou, esforçando-se para se acalmar. — Ninguém
de quem poderia me orgulhar. E, Elliot, preciso sentir orgulho de meu convidado,
entende? É muito importante para mim.
— Sim, compreendo. Infelizmente... muito bem, Audrey, dê-me seu
endereço e me diga a hora em que devo chegar. E, talvez, seja boa idéia me dizer
seu sobrenome. Ainda não o conheço.
O sucesso trouxe a sensação de triunfo, mas, também, agitação. Ele viria.
Forneceu seu endereço, em Newport, seu nome completo, Audrey Henrietta
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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

Farnsworth, seu número de telefone: para o caso de um imprevisto. Mas, no


íntimo, rogava para que nada impedisse seu comparecimento.
— Você poderia chegar às sete horas? — pediu, quase sem fôlego. —
Tomaremos um aperitivo antes do jantar. E, por favor, vista um dinner-jacket.
Será uma ocasião formal. Percebendo que ele hesitava, ela indagou insegura: —
Você tem um dinner-jacket, não é mesmo?
— Sim, Audrey, tenho um dinner-jacket. — Ele parecia sorrir.
— Foi o que imaginei. Considerando...
— Considerando o quê?
— Considerando que você é rico e... obviamente é adepto de uma vida
social movimentada.
— Não é o que tem ocorrido nos últimos tempos — ele murmurou. — Talvez
eu devesse freqüentar mais. E, diga-me, o que vai vestir, Audrey? Formal significa
vestido longo?
— O longo está fora de moda. Usa-se o comprimento de um palmo abaixo
do joelho. Ainda não sei o que vou usar. Acredito que terminarei comprando algo
ofuscante. Lavínia afirma que é o melhor no momento. — Audrey parou, para
respirar. Percebia que estava ofegante. Acontecia-lhe com freqüência, quando o
nervosismo a afetava.
— Já lhe ocorreu que talvez esta moda não a favoreça? — ele observou,
ferino. — Ou que Lavínia possa escolher algo que seja adequado para ela, não
para você?
— Sim — ela confessou. — Já me ocorreu, em verdade.
— Então, por que não compra algo sozinha, alguma coisa que agrade
apenas você?
A ideia a embaraçava, pois não confiava no próprio gosto.
— Bem, eu gostaria... — ela hesitou infeliz. — O problema é que jamais me
sinto segura sobre o que comprar. As vendedoras dizem que tudo vai bem para a
gente e, no fim, sinto-me muito confusa. Comprei um vestido de noite, algum
tempo atrás e Lavínia afirmou que era um desastre. Totalmente sem vida e
terrível em mim.
— De que cor é ele?
— Bege cremoso, de seda.
— E qual o estilo?
— Nada espetacular. Mangas longas bem justas, corpete ajustado,
decotado atrás. A saia é esvoaçante.
— Você ainda o tem?
— Sim, mas...
— Deixe-me dar-lhe uma sugestão — ele interrompeu mordaz. — Use-o! A
cor creme parece perfeita para você. Prenda os cabelos para o alto e, como
enfeite, apenas brincos de ouro. Nada mais, nem mesmo um relógio. Sombras
neutras ao redor dos olhos. Muito blush. Batom acobreado e esmalte do mesmo
tom. Entendeu?
— Bem, sim, mas... o que é você — ela indagou com um sorriso nervoso —,
um expert em moda feminina?
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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

— Não, um expert em mulheres.


Novamente, o coração de Audrcy bateu rápido. Não duvidava da veracidade
do que ele acabara de afirmar. Surpreendeu-se com o ciúme que sentiu ante tal
reflexão. Quando descobrira sobre o relacionamento de Diane e Russell não
sentira ciúme. Apenas mágoa, pois acreditava que tal demonstração de
infidelidade revelava que ela era incapaz de inspirar um amor profundo e
verdadeiro. Mas, a simples ideia de Elliot amar outra mulher, lhe provocava
inveja dilacerante.
Será que estava apaixonada por ele?
Esperava que não. Tinha esperanças que não. Elliot era um outro tipo de
homem. Uma pessoa como ele só apareceria na vida de um moça uma vez na vida
e seria impossível de ser esquecido.
— Prometa-me que não permitirá a Lavínia vesti-la — ele prosseguia. —
Prometa que seguirá minhas sugestões.
— Prometo. E, Elliot, muito obrigado.
— Não há de quê.
Ele desligou e Audrey percebeu que estava agarrando com força o receptor.
Sua mão começou a tremer enquanto ela a abaixava, bem devagar, para apoiá-lo
no aparelho. Sexta-feira parecia um milhão de anos distante.

CAPÍTULO III

— Posso entrar, Audrey?


— Não, não, Lavínia, não entre. Ainda estou me vestindo. Não quero que
ninguém me veja antes de ficar pronta.
— Realmente, tanto mistério! — Lavínia proferiu cm tom irônico, do lado de
fora da porta. — Primeiro, você nada nos conta sobre esse tal de Elliot que
convidou. Agora, não me deixa ver como está. Pensei que talvez pudesse ajudá-la
a pentear os cabelos. Você acabou não indo ao cabeleireiro comigo, à tarde.
— Está tudo bem. Arranjei os cabelos sozinha.
— É bem o que eu temia, querida.
— Lavínia! — Audrey explodiu com determinação inesperada. — Deixe-me
sozinha ao menos uma vez.
— Não precisa usar este tom comigo, Audrey. Não sei o que está
acontecendo com você. Completar vinte e um anos não lhe dá licença para ser
rude!
Audrey sentiu-se culpada ao ouvir Lavínia retirar-se, resmungando.
Refreou o impulso de ir-lhe ao encalço, desculpar-se. Receava que Lavínia fizesse
algum comentário, do alto de sua experiência, minando a agradável confiança
que começava a crescerem si própria, a cada segundo.
Voltou-se, para se contemplar no espelho, de corpo inteiro. Não conseguia
acreditar na própria aparência. O vestido de seda creme, em vez de esmarecer
sua bonita pele, proporcionava-lhe um suave brilho. Sem dúvida, ficara atraente.
E não pôde deixar de notar que os vermelhos brilhantes, os rosa-maravilha e os
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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

tons púrpura, sugeridos por Lavínia, para realçar seu colorido, produziam um
efeito contrário. Faziam-na parecer desbotada e doentia.
Quanto aos cabelos... Audrey jamais havia se sentido à vontade com o
mivo(*)-escuro, ou a forte permanente, impossível de domar. Mas Lavínia e seu
cabeleireiro haviam ambos insistido, dizendo que seu castanho natural não a
favorecia, que seu rosto fino necessitava de um contraste dramático. Apesar de
não se sentir plenamente convicta, acabam cedendo aos conselhos, pois ambos
eram experts e, em verdade, as sugestões iam de encontro à moda em vigor.
Havia erguido os cabelos para o alto da cabeça, prendendo-os, deixando
apenas alguns anéis escaparem, emoldurando-lhe o rosto. O resultado fora
ótimo. Decidiu tomar providências neste sentido o quanto antes.
Ouviu ao longe o grande relógio do avô ecoar as sete horas. Estremeceu.
Engoliu em seco, sentindo o estômago revolver-se em espasmos nervosos. Elliot
deveria chegar a qualquer momento, juntamente com os demais convidados.
Precisava descer sem mais demoras.
Hesitava, ainda, aterrorizada ante a idéia de receber críticas pela sua
aparência. Não seria preciso muito para ameaçar a confiança nova e frágil.
E não somente seu aspecto a deixava nervosa. Elliot produziria um choque,
também. Tanto o pai, quanto Lavínia, imaginavam receber um jovem esnobe, sem
nada de especial. Não estariam preparados para a arrebatadora figura de Elliot,
num elegante traje de rigor. Esperava que eles disfarçassem a surpresa e não
fizessem muitas perguntas. Elliot não fazia idéia de que fora idealizado como um
ardente admirador. Sem dúvida imaginava que estaria comparecendo como um
simples amigo.
Tentando controlar o nervosismo, Audrey fitou-se mais uma vez no espelho,
para renovar a autoconfiança e descer, afinal, para a sala de recepção.
— Audrey, minha querida! — exclamou o pai em tom surpreso, quando a
avistou no umbral do enorme living. — Você está adorável! Não concorda,
Lavínia?
Audrey animou-se por um breve momento, mas logo sentiu o coração
apertado quando a madrasta se voltou em sua direção. Estivera verificando os
copos e garrafas para servir o cocktail, no móvel que servia de bar. Examinou o
vestido bege de alto a baixo.
— Sim, está adorável — concordou. Mas havia zanga em seu olhar.
Mais uma vez Audrey deixou-se intimidar pela atitude negativa. Mas
reagiu. Não desejava se exibir, porém, acreditara que, parecendo bonita no
própria aniversário, agradaria à madrasta.
A campainha da porta tocou, distraindo-lhe os pensamentos.
"Elliot!" ela pensou, sentindo a respiração parar.
— Pode deixar que atendo eu mesma, Marcc(*) — avisou, detendo a
empregada que se apressava através do saguão de mármore negro em direção à
porta da frente.
O coração de Audrey parecia querer saltar do peito quando ela se desviou
do rosto irritado de Lavínia e dirigiu-se para a porta da frente. Não se tratava de
Elliot, no entanto. Era Edward Hurley e sua esposa, Alice. Alto, na faixa dos
quarenta anos de idade, Edward era o chefe de Audrcy.
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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

— Ora, vejam! — exclamou Edward com os olhos arregalados — Você está


formidável, Audrcy. Por um momento quase não a reconheci.
— Mas que cumprimento mais desajeitado, Edward — repreendeu sua bela
esposa. — Mas este vestido está lindo em você, Audrey. E amei o novo penteado.
Realça sua pele e seus adoráveis olhos.
— Alice sorriu, beijando-a no rosto. — Feliz aniversário, querida. Espero
que aprecie este presentinho — declarou, entregando-lhe um pequeno e bonito
embrulho.
— Com certeza gostarei muito — agradeceu Audrey, sorrindo, reconfortada
pelos elogios calorosos.
Mas um instante depois, soou novamente a campainha.
— Deve ser Dwight — falou Edward. — Ele estava estacionando quando
alcançávamos o último degrau. Como pode bem imaginar, decidimos não
aguardá-lo.
Audrey concordava que, subir os degraus fronteiros da residência
Farnsworth, levava algum tempo, pois eram trinta a escalar. A casa era
relativamente nova, e um tanto ostensiva. De dois andares, sem um estilo
particular, exibia inúmeras colunas trabalhadas, além de grande quantidade de
mármore italiano e imensos aposentos, que impediam qualquer sensação de
privacidade.
Audrey preferia o lar antigo, acolhedor, que fora por longo tempo a
residência da família. Mas, assim que Lavínia se tornara a nova sra. Farnsworth,
insistira em construírem uma nova casa, segundo seu gosto.
Mais uma vez voltou para abrir a porta. Dwight Liston, o elegante e esbelto
gerente de marketing da empresa do pai e sua atraente esposa loira, Frances, não
conseguiram esconder a própria surpresa ao encontrá-Ia. Literalmente, ficaram
de boca aberta. Tal reação aumentou ainda mais a crescente auto-estima de
Audrey. Mas não conseguiu evitara apreensão pelo fato de Elliot não ter ainda
chegado. Olhou por sobre os ombros dos recém-chegados, tentando avistar o
Saab preto, do lado de fora do jardim. Com certeza, ele não a decepcionaria,
pensou angustiada.
Como não percebera nenhum ruído de um carro parando, sobressaltou-se
ante o novo toque da campainha.
— Imagino que pretenda atender novamente, Audrcy? — Lavínia indagou
cm tom cáustico.
— Sim, é o que farei. — Forçou um sorriso amplo, ainda confusa pela nova
atitude da madrasta. — Deve ser Elliot, pois é o único que falta.
Apressou-se para fora do aposento, ainda ouvindo a pergunta de Edward:
— Elliot? Quem é Elliot? Pensei que Audrcy estava saindo com Russell.
Parecia que ainda não era de domínio público seu rompimento com
Russell. Apesar do esforço de Diane.
Mas ela não se importava mais nem com Russell nem com Diane. Sentia-se
aliviada ao alcançar a porta da frente. Mas nada a preparara para as emoções
que dela se apoderaram ao avistar Elliot.
Trajando um elegante smoking negro, ele parecia ainda mais atraente do
que quando o conhecera, trazia um enorme ramalhete de rosas num tom de
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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

amarelo pálido. Feliz, Audrey primeiro fitou as flores, e depois seu convidado. Por
um momento interminável, a expressão de seu rosto foi indecifrável. Mas um
sorriso irônico tomou o lugar da expressão severa.
— Acredito que deveria seguir a carreira de conselheiro de assuntos
femininos — ele gracejou em tom seco. — Audrey, você está deslumbrante. —
inclinando-se para a frente, beijou-a na face. — Feliz aniversário, Cinderela.
— Elliot, muito obrigado por ter vindo — ela agradeceu, emocionada — e
por tudo o mais. — Lágrimas afloraram a seus olhos, enquanto o coração
palpitava de emoção.
— Se você chorar — ele ameaçou —, voltarei atrás, por esses estúpidos
degraus, imediatamente. E observe que não se trata de um pequeno exercício. —
Ele entrou, fechou a porta atrás de si, e estendeu-lhe as rosas.
Em vez de chorar, ela riu. Elliot, seu amigo, viera em seu socorro, mais
uma vez. Aceitaria sua demonstração de bondade, com apreço. Determinara-se a
impedir que outros sentimentos a invadissem, estragando sua noite.
Apanhando as rosas, deu-lhe o braço livre e o conduziu para dentro, para
exibi-lo a todos os convidados. Demorou-se de modo teatral, sob o arco da
entrada da sala de recepção. Numa das mãos segurava as flores, com a outra,
enlaçava Elliot.
— Amigos, apresento-lhes Elliot — anunciou triunfante.
De repente, todos ficaram cm silêncio. Os convidados masculinos
estreitaram os olhos, apreciativos. Suas esposas apenas fitavam surpresas.
Lavínia o analisava, evidentemente chocada, perscrutando o coqjo(*) soberbo e
elegante, num exame de evidente conotação sexual.
Audrey apertava o braço de Elliot com firmeza, sentindo uma pontada de
medo irracional atravessá-la.
— Então, este é Elliot — declarou Lavínia, estendendo a mão com
elegância. — Não conhecemos muito a seu respeito. Audrey mostrou-se
misteriosa sobre seu novo admirador.
A jovem sentiu o braço de Elliot tensionar, numa reação à declaração de
Lavínia. Sentiu-se apavorada.
— E você, deve ser Lavínia — Elliot retrucou, dando-lhe um aperto de mão
formal e indiferente. — Já não posso dizer o mesmo a seu respeito. Audrey falou
muito sobre a maravilhosa madrasta, que você tem sido para ela. Uma verdadeira
mãe, não é mesmo, minha querida?
Audrey sobressaltou-se ante o tratamento carinhoso. Sensibilizada,
respirou fundo e ergueu a cabeça, olhando Elliot com adoração. "Que homem
gentil e generoso!" ela agradeceu em pensamento, o coração transbordando de
felicidade.
Embora ele lhe sorrisse, Audrey teve a impressão de captar um momento
de hesitação. Por um breve momento, ao fitá-lo, ela distinguiu um brilho
preocupado em seu olhar. Mas, ele logo reassumiu o ar indiferente.
Lavínia parecia derrotada. Estava habituada a receber cumprimentos por
sua beleza, não por seu comportamento materno. Elliot abraçou Audrey com
evidente carinho.
— A minha menina não está sensacional, esta noite? — ele indagou,
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sorrindo. — Bem... — ele voltou-se para os demais, descontraído. — Acho melhor


eu me apresentar enquanto Audrey arruma as flores num vaso. Muito prazer,
Elliot Knight — ele se adiantou, completando —, o senhor com certeza é o sr.
Farnsworth, o pai de Audrey...
As horas que decorreram a seguir foram um sonho de prazer indescritível
para Audrey. Elliot se portava como um namorado atencioso, sempre a seu lado,
insistindo em sentar-se junto a ela na mesa e, de modo geral, agia como um
amante apaixonado. Jamais ela imaginara tal situação, nem mesmo em fantasia.
Apesar de estar a par que tudo não passava de encenação, Audrey
desfrutava cada instante. Sentia-se desabrochar ante as atenções que recebia.
Sua usual timidez dera lugar a demonstrações de conversa espirituosa. Os
demais convidados lançavam-lhe, especialmente os homens, olhares de
admiração.
Porém, quando saboreavam a sobremesa, aconteceu algo que colocou a
aniversariante em pânico. Um espetacular bolo de sorvete branco fora trazido, e
Frances Listón comentou que ele lembrava as trilhas de esqui nas montanhas.
Quase imediatamente, Lavínia olhou para Elliot, do outro lado da mesa e
indagou:
— Audrey mencionou que esteve esquiando no último fim de semana,
Elliot. Onde costuma ficar?
Audrey desejou fazer alguma observação inteligente, para mudar o assunto,
mas o receio de ser exposta a impedia de emitir som. Por sorte, Elliot era uma
pessoa intuitiva e inteligente. Antes de responder, lançou-lhe um sorriso
divertido.
— Tenho um chalé à beira do lago Jindabync(*), o que me permite acesso
rápido às pistas de esqui mais próximas.
O pai de Audrey parecia impressionado. Lavínia limitou-se a erguer as
sobrancelhas.
— Você deve ter um bom trabalho, para se permitir um chalé nas
proximidades das pistas de esqui — interveio Edward, sem o menor tato. — Em
qual atividade se ocupa? Ou eu não deveria indagar? — prosseguiu sorridente.
Audrey retraiu-se.
— Sou advogado de incorporações — Elliot admitiu com elegância. — Eu
trabalhava para uma grande companhia internacional, mas, recentemente, recebi
uma considerável herança. Por esta razão, afastei-me por um bom tempo das
atividades normais. Só retornarei à ativa quando sentir tédio. Por enquanto...
— Por enquanto? — Lavínia interferiu irritada.
Audrey sentia-se fascinada, não apenas pelas informações sobre Elliot, mas
também, pela maneira como conseguia sorrir de modo charmoso e sensual.
— Por enquanto — ele se voltou para a madrasta, contemplando-a com o
sorriso espetacular — encontrei outras ocupações muito mais interessantes.
— Devo confessar que o invejo — Dwight observou, atraindo um olhar
contrariado da esposa. — Não precisar trabalhar, quero dizer — ele apressou-se a
explicar.
— Ora, ora, Dwight — Warwick Farnsworth sorriu expansivo —, você ama
seu trabalho. Ficaria louco se não passasse dez horas por dia atrás de sua
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escrivaninha, imaginando aperfeiçoar o marketing de nossos produtos.


— Se vocês não pararem de conversar sobre trabalho e comerem a
sobremesa — Lavínia rebateu — ela derreterá.
Todos atenderam à observação e saborearam o doce em silêncio.
A vivacidade de Audrey cedeu lugar a meros monossílabos. Seus sorrisos
passaram a ser forçados. Se Elliot percebeu a súbita mudança, não deu o menor
sinal. Mas também ele parecia constrangido, como se lamentasse a decisão de ter
comparecido à festa.
Ela entendia seus sentimentos. Também ela desejava, com igual
intensidade, que a noite terminasse logo.
Porém, como um verdadeiro gentelman, Elliot permaneceu a seu lado,
mesmo quando deixaram a mesa do jantar e retornaram ao living. Ali, o bolo foi
cortado e os presentes abertos.
Acabara apenas de agradecer ao pai por um belo anel de safira, aos Hurley
pelo perfume francês e aos Listons pela linda bolsa de noite toda trabalhada cm
contas, quando Lavínia anunciou que o pai ainda lhe reservara uma outra
surpresa. Um presente de aniversário especial para a filha.
Audrcy sobressaltou-se ante a expressão maliciosa da madrasta, saindo de
seu estado de letargia. Uma premonição má a deixou de sobreaviso. Lavínia
parecia um gato que conseguira afinal encurralar um ratinho desvalido.
— Sim? — Audrey perguntou, sobressaltada. — O quê?
— Jamais conseguirá adivinhar — declarou Warwick Farnsworth.
— Nem em um milhão de anos — Lavínia acrescentou em tom suave e
venenoso.
— Você precisará ir lá para fora para ver — avisou o pai. — Venham todos.
Vamos ver o que comprei para comemorar a maioridade de Audrcy.
Audrey sentiu-se tensa ao extremo. Parecia uma estátua de gelo. Rezava
para que não se tratasse de um carro. Seria demasiada insensibilidade, pois ele
sabia muito bem que ela tinha pavor de dirigir. Ele não poderia fazer algo
semelhante.
Elliot segurou-lhe o braço com firmeza. Sobressaltada, encarou os intensos
olhos cinzentos, que pareciam querer enviar-lhe uma mensagem. Não se
preocupe. Estou aqui. Mas o pânico era demasiado grande para receber conforto.
Pela primeira vez durante a noite, sua mente não estava em Elliot. Voltara atrás
no tempo, distinguindo ainda o ruído brusco dos freios... o barulho estarrecedor
dos metais se chocando... seus próprios gritos.
Tinha vaga consciência de Elliot tentando tranqüilizá-la, enquanto a
conduzia no encalço do pai para fora do living, atravessando o hall e saindo pela
porta da frente para o pátio.
E lá estava ele. Ao pé dos intermináveis degraus.
Um carro. Um Magna esporte, em tom vermelho brilhante.
Ela o fitava hipnotizada.
— Seu pai arranjou para que fosse entregue durante o jantar — comunicou
Lavínia sorridente. — Garanto que está surpresa, Audrcy.
Ela permaneceu em silêncio. Lutava para controlar os sentimentos e o
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terror que a atormentava. Como ele pudera lhe fazer isso? Não a amaria ao
menos um pouquinho? Como ousava ele?
— Sei que você sempre declarou que não desejava dirigir um carro — o pai
argumentou, ao perceber seu silêncio embaraçado. — Mas Lavínia e eu
discutimos o assunto e decidimos que já estava na hora de superar o acidente
ocorrido há nove anos. O fato de não dirigir não trará sua mãe de volta. É preciso,
aprender a superar medos irracionais e não sucumbir a eles, não é verdade,
Lavínia? A madrasta anuiu com um gesto displicente.
— Sem dúvida, querido.
Audrey sentia-se mergulhar no pânico e, desesperada, lançou um olhar
súplice a Elliot.
Ele hesitou por uma fração de segundo. Mas, logo, passou o braço pela
cintura esguia, atraindo-a para perto de si.
— Acredito que Audrey não tenha palavras para exprimir sua satisfação,
não é, querida? E tem toda razão, Warwick. Toda moça moderna e independente
deveria saber guiar e, pelo que vejo, o Magna é automático. É formidável, Audrey.
Eu mesmo faço questão de ensiná-la a dirigir, se aceitar.
— Estaria disposto, mesmo? — ela falou, a voz apenas audível, sem
contudo, conseguir esconder a confusão interior.
Elliot reconfortou-a com um sorriso delicado.
— Quem mais? Começaremos amanhã mesmo. Bem, não está na hora de
agradecer a seu pai pelo maravilhoso presente? E a sua querida madrasta.
— É um carro adorável — falou entre os dentes. — Muito obrigado, pai...
Lavínia. É exatamente o que eu desejava.
O enorme sorriso de alívio do pai foi tão caloroso e genuíno que Audrey
hesitou. Talvez se importasse, afinal, ela refletiu. Quando ele se aproximou,
envolvendo-a num comovido abraço, ela sentiu-se profundamente tocada. Acho
que ele se importa, sim. De verdade!
— Estou tão contente, minha querida — ele declarou, afastando-se. — E,
também, aliviado. Para falar a verdade, eu me sentia muito preocupado com o
carro. Mas, Lavínia tinha razão, como sempre. Preciso congratular-me com você
— ele prosseguiu, estendendo a mão à esposa. Lavínia pegou-lhe a mão, mas seu
sorriso parecia esculpido cm cimento. — Bem, todos para dentro — Warwick
convidou. — Está muito frio aqui fora. Vamos entrar e celebrar com um vinho do
Porto.
Audrey e Elliot foram os últimos a entrar.
— Parece que estou sempre lhe agradecendo — ela observou.
Uma estranha calma a dominava. A descoberta da verdadeira per-
sonalidade da madrasta parecia dar-lhe uma nova força. — Mas, muito obrigada
novamente.
— Talvez não diga o mesmo amanhã — ele declarou, ríspido. — Dizem que
os homens jamais deveriam ensinar as namoradas a dirigir.
— Mas eu não sou.. — Audrcy começou a dizer, sobressaltada.
Mas não conseguiu terminar a frase. Ele se inclinou e beijou-a de leve na
boca.

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— Cuidado, estão nos observando — ele advertiu, sussurrando contra seus


lábios. — Não deseja que Lavínia nos surpreenda, não é? — E prosseguiu, mais
alto: — Venha Audrey. Ainda não lhe dei meu presente. Acreditou que receberia
apenas as flores?
Audrey ainda não se recuperara do beijo, quando esta nova surpresa foi
anunciada. Deixou-se levar, quando ele tomou-lhe o braço, e a conduziu para
dentro do living. Ele retirou do bolso uma pequena caixa de veludo, abriu-a e
depositou-a em suas mãos.
Atônita, ela contemplou o extraordinário colar de ouro, sentindo o coração
palpitar desordenado. Não se tratava de presente comum. Devia valer centenas de
dólares. Audrey fitou Elliot, maravilhada.
— Foi por esta razão que eu lhe pedi para só usar brincos de ouro — ele
explicou, displicente. — Deste modo, eu poderia fazer isto... — E retirou o pesado
colar de seu estojo de veludo, e virou-a para colocar-lhe a jóia ao redor do
pescoço.
Ao sentir os dedos tocando sua pele nua, ela sentiu-se arrepiada. Apertou
os olhos, tentando controlara imaginação, impedindo-se de fantasiar qual seria a
sensação desses dedos acariciando seu corpo inteiro.
Mas fracassou.
Quando afinal abriu os olhos, suas faces estavam coradas, o coração
batendo descontrolado. Repreendeu-se pela estupidez ininterrupta de se permitir
fantasias impossíveis. Precisava parar de uma vez por todas de alimentar falsas
ilusões. Sabia muito bem que não era o tipo que poderia interessar um homem
como Elliot. Não era bonita, nem sequer espirituosa. Não possuía nenhum
requisito para atrair uma pessoa de seu nível, um advogado de incorporações.
Advogados belos como ele jamais olhariam para moças como ela. Eles prefeririam
mulheres excitantes, sensuais, de grande experiência. Mulheres como...
Contra a vontade, seu olhar voltou-se para Lavínia.
Audrey já adivinhara que a madrasta não estaria fitando o colar de ouro tal
como os demais. Seus olhos negros estavam paralisados sobre o rosto de Elliot, e
neles se espelhava a inveja que sentia. Não do colar, mas de quem o havia
presenteado.

