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Prólogo

Russell nasceu no seio de uma grande alcateia que dominava o lado oeste
do país. Como perdeu os pais cedo, foi abandonado na floresta para ser
comido pelos animais. Afinal, seu pai era o alfa que tinha acabado ser
morto por um usurpador, que tomou seu lugar na liderança do bando.

O bebê foi encontrado por Kirk na floresta, o beta do bando de shifters


ursos que vivia nas proximidades. Os ursos viviam em tranquilidade na
região mais árida da cidade, mas frequentavam a floresta em busca de lenha
e isso era a única coisa que tiravam de lá. Nunca passavam da área comum,
porque a floresta fazia parte do território dos lobos e eles evitavam
problemas.

Tempos antes, lobos e ursos viviam em pé de guerra quando se


encontravam na floresta, mas um tratado de paz foi feito e uma área comum
foi estabelecida, os ursos poderiam usá-la sem que ninguém os
importunasse. Porque os ursos costumavam ser pacíficos, até que fossem
provocados.

Para dentro dela, era território dos lobos e os ursos não invadiam. Não por
medo, mas porque respeitavam os espaços alheios. Os lobos não invadiam
seu território e vice-versa.

Viviam, portanto, em paz.

Mas a paz dentro da alcateia foi quebrada no dia em que Kirk encontrou o
bebê na floresta, foi quando um lobo usurpou o posto de alfa e as coisas
mudaram. Kirk, sem saber o que estava acontecendo, até tentou devolver o
bebê, mas o novo líder não quis.

"Faça o que quiser com ele!" Foi o que ele disse. Kirk então levou o bebê
lobo para seu bando e lá o criou como seu filho, com o aval de Desmond, o
alfa do bando dos ursos.

Mais de trinta anos depois, o bando de ursos recebe a visita de uns lobos,
dizendo que o alfa deles, aquele alfa mal, estava enfim morto e que eles
sabiam que lá morava o sucessor da alcateia por direito. Só então Russell
soube que era filho do antigo alfa dos lobos, aquele que foi assassinado
anos antes.

Até então, ninguém no bando dos ursos sabia que aquele bebê era filho do
antigo alfa, que foi morto para que o usurpador ficasse com a alcateia. Um
dos membros mais antigos dos lobos guardou o segredo por muito tempo.
Sabia que o filho do alfa estava em boas mãos e agora, com a morte do alfa,
Russell podia voltar e assumir o bando.

Era o que a maioria deles queria e esperava. Caso Russell se recusasse, a


alcateia poderia ficar em péssimas mãos.

Capítulo 01

— Eu não vou, pai. — Russell falou cheio de irritação para Kirk.

— Eu imagino que não queira, meu filho. Mas saiba que se for da sua
vontade, eu e sua mãe não vamos nos opor. Já falei com ela, ela chorou,
mas ela entende.

— Eu não gosto daqueles lobos, daquele lugar...

— Eu também não, Rus, e prefiro você aqui com a gente.

Depois da conversa curta, Russell foi para a sua casa, que ficava dentro do
terreno da fazenda do pai. A residência pequena e modesta, contava com
uma decoração campestre, onde havia o predomínio do marrom, da madeira
e do couro sintético. A casa toda mantinha aquele aroma de campo, com um
toque de sândalo. Quadros com cavalos adornavam a sala. Os animais eram
uma das paixões de Russell, que mesmo sendo um lobo, parecia amansar os
equinos com que convivia. Embora soubesse montar, ele evitava, porque
tendo ele um animal interno, não se sentia bem sendo carregado por outro.
Tinha uma relação amistosa com os cavalos da fazenda, não sendo
incomum que ele mesmo os lavasse e escovasse suas crinas. Algo que tinha
uma ação quase terapêutica em seu organismo.
Mas o comum mesmo era que ele fosse visto soltando os animais no pasto,
ou passeando ao lado deles. Sentia-se privilegiado por poder conviver com
cavalos livres. Algo que não se via em quase nenhum lugar do mundo.

Todos os ursos viviam próximos, em espécies de fazendas e sítios. Alguns


terrenos continham mais de uma casa, outros apenas uma, mas nenhum
deles era muito grande. Nem mesmo o de Desmond, o alfa.

Naquela tarde, Russell trabalhou no campo, tratou dos cavalos, carregou


lenha para a casa dos pais, para a sua, consertou um trator e ajudou o
cuidador a tratar de outros animais, porque era ele quem cuidava da fazenda
do pai, enquanto Kirk ajudava a administrar o bando, uma vez que o alfa
também tinha seus negócios para cuidar.

Passou a tarde inteira trabalhando para esquecer que seu passado tinha
batido à porta e ele não queria ir. Depois de passar a vida toda tentando se
afirmar em meio aos enormes ursos, mesmo tendo sido adotado pelo beta,
ele não queria ter que se enfiar no bando que o tinha rejeitado.

Russell tinha pouco mais de 1,70 m de altura, era o menor do bando, que
era formado por homens que pareciam gigantes em sua maioria. Fora que
ele era um lobo em meio aos ursos, sendo que até algumas mulheres eram
maiores que ele e uns poucos ômegas também. Levou anos até que ele
adquirisse autoconfiança para se impor, ainda que os ursos fossem bastante
tranquilos. Não era fácil crescer se achando um nanico, além de ser o único
lobo do bando.

Com o tempo ele se estabilizou e conseguia se divertir entre os ursos, que


não se importavam com o seu tamanho e até gostavam que ele fosse
diferente. Porque no fim das contas, Russell era um homem forte, com
grande presença de espírito, calmo, era bom de luta, educado, bonito,
bastante divertido e generoso na cama e assim como os outros ursos, sabia
cozinhar. Ele se integrou.

Além disso, ele sabia cuidar de tudo na fazenda dos pais e ainda que
houvesse uns poucos funcionários, era ele quem comandava as coisas lá e
era assim que tirava o seu sustento.
Ele não queria ir embora e bufava de raiva daqueles homens que tinham ido
atrapalhar o seu sossego. Mas os homens pareciam mesmo dispostos a
convencê-lo e voltaram no dia seguinte e no outro. Russell não aguentava
mais a insistência. Até que Abel, seu melhor amigo, lançou um argumento
intrigante.

— Rus, eu sei que você não quer ir. Eu também não quero que você vá para
aquela bosta de alcateia, mas você sabe que o bando deles é maior que o
nosso. E se o novo alfa for realmente pior que o antigo e acabar com a área
comum? Podemos ser impedidos de entrar na floresta e não quero que a
gente tenha que entrar em guerra com aqueles sarnentos. Se você for o alfa,
nunca mais teremos problemas e poderemos viver em paz de uma vez por
todas.

As palavras de Abel acenderam uma luzinha na mente de Russell. Ele podia


até ser pequeno, mas tinha um grande instinto protetor e um imenso amor
pelo bando de ursos, principalmente pelos pais, a quem seria eternamente
grato por terem o acolhido.

Faria qualquer coisa para manter os ursos seguros e felizes.

— A alcateia não fica longe daqui. Você poderia ver seus pais sempre. E eu
vou lá te visitar.

Porque não deve ser fácil ficar no meio de cachorros. — Abel


complementou, rindo. — Fora que você já está com trinta e cinco anos e
não encontrou seu companheiro. Quem sabe ele não está entre os lobos? —
Abel brincou, fazendo uma careta, já que adorava praguejar contra os lobos.

— Ai, Abel... — Russell riu. — Eu não estou querendo um companheiro.


Estou bem assim...

Com "assim" ele queria dizer: tendo sexo forte e casual com os grandes
ursos ou com humanos. Algo gostoso e prático, mas sem compromisso.

— Claro... mas pensa no que eu te falei. Pode ser um jeito de deixar os dois
bandos em paz.
E eu vou mesmo te visitar, mesmo não suportando lobos.

— Você sabe que eu sou um lobo, não sabe? — Russell riu.

— Você é único lobo que eu gosto, Rus. — ele dava uma risada gostosa ao
prender os longos cabelos loiros em um rabo de cavalo.

— Mas faz sentido isso que está dizendo. Eu vou pensar melhor.

Foi depois disso que Russell se decidiu. Ele não precisava da opinião de
ninguém, ele já estava certo. Só tinha uma forma de deixar o seu querido
bando de ursos sossegado. Ele precisava ir embora.

Ele seria o novo alfa dos lobos.

Capítulo 02

Talvez eu devesse falar com meu pai antes de ter decidido, mas de alguma
forma eu sentia que ele compreendia que aquele era o meu destino. Assim
como ele sempre soube que eu não sou do tipo que consulta os outros para
tomar minhas decisões.

Não posso negar que as palavras de Abel me afetaram e influenciaram,


porque além do amor e da gratidão que tenho pelos meus pais, eu faria de
tudo para deixar o meu bando mais seguro, mesmo que isso me fizesse ir
embora.

Mais uma vez as palavras de Abel foram decisivas. A alcateia era logo ali,
eu poderia sempre ver minha família, inclusive ver Abel, meu melhor
amigo.

Eu não diria que estava feliz com essa decisão, porque eu amo a fazenda e a
minha casa.

Amo estar entre os ursos, que me aceitaram, ainda que eu fosse um lobo e
um homem bem menor do que eles. Sempre fui respeitado e também por
isso eu faria qualquer coisa para deixar meu bando tranquilo. E me tornar o
alfa da alcateia vizinha faria com que não houvesse mais animosidade na
floresta, faria com que os ursos não tivessem mais inimigos.
Assim eu fui. Empacotei minhas coisas, me despedi dos meus pais, com
choros e abraços, coloquei as coisas na caminhonete e fui. Optei pela
estrada, porque só entrava na mata para recolher lenha, não havia estrada
por lá e embora alguns lobos passassem por lá com carro, eu sempre achei
aquilo errado.

Logo que cheguei fui recepcionado pelos dois homens que tinham ido à
fazenda me convencer a me tornar o alfa daquela alcateia. Joshua e Kurt
foram os que me recepcionaram e mostraram a alcateia, me apresentaram às
pessoas e me levaram à reunião com os executores.

Eles também me contaram que eram muito amigos do meu pai biológico,
fazendo questão de dizer que ele tinha sido um ótimo alfa, antes do alfa
anterior ter armado uma emboscada para matá-lo e tomar seu lugar. Algo
me dizia que as pessoas não eram muito confiáveis naquele bando, mas eu
me apegava ao fato de que poderia tornar a vida dos ursos mais tranquila. A
vida dos meus pais de criação mais segura.

Assim que eu entrei no salão de reuniões, no que eles chamavam de sede da


alcateia, que mais parecia uma pequena igreja de cidade pequena. Aquela
era uma cidade pequena, mas com certeza aquilo não era uma igreja. Logo
que entrei, percebi risadinhas e comentários. Ainda que não pudesse
compreender tudo o que diziam, eu sabia a que se referiam. Até que um
engraçadinho resolveu falar abertamente.

— Esse é o novo alfa?

Seu tom de desdém e seu olhar passeando sobre mim me fez entender de
imediato ao que ele se referia.

— Sim, Payton. Sente-se. — falou Kurt, aparentemente irritado.

— Ele não tem tamanho de alfa. — disse um outro. Sem escárnio, mas com
o mesmo descrédito.

— Você gostaria de me desafiar? — eu precisei perguntar ao homem. —


Porque eu estava tranquilo na minha casa até baterem na minha porta
dizendo que eu tinha uma alcateia para liderar. — falei com indiferença,
mas com a firmeza que tinha aprendido com meu pai. Todos ficaram em
silêncio. O tal de Payton se sentou, mas seu olhar de descrença ainda estava
lá, pairando sobre mim. Tentando me desnudar. Eu podia ver.

— Fiquem em silêncio! — Joshua falou aos demais. E então explicou


porque eu estava ali.

Sobre meu pai, sobre a usurpação do posto e coisas que os presentes sabiam
muito melhor do que eu.

Lobos shifters, assim como ursos precisavam viver em comunidade.


Embora houvesse os lobos solitários por aí, o normal era o agrupamento em
bandos, sempre com um líder. Vivessem dentro ou fora das cidades. No
caso daquela alcateia, todos viviam na cidade, junto aos humanos e mesmo
que ninguém soubesse de sua natureza excepcional, assim como também
não sabiam que dos ursos, eles viviam bem integrados, mas sob suas
próprias regras e unidos em torno de um alfa.

— Nós precisamos fazer justiça e devolver a liderança da alcateia a Russell.


Porque todos sabemos que tanto o alfa quanto o beta eram usurpadores. E
de acordo com nossas regras, a sucessão da liderança do nosso bando é feita
pela confiança ou pelo sangue. Como o beta também está morto e o filho do
antigo alfa está vivo, é dele o direito. Por isso ele está aqui. —

dizia Kurt aos presentes.

— E todos nós precisamos respeitá-lo. Porque ele é a melhor opção que


temos. Ou vocês querem viver sob a opressão novamente? — uma mulher
se levantou para dizer.

As pessoas se entreolharam e concordaram com ela. Mas muitos olhavam


com descrédito.

Então Kurt disse que eu precisa escolher um beta. Mas como eu escolheria
alguém de confiança num lugar onde eu não conhecia ninguém?

— Se eu não estivesse aqui, quem vocês escolheriam como alfa? — eu


perguntei, porque foi a melhor ideia que tive no momento.
Alguns nomes pularam na boca das pessoas, mas o que se destacou foi
Finnegan.

— Finnegan será meu beta, então. — eu disse, torcendo para que o cara não
fosse um babaca.

Então um homem enorme se levantou lá atrás.

— Eu sou o Finnegan. Obrigado, alfa. — ele sorriu sem jeito e respeitoso.


Embora fosse muito alto, não me olhou como alguns outros.

Tudo bem que o tal do Finnegan podia ser um cara enorme, mas o fato de
ele não parecer um completo imbecil e de aquilo ter deixado as pessoas
alegres me pareceu um começo razoável. Eu não queria precisar ter que ser
grosseiro novamente, porque eu sabia que se fosse preciso eu seria. Vivendo
entre homens enormes, eu precisei me impor muitas vezes e nem sempre fiz
isso de forma amigável, confesso. Já precisei descer na porrada um ou outro
grandão metido a besta, humano ou urso, que tentou ter alguma diversão às
minhas custas. E embora eu soubesse me defender, não posso dizer que
minha autoestima tinha saído intacta do meu processo idiota de
autoafirmação. Vez ou outra a insegurança das as caras.

Depois daquela reunião, o próprio Finnegan, que me pediu para o chamar


apenas de Finn, me levou para onde seria a minha casa, ou seja, para a casa
do alfa morto. O lugar era enorme e muito bem decorado. Dava umas três
da minha casa na fazenda e com certeza era a maior casa da alcateia, mas
além de eu achar muito grande, não conseguiria morar na casa do homem
que matou minha família.

— O que você acha dessa casa, Finn?

— Eu acho uma boa casa, alfa.

Confesso que ser chamado de alfa ainda era estranho pra mim. E mesmo
que eu dissesse a ele para me chamar pelo nome, ele me chamava pelo meu
novo título.

— Você trocaria de casa comigo?


— Senhor, mas eu moro sozinho. Minha casa é muito pequena. — o meu
beta se espantou.

— Eu não me importo. Você trocaria?

— Trocaria.

— Ótimo! Então chame os executores e vamos fazer a mudança.

Naquele mesmo dia eu me instalei na casa de Finn e ele na casa do alfa


antigo. Minha vida tinha mudado por completo, de repente. Criado por
ursos em uma fazenda, agora eu era líder de um bando totalmente
desconhecido pra mim e precisava descobrir como faria as coisas
funcionarem.

***

Minha sorte é que meu estranho sistema tinha me ajudado a escolher um


beta fácil de lidar e com bastante inciativa. Além de organizar rapidamente
os homens para fazer nossa troca de casas, ele me explicou como tudo
funcionava, me mostrou as coisas na alcateia e me deu ideias do achava que
podia melhorar. Finn estava mesmo animado com a ideia de ser beta e
poder ajudar o povo que segundo ele tinha sofrido muito nas mãos do
antigo alfa.

Foi um dia longo de muito trabalho, assim como seriam os dias seguintes.
Muitas casas estavam velhas na alcateia, quase não havia áreas comuns e as
que havia estavam velhas, não viam reparos há anos e além de um refeitório
para os executores, eu pretendia criar uma enfermaria, mesmo que simples,
e uma área para as crianças brincarem na região da sede do bando, aquela
que parecia uma igreja e em torno da qual maioria das casas ficava. A
minha ficava mais distante, assim como algumas outras.

No meu bando, ou melhor, no meu antigo bando, havia uma boa enfermaria
e contávamos com um médico. Mesmo que os ursos fossem em menor
número, era possível ver que eram um grupo mais bem organizado. Soube
que havia um enfermeiro entre os lobos e esperava contar com seus
serviços, pretendia reorganizar os recursos e os usar de forma diferente da
que o outro alfa fazia. Mas eu ainda encontraria muita dificuldade e
resistência por parte de alguns, porque por onde eu passava ouvia risos e
ironias sobre minha altura. Eu me senti no início da adolescência e eu
realmente não tinha muita paciência com adolescentes bobos. Levaria um
tempo para que eu ganhasse a confiança de um bando tão acostumado a
associar a capacidade de liderança com o tamanho e a forma física. Mas eu
estava disposto a tentar. E ver o empenho e a vibração do meu beta me
ajudava a ter ânimo.

Montei uma pequena oficina de marcenaria na parte de trás da minha nova


casa e lá eu pretendia começar a construir peças para a área de lazer que eu
pretendia criar e para a manutenção de algumas casas nas minhas horas
vagas. Precisaria de ajuda, por isso pedi para que Finn me indicasse alguém
que pudesse me ajudar no trabalho. Alguém forte e disposto a aprender.

— Eu conheço alguém que será perfeito para te ajudar, alfa.

Assim ele me trouxe Cameron. Um executor alto e forte, como quase todo
mundo naquele lugar, mas diferentemente da maioria, ele tinha o olhar
tranquilo e doce. Sempre sorrindo, ele parecia feliz em colaborar. Só depois
eu soube que ele talvez tivesse alguma lentidão para tarefas intelectuais,
mas era ótimo executando trabalhos manuais pesados. E eu particularmente
tinha gostado dele.

Apesar de eu ter percebido os outros executores fazendo piadas com relação


à lentidão de Cameron, não notei que ele tivesse dificuldade em
compreender o que eu ensinava e atribuí as gracinhas mais ao preconceito
que a alguma deficiência real.

— Chega! Não quero mais gracinhas aqui! Ou alguém vai ter que me
desafiar em um combate. — falei durante uma reunião, tirando minha
camisa, deixando claro que eu podia até conviver com as desconfianças
deles com relação ao meu tamanho, mas não aceitaria que tentassem
oprimir outras pessoas.

Ninguém moveu um músculo.


Vesti minha camisa de flanela e continuei a reunião normalmente. Mais
tarde, enquanto serrava madeira para consertar um telhado, Cameron me
agradeceu, dizendo que já estava acostumado, que eu não precisava me
importar com aquilo.

— Eles falam isso, porque eu sou meio lento, mas eu não ligo, alfa. —
Cameron falou. — Eu já estou acostumado.

— Com o seu tamanho, Cameron, eles não deviam se meter com você.

— Mas aqui todo mundo é grande, alfa. A maioria é até maior do que eu. —
ele sorria. — E

eu realmente não me importo. Não quero que eles tenham medo de mim...
não gosto de violência.

Eu sorri, olhando para aquele homem forte, com a camisa amarrada na


cintura, barba por fazer, músculos brilhando de suor e o rosto suave,
enquanto ele serrava a madeira e falava tranquilamente, pouco se
importando para a opinião alheia. Assim era Cameron. Forte, grande e bom.
Como o meu beta. Mas ele não cheirava como Finn, ele tinha um perfume
realmente especial. E justamente por isso eu tinha que me manter longe
dele.

Para a minha sorte, eu estava rodeado das melhores pessoas da alcateia e


aquilo me enchia de esperança.

***

Quando Finn chamou os executores para ajudar na mudança, Cameron não


imaginou que fosse se sentir tão bem perto do cara. Não apenas porque ele
parecia um alfa muito melhor que o anterior, mas porque tinha algo nele
que fazia seu estômago borbulhar.

Ele ficava nervoso, porque nunca tinha visto um homem que ele achava tão
bonito antes.
Nem tão gentil e educado com ele. Nem tão cheiroso. O homem tinha um
cheiro quente, que lembrava calor, mas com notas frescas de folhas.
Cameron não sabia explicar.

Ele não era como os lobos da alcateia, muito menos como o antigo alfa.
Russell tratava todo mundo com respeito, olhava a todos nos olhos e, Jesus,
sempre que ele olhava nos olhos de Cameron, ele sentia a barriga roncar de
uma forma estranha, como se eu tivesse fome, sem ter.

Seguramente, ele não se interessaria por alguém como Cameron, pensava o


executor.

Nunca o olharia de uma forma diferente. Não com tantos homens e


mulheres bonitas ao redor como havia na alcateia. Homens bonitos e muito
menos enrolados que ele, porque Cameron era um péssimo partido. Tinha
que cuidar de Billy e aquilo tomava muito do seu tempo. Fora que nenhum
homem adulto parecia gostar muito de crianças. Não para manter uma
relação duradoura, pelo menos.

Para ir de vez quando para a cama não tinha problema, mas aguentar as
coisas diárias ninguém estava disposto. Se bem que até sexo casual fazia
tempo que Cameron não tinha. Com o trabalho dobrado na alcateia e tendo
que cuidar do sobrinho, não sobrava muito tempo para ele. Isso porque ele
tinha uma vizinha que o ajudava com o garotinho de três anos.

Desde que sua irmã e o companheiro morreram, Cameron, que já não tinha
pais, ficou encarregado e cuidar do sobrinho, porque não tinha mais
ninguém no mundo para cuidar dele.

Ninguém nunca soube o que aconteceu com sua irmã, mas ele tinha certeza
de que era coisa do alfa. Dias antes do desaparecimento dos dois, eles
tinham tido uma discussão com o alfa e pouco tempo depois os dois
apareceram mortos. Foi um grande sofrimento para Cameron. Agora ele
cuidava do sobrinho, mas ainda sentia muito a falta da irmã. Billy era agora
toda a família que ele tinha.

Sua vida era trabalhar e cuidar do sobrinho. Quase não tinha tempo pra se
divertir e quando tinha acabava fazendo alguma coisa com o garotinho. Por
causa disso, quando ele olhava para o alfa lindo que a alcateia tinha
ganhado, por mais que sua barriga ficasse estranha, ele tinha certeza de que
nunca teria sequer uma chance com aquele cara que parecia um sonho, um
cowboy sexy de filme.

Estava certo de se Russell gostasse de homens como muitos shifters,


preferiria a companhia de homens menores, ou delicados como os ômegas.
Ou até mesmo de mulheres. Com certeza, o alfa não ia gostar de um cara
mais alto que ele, meio desengonçado e um pouco confuso. Não.

Por isso, Cameron se contentaria em observá-lo de longe, quando Russell


não tivesse olhando e fantasiaria com ele nas noites solitárias em seu
quarto, depois que Billy já estivesse dormindo.

Lembrando do seu cheiro e da sua voz. Porque Cameron não se sentia


muito sortudo, nem muito esperto. Como se não tivesse nada de especial
sobre ele. Pelo menos nada que faria o alfa lindo olhar para ele uma
segunda vez.

***

Com muito custo, eu tentava colocar aquela alcateia em ordem, mas a cada
dia eu me deparava com uma coisa mais estranha que a outra.

Mas talvez a pior de todas elas aconteceu naquela tarde, quando eu estava
na minha casa, descansando um pouco depois do almoço e um executor
chegou com três ômegas. Cameron tinha feito uma pausa também e por
mais que eu o chamasse para almoçar comigo na cozinha, ele sempre se
recusava e pegava o lanchinho que tinha levado, sentava perto dos cavaletes
e comia sozinho. Eu sinceramente preferia que ele tivesse uma refeição
quente e mais substancial,

afinal, um homem do tamanho dele, que trabalhava tanto, precisava se


alimentar bem, mas como ele parecia não gostar de entrar na minha casa, eu
não insistia. Apenas deixava um lanche extra ou suco pra que ele tomasse,
sem parecer insistente, porque o cara parecia meio tímido, além de ter
aquele cheiro tentador.
Mas naquela tarde, chegou o executor com os ômegas. Eu atendi e para a
minha surpresa, o homem queria saber qual deles eu queria. Fiquei em
choque.

— O quê? Como assim qual deles eu quero? — perguntei, confuso.

— Viemos satisfazê-lo, alfa. — disse o garoto que devia ter pouco mais de
vinte anos.

— Me satisfazer?!

— Sim. Você pode escolher um de nós ou todos.

— Você está querendo dizer que eu posso fazer sexo com vocês? É isso
mesmo que eu estou entendendo?

— Sim. — disse o mais falante, enquanto eu vi o executor que os


acompanhava ir falar com Cameron.

— Por que estão me oferecendo isso? — pergunto, nervoso.

— Isso é comum, alfa. Ômegas precisam servir ao alfa...— o rapaz dizia,


enquanto os outros permaneciam com a cabeça baixa.

— Pelo amor de Deus! — dou um grito que assusta os três. — De onde


vocês tiraram isso?

— questiono, irritado.

— Não é assim em todo lugar? — ele me pergunta assustado.

— Não! — eu digo espumando. — Escutem, vocês não têm que me servir


nem servir ninguém. Isso acaba hoje!

— Mas alfa...

— Eu não quero fazer sexo com vocês e isso vai acabar. O que eu quero que
vocês façam é que procurem o Finnegan e digam que eu preciso falar com
ele. Só isso, por favor.
Mal eu termino de falar e um deles levanta os olhos e me agradece. Aquilo
me enfurece ainda mais. Eu me revolto com aquela situação e assim que
Finn chega, eu peço para que ele reúna todo mundo no salão de reuniões.

Cerca de uma hora depois, com o salão cheio, eu deixo claro que nenhum
ômega deve servir ninguém.

— Nem a mim! Se algum ômega for maltratado ou abusado nessa alcateia o


responsável será imediatamente banido. Assim como quem mexer com os
ursos. Eu fui claro?

Ninguém responde.

— Estou estarrecido com essa situação. Todos aqui são livres. Isso inclui os
ômegas. —

reforço a ideia, lembrando do meu querido amigo Abel. Só de imaginá-lo


sendo obrigado a fazer sexo com alguém meu estômago se revira. Se bem
que seria mais fácil Abel enfiar uma faca no estômago de alguém do que ser
forçado a alguma coisa. Mas ainda assim.

— Espero que estejamos entendidos. — eu falo e dispenso todos da


reunião.

Na saída, alguns familiares de ômegas vieram me agradecer emocionados e


eu só pude lamentar pelo que vinha ocorrendo ao longo dos anos. Aquilo
sem dúvida era um abuso sem tamanho. Muitos não sabiam que aquilo
acontecia e ficaram chocados. O próprio Finnegan se chocou. Soubemos
posteriormente que aquela era uma prática não muito antiga, mas mesmo
por um dia aquilo era uma perversidade.

Depois de falar com as famílias, eu vi Cameron saindo apressado. Enquanto


eu falava, tinha reparado nele sozinho lá no fundo, sorrindo pra mim, como
se estivesse gostando da minha fala.

Foi bom ver seu rosto entre as pessoas. Ele e Finn estavam entre os poucos
rostos que eu já considerava familiares naquele lugar onde eu ainda era
descreditado por muitos e motivo de graça para tantos outros.
Eu sentia falta da minha família e do bando dos ursos, mas eu começava a
sentir que aquela alcateia realmente precisava de alguém de fora para
mostrar que as coisas poderiam ser diferentes. Não necessariamente eu, mas
alguém que pudesse mudar algumas coisas.

Apressei o passo para alcançar Cameron. O chamei e ele se virou.

— Quer uma carona?

— Não precisa, alfa. Não quero te dar trabalho.

— Para com isso, Cam. Eu que te dou trabalho todo dia. Literalmente. —
eu ri. Ele pareceu ficar confuso.

— Me deixa te levar pra casa. — eu pedi.

Ele concordou com a cabeça, claramente envergonhado.

— Você não precisa ficar envergonhado, Cameron.

— Não gosto de dar trabalho, alfa.

— Não é trabalho nenhum. Você mora perto de mim.

— Sim, eu moro. — percebo que ele diz meio sem graça, mas entra na
caminhonete.

Confesso que o cheiro do cara era delicioso e aquele jeitinho meio tímido
me fazia ter vontade de arrancar a roupa dele com a boca. Mas, claro, eu
não disse, não diria e não demonstrei isso a ele. Eu nem sabia se Cameron
era gay e eu não estava nem um pouco interessado em ter dor de cabeça
com lobos. Se fosse pra ter problemas, eu preferia ter com os ursos, que eu
já conhecia muito bem.

Deixei o cara na casa dele, que era pouco mais que uma cabana. Me despedi
e voltei para a minha casa, que também não era grande, mas era maior e
parecia bem mais confortável que a de Cameron. Eu ainda estava
inconformado com aquela situação com os ômegas, com a pobreza que
algumas pessoas viviam, enquanto o alfa levava uma vida luxuosa.
Finnegan me mostrou a casa dele, que era a do antigo líder e o próprio beta
ficou chocado com o que havia lá.

— Não posso ficar com tudo isso aqui, alfa. — disse ele, me mostrando
aquele monte de aparelhos eletrônicos e móveis. Eu podia errar em várias
coisas na minha vida, mas a cada dia que passava eu tinha certeza de que eu
tinha acertado na escolha do beta. E, merda, Finn era outro homem lindo.
Com os cabelos castanhos, curtos, maxilar marcado, barba bem baixa e e
maxilar marcado, era o tipo que atrairia facilmente homens e mulheres.
Fora que aquele ar sério e comprometido dele aumentava sua sensualidade.
O cara era quente.

Com a ajuda de Cameron e outros executores, levamos o que Finn não


queria da casa para a sede, onde pretendíamos montar uma área comum
agradável para as crianças. A alcateia estava empenhada em melhorar.
Muitos pareciam felizes. Ainda que desconfiassem da minha capacidade de
liderança devido ao meu tamanho, conforme o tempo ia passando, eu sentia
que ganhava a confiança deles e que as coisas poderiam melhorar.

Capítulo 03

Cameron nunca tinha sentido aquelas coisas em seu estômago que ele
chamou de bolinhas.

Uma efervescência gostosa, como bolhas de refrigerante gelado em um dia


de calor.

O alfa preferia estar com ele e ele queria abraçá-lo e o girar de tanta
felicidade. Não precisava de mais nada. Só de estar perto. Sentia que podia
serrar, cortar, martelar até seus braços caírem só para estar próximo de
Russell. E sempre que o via tirar a camisa e mostrar os músculos, era como
se o seu corpo cantarolasse para ele, desejando tocá-lo, querendo seus
toques.

Pensou que era porque não tinha ninguém havia muito tempo e em seguida
achou que seria prudente desviar os pensamentos do alfa, ainda mais depois
que o viu com aquele lindo ômega urso em sua casa.
Sim. Ele viu Abel todo sorridente com Russell. Pareciam muito íntimos e
Cameron não fazia ideia que o cara era apenas amigo do alfa. Foi o
suficiente para que ele tivesse certeza da necessidade urgente de parar de
fantasiar com o alfa novo.

Abel estava sorrindo no momento em que saiu da casa do alfa, porque


Russell já o tinha acalmado. Antes disso, porém, chegou emburrado e
nervoso. Mas isso Cameron não viu, porque foi o momento em que ele
estava sentado atrás dos cavaletes comendo o seu sanduíche.

O ômega urso chegou possesso, acompanhado pelo beta, que também


estava com a cara fechada.

— Oi, Rus. Eu não sabia que era tão burocrático entrar aqui. — ele falou
assim que Russell abriu a porta da frente, de onde não se podia ver o quintal
dos fundos onde estava Cameron.

— Alfa, eu te peço desculpas, mas por segurança eu precisei escoltá-lo até


aqui. Ele diz que é seu amigo, mas ninguém o conhece na alcateia... e pode
ser perigoso pra ele. — Finn se explicou.

— Você não me conhece, porque eu sou urso, merda. Eu já te falei. O que


eu ia fazer aqui no meio de um monte de cachorros. — Abel bradou
irritado, enquanto Russell terminava de comer sua maçã, sorrindo daquela
discussão.

— Somos lobos. — o beta falou com respeito.

— Lobisomens. Igual de filme de terror. — Abel fez uma careta de menino


mimado.

— Chega, Abel. — disse o alfa para o ômega. — Ele é meu amigo, Finn.
Obrigado por trazê-

lo até aqui. Mas não precisa se preocupar, porque ele parece feroz, mas é
inofensivo. — riu Rus.
— Eu sabia que eu não devia ter vindo. — Abel empurrou a porta
resmungando, sem sequer olhar novamente para Finnegan.

Russell agradeceu o lobo mais uma vez e entrou.

— Eu venho te visitar e você coloca um cachorro atrás de mim, Rus?!

— Abel... — Russell sorriu. — Eu também estava com saudade de você.

— Sei.

— Mas o Finn está certo. Não é seguro você andar pela alcateia sozinho.
Ainda tem amigos do antigo alfa por aí. Não quero que te façam mal.

— Pronto. Agora eu sou um bebê. — Abel revirou os olhos. — Acho que


você esqueceu que eu também sou um urso. E que nós não temos medo de
cachorro.

Russell riu outra vez. Estava realmente com saudade do amigo.

— Não acho que seja adequado você nos chamar de cachorro

— Oh, sim, senhor alfa. — ele ironizou.

— Vem. Deixa eu te mostrar minha casa. — Russell o chamou, dando uma


volta com ele pelos aposentos recém pintados.

— Uma porcaria, né, Rus? Você é o alfa e te dão isso?

Russell gargalhou, mesmo já imaginando a reação do amigo. Porque Abel


tinha momentos de incrível maturidade e sensatez, mas no geral ele era
irritantemente sincero e bastante provocador.

— Eu preferi essa.

— Hum. Que modesto, senhor alfa. Mas sua casa na fazenda é melhor.

— Sim, é. Mas essa vai ficar boa também.


— Tenho certeza que vai. Afinal, você sabe fazer tudo, né, amigo? Mas a
sala é bonitinha.

Eu gostei dela.

— A cozinha ainda precisa de reforma. Estou trabalhando nisso. Mas me


diz, por que você não veio até aqui com seu carro?

— Porque não queria que os cachorros arranhassem a porta. — Abel riu.

— Abel!

— Eu deixei o carro perto daqui, bobo. Assim que eu desci pra perguntar
onde você morava o grandão lá me parou e me acompanhou à força até
aqui.

— É o certo, Abel.

Abel ainda fez algumas provocações, mas aos poucos a irritação com a
escolta de Finnegan foi passando e ele foi se tornando mais amoroso e
menos reativo. Mais amoroso para o seu padrão, porque depois da sua
decepção amorosa, o ômega tinha se tornado um pouco frio e um tanto
cínico. Russell era o único com quem ele se abria, assim como foi o único
pra quem ele contou que ficou três anos em um relacionamento escondido,
para depois descobrir que o cara era casado. Com uma mulher. E tinha
filhos!

O resultado foi Abel pegar ódio de humanos e raiva de qualquer pessoa do


sexo masculino que não fosse Russell. Com vinte e oito anos, ele se sentia
um idiota por ter caído na lábia de um farsante por três malditos anos. E
desde que tinha descoberto, há dois anos, ele nunca mais tinha conseguido
estar com ninguém.

Não que o namorado fosse o cara mais incrível. Mas ele parecia muito
melhor do que era.

É verdade que o próprio Abel escondia dele o fato de ser um shifter urso,
mas isso não era nada comparado a uma esposa e filhos. Assim Abel se
tornou uma pessoa meio ácida, que só mostrava suas fraquezas para
Russell, porque sabia que ele não ia enganá-lo para levá-lo para a cama.

Porque nem quando estava no cio Russell fazia algum movimento em sua
direção.

Claro que durante os seus calores, o próprio Abel já quis se jogar entre as
pernas do amigo lobo e chupá-lo até não restar uma gota. Mas Russell
nunca deu um sinal nessa para ele e Abel seguramente se arrependeria de
cair de boca no lobo.

Assim, eles eram como irmãos. Por isso Abel se sentia no direito de dizer
sempre o que pensava e Russell, francamente, preferia daquele jeito.
Gostava da sinceridade do amigo, mesmo quando essa dizia que a casa era
uma droga.

Não era. Mas não era mentira que a casa na fazenda era muito melhor, mas
Russell tinha um propósito na vida agora e muito dele tinha a ver com os
ômegas da alcateia, porque depois que ele soube como eles eram tratados,
sua vontade de ficar se fortaleceu.