CAPÍTULO IV

Audrey voltou o olhar para o rosto de Elliot. Tentou ver se ele estava
consciente do desejo expresso no rosto da madrasta. Ele fitou-a por um
momento, de modo estranho. De repente, seu rosto se anuviou.
— Você não gostou do meu presente? — indagou, acenando para o colar.
Antes que ela pudesse falar qualquer coisa, seu pai bateu nos ombros de
Elliot.
— É claro que ela gostou! Mas cuidado, meu amigo. Se começar a
presentear uma mulher com jóias, não demora, e ela o está levando ao altar antes
que você se dê conta.

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— Oh, pai — Audrey repreendeu, corando de embaraço.


— Sim, não seja ridículo, Warwick — interveio Lavínia com brusquidão. —
Eles acabaram de se conhecer. Alem disso, não imagino um homem como Elliot
abandonando seu status de solteiro com tanta facilidade.
— É mesmo, Lavínia? — a voz de Elliot soava fria. — Então ficará surpresa
ao saber que já fui casado uma vez. Audrey não lhe contou? Sou viúvo.
Por um momento dominou um silêncio elétrico entre os presentes, até que
Elliot prosseguiu, sereno, sobre a morte trágica da esposa. Seguiram-se
murmúrios de simpatia, assim como mais algumas questões. Todos ficaram
sabendo que a falecida sra. Knight havia sido a famosa autora de contos infantis,
M.C. Thwaitcs. Audrey lembrava-se de haver assistido a uma entrevista da
escritora na televisão alguns anos atrás, quando um de seus livros havia recebido
um prêmio especial. Parecia pelo menos dez anos mais velha que Elliot.
— Mas ela não estava na faixa dos quarenta anos de idade, ao falecer? —
indagou Alice, fazendo eco com a surpresa de Audrey.
— Sim — Elliot concordou. — Moira era alguns anos mais velha do que eu.
— Mais do que poucos — discordou Edward, com a habilitai falta de tato.
— Você deve ter pouco mais do que trinta.
— Trinta e três, em verdade.
Audrey tentava disfarçar a própria surpresa. Sua mente se agitava. Havia
imaginado Moira como uma criatura feminina estonteante e maravilhosa, a quem
Elliot havia amado apaixonadamente. Uma mulher como Lavínia. Não conseguia
vê-lo perdido de amores por uma autora sem dúvida inteligente, mas de
aparência comum.
Suspeitas desagradáveis invadiram a mente de Audrey. Mas ela logo tentou
rechaçá-las. Elliot não se casaria com uma mulher mais velha e doente visando
simplesmente seu dinheiro. Ou ele o faria? Alem disso, afirmara ter amado a
esposa. Ou teria apenas negado que se casara visando a fortuna da esposa? Ela
não conseguia se lembrar...
O som de uma música rítmica invadiu o aposento, e Audrcy percebeu
fracamente a voz de Lavínia convidando todos a dançarem.
— Pare de se preocupar, mocinha aniversariante — murmurou Elliot a seu
ouvido —, e dance comigo. É o que todos esperam de nós.
— O quê? — ela olhou de relance para o rosto belo e franco de Elliot e
sentiu-se culpada por duvidar de um homem que fora tão generoso com ela. E
ainda estava sendo generoso. — Está bem — ela sorriu com gratidão —, mas não
sou boa dançarina.
— Não se preocupe. Tampouco sou Fred Astaire. Mas enlaçou-a com
segurança e, confiante, dirigiu-a com suavidade para o saguão.
— Desculpe-me — balbuciou, quando tropeçou, pisando-lhe o pé. — Sou
muito desajeitada.
— Não seja tola — ele retorquiu — e apertou-a com mais força.
Logo, ele limitou seus movimentos a um suava balanço, Audrey relaxou,
envolvida pelo calor sensual de seu abraço. Cerrou os olhos, apoiando a cabeça
no peito másculo, desfrutando cada instante. Elliot não escolheria jamais tal
situação. Estava apenas tentando ajudá-la. Porém, ela não precisava se lembrar
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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

disso a todo instante. Tratava-se de sua noite. Se ele podia fingir, então ela
também faria o mesmo.
De repente, a música foi interrompida.
Audrey abriu os olhos, e viu Lavínia ao lado do toca-discos, encarando-a
com frieza, antes de dirigir um sorriso alegre para os demais.
— Warwick acabou de abrir o porto. E há café para quem o preferir.
Audrey pensou ter ouvido Elliot murmurar uma palavra que lembrava, de
algum modo, "mulher vulgar". Mas não estava certa. Quando ele afrouxou o
abraço, sua expressão era glacial.
— Café, minha ladyl — ele sugeriu com um aceno galante, estendendo-lhe
a mão.
Audrey deu uma risada. Mas, qualquer possível prazer durante o resto da
noite, pela companhia de Elliot, foi estragado pelos olhares contínuos da
madrasta. Ácidos para si própria, sedutores para Elliot. Audrey sentia-se
ameaçada, tentando antecipar os movimentos e gestos de Lavínia. Por um
momento, ela sentou-se ao lado de seu "namorado", apoiando a mão, como por
acaso, sobre sua coxa. Elliot permaneceu impassível. Ela desejou arrancar os
olhos da madrasta.
De certo modo alegrou-se quando a festa terminou, logo após a meia-noite,
e os convidados começaram a se despedir, apesar de não desejar separar-se de
Elliot.
Elliot não fazia menção de se despedir, no entanto, e o pai de Audrcy
concluiu que ele desejava ficar um pouco a sós com a filha. Chamou Lavínia,
dizendo que deviam deixar os "jovens à vontade". A madrasta ficou lívida ante a
observação, retrucando com azedume e sarcasmo que não se considerava velha
aos trinta e sete anos. Warwick a ignorou, pegou no braço de Lavínia e a
conduziu para fora da sala.
— Sinto muito, Elliot — ela desculpou-se, respirando fundo. Estavam
sentados no mesmo sofá, uma distância razoável a separá-los. Elliot lançou-lhe
um olhar inescrutável.
— Sente pelo quê?
— Por envolvê-lo nesta situação confusa. Por precisar responder a tantas
perguntas. E por Lavínia.
— Ah, sim, Lavínia... Ela foi um tanto óbvia, não é mesmo?
— Sim — admitiu a moça, sentindo o estômago contrair-se.
— Esperemos que seu pai não tenha percebido.
Audrey fitou-o, enquanto bebericava uma xícara de café. Sem dúvida era
atraente sob todos os pontos de vista. Sua aparência, seu estilo, seu ar de
autoconfiança se evidenciavam. Tampouco se importava de ser tratado como
objeto sexual.
— Isto... isto costuma lhe ocorrer com freqüência? — ela indagou hesitante.
Elliot movimentou os ombros, num gesto de indiferença.
— Digamos que acontece mais do que me agrada.
— E o aborrece? — ela perguntou ríspida, sentindo o ciúme crescer em seu
íntimo.
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— Sim — ele concordou, demonstrando na expressão do rosto enorme


desagrado. Por um momento, ela se alegrou. Mas, logo lembrou-se que havia se
comportado da mesma maneira durante o jantar. Detestava imaginar que Elliot a
colocaria na mesma categoria de Lavínia. Suas faces ficaram ruborizadas. Em
verdade o amava. Descobrira isso no momento em que lhe abrira a porta ao
chegar. Quase gritara de emoção. Mal conseguira se controlar.
Seguiu-se um pesado silêncio, quase tão pesado quanto seu coração.
De repente, Elliot ergueu-se, forçando-a a acompanhá-lo com o olhar.
— Já está na hora de ir embora — ele declarou decidido. — Precisarei de
oito horas de sono para desempenhar meu papel de instrutor calmo e seguro
amanhã cedo.
Ela havia esquecido do carro. Sentiu-se tensa. As aulas de direção. Oh,
Deus... O que seria pior, tentar superar o medo de dirigir ou continuar a ver
Elliot. Ambos lhe trariam dor, seja pelo passado, seja pelo futuro.
Por um momento cerrou os olhos, tentando controlar-se.
— Você não é obrigado a... sabe bem — ela conseguiu falar a voz
estrangulada, os olhos enevoados. — Posso procurar uma auto-escola.
— E o que você prefere? — ele indagou em voz suave.
Ela se esforçava para manter o olhar firme, esconder as emoções que neles
se espelhariam, caso não as reprimisse. O amor, a necessidade, os anseios de ser
querida...
— Não — confessou, sem conseguir mentir. — Prefiro que você me ensine.
Ele não respondeu nada. Limitou-se a fitá-la em silêncio, a expressão
indecifrável.
— Eu sei que você não tem a menor vontade — ela prosseguiu, entristecida.
— Está, mais uma vez, sendo generoso.
— Há algum crime em ser apenas generoso?
— Não. Mas ninguém gosta de ser objeto de piedade! — ela acrescentou
num acesso de franqueza.
— Quem disse que sinto piedade? — ele suspirou frustrado.
— Oh, seja honesto, Elliot, acredita que não sei por que veio ao jantar de
meu aniversário, porque me apoiou e até me deu este belo colar? — tocou o
adereço com mãos trêmulas.
Num acesso de fúria ele a tomou pelos ombros.
— Você não tem a menor idéia da razão pela qual vim a sua festa. Não sabe
nada a meu respeito, exceto o que esteve imaginando em sua cabecinha ingênua.
Não sou um homem generoso, Audrey. Absolutamente. Mas sou honesto. É
verdade que tive pena de você. Por que não? Tem passado situações difíceis, pelo
que pude constatar. Precisou de alguém a seu lado pelo menos uma vez e aceitei
o papel. Mas se imagina que eu seja um galante príncipe encantado, está
totalmente enganada. Posso ser tão ruim quanto qualquer bastardo. Até pior do
que o seu Russell! Ele explodiu numa risada amarga.
— Quer ouvir mais umas verdades? Bem, está com toda a razão. Não tenho
a menor vontade de ensiná-la a dirigir. Nem desejo revê-la nunca mais. Mas não é
pelas razões que inventou, com a ajuda de seu complexo de inferioridade. É bem

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o oposto, de fato. Estou preocupado em acabar seduzindo você, sua tolinha!


Audrey piscou atônita. O que estava ele dizendo? Que a achava atraente,
mesmo desejável? Tal idéia fazia seu coração palpitar desvairado.
— Agora mesmo sinto o impulso maluco de beijá-la. — ele prosseguiu,
apertando-lhe ainda mais os ombros. — O problema é que não conseguiria parar
por aí. Sem perceber, desejaria sentir sua pele macia sob minhas mãos. Seria
levado pelo impulso de acariciar o corpo suave, delicado e ardente de uma
mulher. Precisaria mergulhar em sua carne, perder-me. Tocá-la... saboreá-la.
Audrey estava paralisada. As imagens que ele evocava a mergulhavam num
turbilhão de excitação. O sangue fervia-lhe nas veias.
Por um momento interminável a fitou, os olhos cinzentos brilhando. E,
então, sua cabeça inclinou-se, e ele procurou ávido, pela boca delicada.
Ela abriu os lábios, em silenciosa aceitação. Regozijava-se com a idéia de
que seria beijada.
Mas, de repente, ele recuou, enrijecendo. Estremeceu, retirando as mãos do
corpo que ainda segurava. Recuou um passo atrás.
— Não! — exclamou. — Não posso! Não devo!
— Mas, por que não? — ela irrompeu, tomada por uma onda de desejo. —
Quero que me beije. Quero fazer amor com você — completou, sentindo-se
mergulhada num estranho torpor.
Ele sentia-se tentado. Era óbvio. Seus olhos fitavam a boca cobiçada, o
corpo inteiro vibrando em extrema tensão. A atmosfera da sala parecia carregada
de eletricidade. Audrey prendia a respiração, sem ousar antecipar o que
aconteceria. Estava chocada com a própria franqueza. Jamais havia se
comportado de tal maneira cm toda sua vida!
Mas, no último instante, ele gemeu e afastou-se, passando as mãos
trêmulas nos espessos cabelos negros, tentando acalmar-se. Pronunciou uma
imprecação em voz baixa e afastou-se na direção ao bar. Serviu-se de uma dose
de bourbon.
Audrey o espreitava enquanto ele ingeria a bebida de um só trago. O que
faria a seguir? Mas no momento em que ele se voltou para encará-la, os olhos
furiosamente exasperados, ela recuou assustada.
— Não aprendeu nada com a experiência com Russell? — ele inquiriu
zangado. — Pelo amor de Deus, Audrey, não se ofereça de tal modo a homens que
você nem conhece.
— Mas eu o conheço — ela protestou confusa.
— O que você conhece? — ele contradisse. — Minha idade? Meu status
civil? Minhas qualificações? O que tudo isso lhe revela sobre o tipo de homem que
sou na realidade... em meu interior? Nada!
— Sei que você é bom e generoso — ela insistiu. — Sei que jamais me
magoaria deliberadamente.
— Não prestou atenção a nem uma palavra do que lhe disse, não é? — Ele
riu com amargura, voltando a aproximar-se lentamente, exibindo uma expressão
sardônica. — Não sou nada do que você disse. Estou apenas demonstrando
alguma consciência por ter vivido com uma mulher como Moira. Algo de seu
caráter e retidão devem ter me impregnado. Mas duvido que permaneça. A
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verdade é — ele hesitou, os olhos desviando-se para os seios que se agitavam sob
a fina seda cremosa — que tais qualidades já estão se enfraquecendo.
Ela sentiu o rosto incendiar-se, quando a ponta de seus seios se
intumesceram ante o olhar ávido de desejo.
— Bom e generoso — ele escarneceu. Com um gesto brusco agarrou-a,
apertando-a fortemente. O contraste entre o corpo macio e o rígido era terrível. —
Bom e generoso — ele repetiu, rindo, segurando sua cabeça para trás, com as
mãos poderosas. — Um homem bom e generoso faria isto?
Aproximou a boca ardente. O beijo revelava total falta de controle. Ele se
entregara às próprias exigências, apoderando-se do que desejava. Abriu os lábios
suaves com urgência, aprofundando a língua com agressividade. Ela não opunha
resistência, mas, mal conseguia respirar.
Não se tratava do tipo de beijo que Audrcy imaginara partilhar com Elliot.
Em absoluto. Mas, por mais que se sentisse chocada, ou mesmo assustada, pela
qualidade da violência de tais ações, seus sentimentos não lhe permitiam ficar
insensível. Em poucos segundos passou a corresponder com ardor. Seu próprio
desejo estourava por todos os poros. Seus lábios exigiam cada vez mais, abrindo-
se voluntariamente. Libertou os braços, apoiando-os no musculoso torso
masculino.
Foi a vez dele se sobressaltar, ante a intensidade com que era
correspondido. Por um breve momento, sua boca afastou-se, mas logo
recomeçou, desta vez com mais gentileza. Audrcy percebeu que estava
aprendendo os caminhos da autêntica sabedoria sexual. Elliot passara a seduzi-
la, brincando com a língua em sua boca, as mãos afagando-lhe a cabeça. Seus
dedos acariciam em lentos toques os lóbulos das orelhas, provocando-lhe
arrepios de prazer. Ele continuava a movimentar-lhe a cabeça em diversos
sentidos, explorando-lhe cada vez mais a boca, cada movimento da língua
provocando ondas de calor e de excitação.
Tornava-se cada vez mais difícil pensar. Parecia estar envolvida num
turbilhão de emoções. Tudo fora tão diferente com Russell. Impossível comparar.
Nem remotamente já vivenciara tais experiências.
Ao ouvi-la emitir um gemido profundo, ele estremeceu e apertou-a ainda
mais. Com uma das mãos acariciava-lhe os cabelos. A outra descia lentamente
pelas costas, desde o pescoço ate ás nádegas. Agarrou-a com mais força ainda,
levantando seu corpo e o pressionando contra o seu. Ela pôde sentir sua
excitação física em toda extensão.
Mais uma vez, ele abandonou-lhe os lábios, passando a percorrer o
pescoço, deixando traços úmidos devastadores do caminho percorrido. Quando
ele começou a sugar sua pele, ela pendeu a cabeça para trás, em puro êxtase.
Mais uma vez ele a surpreendeu, erguendo-a nos braços e começando a
transportá-la através da sala.
— Onde fica seu quarto? — ele indagou rouco, já se encaminhando para a
escada.
— É o primeiro aposento, do lado direito — ela gaguejou, mo-
mentaneamente atônita pela rapidez com que tudo se desenrolava.
Apenas quando ele começou a galgar os degraus dois a dois, ela se lembrou
de um impedimento óbvio para o que pretendiam.
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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

— Elliot — ela irrompeu angustiada. — Não podemos!


O evidente desespero na voz o atingiu. Ele se deteve de chofre, filando-a de
modo estranho. Seus olhos pareciam lagos turbulentos, em nada lembrando a
usual sofisticação glacial.
— O que quer dizer? Como não podemos? O que nos deteria?
— Estou em meu período menstrual — ela declarou sucumbida.
— Seu período — ele repetiu como um autômato, cerrando os olhos.
— Sinto muito — ela sussurrou, embaraçada. Será que ele não percebia
que ela também o desejava? Oh, como ansiava por ele!
— Ela sente muito... — ele meneou a cabeça e abriu os olhos. Sua
expressão era terrível. — Deus — suspirou, e a pôs no chão no primeiro patamar.
Voltou-se, e segurou a balaustrada num firme aperto, respirando fundo diversas
vezes. Afinal, após um último suspiro pesado, ele se voltou, aliviando a aasiedade
dela com um sincero olhar de desculpas. — Eu é que deveria estar pedindo
perdão, não você. Não sei o que me aconteceu. Nem mesmo me ocorreu a idéia de
tomar os devidos cuidados contraceptivos. Acredite-me, Audrcy, quando digo que
a mãe natureza acaba de salvá-la de cometer o pior erro de sua vida!
Ela retribuiu-lhe o olhar, o coração partido. Não enxergava as coisas do
mesmo modo. Oh, sabia bem que ele não a amava e provavelmente jamais isto
ocorreria. Mas tampouco podia mudar os próprios sentimentos. Ela o amava, com
ardor. E seria uma felicidade fazer amor com ele. Talvez nada de mais
permanente surgisse, mas ao menos restariam preciosas lembranças.
Mas não... o destino não lhe permitiria a menor concessão à felicidade.
— Foi melhor assim — ele confortou-a com gentileza, acariciando-lhe o
rosto com gestos ternos. — Uma pessoa como você deveria procurar amor. Não
sexo. E a verdade é que sou incapaz de amar, neste momento de minha vida. Dar
a uma pessoa vulnerável como você, uma experiência sexual, sem amor, seria um
crime, especialmente após o que aconteceu com Russell.
Audrey começou a protestar. Pretendia dizer-lhe que não dava a mínima
para o antigo namorado, mas ele a silenciou com o olhar.
— Se acredita que seja fácil para mim — ele prosseguiu lúgubre —, está
muito enganada. O caminho mais fácil seria tomá-la e usá-la e, depois, declarar
que seus serviços não eram mais requeridos e que eu procuraria outra pessoa.
Acrcditce-me. Conheço bem o tipo de homem que age desta maneira. Fui um
deles durante vinte e nove anos e facilmente poderia me reintegrar a tal papel.
Não sinto facilidade em me comprometer.
Audrey piscou os olhos várias vezes, chocada. O que estava falando? Que
antes de se casar agira como um incurável Don Juan? Não conseguia acreditar
que tivesse sido um mulherengo, apesar de sua aparência viril e enorme charme.
Um devasso teria correspondido às evidentes aberturas sensuais de Lavínia. E
não estaria se preocupando com os sentimentos e emoções de uma mocinha.
Talvez já tivesse sido um conquistador em outros tempos. Mas não o era mais.
Suas ações falavam mais alto que as palavras.
— Está me ouvindo, Audrey? — ele irrompeu impaciente.
— Sim — ela gaguejou.
— Não parece. Deixe-me colocar em termos claros. Não dormirei com você.
33
Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

Serei seu amigo, se ainda o desejar. Creio que você não dispõe de muitos. Mas,
por favor, não complique as coisas apaixonando-se por mim. Seria mais um
fracasso, após o ocorrido com Russell. Dê tempo a si própria para situar os pés
na realidade, antes de partir para um novo romance. Outro homem há de
aparecer, no momento adequado. Alguém de sua idade, que a amará de verdade e
não a magoará. Enquanto isso...
— Enquanto isso — ela repetiu, o coração palpitando.
— Enquanto isso tomarei os devidos cuidados para não cair sobre você
novamente — ele declarou, o rosto marcado por uma expressão cínica. — Você é
uma garota sensual, fácil de ser excitada. Por qual razão Russell afirmou que
você era insípida na cama, não faço a menor idéia! Talvez precise começar a
praticar/ogg/rtg(*)... ou, talvez...
Audrey sentiu o estômago contorcer-se. Percebia que ele avaliava se não
seria o caso de arranjar uma amante. Alguém muito experiente, que lhe
preencheria as necessidades sexuais e asseguraria que ele agisse apenas como
um amigo "seguro" em relação a ela.
A desolação a invadiu. Não precisa fazer isto, desejava gritar-lhe. Não sou
mais tão jovem, ou tão inexperiente e ingênua. Conheço os perigos. Sei que você
só deseja sexo. Compreendo. Só desejo ficar a seu lado e confortá-lo. Não rejeite o
meu amor. Não o deixe enfraquecer e terminar, sem ser desfrutado, plenamente
realizado...
Mas ela apenas fitava o belo rosto, as palavras explodindo no coração. Nada
disse. Seu suspiro desolado despertou Elliot do próprio devaneio.
— É melhor você ir para a cama, Audrey — ele aconselhou. — Parece muito
cansada.
Ela anuiu resignada, detestando-se pelo próprio silêncio, embora
reconhecendo que de nada adiantaria oferecer-se como amante para Elliot. Ele
recusaria. Ela tentava convcnccr-sc dc que ele estaria tentando protegê-la de
mágoas futuras. Mas, uma voz familiar em seu íntimo, sussurrava que se ela
fosse realmente bela e sexy, ele não conseguiria afastar-se com tanta facilidade.
— Não precisa incomodar-se em me acompanhar até a saída — ele
declarava. — Conheço o caminho. Às dez, amanhã, será muito cedo para você?
— Poderia, por favor, vir às onze? — ela indagou hesitante. Tinha o
pressentimento de que demoraria muito a adormecer, apesar do cansaço.
— Combinado, às onze, então — ele concordou, adiantando-se para beijá-la
ligeiramente na testa. — Boa noite, querida aniversariante.
Audrey o observou afastar-se, o coração mergulhado em tristeza.
— Oh, Elliot — ela suspirou. Voltou-se, então, dirigindo-se ao quarto de
dormir.
Estava certa. Levaria muito tempo até conseguir pegar no sono.

CAPÍTULO V
34
Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

— Você é mesmo imprevisível, Audrey, envolvendo-se com um homem


desses! — Lavínia irrompeu pela cozinha. Parecia uma visão sensual, envolta em
um roupão de veludo púrpura, os longos cabelos negros caindo além dos ombros.
Audrey reprimiu um gemido. Ergueu os olhos da xícara de café, para o
relógio de parede. Receava estar atrasada. Aos sábados, a madrasta raramente se
levantava antes do meio-dia. Mas não. Eram apenas dez e quarenta e cinco.
— Você acordou cedo — comentou, ignorando o comentário sobre Elliot.
— Não consegui pegar no sono de novo, depois que Warwick fez tanto
barulho ao acordar, antes de sair para o jogo de golfe — retrucou a madrasta, de
mau humor. — E agora estou com dor de cabeça. — Procurou no armário sobre a
geladeira alguns comprimidos e tomou-os com um copo de água. Audrey
continuou sentada em seu banco, junto à mesa de breakfast, sorvendo o mais
rápido possível seu café. Após as descobertas da noite anterior, sabia que Lavínia
não descera apenas para tomar aspirina. Havia um bom suprimento do remédio
no seu banheiro. E, francamente, não estava afim de agüentar o comportamento
ambíguo e as manobras de uma pessoa que não merecia sua confiança.
Mas não conseguiu ser rápida o suficiente. Antes dc escapar, Lavínia
postara-se do outro lado da mesa, fitando-a de modo displicente.
— Então, não vai me contar nada sobre o enigmático sr. Knight? —
provocou.
Audrey levantou os ombros de modo o mais indiferente possível.
— Não há nada para contar. Acredito que Elliot tenha respondido a todas
as questões durante a minha festa.
— Não concordo. Ele só mencionou fatos comuns. Seja franca, Audrey,
qual é o seu jogo?
— Jogo? — ela repetiu, sentindo-se ruborizar. — O que está querendo
dizer?
— Bem, você devia saber perfeitamente bem que um homem como ele seria
um choque para seu pai e para mim. Vamos enfrentar a verdade. Ele não é o tipo
de pessoa que esperávamos. Nós nos esforçamos o melhor possível para esconder
nossos sentimentos. Mas ele tem idade demais para você, sem mencionar outros
fatores.
Audrey filou a madrasta, refletindo que ela não escondera seus sentimentos
em absoluto. Lavínia se comportara como uma gata no cio.
— Oh! — exclamou, incapaz dc conter-se. — Papai gostou de Elliot. E você
também, sem dúvida alguma.
Por um breve momento Lavínia desconcertou-se. Mas logo voltou à carga.
— Bem, é claro que gostamos dele. O sr. Knight é encantador. Mas nada
sabemos sobre sua vida pessoal, isto sem falar de seu estranho casamento com
uma mulher mais velha que era muito rica. Pode-se imaginar que talvez tivesse
ocorrido um rápido divórcio, caso a pobre esposa não tivesse morrido. — Lavínia
prosseguiu sem piedade no negro olhar: — Você já deve ter pcasado(*) que Elliot
Knight não passa de mais um Russell em sua vida.
Audrey respirou fundo, tentando controlar o palpitar desordenado do
coração. Lutou para recuperar a calma.
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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