— Bando de filhos da puta! Cachorros malditos! — Abel gritou quando


Russell contou, tirando os pés que descansavam em cima da mesa e
sentindo o coração queimar de ódio.

— Pelo visto esses cachorros não prestam, Rus. Se eu soubesse disso nunca
teria te aconselhado a vir pra esse inferno.

— Você precisa pensar que os ômegas são lobos também e se eu não viesse,
talvez isso continuasse acontecendo.

Abel praguejou por mais algum tempo antes de concordar com Russell. E
aquele certamente era um bom motivo para que ele ficasse. Ômegas tinham
uma espécie de senso de comunidade entre si. Mesmo entre espécies
diferentes. Eles raramente criavam laços carnais entre eles, mas tinham um
forte vínculo emocional e aquilo foi um baque e tanto no coração já ferido
de Abel.
Levou um tempo até que Russell conseguisse distrair o amigo novamente,
para que ele fosse embora sorrindo. Mostrou a parte de trás da casa, acenou
de longe para Cameron, mas não levou Abel até lá.

— Pelo menos os cachorros são bonitos. — Abel riu ao fazer aquela


observação imprópria.

— Não os chame de cachorros, Abel. São minha alcateia agora. Ou você


quer que eu declare uma guerra contra o seu bando? — Russell brincou,
fazendo o amigo rir.

— Palhaço!

Rindo, ele foi embora mais leve, tendo o próprio alfa o acompanhado até o
carro e lá se despediram. Mas na volta, não foi possível que Abel
esquecesse o que tinha ouvido. E mesmo com toda a sua aridez, ele
lamentava arrasado pelo tempo que os lobos ômegas tiveram que sofrer,
mas aliviado ao saber que tinha dado um bom conselho ao amigo. Porque
Abel sabia que com Russell naquela alcateia, nenhum ômega sofreria.

Pelo menos não se o alfa soubesse.

***

Ao levantar da cama aquela manhã, Cody sabia que teria um dia difícil. Por
mais que os ânimos estivessem muito melhores na alcateia, e até ele mesmo
já tinha chegado a ter um certo ânimo, ele sabia que Rhett estava
insatisfeito, fazendo com que seu ódio à primeira vista pelo novo alfa o
deixasse ainda mais violento que o comum.

Cody bem que tinha tentado terminar aquela relação. Vinha tentando reunir
força para isso, mas Rhett sempre arrumava um jeito de impedir e de o
ameaçar. Assim ele ia empurrando, sem esperança de encontrar uma forma
de sair daquilo.

Quando a alcateia estava sob a liderança do alfa anterior, ele até que tinha
mais motivos para levar sua relação com Rhett. Afinal, o cara era um dos
homens próximos do alfa, isso fazia com que Cody não precisasse
esquentar a cama do líder, diferentemente dos outros ômegas que não raro
precisavam servir o alfa. Esse era um grande motivo para suportar a relação
ruim.

Porque querendo ou não, por Rhett ele ainda sentia alguma atração física,
embora nem isso fosse mais como antes.

Pelo menos eles não moravam juntos. No passado isso incomodou bastante
o jovem ômega, principalmente quando ele descobriu que Rhett fazia
algumas festinhas em sua casa sem convidá-lo. Hoje em dia, no entanto, ele
preferia ter umas noites sozinho. Talvez ele preferisse ter todas, mas ainda
não conseguia.

Se Rhett fosse um cara mais amoroso, talvez Cody sentisse mais sua falta.
Mas além de ele não ser, aos poucos ele ia matando por sufocamento a
meiguice e a doçura de Cody, que já não sorria como antes.

Sua casa ficava num dos lugares mais afastados de onde moravam as
pessoas na alcateia, perto da casa de Cameron. Um lugar mais pobre e meio
sem cor, mas que tinha sua tranquilidade, sendo perfeito para a ação livre de
um abusador.

Cody e Cameron se davam bem. Não eram propriamente amigos, porque


todos no bando sabiam como Rhett era ciumento e quem chegasse muito
perto de Cody acabava pagando um preço. E Cameron não era o cara que se
metia em confusão. Ainda mais porque tinha o sobrinho pequeno para criar
e ele não queria que os homens do antigo alfa fizessem algo para Billy.

Mas desde que Russell tinha assumido a alcateia, Cameron reparou que as
visitas de Rhett se tornaram mais frequentes, bem como Cody parecia cada
vez mais triste. Cameron chegou a bater na porta do ômega e perguntar se
ele precisava de alguma coisa, mas tudo o que conseguiu foi um "não,
obrigado. Por favor, vá embora". Cameron, entretanto, estava de olhos e
ouvidos atentos, porque ele podia não ser muito inteligente, mas ele tinha
uma sensibilidade acima do comum. Ele sentia que algo estava errado. Mais
errado do que antes.
Mas Cameron precisava trabalhar como executor e agora como ajudante do
alfa e não tinha muito tempo para ver o que passava ao redor. Estava feliz,
porque gostava de passar seu tempo na casa de Russell e porque ele estava
fazendo um dinheiro extra, e podia pagar para a senhora Moore cuidar de
Billy.

O menino gostava dela e assim Cameron ficava tranquilo podendo ajudar o


alfa. Ele nem sabia que ganharia mais por isso, mas o próprio Russell fez
questão de providenciar que isso acontecesse.

— O Cameron tem trabalhado dobrado. Precisa receber por isso, Finn. —


disse o alfa ao beta.

— Ah, claro. Vou providenciar que ele tenha dois pagamentos, alfa. Ele e os
demais que estão ajudando na construção. — salientou Finn.

— Ótimo. Porque pelo que percebemos, o que se arrecada aqui dá pra fazer
muita coisa.

— observou o alfa.

— Sim. Mas nós sabemos para onde tudo isso ia. — Finn lamentou,
passando para o assunto seguinte da reunião com o alfa.

Aproveitando que estavam sozinhos, porque Russell fazia questão de ter


aqueles momentos a sós com o seu beta, ele se desculpou pelo
comportamento ruim do amigo Abel.

— Não se preocupe, alfa. Eu me preocupei, porque não sabia quem ele era e
também porque percebi que ele era um ômega. Eu não sei se é seguro um
ômega estranho andar por aqui ainda. — Finn se explicou.

— Você fez bem, Finn. Eu te agradeço por isso. E se ele voltar, pode ficar
de olho nele, mesmo que ele reclame. Por favor. Porque Abel é teimoso e às
vezes esquece que é um ômega.

— Pode deixar, alfa.


— Ou você coloca alguém de confiança para ir atrás dele, pra que ele não te
xingue.

— Eu não ligo pra ofensas, alfa. — Finn sorriu. — Ele só parece um ômega
arisco. Nada perto do que todos nós já passamos aqui.

— Ele é marrento mesmo. Mas é um bom cara.

— Tenho certeza que é, alfa.

Na sequência, os dois falaram sobre um lugar seguro para guardar as armas


e Russell ouviu as sugestões de Finn sobre o assunto, assim como sobre
outras coisas. Os dois se entendiam com facilidade e isso era realmente
auspicioso para a alcateia.

***

Depois de deixar a casa do alfa, Cameron foi para a sua. Mal tinha
conversado com ele e esses eram os piores dias para o executor. Ainda que
ficasse quente e envergonhado, gostava mais quando Russell estava por lá.

Ao chegar perto de sua casa, Cameron viu o carro de Rhett estacionado


próximo da casa de Cody. Precisava passar por lá para chegar à sua casa e
sempre que via o carro do homem se sentia mal. Sempre achou que o
ômega não combinava muito com ele e como Cody parecia cada vez mais
triste, Cameron resolveu que ficaria de olho.

Ele não sabia que dentro da residência do ômega, naquele momento, não
estava acontecendo nada, além de Rhett estar jogado no sofá, enquanto
Cody cozinhava. Ninguém sabia dos hematomas nos braços do pequeno
Cody, porque ele os escondia, ou se transformava para que eles fossem
embora. Assim como ninguém sabia das ameaças que Rhett fazia caso ele
contasse a alguém.

Os apertões, os chacoalhões e os xingamentos eram quase sempre por causa


de ciúmes.
Sempre por algum motivo infundado. Cody já nem tinha amigos por conta
do comportamento agressivo de Rhett e aos poucos sua luz ia morrendo, sua
vida ia deixando de fazer sentido, sem que ninguém além de Cameron
notasse que ele estava em perigo, que sofria calado.

Mas Cameron tinha também seus próprios problemas e cuidar de Billy


levava muito do seu tempo. Não que ele reclamasse, porque o sobrinho era
sua felicidade, mas o trabalho, a casa e uma criança para cuidar
demandavam tempo e ele infelizmente não conseguia investigar melhor o
que se passava com Cody.

Antes de entrar em sua casa naquele dia, ele passou na senhora Moore para
pegar Billy e o garotinho foi correndo para o seu colo como em todos os
dias. Agradeceu a mulher, despediu-se e levou Billy nos ombros. Deu
banho no garoto e depois fez o jantar, só depois que comeram é que
Cameron foi tomar banho.

Ficou um tempo brincando com Billy na pequena sala e depois que ele
dormiu, pôde assistir um pouco tevê e desmaiou de cansaço ali na sala
mesmo. Ele se esforçava para fazer o melhor e se contentava com pouco.
Poder sustentar o garotinho e ter uma casa e comida na mesa

parecia bastante bom, embora ele ficasse feliz se pudesse proporcionar um


pouco mais de diversão para o sobrinho, além de levá-lo ao parque de vez
em quando. Mas Cameron estava guardando parte do que ganhava e agora
que o novo alfa tinha aumentado o pagamento dos executores, ele pensava
até em comprar um videogame para Billy.

Ele tinha planos, e todos envolviam a felicidade do sobrinho, ainda que de


forma simples, dentro de suas limitadas possibilidades, Cameron estava lá
para ele e Billy não ficaria sozinho.

***

Tinha sido um dia cheio na alcateia, como quase todos eram, mas eu tinha
conseguido chegar em casa ainda com o sol brilhando e daria tempo de
fazer o jantar. Cameron e outro executor ainda terminavam alguma coisa no
quintal de trás quando eu saí do banho.
Gritei pra eles da janela que podiam ir, pois o tempo estava fechando e
provavelmente choveria. Fiz isso e fui cozinhar o jantar. Fazia tempo que eu
não parava para fazer uma refeição decente pra mim mesmo, então naquele
dia decidi que iria caprichar.

Já estava quase terminando quando começou a chover. Olhei pela janela da


porta de trás e vi que Cameron ainda estava lá, sozinho, correndo para
guardar as ferramentas quando a tempestade desabou. Vi que ele se abrigou
no toldo do galpão e o gritei. Não ia deixar o cara ficar espremido lá,
quando podia se abrigar na minha casa.

Ele tentou dizer alguma que eu não entendi, então eu gritei:

— Venha logo, Cameron! — e acenei com a mão.

Ele correu até mim, molhando-se todo pelo caminho, e entrou na varanda.
Corri para pegar uma toalha para ele, porque ele não quis entrar em casa
molhado como estava, mas a chuva apertou e mesmo onde estávamos os
pingos fortes e gelados conseguiam nos atingir. O tempo parecia mudar.
Não só pela chuva, mas também pelos ventos frios que sopravam
empurrando a água.

— Venha. Entre. — digo a ele, impaciente.

Ele tentou relutar, mas o impedi. Abri a porta e deixei que ele entrasse
primeiro. E quando ele passou, notei que nem a água fazia desaparecer o
seu perfume, que voou direto para dentro de mim.

O cara cheirava bem, era bonito, tinha aquele corpo grande e bem
construído, mas era mais alto que eu, então com certeza não ia querer se
submeter a alguém mais baixo. Fora que eu nem sabia se ele preferia
homens, ou se tinha alguém. Eu sabia quase nada sobre ele, mas meu corpo
pulsou de vontade. Uma vontade que eu afastei com pressa, focando no
jantar que eu precisava terminar.

Ao entrar, percebi que ele olhou discretamente ao redor, não havia


julgamento perceptível em seu olhar, mas eu me senti na obrigação de
explicar porque nem tudo estava no lugar.
— Eu ainda estou terminando de arrumar as coisas. A casa precisava de
alguma reforma.

— falo, indo para a cozinha, de onde se pode ver a sala, onde ele estava.

— Todas as casas aqui precisam de reforma. — ele disse. — É uma ótima


casa e você está fazendo um bom trabalho.

— Obrigado, Cameron. — sorrio. — Sente-se aqui, jante comigo. A comida


está quase pronta.

— Oh, não. Não posso aceitar.

— E por que você não pode jantar comigo? — olhei para, ele esperando que
ele falasse sobre algum companheiro ou namorado.

— Porque eu não quero te dar trabalho, alfa. — ele baixou o olhar e eu


percebi que poderia ser vergonha.

Pensei em perguntar se ele tinha alguém esperando por ele em casa, mas
achei que poderia soar atirado demais e não perguntei. Na minha cabeça,
com certeza aquele homem lindo teria alguém. Não teria como ser
diferente.

— Então jante comigo e espere a chuva passar. Se ela não passar eu te levo
de carro até sua casa. — falei como se encerrasse o assunto. — Você não
vai me atrapalhar. O jantar está quase pronto e vai ser bom ter companhia.
— sorri para ele, desligando o fogo.

Ele sorriu de volta, sentando-se na cadeira meio encolhido.

— Você está com frio?

— Não, alfa. Estou ótimo. A casa está quente...

Mesmo parecendo nervoso, ele jantou comigo e conversamos bastante, mas


não entrei em assuntos pessoais. Foi então que eu descobri que por trás
daquele homem grande — não tão alto quanto os demais lobos da alcateia,
mas mais alto que eu — era além de delicioso, um cara especial.
Tudo nele parecia ser diferente. Ele tinha uma ingenuidade por trás das
palavras, estranho para alguém da idade dele, um adulto já, como seus mais
de trinta anos completos, mas que mantinha aquela espécie de inocência, de
bondade que escapava pelos poros, assim como preenchia tudo o que ele
dizia. Eu fiquei encantado por ele. Mais ainda do que sua beleza que já me
atraía, agora tudo no cara parecia lindo.

O jeito que ele falava, o sorriso tímido, a forma que ele ficava com as
bochechas coradas quando ficava envergonhado e tudo isso contrastando
com o seu cheiro e seu jeito másculo, com a forma que ele mexia nos
cabelos castanhos e levemente ondulados, seus movimentos contidos, mas
viris. O cara parecia um sonho andando pela vida, mexendo com a minha
cabeça e com a minha libido.

Seu jeito meigo de me olhar me fazia querer beijar sua boca, até o ritmo de
sua respiração parecia querer me atrair e quanto mais próximo de Cameron
eu ficava, mais eu tinha certeza de que precisava me afastar. Assim, eu o
deixei em casa depois do jantar. E acho que nunca alguém tinha parecido
ficar tão feliz com a minha comida antes. Mas no dia seguinte eu pedi a
Finn que me arrumasse outro cara para trabalhar na reforma, porque
definitivamente eu não podia mais ficar perto de Cameron.

Principalmente depois do que eu descobri ao deixá-lo em casa.

Capítulo 04

Depois do jantar, consegui fazer com que Cameron ficasse pouco tempo na
minha casa. Ele parecia agoniado, então eu o levei logo embora, porque
certamente ele tinha alguém esperando por ele. Eu só não esperava que
fosse uma criança.

Assim que ele se despediu de mim dentro do carro, com aquele charme
tímido de quem nem sequer sabe que é lindo, ele correu para a porta de
entrada da casa. E antes que ele chegasse, a porta se abriu. Por ela saíram
uma mulher e um garotinho que ele segurou nos braços de forma amorosa.

Ele tinha uma família.


Distante, não pude ver direito a mulher, mas fiquei o observando com o
menino. Seu jeito carinhoso, a carinha de felicidade do garoto, as
mãozinhas que abraçavam Cameron pelo pescoço. Absorto naquela
imagem, eu mal pude reparar na mulher. Saí com o carro logo em seguida.
E pensei naquilo o resto da noite. Uma longa noite, posso garantir.

No dia seguinte, eu pedi que Finn me arrumasse outro ajudante, porque


substituiria Cameron.

— Ele fez alguma coisa, alfa?

— Não. Ele é ótimo. Eu só acho que ele deve estar cansado. Talvez seja
bom revezar.

— Pelo que eu sei ele está muito feliz ajudando. Mesmo sem saber que o
pagamento seria maior. Mas eu falo com ele, alfa. E amanhã eu arrumo
alguém.

Fiquei mais tranquilo depois de falar com Finn e depois do almoço notei
que Cameron não estava mais lá. Não fiquei feliz, claro. Mas pensei que
seria o melhor a se fazer, afinal, eu tinha acabado de chegar na alcateia e
não queria sair dando em cima dos homens. Queria mostrar que eu era
diferente do antigo alfa e ficar babando em cima de um cara não era o
melhor jeito de fazer isso.

Naquela noite, porém, aconteceu algo inesperado. Eu estava na sala


descansado, depois do jantar, jogado no sofá, quando alguém bateu na
porta. Pelo cheiro eu já sabia quem era. Meu lobo se inquietou.

— Oi, Cameron. — falo calmamente ao vê-lo, mas por dentro me agito.

— Oi, alfa... — ele parece aflito. Morde o interior da boca, o que dá a ele
um ar de menino grande assustado e o deixa ainda mais adorável.

— Quer entrar? — pergunto, torcendo pra que ele queira.

— Não... eu só vim te perguntar uma coisa.

— Pode perguntar.
— Desculpa atrapalhar o seu descanso, alfa. Prometo que vou ser bem
rápido.

— Você não me atrapalha, Cameron. — digo e ele sorri acanhado.

— Eu... fiz alguma coisa errada pra você me dispensar, alfa? Se eu fiz, me
desculpa... eu posso aprender a fazer as coisas direito... — seus olhos se
estreitam.

— Não! Você não fez nada de errado. — falei calmo, já com o meu coração
apertado de olhar pra ele.

— É por causa do Billy? Se for, alfa, eu prometo que não vou trazer ele
aqui. A senhora Moore cuida dele quando não estou em casa... não vai
atrapalhar o trabalho. — ele diz rápido, me deixando completamente
confuso.

— Quem é Billy?

— Meu sobrinho, alfa.

— O menino que eu vi ontem na sua casa é seu sobrinho? — não consigo


conter o sorriso.

— Sim. Se for por causa dele...

— Não tem nada a ver com ele, Cameron.

— Então o que foi que eu fiz de errado? Se você me disser eu tento


melhorar... eu sei que eu sou um pouco confuso e...