— Um outro Russell? — conseguiu indagar. — Receio não ver nenhuma


semelhança entre os dois.
— Oh, pobre querida, pensei que tivesse compreendido. Russell estava
apenas atrás de seu dinheiro. Seu pai e eu adivinhamos desde o início.
— Se é assim, por que não me advertiram? Por que você e papai me
deixaram no escuro?
Ao se ver abertamente confrontada, Lavínia arregalou os olhos, surpresa.
— Bem, não desejávamos magoá-la, querida. Além disso, Warwick
acreditava que lhe faria bem sair um pouco e se divertir.
— Está querendo me dizer que papai tolerava que um gigolô me seduzisse,
visando a fortuna da família, somente para que eu tivesse alguns encontros? Que
surpreendente! Precisarei pedir-lhe que me explique seu raciocínio, quando voltar
para casa. Acho que ele deveria ficar furioso por empregar tal vigarista em sua
empresa!
— Bem, é claro que não ocorreu a Warwick que Russell a seduziria, Audrey
— Lavínia retrucou.
— Oh? Então, está querendo me dizer que, segundo meu pai, um homem
como esse cafajeste sairia comigo durante vários meses e não tentaria nada! Que
lisonjeiro!
A madrasta a fitava, sem a reconhecer. Parecia, de repente, outra pessoa.
— Não... ele e eu... Bem, o fato é, minha querida, que tranqüilizei seu pai a
esse respeito. Ele estava muito preocupado com você, e achei melhor acalmar
seus receios. Afiancei que você me contara que Russell agia como um perfeito
gentelman.
Audrey acalmou-se. A idéia de que o pai se importava com seu bem-estar,
revelava que ele a amava, afinal de contas. Não fora negligente, como imaginara.
Mas a raiva contra Lavínia só fez aumentar. Porém estava aprendendo a
usar tal sentimento de modo positivo. Reforçava sua decisão de ser ela mesma,
não se deixar influenciar por conselhos capciosos.
— Mas, por que fez isto, Lavínia? Porque afiançou que meu namoro era
puramente platônico? ...
— Eu... bem — a agitação da madrasta era evidente, tanto pela voz
gaguejante, como pelo rubor da face. — Não desejava preocupar Warwick — ela
confessou, endireitando a cabeça num gesto altivo. — Você sabe como são os
pais. Eles se preocupam com assuntos desse gênero.
Audrey estava a ponto de negar qualquer conhecimento do assunto,
quando Lavínia sorriu. Mas tratava-se de um sorriso dissimulado, que provocou-
lhe arrepios de cólera.
— Mas, nós mulheres, em verdade não nos importamos de fazer amor com
homens como Russell — ela contemporizou. — Crápulas podem ser muito
excitantes, não é? Homens como Elliot...
— Elliot não é um crápula! — Audrey defendeu, perdendo por um momento
a compostura.
— Não? — Lavínia riu novamente, uma sensação de triunfo perpassando
pela voz. — É evidente que você não o conhece. Com certeza ainda não esteve

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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

com ele na cama, ou não faria uma afirmação tão ingênua. — Olhou a enteada
com ar de piedade. — Não se iluda.
E com estas derradeira palavras, ela se retirou. Audrey não conseguia
controlar o tremor. Miserável! Ciumenta, invejosa!
Ainda estava sentada, tentando controlar a raiva e a dor quando, alguns
segundos após, o relógio do avô bateu às onze horas. Quase ao mesmo tempo,
soou a campainha.
— Deve ser Elliot — ela gemeu.
Que diferença da noite anterior, quando se alegrara tanto com sua
chegada. Sentia-se desesperada. A custo levantou-se do banco e se dirigiu com
relutância para a porta. Não fosse por Lavínia, ela lhe diria que mudara de ideia,
e que preferia aprender a dirigir numa auto-escola. Terminaria portanto a
amizade que podia lhe trazer a inda mais tristeza. Mas não suportava a idéia de
dar esse gosto para a madrasta.
Mas, ao alcançar a porta da frente, ocorreu-lhe uma idéia que eliminaria o
problema de Lavínia por completo.
Porém, uma vez mais, a visão de Elliot a distraiu. Usava tramtng(*) azul-
marinho, com gola de capuz e camiseta branca por baixo. Parecia mais sexy que
nunca. Talvez a barba por fazer lhe desse esse ar viril. Ou seriam os cabelos em
desalinho, caindo sobre a testa. Ou as roupas informais, chamando a atenção
para o corpo atlético, desde os ombros largos, até os quadris estreitos e as pernas
longilíneas e musculosas.
Uma série de lembranças veio à tona. A sensação daquele corpo forte a
enlaçá-la a invadiu.
— Bom dia, aniversariante — ele saudou, os olhos cinza sorridentes. —
Belo dia, não? O sol brilhando. Sem vento. O melhor tempo do inverno em
Sydney. Acordei às sele, e pratiquei jogging. Hei — ele a fitou de perlo. — Não
parece tão animada. Tem certeza de que deseja começar hoje a aprendera dirigir?
Posso voltar amanhã.
— Não — ela afirmou resoluta. — Inútil adiar o desagradável.
— É desta maneira que pensa a meu respeito? — Elliot riu — Como
desagradável?
— Não se trata de você, Elliot. Refiro-me a aprender a dirigir. Devo adverti-
lo, no entanto, que talvez eu seja inapta a qualquer forma de aprendizagem.
— Impossível! — ele exclamou sem hesitação. — Você é o tipo da aluna
rápida. — Seus olhos passearam um momento por seu rosto e cabelos, antes de
descerem para admirar a camiseta cor de pêssego. — Você demonstrou muita
sensibilidade, mantendo seu cabelo para o alto, bem como usando uma
maquilagem neutra e descobrindo que cores em tom pastel a favorecem muito
mais do que as cores muito vivas.
Audrey sentiu-se ruborizar de prazer. Ao acordar, havia examinado seu
guarda-roupa, jogando fora tudo o que não lhe agradava. Decidira vestir a
camiseta simples que Elliot admirara, e seu jeans favorito, cinza stone-washed.
Porém ele fitava o jeans de sobrecenho carregado.
— Estas calças compridas, no entanto — ele acrescentou aborrecido —,
sugiro que você os deixe no armário, no futuro, quando sair comigo.
37
Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

Audrey sentiu-se atordoada. Desalentada. Acreditara que a peça lhe caía


muito bem. Gostaria de usá-la em todos os momentos e em todos os lugares.
— O que há de errado com meu jeans? — ela indagou sobressaltada. —
Você com certeza não é do tipo clássico, que aprecia mulheres apenas de saia e
vestido! Acontece que gosto dele, e pretendo usá-lo em qualquer lugar e cm
qualquer ocasião.
Era a vez de Elliot se surpreender. Sua vacilação era visível. Audrey não
sabia se o que o chocara fora a acusação de antiquado, ou se derivava de sua
reação ante a observação sobre a roupa. Mas não se importava. Estava cansada
de ser confundida por conselhos alheios. Talvez tivesse sido sua culpa, por
demonstrar total falta de autoconfiança. Mas esta atitude pertencia ao passado.
No futuro, tomaria sozinha as próprias decisões, em todos os aspectos de sua
vida. E se cometesse erros, paciência! Ao menos seriam seus erros.
— Que aconteceu? — ele inquiriu. — O que deu em você hoje?
— Nada — ela murmurou suspirando. — Desculpe-me, Elliot. Acho que
minha disposição hoje não é das melhores.
— Não precisa se desculpar. Está tudo bem. Em verdade prefiro esta nova
atitude. Apenas me surpreendeu descobrir que a doce e tímida Audrey encontrou
seu lado vivo e fogoso. Sem mencionar a coragem de agir segundo as próprias
convicções.
— Bem, este é um cumprimento não muito lisonjeiro — ela protestou.
— Meu Deus! — ele retrucou — e ainda não acabou! — Acho que precisarei
de uma armadura para me defender.
Ela estava decidida a manter a atitude beligerante, mas, ao fitá-lo,
percebendo sua expressão divertida, ela mudou de rumo.
— Você é um mesquinho! — ela acusou, porém sorria também.
— Nunca! — ele contradisse.
— E é um mau juiz de roupas. Este jeans me cai muito bem.
— É verdade — ele concordou, apertando os lábios, enquanto o olhar
descia mais uma vez para o lugar em que o tecido acentuava cada curva das
pernas bem torneadas. — É esse o problema.
Seu olhar continuou a vagar, detendo-se sobre os seios, arfantes sob a
camiseta de algodão.
Tomada pela surpresa, ela mal conseguia respirar. Elliot não fazia o menor
esforço para ocultar seu desejo.
"Ele me quer, mesmo", ela pensou, atônita.
Ele exibia uma expressão carrancuda, como se a mesma idéia lhe tivesse
passado pela mente.
O momento carregado de eletricidade foi interrompido pelo ruído da porta
sendo completamente aberta atrás de ambos.
— Audrey! O que você está fazendo aí fora, com a porta meio aberta? Está
criando uma corrente de ar... Oh, é você Elliot — irrompeu Lavínia, fingindo total
surpresa. Estendeu a mão de unhas pintadas de vermelho forte, enquanto a
outra passava pelos longos cabelos negros, jogando-os para trás, num movimento
sensual. O peignoir entreaberto, deixava uma parte dos seios à mostra. — Não
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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

sabia que você havia chegado. Acabo de sair da cama.


Audrey perscrutou o rosto da madrasta, perfeitamente maquilado. Não lhe
escapou o exótico perfume, exalando em ondas eróticas. Qualquer mulher
perceberia as intenções de Lavínia.
Audrey sentiu-se atormentada pelo ciúme, ao perceber que ele fitava o
decote da madrasta. Os olhos que, alguns segundos atrás, brilhavam de desejo
por ela, haviam mudado de objeto. Bem feito, por que imaginara ser a única a
atraí-lo? Quanta ingenuidade!
Ele se voltou para ela, exasperado. Percebera sua expressão fixa, e se
aborrecera. Não demonstrava o menor senso de culpa.
As palavras de Lavínia voltaram a sua memória. Afirmara que Elliot era um
Casanova e que jamais se interessaria por sua pessoa. Claramente, a madrasta o
considerava um devasso do ponto de vista sexual.
Apesar do que estava acontecendo, Audrey rejeitou tais idéias sem
hesitação. Não! Não podia ser nada disto. Agira como um gentleman, quando a
vira cm apuros, e na noite da festa. E também soubera se controlar, na noite
anterior, quando estivera tão excitado. Um devasso teria procurado dobrá-la ao
próprio prazer, encontraria alguma alternativa para satisfazer a luxúria.
Tal pensamento trouxe seu olhar de volta a Lavínia, que continuava a
flertar descaradamente com Elliot.
— Precisa vir jantar conosco uma noite dessas, quando não tivermos outros
convidados — ela convidava. — Nós apreciaríamos muito sua companhia.
"Está querendo dizer que você amaria recebe-lo", pensou Audrey, sentindo
adorar uma mistura de raiva selvagem e pânico. "Deus, por favor, não permita
que tal ocorra", ela rezou angustiada. "Que nada disso aconteça", suplicou.
— Eu gostaria muito — Elliot agradeceu suave. — Telefone-me um dias
desses, e poderemos coordenar as datas. Agora, com licença, preciso me dedicar
a esta senhorita que vai aprender a dirigir. Tem as chaves, Audrey?
— Estão lá dentro, sobre a mesinha do hall de entrada.
— Bem, então as apanhe, doçura. Não disponho do dia inteiro.
— Vai sair mais tarde? — ela ouviu a madrasta indagar, enquanto se
apressava pelo hall.
— Não tenho compromissos fora de casa. Pretendo acompanhar as corridas
de cavalo desta tarde.
— Oh, é um jogador! — Lavínia parecia deleitada. — Adoro pessoas que
jogam. São tão carismáticas.
— Realmente? — Elliot deu uma risada seca — eu as considero estúpidas.
Não, não sou um jogador. Herdei uma parcela na posse de um cavalo de corrida,
e como não me agrada ser ignorante, estou fazendo um curso rápido sobre o
assunto antes de freqüentar sua primeira corrida no sábado próximo.
Ele começou a descer as escadas e Audrey o acompanhou, afastando-se de
Lavínia.
— Que excitante! — prosseguia a madrasta. — Onde serão as corridas?
— Em Roschill. Pretendo levar Audrey — ele comunicou, passando o braço
pelos ombros da moça.
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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

Por sorte, ela já estava se habituando à presença de espírito do


companheiro e reagiu sem demonstrar a menor surpresa.
— Sim, mal posso esperar.
— Sinto não poder convidá-la, nem a Warwick, Lavínia — ele prosseguiu. —
Mas seremos convidados de alguns amigos meus em sua cabine particular.
Talvez em alguma outra ocasião...
— Sim, é claro — Lavínia aquiesceu com um sorriso tenso, mas Audrey
percebeu uma ponta de ressentimento em seu olhar. Agradeceu, no íntimo, a
Elliot, por ter aberto uma saída honrosa.
— Venha, Audrey — ele chamou, fazendo questão de guiá-la com extremo
cuidado pelos degraus íngremes, como se ela fosse uma flor extremamente frágil,
que necessitasse de sustentação especial.
— Não acha que está exagerando? — ela indagou-lhe sarcástica.
— Talvez...
Ele parecia estar se divertindo imensamente, representando o galante
apaixonado. Pela primeira vez, Audrey acreditou que, talvez, de fato, não
conhecesse os motivos pelos quais ele a estava ajudando. Talvez não fosse nem
bondade, nem piedade. Talvez ele apreciasse o simples fato de representar. Ou
lhe agradasse enganar os demais...
Uma sensação desagradável tomou conta de seu coração, enquanto o
observava abrir a porta do passageiro para ela, com um estranho sorriso no
rosto. Ele havia afirmado que ela nada conhecia a seu respeito, e tal fato ficava
cada vez mais evidente quando se encontravam. Uma corrida de cavalos fora
mencionada! Qual seria a próxima surpresa?
— Audrey, entre!
— Para onde vai me levar?
— Para algum lugar bem isolado, onde não encontraremos outros carros.
— Isolado?
— Exatamente. Seu carro ainda não foi licenciado, e nada podemos fazer
esta manhã. Isto quer dizer que deveremos nos manter afastados das principais
estradas. Alem do mais, você ainda está longe de poder enfrentar um tráfego
normal. Vamos, entre logo. A perversa bruxa bem que está torcendo para que
algo de ruim aconteça.
Audrey arregalou os olhos, chocada, e voltou a cabeça para o alto. Mas não
avistou Lavínia, que já havia entrado.
— Tudo bem, talvez ela não a deseje morta — ele prosseguiu — mas, um
pouco deformada, ela não se importaria.
Cinco minutos se passaram antes que Audrey tivesse a possibilidade de
pronunciar uma palavra. Elliot dirigia o Magna com segurança, tentando chegar
a um lugar "isolado". Mas os pensamentos de Audrey não se concentravam mais
em Elliot, ou em seus motivos ocultos, ou mesmo nas lições de direção. Fixavam-
se na mulher que influenciara sua vida nos últimos nove anos, trazendo-lhe
apenas desvantagens. Lavínia minara sua autoconfiança, enfraquecera sua auto-
estima, tomara-a insegura até quanto ao amor do pai. E Elliot parecia acreditar
que ela lhe desejava inclusive que um mal físico a acometesse.

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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

— Não consigo entender nada — ela declarou, agitada. — Por que ela me
detesta tanto?
— Mulheres como Lavínia não detestam — Elliot pronunciou seguro. — Isto
pressuporia certa capacidade de amar. Elas competem. Com todas as outras
fêmeas que apareçam em seu círculo. Elas querem, ou melhor não, necessitam
ser o centro da atenção. Elas acreditam que isto só ocorra em função de sua
aparência. Lavínia veria qualquer mulher como uma ameaça potencial, Audrey. E
você, mais que ninguém.
— Mas nada disto faz sentido! — Audrey explodiu. — Como poderia eu
competir com a aparência de Lavínia? Quero dizer... nunca serei tão bonita como
ela.
— Oh, eu não diria tal coisa. Você estava muito atraente ontem à noite. E
você também é jovem, suave e inocente. Atributos que ela jamais voltará a
possuir. Além disso, há muitos tipos de beleza, Audrey. Sem dúvida, Lavínia
possui uma beleza marcante, mas um tanto notória. Alguns homens não
apreciam tal tipo.
— Você parecia apreciar, há pouco, na porta de casa — ela rebateu, sem
conseguir se controlar.
Elliot diminuiu a velocidade num sinal amarelo, lançando-lhe um olhar
sardónico, quando o carro parou.
— Eu já estava esperando sua reação. Vi que se surpreendeu pelo fato de
eu fitar os seios que despontavam através do peignoir entreaberto. Ouça, sou um
homem norma, Audrey. Consigo admirar a obra da mãe-natureza ao produzir
uma bela mulher, sem no entanto esquecer que se trata apenas de uma simples
fachada. Nada mais. Prefiro ir para a cama com você, meu amor, e não com sua
madrasta.
— Apreciaria que você não fizesse tal tipo de comentário — ela gaguejou,
sentindo as faces ruborizarem.
— Por quê?
— Bem eu... eu.. — ela não conseguiu terminar, aborrecida pela sua
insensibilidade em não poupá-la.
— Porque ainda quer fazer amor comigo? — ele ajudou calmamente.
Ela enrijeceu.
— É melhor que você o reconheça. Ou poderei imaginar que ainda não
decidiu assumir o controle de sua vida.
Ela se voltou, encarando-o. Surpreendeu-se com a calma de seu olhar. Ele
tinha razão. De que adiantava resolver ser diferente, se ainda agia da mesma
maneira?
— Sim — ela confessou, mas, a voz soava estranha, parecia de outra
pessoa.
— Sim, o quê? — ele apressou-se a perguntar, os olhos brilhantes.
— Sim, ainda desejo que façamos amor.
Sentiu-se satisfeita ao conseguir anunciar seus desejos em voz firme e
segura.
Ele sustentou seu olhar por um tempo que parecia enorme. O silêncio
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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

dentro do carro tornara-se pesado.


— Não estou certo que você não seja mais uma tola, Audrey Farnsworth ou
a mulher mais ambígua que já conheci. Só Deus sabe como você me confunde.
Não sei se desejo beijá-la, ou colocá-la de bruços em meu colo e dar umas boas
palmadas em seu traseiro. Mas acho que terminarei na cama com você, sua
deleitável raposinha arteira.
Ele emitiu um som exasperado. Ela apenas o fitou, entre surpresa e
divertida. Deleitável, raposinha? Ela?
— Preste atenção — ele falou —, não sei por quanto tempo conseguirei
representar o nobre gentleman com você, Audrey. A única coisa que reconheço é
que gostaria de levá-la imediatamente para algum lugar, e fazer amor a tarde
inteira. Mas, depois, eu me sentiria culpado.
Riu com gravidade.
— Bem — prosseguiu — acho que quem mais se surpreende com meu
problema de consciência, sou eu mesmo. Mas sei que não pode durar. — Ele se
voltou no banco, fitando-a com olhos ardentes. — Para dizer a verdade, minha
atitude cavalheiresca está começando a me irritar. Por que me contenho, indago a
mim mesmo? Ela não é mais uma criança, nem tampouco uma virgem! Se não for
eu, será algum outro. Jamais vi um pêssego tão maduro, aguardando ser
saboreado!
Ele a fitou, reparando nas faces coradas, os olhos dilatados, a boca
trêmula.
— Farei um trato com você — ele propôs afinal. — Se ainda se sentir do
mesmo modo, quando obtiver sua carteira de habilitação de motorista, eu a
levarei para minha casa na montanha, para um fim de semana. Somente nós
dois. Nada de esquiar. Apenas sexo. O que você decide?
Audrey não conseguia pronunciar uma palavra. Seus olhos estavam baixos,
voltados para o chão do carro, exprimindo confusão.
— Ao menos nessa oportunidade — ele sussurrou — Russell estará
completamente esquecido e eu não sentirei que estou me aproveitando de seu
recente rompimento.
Audrey ergueu lentamente os olhos, para fitá-lo. Se alguém lhe tivesse dito,
momentos atrás, que Elliot se ofereceria a ela como amante, e que ela o
recusaria, teria dito que tal pessoa estava louça.
— Então — ele insistiu. — Diga alguma coisa, por favor. Não é o que
deseja?
— Não — foi o máximo que ela conseguiu pronunciar.
— Não? — ele repetiu, franzindo as sobrancelhas. — O que quer dizer, não?
— Significa — ela clareou a garganta — que não estou interessada num fim
de semana desmoralizante.
— Desmoralizante? — ele repetiu, zangado.
Ela começou a fraquejar. Que está fazendo, sua idiota? Repreendeu-se. Não
está na hora de uma atitude santa. E então, se ele deseja apenas sexo, que há de
mais? Diga que irá, que um par de dias de pura luxúria é exatamente o que está
procurando.

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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

— Você... você afirmou que eu deveria procurar pelo amor, Elliot — ela
explodiu. — Não apenas sexo.
— Sim, bem, isso foi ontem à noite — ele murmurou, lançando-lhe um
olhar cínico. — Acho que me deixei levar pela minha atitude de cavaleiro galante.
Hoje a história é diferente, especialmente com você usando esses jeans tão justos!
— Seu olhar passeou pelas coxas onde a calça se ajustava como uma segunda
pele. — Olhe Audrey, não pode esperar...
Elliot interrompeu-se, quando os carros atrás começaram a buzinar,
protestando. Há muito tempo, pelo jeito, as luzes tinham se acendido no verde.
Ele murmurou algo baixinho e o carro saltou para a frente, aos solavancos.
— É ridículo... Eu sabia que não devia me envolver com você. Sabia que
seria um erro. Talvez você não seja uma virgem, mas ainda é uma criança, uma
criança tola e ingênua, brincando de mulher, me provocando e então...
— Elliot — ela gritou, ao perceber o Magna desviar-se, aproximando-se
perigosamente de um caminhão no outro sentido.
Desta vez ele não se limitou a resmungar. Praguejou alto e em bom som,
retomando o carro à pista, num pequeno espaço entre dois carros. Na primeira
oportunidade, desviou para uma transversal sossegada, e freou bruscamente.
Desligou o motor. Voltou-se para Audrey, encolerizado.
Mas não pronunciou nenhuma palavra de admoestação, pois ela parecia
paralisada, o rosto branco como um fantasma. Tremia como uma folha.
— Oh, meu Deus — ele resmungou. — Esqueci que você passou por um
acidente traumático. Desculpe-me. Que idiota sou!
Ele soltou ambos os cintos de segurança, e aninhou-a o melhor possível
nos braços, considerando-se o exíguo espaço da parte da frente do carro.
— Vamos, reaja, está tudo bem, não aconteceu nada, estamos salvos, o
carro está parado. Elliot está aqui... tomarei conta de você.
E tudo recomeçou. De repente, ele estava acariciando seus cabelos.
Levantou-lhe o queixo e beijou-a, suspirando resignado.
Audrey gemeu. Percebia que estava se desviando de sua recusa anterior.
Correspondia à linguagem corporal. Sua ansiedade em abrir os lábios a traíam.
Sentia as carícias sobre os seios e quase soluçou de prazer quando ele provocou
uma maravilhosa raeção de um dos bicos.
— Elliot — ela gritou, lutando para respirar.
— Mmm? — ele apenas desviou a boca para devorar-lhe a orelha, sem
interromper sua intenção erótica. Já conseguira desabotoar a blusa, continuando
a esfregar o bico intumescido através da seda do sutiã.
— Ainda não podemos — ela conseguiu dizer.
— Eu sei...
— Pare... por favor.
— Não — ele reagiu. — Não, enquanto você não me prometer um
relacionamento total comigo assim que tiver obtido sua habilitação de motorista.
— Está bem, prometo qualquer coisa. Mas pare com isto.
— Não quero — ele queixou-se.
— Você não está sendo justo.
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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

— Nem você.
— Elliot, por favor...
Ele deixou-sc reclinar no assento, liberando-a. Ela tremia quase tanto como
no início.
Elliot suspirou, frustrado, mais uma vez.
— Sinta-se livre de mudar de idéia, Audrey — ele declarou tenso. — Não
vou cobrar-lhe uma promessa realizada sob pressão sexual. Não sou tão
bastardo.
Audrey cerrou os olhos tensa. Sua cabeça ainda girava. As acusações
iniciais de Elliot voltaram-lhe à mente. Ele afirmara que ela estava brincando de
mulher, reduzindo-o em frangalhos... E não era exatamente isso o que voltara a
ocorrer?
Já estava na hora de amadurecer, ela decidiu. Já era tempo de entender
que há uma diferença entre o que se quer e o que se pode ter.
— Não mudarei de idéia — cia afirmou resoluta. — Eu o desejo Elliot. Acho
que sempre o quis, desde o primeiro instante em que nos conhecemos. — A voz
traía um ligeiro tremor.
Ele surpreendeu-se ao ouvir tal declaração. Depois pareceu preocupado.
— Sei que você está preocupado. Imagina que eu tenha ficado abalada por
meu rompimento com Russell — ela apressou-se a explicar. — E é admirável de
sua parte. Mas, você não é meu guardião, Elliot. Você mesmo afirmou que o
principal fator para eu decidir ir para a cama com um homem deveria ser a
minha vontade e decisão. Bem, quero fazer amor com você, mais do que jamais
acreditei possível. Mas não sinto apenas desejo por você, Elliot.
— Por favor — ele interrompeu abrupto —, não vá dizer que me ama!
— Não tenho a menor intenção de dizer tal coisa. — E ela não o fez. Não
arriscaria o pouco que conseguira dele. — Eu apenas estava tentando explicar
por que não gosto de reduzir nosso relacionamento a um simples fim de semana
de sexo. Desejo mais para nós dois. Eu... realmente gosto e admiro você, Elliot.
Você tem tarimba social, é sofisticado e muito seguro de si mesmo. Tudo o que
jamais fui ou tive, mas amaria alcançar. Acho que posso aprender muito se
passar algum tempo com você.
Nesse momento, os olhos do companheiro deixavam transparecer uma
ironia irreverente, que a feria.
— Você está falando de modo geral, Audrey? Ou estamos de volta ao sexo?
Ela sentiu-se reconfortada por não corar demasiado. Sua boca devolveu-lhe
um riso intencionalmente provocador.
— Acredito que algumas lições nesse departamento me fariam muito bem.
— E imagina que eu seria um instrutor ideal? — foi a vez dele rir.
— Sim, muito — ela anuiu.
Seus olhos se abriram depois estreitaram, desejo inegável faiscando de
suas profundezas.
— E qual lição deseja iniciar esta tarde? — ele inquiriu, rouco. Uma
sensação de poder invadiu Audrey ao ouvir o tom rouco de Elliot, percebendo sua
excitação. Se ele a desejava tanto, então ela era uma mulher desejável, uma
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mulher pela qual valia à pena esperar.


— Acho Elliot — ela declarou com nova autoconfiança —, que sua ideia
original é a melhor. Primeiro aprenderei a dirigir. E, depois, prosseguiremos com
as demais intenções.
— Meu Deus, sem dúvida alguma você progrediu bastante desde ontem à
noite! Eu a aconselhei a assumir a própria vida, mas não precisa exagerar comigo
doçura. Você poderá descobrir que o tigre que leva pela cauda é mais forte do que
você!
Por um momento ele a fitou e, de repente, soltou numa alegre risada.
— Quem teria acreditado? Levado ao xeque-mate por uma simples aprendiz
do jogo. Declaro que não disponho de opção, sendo um gentleman — ele afirmou,
provocando-lhe calafrios —, devo ceder com graça. Mas, permita-me acrescentar,
aprenderá a dirigir em tempo recorde! Ainda que precisemos praticar pela manhã,
à tarde e à noite!

CAPÍTULO VI

— Surpreendente! —- Elliot exclamou. — Simplesmente surpreendente.


— É mesmo — concordou Audrey, sem falsa modéstia. Apenas seis dias
haviam decorrido desde aquele sábado memorável e ela já podia dirigir confiante
no tráfego. E nesta manhã ela conseguira fazer uma manobra em marcha ré sem
a menor falha.
Sem dúvida, fora uma surpresa que ela, apesar de todo o nervosismo e
receios, estar se saindo uma excelente motorista. Embora Audrey suspeitasse que
grande parte do mérito coubesse ao instrutor.
Após preveni-la que estava disposto a ensiná-la manhã, tarde e noite,
incansavelmente, ele assumira um ar sério e a levara a sua casa para tomar café.
Declarara que a primeira lição podia esperar até que ele conhecesse a natureza
exata do acidente em que ela estivera envolvida.
Audrey assustara-se ante a perspectiva de ficar a sós com ele, logo após a
explosiva manifestação de erotismo, mas Elliot não a tocara durante o trajeto. Ao
contrário, ele a tratara com gentileza profissional; do modo como um psiquiatra
agiria; e, logo, ela sentiu-se relaxar. Começou a contar-lhe como acontecera o
acidente que matara a mãe, de que maneira o pai dirigia na ocasião: um poderoso
carro esporte; como os pais haviam discutido por razões de dinheiro e que ele se
irritara, aumentando a velocidade. Estivera chovendo e o carro havia derrapado,
batendo num poste. A mãe tivera morte instantânea. Ela própria havia escapado
com sérias contusões. O pai sofrera apenas um arranhão no cotovelo.
Elliot compadeceu-se pelo acidente e por seus receios de dirigir, mas
comentou que ela deveria sentir-se menos nervosa atrás de uma direção que a
seu lado.
Ele a acalmou com o pensamento que dirigir, constituiria uma outra forma
de controlar a própria vida c que confiança na direção dependia de aptidão. Por
isto era importante receber instrução adequada.

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E ele se provou um excelente professor, levando-a passo a passo, sem


pressa, usando elogios profusos e encorajamento todas as vezes que ela acertava,
e apenas ralhando com carinho quando ela sentia dificuldades. Alguns dias mais
tarde, Audrey adquiriu coordenação das mãos e pés com incrível suavidade e
ambos se surpreenderam.
Naturalmente, as lições haviam sido longas e freqüentes. Haviam passado a
maior parte do domingo praticando. E Elliot a apanhara todos os dias, uma hora
antes do trabalho e todas as tardes, para outra hora de prática após o expediente.
Nesta manhã de sexta-feira, havia ocorrido o teste mais difícil, pois estivera
chovendo de leve, trazendo lembranças tristes do acidente. No entanto, ela
obtivera êxito.
— Logo estará pronta para submeter-sc ao teste — ele declarou, lançando-
lhe um olhar significativo.
Ela sentiu o coração disparar.
Ele não a tocara durante a semana inteira. Mas, cada minuto que
passavam juntos era carregado de tensão sexual intensa. De ambas as partes.
Algumas vezes, percebendo os olhares devoradores de Elliot, ela começara a
ter esperanças de que ele estaria se apaixonando. Mas, ela sempre afastava tais
pensamentos tolos.
Elliot só lhe dera a entender que continuava estimulado por um forte desejo
sexual. Mais nada interferira em sua disposição. E era evidente que estava há
muito tempo carente.
Embora tivesse passado a usar o cabelo erguido para o alto, e vestisse
roupas de tom pastel, Audrey não se sentia o tipo de mulher que conseguiria
cativar um homem contra a sua vontade.
No entanto, tinha consciência que uma pessoa da classe e estilo de Elliot,
apreciava que suas companheiras de cama lhes fossem fiéis. Ela acreditava que
sua pouca experiência constituísse um atrativo à parte.
Mas, e após a consumação do ato? Ele continuaria motivado? Enquanto o
desejo de ambos estava em compasso de espera, Audrey sentia crescerem seus
temores e dúvidas. Seria capaz de agradá-lo na cama? Era difícil esquecer os
comentários mordazes de Russell sobre sua falta de atrativos. E se ele estivesse
com a razão? Com o antigo namorado, quando se despia, sentia-se, sempre muito
inibida e tímida. Também não sentira prazer no alo. Para ela, toda a experiência
havia sido sempre confusa e frustrante.
E se o mesmo ocorresse com Elliot? Mesmo que ele conseguisse inflamar a
mulher que existia cm suas fantasias, será que esta mulher seria comparável às
demais que ele havia conhecido?
Embora a primeira esposa não tivesse sido maravilhosa, devia ter sido uma
mulher muito sensual. Mulheres mais velhas possuíam mais experiência.
Bastava observar Lavínia para acreditar nisso.
— Vou marcar um teste para você na próxima semana — Elliot a informou.
— Caso você falhe, poderá fazer outro na semana seguinte.
— Talvez seja ainda muito cedo para me submeter a um teste — ela disse,
preocupada ante a perspectiva de dirigir ao lado de um estranho. — Não há
pressa, há? — acrescentou sem refletir.
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Ele lançou-lhe um olhar reprovador.


— Não brinque, Audrey. Sabe muito bem que há pressa. Mais uma semana
com estas aulas e eu estarei subindo pelas paredes. Não há mais jogging ou
chuveiros frios suficientes para me acalmar.
— Oh... — ela ruborizou-se. — Nunca imaginei que a situação poderia ficar
tão grave. Acho que desconheço muito a respeito dos homens e de seus corpos.
— Bem, não é um grave defeito — Elliot resmungou. — Se eu desejasse
alguém promíscuo, não estaria junto a você.
Audrey o filou em silêncio e ele retribuiu o olhar. Um sorriso sexy
despontou em sua boca e ela sentiu-se triste.
— De certo modo, esta espera é divertida — ele confessou. — Como uma
criança, contando os dias para o Natal. — Seus olhos se estreitaram ao
passearem pelo corpo bem-feito. — Apreciarei desnudá-la, Audrey, como um
menino com um brinquedo novo.
As faces de Audrey coraram. Como sempre, Elliot conseguia ser muito
evocativo ao falar sobre sexo. Mas, embora se sentisse excitada, não podia evitar
um certo desalento em ser comparada a um brinquedo. Também não a lisonjeava
ser descartada como um brinquedo, alguns dias após o Natal.
— Para quando está planejando nosso fim de semana na neve? — ela
indagou com voz embargada.
— Dentro de uma semana. Partiremos na sexta-feira, depois do seu
trabalho.
— E se eu for reprovada no teste? — ela indagou, umedecendo os lábios
ressecados.
— Neste caso iremos de qualquer maneira — ele anunciou decidido. — Se
eu não precisasse assistir às estúpidas corridas de cavalo amanhã,
provavelmente eu cederia à tentação e a levaria ainda neste fim de semana. Agora
chega de conversa. Ponha o motor desta carroça cm funcionamento, antes que eu
comece a me envolver em idéias proibidas!
— Como estão evoluindo as aulas de direção? — indagou Edward, quando
passou ao lado de sua mesa, uma hora mais tarde.
— Muito bem.
Ele se deteve junlo à porta que conduzia a seu escritório, franzindo a testa.
— Espero não perder você, Audrey. É uma excelente secretária. Audrey
sentiu-se satisfeita. Acreditava ser uma boa profissional, mas era a primeira vez
que o chefe a elogiava.
— Por que me perderia? Não vou à parte alguma.
— Homens como Elliol Knight não permitem que suas esposas trabalhem
— ele afirmou sem preâmbulos.
Audrey espantou-se, e respirou sobressaltada, antes de rir e retrucar o
mais seca possível.
— Pelos céus; Edward. Você parece meu pai. Ele não pára de me perguntar
quando anunciarei as datas. Elliot e eu somos apenas bons amigos!
O chefe fitou-a pensativo.
— Um homem não ensina uma mocinha a dirigir sem alguma outra razão,
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Audrey. Em geral há outro motivo bem definido. Já lhe ocorreu que Elliot Knight
possa estar interessado em seu dinheiro? Afinal de contas, ele já foi casado com
uma rica esposa.
Audrey enrijeceu o corpo, ultrajada. Em verdade, Edward podia levar a
falta de tato meio longe, algumas vezes.
— Não penso que...
— Peço desculpas pela minha rudeza — ele interrompeu —, mas, sei que
seu pai não a advertiria.
Audrey confundiu-se ante tal assertiva.
— Por que ele não o faria? — conseguiu indagar, hesitante. Edward voltou-
se, caminhando devagar para sua mesa, a pasta na mão.
— Porque ele não acha que seja errado um homem desposar uma mulher
por dinheiro.
Audrey sentiu um aperto na garganta.
— Você é uma moça atraente, Audrey — prosseguiu o chefe com a máxima
gentileza. — Muito mais atraente do que eu leria imaginado. Você desabrochou
tarde. Merece mais que os Russells deste mundo. Aliás, talvez lhe interesse saber
que despedi Russell ontem.
Audrey quase engasgou pelo choque.
— Eu o apanhei surrupiando no estoque de carros. Não posso admitir esse
tipo de coisas. Também demiti Diane.
— Diane? Mas, com certeza ela não estava furtando, também?
— Não. Mas ela parecia exercer uma má influência num membro muito
digno de meu staff. Uma semana atrás eu sugeri com sutileza que ela se sentiria
mais feliz trabalhando em outro lugar.
Audrey não sabia o que dizer. Jamais lhe ocorrera que o chefe se
importasse com sua felicidade.
O sorriso de Edward era caloroso.
— Como já expliquei, não desejo perdê-la, Audrey. Além disso — seu
sorriso se ampliou, usando o máximo de charme —, preocupo-me com meu
trabalho. Já vejo você dirigindo a empresa um dia desses.
— Eu? — ela se surpreendeu.
— Sim, você tem tino para administração e organização. Também possui
instinto para máquinas. Você conhece mais sobre computadores, impressoras e
copiadoras do que qualquer outra pessoa. Até conseguiu consertar sozinha uma
máquina de escrever na semana passada... Aposto que será uma excelente
motorista.
— Sim, chegarei lá — ela confirmou, exprimindo orgulho e confiança na
voz.
— Ótimo! Apenas uma coisa, entretanto — ele sentiu-se no dever de
acrescentar—, não entregue o coração muito depressa ao instrutor. Quando ele
começou a se afastar, ela se ergueu de chofre(*).
— Edward! — chamou.
— Sim? — ele se deteve, voltando-se com ar sério.

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— Por que você disse isso sobre Elliot? Está a par de algo que eu
desconheço?
— Em absoluto. Mas, tenho a impressão que você também o conhece muito
pouco. Que sabe a respeito de sua família, seu passado, sua situação?
— Não muito — ela admitiu devagar. Nada, em verdade, ela percebeu,
sentindo um sobressalto doentio.
— Então, você já deve começar a perguntar, antes que seja demasiado
tarde.
O conselho de Edward não saiu da cabeça de Audrey o dia inteiro. Em
nenhum momento acreditou que Elliot estivesse atrás de seu dinheiro. Se assim
fosse, ele a teria perseguido desde o início. No entanto, ela deveria informar-se
mais sobre o homem com quem pretendia ir para a cama dentro de uma semana.
O amor não precisava ser tão cego.
Quando encontrou Elliot esperando do lado de fora do escritório,
pontualmente às quatro e meia, ela não se encontrava com vontade de praticar
na direção.
— Elliot — propôs, ao entrar no carro — será que poderíamos cancelar a
aula esta tarde? Seu olhar era penetrante.
— Claro. Alguma razão particular?
— Sim, eu... — de repente ela sentiu-se incapaz de prosseguir. Havia
decidido fazer-lhe todas as perguntas que a atormentavam. Mas não podia. Nem
queria. Talvez fosse uma covarde, mas receava descobrir algo que a impediria de
passarem o próximo fim de semana juntos. Ela reconhecia que era estúpido e
fraco de sua parte, mas não podia evitá-lo.
— Eu, bem, marquei hora no cabeleireiro — ela inventou desesperada. —
Como você me pegará amanhã às onze horas para irmos às corridas, não disporei
de tempo. Preciso aproveitar esta tarde. Ficam abertos ate às nove da noite, nas
sextas-feiras.
Ele lhe lançou um olhar preocupado.
— Que pretende fazer com seus cabelos?
— Ainda não estou certa. Acho que vou cortá-los, e mudar a cor também.
— Sim, acho que seria uma boa idéia.
— Não estava pedindo sua aprovação — ela cortou brusca.
— Hum, como está melindrosa hoje! Teve um mal dia no escritório?
— Absolutamente — ela mentiu, com um tom que a flagrou. — Edward
contou-me que Russell foi despedido, e que Diane também sairá do emprego. Eu
não poderia sentir-me mais feliz.
— Ah, entendo. — Elliot falou em tom seco.
Ela evitava olhar para seu lado, embora fosse evidente que ele não estava
entendendo nada. Imaginaria talvez que ela estaria aborrecida porque Russell
partiria? Na verdade, sentia-se zangada consigo própria por não conseguir fazer
simples perguntas a Elliot. O que receava? Elliot sempre fora honesto com ela.
Tudo bem, ele não gostava de falar a seu respeito. E daí? Muitos homens eram
deste jeito.
— Qual o caminho para o seu cabeleireiro? — ele indagou brusco.
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— Basta deixar-me no fim da rua Ncwport, próximo à banca de revistas.


Havia ali perto uma pequeno salão, entre duas arcadas. Audrey já o
percebera várias vezes. Raramente estava cheio e ela tinha certeza que
conseguiria ser atendia sem hora marcada. Uma vez que havia apresentado tal
desculpa, não via razão para não prosseguir. Um dia precisaria tomar
providências sobre seus cabelos. Por que não esta tarde?
— Voltarei de táxi para casa — informou.
— Não quer que eu venha buscá-la?
— Não, obrigado. Não faço a menor idéia de quando ficarei pronta. Vá para
casa e estude seus formulários. Não tenho a menor idéia sobre corridas de
cavalos e dependerei de suas sugestões amanhã.
Ele sorriu com gosto.
— Cuidado, poderá estar falida ao fim do dia, amanhã, embora eu imagine
que a herdeira dos Modern Office Supplics não precise se preocupar. Acabo de ler
no Financial Times que trata-se de uma empresa em ascensão, com lucros
crescentes a cada ano que passa. — Audrcy sentiu-se alerta.
— Oh? Costuma ler o Financial Times? — Ele deu de ombros, indiferente.
— Durante algum tempo havia perdido tal hábito. Mas acho que já estava
na hora de voltar ao trabalho. O jornal de sexta-feira traz muitas ofertas.
Audrey silenciou. Elliot estaria voltando a trabalhar por que precisava de
dinheiro? Já teria dissipado a herança da esposa?
Inúmeras perguntas estavam na ponta de sua língua. De onde vinha ele?
Quem eram seus pais? Como havia encontrado a esposa? Ele a teria amado?
— Está bem aqui? — ele indagou, aproximando-se do meio-fio e
estacionando.
— Sim, ótimo — ela confirmou. Abriu a porta e estava saindo quando
sentiu a mão de Elliot sobre o ombro.
Voltou-se devagar, fitando-o. Ele era devastadoramente belo. Belo e sexy,
mas demasiado enigmático para sua paz de espírito.
— Sim? — ela indagou, os enormes olhos castanhos projetando a
inquietação que a atormentava.
— Nada — ele respondeu com suavidade. — Apenas isto... — ele inclinou-
se e a beijou.
Era o primeiro beijo desde o trato que haviam firmado no sábado anterior e
ela não pôde evitar a idéia que talvez se tratasse de um beijo com alguma
finalidade, destinado a obscurecer em vez de clarear, seduzir em vez de
apaziguar.
Mas, a sensação de seus lábios era puro paraíso. Ela suspirou em sua
boca, encontrando sua língua a meio caminho, aceitando com prazer a deliciosa
exploração. Antes que pudesse perceber, estava apertando sua camisa e atraindo-
o para mais perto.
Elliot terminou o beijo. Afastou-a, ardente de desejo. Ele acenou-lhe uma
fria despedida, os olhos flamejantes num rosto esculpido em granito.
Ela o observou partir, de repente consumida por real alarme. Teria sido o
beijo um ato deliberado para mantê-la presa a seu encanto, pois ele estaria
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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

temendo perdê-la? Mas tais idéias eram ridículas! Ela estava imaginando coisas.
Edward pusera idéias em sua cabeça, idéias que não se baseavam wm fatos.
Elliot talvez não fosse um santo, mas era honrado w ela o amava. Ela o amava w
desejava. E, o mais importante, ela o possuiria. E nada, absolutamente nada,
interferiria em seu caminho!

CAPÍTULO VII

Audrcy chegou em casa depois das nove horas da noite. Estava subindo as
escadas, quando foi surpreendida por Lavínia. A madrasta, carrancuda, ficou
ainda mais lívida ao deparar o penteado de Audrcy.
Mas já estava preparada para tal reação. Substituíra a permanente
exagerada por uma ondulação suave e um corte moderno, que lhe emoldurava o
rosto. Os cabelos se repartiam de lado, e formavam uma curva ao lado das
orelhas e das faces. A nova cor, um cálido loiro, lustroso e dourado, realçava sua
pele.
— Meu Deus! — Lavínia exclamou zombeteira, os olhos negros faiscando.
— O que você fez nos cabelos?
— Nada — retorquiu alegre. — Em verdade foi tudo obra de meu novo
cabeleireiro.
— Muito esperta, Audrey — A mulher sorriu com desdém. — Devo declarar
que a sua maioridade não melhorou em nada seus modos. Ou talvez seja efeito
da companhia atual. Mas creio que deva nos informar quando não vem jantar. A
pobre Elsie cozinhou em vão para você!
— Tentei telefonar do instituto de beleza. Mas a linha estava sempre
ocupada. Além disso, você me havia dito que jantaria fora com papai e Elsie
sempre vai a um cinema nestas ocasiões. Não imaginei estar perturbando
ninguém.
— Bem, seu pai precisou ficar em casa, aguardando algumas ligações
internacionais de negócios.
— Como poderia adivinhar, Lavínia?
— Adivinhar o quê? — indagou uma voz masculina.
A expressão da madrasta mudou completamente ao avistar o marido. A
agressividade dissipou-se, dando lugar à timidez.
— Sobre nossa permanência em casa, querido — ela continuou — Parece
que Audrey não saiu com Elliot. Ela foi ao cabeleireiro.
Warwick Farnsworth escrutinou(*) a filha sorridente.
— Sem dúvida ela foi! Audrey querida, como está diferente! Se tivesse
passado na rua a seu lado não a teria reconhecido. Está tão diferente, com a cor
loira. Mais velha... sofisticada.
— Obrigado, papai. Também gosto muito de minha nova aparência.
Entretanto Lavínia não aprovou.
Ele fitou a esposa com estranheza.
— Não sei por que ela não aprovaria. E percebo que também andou fazendo
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compras. — Ele acenou para inúmeras sacolas de plástico que ela carregava.
— Sim. Amanhã acompanharei Elliot às corridas. Achei que seria a ocasião
de estrear uma nova roupa.
Warwick pareceu surpreso.
— As corridas? Corrida de cavalos ou de carros?
— De cavalos. Lavínia não lhe contou? Elliot possui uma parte na posse de
um cavalo, uma égua chamada Little Girl Pink.
— Não. Ela não me contou nada. — Sua boca exprimia tensão ao trocar um
olhar com a esposa. Era o primeiro leve indício de que o relacionamento, entre os
dois não ia bem. Mas Audrey não sentia nenhuma simpatia especial pelo pai. Ele
desposara uma mulher por dinheiro e outra por sexo. Nenhuma das duas razões
ela louvava.
—-Bem, vou subir. Preciso preparar muitas coisas antes de dormir. E foi o
que fez.
O tempo passado no instituto de beleza fora proveitoso. A dona do salão era
muito amiga da gerente da butique ao lado. Trocaram idéias e, enquanto ela
secava os cabelos, diversos trajes foram exibidos para sua apreciação. Escolheu
novos vestidos e conjuntos, e, também, acessórios, combinando. Também fora
persuadida a maquilar o rosto com o esteticista do salão e, em conseqüência,
adquirira uma série de cosméticos e artigos de beleza.
Audrey entrou no quarto e esvaziou todas as sacolas sobre a cama. Tratou
de arrumar primeiro os potes e frascos e escovas sobre a penteadeira. Depois,
sentou-se junto ao espelho, admirando sua nova aparência.
Naturalmente, a principal mudança estava nos cabelos. Mas, apreciava
também a maneira como o esteticista contornara suas sobrancelhas. Quanto aos
olhos... pareciam maiores sob o efeito das sombras bege e marrom. Sem
mencionar o efeito do rímel nos cílios.
Acompanhou com as mãos, o contorno das faces, sem reconhecer-se. Uma
aplicação correta de blush as realçava. A boca também parecia menos infantil,
pois o delineador e o batom brilhante produziam um efeito adulto. Audrey
avaliou-se. Será que sua aparência poderia ser considerada sexy? Ou ela estava
indo longe demais em suas expectativas? Talvez pudesse se considerar
sofisticada. Sim. Era esta a palavra. Elliot aprovaria? Sentiu o estômago contrair-
se.
Mergulhou na cama, rolando sobre as costas e rindo de felicidade. Elliot...
Saltou fora da cama, sentindo nova onda de alegria ao avistar-se mais uma
vez no espelho.
— Me aguarde, Elliot Knight!
— Não acredito! — exclamou Elliot, assombrado, fitando Audrey, que saía
de casa, fechando a porta atrás de si com firmeza.
— Não gostou? — indagou, porém consciente do brilho de admiração no
olhar perplexo.
— Não gostei de que, deseja saber? — ele indagou rindo. — Dos cabelos, do
rosto, ou do vestido deslumbrante?
Ela corou de prazer.

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— Acho que me refiro a tudo.


Ele contemplou a fila de botões negros que se iniciava no decote em "V" do
vestido de lã creme e descia ate à bainha. A roupa combinava magnificamente
com os cabelos dourados bem cortados e o rosto perfeitamente maquilado. Antes
que ele pudesse pronunciar uma palavra, ela ergueu o chapéu de palha que
segurava e o colocou com graça sobre a cabeça.
— E o que acha deste complemento? — ela sorriu, ainda mais confiante.
— Fantástico! — ele declarou, meneando a cabeça atônito. Também ele
estava muito bem, elegante num terno cinza claro e camisa de seda branca.
Havia se barbeado com cuidado, exibindo o rosto macio e atraente em toda a sua
plenitude. Os cabelos estavam penteados com cuidado. Nenhum anel rebelde
estava fora de lugar. Os faiscantes olhos cinza brilhavam no rosto incrivelmente
belo.
"A esta mesma hora, na próxima semana", lembrou-se Audrey, com uma
pontada no estômago, "concretizaremos nossa relação".
— Se passasse por mim na rua, você me reconheceria? — ela perguntou,
para se distrair dos pensamentos perturbadores.
— É claro!
— Oh, de verdade? — ela provocou. — Meu pai garantiu que não me teria
reconhecido.
— Doçura — ele garantiu com um sorriso sexy —, eu reconheceria seus
olhos ainda que disfarçados. E essa boca... — tocou de leve o lábio em que
brilhava o batom de cor bronze. — Não saia de perto de mim, hoje, querida — ele
sussurrou. — Não pretendo quebrar os dentes de algum jogador afoito se ele
tentar levá-la na conversa. Agora, retire o chapéu e venha. Seu futuro a aguarda.
— Meu futuro? — ela enrijeceu por um instante, piscando nervosa.
— As corridas, então — ele falou risonho.
Mas Audrey imaginou que ele se referira a alguma outra coisa. As
advertências de Edward espoucaram(*) em sua mente e ela lançou a Elliot um
olhar preocupado. Acreditava que ele não havia planejado nada de antemão. Mas,
observando sua nova aparência, não estaria revendo suas idéias e tomando a
decisão de desposá-la? Pelo seu dinheiro?
Sentiu-se abalada por não conseguir descartar tal hipótese.
— Ainda não me recuperei da surpresa por sua estonteante aparência —
ele declarou, abrindo-lhe a porta do Saab preto.
Audrey devolveu-lhe um sorriso contraído, mas ele não pareceu perceber.
Estava de excelente humor. E isto a preocupou ainda mais. Talvez ele apenas se
sentisse melhor por apresentar uma Audrey Farnsworth mais bem produzida a
seus amigos.
Ela jamais descobriria muito sobre Elliot, se se limitasse a ficar calada.
Mas não conseguia encontrar as palavras adequadas. Nem a coragem para
pronunciá-las.
Elliot conversou sem parar, durante todo o trajeto até Roschill.
Audrey não entendia a razão de tanta animação.
Ela se confortava com a idéia de que ele não poderia forçá-la a desposá-lo,

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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

se esse fosse seu plano. Ela poderia sentir-se apaixonadíssima, e estar preparada
para entregar-se a com ele. Mas enquanto não o conhecesse melhor, sua relação
não passaria desse patamar.
Logo divisaram a pista de corridas, o enorme campo relvado contrastando
com as chaminés das fábricas vizinhas e seus telhados.
Audrey jamais estivera em Roschill. Já freqüentara Randvvick(*) em um dia
de Derby, quando o pai havia sido convidado por uma de suas relações
milionárias. As corridas pareciam ser prestigiadas por pessoas desse gênero.
Proprietários abastados, ou homens de negócios muito ricos, a quem agradava
impressionar eventuais clientes, proporcionando-lhes um dia de entretenimento
magnífico junto ao esporte dos reis.
Os amigos de Elliot seriam pessoas desse tipo?
Tais reflexões lhe provocaram extrema agitação. Mudara de aparência. Para
muito melhor. Porém, não se transformara, da noite para o dia, numa pessoa de
traquejo social. Obter sucesso, jantando com pessoas amigas era bem diferente
de precisar conversar com estranhos.
— Elliot! — ela não conseguiu se conter mais.
— Sim?
Ele parecia distraído, concentrando-se em manobrar com cuidado no
estacionamento cheio de carros. Um atendente dirigia os veículos para diversos
lugares, embora nem todos obedecessem. O carro a sua frente, por exemplo,
começou a dar marcha a ré. Audrey entrou em pânico.
Elliot resmungou impaciente, virando a direção para o lado e abrigando-se
num espaço livre entre um Mercedes azul escuro e um Rolls-Royce prateado.
Embora a jovem se sentisse aliviada, a visão das pessoas bem vestidas saindo
desses carros, só fez aumentar-lhe o nervosismo.
— Elliot — ela repetiu.
— Sim? — ele desligou o motor e retirou as chaves do contato antes de se
voltar para ela.
— Não me contou nada sobre as pessoas com quem ficaremos. Quem são?
— Co-proprietários do cavalo. Gente simpática. Não precisa se preocupar.
— Mas estou muito preocupada — ela repeliu tensa. — Gostaria ao menos
de conhecer seus nomes e um pouco a seu respeito. — Quero dizer. — ela deu de
ombros desanimada.
Ele virou-se para apanhar os formulários das corridas e os binóculos que
estavam no banco de trás.
— O sr. Nigel Evans e sua esposa serão nossos anfitriões. Conheço a ambos
muito bem. Nigel era o editor de Moira. O nome da mulher dele é Yvonne. O outro
casal é Bill Dayton e sua esposa Joyce. Possui uma gráfica. Estará presente mais
um casal de sobrenome Gregson. O nome do marido é Mike, mas esqueci o da
esposa. Helen, acho. Na verdade, são mais amigos de Moira do que meus — ele
explicou. — Lillle Pink Girl, a égua, pertencia a ela. Cavalos jamais foram minha
paixão, como pode imaginar.
Audrey tentou ignorar a informação sobre as "paixões" da ex-esposa, e,
respirando fundo, encarou-o com firmeza.