— Não. — interrompo. — Você não é confuso e não fez nada errado. Eu só


achei que você precisasse de um descanso... — minto, querendo colocar
aquele homem grande com carinha de choro no meu colo e dizer que ele
pode fazer o que quiser.

— Eu não gostaria de ter um descanso. Eu gosto de te ajudar. — ele fala


como quem pede.
Tão suave e meigo. Eu cedo fácil, como cederia a qualquer coisa que ele me
pedisse, que ele quisesse.

— Então você pode continuar, Cameron. Se não está cansado...

— Não estou! — ele sorri largamente.

— E... você pode trazer o Billy quando quiser. Se sua companheira não se
importar.

— Oh, alfa. Obrigado. E... eu não tenho companheira... — ele fala e eu já


quero rolar com ele pelado no chão. — Somos só eu e o Billy. A mulher
que viu na minha casa é nossa vizinha, a senhora Moore. Ela cuida do Billy
quando estou trabalhando. Minha irmã morreu há dois anos e eu fiquei
responsável por ele.

— Ah... nossa. Eu sinto muito, Cameron.

— Obrigado, alfa... e... eu posso mesmo continuar te ajudando?

— Claro. Eu vou avisar o Finn que você não está cansado.

— Eu não cansaria nunca de te ajudar, alfa. — ele diz, totalmente


inconsciente do que aquilo causaria em mim.

— Que bom, Cameron... — solto as palavras como um suspiro. — E você


pode trazer seu sobrinho quando precisar. Isso não é um problema pra mim.
— eu falo, ridiculamente meloso.

Ele me agradece alegremente mais algumas vezes e aperta minha mão antes
de ir embora.

Aquilo me deixa tão perturbado que eu nem consigo oferecer a ele uma
carona. Porque eu não sabia direito o que pensar. Minha cabeça apenas
enumerava e embaralhava todas as informações.

Ele não tinha companheira, nem filho e queria continuar me ajudando. O


que tudo aquilo queria dizer pra mim, provavelmente era diferente do
significado real, mas naquela noite eu o desejei de tantas formas que meu
corpo não aguentou. E pensando nele, procurei alívio, esgotei meu corpo
como quem buscar esgotar os pensamentos, pra quem sabe no dia seguinte
ver que o desejo tinha ido embora com os meus fluidos corporais, restando
apenas uma simpatia diplomática pelo lobo.

Mas isso não foi o que aconteceu.

***

Atormentado pela atração que sentia por aquele homem, Russell resolveu
que precisava se distrair urgentemente. Vestiu seus jeans apertados, uma
camiseta branca, calçou as botas e saiu.

Deixou o chapéu em casa, mesmo gostando muito de usá-lo. Preferia o


adereço durante o dia.

Entrou na caminhonete e dirigiu até perto das fazendas dos ursos, um pouco
distante da parte da cidade onde viviam os lobos, mas era lá onde ele se
sentia bem. Estacionou em frente à lanchonete da Tracy. Uma antiga ursa
que servia bebida até tarde da noite, a depender do humor de Tracy, além de
ótimos e gordurosos hambúrgueres.

Tracy era velha conhecida dos ursos, mas sua lanchonete era frequentada
também por humanos, muitos gays, que iam atrás dos belos e grandes
homens das fazendas.

Apesar de ser um lugar onde rapazes se conheciam, Tracy tinha um jeito


bastante peculiar de lidar com os clientes e com os amigos, e não admitia
pegação nos banheiros, não sendo raro ela pegar sua espingarda velha de
baixo do balcão para botar algum engraçadinho para correr por mal
comportamento.

Os rapazes podiam se beijar lá dentro.

"Mais que isso, façam em um motel!", ela costuma dizer. Afora isso,
raramente havia brigas ou discussões. E no geral ela tinha mais problema
com os humanos que com os ursos.
E foi para lá que Russell dirigiu aquela noite, porque sabia que Tracy abria
perto da hora do almoço e costumava ir até tarde e ele estava à procura de
alguém para esquentar sua cama.

Precisava relaxar, precisava se divertir e acima de tudo ele precisava


esquecer aquele lobo incrivelmente doce. E o bar — ou lanchonete,
dependendo da disposição do frequentador — da Tracy parecia perfeito
para encontrar alguém.

Depois de estacionar, Rus entrou no lugar. Imediatamente Tracy acenou


para ele, limpando em seguida a mão molhada no avental já não tão limpo.

— Meu lobo preferido. Essa é por conta da casa. — ela sorriu e estendendo
a ele uma dose de uísque com gelo.

— Obrigado, Tracy. — Russell sorriu de volta, já sentado no banco em


frente ao balcão.

— E como está indo, pequeno alfa? — ela pergunta sorridente.

— Por enquanto está tranquilo, Tracy. — Russell responde e em seguida


entornou a dose da bebida à sua frente.

— Você vai se sair bem, querido. Eles deram sorte de ter você. — ela sorriu
amorosamente para Russell, por quem tinha um carinho especial e quase
materno, e logo se virou para um cliente que chegava, reclamando de sua
impaciência e ameaçando colocá-lo para fora.

Como Tracy era grande como a maioria dos ursos, nenhum engraçadinho se
metia com ela, então todos ouviam silêncio as broncas, sem deixar de
frequentar o lugar.

Assim, enquanto ela brigava com o cara do lado, reclamando por ter que
atender todo mundo sozinha, Russell aproveitou para dar uma olhada no
lugar. Acenou para Glenn que estava na cozinha, e depois virou o olhar para
algumas pessoas que estavam por lá. Nenhum cara o interessou de imediato.
Ninguém o fez se animar.
Então uma voz conhecida surge por trás dele.

— E aí, alfa? — a voz brincou.

— Oi, Carter. — o sorriso de Russell se abriu no rosto outrora fechado.

— Posso sentar aqui? — o homem perguntou.

— À vontade. — Russell se virou para ele.

Carter era um shifter urso com o qual Russell já tinha saído algumas vezes
antes de ir para a alcateia. O cara tinha um belo sorriso e um ótimo corpo,
não era tão alto como os outros ursos e tinha uma conversa agradável, além
de fazer um excelente boquete. Carter era perfeito para o que Russell estava
procurando, principalmente porque todos sabiam que Carter não era um
cara que queria se comprometer. Jovem e bonito, ele estava interessado
unicamente em aproveitar a vida. Escolhia a dedo com quem aproveitaria,
no entanto. E naquela noite, seu sorriso persistente e sua sobrancelha
expressiva diziam que ele queria o mesmo que Russell, o que resultou em
algumas bebidas e uns beijos no bar.

Terminaram a noite na cama de Russell, porque Carter sussurrou em seu


ouvido que ele morria de vontade de conhecer a alcateia. Seu sorriso
teimoso indicava que não era bem a alcateia que ele queria conhecer. Então,
como Russell e ele ainda não tinham tido uma intimidade maior que uns
beijos e sexo oral, o lobo o levou para a sua cama, para fazer lá o serviço
completo, como ambos queriam. Como Russell precisava.

Com a intensidade da noite, Carter acabou dormindo lá. Russell não era o
tipo de cara que não passava a noite junto só porque a relação era casual.
Ele não se importava em dormir com os caras que transava. Pensava que se
o cara era bom para sexo, também era bom para trocar carinhos e dormir
abraçado. Claro que muitos não estavam em busca dessas coisas, mas
Russell gostava do pacote completo, ainda que não fosse ter uma relação de
longo tempo.

Já tinha tido alguns namoros e casos mais longos, mas havia algum tempo
que alguém não o interessava a ponto de ele querer se comprometer. Na
verdade, estava cada mais difícil até suas saídas casuais. Pensava que estava
ficando velho para aquela brincadeira, mas achar um homem que quisesse
algo sério também era difícil. Parecia que ele sempre atraía aqueles que
gostavam de solteiros e no fundo Russell não sabia bem o que queria.

De fato, ele não achava tão ruim aquilo de não se comprometer. Afinal,
fazia mesmo bastante tempo que ele não sentia aquele friozinho na barriga
gostoso. O que, no entanto, não o impedia de ser uma companhia gentil e
carinhosa antes, durante e depois do sexo. Quando

era possível. E com Carter foi. Não pelo tempo que Russell gostaria, porque
o cara desmaiou depois de gozar pela segunda vez.

Russell era um cara maior na cama do que sua altura poderia indicar.
Apesar de atencioso, ele gostava também de uma coisa forte, por isso Carter
ficou esgotado e desabou na cama com um sorriso no rosto.

Acordou apenas no dia seguinte, mas não quis ficar de carinho com Russell.
O alfa até que achou bom, posto que não conseguia evitar que o rosto
Cameron surgisse à sua frente toda vez que fechava os olhos, fazendo-o
imaginar como seria o sabor dos seus lábios, o gosto da sua pele.

Como tinha ido com seu próprio carro, Carter se despediu com um selo
rápido, sendo acompanhado pelo alfa até a porta de trás, enquanto Russell
segurava uma caneca de café fumegante, vendo-o ir. Vestia apenas uma
calça, dando a Cameron uma boa visão dos seus músculos bem esculpidos e
de esperanças quebradas.

Cameron sempre chegava bem cedo à casa do alfa, e como já tinha


permissão, começava a trabalhar antes que ele acordasse, porque na maior
parte dos dias ele precisava sair cedo, devido ao seu turno como executor.
Conseguia ainda passar em casa para ver como estava Billy.

Mas como estava ajudando o alfa, só trabalhava com executor em três dias
na semana. Nos que tinha a tarde livre, podia ficar mais tempo com o
sobrinho.
Mas infelizmente naquela manhã Cameron não pôde admirar a beleza das
curvas que faziam o corpo de Russell, uma vez que seus olhos se detiveram
principalmente no moreno que deixou a casa do alfa e o beijou antes de sair.

Sem saber como lidar com o rebuliço que aquilo criou em seu interior,
Cameron apenas baixou os olhos para a madeira que serrava e sentiu as
pernas amolecerem junto com o turbilhão que parecia querer engolir seu
estômago. Desligou a serra com medo de cortar os dedos e se apoiou na
bancada de madeira. Que sensação ruim era aquela de ter ciúmes! Com toda
a sua inocência, Cameron nem sequer conseguia entender o que aquele
sentimento significava.

Sentindo o bater forte do coração cortado, o estômago moído, ele precisou


sentar. Não soube quantas vezes respirou fundo e contou até dez como sua
mãe o ensinara a fazer quando era pequeno e ficava com medo. Aquela era
uma sensação diferente, entretanto, mas ao mesmo tempo era o mesmo
medo.

Medo de algo que ele não compreendia, tudo o que sabia era que não queria
sentir. Queria fazer aquela sensação ruim ir embora, a vontade de correr
para a sua casa e chorar, desaparecer.

Ele era um homem, afinal. Não fugiria ao seu dever. E não fugiu. Sabia que
alguém como Russell não se interessaria por ele. O homem era um alfa, que
tinha vivido entre os ursos. Um alfa lindo, que tinha tudo para arrumar
alguém muito melhor. Não fazia sentido que Cameron alimentasse alguma
esperança. Se ele sabia disso, então por que estava tão triste?

Dando aquele tempo que precisava para se recompor, Cameron voltou ao


trabalho, torcendo para que Russell não saísse por aquela porta, banhado no
cheiro de outro homem, no cheiro de um urso.

Ele não saiu. E só depois do almoço que Cameron o viu. Quando o alfa foi
levar um copo de café quente para ele. Conversaram pouco, Cameron mal
podia olhá-lo nos olhos sem sentir aquela coisa ruim na barriga, ou aquelas
pequenas torcidas em seu peito. Ao passo que Russell sentia em si uma
espécie de culpa, porque ele sabia, dentro de si, ele sabia com quem ele
queria realmente passar a noite.
Os dois não ficaram frente a frente naquele dia. Mesmo sem saber que
Cameron tinha visto Carter sair, que tinha visto o beijo, o alfa não teve
vontade de encarar o homem. Russell se sentia estranho, como se tivesse
feito algo errado, mesmo sabendo que não tinha feito nada. Que era
perfeitamente normal passar a noite com alguém. Afinal, ele era livre,
jovem e não tinha amarras. Era isso que dizia a si mesmo como um mantra,
enquanto sua mente passeava pela lembrança de Cameron e sua doçura
ingênua.

— Merda! — o alfa praguejava, enquanto fazia as coisas.

Aquela noite de sexo deveria deixá-lo de bom humor, mas tinha tido o
efeito contrário. E

por isso ele se punia, xingando-se. Sua vontade era correr até a casa do
executor e beijar sua boca até se cansar. Pedir desculpas, como se o tivesse
traído, prometer que agiria de forma diferente. E não seria sacrifício algum
ser fiel a Cameron. Que delícia seria se Russell pudesse fazer isso, de ser só
dele.

Isso já estaria bastante bom para ele. Só poder beijar os lábios de Cameron
e descobrir se eram tão doces quanto pareciam.

— Droga! — ele continuava praguejando ao longo do dia.

E os dias foram passando, enquanto ele percebia o executor muito mais


quieto e distante.

Mesmo quando chovia, Cameron se recusava a entrar em sua casa. Nunca


aceitava almoçar com ele e o contato entre eles parecia estritamente
profissional. Como se Cameron fosse um funcionário de Russell, com o
qual ele não conseguia estreitar relações.

Ele queria estreitar laços com o lobo. Ele sabia, embora nunca fosse admitir
em voz alta.

Mas estavam cada vez mais distantes um do outro, sendo que as coisas
práticas do dia-a-dia pareciam afastá-los ainda mais.
Até que a senhora Moore teve um imprevisto e não pôde cuidar de Billy.
Sem saber o que fazer, Cameron deu banho no sobrinho, trocou-o, fez café
da manhã e enquanto Billy comia, ele andava de um lado para o outro
pensando no que fazer. Então se lembrou que o alfa tinha dito que ele
poderia levar o garoto para a sua casa se precisasse, e para Cameron não
havia essa coisa de dizer por educação ou da boca para fora. Ele dizia o que
sentia e pensava que todos faziam o mesmo. Tinha uma certa dificuldade
para entender diplomacia.

De modo que, tendo lembrado da carta branca do alfa, ele fez um lanche
para ele e outro para o sobrinho, embrulhou-os com cuidado e, pegando na
mão de Billy, saiu para o trabalho.

Colocou o garoto sentadinho perto da bancada, pediu para que ele ficasse
bonzinho e começou a trabalhar. Fazendo com perfeição o que tinha
aprendido, ele jogava o cabelo do rosto, enquanto martelava e ficava de
olho em Billy, que brincava ali pertinho.

Billy era tranquilo e, sentado embaixo de uma árvore, ali ao lado do tio, ele
tirou do bolso um pequeno carrinho vermelho e um cavalo miniatura de
plástico e começou a brincar sozinho.

Quando acordou, Russell tomou seu café da manhã como de costume e


antes de ir ajudar a colocar uns telhados na alcateia, ele olhou pela janela da
cozinha. Então ele viu Billy sentado ao lado do tio que trabalhava. Sorriu ao
ver os dois. O garotinho tinha os olhos de Cameron, o mesmo castanho
avermelhado nos cabelos. Parecia estar feliz.

Sem conseguir se aguentar, Russell encheu uma caneca com café e em outra
ele fez um chocolate quente e foi levar para os dois.

— Obrigado, alfa. Não precisava se incomodar. — Cameron falou,


aceitando a bebida.

— Você deve ser o Billy. — o alfa disse, simpático, aproximando-se do


menininho. — Você gosta de chocolate quente? — Russell esticou a xícara
para ele, mas antes de aceitar, o garoto olhou para o tio, buscando sua
aprovação.
— Pode pegar, Billy. O alfa é nosso amigo. — Cameron sorriu, vendo-o
pegar a bebida da mão do alfa, que estava agachado à sua frente. —
Agradece o alfa, Billy.

— Obrigado, tio alfa. — o garotinho sorriu, levando a bebida aos lábios


depois de assoprar, como seu tia havia ensinado.

— Me desculpa, alfa. A senhora que cuida dele não pôde ficar com ele hoje
e eu...

— Não precisa se desculpar, Cameron. Traga-o quando precisar. — Russell


sorriu e voltou o olhar para o garoto.

— Você gosta de cavalos? — ele perguntou, vendo o cavalinho de plástico


ao lado dele.

— Uhum. — Billy deu um sorriso.

— E você já viu um de verdade?

— Só na televisão...

— Pois eu tenho um cavalo de verdade. Você gostaria de ver um dia?

Os olhos castanhos de Billy brilharam e ele olhou para o tio outra vez.

— Se o seu tio deixar, eu te levo até a minha antiga casa para você ver o
cavalo.

— Meu tio pode ir também? — Billy perguntou com os olhinhos brilhantes.

— Claro que pode! — Russell voltou a olhar para Cameron.

— Claro. Se não for incomodar o alfa, podemos ir um dia. — o homem


falou sem jeito.

— Eba! — Billy comemorou.


— Então estamos combinados, garotão. — o alfa estendeu a mão para Billy,
que a apertou com sua mãozinha.

Em seguida, os dois homens se olharam. Cameron estava tão nervoso que


nem sabia o que dizer. Apenas viu o alfa se despedir, desejando a ele um
bom trabalho e o viu caminhar para dentro da casa, sentindo aquele maldito
incômodo no estômago que ele sabia que não devia mais sentir.

Queria dizer ao alfa que não precisava se incomodar, queria ter dito
qualquer coisa, mas a ideia de sair com ele soava tão bem para Cameron,
que ele não teve força para dizer coisa alguma. E mesmo que soubesse que
aquilo provavelmente era uma forma de o alfa mostrar simpatia apenas, ele
esperava, bem lá no fundo, que fosse verdade.

Capítulo 05

Eu fiz o que tinha que fazer naquele dia e corri de volta para a casa. Queria
voltar a tempo de fazer o almoço, porque fiquei com eles na cabeça.

Preparei uma salada, batatas cozidas com outros legumes, e carne grelhada.
Algo simples, porque eu não sabia o que eles comiam e não entendo nada
sobre crianças. Não sabia bem o que Billy comia, mas me incomodava o
fato de uma criança ter que almoçar no quintal. Me incomodava que
Cameron comesse lá também, mas ele sempre recusava meus convites.

Naquele dia, porém, eu não o deixaria recusar. O cara estava com uma
criança, caramba, e se fosse preciso eu seria firme.

Pus a mesa e depois fui chamar os dois. Confesso que me peito estava um
pouco agitado.

Eu não sabia ao certo o que aquilo significava, mas quando Cameron tentou
recusar, eu o interrompi.

— Cameron, por favor. Eu cozinhei para nós três. — disse meio seco.

Ele parou e me olhou por um tempo, sem dizer nada. Sem me dar uma pista
do que estava pensando. Então seus cílios se moveram rápido, ele piscou
algumas vezes. Então eu percebi que o que eu disse poderia ter soado
estranho. "Eu cozinhei para nós três", que grande idiota eu sou! Aquilo
parecia tão íntimo e eu não tinha intimidade nenhuma com o cara. Não que
eu não quisesse. Ele não parecia me deixar chegar muito perto. E talvez
fosse impróprio mesmo.

— Obrigado, alfa. — ele falou, me olhando.

Então ele chamou Billy e os dois me seguiram pelo quintal de terra batida,
depois pelo pedaço de grama que circundava a casa e entraram. A pedido de
Cameron, mostrei o banheiro para que eles pudessem lavar as mãos, porque
ele só usava o banheiro de fora da casa, um que ficava perto do pequeno
galpão onde eu guardava as ferramentas.

Já tinha levado boa parte do que eu precisava para a alcateia. A casa em que
eu estava morando foi deixada com quase todos os móveis de Finn, porque
a casa para qual ele foi, do antigo alfa, já tinha coisas demais e ele só levou
o essencial. Eu troquei a cama, um sofá, e algumas coisas na cozinha, mas
fiquei com o resto, de modo que minha casa na fazenda ainda permanecia
quase completa.

Depois de lavarem as mãos, eles se sentaram à mesa e eu comecei a servir


Billy.

— Você come salada? — pergunto, porque eu realmente não entendo de


crianças.

— Pode colocar, alfa. O Billy come de tudo. — Cameron sorriu meio


tímido.

Em seguida, descobri que o tio também comia de tudo e o servi, antes de


servir a mim mesmo. Ele parecia extremamente acanhado e eu não sabia se
era por não estar acostumado a comer na casa dos outros, ou se era por eu
ser o alfa. Tentei brincar com Billy, falando bobagens, fazendo o menino rir,
para ver se deixava a situação mais leve.

O garotinho era realmente um doce. Ria com facilidade, era educado,


divertido. Percebi que mesmo sozinho, Cameron estava fazendo um ótimo
trabalho. E de alguma forma Billy me lembrava a mim mesmo, porque
assim como ele, eu fiquei órfão ainda bebê e se não fosse alguém cuidar de
mim eu não teria sobrevivido. E assim como Billy, eu tinha encontrado boas
pessoas.

— Huum... — o garotinho fecha os olhos quando morde a carne que deixei


marinando por um bom tempo em um molhe agridoce, que eu mesmo
preparo.

Sorrio com aquela fofura, porque não é todo dia que se recebe um elogio de
uma criança.

E eu considerei aquele "humm" como um elogio.

— Você cozinha muito bem, alfa. — diz Cameron. — Agora o Billy vai
ficar triste quando comer a comida que eu faço. — ele faz uma brincadeira,
e eu encaro como se ele estivesse ficando mais à vontade. Meu coração se
aquece, porque qualquer porcaria que aquele homem fizesse, qualquer olhar
na minha direção fazia meu coração esquentar.

— Então vou ter que chamar vocês para almoçar mais vezes. — falo em um
tom de flerte, não intencionalmente, mas escapa sem que eu consiga me
interromper. Me repreendo mentalmente, porque era um flerte cretino.

— Oh... não, alfa. Não podemos ficar te incomodando. Com tanta coisa que
tem pra fazer...

não foi o que eu quis dizer. — Cameron tenta se justificar, sem entender
meu galanteio. E eu não sabia se aquilo era bom ou ruim.

— Estou brincando, Cameron. — jogo um sorriso sedutor, porque insisto


em me comportar como um idiota na frente dele, como se meu corpo não
quisesse me obedecer e tentasse seduzir o homem a todo custo. — Mas
vocês não me incomodam... espero que não recuse se eu te chamar para
almoçar outra vez.

— Você é muito gentil, alfa. — ele olha para o prato e continua comendo,
ainda sem graça.
Definitivamente eu precisava parar de fazer aquilo. Ele não me dava
nenhum sinal de corresponder às minhas investidas, se é que eu poderia
chamar aquela droga que eu fazia de investida.

Eu me senti um imbecil por não conseguir ter uma conversa normal com o
cara. Ou eu falava alguma besteira que ele não entendia, ou eu o deixava
sem graça. A verdade é que eu não sabia me comunicar com ele direito e
não entendia o porquê, se normalmente eu me dava bem com os caras. Com
ele tudo era estranho, meio atravancado e eu só fui entender melhor no dia
seguinte, quando conversei com Finn.

Mas naquele dia ainda, depois do almoço, eu levei os dois para a casa. Não
deixei que Cameron voltasse ao trabalho, porque não queria que ele ficasse
com o menino fora de casa.

Como naquele dia ele teria o turno de executor, pedi para Finnegan que
pusesse alguém no lugar dele, porque ele não tinha ninguém para cuidar do
sobrinho. E antes de eles saírem do carro, eu, com toda a minha ansiedade,
reforcei o convite para que Billy conhecesse o cavalo na fazenda, porque eu
realmente queria que Cameron entendesse que era um convite mesmo.

— Podemos ir no sábado? Você tem algum compromisso? — perguntei,


esquentando, porque pra mim aquilo soava como um convite para um
encontro.

— Não tenho, alfa, mas não precisa se preocupar... — ele tentou dizer e
mesmo que eu não quisesse interrompê-lo, eu interrompi.

— Vocês não vão me dar trabalho. — falei. — Eu preciso ir até lá buscar


umas coisas... —

menti, para não parecer outra coisa. Para não ficar tão claro que eu queria
passar mais tempo com ele.

— Pode ser no sábado, então? Se você não puder ou não quiser, não se
acanhe em dizer.
— Eu posso. — ele me olhou profundamente. — Eu quero. — ele piscou
algumas vezes. Eu sorri e ouvi Billy comemorando no banco de trás.

Me despedi dos dois e quando ele pegou Billy no banco de trás, sorri ao
ouvir o garotinho perguntar se faltava muito para sábado. Billy ainda me fez
tchau do colo do tio. E aquilo me encheu ainda mais de felicidade. Eu
estava completamente encantado com os dois. Totalmente fascinado. E não
havia mais chance de eu querer outra coisa.

***

Fiz minhas coisas na manhã seguinte, tomei café e acenei para Cameron
pela janela. Billy não estava com ele e eu não tive coragem de ir até lá sem
um motivo aparente. Ainda mais porque o outro executor que me ajudava
estava com ele. De modo que eu esperei até que Finnegan fosse à minha
casa para tratar de alguns assuntos da alcateia.

Antes de começarmos a falar sobre o que precisávamos, Finn entrou no


assunto de Cameron.

— Que bom que deu a folga para o Cameron ontem, alfa. Ele sofre para
criar aquele menino sozinho depois de tudo o que aconteceu.

— Você diz sobre o que aconteceu com a irmã dele?

— E com ele também.

— E o que aconteceu com ele? — pergunto, curioso.

— Você deve saber que a irmã e o companheiro dela morreram


misteriosamente. — ele inicia o relato.

— Sim, disso eu sei.

— Foi ela quem criou Cameron. Era como uma mãe pra ele, porque depois
que o alfa anterior matou o seu pai — Finn parece se constranger nesse
momento. —, algumas pessoas da alcateia se rebelaram e foram mortas. Eu
era pequeno nessa época e não me lembro, mas todos conhecem a história.
Invadiram a casa de Cameron e mataram seus pais de forma violenta.
Encontraram ele no chão com um grande ferimento na cabeça. Foi sorte ele
não ter morrido. A irmã era mais velha e conseguiu se transformar e fugir,
mas não teve tempo de levar o irmão.

Então, como ele era pequeno e não tinha passado pela primeira
transformação, acreditam que ele tenha ficado com alguma sequela.

— Sequela?

— Sim... — com toda a sua educação, Finnegan escolheu com cuidado as


palavras. — Ele frequentou a escola normalmente, mas algo nele é
diferente. Digamos que ele não compreende as coisas como a maioria das
pessoas. Tem alguma dificuldade pra entender ironias e sugestões.

É comum que ele se atrapalhe, mas ele é a criatura mais doce dessa alcateia.
Tem um coração puro e imenso. E na verdade ninguém sabe se ele teve
mesmo sequela ou se seria assim diferente de qualquer jeito.

— Entendi...

— A irmã cuidou dele com carinho. E quando ela morreu, mesmo que
Cameron morasse já sozinho, ele sofreu muito. A vizinha dele, a senhora
Moore, uma mulher que mora só há muito tempo o ajuda com o sobrinho.
Muitas pessoas o ajudaram no começo, porque Cameron não sabia trocar
uma fralda. Mas agora ele tira de letra. Ele e Billy são muito queridos. Só
alguns bestas que gostam de tirar sarro do Cam por ele não compreender
bem algumas coisas, mas ele não liga. Às vezes eu acho que ele não
entende... se entende, ele ignora. — Finnegan sorri e meu lobo uiva
internamente, de raiva de quem debocha dele.

— Ele teve e tem uma vida difícil. Cuida sozinho do menino e o dinheiro
sempre foi curto.

Por isso fiquei feliz quando você resolveu dobrar o pagamento dele. Vai
fazer muita diferença pra eles, alfa.

— Que bom, Finn. — respiro fundo, profundamente chateado.— Então ele


deve ter minha idade. — penso alto.
— Deve, alfa. Eu não sei exatamente a idade dele.

Com o peito ardendo de tristeza e raiva, passo para o assunto que queria
tratar com meu beta, falamos sobre os problemas que precisam ser
resolvidos, mas minha mente paira sobre Cameron e meu desejo que não se
despede de mim. Por mais que eu tentasse, até mesmo indo para a cama
com outro, tendo um bom sexo. Nem isso fazia com que eu deixasse de
pensar em Cameron e no quanto eu o queria. No quanto aquilo era
impróprio.

Nem mesmo o fato de saber que ele era diferente me fazia perder o
interesse. Finnegan falava sobre as reformas, as trocas de executores e
outras coisas de forma animada. Mesmo com toda a sua polidez, porque o
cara era realmente todo certinho, dava para perceber sua animação em
ajudar as pessoas. Eu estava feliz também, só me sentia um pouco mal por
pensar mais em levar Cameron para a fazenda do que em outra coisa.

— Eu pensei poderíamos fazer uma comemoração. Algo voltado para as


crianças. Com dinheiro não sendo mais desviado, podemos fazer algo
simples com doces e alguns brinquedos sem prejudicar o orçamento das
reformas. — Finnegan sugere meio inseguro.

— Claro. É uma ótima ideia, Finn. Mas eu não sou muito bom com essa
coisa de festa, então se você puder organizar isso.

Ele concordou. A cada dia que passava eu tinha certeza de que ele era a
pessoa ideal. Além de cuidar do dinheiro, ele me ajudava em praticamente
tudo. Parecia confiável e era bem visto por todos. Finnegan era o tipo de
pessoa que conseguiria acalmar uma multidão falando baixo, sem esforço.
Ao contrário de mim, que sou mais impositivo. Eu preciso ser assim.
Aprendi desde cedo a ter um comportamento mais inflamado por ser mais
baixo que a maioria à minha volta. 6

A conversa com Finn terminou na casa de um membro da alcateia que


estava com problema no telhado. Passei a tarde tentando resolver aquilo e
quando cheguei em casa, Cameron não
estava mais lá. Lamentei sozinho. O que eu faria se ele estivesse
provavelmente seria nada, mas eu gostava de vê-lo, de ter o cara por perto e
de sentir o cheiro dele.

Cameron podia ter uma personalidade e um modo de ver o mundo diferente


da maioria, mas por fora ele era bonito e forte como muitos lobos daquela
alcateia. Até mais bonito que a maioria e certamente havia gente interessada
nele. Ou interessado. Afinal, eu sabia que ele não tinha companheira, mas
não sabia se ele gostava de homem, ou se tinha alguém em vista. Eu sabia
pouca coisa sobre ele, mas queria saber mais. Queria saber tudo.

Eu estava completamente fodido com aqueles pensamentos todos em


Cameron. Precisava urgentemente fazer alguma coisa para mudar essa
situação, mas antes eu precisava levar Billy para conhecer os cavalos. E
isso aconteceria no dia seguinte.

***

Como já era de costume, Cameron acordou animado. Preparou um café da


manhã simples para ele e para Billy, depois trocou o garotinho e o deixou
na casa da senhora Moore antes de ir trabalhar.

— Tchau, titio! — Billy acenava para ele, com uma mão dada com a loba.
Como em todos os dias, Cameron virou e acenou de volta para o sobrinho,
fixando um sorriso honesto no rosto. 2

Chegou à casa do alfa e começou a trabalhar. Chegava sempre antes do


necessário e quando Russell acordava, ele já estava lá, fazendo o seu
trabalho pesado. Naquele dia, como era sábado e não tinha nenhum
compromisso na alcateia, o alfa decidiu que ajudaria Cameron. Mas assim
que terminou de lavar a louça do café da manhã, Finnegan apareceu com
problemas para resolver.

Felizmente, Russell chegou a tempo de encontrar Cameron e dizer para que


ele guardasse as coisas para irem à fazenda.

— Você está falando sério, alfa?


— Sim, Cameron. Mas se você não quiser ir tudo bem. Não quero que se
sinta pressionado ou algo do tipo.

— Não. Eu quero! Billy não para de falar no cavalo que vai ver... ele está
ansioso. —

Cameron sorriu.

— Então vá pra casa que eu passarei lá daqui uma hora. Tudo bem pra
você?

— Ótimo, alfa. Obrigado por fazer isso pelo Billy. — Cameron piscou
rápido e então virou o rosto, ouvindo o "por nada" meio atordoado do alfa.

Russell sabia que não era bem pelo garoto que ele estava fazendo aquilo,
embora fizesse sem problema algum e de bom grado, mas ele queria poder
passar mais tempo com o tio de Billy. Não importa qual fosse a desculpa,
ou o pretexto mirabolante que precisasse inventar.

Enquanto tomava banho, o leve arrependimento acometeu Russell. Talvez


não fosse certo fazer aquilo, talvez ele quebrasse a cara. O importante, ele
pensou, era não ser direto a ponto de fazer o cara se sentir mal. Por outro
lado, se Cameron tinha dificuldade em compreender insinuações, seria
difícil ser sútil com ele. Flertar seria quase impossível. Russell se
encontrava diante de um dilema. Mas não podia voltar atrás. Não queria
voltar atrás.

Na pior das hipóteses ele não faria nada. Mostraria o cavalo a Billy e
voltariam para a casa.

Tudo continuaria como antes e ele tentaria tirar o cara da cabeça. Parecia
bom, ainda que fosse a pior das hipóteses.

Parando em frente à casa de Cameron, ele buzinou discretamente e logo viu


a porta se abrir. Billy estava sorridente e Cameron, lindo.

— Merda! — Russell reclamou, sentindo em seu corpo os efeitos do


homem.
Saiu do carro para abrir a porta para Billy e antes estendeu a mão para
cumprimentar o garotinho com um aperto, porque Russell era mesmo um
desajeitado quando se tratava de crianças. Billy entrou no carro, Russell
afivelou o cinto nele e então disse para Cameron entrar.

Ele não sabia, mas o coração de Cameron pulsava ansioso toda vez que
estavam muito próximos e se ele ficava mais calado era porque não queria
parecer um bobo como muitos diziam que ele era. Não aos olhos de Russell.

Dirigindo já pela estrada, Russell conversava com Cameron. A conversa


fluía bem, ele ria das tentativas de piada do alfa e parecia compreender tudo
o que ele falava com facilidade. O

alfa descobriu que não era a peculiaridade de Cameron que havia truncado
as conversas iniciais entre ele, mas o seu desejo pelo lobo.

Para Russell, Cameron era perfeitamente normal. Aliás, ele parecia melhor
que o normal.

Ele parecia incrível. Com aquela sinceridade ingênua e o receio constante


de estar incomodando que lhe conferiam uma doçura extra. Se era aquilo
que fazia Cameron ser diferente, então Russell descobriu que gostava de
caras diferentes, porque tudo em Cameron soava atraente para ele.

Chegaram na fazenda ainda de dia. Como era grande, a casa onde Russell
morava ficava distante da casa de seus pais, mas logo que chegaram, o alfa
descobriu que os pais não estavam, então ele dirigiu até perto do estábulo,
onde estacionou o carro e desceu com os dois.

Vestiu o seu chapéu para se proteger do sol e Cameron sorriu ao olhar para
ele. Gostava de como o alfa parecia um coubói sexy com aquele chapéu. Na
alcateia eles não costumavam ter aquele visual, que Cameron achava cair
muito bem em Russell. Tão bem que seu corpo se endurecia ao olhar para
ele.

De repente, Cameron se lembrava que o homem bonito era o alfa e que


como tal ele jamais ia olhar para alguém como ele, que tinha aquela certa
lentidão nunca diagnosticada. Vivendo sempre em dificuldade, seu irmão
mal podia cuidar de si mesmo por estar sempre trabalhando.

Ele ainda teve sorte de ter uma professora com um olhar diferenciado que
conseguiu alfabetizá-

lo. Foi difícil, mas ela conseguiu. E Cameron sabia ler muito bem, embora
não tivesse completado todos os anos escolares.

Russell pediu que eles esperassem do lado de fora do estábulo e entrou para
tirar um lindo cavalo marrom da coxia.

Billy soltou a mão de Cameron e correu para o animal num impulso


incontrolável.

— Billy! — Cameron protestou, mas o garotinho fingiu não ouvir. Sempre


era obediente, mas diante daquele lindo animal, ele não conseguiu resistir.

— Pode deixar... — Russell sorriu para Cameron, quando ele se aproximou.

— Pode pôr a mão, tio alfa? — Billy perguntou olhando para cima.

— Claro, Billy. Vem cá, deixa eu te colocar em cima dele. Você quer?

— Quero!

— Só uma voltinha. — Russell falou, suspendendo o garoto até a cela.

O alfa tinha escolhido o cavalo mais manso e sorria ao ver Billy acariciar
sua crina, deliciando-se visivelmente com aquele passeio.

— Você monta, alfa?

— Eu sei montar, mas não gosto de subir nas costas de um animal.

Cameron piscou algumas vezes, sorrindo em seguida, ao ouvir o que o alfa


disse.