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— Não. Não imagino nada. Como poderia? Desconheço tudo sobre Moira.
Ou sobre seu casamento. Andei me perguntando quando você esclareceria mais a
este respeito. Antes, ou depois que dormirmos juntos.
Audrey sentia-se orgulhosa por ter conseguido, afinal, exprimir suas
dúvidas, embora sentisse as mãos tremerem descontroladas.
— Em nenhuma das duas ocasiões — ele declarou exacerbado.
— Por que não?
Ele adiantou-se, olhando-a irritado.
— Pelo amor de Deus, Audrey. Não vejo o que meu casamento com Moira
tem a ver conosco. Está terminado. Deixe tudo como está! Levei um ano para
superar meu sentimento de culpa em relação a Moira! Não quero tocar no
assunto.
— Culpa? — ela balbuciou. — Culpa por quê?
— Pela sua morte — ele explicou tenso. — Audrey sentiu-se aliviada. —
Sempre me censurei por estar ausente há tanto tempo quando ela adoeceu. Eu
sabia que não estava bem e não deveria ter partido.
— Partido para onde? Onde você estava?
— No exterior. Na Europa. Tinha sido chamado para colaborar no
planejamento das competições de esqui que ocorreriam no ano seguinte.
Audrey o fitou surpresa. Ele notou sua expressão e reagiu sério.
— Já lhe contei que eu esquiava. Em verdade, costumava esquiar
profissionalmente. Sou bastante conhecido nos círculos internacionais desse
esporte.
— Oh... bem, eu não estava a par.
— Por que estaria? O esqui não é objeto de grande publicidade na Austrália
e já não participo há alguns anos.
— Mas eu já deveria ter perguntado sobre você mesmo antes — ela
declarou, franzindo a testa.
— Sim, acho que você deveria — ele a examinou. — Está perguntando,
neste momento?
Ela sentiu o coração disparar, mas agüentou firme.
— Sim... — anuiu.
— Neste momento?
— Sim.
Ele suspirou, aparentemente divertido.
— Você escolhe momentos bem estranhos, Audrey, meu amor. — olhou de
relance para o relógio. — Suponho que posso lhe fazer um breve resumo.
Vejamos... Sou filho único. Meu pai abandonou minha mãe quando eu era ainda
um bebê. Minha mãe morreu logo após minha formatura do ginásio. Consegui
uma bolsa para a universidade e esquiava durante as férias. Tornei-me um
advogado, trabalhei e economizei. Aos vinte e sete anos, parei de trabalhar
durante dois anos, dedicando-me ao esqui em tempo integral. Aos vinte e nove,
esmaguei meu joelho direito numa queda e abandonei as corridas. Retomei à
Austrália, voltei ao trabalho, conheci Moira numa festa. Logo começamos a viver
juntos e depois nos casamos. Você sabe o resto.
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— Você abandonou todas as outras mulheres — Audrey insistiu, segurando


a respiração — as que você mencionou até completar vinte e nove anos?
Ele riu constrangido.
— Minha querida e doce Audrey, se eu enumerasse todas as minhas
conquistas passadas, ficaríamos aqui para sempre.
Ao perceber que ela se chocara, ele a fitou com um sorriso sardônico.
— Você já sabia disso. Nenhuma das mulheres com quem dormi, se
arrependeram. Por que o faria eu? Será que a choquei? — ele riu de novo. —
Parece que sim. Bom. Você tem o mau hábito, minha doçura, de me olhar com
óculos cor-de-rosa. — Deveria me acreditar quando afirmo que minha única
virtude referente às mulheres é meu comportamento em relação a você.
Ela o fitou. Isto significaria que ele se casara com Moira por dinheiro? Ou
que lhe havia sido infiel?
— Se está desiludida, deve culpar a si própria. Não deveria ler produzido
essa aparência extraordinária e tão sexy.
Audrey acreditava estar preparada para o beijo, desta vez. Imaginava que
conseguiria dominar sua reação. Mas o pulso se acelerou rápido, antes que os
lábios se tocassem. Seu interior ansiava pelo tumulto de sensações que surgiriam
inexoravelmente.
Ela gemeu sob a pressão áspera dos lábios, pela invasão da língua
exigente. Seu coração parecia explodir. A mente girava. Era o pior lado do amor.
Compulsivo, obsessivo, louco. Não prestava atenção à razão. Ou às advertências.
Mesmo quando as advertências provinham do próprio ser amado. Foi Elliot quem
se afastou.
— Acho que é melhor a gente ir andando — ele declarou com uma risada
seca — ou arriscamos não chegar jamais!

CAPÍTULO VIII

Dadas as circunstâncias, a meia hora seguinte decorreu


surpreendentemente bem para Audrey. Só precisava dissimular sua falta de
traquejo social, o que a deixava nervosa. E, também, sua agitação sexual. Para
atenuar o primeiro problema, Elliot tentou ajudar, servindo-lhe uma bebida, do
pequeno bar existente no fundo do reservado particular. Mas, quanto ao segundo,
sua atuação revelou-se cm sentido contrário. Manteve-se a seu lado, sem afastar-
se por um momento sequer, apoiando as mãos, ora em sua cintura ora na curva
do quadril, enquanto as apresentações eram feitas.
Entretanto, ele estava certo num ponto. Os amigos de Moira eram muito
simpáticos. Em nada lembravam o esnobismo ou a afetação de muitas pessoas
ricas. Aceitaram com naturalidade a nova namorada de Elliot, o que a
surpreendeu.
Quando Elliot partiu com Nigel, um pouco antes da primeira corrida, para
fazerem algumas apostas, as duas mulheres ficaram juntas.
— É formidável ver Elliot voltar a sair de novo, após a morte de Moira —

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comentou Yvonne. — E com alguém tão jovem e bonita. Nigel e eu temos estado
muito preocupados a seu respeito. Suponho que esteja a par de seu enorme
sofrimento pela morte da esposa.
Audrey confirmou, mas sua mente fervilhava pela ênfase que a
companheira dera à palavra jovem.
Yvonne, num gesto de afeição, enlaçou-lhe a cintura.
— Você me consideraria rude, seu eu perguntasse se vocês dois estão
namorando sério?
— Em verdade não! — exclamou Audrey — só nos conhecemos há duas
semanas.
A outra mulher anuiu num gesto de compreensão.
— Percebo. Bom, de qualquer modo, ainda é cedo para pensar em
compromissos. Mas tenho certeza que Moira ficaria muito feliz se vocês dois já
estivessem nesse ponto. — Ela deu uma risadinha — Não se surpreenda, minha
cara. Moira não era possessiva. Ela teria desejado que Elliot voltasse a se casar,
que não retornasse a seu estilo de vida anterior. Sem dúvida ele agia como um
conquistador, antes de desposar Moira.
— Ouvi a respeito — concordou Audrey.
— Sim? Quem lhe contou?
— O próprio Elliot.
— Engraçado, Não é de seu feitio. Em geral costuma ser muito reservado
sobre sua vida particular. Para dizer a verdade, se Moira não tivesse sido uma
amiga muito especial, jamais teria satisfeito minha curiosidade sobre sua pessoa.
Ele deve tê-la em alta estima, para ter se aberto com você.
Audrey se entristeceu. Ela não sabia tanto assim.
— Será que eu falei alguma bobagem? — Yvonne indagou apreensiva.
— Não, não. Em verdade eu gostaria de conhecer mais a respeito de Elliot.
Mas devo respeitar sua privacidade.
— Tolice! Nós, mulheres, devemos nos aliar. Eu lhe direi tudo o que desejar
saber. Pode começar a perguntar!
Como ela poderia resistir?
— O casamento de Elliot com Moira foi um casamento de amor?
— Aí está uma pergunta difícil de responder. Bem, certamente, foi do lado
de Moira. É claro que houve muita especulação, pelo fato de Moira ser famosa e
rica. Murmurava-se que ele era interesseiro. Mas eu jamais engoli tais fofocas.
Elliot possuía uma excelente posição como advogado numa grande companhia. E
também obtivera enorme sucesso nas pistas de esqui. Além disso, ele parecia se
preocupar com ela. Muito embora eu hesite em empregar a palavra amor. — Ela
suspirou. — Moira costumava dizer que ele sempre relutaria em depositar sua
confiança em uma mulher, após o comportamento da mãe.
— Sua mãe? — Audrey interessou-se.
— Não sabia? Diga-me, minha cara, o que Elliot lhe contou sobre sua
infância e juventude?
— Não muito. Contou-me que o pai abandonara a família quando ele era
apenas um bebê, e que a mãe morrera após sua graduação no ginásio.
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— Esta versão é bem reduzida. Seu pai o abandonou. Mas a mãe fez o
mesmo, quando ele contava oito anos.
Audrey parecia muito chocada.
— Ela era alcoólatra — Yvonne explicou. — Elliot foi entregue à custódia do
Estado, e o colocaram cm vários lares de adoção.
Mas, ele não se adaptava, e acabou vivendo numa casa para meninos sem
família. Foi um adolescente anti-social. Uma instituição de caridade especializada
em providenciar férias para crianças sem lar, o levou para um lugar de neve
quando ele tinha quinze anos. Ali, descobriu-se que ele possuía um raro talento
para esquiar. Está a par de suas excelentes qualificações nesse esporte?
— Um pouco...
— Ele era fabuloso. Sem mencionar ser superdotado na escola. Os patronos
desta entidade assistencial conseguiram uma bolsa para que ele estudasse direito
numa universidade, e conseguisse praticar esqui no tempo livre. Seu
investimento foi recompensado por Elliot alcançar as notas máximas no curso
superior e tornar-se um esquiador de nível internacional.
— Incrível! — exclamou a jovem, atônita.
— Comenta-se que ele teria conseguido um título de campeão mundial se
tivesse vivido na Europa e não aqui, na Austrália, com nossa carência de
competições desse gênero. Mas ele sempre conseguia se colocar entre os dez
primeiros. Tal fato, e sua bela aparência, facultaram-lhe um lucrativo contrato
com uma companhia européia de roupas de esquiar.
Yvonne suspirou, mergulhada em lembranças.
— Não que Elliot tivesse contado tudo isso a Moira, pessoalmente —
prosseguiu. — Ela obteve informações através de outras fontes ao longo dos anos,
muito antes que eles se encontrassem. Pois Moira fazia parte do grupo de
patronos que o ajudou.
Mas a companheira não era do tipo de manter silêncio muito tempo c
continuou:
— Ela mesma me disse que o conheceu durante uma festa em Perisher
Valley, em que se celebrava o término da estação de esqui. Sua beleza havia
virado a cabeça da maioria das mulheres presentes. Ele já possuía a reputação de
irremediável conquistador, especialmente de mulheres mais velhas, que só
desejavam sexo de uma relação. Divorciadas... viúvas... executivas... esposas
infelizes.
Audrey sentiu um tremor gelado.
— Bem, mas a vida no circuito de esqui internacional é assim mesmo —
Yvonne continuou com franqueza. — Moira achou divertido observar esse
comportamento de Don Juan a distância. Mas quando ele tentou, com o maior
cinismo, seduzi-la, sentada numa cadeira de rodas, ela se alarmou.
Yvonne deu uma risada com gosto, ao lembrar tal situação. Mas Audrey
lutava para assimilar tanto a informação sobre o Elliot mulherengo, como o fato
de Moira ser uma inválida.
— Acredite-me quando afirmo que Moira parecia uma serena lady —
prosseguiu Yvonne. — Mas era só aparência. Ela reagiu com firmeza a seus
galanteios, sendo mesmo rude em público. Depois o ignorou pelo resto da noite.
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Aparentemente, ele se sentiu intrigado. E, talvez, também desafiado. Moira era


muito inteligente. Ela lhe telefonou no dia seguinte e assim começou a relação
entre os dois.
— Moira estava sempre presa a uma cadeira da rodas? — Audrey armou-se
de coragem para indagar.
— Não. Ela atravessava bons e maus períodos. Típico de sua doença.
Costumava passar muito tempo em lugares de neve, pois o frio fazia diminuírem
os sintomas. Não sei por qual razão, mas, o fato é que, logo após conhecer Elliot,
ela, por dois anos, ficou assintomática, porém, poucas semanas antes de morrer,
teve uma recidiva(*). No entanto, ela sempre comportou-se com coragem,
demonstrando muita força de caráter. Não permitia que nada a abalasse. Porém...
acho que foi melhor assim...
— Por que diz isso? Elliot lhe era infiel?
Yvonne fez um gesto de indiferença com os ombros.
— Ninguém nunca soube de nada, mas é difícil imaginá-lo resistindo a
todas as mulheres que se atiravam aos pés dele. Oh, lá vem eles — ela advertiu.
— Não comente sobre o que lhe contei, por favor. Elliot ficaria furioso, e Nigel
também. Ele diz que falo demais.
— Não se preocupe, nada direi — prometeu Audrey, séria, a mente
agitando-se desordenada.
— Vocês duas parecem culpadas como ladrões — Elliot sorriu, passando
um braço possessivo pela cintura de Audrey. Ela enrijeceu. Mas, ao encará-lo,
percebendo os olhos calorosos e cheios de desejo, todas as preocupações sobre o
seu caráter se esvaneceram.
Só conseguia pensar no presente. E ela o desejava com fúria. Nada mais
importava. Além do que, ele jamais tentara enganá-la a respeito de suas
intenções.
— Estávamos discutindo as chances do próximo páreo — Yvonne mentiu
com voz suave.
— E qual sua opinião, Audrey?— inquiriu Elliot.
Ela o repreendeu com o olhar. Por que ele a embaraçava, perguntando-lhe
coisas que ela não poderia responder?
— Garotinha ardilosa — ele sussurrou em seu ouvido. — Estamos aqui
apenas para observar Little Girl Pink correr. Nada mais!
— Ela participará de qual páreo? — ela indagou, o coração aos saltos.
— Páreo três.
— E acredita que ela vencerá?
— O treinador não pensa que ela tenha chances, mas Nigel me disse que
ele é uma pessoa cautelosa. Aqui está minha lista de apostas. Leia e decida por si
própria. Não quero influenciá-la.
Com as faces coradas, Audrey concentrou-se cm estudar as diversas
informações, contente por desviar a atenção do que Elliot podia fazer com seu
corpo, mesmo sem tocá-la.
— Do que pude compreender — ela declarou após um ou dois minutos —,
Little Girl Pink está sendo cavalgada por um jockey competente, mas pouco

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conceituado. Aqui se afirma que com seu peso e excelente posição na pista, ela
tem mais chances que os demais cavalos.
— Fala como um verdadeiro apostador! — Nigel brincou.
— Não se trata apenas disso — ela sorriu —, o jockey usará as cores creme
e preto, minhas cores.
— Oh, bem, neste caso — Elliot caçoou divertido —, seguirei o conselho da
especialista e não darei ouvidos à avaliação do treinador!
Quando os cavalos começaram a primeira corrida, sentiu-se contagiar pela
excitação do ambiente. Procurava acompanhar todos os detalhes.
— Como é bonita! Que belo desempenho! — elogiou.
Elliot apanhou o binóculo de volta c comentou sério:
— Desempenho? Você usa uma linguagem bastante apropriada para
alguém que afirmava nada conhecer sobre corridas de cavalos! — ele estranhou.
— Ouvi Nigel usar o termo ao preparar suas apostas — ela confessou,
encabulada.
Todos riram.
— Bem, vamos esperar que os resultados sejam bons — Nigel interveio. —
Creio que ainda está correndo.
— Também espero — Audrey concordou, observando os tickets de aposta
no bolso do paletó de Elliot com agitação crescente.
Little Girl Pink não venceu. Mas chegou em terceiro, para deleite geral.
Todos se abraçaram, congratulando-se. Elliot conseguiu um prêmio de cinco mil
dólares e deu mil a Audrey.
— Para contrabalançar sua perda — ele declarou.
— Oh, mas não posso aceitar! — ela exclamou, ainda ruborizada pela
agitação. — Perdi apenas dez dólares.
— Pegue — ele insistiu. — Corrompa-se. Posso fazê-la merecer tal quantia,
mais tarde — ele gracejou num murmúrio rouco.
Audrey sentia-se chocada e excitada ao mesmo tempo. Talvez ele estivesse
apenas brincando, mas ela não estava acostumada a esse tipo de zombaria
sofisticada. Ele percebeu seu embaraço, e deu-lhe um rápido abraço.
— Você é deliciosa, sabia? Tão deliciosa — pronunciou, acariciando-lhe a
orelha —, que não conseguirei esperar mais.
— Sinto muito, amigos — ele se dirigiu cm voz alta ao resto do grupo —,
mas Audrey e eu precisamos partir. Vamos a uma estação de inverno, para
passarmos o resto do fim de semana.
Audrey conseguiu dominar a surpresa. Por um segundo sentiu excitação.
Mas, logo, outra ideia desagradável a assaltou.
Compreendeu o que Elliot acabara de fazer. Resolveu aguardar o momento
oportuno para se rebelar.
— Precisam partir tão cedo? — queixou-se Yvonne. — Eu estou adorando a
companhia dos dois.
Mas Elliot permaneceu inflexível e conduziu Audrey, através da multidão e
pelo estacionamento de carros.

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O que ele tinha em mente? Possuí-la no estacionamento? Ou se imaginava


tão atraente que ela o acompanharia, atendendo a todos os seus desejos sempre
que ele os manifestasse? Ela podia estar apaixonada, mas não era uma escrava
dos próprios desejos. Alcançaram o Saab e Elliot inclinou-se para abrir a porta do
passageiro.
— Você não devia ter agido desta maneira Elliot — ela falou, tremendo, mas
com profunda convicção interior. — Você deveria ter me consultado primeiro.
Ele se endireitou, a expressão traindo abalo e irritação. Era um homem que
fazia o que queria e não admitia que alguém inexperiente como Audrey o
desafiasse.
"Você deveria ter ficado de boca calada, sua tola!", ela se repreendeu. "Ele
provavelmente a levará para casa, a deixará na porta, e partirá para nunca mais
retomar."
Quando ele anuiu vagarosamente, exibindo o início de um sorriso
dissimulado, ela sentiu um grande alívio.
— Você tem razão — ele concordou. — Eu deveria mesmo. Agi como um
arrogante pretensioso. Desculpe-me.
— Está tudo bem — ela declarou, sentindo uma satisfação que jamais
provara antes.
Ele a fitou nos olhos, tirando-lhe o chapéu, colocando-o sobre a capota do
carro, antes de tomá-la em seus braços.
— Você virá comigo, Audrey? — ele murmurou, e se inclinou para tocar-lhe
os lábios. — Imediatamente... — Seus lábios se afastaram de leve, com o próximo
beijo. — E ficará comigo durante todo o fim de semana?
Seus lábios desceram mais uma vez e Audrey tornou-se incapaz de
qualquer reflexão no minuto seguinte. E quando ele afinal a libertou, continuava
atordoada.
— Ainda não me respondeu — ele comentou em tom suave.
— Eu... não estou tomando pílula — ela explicou.
— E isto significa?
— Que você precisará... — ela não conseguia terminar. Ele sorriu com
gentileza c a abraçou.
— Naturalmente. Não precisa se preocupar. Ela suspirou, tremendo.
— Acho que vou ficar terrivelmente nervosa, Elliot. Ele começou a
acariciar-lhe os cabelos.
— Não há nada de que se envergonhar, querida.
Ela se retraiu, com o toque carinhoso e a suave voz sussurrando em seu
ouvido.
— Há pessoas nos olhando — ela conseguiu dizer.
— Não se preocupe com eles.
— Oh, eu o quero tanto, Elliot.
Ela pressentiu que ele tremia e sua reação foi o momento mais
emocionante e maravilhoso, para ela.
— Vamos quebrar todos os recordes daqui até as Montanhas Nevadas.

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Ela reagiu de imediato, ficando tensa ante a idéia de correrem em alta


velocidade, e sofrerem um acidente numa estrada coberta de gelo.
— Ah, eu havia esquecido — ele resmungou, percebendo-lhe o terror na
face. — Ok, quebraremos o recorde por chegarmos a Jindabyne sem exceder os
limites de velocidade. Justo?
— Justo. — Ela sorriu, suspirando.
Ele manteve a palavra. Mas o ponteiro de velocidade permaneceu no limite
rígido, desde a partida e logo haviam ultrapassado os limites da cidade e se
encontravam na via expressa, dirigindo-se ao sul.
— Posso ligar o gravador? — ela indagou, depois de meia hora. Elliot não
parecia disposto a conversar e o cenário era monótono, provocando tédio. Audrey
jamais passara por esta via expressa. Parecia apenas uma ligação sem graça
entre várias cidades.
— Claro. Pegue a fita que desejar. Tenho várias, é só escolher.
Ela selecionou a trilha sonora do filme de Tom Cruise, Top Gun e recostou-
se no assento, com os olhos fechados, enquanto a música ecoava no carro.
— Tente dormir — sugeriu Elliot.
Ela não conseguiria, é claro. Como poderia? Mas fingiu, no entanto,
voltando a cabeça para o outro lado, e fitando sem enxergar através da janela. De
vez em quando atravessavam um trecho de estrada mais interessante,
bordejando pequenos lagos. Um deles se denominava Lake George.
Tipo engraçado de lago, ocorreu-lhe. Ultrapassaram o desvio para Canberra
e começaram a percorrer a estrada para Cooma(*). Não pararam uma única vez.
Nem conversaram.
Num dado momento, o sol mergulhou baixinho no céu, lançando um brilho
amarelo dourado sobre as colinas longínquas, antes de desaparecer por completo.
Todo o campo mergulhou numa névoa cinzenta e fria. A lua cheia surgiu no céu
escuro. O cenário começou a se apagar e, finalmente, Audrey adormeceu. Um
toque gentil em seu ombro a despertou.
— Audrey... Chegamos.
Ela se endireitou, alarmada, olhando ao redor.
Encontravam-se numa garagem que em verdade parecia uma caverna, pois
fora escavada em sólida rocha. Uma porta rolante a fechava automaticamente.
Um calafrio atravessou-a de alto abaixo.
— Venha — convidou Elliot—, abrindo-lhe a porta. Precisamos subir c
acender a calefação.
Audrey saiu do carro em estado quase hipnótico. Haviam chegado.
— Por aqui — Elliot orientou, caminhando sobre o chão cimentado em
direção a uma escada interna, que terminava numa porta no teto da garagem.
Elliot subiu primeiro, para abrir a porta.
— Todo cuidado por aqui é pouco — ele explicou, enquanto inseria a chave.
— Casas de veraneio vazias constituem um alvo fácil para arrombadores.
Entraram no maior living que Audrey já avistara. Uma das paredes centrais
era de rocha viva. As laterais eram de tijolo, sem janelas e pintadas de branco.
Mas a sua frente, havia somente vidro, permitindo apreciar a paisagem cm larga
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escala. Embora nuvens estivessem cobrindo a lua, podia-se avistar os topos das
árvores e umas poucas luzes brilhando à distância.
Ela olhou ao redor, apreciando a decoração luxuosa. Divisou um espesso
tapete cinza, um conjunto de som e televisão negros, sofás de couro vermelho-
escuro e diversas cadeiras. Um enorme aquecedor preto, de combustão circular,
se elevava com nobreza no centro do aposento, seu funil escuro desaparecendo
no teto branco.
Audrey desviou a atenção para a bem aparelhada cozinha, de um branco
imaculado e separada do restante da sala por um balcão de breakfast, junto ao
qual havia três banquetas de couro preto. À esquerda, praticamente à frente da
enorme vidraça, encontrava-se uma mesa de jantar de vidro, com seis cadeiras de
couro vermelho.
Tudo no aposento, era cinza, branco, preto ou vermelho. O efeito
dramático, muito masculino, de tais cores, levou Audrey a acreditar que o lugar
pertencera a Elliot e jamais a Moira. A conclusão a fez sentir-se melhor.
— Fique à vontade — ele sugeriu. — Vou ligar o aquecimento e depois
prepararei algo quente para comer e beber. — Ele deu alguns passos e ligou
alguns interruptores na parede mais distante. — Está gelado aqui dentro! Acho
que vou acender a lareira também.
Audrey se afastou, fingindo admirar a vista. Conseguiu apenas divisar o
que parecia uma imensa massa de água. Jindabyne Lake, ela supôs.
— Feche as cortinas, sim? — ele pediu. Ajudará a conservar o calor.
As cortinas eram de seda preta pesada. Audrey puxou os cordões e ficaram
isolados do resto do mundo. Sem entender a razão, fitou o teto.
— Sim, há outro andar logo acima — Elliot confirmou. — Duas suítes. —
Ainda bem que já está ficando mais quente. Uma das portas que está vendo leva
à escada. A outra para o banheiro. Imagino que queira usá-lo. Eu também. Mas
vá você, primeiro. Quando retomar, sente-se perto do fogo — ele sugeriu,
acenando para um dos grandes sofás situados ao lado do aquecedor. — Deixarei
a porta de vidro aberta, assim ficará aquecida. Vou providenciar uma refeição
para nós. Acha suficiente lasanha e café? Usarei o microondas.
— Parece ótimo — ela declarou e afastou-se apressada.
Dai a pouco, eles se acomodavam à frente de um fogo crepitante, comendo
e bebendo. Parecia que não tinham a menor preocupação no mundo.
Talvez Elliot percebesse sua apreensão. De repente, ele afastou o prato e
deslizou ao longo do sofá. Retirou-lhe da mão a caneca vazia de café e aproximou-
se.
— Chega de adiamento — declarou decidido, e a atraiu para o sofá junto a
si.