— Acho que eles não devem gostar muito de ter gente em cima deles...
— Mas acho que criança eles não ligam que subam... — Russell entregou
novamente um sorriso aberto. E dessa vez conseguiu um sorriso de
Cameron, como se ele tivesse entendido bem.

O alfa então foi segurando o cavalo com Billy sobre o animal, para que o
garotinho pudesse dar um curto passeio. De longe, Cameron observava os
dois, sentindo a todo o momento aquele pinicar em sua barriga que sempre
sentia quando Russell estava ao redor. Fantasiou coisas indizíveis,
impossíveis e sentiu que sua vida nunca tinha parecido tão boa como
naquele momento, como com aquela visão.

Os dois voltaram rápido. O lindo cavalo caminhando lentamente naquele


chão de terra batida, enquanto sol ia deixando o horizonte formava uma
bela imagem para se admirar. Mais belo ainda era Russell e Billy em
perfeita sintonia entre si, com o animal, com a natureza.

O alfa então tirou o garotinho de cima do cavalo e o deixou acariciar o seu


pelo. Com um sorriso tatuado no pequeno rosto, Billy se divertia como em
poucos momentos. Os três foram chamados para conhecer o estábulo e
Billy pôde ver os outros animais. Caminhou com o tio entre as coxias
extasiado, enquanto o alfa guardava o cavalo marrom.

Enquanto ainda estavam lá dentro, uma chuva forte e repentina caiu. Uma
chuva que já se avizinhava e que Russell vinha tentando evitar, mas
desabou antes que eles pudessem voltar para o carro. Foi então que uma
ideia tentadora demais para ser ignorada atravessou Russell como um raio
que cortava o céu.

— Minha casa fica bem perto daqui. Você se importa de irmos até lá e
esperar a chuva passar? — ele perguntou para Cameron.

— Não, alfa. Tudo bem pra mim.

Concordando, Cameron pegou Billy no colo e correu pela chuva atrás de


Russell. De fato, a casa estava mais próxima de onde estava o carro, mas
não havia nada que os impedisse de ir até o automóvel e retornar para a
alcateia. A chuva estava forte, mas não impedia que Russell dirigisse por
ela com tranquilidade, no entanto o alfa preferiu esperar, levando os dois
para a sua antiga casa.

Assim que entraram, Cameron notou que provavelmente faltavam alguns


móveis na casa, mas ainda assim era linda.

— Olha, tio! Cavalos! — Billy apontou para os quadros na parede.

— O alfa deve gostar de cavalos como você, Billy. — Cameron sorriu.

Russell foi até a cozinha, que ainda tinha uma geladeira funcionando, com
pouquíssimas coisas dentro. O armário contava com alguns mantimentos e
Russell resolveu fazer um macarrão para eles comerem. No refrigerador
havia água e refrigerante e algumas coisas que ele precisava jogar fora.

Ofereceu uma bebida a Billy e outra a Cameron. Ambos aceitaram. E então


ele perguntou se os dois se importavam em jantar com ele lá.

— Ebaa! — comemorou Billy em resposta. Cameron sorriu, dizendo:

— Acho que ele já respondeu. — Cameron sorriu gostosamente e perguntou


se o alfa queria ajuda.

— Se você puder lavar os pratos vai ajudar bastante. Eles estão guardados e
acho que podem ter pego um pouco de pó. Essa parte da cidade é meio
seca... — o alfa dizia, enquanto vasculhava os armários em busca de
alguma coisa para incrementar o macarrão com queijo que ele iria fazer.

— Posso deixar o Billy na sala?

— Pode, claro. Mas lá não tem tevê. Levei pra alcateia. No quarto de
hóspedes tem uma pequena. Posso colocar ele lá, enquanto cozinhamos?

— Claro, alfa.

Russell, então, levou o garoto até o quarto, ligou a tevê e o colocou na cama
de solteiro.
Deu o controle remoto e deixou a porta aberta, dizendo que se ele cansasse
poderia ficar com eles na cozinha.

Retornando para a cozinha, o alfa viu aquele homem forte e lindo lavando a
louça, e seu coração disparou, pensando em como a vida seria boa se
pudesse tê-lo por perto.

— Você se importa de comer macarrão? — o alfa perguntou.

— Não, alfa... na verdade, não precisa se preocupar...

— Eu já disse que vocês não me atrapalham, não disse? — Russell tentou


dizer de forma leve, mas em seguida falou o que não devia.

— Eu gosto de ter vocês por perto. — confessou o alfa, como se não


pudesse se segurar.

No mesmo instante o corpo de Cameron pareceu ter sido atingido pelo


fervor que o consumia quando Russell ao redor, mas de uma forma muito
mais intensa. Ele engoliu saliva, ainda lavando os pratos e sem saber direito
o que aquilo significava, ele falou o que sentiu vontade.

— Eu também gosto de ter você por perto, alfa.

Engolindo saliva outra vez, ele virou para Russell e sorriu, deixando no ar,
não propositalmente, o que realmente estava por trás daquelas palavras.

O alfa simplesmente não soube como prosseguir com aquela conversação.


Ficou demasiadamente abalado para falar algo que não o deixasse
constrangido depois, por isso apenas continuou com o preparo da comida,
voltando a conversar sobre bobagens quando foi possível.

Logo a refeição estava feita e os três jantavam na cozinha. Billy se deliciava


com a comida e com o segundo refrigerante que tomava. Os outros dois
tomavam água, porque aquele era o último refrigerante da geladeira e Billy
ficou com ele.

E enquanto os dois adultos limparam a louça, Billy voltou para o quarto


para continuar assistindo o desenho. Tinha gostado de ficar na casa do alfa e
parecia tranquilo vendo tevê no quarto. Quando terminou de ajudar Russell,
Cameron foi até lá e viu que ele dormia. Sorriu e voltou para a sala. Russell
estava parado em frente à grande janela da sala admirando a chuva que já
caía mais fraca. Tinha acendido a lareira porque o frio já ameaçava invadir
o lugar, mas o fogo não era a única iluminação do ambiente. Uma luminária
ao lado do único sofá que restara no lugar estava acesa, mas mantinha ainda
o lugar à meia luz. Sem saber o que fazer, Cameron sentou no sofá e
observou o alfa em pé por um instante. O homem poderia ser um pouco
mais baixo que ele, mas seu porte e sua postura deixavam claro que ele
tinha um forte animal dominante por dentro. Cameron se sentiu tremer de
leve, com o desejo atravessando seu corpo.

De repente o alfa se vira.

— Posso ir buscar o carro. — ele falou, aproximando-se do sofá. — Você


deve estar ansioso para voltar para a sua casa.

— Eu estou bem, alfa. Billy está dormindo...

— Hum... então você não se importa em ficar mais um pouco? — Russell


se sentou em uma cadeira ao lado do sofá.

— Não. Eu gosto de ficar aqui. — os dois permaneciam se olhando.

— E eu gosto que você fique aqui... — sussurrou o alfa, ainda preso no


olhar no homem.

— Seu namorado não se importa de ficarmos aqui? — Cameron ruborizou


de leve.

— Eu não tenho namorado. — Russell franziu a sobrancelha teimosa que


comumente o entregava.

— Oh... eu pensei que... aquele homem na sua casa na outra manhã...

— Você o viu sair?

— Sim. Pensei que fosse seu namorado.


— Ele é apenas um velho amigo. — Russell se esquivou. — E você tem
namorado? Ou namorada, Cameron?

Havia uma inegável tensão no ar.

— Não tenho, alfa. Nem namorado, nem companheiro. — Cameron sentiu


uma grande necessidade de deixar claro. E Russell sorriu.

— Então somos dois homens livres e descomprometidos. — o coração do


alfa batia forte ao dizer.

— Sim. Somos.

As respirações pesadas dos dois já se tornavam visíveis, embora não


enxergassem. Era evidente que ambos desejavam a mesma coisa, mas então
uma voz vinda de trás.

— Titio... — Billy o chama.

— Vem aqui, querido. — Cameron estende os braços e Billy vai para o seu
colo. — Você já quer ir embora?

— Não, tio. Vamos ficar?

— Daqui a pouco temos que ir embora.

— Por mim vocês podem dormir aqui se quiserem.

— Eba... — ele comemorou soltando um bocejo engraçado em seguida.

Cameron jogou um sorriso de cumplicidade para Russell, enquanto


aninhava Billy sonolento em seu colo.

Feliz que eles dormiriam lá, o alfa foi buscar um cobertor para colocar
sobre o garotinho, enquanto Billy adormecia em seu colo, sentindo as fortes
batidas do coração apaixonado do seu tio.

Capítulo 06
Sem saber que Russell estava na fazenda, ou seja, bem pertinho dele, Abel
resolveu visitá-

lo na alcateia e eles se desencontraram. Mesmo que o amigo tivesse dito


para que ele tomasse cuidado, o urso ômega não seguiu as recomendações.
Abel era rebelde demais para isso. Além do fato de ele desprezar os lobos,
achando-os fracos perto dos ursos.

Por isso, pegou seu carro e foi visitar o amigo, mesmo com a intensa chuva
que caía. Com Russell longe, Abel não tinha muito o que fazer e vivia
entediado. Naquela noite, especificamente, ele estava além de tudo, ansioso,
por isso foi atrás do amigo.

Depois que descobriu a traição do namorado, Abel vinha rejeitando o


contato físico, mas sempre que seu cio chegava, ou se aproximava, aquela
vontade louca de ter seu corpo sendo possuído o consumia por dentro. Mas
ele lutava, porque achava que mesmo sendo um ômega, não poderia se
resumir a um punhado de hormônios. Sem saber que os shifters ômegas
eram talvez os seres vivos mais influenciados pelos calores do cio.

De modo que ele saiu na chuva mesmo, porque precisava se distrair e ver
seu melhor amigo era uma das poucas coisas que o acalmava. Amaldiçoava
sempre que o cio estava perto.

Normalmente, ele gastava a energia do seu cio praticando atividades físicas.


Aquilo fortalecia seu corpo e aumentava sua segurança. Tanto que Abel se
tornou um ômega bastante forte perto dos outros. Tinha aquela compleição
magra e pequena, mas tinha também muita força e um bom conjunto de
músculos. Ninguém queria se meter em uma briga com ele, principalmente
porque seu urso era grande e bravo e em sua forma humana, ele vivia
armado. Abel tinha se tornado um ômega forte, virulento, selvagem e
irritadiço.

Tudo isso para afastar os homens de seu pé, principalmente quando seus
deliciosos odores de acasalamento começassem a se desprender no ar.

Naquela noite chuvosa ele não podia treinar seu corpo, então ele procurou o
amigo, porque a companhia de Russell sempre o ajudava. Gostava de estar
perto de Russell, porque ele era o único que não lhe lançava olhares
lascivos quando estava no cio, ou perto dele. Era um bom amigo e um bom
homem. Embora Abel não acreditasse mais que houvesse homens de
qualidade no mundo. Sendo ou não shifter.

O amigo alfa, no entanto, não estava em casa e assim que Abel bateu na
porta e descobriu isso, ele se irritou profundamente. Xingou sozinho na
porta do alfa, atiçando ainda mais os quatro lobos que o espreitavam desde
que entrou do território da alcateia. Liderados por Rhett, eles emboscariam
o amigo do alfa para deixar uma mensagem clara ao novo líder. "Você não é
bem-vindo", eles queriam dizer, aproveitando que o alfa não estava.

A ida do urso ômega sozinho à alcateia parecia um presente aos lobos mal-
intencionados, mas assim que terminou de praguejar, Abel sentiu que seria
atacado. O cheiro dos lobos não era tão marcante, mas seu instinto o alertou
para a iminência do perigo e ele deixou seu urso tomar seu lugar.

Uma patada ferina atingiu o primeiro lobo que veio correndo em sua
direção, mas outro lobo mordeu sua pata traseira, conseguindo sua atenção,
o urso o atacou também com as garras, urrando alto e grosso, sentindo pele
e pelos entrarem nas enormes unhas. Outro lobo fugia ganindo para longe.
Então vieram os outros dois e o primeiro atingido se levantava para atacá-
lo.

Abel correu para cima de um, enquanto os outros pulavam sobre ele,
ferindo-o com os dentes afiados. O ômega lamentou não ter saído do carro
carregando a calibre 12 que ele levava no banco de trás, para expedientes
como aquele. Abel era prevenido, e gostava dos clássicos, por isso
mantinha sua 12 carregada no carro, mas fora pego de surpresa e agora
tinha que lidar com os lobos sozinho em sua forma de urso.

Teria conseguido acabar com os caras, não fosse um dos desgraçados ter se
transformado e, pegando uma arma escondida, acertasse-o no ombro ao
mesmo tempo em que ele era atacado por um lobo feroz. O impacto foi tão
grande que ele caiu desacordado no chão e sem perceber, mudou de forma
assim que caiu. O lobo já se preparava para estraçalhá-lo quando
alguém veio em seu auxílio e atacou o atirador que corria na direção deles.
Para não serem reconhecidos, os três que restaram, correram para longe
dali, deixando o urso lá. Ou melhor, deixando o pequeno corpo nu de Abel
caído no chão.

O seu lobo salvador logo tomou a forma humana e, pegando-o no colo,


levou-o para longe dali.

***

— Ele dormiu. — Cameron cochichou pra mim, sorrindo lindamente.

— Coloca ele na cama. — cochichei de volta. — Ou você já quer ir


embora?

— Não quero. — ele falou. Então eu caminhei até ele, me abaixei e peguei
o garotinho de seus braços, murmurando:

— Eu já volto.

Nesse momento, nossos olhos se encontraram tão de perto, que eu pude


sentir de relance o seu calor. E como eu queria aquele calor! Que sensação
aquela proximidade me causou!

Cameron apenas balançou a cabeça, enquanto eu caminhava com Billy nos


braços até o quarto, torcendo para ele não acordar. Voltei pra sala devagar,
pensando no que faria, no que diria, então fui até a cozinha, abri um vinho e
voltei para onde estava Cameron. Acho que até uma pessoa com grandes
dificuldades cognitivas — o que claramente não era o caso dele —

compreenderia minha intenção. Meu desejo por ele escorria pelos poros,
ainda que eu tentasse alguma sutileza.

Para a minha sorte, ele aceitou a bebida, então eu enchi as duas taças e
entreguei uma a ele. Bebemos. E eu fiquei sem graça. Eu não conseguia dar
um passo à frente, não conseguia fazer um movimento, porque as coisas
com Cameron eram realmente estranhas e profundas pra mim. Eu
simplesmente travei. Tomei todo o vinho de uma vez e enchi a taça
novamente.

— O que acha de dormir aqui? A chuva parece que não vai parar... — falei,
como se aquela fosse uma desculpa plausível.

— Tudo bem pra mim, alfa. — ele sorriu, terminando de tomar o vinho,
encostando no sofá.

— No meu quarto não tem colchão, porque levei pra alcateia, mas eu durmo
aqui no sofá.

Você pode dormir com o Billy, a cama que ele está tem outra que sai de
baixo dela. É só você puxar... — eu tentava explicar.

— É uma bicama... — ele riu de leve.

— Sim. Desculpa, eu não quis te ofender... — eu disse, sentindo minhas


orelhas esquentarem.

— Não me ofendeu, alfa. — ele falou com uma simplicidade doce.

— Que bom, Cameron... — eu sorri. — E você não precisa me chamar de


alfa. Pode me chamar pelo meu nome.

— Tudo bem. — ele levou aos lábios mais vinho, depois que voltei a encher
sua taça. —

Você tem uma boa casa aqui. Vai sentir falta dela, não vai?

— Eu estou bem instalado na alcateia. Não me importo com o tamanho da


casa.

— Isso é bom. Mas deve ser bom morar em um lugar bonito e quente como
esse. Minha casa é tão gelada, que às vezes o Billy vai dormir no meu
quarto por causa do frio. — ele sorriu como se aquilo fosse algo normal,
que qualquer pessoa passava.

— Nossa. Não tem lareira? Faz muito frio nessa região no inverno.
— Não tem.

— Podemos dar um jeito nisso. Você tem me ajudado a consertar a casa dos
outros, podemos colocar uma lareira na sua também.

— Não, alfa. Digo, Russell. — ele deu um sorriso corado e sem jeito. —
Tem gente que precisa mais.

— Eu gostaria muito que você tivesse uma lareira... assim eu não fico com
frio quando você me chamar pra jantar com você e com o Billy. — eu tentei
brincar.

— E você gostaria de jantar com a gente? — ele abriu bem os olhos,


piscando rápido e sempre que ele fazia aquilo — que devia ser um
movimento involuntário —, eu ficava encantado.

— Eu adoraria jantar com vocês. — respondi sério, vendo o sorriso dele se


abrir.

— Eu vou gostar disso. — ele baixou os olhos. — Mas eu não cozinho bem
como você.

— Eu não me importo. — sorri e olhei pra ele de lado.

Nossos olhares se agarraram. Ele sorriu outra vez. O momento era perfeito
para um beijo, mas eu não sabia se podia, se devia, se ele iria gostar, então
eu me arrisquei. Eu podia ter simplesmente me acovardado, mas eu fui em
frente, me precipitando e falando bobagem.

— Eu nem te beijei e já estou apaixonado por você...

Sim. Foi isso o que eu disse!

— Oh... — eu o vi ofegar. — E você quer me beijar?

— Eu quero muito te beijar, Cam. — Falei e o vi piscar rápido, fazendo


aqueles cílios espessos se moverem com ligeiros e lindos.
— Eu também quero... — ele balbuciou, aparentemente tão nervoso como
eu. — Pode me beijar, alfa...

Ele mal terminou a sentença e meus lábios colaram nos dele da forma mais
gentil que meu ímpeto permitiu. Senti sua boca na minha e era como se um
desejo antigo se realizasse. Mesmo o conhecendo há tão pouco tempo,
aquele beijo parecia um sonho antigo, e sua boca perfeita na minha.

Quente, macia, trêmula.

Ele todo tremia quando o abracei, segurando sua nuca com o mesmo
carinho que percorria os caminhos de seus lábios. Voltei a beijar sua boca,
me aprofundando, buscando sua língua que se entregava à minha com
facilidade, que se deixava dominar, mas se fazia presente o tempo todo,
brincando comigo, lambendo meus lábios, sensual e ternamente, me
deixando ainda mais louco por ele do que eu já estava.

Toquei seu rosto, mas eu queria tocar o corpo todo. Segurei seu pescoço
com mais firmeza, sem me tirar da sua boca, sem deixar de saboreá-lo,
porque uma tendo sentido o seu gosto, eu não queria mais parar. Então ouvi
uma voz pequena e aguda.

— Titio... — Billy entrava na sala e quase pegou nosso beijo.

Resmunguei internamente ao soltá-lo, enquanto eu ouvia o garotinho


chamar o tio para dormir com ele, porque estava com medo.

— E se eu ligar a tevê? Será que o medo vai embora, Billy? — Cameron


falou.

— Não, titio. Quero você.

— Então vem com o titio. Vamos dormir. — ele o pegou nos braços. — Diz
"boa noite" pro alfa, Billy. — Cameron olhou para mim com um rosto de
lamento e os lábios levemente inchados do nosso beijo, mas sem deixar de
sorrir.

— Boa noite, tio alfa. — Billy disse com uma voz de sono.
— Boa noite, Billy. — respondi. — Boa noite. — falei, olhando para
Cameron.

Também sorri. Mesmo bastante frustrado com aquela súbita separação, eu


sorria, porque eu ainda podia sentir o gosto dele na minha. E aquele tinha
sido o melhor gosto de todos. Tinha sido rápido, tinha sido pouco, mas o
suficiente pra eu saber que eu não precisaria de mais nada, que não ia
querer beijar outra boca que não fosse a dele.

***

Enquanto Cameron suspirava na cama de baixo do quarto de hóspedes de


Russell, lembrando dos beijos que tinham acabado de dar e maravilhado
com a sensação de ter o alfa na sua boca, tão gostoso e quente, Abel
acordava, seminu e ferido, na casa de Finnegan.

— Onde eu estou? — o urso rosnou, tentando se levantar.

— Por favor, não se levante. — Abel o tocou para acalmá-lo e o fazer


deitar.

— Não toque em mim! — Abel resmungou, com a força que tinha, fazendo
uma careta de dor.

Finn se afastou da cama onde o tinha colocado.

— Eu te trouxe para a minha casa. A enfermeira da alcateia está vindo ver


seu ferimento.

Tente se acalmar. Você vai ficar bem. — o beta dizia com tranquilidade.

— Eu quero ir pra casa. — disse o ômega teimoso, tentando em vão se


levantar.

— Deite-se. — Finn falou calmamente.

— Por que você acha que manda em mim?


— Eu não acho que mando em você. Só quero que fique bem. — o beta
disse e em seguida saiu do quarto para atender a enfermeira que chegava.

— Posso ver o seu ombro? — ela perguntou ao ômega, aproximando-se da


cama.

— Pode... — ele respondeu muito mais manso, pois ser tocado por uma
mulher era algo menos incômodo para ele.

Percebendo que com a enfermeira ele parecia mais calmo, Finnegan ficou
na porta, apenas observando os dois de longe.

— Você consegue se transformar? — ela perguntou.

— Não...

— Não tem problema. Mas vou precisar tirar a bala que está alojada no seu
ombro. Você deve ter mudado bem no momento do tiro e a bala ainda está
aqui.

— Tudo bem, doutora. — ele disse.

— Eu sou enfermeira, não sou médica, mas já fiz isso algumas vezes. Você
quer que eu faça, ou prefere ir a um hospital?

— Não. Pode tirar.

— Você precisa tirar a blusa. — ela falou. — Enquanto isso, vou até o carro
buscar minha outra maleta. Não tenho tudo o que preciso aqui.

— Tudo bem...

— Eu vou estar na sala. — Finnegan falou para ele, saindo junto com a
mulher.

— Eu não consigo tirar sozinho... — Abel reclamou, fazendo Finn voltar


para o quarto.

— Quem colocou essa blusa em mim?


— Fui eu. Imaginei que não quisesse ficar sem roupa.

— Eu não quero, mas olha o problema que você me meteu.

Finnegan sorriu. Foi até a cozinha buscar uma tesoura, enquanto o urso
ômega resmungava e quando voltou, avisou que cortaria a camiseta para
que ele não precisasse levantar os braços.

Abel permaneceu em silêncio, a dor já era forte demais para ele lutar contra
a ajuda do lobo.

Com cuidado, Finn se aproximou.

— Fique tranquilo. Não vou te machucar.

Cortando de cima para baixo, começando pela gola, o beta cobriu o urso
com um cobertor até a cintura, de modo que ele não ficaria com as partes
íntimas expostas. Não que Finnegan já não tivesse visto, porque ele tinha
vestido o cara e viu todo o seu corpo, fez um curativo improvisado no
ferimento e o vestiu. Em seguida, ligou para a enfermeira.

Agora ele estava lá, cortando a manga da camiseta para deixar exposto o
ombro ferido.

Antes de cortar o tecido, ele afastou os longos cabelos loiros do ômega com
cuidado, sentindo sua textura fina nos dedos. Ofegou por instante, pois
desde que vira pela primeira vez, a despeito de toda a sua reclamação,
Finnegan o achara lindo. De perto ele era ainda mais. E seu cheiro o fazia
estremecer.

Logo a mulher voltou e Finnegan o deixou com ela, avisando que estaria na
sala. Voltou apenas para levar uma toalha e um pouco de água que ela havia
pedido e deixou os dois sozinhos.

Da sala, ele ouviu Abel gritar de dor e praguejar todos os lobos que
conseguia. Aflito, Finn esperou até que a mulher saiu. Não demorou muito.
A bala estava quase para fora, mas ela precisou tirar a sangue frio, o que fez
com que Abel caísse num sono profundo antes mesmo da sutura.
Ela limpou o ferimento e fez um curativo. Apagou a luz e deixou o urso
dormindo. Em seguida, explicou o que achou necessário para Finnegan, que
agradeceu pela ajuda e a acompanhou para fora. Assim que fechou a porta
da casa, o beta voltou para o quarto e, sem acender a luz, deu uma olhada
no ômega que dormia. A respiração era pesada, mas ele parecia bem.

Pensando sobre o ocorrido, Finnegan concluiu que havia perigo na alcateia.


Ele precisaria contar tudo ao alfa, mas antes ele precisava garantir que
aquele ômega bonito em sua cama estivesse totalmente fora de perigo. Por
isso, ele dormiu na sala, para o caso de Abel acordar. E

definiu que só no dia seguinte procuraria Russell, para tratar do ataque ao


seu amigo e tentar resolver aquele problema.

Capítulo 07

A manhã parecia ainda mais fria que a noite. O sol não conseguia esquentar
o solo ou ar e o clima permanecia gelado. Finnegan levantou cedo, fez sua
higiene matinal e caminhou na ponta dos dedos até o quarto. Não queria
incomodar o ômega bravo.

Ele ainda dormia, com a respiração mais calma que na noite anterior e
parecendo tranquilo, mas Finn sabia que ele precisava de energia para a
transformação e por isso foi preparar algo substancioso para o desjejum do
urso. Morando próximo do bando de Abel, sempre havia comentários de um
bando sobre o outro e o que sempre Finnegan ouvia falar era que ursos
comiam muito e eram bons em preparar refeições, o que fez com que ele
desse o seu melhor na cozinha aquela manhã.

Fez uma refeição completa, com ovos, bacon, pão, leite, manteiga e o que
mais encontrou na geladeira. Colocou em uma bandeja bonita e levou para
o quarto. Descansou a bandeja na mesa de cabeceira e tocou o braço do urso
a fim de fazê-lo acordar. O que ele fez quase num pulo. Levou alguns
segundo para se lembrar do que acontecera na noite anterior, e então seu
ombro agilizou o processo de recordação.

— Eu trouxe seu café da manhã. — Finn se virou para pegar a bandeja. —


Você precisa de ajuda para se sentar?
— Não. Eu consigo. — ele falou com os olhos ainda inchados e a voz meio
rouca.

Então Finn entregou a ele a bandeja, apoiando-a sobre suas pernas. Abel
olhou para a comida, depois para Finnegan que sorria e agradeceu.

— Vou deixar você sozinho, mas logo venho buscar a bandeja para que
você volte a descansar.

Abel queria dizer que não voltaria a descansar, que iria embora, que não
receberia ordens de nenhum lobo, mas ele estava tão fraco que não tinha
certeza se realmente iria aguentar.

Comeu o que Finnegan havia preparado para ele e quando o lobo voltou, ele
já estava dormindo novamente.

Por um tempo, o beta o admirou, ainda com a camiseta azul-escura toda


cortada embaixo de seu corpo, tendo pedaços dela visíveis, ele dormia bem
mais calmo que na noite anterior.

Seu curativo parecia bom, mas Finn não ousou se aproximar. O urso era
feroz demais para que ele arriscasse. Não que estivesse com medo de ser
atacado, achava o pequeno shifter loiro adorável em sua expressão nervosa.
Finnegan apenas não queria incomodá-lo a ponto de querer fazê-lo ir
embora. E o beta tinha muitas razões para não querer que ele fosse. Muitos
motivos para querer que ele ficasse.

***

Na fazenda do pai de Russell, naquela mesma manhã, os três tomaram café


da manhã juntos antes de voltarem para a região da alcateia. O sol brilhava,
mas o dia ainda estava frio, quando eles voltaram e ninguém falou sobre o
beijo.

Nenhum deles queria fingir que nada tinha acontecido, mas ao mesmo
tempo não sabiam o que fazer. Não queriam parecer forçar a barra, nem
queriam parecer indiferentes, por isso ficaram apenas estranhos e distantes.
Russell ainda levou Billy para ver os cavalos antes de irem, mas nem uma
aproximação entre os homens, apenas algumas trocas de olhares de alguns
sorrisos tímidos.

A volta silenciosa serviu para deixar Cameron um pouco ansioso e


preocupado. Ele tinha gostado daqueles beijos mais do que de qualquer
outro, mais do que de qualquer coisa. Queria ele dizer isso para Russell,
mas com Billy lá ele não pôde. Achava que assuntos como aqueles eram
impróprios para crianças, mesmo sendo apenas beijo.

Como Russell também não disse nada, apenas se despediu, dizendo "até
amanhã", Cameron agradeceu e desceu do carro com Billy. Não sem antes o
garotinho dar um abraço no tio alfa, deixando-o levemente emocionado.

O alfa queria ter dito muitas coisas, mas também não sabia o que dizer.
Tinha passado a metade da noite em claro, deitado no sofá, sentindo o
cheiro de Cameron na casa e em seu corpo. Foi difícil dormir depois de
beijá-lo, sorria como um bobo, como adolescente enamorado, com o desejo
ardendo na pele, mas a despeito desse ardor, havia uma confortável
quietude, uma paciência amorosa que soprava em seu ouvido, dizendo que
tudo estava pela primeira vez em seu devido lugar.

***

Mal chegou à alcateia, o alfa foi informado do ataque. No mesmo momento,


ele foi até a casa de Finn, onde sabia que estava Abel, nervoso para ver o
amigo. Finnegan explicou o que tinha acontecido antes de levar o alfa até o
quarto e ele verificar que o urso estava bem.

— Sabemos quem o atacou? — ele perguntou ao beta.

— Quando eu cheguei os três correram. Na hora do nervoso eu não pude


identificar, alfa, mas eu tenho minhas suspeitas.

— Precisamos investigar, Finn. Coisas como essa não serão aceitas. Pelo
menos não enquanto eu estiver no comando. E obrigado por ajudar meu
amigo. — ao agradecer, o alfa percebeu o olhar de Finn brilhar. Ele
compreendeu rapidamente o que acontecia ali.
— Não me agradeça, alfa. Eu fiquei preocupado com ele... só não sei onde
ele deixou o carro, porque eu precisava que a enfermeira o visse. Tinha uma
bala alojada em seu ombro.

— Mas que filhos da puta! — Russell bradou. — E não se preocupe, eu


acho o carro.

— A chave não estava com ele quando o encontrei. Deve ter caído no chão
perto da sua casa, alfa.

— Vou pra lá procurar e levo o carro para a casa dele. Antes passo aqui para
buscá-lo.

— Eu posso levá-lo, alfa. Só me dizer onde fica. — o beta falou, aflito.


Russell olhou bem para Finnegan, pensou por um instante e concordou.

— Obrigado por confiar em mim. — Finnegan suspirou, porque sabia que


não teria outra chance com Abel e, por Deus, ele não queria deixar mais
ninguém cuidar dele naquele momento.

— Mas ele não tem familiares, Finn. Se ele não melhorar, me diga e eu o
levo pra minha casa. Porque eu não acredito que ele vá aceitar ficar aqui.

— Tudo bem, alfa. Ele provavelmente não vai aceitar mesmo.

Decidiram que só cuidariam dos lobos depois de resolver o problema com


Abel, e então Russell saiu para procurar a chave do carro do amigo. Viu o
quintal meio revirado, sinais de luta e achou a chave caída perto da porta.
Nem entrou em casa, pediu que um executor o ajudasse e depois de achar o
carro do amigo, dirigiu-o até o bando dos ursos, com um executor levando
seu próprio carro atrás, para que ele pudesse voltar de lá em seu próprio
automóvel.

Abel só acordou no meio da tarde. Finn não saiu de casa nem por um
segundo para ficar de olho nele. Verificou o quarto a cada hora para ver se
ele estava bem e não via a hora de vê-lo sem dor. De repente, quando estava
na sala patrulhando o sono do shifter ferido, ele ouve um barulho alto vindo
do quarto. Correu para lá e encontrou o grande urso pardo urrando. Não o
maior que ele tinha visto, mas certamente bem maior que seu lobo. Sorriu
ao vê-lo em pé.

Agradeceu pela primeira vez por morar em uma casa grande, caso contrário
o urso teria quebrado alguns móveis.

— Só vim porque fiquei preocupado, mas já estou saindo. Pode ficar à


vontade. — o urso grunhiu e Finn fechou a porta atrás de si.

Com certeza ele estava reclamando na sua linguagem de urso. Finnegan


poderia jurar que ele o xingava, mas sorriu. Afinal, ele estar transformado
era um bom sinal. De modo que o beta apenas se sentou no sofá e esperou
até que a cura acontecesse dentro do quarto. Decorridos alguns minutos,
Abel sai enrolado no lençol, dizendo que precisava de uma roupa.

Finnegan se levantou rapidamente e deu de cara com aquela linda imagem


do cara pelado, com seus brilhantes cabelos claros a emoldurar o rosto
suave, enrolado em um lençol branco.

Tudo o que Finnegan queria era deitá-lo na cama e beijar sua boca, depois
fazer amor com ele

até o dia seguinte. Abel era lindo como uma pintura renascentista, embora
fosse magro. Ele era perfeito, totalmente desejável e completamente arisco.

— Você está melhor? — Finn pergunta, demonstrando preocupação.

— Estou ótimo. — ele responde impacientemente. — Preciso de roupas


para ir embora.

— Vou pegar pra você. — o beta caminhou para o quarto.

— Como está seu ombro?

— Quase perfeito. — ele disse com uma certa frieza.

Finn pegou algumas peças e deixou à disposição de Abel sobre a cama e


saiu do quarto.
Pouco tempo depois, ele sai e já vai se despedindo.

— Calma. Eu vou levar você.

— Não precisa. Tenho que pegar meu carro... — ele parecia meio aéreo.

— Russell levou seu carro para a sua casa. Eu te levo até lá.

Abel bufou. Detestava favores. Achava que sempre ficaria devendo alguma
coisa e se tinha algo que ele odiava mais que favores era ficar devendo.

— Eu posso ir andando.

— Não vou deixar você ir andando. — Finnegan tentou suavizar sua fala.

Abel revirou os olhos, como se aquilo o estivesse deixando aborrecido e


concordou em se deixar levar.

— O que acha de comer antes?

— Eu estou bem, lobo. Obrigado. Só quero ir pra casa antes que eu seja
atacado de novo nesse lugar.

— Sob os meus olhos eu te garanto que você não será atacado.

Aquelas palavras foram ditas com tanta propriedade que Abel não ousou
retrucar. Foi a primeira vez que o homem soou realmente autoritário, mas o
ômega não se importou. Só queria ir embora daquele lugar logo.

Ao longo de todo o caminho, Finnegan tentou puxar um assunto tranquilo


com Abel, mas ele estava mais irritado que normalmente e o beta não
conseguiu nenhuma abertura. E Finn queria, ele precisava que Abel desse a
ele uma oportunidade para se aproximar, afinal, ele já sabia que aquele
ômega era seu. Tudo nele gritava para reclamá-lo para si. O beta tinha
certeza, mas como dizer isso a um urso que odiava lobos, logo depois de ter
sido atacado por lobos? Não tinha como. Por isso Finn não disse. Voltou
para a alcateia apenas com um agradecimento breve do urso, como seu
cheiro maravilhoso dentro do carro e o coração cheio de preocupação.
***

Quando voltou da casa de Abel, Finnegan foi direto para a casa do alfa
tratar do que havia acontecido. Organizaram dois grupos de busca, com os
homens que Finn considerava mais leais e trataram de investigar o grave
incidente. Alfa e beta coordenaram as equipes e ainda que Russell não
estivesse totalmente familiarizado com o território junto à floresta, ele
conduziu a busca.

O trecho de mata era curto, fazia parte de um pequeno parque florestal.


Chamavam-no de território da alcateia, mas não era algo reconhecido pela
lei. Tratava-se mais de convenção entre os shifters, que costumam ser
extremamente territorialistas devido à sua parte animal, e quando se tratava
de ursos e lobos a questão se intensificava. Eram bandos que levavam
bastante a sério a questão do grupo e do espaço e por isso, resolver aquele
ataque era uma questão de honra para Russell, principalmente porque ele se
via no meio do caminho entre os dois bandos, num limiar difícil e perigoso.

Dois dias se passaram e ninguém tinha conseguido uma prova convincente


de que Rhett estava envolvido. Com toda aquela questão tomando o tempo
do alfa, ele mal conseguiu conversar novamente com Cameron, ainda que o
homem passasse parte do dia em seu quintal dos fundos. E aquilo já
preocupava o pobre lobo, que sonhava ansioso com outro beijo de Russell.

Mas além das buscas, Russell precisou visitar Abel, resolver as coisas das
reformas e da festa das crianças que estava perto de acontecer. Tudo se
juntava e ele não conseguia tempo para estar sozinho com Cameron. Toda
noite, no entanto, Russell pensava nele e em como o queria.

Na noite seguinte, por mais que Russell tivesse pedido para que Abel não
fizesse mais aquilo, enfatizando que ainda não tinha encontrado seus os
culpados pelo seu ataque, o ômega foi outra vez sozinho à alcateia.

— Caramba, Abel! — Russell rosnou quando abriu a porta.