CAPÍTULO IX

Elliot estava beijando Audrey antes que ela pudesse dizer palavra. Rolou-a
para debaixo de seu corpo, pressionando-a contra o macio sofá vermelho, com

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seu peso. Ergueu-lhe o rosto com uma das mãos, mantendo-lhe a boca firme
prisioneira de seus beijos apaixonados.
Audrey foi dominada por súbito pânico, ao perceber a evidência rija de seu
desejo, pressionada com urgência entre suas coxas. O nervosismo provocou nova
contração de seu estômago. E se ela o desapontasse? Porém, seu corpo respondia
de modo automático à profunda necessidade que ele evidenciava, e ela se
arqueou contra ele.
Ele arquejou, rolando de lado, quase caindo do sofá.
— Cuidado, Audrey!
Ela se retraiu ante a observação. Sentimentos de autocomiseração a
assaltaram. Ela era uma estúpida, desajeitada e sem esperanças.
— Não, não — ele a acalmou, cobrindo seu rosto entristecido de suaves
beijos. — Não estou aborrecido com você. É que... estou muito, muito excitado,
amor — acariciou-lhe os cabelos, as faces, a boca. — Você é tão encantadora e a
tenho desejado tanto. Compreende o que estou dizendo?
Ela o encarou piscando, o coração aos saltos, a mente em confusão.
— Eu também tenho sentido a mesma coisa — ela confessou,
estremecendo.
— Com certeza você não é frígida... — Quero que você tire as roupas,
Audrey. Preciso vê-la, tocá-la... Aqui mesmo. Mas, se preferir, podemos subir
para o quarto.
— Aqui está bem — ela conseguiu falar rouca.
Ele se inclinou, para voltar a beijá-la, enquanto seus dedos desabotoavam-
lhe os botões do vestido. Logo, vários estavam livres, assim como o fecho
dianteiro do sutiã. Suas mãos começaram a provocar sensações maravilhosas nos
seios macios.
Demasiado maravilhosas. Ela sentia o sangue fluir acelerado na cabeça, o
coração palpitar tão rápido, que receava desintegrar-se. Mas, quando ele ergueu-
lhe a saia acima dos quadris e começou a despi-la das roupas abaixo da cintura,
ela protestou.
— Está tudo bem — ele acalmou-a, sentando-se para continuar a desnudá-
la. E, embora Audrey não se envergonhasse do próprio corpo sentia-se tímida
ante a contemplação direta de Elliot. Jamais teria permitido a Russel olhá-la tão
despudoradamente. Nunca!
Mas, amava Elliot. De verdade. Ele a fitava com tanta admiração e desejo!
— Tem um lindo corpo, Audrey — ele falou com simplicidade, inclinando-se
para beijar os bicos rosados, um de cada vez.
— Oh, Elliot — ela vibrou.
Ele ergueu a cabeça, para filá-la, exibindo um sorriso divertido.
— Aquele homem devia estar louco — ele murmurou. — Não conseguia
enxergar? — E beijou-a com ferocidade, deitando-a, as mãos se movendo pelo
corpo nu. Procurava e encontrava seus lugares mais íntimos, provando-lhe que
Russell conhecera tanto de um corpo feminino, como a Idade Média de música
clássica.

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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

Quando ela começou a gemer, Elliot sentou-se, bruscamente, atraindo-a


para uma posição sentada, na qual ele acabou de libertá-la do vestido e do sutiã,
jogando-os com fúria para o lado. Por um longo momento admirou o corpo
inteiramente nu, os olhos cinzentos parecendo aço fundido. Retirou a gravata por
cima da cabeça.
— Ajude-me, Audrey — pediu rouco, os olhos escurecendo. Ela o atendeu,
as mãos tremendo, despindo-o sem fineza e sem consideração ao valor das
roupas. Paletó, camisa, cinto, meias, sapatos. Quando chegou à calça,
precisaram ficar em pé, o coração de Audrey se acelerando quando afinal o
contemplou cm toda a glória masculina. Ela o fitou, encantando-se com os
músculos sólidos, que sustentavam a estrutura bem-proporcionada.
Compreendia como alcançara sucesso, correndo em velocidades perigosas nas
montanhas cobertas de neve.
Seus olhos caíram nervosos para sua masculinidade, orgulhosamente creta
e tão formidável quanto havia suspeitado. Engoliu em seco.
— Preciso tomar precauções, Audrey — ele comunicou com voz rouca —
antes que me esqueça.
Logo ele retornou. Ela adiantou-se, oferecendo o corpo nu e estimulado,
num forte abraço. Ele gemeu em resposta, enlaçando-lhe o pescoço e capturando-
lhe a boca num beijo ardente. Suas mãos roçaram as costas macias e depois
desceram às nádegas bem femininas. Ele a pressionava cada vez mais, movendo
seu sexo contra ela. Ela o desejava e nesse mesmo instante!
Gemeu aliviada ao sentir entre as coxas a pressão rígida de sua
masculinidade. A sensação era incrivelmente excitante. Mas, logo, não bastava
mais. Quando estava a ponto de suplicar-lhe que a possuísse, ele ergueu-lhe o
corpo com suavidade e a penetrou com um único impulso.
Audrey arquejava, os olhos arregalados de surpresa e prazer. Ele gemeu e
depois sorriu-lhe.
— Espero que esteja tão bom para você, quanto está para mim.
— Sim — ela estremeceu. — Oh, sim...
Segurando-lhe as nádegas com firmeza, Elliot ergueu-a do chão e sentou-
se, por sua vez, no meio do sofá, acomodando-a sobre seu corpo. Quando ela
dobrou os joelhos, afundou no sofá macio, sentindo sua masculinidade se
aprofundar. Fechou os olhos, extasiada, vibrando com as sensações físicas
indescritíveis.
Elliot... seu amor... seu amante.
— Faça amor comigo, Audrey — ele exortou com voz rouca. Ela abriu os
olhos, o coração palpitando desordenado.
— Deste modo? — ela perguntou e, agarrando-lhe os quadris, os
movimentou num voluptuoso círculo, movendo-se, devagar, para cima e para
baixo.
— Oh, meu Deus — ele clamou atormentado.
Sim, ele estava certo, pensou, surpreendida com as sensações que a
atravessavam.
No entanto, ela não sabia que era capaz de fazer tais movimentos sozinha.
Elliot ainda beijou-a inúmeras vezes e logo Audrey foi envolvida num mundo
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selvagem de prazer crescente e tensão que não admitiam nenhuma inibição.


Gradualmente esqueceu a timidez, ou o receio de ser considerada lasciva. Tudo
no seu interior era frenético. Precisava mover-se cada vez mais rapidamente, a
cabeça inclinada para trás, os lábios entreabertos, ansiando pelo êxtase desta
louca jornada erótica. Pois não estava distante. Ela o pressentia!
E, de repente aconteceu! Uma experiência quase assustadora pela
intensidade. Cada extremidade nervosa parecia cm tensão máxima e,
abruptamente o equilíbrio se rompeu. Seu corpo inteiro parecia despedaçar-se. O
êxtase sucedeu-se em convulsões. Agudas sensações elétricas reverberaram sobre
Elliot.
Também ele grilou. E ela participou de seu prazer, sentindo a pulsação
quente inundá-la. Os corpos se fundiram num só.
Ela se deixou cair para a frente, a face encostando-se ao ombro do amado,
o peito ainda ofegante. O palpitar acelerado do coração demorou uma eternidade
para diminuir. O mais puro contentamento a invadiu. Elliot a abraçou,
segurando-a mais perto.
— Você é fantástica — ele confidenciou suave. — Sabe disto?
— Nunca imaginei — ela murmurou.
— Nunca percebeu quão fantástica é?
— Não. Que o sexo era assim. — Suspirou fundo, estremecendo,
pressionando os lábios contra sua pele.
— Sexo não, Audrey. Fazer amor. Nós fizemos amor...
Audrey emocionou-se, e lágrimas afloraram a seus olhos. Ele ainda era seu
galante cavaleiro... sempre dizendo e agindo da maneira correta. O que mais
poderia desejar uma mulher? Seu coração? Uma vozinha incansável sussurrou.
Oh, cale-se, rebateu a mente, feroz e zangada. O importante é a realidade,
não uma fantasia romântica!
Ergueu a cabeça resoluta. Não permitiria que sonhos de uma escolar
estragassem o que vivenciara com Elliot. E, além do mais, quem sabia quando
seu caso terminaria? Ele sempre a estava aconselhando a tomar as próprias
decisões, a forjar o próprio futuro. Bem, seu futuro precisava se iniciar com o
presente e o presente era Elliot.
— O que aconteceu? — ele quis saber, surpreendido pelo ar determinado
cm sua face.
— Elliot...
— Sim?
— Como... como... — sua voz se enfraqueceu, faltando-lhe coragem para
prosseguir. Inibida, baixou o olhar. Que covardia, para quem tentava construir o
próprio futuro, admoestou-se. Não conseguia nem mesmo formular um simples
desejo.
— Como o quê? — ele prosseguiu, provocando-a. — Vamos, Audrey, diga o
que pretende. Posso lhe garantir que não sou do tipo que se choca com facilidade.
De repente, ela se regozijou, e endireitou a cabeça. Mas ao se defrontar com
Elliot, enrubesceu.

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— Eu... eu ia perguntar — ela engoliu em seco antes de continuar, a voz


soando estranha. — Quanto tempo precisamos esperar antes de poder repetir
tudo mais uma vez?
Ele sorriu de leve, os olhos faiscando e inclinou-se para a frente para beijá-
la na boca.
— Bem, digamos que você me extenuou, garotinha petulante. Digamos que,
provavelmente estarei recuperado depois que tomarmos nosso banho?
— Nosso banho? — ela arregalou os olhos.
— Sim, nosso — ele declarou firme e ergueu-se, carregando-a junto.
— Eu deveria telefonar para casa — ela declarou, tensa, cerrando os olhos
contra os sentimentos que ele evocava, ao tocar de leve seus seios. — Devo avisá-
los onde me encontro.
— Mais tarde — ele murmurou. — Agora estamos relaxando. Deite-se.
— Relaxando — seu cérebro estimulado repetiu. O homem era louco! Como
poderia ela relaxar-se, permanecendo nua dentro da banheira junto a ele,
sentindo suas longas pernas musculosas tocarem-na de cada lado do corpo?
Sentia-se como uma gata sobre um teto de zinco quente!
— Bem, não me sinto muito relaxada neste momento — ela prorrompeu.
Ele riu com gosto e beijou-lhe os ombros molhados.
— Deveria estar. Acredita-se que a água constitui um afrodisíaco fraco
junto às mulheres.
Quem acredita? ela refletiu beligerante.
Ela prendeu a respiração, quando dedos ensaboados esfregaram mais uma
vez seus seios, que despontavam fora da água borbulhante, apontando para o
teto como os picos de duas montanhas gêmeas.
— Algumas partes minhas não estão dentro da água — ela o lembrou, com
voz infantil.
Ele riu, mas desviou as mãos para as costas e estômago, por sorte duas
regiões menos excitáveis de seu corpo. Gradualmente, sob a gentil massagem, a
tensão começou a se dissipar dos músculos. O calor da água e de suas mãos
realizavam um pequeno milagre. Um suspiro hesitante escapou de seus lábios,
um suspiro de alívio e, afinal, de relaxamento.
— Elliot — ela murmurou pouco depois.
— O que?
— É muito bom.
— Estou contente que você aprecie — ele murmurou.
— Não está falando sério? — ela quis saber, alertada pelo tom áspero da
voz.
— Acho que já é tempo de sairmos.
— Tudo bem — ela concordou sonhadora.
Ele levantou seu corpo molhado da banheira, percebendo as pernas e
braços quase dormentes. Ela bocejou e ouviu Elliot rir, como se se encontrasse a
grande distância.

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— Acho que levou meu conselho muito a sério — ele se queixou, e a levou
de volta ao quarto aquecido, estendendo seu corpo úmido sobre o acolchoado de
veludo vermelho da cama.
O toque do tecido sob a pele nua era deliciosamente sensual. Ela se sentia
deliciosamente sensual. Espreguiçou-se como uma gata, colocando os braços sob
a cabeça, regozijando-se com a sensação do plush(*) aquecido na pele molhada.
— Não vá embora — ele caçoou, ao observá-la espreguiçar-se mais uma
vez, e saiu, voltando ao banheiro. Um segundo depois, retornava, com uma
enorme toalha nas mãos.
— Por onde começarei a enxugá-la? — ele hesitou. — Por aqui? — tomou-
lhe um braço e o esfregou com gentileza. Depois o outro. Ela suspirou
reconfortada.
— Aqui, talvez? — Suas pernas obtiveram idêntica atenção.
Audrey apreciava tudo, as pálpebras ficando cada vez mais pesadas. Até
perceber que a toalha subia cada vez mais, entre as coxas. Quando alcançou seu
objetivo, ela arregalou os olhos.
— Ah — Elliot exclamou satisfeito. — Vejo que você decidiu reunir-se aos
vivos.
Quando ele começou a esfregar a toalha, de leve, sobre o estômago, e,
depois, sobre os seios, um gemido baixo escapou-lhe da garganta. No entanto, ele
não se deteve. Continuou esfregando cada vez mais, e menos gentil.
— Creio que já deve estar bem enxuta — ele resmungou, atirando a toalha
longe.
Audrey o fitou, ardendo de desejo, mas ele continuava parado, em pé,
contemplando seu corpo, recostado sobre o leito.
Quando ele começou a tocar-lhe de leve, com as pontas dos dedos, os seios
e o estômago, ela arrepiou-se inteira.
— Tem uma linda pele Audrey. Tão macia... Poderia fitá-la para sempre. E
tocá-la... — ele se estendeu a seu lado. — e beijá-la...
Beijou um dos seios, na parte de baixo. Depois subiu, rolando a língua
sobre o bico intumescido, desenhando-lhe o contorno até que ela protestou com
um gemido.
Ele se deteve de imediato, e depois a surpreendeu, deslizando ao longo de
seu corpo e colocando a boca onde jamais ninguém havia feito o mesmo. Ela teria
morrido de choque e embaraço se Russell tivesse feito tal movimento. Mas, com
Elliot, qualquer momentânea hesitação era descartada de imediato, substituída
pelo puro prazer sensual.
Porém, este tipo de prazer possuía seu lado obscuro. Audrey logo descobriu
que cada extremidade nervosa de seu corpo estava eletrizada com o que Elliot
estava fazendo. Ele provocava sensações demasiado agudas. Sua cabeça parecia
se movimentar para os lados sem controle e ela se perguntava se realmente
desejava que esta agonia maravilhosa continuasse.
Porém, quando Elliot parou, de chofre(*), sentiu-se desalentada e
desapontada. Quando ele afastou o corpo, ela gemeu em protesto. Logo ele
começou a beijar-lhe os ombros, acariciando-lhe os cabelos, e percorrendo com a

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língua a pele macia do pescoço, sugando seu lóbulo, soprando em seu ouvido
numa doce tortura sensual.
Ela estremeceu convulsivamente.
— Eu amo suas reações — ele murmurou, sorrindo de modo sexy. — Amo
tudo em você.
Ele passou a traçar com o polegar um caminho por sua coluna dorsal,
desde o pescoço ate às nádegas. Cada um de seus músculos foi despertado,
contraindo-se em nós de excitação. Seu coração parou de bater e, depois,
recomeçou, acelerado.
— Também tem lindas costas — ele proferiu com voz rouca, os dedos
desenhando círculos sobre as nádegas. — Bela...
Audrey enrijeceu de antecipação quando os dedos reiniciaram suas
viagens, passeando mais uma vez pela base da espinha e se movimentando para
baixo e para dentro. Quando Elliot finalmente alcançou sua intimidade úmida de
desejo, ela tremia. Quando ele lhe separou as coxas, desejava apenas que a
penetrasse, não importava como.
Estava completamente entregue. Ele segurou-lhe os quadris e a levantou,
fazendo com que se apoiasse sobre as mãos e joelhos, e deslizando dentro dela
vindo por trás.
Sua única reação foi um suspiro trêmulo de alívio.
— Sim, oh, sim — ela gemeu, quando ele começou a se movimentar. Ela o
desejava loucamente, contorcia-se, seus dedos agarravam o acolchoado em
movimentos convulsivos.
Com as mãos, Elliot desenhava movimentos circulares sobre seus seios.
Respirava em seu ouvido, murmurando-lhe como era linda e quanto ele a
desejava, e como a possuiria com freqüência. As palavras apaixonadas a
tornaram selvagem e, antes que percebesse, mergulhava num clímax elétrico e
convulsivo. Quase soluçava num êxtase doce e prolongado.
Elliot correspondeu com firmeza enquanto estremecia em seu interior por
diversos segundos e depois a arrastava consigo quando se deixou cair sobre a
cama, arquejante.
Audrey permaneceu ao lado, quieta em seus braços trêmulos, atônita pelo
que haviam acabado de partilhar. A paixão... a intensidade... E o maravilhoso
contentamento. Depois a paz interior... Era muito mais do que jamais sonhara,
ou tivera a esperança de experimentar. Como sobreviveria quando tudo tivesse
terminado, quando não mais deitasse entre os braços de Elliot novamente, nunca
mais sentiria tal paz, tal alegria?
Seu suspiro era ao mesmo tempo sensual c triste.
— Em que está pensando? — ele murmurou, atraindo-a para mais perto.
— Que seria maravilhoso poder repetir o que fizemos todas as noites — ela
respondeu com simplicidade.
— Acho que podemos dar um jeito, não? — ele sorriu gentil.
Audrey reteve a respiração. Com certeza ele não ia pedi-la em casamento?
O fato de considerar a idéia alarmante não a iludiu. Quantas vezes, uma
moça perdidamente apaixonada, recearia que o amado a pedisse em casamento?

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No entanto, não queria que Elliot a pedisse. Em absoluto. Ele não a amava e a
proposta só podia significar uma coisa. A simples idéia lhe provocava frio na
alma.
— Estive pensando — ele declarou, e premiu(*) os lábios suaves sobre sua
orelha. — Gostaria de se mudar para cá e viver comigo?
O coração de Audrey palpitou de alívio e excitação instantânea. Ela se
aninhou em seus braços, fitando seu rosto com olhos brilhantes.
— Tem certeza, Elliot? Quero dizer... realmente está seguro? Eu... bem, não
sou a pessoa mais ordenada deste mundo.
Seu sorriso era sardônico.
— Não tenho em mente suas habilidades caseiras, no momento, doçura. —
E, capturando-lhe o queixo com a mão, tomou-lhe a boca num beijo apaixonado.
— Jamais desejei uma mulher tanto como continuo a querê-la — ele sussurrou
contra seus lábios. — Acho que todas as noites não bastariam para mim.
Suas palavras febris, levaram Audrey a acariciá-lo.
— Nem para mim — ela admitiu com voz rouca, uma onda de desejo a
atravessando, ao perceber como seu leve toque o estimulava novamente.
— Oh, Elliot... adoro senti-lo dentro de mim. Faça de novo... Por favor...
Ele gemeu e a colocou sob seu corpo, quase com rudeza, apartando-lhe as
pernas e mergulhando em sua intimidade ansiosa. Ela o apertou no máximo de
suas forças, provocando-lhe um profundo gemido.
— Algo me diz — ele deixou escapar, rouco — que vamos atravessar uma
longa noite.

CAPÍTULO X

— Elliot — Audrey sussurrou logo após a meia-noite — Eu... eu não


telefonei para casa, contando onde me encontro. Eles devem estar preocupados.
— Ela ergueu a cabeça, que descansava sobre seu peito.
— Não, não acredito — ele replicou tranqüilo, acariciando-lhe a cabeça. —
Eles só se preocuparão quando checarem seu quarto amanhã. E, se conheço
Lavínia, isto não ocorrerá muito cedo, em pleno domingo. Poderá telefonar-lhes
pela manhã, dando alguma desculpa plausível pela sua ausência. Diga que
passou a noite na casa dos Nigel, que fomos para lá após as corridas e que eu
bebi demasiado para poder levá-la de volta para casa.
— Sim... suponho que seguirei seu conselho. Acontece que não sou boa em
mentiras. Com certeza eles perceberão a verdade.
— E daí? Você é uma pessoa adulta, Audrey, não uma criança. Não há
nada de errado em manter uma vida sexual própria, contanto que seja discreta e
não promíscua.
Audrey retraiu-se ante a maneira de Elliot categorizar, o que haviam
realizado, como sua "vida sexual". Não havia afirmado que haviam feito amor e
não apenas sexo?

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— Alem disso — ele acrescentou —, eles logo descobrirão quando você vier
morar comigo.
As conseqüências do que havia feito, concordando em viver com Elliot, a
aturdiram. O que diriam seu pai e Lavínia?
— Parece muito quietinha, de repente — Elliot falou suave. — Está
desistindo de vir morar comigo?
Ela sentou-se, afastou os cabelos do rosto e depois deitou-se ao lado de
Elliot, repousando a cabeça no travesseiro.
— Não — comunicou decidida. — Mas não creio que consiga obter a
aprovação familiar.
— Por quê? Por eles saberem que não casarei com você?
Ela o fitou de soslaio, o coração sc apertando. Pois Audrcy não sabia mais
se, em verdade, não desejava que Elliot a pedisse em casamento. Ou não tinha
certeza que ele não a amava. Como poderia um homem fazer amor de modo tão
lindo e com tanta freqüência sem estar apaixonado? De onde provinham a
ternura e o cuidado com o prazer dela em primeiro lugar? Pois ele sempre se
mostrara preocupado com ela, em todos os momentos. Um homem que só
desejava sexo agiria desta maneira? Era difícil acreditar.
— Você sempre soube, Audrcy — ele repetiu com firmeza. — Eu serei seu
amante pelo tempo que desejar. Mas não casarei com você. Não sou do tipo
casadouro.
— Você casou com Moira.
— Era diferente.
— Como diferente? — ela quis saber.
Ele se sentou abrupto, afastando as pernas para o lado da cama.
— Não admito ser questionado — declarou, a voz gelada revelando
reprovação. — Nem por você. Nem por ninguém. Aceite-me como sou, Audrey, ou
desista. Não há mais nada a dizer.
Ela se sentou, empertigando-se, e o fitou sobressaltada, o coração aos
trancos. Aí estava um Elliot que jamais vira, um Elliot rude e frio. Um cavaleiro
negro, não um galante.
Por um breve segundo ela sentiu-se chocada. E ferida. Mas, então,
percebeu a dor silenciosa, que transparecia em cada músculo rígido do amante.
Ele mantinha a cabeça tensa para trás. E ela soube que haveriam razões
complexas para explicar seu modo dc agir. Ele não se parecia mais com o homem
que ela conhecera e pelo qual se apaixonara. Talvez, se tentasse com delicadeza...
Ajoclhou-se a seu lado, deslizando os braços ao redor de seu peito e o
abraçou.
— Elliot... eu compreendo. De verdade.
Ele pareceu ainda mais tenso.
— Você ainda está sofrendo pela morte de sua esposa. Percebo que a deve
ter amado muito. Mas não consegue enxergar que o que nós dois sentimos um
pelo outro, é mais do que simples desejo?
— Não — ele negou com veemência, batendo os punhos. — Está enganada
e não pretendo ser responsabilizado por enganá-la!
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Ele se virou, pegando-lhe os ombros, a expressão dura.


— Em primeiro lugar, vamos esclarecer logo uma coisa. Meu casamento
com Moira foi um ato de amizade, não romance. Moira estava preocupada que
parentes gananciosos pusessem as mãos em sua fortuna após sua morte. Ela
pensou que eles não poderiam contestar um testamento a favor de seu legítimo
marido. Assim, para tranqüilizá-la; os médicos haviam declarado que ela não
viveria mais do que cinco anos; eu a desposei e prometi destinar, sempre, uma
elevada porcentagem de seus direitos autorais a favor de suas obras de caridade
favoritas. E tenho cumprido minha promessa. Eu gostava e admirava Moira
enormemente, mas jamais a amei. Nunca me apaixonei por uma mulher Audrey,
apenas porque não sou capaz de tal sentimento!
Audrey o encarava, os olhos arregalados de choque e confusão, além de
descrença. Um brilho de aço apareceu no olhar dele ao perceber sua reação.
Deliberadamente, deixou uma mão deslizar vagarosamente pela curva de seu
seio.
— Acredita que isto signifique que eu a amo? — ele inquiriu cm voz rouca,
seu polegar excitando o bico do seio. — Não necessariamente, Audrey. E nem isto
— ele pegou-lhe a mão, colocando-a sobre sua ereção. — Isto é desejo, não amor.
Com certeza, já aprendeu a diferença!
Ele afastou-lhe a mão com firmeza.
— Se ainda acredita que me ama — ele prosseguiu irado —, então é melhor
terminarmos nossa relação imediatamente. Você logo me esquecerá, uma vez que
eu me retire de sua vida. E com certeza não encontrará a menor dificuldade de
encontrar alguma outra pessoa.
Audrey o encarava, tentando, desesperada, enxergar através da superfície,
o ser humano real. Podia entender como alguém, com sua história de vida,
tivesse dificuldade cm confiar e amar. Essa incapacidade para se apaixonar se
demonstrava pela propensão bem cedo demonstrada em agir como um
conquistador. Yvonne contara sobre seu comportamento instável, jamais se
fixando a uma mulher. Moira devia ter sido uma mulher muito especial para
captar tanto de seu afeto.
Mas ele não conseguia perceber que havia mudado? Que o homem que se
demonstrara tão bondoso e gentil para com ela era capaz de amor profundo?
A teimosa dele a frustrava. "Também fui ferida", ela queria grilar-lhe. "A
solução não consiste em se proibir de sentir afeição, para evitar de ser magoado
novamente. A resposta é abrir seu coração, continuar procurando o amor. Russell
fora um desastre. Mas não desisti. Continuei procurando e o encontrei, meu
querido. E não tenho a menor intenção de perdê-lo. Conseguirei obrigá-lo a
enxergar tudo isto ainda que precise morrer!"
Audrey controlou a própria emoção, reconhecendo que precisava aliviar a
situação ou arriscaria perder Elliol por completo.
Conseguiu exibir um sorriso descontraído e livre de preocupações.
— Nossa, quem teria imaginado que você podia ser um tipo tão
preocupado? E daí se tiver me apaixonado por você? Não quer dizer que queira
me casar. Sou demasiado jovem. Você mesmo comentou isso. Pretendo me
divertir por alguns anos. E espero que seja com você. Por isso pode parar logo

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com este ato de mau humor. Não vai se livrar de mim com tanla facilidade! Ele a
fitou incerto.
— Ainda não foi o bastante? — ela o provocou, meneando a cabeça. — Não
esqueça que ainda não atingimos a quota que você me prometeu no início da
noite.
Ele explodiu numa risada, aliviado.
— O que farei com você?
— Está querendo dizer que ainda não sabe? — ela suspirou caçoadora. —
Pobre de mim, imaginava que você sabia tudo o que era necessário saber a
respeito. Mas quero a prova. Você pode enganar algumas pessoas todo o tempo,e
todas as pessoas por algum tempo. Mas não...
Ela gritou quando se sentiu atraída com rudeza para dentro de seus braços
e sobre o leito.
— Creio ser meu dever adverti-la — ele murmurou rouco, exibindo um
sorriso cínico — que desafios são para mim tão irresistíveis quanto uma certa
loira nua!
— Lavínia, é você?
— Não, amorzinho, aqui é Elsie. Audrey suspirou de alívio.
— Papai ou Lavínia já acordaram?
— Ainda não vi sinal de nenhum dos dois. Porém, ainda é apenas dez e
meia. Onde você está, menina? Eu não fazia idéia que você não estava mais em
casa. Também não a avistei hoje. Saiu para uma aula de direção?
Audrey alegrou-se pela possibilidade do álibi já pronto.
— Sim, é isto mesmo. Elliot desejava praticar bem cedo, antes do tráfego de
domingo. Estou na casa dele, tomando um lanche. Achei melhor ligar e avisar
onde estou. Passarei fora o dia inteiro.
— Você está se dando muito bem com esse jovem, não é?
— Eh, sim — ela confirmou hesitante, sentindo o estômago se contrair ao
ver Elliot movimentando-se pela cozinha, entretido em preparar o breakfast. Ele
parecia tentador, usando apenas o robe negro e nada mais. Ela também não
vestia muita coisa. Uma ampla toalha vermelha cobria-lhe a nudez do seio até as
coxas, no estilo sarongue. Outra toalha estava enrolada sobre os cabelos úmidos.
— Ele é ótimo — ela falou, captando o olhar de Elliot. Ele a saudou com um
gesto de cabeça.
— É muito gentil da parte dele ensiná-la a dirigir. Isto requer muita
paciência.
— Oh, sim. Elliot é muito paciente.
Ele se voltou para ela, franzindo as sobrancelhas.
— Não sou paciente, não, sua pequena preguiçosa. Venha já me ajudar.
— Suponho que devo dar o recado a seu pai e à sra. Farnsworth de que vai
passar o dia fora? — Elsie ofereceu.
— Sim, por favor.
— Eu o farei, pode ficar sossegada. Te vejo mais tarde, queridinha.
— Até logo, Elsie.
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— Viu? — Elliot sorriu quando ela desligou. — Não há problemas.


— Está me corrompendo — Audrey riu. Elliot voltou a atenção para os ovos
com bacon.
— Não tenho certeza de quem está corrompendo quem — ele replicou
sardônico.
Ela se ergueu do banco e aproximou-se da mesa de breakfast para ficar por
trás de Elliot. Correu as mãos pelos ombros largos. Ele era tão belo, ela suspirou.
Tão belo...
E lhe pertencia. Ao menos nesse momento.
— É essa a sua ideia de ajudar? — ele protestou.
Ela deslizou os braços ao redor da cintura dele, encostando a face em suas
costas.
— Sim — ela confessou.
— Você é uma pequena bem afetuosa, não é?
— Não sei. Jamais alguém comentou que eu era afetuosa até agora.
— Nem mesmo Russell?
Ela se endireitou bem devagar, afastando-se.
— Por que trazê-lo à conversa? — ela indagou tensa. — Sabe muito bem
que o simples nome dele me irrita.
— Estava apenas checando — ele a fitou de relance. — Ei, não fique assim
tão séria. O que aconteceu com a mocinha que só queria se divertir?
— Ela também possui seus momentos sérios.
— Ótimo. Então ponha algumas fatias de pão na torradeira, os ovos com
bacon estão quase prontos.
Ela riu.
— Quem vai cozinhar quando morarmos juntos? — ela indagou quando
estavam sentados um frente ao outro saboreando a refeição.
— Você se arrependerá se disser que serei eu — ele protestou.
— Jamais cozinhei uma refeição decente em minha vida.
— Neste caso, eu me ocuparei do assunto.
Ele concordou com um pomposo gesto de cabeça.
— Seu afeiçoado ajudante, madame.
— E quais outros serviços é capaz de prover, ajudante confiado? — ela
indagou, correspondendo ao espírito brincalhão.
— Madame! — ele exclamou dm tom afrontado, imitando um mordomo
inglês empertigado. — Não sei o que quer dizer.
— Bem, pode ter me enganado. Deu-me um completo itinerário de suas
habilidades, ontem à noite. E com muita proficiência também.
— Madame pareceu dominar as várias técnicas com muita rapidez. Bem,
sem dúvida aprende rápido.
— E verdade... mas necessitarei de um curso de aperfeiçoamento ao menos
a cada dois dias.
— Oh, não, não acredito que funcione.
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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

— Não?
— Em definitivo, não. Se passar um dia sem praticar, pode esquecer tudo.
— Realmente? Pensei que fosse como andar de bicicleta. Uma vez que
aprende jamais...
— Madame! As coisas que diz. Estou enrubescendo.
— E eu sou a rainha da Inglaterra.
Os dois se entreolharam e caíram na risada.
Foi um dia de glória. Ambos loucos e maravilhados. Num dado momento,
passaram a fazer amor do lado de fora, no terraço. Mas, quando o vento gelado
começou a congelar certas partes sensíveis, transferiram-se para dentro, sobre o
carpete, onde um agradável raio de sol se filtrava através da enorme janela de
vidro.
Todo o tempo, Elliot continuou com a farsa da relação de madame com
doméstico. E ela declarou-se encantada com seus serviços. Porém deixou bem
claro que, como cozinheiro, suas habilidades estavam muito aquém do desejável.
A maior parte do que comeram foi preparada em microondas.
Por volta das quatro horas da tarde, entraram com relutância no carro,
para a viagem de volta a Sydney. A maior parte do trajeto brincaram jogos
infantis, inventando palavras a partir dos números das placas.
Ao passarem por Goulburn entraram dentro de um McDonalds e
empanturraram-se de hambúrgueres, batatas fritas e milk slakes.
— Parece que desenvolvi um apetite voraz — Elliot comentou, devorando o
segundo sanduíche.
— Não consigo imaginar a razão — Audrey afiançou, com fingida inocência.
— Não me pergunte. Passei a maior parte do dia deitado de costas. — Ele
ergueu uma sobrancelha, fitando-a de soslaio e ela enrubesceu.
— É culpa minha se você não aprecia a posição de missionário?
— Acontece que não sou um missionário.
Ela desatou a rir e Elliot se juntou a ela. Ainda estavam rindo quando
voltaram ao Saab.
— Acho melhor você não entrar comigo — ela pediu, quando ele parou o
carro do lado de fora da escadaria dos Farnsworth. — Quero contar as novidades
sozinha.
— Mas fará as malas ainda hoje?
Ela sorriu e o beijou.
— Ainda que precise ficar acordada metade da noite.
— Voltarei amanhã às sete e meia para sua aula de direção. Ponha a
bagagem no Magna. Virei de táxi.
— Estarei pronta.
— Não deixe que Lavínia a aborreça! — ele advertiu, enquanto ela subia os
degraus.
— Não se preocupe.
Mas estava muito longe de sentir igual confiança quando Elliot se afastou e
ela se viu sozinha. Toda a sua coragem parecia ter-se ido com ele.
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Seu pai e Lavínia ainda estavam acordados, assistindo a televisão no


estúdio. Audrey entrou e falou um nervoso alô.
— Penso ter ouvido alguém junto à porta — Lavínia declarou, arregalando
os olhos negros ao deparar com o vestido de lã creme da moça. — Ainda está
usando a mesma roupa de ontem à noite? Não me diga que não voltou para casa,
Audrey? Você disse a Elsie que...
— Passei a noite com Elliot — ela declarou num assomo de coragem. — É
melhor saberem logo. — Dirigia suas palavras mais para o pai que para Lavínia.
— Eu o amo, papai e ele... se preocupa comigo. Pediu-me para viver com ele e
pretendo aceitar. Por favor, não crie caso. Já tenho vinte e um anos e não pode
me deter.
Warwick Farnsworth permaneceu em silêncio por um longo momento.
— Se é o que deseja, minha querida... — ele anuiu. Audrey tremeu de alívio
e felicidade.
— Warwick? — Lavínia explodiu. — Como pode aceitar tal decisão com
tanta calma? O homem é muito mais velho que Audrey. E pelo pouco que
sabemos, talvez ele seja um interesseiro, um caça-dotes, um...
— Ele é um advogado perfeitamente respeitável. Sem mencionar o fato de
ser um atleta de renome mundial — Warwick replicou tranqüilo. — E também é
muito mais rico do que minha filha. Acha que não o investiguei?
Ele ergueu-se, e encaminhou-se para a filha, tomando-lhe as mãos.
— Faça o que considere correto, Audrey. Você merece ser feliz depois de um
Russell. Edward contou-me tudo. Só desejaria ter sabido há mais tempo a cobra
venenosa que ele era. Mas, ele sempre se apresentou com tanta adequação, você
mesma deve admitir. Embora sem ter jamais sido páreo para Elliot, é claro...
— Não acredito no que está ocorrendo — Lavínia murmurou. — Ele não se
casará com ela! Não, se ele for rico.
Audrey percebeu a irritação assomar aos olhos do pai.
— Algumas pessoas se casam por outras razões além de dinheiro, Lavínia
— ele rebateu rude.
— É mesmo? — ela contrariou, cínica.
Parecia que o pai havia levado uma chicotada. Seu rosto tingiu-se de
vermelho. Audrey desejaria surrar a madrasta por tanta perversidade.
Seu pai manteve-se calado. Mas os olhos mostravam mágoa. Ele
endireitou-se com orgulho, tentando recompor-se. Audrey jamais o respeitara
tanto cm toda a sua vida.
— Sim — ele declarou, estranhamente calmo. — O problema é que nem
sempre isto seja compreendido, até que seja muito tarde. Seguiu-se um momento
de silêncio carregado de eletricidade. — De qualquer maneira, estamos nos
afastando de nosso objetivo — ele prosseguiu. — Como pessoa adulta, Audrey
tem o direito de encontrar amor onde e quando decida. Pelo que pude avaliar,
Elliot Knight me parece um homem decente. Não acredito que tenha alguma
intenção deliberada de magoá-la.
— Então é assim? — Lavínia enfureceu-se. — Bem, fica claro que vocês não
passam de um par de ingênuos. Esse homem é um libertino! Audrey é só uma

76
Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

novidade para ele. Ele tem se divertido em brincar de Pigmaleão com ela. Mas,
logo se cansará do papel. Não há dúvida...
— Basta! — Warwick ordenou. — Ficarei grato se mantiver suas opiniões
desagradáveis para você mesma, no futuro. Agora eu gostaria de conversar com
minha filha, a sós!
Lavínia ficou escarlate de ira.
— Muito bem. Mas não diga que não a adverti, Audrey. Tão logo se tornar
um aborrecimento para Elliot na cama, ele a substituirá por alguém um pouco
mais... experiente. Registre minhas palavras! — E, olhando-os com desprezo, saiu
furiosa da sala, batendo a porta atrás de si.
Audrey sentia-se péssima.
— Sinto muito, pai — ela iniciou tremendo. — Eu... eu não pretendia
provocar problemas.
Ele meneou a cabeça, negando.
— Não é culpa sua, querida. Lavínia está... Bem, nos últimos tempos ela
tem se sentido infeliz. Nós dois temos encontrado dificuldades. Mas não se
preocupe com isto. No entanto... — ele hesitava e a jovem se retraiu, angustiada.
— Você tem certeza de que quer viver com esse homem? Lavínia argumenta
que o fato de ele ser bem mais velho do que você. E... mais experiente possam
haver dificuldades...
— Tenho certeza — ela mentiu.
— Então seja — o pai suspirou. — E agora vá logo para a cama, minha
menina. Você me parece um pouco... esgotada — ele terminou, com o esboço de
um sorriso dissimulado.
Ela sentiu o calor subir às faces.
— Sim, estou um pouco cansada. E também preciso preparar as malas.
O pai mostrou-se surpreso.
— Tão depressa?
— Eu me mudarei amanhã cedo.
— Sentirei sua falta. — Ele suspirou.
— Eu o visitarei — prometeu, tocada pela sinceridade de sua reação.
Abraçou-o carinhosamente.
— Espero que sim...
Audrey subiu ao quarto envolvida num turbilhão de emoções. Em absoluto
sentia-se segura de que estava agindo da maneira correta. Por que será,
perguntava-se, agoniada, que outros pessoas conseguiam colocar tais dúvidas em
seu coração? Ela tinha consciência do ciúme de Lavínia, mas, ainda assim, suas
palavras haviam abalado seu otimismo, sua esperança no futuro.
Tudo o que haveria em sua relação com Elliot seria apenas sexo?
Esperava que não. Quando estivessem vivendo sob o mesmo teto, dia após
dia, semana após semana, disporiam de muito tempo para apenas conversar,
conhecer-se mutuamente em diversos níveis. Seu relacionamento amadureceria e
então Elliot perceberia a profundidade de sua ligação.

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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

Ela começou a preparar a bagagem, recuperando a tranqüilidade. No dia


seguinte, Elliot viria buscá-la. E ela se tornaria parte de sua vida. Bastava
esperar pelo amanhã...
Mas, quando, afinal, deitou-se para dormir, as advertências malévolas de
Lavínia retornaram, atormentando-a.
E, quando conseguiu adormecer, seus sonhos povoaram-se de pesadelos de
horror e insegurança. Em um deles, Elliot a ameaçava com um chicote, e, ao
fundo, Lavínia ria caçoadora. Ela tentava se desviar de Elliot como um animal
assustado. Ele a perseguia, dizendo que ela não passava de uma tola ingênua,
que mulheres jovens o aborreciam ao extremo, que seu único prazer com ela fora
rir de suas inadequações. E, depois, avisara que desejava uma mulher de verdade
e começava a fazer amor com Lavínia a sua frente.
Audrey despertou, trêmula e exausta.
Mas, quando Elliot chegou, pontualmente, sorrindo e beijando-lhe a boca
com gentileza, todas as suas duvidas se dissiparam, substituídas por um
sentimento de profundo amor e confiança.
Ele era o seu Elliot, seu cavalheiro, numa brilhante armadura. Ele jamais a
trairia.
Talvez fosse melhor desconhecer, o que o futuro lhes reservava.

CAPÍTULO XI

— Lembro-me que você e Elliot não estavam saindo a sério, segundo suas
próprias palavras — Yvonne observou, levando Audrey para a cozinha, — E viver
junto, nos tempos atuais, não é suficientemente sério?
Nigel havia telefonado a Elliot, a propósito de negócios, durante a semana e
o convidara a jantar no sábado a noite.
Estendera o convite a Audrey quando fora informado do novo arranjo na
vida do amigo.
— Faz apenas uma semana — Audrey despistou. — E não temos intenção
de nos casar.
Yvonne colocou mais batatinhas na tigela vazia que trazia na mão. Ainda
estavam no aperitivo, antes do jantar. Saboreavam bebidas e salgadinhos.
— Devo declarar que ainda estou surpresa — ela comentou — embora fosse
óbvio, para quem visse os dois juntos durante as corridas, que Elliot estava muito
envolvido com você. Quem sabe? — ela riu. — Talvez ele supere, afinal, sua
inclinação por mulheres mais velhas!
Audrey desatou num riso forçado.
— Assim espero.
A outra mulher a fitou com atenção e depois suspirou.
— Está terrivelmente apaixonada por ele, minha querida, não é mesmo?

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Audrey enrubesceu, olhando nervosa sobre o ombro da anfitriã, tentando


avistar Elliot. Mas ele eslava entretido conversando com Nigel na sala.
Yvonne deu-lhe uma palmadinha confortadora na mão.
— Não precisa se embaraçar. Elliot é um homem maravilhoso. Apenas
espero... oh, nada! Só se é jovem uma vez na vida. Apenas aproveite enquanto
durar.
Audrey sentiu o ressentimento invadi-la. Por que todos achavam que sua
relação com Elliot não duraria? Aliás, o próprio Elliot acreditava a mesma coisa.
E, ainda que estivessem apenas há uma semana juntos, não havia o menor sinal
daquele aprofundamento em sua relação que ela secretamente esperara. Nem as
conversas serias e significativas, nem simples companheirismo.
O interesse de Elliot continuava estritamente no plano físico. Ele parecia
não se cansar dela. Levava-a ao trabalho, todas as manhãs no úllimo instante
para que da chegasse apenas a tempo. Apanhava-a na hora do almoço, e a trazia
para casa, onde, invariavelmente faziam amor durante a hora inteira. Até suas
lições de direção haviam sofrido, com freqüentes interrupções a distraí-los. Como
ela conseguira passar no exame, não entendia. Mas fora bem- sucedida, sem
cometer o menor erro.
As noites decorriam do mesmo modo que os dias, embora, ao menos, Elliot
tentasse criara ilusão de um romance real. Ele passava a tarde inteira
preparando um jantar iluminado à luz de velas, o qual ele servia com toda
formalidade, insistindo em que se trajassem para a ocasião.
Mas, logo após...
Audrey suspirou. De certo modo, era igual a ele. Pois sempre estava mais
que disposta, sempre terrivelmente excitada quando o jantar terminava e Elliot
começava a despi-la com lentidão.
Mas ela detestava que cada hora livre de suas vidas parecesse controlada
por seu mútuo desejo insaciável. Ela queria mais. O problema estava que Elliot
não. Ela o reconhecia, assim como os demais.
— Este suspiro tão fundo significa que nem tudo é perfeito no Jardim do
Eden — Yvonne indagou com delicadeza.
Audrey sorriu fracamente.
— Apenas desejaria que Elliot me permitisse conhecer o que se passa em
sua mente, ocasionalmente. Nunca sei, de fato, o que ele está pensando.
— Pelos céus! Sc eu tivesse tido apenas um dólar, para cada vez que Moira
dizia a mesma coisa! — ela fitou Audrey atenta.
— Você se importa que eu fale sobre Moira? Por favor, seja sincera.
— Não, não realmente — foi a surpreendente admissão. — Ela deve ter sido
uma pessoa extraordinária.
— Bem, ela não era perfeita. Como todo mundo, também tinha seu lado
mau. E conseguia ser bem teimosa. E até brutal quando defendia as próprias
opiniões. Mas mantinha grande expectativa sobre as pessoas em geral. Todos os
seus amigos tentavam se comportar acima destas expectativas, pois, se não o
fizessem, de alguma maneira sentiam que poderiam desapontá-la. — Yvonne
desatou numa risada — Ela me acusava de ser uma inveterada tagarela. E sou!
Mas, perto dela, garanto que me comportava, acredite-me!
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— E o que ela pensava sobre Elliot?


— Que ele exagerava em sua independência e que necessitava de uma
mulher que lhe resistisse, que o enfrentasse!
Tratava-se de uma simples observação, mas chamou a atenção de Audrey.
Ainda refletia quando chegou em casa com Elliot. Assim que fechou a porta,
atraiu-a em seus braços. Ela enrijeceu.
— Há algo errado, doçura? — ele arqueou as sobrancelhas. — Estava
intrigado, ao perceber que você esteve muito calada durante a noitada. Achei que
não estava muito a fim de atividades sociais.
Ela se afastou da tentação de seu abraço e começou a se afastar para o
quarto de dormir.
— É a verdade. E também estou com dor de cabeça. Ela sentiu mais do que
via seu olhar silencioso.
— Não se trata de uma dor de cabeça de brincadeira, não é? — ele indagou,
seguindo-a ao quarto.
Ela retirou uma camisola da cômoda onde guardava suas roupa íntima.
Depois voltou-se, encarando-o.
— Não. E séria. Sinto muito, Elliot, mas hoje não sinto vontade de fazer
amor. — Audrey tentava não parecer culpada, pois não tinha dor de cabeça,
embora sua mente estivesse estressada. No entanto, sentia-se compelida a
observar como Elliot manipularia sua relação sem sexo por um dia ou mais.
Queria forçá-lo a conversar com ela.
— É óbvio — foi sua observação seca, ao perceber a camisola. Ela não
havia usado uma peça de roupa na cama durante a semana inteira.
— Se desejar, poderei dormir no quarto de hóspedes — ela sugeriu,
aguardando temerosa pela resposta.
Em seu íntimo, suplicava que ele não concordasse. Esperava que ele
desejasse sua companhia de qualquer maneira.
Ela o fitou e percebeu que ele assumia uma expressão dura.
— Você está mentindo para mim, Audrey. Por quê?
— Eu... não estou. — Apesar dos esforços em se controlar, um rubor
culpado cobriu suas faces. — Tenho mesmo dor de cabeça — ela insistiu,
percebendo que estava criando um grande caso. — Se não acredita em mim, não
posso evitá-lo.
— Não acredito! — ele replicou com frieza. — Espero que aprecie sua noite
no quarto de hóspedes. — E, sem mais palavras, ele entrou no banheiro da suíte
principal, batendo a porta atrás de si com estrondo.
— Você está com ar estressado — Edward comentou na manhã seguinte,
durante o trabalho. — Não parece a mesma da semana passada. Pelos céus,
quando você entrou aqui na outra segunda-feira, parecendo uma jovem e
maravilhosa Grace Kelly, eu quase caí de minha cadeira. Hoje, no entanto... — ele
mostrou um ar de desaprovação. — Talvez seja sorte você ter um chek-up
marcado para o fim da manhã com a associação de saúde segurada pela
empresa. Talvez o médico consiga descobrir o que há de errado com você.

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— Oh, eu havia me esquecido por completo deste compromisso — Audrey


gemeu, lembrando de suas boas intenções de fazer as pazes com Elliot na hora do
almoço.
Sua noite no quarto de hóspedes fora tenebrosa e o café da manhã ainda
pior. Elliot tentara quebrar o gelo e ela, como uma criança idiota, o acusara de
não se importar com ela em absoluto, de desejar apenas sexo.
Ele a fitara longamente, com seu típico olhar impenetrável e depois negara
a verdade de tal acusação. Ele se preocupava com ela. Se ele desejasse uma
mulher apenas para sexo, teria escolhido uma pessoa mais adequada, um pouco
mais madura, não uma criança irracional e teimosa que merecia levar uma boa
surra no traseiro.
Ela havia retorquido que ele não passava de um egocêntrico, egoísta,
maníaco por sexo, estúpido que devia dar uma boa olhada cm si mesmo antes de
terminar a vida como um velho solitário.
E nesse ponto, saíra de casa, dirigindo o carro sozinha, morrendo de medo
de enfrentar o pico do tráfego matinal. Seus nervos quase provocaram uma
colisão com um ônibus.
— A que horas está marcada minha consulta? — ela perguntou a Edward.
— Onze e meia.
Uma consulta a esta hora na cidade, significaria que ela não veria Elliot na
hora do almoço. Ela gemeu. Provavelmente ele imaginaria que estava inventando
uma desculpa para não encontrá-lo. Pegou o fone com a mão tremula para
chamá-lo. Por todos os céus, em que enrascada se metera!
Mas Elliot não a reprovou quando ela lhe contou onde iria. Mas seu tom de
indiferença a aborreceu mais do que se ele houvesse protestado ou reagido.
— Sinto muito, Elliot — ela balbuciou — É inevitável. Todo o staff da
empresa é obrigado a passar por um check-up médico cada dois anos e a consulta
foi marcada há muito tempo e, realmente não posso...
— Pelo amor de Deus — ele a interrompeu impaciente. — Não precisa me
dar explicações.
— Mas... mas é claro que preciso!
— Por quê?
— Porque me sinto em pedaços pelo que aconteceu e queria conversar com
você, explicar-lhe como me sinto. Não quero que imagine que não o quero mais.
— Não penso isso — ele suspirou. — Admito que estava zangado ontem à
noite. Mas percebo que estava errado. Não tinha o direito de questioná-la.
— Tinha sim! — ela insistiu.
— Não, Audrey. Você estava certa. Eu estava errado. Fim do argumento. Vá
a sua consulta e eu a verei à noite quando voltar para casa. Certo?
Ela silenciou, sentindo-se totalmente frustrada.
— Audrey?
— Sim — ela respondeu. Ele voltou a suspirar.
— Agora quem está com dor de cabeça sou eu. Talvez seja até bom que
você não venha almoçar.
— Talvez seja — ela admitiu, desligando.
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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

Ela fechou os olhos desesperada. O que fizera? Por que agira daquela
maneira? Meneou a cabeça e fitou as mãos trêmulas. Ao levantar os olhos
Edward a observava com uma expressão entristecida.
Audrey retomou ao escritório logo após as duas da tarde, armada do
conhecimento de que gozava de perfeita saúde e que viveria até os cem anos de
idade. Palavras do médico, não suas.
— Sc me sinto tão horrivelmente — murmurou baixinho, enquanto apoiava
a bolsa ao lado da escrivaninha. — Não sei se desejarei viver até os trinta anos.
Edward ergueu-se de detrás de sua mesa e saiu de seu escritório separado
por uma parede de vidro.
— Tudo bem! Basta! Não conseguirei concentrar-me no orçamento de
vendas, com você resmungando desse jeito! — ele se aproximou ainda mais —
Além disso, a vida é demasiado curta para se arruinar o pouco que se consegue.
Vá embora. Vá para casa, ou onde quer que esteja seu amado e faça as pazes
com ele. É uma ordem!
Audrey ficou por um momento surpresa. Depois animou-se. Edward estava
certo! Era exatamente o que ela devia fazer. Ir para casa e fazer as pazes. E daí se
Elliot só desejava sexo de sua parte? Talvez com o tempo as coisas mudassem.
Por que arruinar o que possuíam tentando apressar tudo?
Com um sincero obrigado e adeus, ela se apressou para o lugar onde
deixara o Magna estacionado na rua. Mas teve a ingrata surpresa de deparar com
Russell apoiado com enganadora indiferença na porta do motorista.
— Eu tinha certeza que a encontraria se soubesse esperar — ele observou
sardônico enquanto ela se aproximava, o coração aos saltos. — Embora esteja
bastante difícil reconhecer a antiga Audrey feiosa de algumas semanas atrás. Não
que isto faça alguma diferença... — seus lábios exibiram uma expressão cruel. —
Você poderia se matar de esforço, doçura, e ainda continuaria a ser a mais
incompetente na cama, sem rival no mundo inteiro!
O rubor cobriu-lhe as faces, mas a raiva substituiu de imediato qualquer
receio.
— Saia de minha frente, Russell. Não tenho a menor intenção de
permanecer aqui ouvindo você me insultar!
— É mesmo? E o que pretende fazer? Vai me despedir novamente?
— Eu não o despedi — ela retrucou.
— É claro que o fez, queridinha. Mas, sabe de uma coisa, fez-me um favor.
Consegui um emprego fantástico como gerente de vendas na Nova Guiné, e
começarei na semana que vem. Porém, não podia partir sem contar-lhe um
segredinho. — Sua boca se contorceu num sorriso malicioso.
— Diane não foi o único caso que tive. Também experimentei sua
madrasta. Sim... a sexy Lavínia... Aliás, ali está uma mulher que sabe como
agradar a uma homem. Ora, não precisa ficar tão pálida, gatinha. Será que o seu
playboy atual também está de olho por aquelas bandas? — Sua risada era
grotesca. — Aposto que sim. Por que não lhe pergunta como se entretém
enquanto você está trabalhando?
— Saia de minha frente! — Audrey gritou, afastando-o com violência para o
lado.
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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

Ele não tentou impedi-la de entrar no carro e partir. Um rápido olhar pelo
espelho retrovisor o mostrou ainda em pé, rindo dela.
Audrey apertava com força o volante durante o trajeto para casa. Quase
soluçou de alívio quando se aproximou da casa de Elliot. Só conseguia pensar cm
abraçá-lo. Ele a reconfortaria, a tranqüilizaria.
Mas seu alívio durou pouco. Chocou-se ao avistar um Fiat familiar, de cor
malva, estacionado ao lado do Saab negro na garagem de Elliot. Empalideceu ao
extremo e parou o carro numa manobra inábil. Lavínia dirigia um Fiat dessa cor.
Aliás nada comum. Não, ela pensava, sentindo-se adoecer. Não... Conseguiu com
dificuldade sair do carro, passar ao lado do Fiat, fitando a escadaria interna e a
porta fechada no topo. Mas não podia continuar. Temia o que poderia encontrar
se subisse a escada, sem ser esperada. Preferiu dar a volta e subir pela escadaria
de madeira que conduzia à entrada lateral da casa. Cada passo exigia um esforço.
Alcançando a sólida porta da frente, de madeira esculpida, tocou a
campainha. Então apoiou-se no corrimão, enquanto os segundos se escoavam. O
que estava Elliot fazendo, ela perguntava, que se demorava a atender?
Mas, afinal a porta foi entreaberta. Lá estava Elliot, os cabelos em
desalinho, um robe de seda vermelho cobrindo-lhe o corpo nu, exceto pela calça
do pijama, também de seda vermelha.
Sua mente lutava para encontrar alguma desculpa, alguma razão para o
espetáculo que tinha a sua frente. Mas, ao testemunhar o rubor de culpa no rosto
de Elliot, ela mergulhou em profundo desespero.
— Audrey! Você avisou que não voltaria para casa até à noite!
— Audrey? — ela discerniu a voz suqnesa(*) de Lavínia, dentro da casa.
— O que está fazendo aqui? — ele perguntou, quase zangado.
— Vim mais cedo para fazer as pazes — ela declarou com voz vazia. — Acho
que me enganei.
— Não é o que está imaginando, por Deus!
Ela deu uma risada. Parecia um copo quebrando em mil estilhaços.
— Meu pai tem um ditado. Se um animal se parece com um cão, late como
um cão e fareja como um cão, então, pode estar certa que se trata de um cão.
Passeou os olhos doloridos sobre seu corpo mal vestido antes de dar a volta
e descer correndo as escadas.
— Volte! — ele gritou-lhe.
Mas ela era demasiado rápida para ele. As chaves ainda se encontravam na
ignição. Saltou para dentro do Magna, ligou o motor, deu marcha a ré e saiu cm
disparada.
Lágrimas embaralhavam sua visão. Mas o tráfego era suave e ela não
encontrou dificuldades em colocar uma boa distância entre seu carro e algum
perseguidor. Ou ao menos acreditava nisso. Mas, quando diminuía a velocidade
perto de um farol vermelho, divisou o Saab negro de Elliot pelo espelho retrovisor,
aproximando-se velozmente.
Assim que a luz foi mudada para o verde, ela deu a partida, acelerando ao
máximo. Porém, um motorista na via transversal, decidira passar na luz

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Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

vermelha. A colisão foi inevitável. Audrey percebeu o veículo se aproximando


contra seu carro. Arregalou os olhos castanhos de pavor.
Ela não gritou por muito tempo. O impacto a lançou para frente, e ela
bateu a cabeça na roda de direção, mergulhando num negrume sem dor.
Testemunhas relataram, mais tarde, que um carro negro se avizinhou
alguns segundos após o acidente e um homem enlouquecido, trajando um robe
de seda vermelha correra para o sedan acidentado. Comentaram que jamais
esqueceriam sua expressão quando tentara abrir a porta esmagada, ou seu
chamasse ao gritar para que alguém chamasse socorro e uma ambulância, ou a
maneira pela qual deixou-se cair de joelhos no chão, ao lado da jovem motorista,
chorando como uma criança.

CAPÍTULO XII

— Não. — Audrcy virou o rosto de lado, evitando o pai. Fitava o vazio, no


quarto do hospital.
— Audrey... quando vai ser racional? Nada aconteceu entre Elliot e Lavínia
naquele dia. Até eu acredito. Oh, não estou afirmando que ela não teria ido para a
cama com ele, se ela tivesse conseguido seduzi-lo. Ela mesma admite. Mas Elliot
não queria nada com ela! Audrey virou a cabeça bem devagar sobre o travesseiro.
— Certo... — seus olhos pareciam mortos. — Por esta razão ele estava
seminu.
— Mas ele pode te explicar, sc você lhe der a oportunidade. Por que não o
recebe?
Audrey cerrou os olhos, a mente voltando involuntária ao dia em que ela já
apresentava condições para receber visitantes. Elliot e Lavínia haviam entrado
juntos em seu quarto. Ela os vislumbrara um ao lado do outro e se consumira
numa dor insuportável. Tudo parecera explodir em sua cabeça e ela se tornara
histérica, a ponto de o médico proibir que retomassem.
Lavínia não havia tentado retornar. Já Elliot não desistira. Fora difícil não
permitir que ele entrasse.
Havia retornado no dia seguinte e argumentado com o médico com tanta
veemência, que conseguira entrar, porém na presença do profissional. Audrey
havia ouvido a confrontação verbal no corredor, dando-lhe tempo de disfarçar seu
desgosto, encerrando-se num mutismo amargo. Mas, quando Elliot entrara no
quarto, por um momento ela se surpreendera com seu estado deplorável. Meu
Deus, parecia, que ele não dormia há uma semana!
Mas logo ela havia descartado qualquer sentimento de piedade e
endurecera seu coração. Decidira que ele estava sofrendo apenas pela culpa.
Quando começou a falar, ela advertiu o médico que, caso seu indesejável visitante
não partisse imediatamente, ela sairia da cama e se retiraria do quarto. Uma vez
que ela estava se recuperando da cirurgia e de diversas costelas esmagadas, sua
ameaça foi levada em conta.
Ao começar a movimentar as pernas de lado, sob o lençol, Elliot partira.
Mas ele não havia desistido.
84
Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

Ele telefonara. Ela desligara sem dizer palavra. Ele enviara flores e cartas.
Ela enviara as flores para o pavilhão das crianças e queimara as cartas,
observando o papel se curvar até se transformar em cinzas.
Audrey jamais acreditaria em nada que Elliot dissesse. Tudo estava bem
claro em sua mente. Ela o vira semidespido. Percebera seu embaraço culposo. A
incrível coincidência de Lavínia se encontrar na casa no único dia em que ela não
viria almoçar.
Só não entendia por que Elliot tentava mudar sua opinião. Que ela o
compreendesse e perdoasse. Bem, se ele estava preparado para ir para a cama
com gente como Lavínia, então, não possuía nenhuma consciência.
— Audrey...
Ela voltou ao presente, percebendo o pai ainda sentado ao lado.
— Sim?
— Ouça as explicações dele.
— Não. — Seu tom de voz era implacável e o pai ergueu-se, demonstrando
cansaço.
— Você é muito parecida com sua mãe. Ela também era teimosa. Não
prestou atenção quando tentei desfazer a tagarelice maliciosa de alguém me
acusando de tê-la desposado por dinheiro.
— E não foi o que fez? — indagou Audrey, sem rodeios.
— Sim... Mas sua mãe não o sabia. E, quando a fofoca a atingiu, há muito
tempo eu me apaixonara por ela. Tínhamos um bom matrimônio. Éramos felizes,
especialmente após o seu nascimento. Mas ela recusou a ouvir-me, não queria
enxergar a verdade além das aparências. Atirou fora o resto de nossas vidas
juntos e tornou minha vida pessoal um inferno. Recusava-se a dormir comigo e,
por fim, procurei Lavínia para conforto. Não repita o mesmo erro, Audrey. Não se
magoe inutilmente. Elliot a ama. Aposto tudo o que possuo!
Yvonne repetiu o mesmo, na tarde seguinte, quando veio visitá-la.
— Posso imaginar que a situação de Elliot com aquela mulher deve ter
parecido bem ruim — ela comentou abertamente. — Mas, Audrey... Elliot me
assegura que é inocente e eu acredito nele. Minha querida, se apenas pudesse tê-
lo visto nos dias que se seguiram ao seu acidente, quando você estava
mergulhada em coma, devido à concussão... Ele eslava fora de si. Não dormia,
não comia. Percebe o que está fazendo, recusando-se a dar-lhe uma chance de se
explicar? Ele não sabe para onde se voltar, o que fazer. Em desespero, pediu-me
para lhe transmitir uma mensagem, para dizer-lhe que ele não é um Russell.
Audrey hesitou. Pois é conceito de colocar Elliot na mesma categoria de
Russell era simplesmente inadmissível. Bem, ela era obrigada a encarar uma
remota possibilidade. Talvez tivesse se enganado quanto a Elliot. Talvez ele
tivesse sido vítima das circunstâncias, ou das manipulações de Lavínia. Talvez...
— Pense a esse respeito, minha cara — Yvonne recomendou com gentileza.
— Se não der a Elliot a oportunidade de se explicar, não vai sempre imaginar se
não cometeu um enorme erro? Você ama Elliot. Mas amor jamais é suficiente
para construir um futuro. Você deve também possuir confiança.
Audrey sentiu-se desesperar. Confiança... Era muito bonito para dizer, mas
havia uma fina linha entre confiança e ingenuidade. A mensagem de Elliot não
85
Bianca 536.2 – Amar outra vez – Miranda Lee

falava de amor e ela não podia se permitir cometer outro erro monumental. Não
se queria manter sua sanidade mental.
— Eu, prometo pensar no assunto, Yvonne. Obrigado. Você foi muito
bondosa vindo me visitar tantas vezes.
— Foi meu prazer. Bem, devo ir andando. Voltarei amanhã e
conversaremos um pouco mais
— Apreciaria muito. Você é uma amiga de verdade.
Audrey estava deitada, refletindo sobre as palavras de Yvonne, quando
ouviu um ligeiro ruído na porta. Avistou Lavínia entrando no quarto.
Sentiu-se indignada, cada fibra do corpo reagindo com violência. Devia
mostrar claramente seus sentimentos pela expressão do rosto, pois Lavínia
manteve-se afastada da cama, parecendo sofrer muito.
— Por favor, não me mande embora — suplicou. — Precisamos conversar.
Talvez tenham sido as lágrimas verdadeiras, jorrando dos olhos da
madrasta, que tenham suavizado o coração de Audrey. Ou o tato de a oponente
parecer muito mudada. Ela estava quase... desarrumada, o cabelo em desalinho,
sem maquilagem, o tailleur de linho amarelo todo amassado.
Audrey não conseguiu mandá-la embora. Mas tampouco podia falar. Ao
final, Lavínia aproximou-se desajeitadamente do pé da cama.
— Não sei por onde começar — ela soluçou, olhando para o chão. Lágrimas
corriam por suas faces e escorriam do nariz. — Você deve me odiar. Todos me
odeiam. Todos, exceto Warwick. Ele tem sido... surpreendentemente carinhoso e
compreensivo.
— Ele a ama — Audrey conseguiu dizer.
— Sim — Lavínia concordou. — Agora vejo esse sentimento. Porém antes
não conseguia. Eu pensava... — ela negou com um gesto de cabeça. — No dia em
que nos casamos ele me comunicou que não desejava filhos. Senti-me oprimida.
Eu desejava uma criança. Mas Warwick só parecia me desejar pelo sexo. Eu
acreditava que ele não conseguia amar mais ninguém após a morte de sua mãe.
Ele até a enviou para o internato. Porém, quando percebi sua ansiedade ao
esperar que voltasse para casa nas férias, eu me senti profundamente
enciumada. Eu detestava o lugar que você ocupava no coração dele — Lavínia
confessou infeliz.
— Não precisava, Lavínia — Audrey comentou com bondade. — Eu mesma
costumava acreditar que papai não me amava. Apenas há pouco percebi que ele
sente dificuldade em expressar seu amor.
— Sim, é o que ele tem me afiançado, mas também eu pensava que ele não
me amava, especialmente à medida que os anos foram passando e que ele parecia
se afastar de mim cada vez mais. O sexo tornou-se menos importante em sua
vida. Ele encontrou outros interesses, como jogar golfe e colecionar obras de arte.
Eu me sentia negligenciada. Eu... fiz coisas... das quais me arrependo
profundamente.
Audrey sentiu convulsões no estômago. Russell, ocorreu-lhe. Ela está se
referindo a Russell.
— Quando você começou a desabrochar como mulher, conquistando Elliot,
eu me consumi de inveja. Reconheço que enlouqueci. Eu queria feri-la e também
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a Warwick. Achei que, se conseguisse levar Elliot para a cama, eu dominaria o


monstro que crescia em meu interior. Mas Elliot não me tocou sequer. Eu juro,
Audrey! Não duvide jamais de seu amor. Ele a ama. E com intensidade. Acho que
ele próprio só percebeu quando aconteceu esta desgraça. Quem merece censura
sou eu, por você ter rompido com Elliot e pelo acidente. Você precisa acreditar cm
mim!
Audrey fitava os olhos negros cheios de dor e remorso e, finalmente,
compreendeu a verdade. Parecia ter sido chicoteada, tal a força de sua
compreensão da realidade.
— Eu acredito, Lavínia. Eu acredito.
— Oh, muito obrigado — ela gritou. — Muito obrigado. Talvez eu consiga
viver comigo mesma, depois de todo o mal que provoquei.
— Lavínia? — Audrey pronunciou trêmula, o coração aos saltos.
— Sim?
— Você se importaria de me deixar sozinha? Há algo que preciso fazer...
— Oh... Sim, naturalmente. Muito obrigado mais uma vez, Audrey, por me
ouvir. Espero que algum dia você também consiga me perdoar.
No momento em que Lavínia deixou o quarto, Audrey retirou o fone do
gancho, as mãos tremendo enquanto discava o número.
— Elliot Knight falando — ele atendeu no terceiro toque. Audrey
permaneceu silenciosa. Ele parecia extenuado. Sua voz exprimia tédio e
desinteresse pela vida. Em nada lembrava o Elliot que ela conhecia.
Ela sentiu-se consumir de arrependimento. O que eu fiz a ele, com minha
estúpida falta de confiança. Apenas um inocente sofreria desta maneira. Somente
um inocente persistiria após ter sido tão cruelmente rejeitado. Oh, como fui cega!
— Elliot?
O silêncio no outro lado da linha foi como um punhal em seu coração.
Podia sentir o tormento de Elliot como algo tangível, atravessando-lhe a alma.
— Elliot, desculpe-me — ela se esvaiu cm lágrimas. — Sei que não fez nada
de errado. Desculpe-me por ter duvidado de você. Eu... por favor, venha para cá,
junto a mim.
Sem fôlego para prosseguir, ela aguardou sua resposta. Mas ele continuava
mudo. Ou ela assim pensava. Mas, quando, afinal, sua voz soou na linha, ferida
pela emoção, ela percebeu que ele lutava para se controlar.
— Estarei aí assim que puder — ele garantiu com voz embargada. Chegou
ao hospital após vinte minutos. Sem dúvida realizara outro recorde, pois o
Hospital Royai North Shore ficava a muitos quilômetros de sua casa.
Audrey havia planejado saudá-lo com sorrisos calorosos e palavras de
amor. Porém, ao defrontar-se com seu rosto cansado e as enormes olheiras,
sombreando-lhe o rosto, ela explodiu cm lágrimas.
Por um momento, Elliot pareceu hesitar. Mas, logo, aproximou-se,
ajoelhando-se ao lado do leito e a tomou nos braços.
— Oh, Audrey — ele gemeu. — Minha querida... meu doce amor...
Permaneceram abraçados por longo tempo. Diversas enfermeiras espiaram
através da porta semi-aberta e se retiraram sorridentes.
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— Ainda bem que o velho e querido Russell partiu para a Nova Guiné —
Elliot proferiu muito tempo depois. — Pois se não estivesse bem longe, eu
pulverizaria aquele bastardo! Dá para entender bem a razão pela qual você tirou
aquelas conclusões, depois do que ele lhe falou.
— No entanto eu me precipitei. Deveria ter dado a você a oportunidade de
se explicar — Audrey murmurou — que se vestia daquela maneira pois estava
deitado sofrendo de enxaqueca.
— Após nossa conversa, eu tomara alguns comprimidos para dor e havia
caído num sono profundo quando Lavínia bateu na porta. Faltou-me presença de
espírito. Jamais deveria ter permitido que entrasse. Alem do mais, ela fingira
estar preocupada com você e queria verificar se estava tudo bem. Eu não pedi
que ela viesse, Audrey.
— Sei disto, agora, mas foi uma coincidência tão surpreendente, ela visitá-
lo no único dia em que cu não vinha almoçar.
— Não foi coincidência. Edward havia mencionado os exames médicos da
empresa, quando tomara um aperitivo com Warwick no fim de semana. Ela sabia
com exatidão onde você estaria. Quando começou a tentar me seduzir, eu a
repreendi. Adverti-lhe que seu comportamento levaria Warwick um dia a se
divorciar dela. E depois eu a acusei de sempre tê-la tratado muito mal. Quando
você chegou, eu estava terminando meu sermão. Ela parecia genuinamente
abalada. Mas, após o acidente, seu equilíbrio se rompeu. Lavínia é uma mulher
acometida de remorsos, acredite-me.
— Estou a par deste fato. Ela me procurou. Mas não foi apenas ela quem
abriu meus olhos. Foi Yvonne...
—- Ah, ela deu meu recado, não é mesmo, sobre eu não ser um Russell?
— Sim. Por que acreditei que você teria agido como ele, eu mesma não
consigo explicar.
— Nem sempre agi com nobreza, Audrey. Mas mudei.
— Moira mudou você — ela declarou com simplicidade. Elliot sentiu-se
abalado.
— O que está dizendo? Que sabe a respeito de Moira?
— Yvonne contou-me muito sobre Moira. E, também, sobre você.
— Sobre mim? Ela conhece muito pouco sobre minha vida!
— Não é bem assim. Ela era amiga íntima de Moira, Elliot. As mulheres
costumam fazer confidências entre si. Elas não precisam bancar as duronas,
como os homens. Podem se abrir umas com as outras, sem receio de serem
ridicularizadas, ou de serem consideradas fracas.
— Deve ser uma sensação muito boa, não precisar ficar representando todo
o tempo, uma força que não se sente — ele murmurou, os olhos cinzentos
enevoados por pensamentos profundos.
— Poderá sempre abrir-se comigo, Elliot — ela convidou gentil. — É assim
o verdadeiro amor. Não precisa mais sentir-se solitário, guardar para si segredos
sombrios.
Ele a fitou por longo tempo, os olhos pensativos. Depois pegou-lhe a mão e
se exprimiu com voz comedida:

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— Neste caso, há algo que quero contar-lhe, que pode explicar minha
atitude passada em relação ao amor.
— Sim?
— Houve uma vez uma moça...
Audrey procurou manter-se impassível. Uma moça? Com certeza ele não
estava se referindo a Moira.
— Ela era rica... bela... sexy. Eu contava vinte e dois anos, nessa época. Foi
meu primeiro ano no circuito europeu de esqui. Ela se chamava Felicity e, para
ela, a temporada de esqui era um passatempo ocioso. Deixei-me levar pelas
aparências, e me apaixonei perdidamente. Ela garantiu que me amava e desejava
conhecer tudo a meu respeito. Jamais gostei de discorrer sobre meu passado,
mas ela insistiu muito e eu cedi, contando sobre...
Seus olhos se cnsombrcccram(*).
— Yvonne falou sobre minha infância e... minha mãe? Audrey acenou,
afirmativamente.
— Sei que era alcoólatra e que o abandonou aos oito anos de idade. Sei
também a respeito dos lares de adoção e da instituição de caridade...
Por um breve momento, Elliot pareceu aborrecido. Mas, logo, um sorriso
estranho suavizando seu aborrecimento.
— Moira sempre considerou necessário conhecer o passado das pessoas.
Ela acreditava que aí estava a chave de seu futuro. Não uma desculpa, mas a
explicação...
Uma mulher extraordinária a sua Moira, Audrey refletiu.
— De qualquer modo, falhei em não perceber a reação de desagrado de
Felicity quando descobriu minha origem e onde fora criado. Ela não voltou a meu
quarto na noite seguinte e eu procurei por ela. E a encontrei mesmo...
Era impossível negar o pesado cinismo na voz de Elliot.
— Na cama com outro homem?
— Não exatamente. Na cama com dois outros homens.
Audrey retraiu-se desgostosa.
— Sim. Não era um belo quadro. Ela nem percebeu que eu entrara. Estava
ah... muito ocupada.
— Oh Elliot, entendo que tal experiência o tornou amargo quanto ao amor e
às mulheres.
— Em parte. Mas este não é o ponto importante da história.
— Eu... eu não compreendo.
— Muito rapidamente eu compreendi que jamais havia amado Felicity, que
meus sentimentos eram inteiramente voltados para o sexo. Ela fora minha
primeira mulher. Infelizmente, minha fria reação ante a deslealdade dela apenas
reforçou o que eu já suspeitava sobre mim mesmo. Que era um bastardo, a quem
fora negada a oportunidade de amor e carinho durante os anos de crescimento.
Após esta infeliz experiência, mergulhei numa vida de relacionamentos sexuais
transitórios, jamais me importando quando algum caso terminava. Agi deste
modo ate conhecer Moira, quando descobri a possibilidade de ser amigo de uma
mulher. — Ele sorriu com tristeza. — Sabe de uma coisa. Ela costumava
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argumentar que se eu fosse mesmo um conquistador inveterado, sem


consideração pelas minhas "vítimas", por que escolheria sempre mulheres
maduras, que dificilmente teriam seus corações quebrados? É claro que eu
rebatia, acusando-a de louca, afirmando que era um devasso e um libertino. Mas
ela se limitava a rir, ao ouvir tais palavras e sugeria que, neste caso eu deveria
viver com ela, dando-lhe a oportunidade de salvar minha alma.
— E foi o que ela fez de certo modo...
Elliot negou com um gesto de cabeça.
— Não, Audrey. Moira não me salvou em absoluto. Enquanto estive casado
com ela, eu fazia exatamente o que gostava, quando gostava e minha única
concessão ao casamento foi minha fidelidade a ela. Eu a magoava com minha
indiferença. Moira me amava de verdade. Antes de morrer, ela me confessou. Isto
acabou comigo. Obriguei-me a prometer que jamais magoaria ninguém
novamente.
Ele fechou os olhos, atormentado.
— Mas falhei... Com você... — ele suspirou profundamente. — Bem, eu
tentei evitar que isso acontecesse. Naquela sexta-feira à noite, em que a deixei em
casa, eu quebrei o recorde mundial de banhos de chuveiro frios. E o que fez você?
Telefonou-me. Pediu-me para revê-la e, depois surgiu parecendo uma deusa. Eu
me advertia para me afastar, mas, de algum modo, meu corpo não captou tal
mensagem. Nem meu coração. Pois, enquanto ansiava fazer amor com você,
também desejava acarinhá-la e protegê-la, dar-lhe tudo o que merecia. Mas eu
desperdiçara muitos anos de minha vida não prestando atenção a meu coração...
Não compreendi a nova mensagem. Eu aprendera apenas a conhecer as
exigências de meu físico.
Ele estendeu a mão, tocando-lhe a face com gentileza.
— Porém, de certo modo, foi o sexo que me mostrou a diferença entre o que
eu sentia por você e por qualquer outra mulher que já conhecera. No passado,
conseguia saciar meus desejos com freqüência. Mas com você, Audrey... Quanto
mais amor fizesse com você, mais eu a desejava e necessitava. Você me fazia
sentir-me tão especial, minha querida, tão amado. Se alguém me salvou, doçura,
foi você... com sua natureza altruísta, sua alma confiante, sua beleza autêntica...
Ele a beijou então, os lábios tremendo de emoção.
— Foi preciso o choque de avistá-la inconsciente naquele carro para me
despertar do longo sonho em que me paralisara. Rezei por sua vida nesse dia,
Audrey. Supliquei com fervor. E prometi a Deus, que se me devolvesse você,
jamais a magoaria novamente, enquanto eu vivesse. Eu a amo, Audrey. Amo
terrivelmente. E desejo casar-me com você, ter filhos com você. Você arriscaria?
Diria sim?
Audrey sentiu-se enlevada de alegria.
— Oh, Elliot. Você me faz sentir tanta felicidade.
— Assim espero, minha amada. Pois ninguém merece ser mais feliz do que
você.
A música se iniciou e Audrey deu o braço ao pai, olhando-o de relance, com
amor. Ele parecia muito belo e orgulhoso da filha em traje de noiva. Sem

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mencionar seu orgulho por se tornar, em breve espaço de tempo, o orgulhoso pai
de um bebê por nascer. Lavínia anunciara há pouco sua gravidez.
— Você está tão linda — ele sussurrou, ao começarem a caminhar atrás da
dama de honra. — E, também sua amiga. Aquele tom de vermelho-escuro lhe cai
muito bem.
Audrey sorriu, lembrando-se de como Yvonne havia resistido de início em
aceitar ser sua dama de honra. Ao lado de Nigel, representando o melhor amigo.
— Mas sou muito velha! — ela havia protestado.
— É melhor atender a seu pedido Yvonne — Elliot aconselhara, suspirando.
— Só Deus sabe onde foi parar aquela doce e maleável coisinha jovem por quem
me apaixonei. Transformou-se numa ditadora! Sabe o que me disse outro dia?
Que era melhor eu voltar a trabalhar, que não suportaria que o pai de seus filhos
ficasse vagando pela casa o dia inteiro como um gigolô.
Todos havia desatado numa alegre risada e Yvonne cedera.
Chegara o grande momento e Audrey caminhava pelo adro da igreja,
sorrindo para os amigos e parentes, todos lançando olhares de admiração. Logo,
o cortejo de honra chegou ao fim do trajeto e a noiva avistou Elliot, aguardando
por ela.
Seus olhos se encontraram e ela reviveu tudo. O primeiro momento no café,
o galante cavaleiro vindo em sua salvação; o maravilhoso fim de semana, fazendo
amor no chalé; as longas conversas, que se estendiam pela noite; e, agora, isto...
Focalizou Elliot... Este era o melhor momento de todos, em que se fundiriam
numa só pessoa para sempre.
Aproximou-se e ele tomou-lhe a mão, sorrindo com amor.
— Não está nervosa, não é mesmo? — ele indagou suavemente.
— Não.
— Amo você.
— Também te amo...
O ministro tossiu de leve e começou a falar.
"Nós, aqui reunidos, diante de Deus... para unir este homem e esta mulher
pelos laços do sagrado matrimônio..."
Espectadores contariam durante muitos anos sobre o casamento, que
haviam testemunhado entre o surpreendentemente belo noivo e sua delicada e
linda noiva, sobre a maneira enlevada como se fitavam durante a cerimônia e
como, no momento em que o ministro os declarara marido e mulher, não havia
um par de olhos que não estivesse marejado de lágrimas na igreja.

Bianca
Uma história de paixão e amor!
Edição 537
Adorável sedutora
Lindsay Armstrong
Quando Liam a abraçou, Jane quis se afastar, evitar-lhe os lábios sensuais
que se apoderavam dos seus com sofreguidão. Entretanto, traída pelo próprio
desejo, viu-se correspondendo apaixonada, esquecendo-se por um instante de
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que prometera a si mesma jamais ceder ao desafio desse homem que queria levá-
la para a cama a qualquer custo. Como se não bastasse ter de dividir a casa com
ele, agora precisava enfrentar-lhe a firme disposição de conquistá-la! E o pior era
que estava começando a gostar desse jogo perigoso...

Uma história de paixão e amor!


Edição 537
Laços de uma paixão
Jennifer Taylor
Quase três anos após o divórcio, Maggie reencontrou Mattew, mal podendo
acreditar que seu corpo ainda reagia tão intensamente à proximidade desse
homem viril e sensual que um dia fora seu marido. Contudo, agora mais que
nunca, precisava resistir à paixão que a sufocava desde que o conhecera.
Sabia que se sucumbisse ao toque sedutor das mãos morenas e másculas,
seu segredo seria violado.
O que significava que Mattew a faria pagar muito caro por ter lhe escondido
a filha gerada na última noite feliz de seu casamento...

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