— É assim que recebe um amigo? — ele riu, entrando com umas roupas na
mão.
— Eu poderia ir te buscar. Já te falei que é perigoso!

— E você acha que tenho medo desses cachorros sarnentos? — foi a vez de
Abel rosnar.

Quem visse seu rostinho meigo não suspeitaria que ele tinha um urso forte e
um temperamento ácido. Se ele tinha algum traço de ômega, tinha-o
guardado em um baú, acorrentado e jogado no fundo do mar. O cara era
bravo e vivia a reclamar. Não tinha medo, mesmo já tendo sido baleado e
torcia para poder rasgar um ou dois daqueles cachorros que o pegaram.

— Vim trazer as roupas do seu beta. Não quero nada de vira-latas na minha
casa. — Abel riu, colocando as roupas lavadas e passadas sobre a mesa.

— Hum... entendi. — Russell jogou um risinho insinuante de volta.

— Me dê água e pare de sorrir como um idiota, Russell! Não sei o que está
querendo dizer com isso! — o ômega se irritou.

— Acho que você sabe, sim...

Abel revirou os olhos, sentou em uma cadeira desleixadamente e colocou os


pés sobre outra, enquanto via o amigo buscar a água para ele.

— O homem é seu companheiro. — Russell falou despretensiosamente, ao


colocar água em um copo e sentiu o rosnado de Abel chegar em sua nuca.

— Nunca mais fale isso!!

Russell riu.

— Você sabe que é verdade. Vai resistir até quando? — o lobo entregou a
água, rindo do amigo.

— Você é um grande canalha, Russell! Eu não tenho companheiro. Nem sei


do que está falando... — ele entornou a água. — Se eu tivesse um
companheiro, coisa que eu me recuso, jamais seria um cachorro!
— Ele é um lobo. — Russell falou calmamente, sem deixar de sorrir. — E
as coisas não funcionam desse jeito, meu amigo. Agora, escute. Eu preciso
tomar banho. Você vai ficar sentado aqui e só vai sair quando eu voltar,
senão eu falo pro Finn que você veio devolver as roupas e disse que está
perdidamente apaixonado por ele. — o alfa riu, antes de sair da cozinha.

— Você é um canalha, Russell! Um canalha! — o ômega gritou, quando o


amigo se afastava.

Estando sozinho, Abel encheu outro copo com água, bebeu e foi para o
sofá, resmungando.

Ligou a tevê e se sentou, colocando despojadamente os pés sobre a mesa de


centro. Ficou trocando de canal até sentir um cheiro de lobo de aproximar.
Não era o cheiro de Russell, nem o de Finnegan, que ele conhecia bem. Não
era um cheiro estranho, no entanto. Ficou alerta para o perfume que se
aproximava. Seu coração acelerou um pouco, porque no fundo ele tinha um
pouco de receio de ser atacado novamente.

O que Abel não sabia é que há alguns minutos, depois de remoer a


ansiedade e conseguir que a senhora Moore ficasse com Billy por mais
algum tempo, Cameron saiu de casa decidido a contar para o alfa que queria
mais daqueles beijos, antes que ele resolvesse beijar aquele outro homem
que tinha visto sair de sua casa no outro dia. Cameron não sabia como dizer
ao alfa que queria ser o único a poder beijá-lo, por isso queria ir até lá e se
fazer presente. Marcar território.

Ou pelo menos perguntar se ele não gostaria de fazer mais um pouco


daquilo.

Seu estômago borbulhava como da primeira vez que viu Russell, estava tão
nervoso quando chegou à sua porta que nem notou o cheiro do urso ômega.

Deu três batidas na porta, que foram sentidas dentro do seu peito, ajeitou o
cabelo com a mão e esperou com um sorriso no rosto que se desmanchou
no momento em que a porta se abriu.

— Oi. — Abel sorriu, impressionantemente simpático.


— Oi... — o pomo de adão de Cameron se moveu quando ele engoliu
saliva, olhando para baixo. — Eu... me desculpa... eu achei que... não quis
incomodar... — ele falou completamente constrangido. Não esperava
encontrar aquele ômega bonito ma casa do alfa.

E, Deus, ele era tão lindo. Tão delicado. Com os traços suaves, os cabelos
claros como de anjos de filme e ele era pequeno, menor que Russell.
Parecia se encaixar tão bem nele, que o estômago de Cameron roncou de
tristeza.

— Incômodo nenhum. O Russell está no banho. Você quer entrar? — Abel


perguntou, vendo que aquele era um rosto amigável.

— Não... não... me desculpa incomodar... eu... já vou indo... — ele dizia,


totalmente envergonhado.

— Eu digo que você esteve aqui. Como você se chama?

— Cameron...

— Eu aviso que você passou, Cameron. — Abel deu sorriso curto, vendo o
cara agradecer e ir embora.

Cameron não via a hora de fugir correndo dali. Sua barriga gritava, ele
sentia uma forte vontade de chorar. Voltou para a sua casa pela floresta,
completamente atordoado pelos ciúmes. Imaginando Russell saindo do
banho e os dois rolando na cama. O lobo tomando aquele pequeno ômega
nos braços. Como ele se sentiu um tolo! Russell não tinha prometido nada a
ele, mas ele se sentiu um idiota por ter criado esperanças onde claramente
não havia. É claro que o alfa não ia querer nada com um cara como ele.
Onde ele estava com a cabeça?

As pontadas em seu peito o deixavam tonto, enquanto ele andava entre as


árvores, em sua barriga as bolinhas tinham voltado, mas não aquelas
gostosinhas de quando Russell se aproximava, ou de quando eles se
beijaram, que ele se sentiu leve e feliz como quando era criança. Eram
bolinhas ruins, que explodiam e pareciam querer levá-lo ao chão.
Certo de que o alfa tinha outro, de que não o queria, Cameron voltava
arrasado para a casa, com os olhos encobertos por névoa e o coração
ardendo de tristeza, dor e decepção, enquanto Abel continuava sentado no
sofá da casa do alfa, sem conseguir decidir o que assistir.

Quando Russell voltou do banho, o amigo contou, despreocupadamente,


que alguém chamado Cameron o havia procurado.

— Uma gracinha o lobo. E olha que é difícil eu achar lobos uma graça,
mas...

— E o que você disse a ele?! — Russell o interrompeu bruscamente.

— Que você estava no banho, oras.

— Merda! Eu preciso ir, Abel. Ele deve ter achado que estamos juntos, ou
coisa parecida.

Preciso me explicar... — Russell dizia nervoso.

— Calma. O homem não vai fugir com outro. — Abel tentou provocar.

— Eu espero mesmo que não. Caso contrário eu teria que te matar. —


Russell riu, pegando a carteira, as chaves do carro e o chapéu.

— Que bom amigo você é... — Abel torceu o nariz. Você cachorros são
desesperados. Se eu soubesse que tinha algo com o cara, eu tinha falado pra
ele entrar.

— Eu não tenho ainda. Mas pretendo ter. — Russell sorriu com a


expectativa. — E falando em cachorro desesperado, você devia aproveitar
que está aqui e ir logo falar com o Finn. O

homem está caído por você. — o alfa ri, aproveitando sua vez de provocar.

— Vai se ferrar, Rus. Eu vou embora. — Abel se enerva.

— Sozinho, não. Te levo até o carro, espero você ir e depois vou atrás de
Cameron. — o amigo bufa
— Você está mesmo me mandando embora. Que absurdo!

— Claro que estou. Eu não vou perder aquele homem, Abel. Eu não posso
perdê-lo.

Capítulo 08

Foi com dificuldade que Cameron chegou à casa da senhora Moore. Sua
vontade mesmo era deixar seu lobo tomar a vez e correr pela mata, uivar
chorando para o céu. Mas ele tinha responsabilidades e a mulher já tinha
passado quase o dia todo com Billy, merecia seu momento de descanso. Ela
já o ajudava há tanto tempo, sem receber ou pedir nada por isso. Só há
pouco Cameron vinha pagando alguma coisa para ela, depois de muito
insistir para convencê-la a aceitar. De modo que ele não podia abusar. Tinha
responsabilidade tanto com ela quanto com Billy, por isso apenas refez o
caminho de volta, triste e choroso, por achar que o alfa o preteria.

Cameron não era como os outros caras que podiam se dar ao luxo de sair de
casa no meio da noite atrás de uma transa ou de o que quer que fosse. Ele
lutou por aquele pedacinho de tempo para correr até o alfa à noite, já que
ele nunca mais arrumava tempo para ter uma conversa com ele no quintal,
mas Russell já tinha outro compromisso. Já tinha outro homem em sua casa.

Seu corpo ainda doía de tensão quando pegou o pequeno Billy e se despediu
da senhora Moore, ouvindo-a dizer que o sobrinho já tinha jantado. Levou
Billy sonolento nos braços até o quarto e o colocou na cama com cuidado.
Mas mesmo antes de o sofrimento causado pela solidão bater, aquela
tristeza noturna de quando se coloca a cabeça no travesseiro e se precisa
lidar com a vida que se descortina diante dos olhos, um barulho de carro se
anunciou. Era ele, o alfa.

Correndo até a porta antes mesmo que ele batesse, Cameron torcia para que
não estivesse louco, para que não fosse um mal-entendido ou coisa do tipo.
Suas fortes pernas tremiam depois de ter reconhecido o carro de Russell, de
medo que ele estivesse lá por outro motivo. Pensou que talvez fosse brigar
com ele por ter ido incomodá-lo à noite em sua casa, mas assim que o viu
caminhar em sua direção com um sorriso, seu peito se aqueceu novamente e
bolinhas no estômago voltaram a ser agradáveis.
Cameron deu um passo, descendo do limiar mais alto da porta e quando
Russell chegou ele percebeu que no fundo ele não era tão mais baixo assim,
uma vez que com facilidade ele alcançou sua boca, sem dizer coisa alguma,
apenas o pegando pelo pescoço com carinho e com jeito.

Engenhosamente, Russell subiu no degrau da porta e logo estava maior do


que Cameron.

Voltou a beijá-lo e o abraçou sem que ele precisasse se abaixar um pouco


para alcançar sua boca. Embora aquilo não fosse realmente um problema
para eles. Para nenhum deles.

E aquele beijo causou tanto alívio em Cameron que ele pôde enfim relaxar,
tranquilo nos lábios do alfa, porque ele ainda o queria. Mas Cam estava
confuso. Por que o homem estava com outro e agora o beijava? Seria
Russell um daqueles homens que gostava de colecionar conquistas?

— Eu fui na sua casa... — Cameron falou suave, sentindo o homem abraçar


sua cintura.

— Eu sei... por isso estou aqui... não quero que pense que Abel e eu temos
alguma coisa.

— Vocês não têm? — Cameron piscou algumas vezes e, inferno, como


Russell achava lindo aquilo!

— Não temos. — o alfa sorriu. — Ele é apenas meu amigo.

— Ah... amigo igual aquele outro que você beijou na boca? — Cameron
baixou a cabeça e engoliu saliva, fazendo seu pomo de adão dançar.

— Não... eu não tenho mais amigos que eu beijo na boca.

— Não? — Cameron levantou os olhos brilhantes emoldurados pelos cílios


grossos.

— Não. Eu só quero beijar você, Cameron. — o alfa falou antes de beijá-lo


outra vez e puxar seu corpo para junto de si.
Sentiu o homem maior amolecer em seus braços, ao passo que uma parte de
seu corpo insistia em se mostrar cada vez mais rígida. O beijo sonoro, cheio
de suaves gemidos de Cameron já fazia o pênis do alfa exigir o homem.
Mas ele não queria algo improvisado e brusco. Não com Cameron. De
modo que eles ficaram apenas se beijando na porta da casa, enquanto o alfa
tinha

a oportunidade de dizer para ele que o queria desde o momento em que o


tinha conhecido. Que era só ele que Russell queria. Que não havia e não
haveria mais ninguém.

E estando os dois abraçados, Cameron fez com que o coração do alfa se


apertasse ainda mais ao pedir:

— Por favor, não me faz sofrer.

***

Sim. Desde que eu coloquei meus olhos nele eu soube. Algo em mim
soube, algo gritou que ele era meu. E não tinha nada em mim quisesse
magoá-lo. Mas como eu poderia chegar achar que aquele homem aceitaria
minha reivindicação? Entre os shifters, nunca foi muito bem visto um
homem com a minha estatura. A não ser que eu fosse um ômega. Minha
altura era tão mal vista quanto rara para um alfa, visto que shifters
costumavam ser realmente altos. Pelo menos era o que se via entre os lobos
e os ursos.

Eu aprendi a lidar com isso ao longo da vida, mas era diferente quando se
tratava de encontrar seu companheiro. A insegurança tinha batido e eu
simplesmente não sabia se Cameron me aceitaria. Mas eu estava disposto a
conquistá-lo e a mostrar que eu o queria com seriedade. Que não queria
mais ninguém na minha vida. Por isso corri até ele aquela noite, porque se
havia alguma chance de ele achar que eu tinha alguma coisa com Abel, eu
precisava esclarecer. E eu esclareci beijando a boca dele ardentemente,
dizendo em seu ouvido tantas vezes quanto eu pude que eu o desejava,
olhando em seus olhos e dizendo novamente. E
quando meu corpo ficou a um passo de explodir, eu me despedi, alegando
que precisava acordar cedo no dia seguinte.

Minha vontade, no entanto, era tirar a roupa dele ali mesmo na porta de sua
casa e o devorar inteiro. Mas eu queria muitas outras coisas com ele, então
eu me contive e fui embora, não sem antes encher a boca dele de beijos
outra vez.

No dia seguinte, na minha casa, eu fiz questão de ir até ele levar um copo
de café e dizer que eu tinha gostado da noite anterior.

— Eu também gostei, alfa. — ele disse, envergonhado.

Que visão esplêndida era aquela de ver um homem daquela proporção corar
na minha frente, lindamente tímido.

— Você vai mesmo me chamar de "alfa" pra sempre? — eu brinquei,


fazendo-o avermelhar mais uma vez.

— Eu... prometo que vou tentar... — ele levantou os olhos e sorriu.

— Eu vou ficar feliz, Cam. — o chamei de forma abreviada para incentivar


que ele me chamasse pelo menos de "Russell", mas ao dizer aquilo meu
peito esquentou como o rosto dele.

De repente era como se fôssemos íntimos, como se eu já o tivesse feito


meu.

Sem graça, eu voltei para dentro e fui fazer minhas coisas e só no fim do dia
o vi novamente, porque voltei correndo para a casa. Eu me apressei, porque
tinha uma coisa para perguntar a ele que de manhã, devido à minha saída
apressada e desajeitada, eu não pude perguntar.

— Vai ter uma festa para as crianças na sede da alcateia. — eu falei, tendo o
olhar dele preso em mim. — Eu queria saber se você quer ir comigo... você
e o Billy.

Ele arregalou os olhos, me deixando apreensivo.


— Você quer que eu... e o Billy...? — ele parecia não conseguir completar e
eu não sabia se ele não tinha entendido ou se era outra coisa.

— Eu gostaria de ir com vocês. De passar na sua casa e levar os dois... —


eu tentei explicar sem parecer que eu o estava subestimando ou algo do
tipo.

— Oh... eu gostaria muito disso, Russell. — o sorriso dele se iluminou. —


Tenho certeza que o Billy também ficará feliz.

— Ótimo! — eu sorri e me despedi dele, ansioso para que chegasse logo o


dia seguinte, porque eu tinha um encontro. Um encontro com o meu
companheiro.

***

Como não tinham encontrado os homens que atacaram Abel, Russell teve
uma ideia.

Chamou novamente o amigo urso para a sua alcateia a fim de que ele
atraísse a atenção dos lobos que o tinham atacado. Convidou-o para a festa
das crianças, na qual estaria quase todo o bando e Russell poderia ficar de
olho no amigo e talvez encontrar os possíveis agressores.

Como queria que os caras fossem pegos e adorava se sentir corajoso, Abel
evidentemente foi. Gostava de um friozinho na barriga, desde que não fosse
provocado por algum romance. De romances ele queria distância. O que
Abel não sabia é que o amigo tinha combinado de ir à tal festa
acompanhado e logo que soube, Abel se irritou um pouco.

Como o combinado, Russell passou na casa de Cameron para buscar o


executor e o sobrinho. Não o beijou assim que o viu, porque o garotinho
estava perto, mas assim que seus olhos bateram no grande lobo, Russell
salivou de vontade de ter sua boca outra vez. Queria demonstrar toda a sua
autoridade alfa naqueles lábios, naquele corpo e pensar naquilo o aqueceu
como o inferno.
Afastando os pensamentos libidinosos que Cameron despertava nele, ele
apenas elogiou sua aparência, fazendo o lobo corar adoravelmente como ele
tanto gostava.

— Você também está muito bonito, alfa... — Cameron devolveu o elogio,


aproveitando que já estava mesmo corado.

Depois de instalar e prender Billy com o cinto no banco de trás, Russell


entrou no carro e deu partida. Afagou a mão de Cameron que estava sobre
sua perna, causando no homem um endurecimento automático. Cameron o
queria de uma forma diferente da que costumava querer os outros homens
em sua vida. Como era grande e forte, costumava ser cavalgado por rapazes
um pouco menores e para ele estava tudo bem. Mas agora um desejo
secreto e fortíssimo de ser possuído o dominava. E ele torcia para que
Russell quisesse penetrar seu corpo.

Os dois tentavam conter a ânsia daquele desejo e o fogo que queimava entre
a pernas. Mas assim ouviram a vozinha fina de Billy aquela volúpia deu
temporariamente lugar a outro sentimento e os dois puderam relaxar.

Logo que chegou na festa, o alfa cumprimentou algumas pessoas e foi


direto até onde estavam os brinquedos que haviam alugado, como uma
piscina de bolinha e tiro ao alvo, no qual as crianças poderiam brincar
gratuitamente. As prendas recebidas eram simples, mas todas as crianças
pareciam felizes nos colos de seus pais, e os mais antigos membros daquela
alcateia podiam se sentir em paz novamente.

Pedindo licença para Cameron e dizendo que logo voltava, Russell se


afastou assim que viu Abel chegar. Foi recepcionar o amigo, que dessa vez
carregava duas armas no corpo.

"Aqueles canalhas não me pegam dessa vez!", Abel falou a si mesmo, antes
de sair de casa.

As garotas e os garotos mais jovens tinham decorado o lugar com luzes e


bandeirinhas coloridas e além de algodão-doce, pipoca e hot dogs, havia
uma mesa com pratos feitos pelos membros da alcateia. Era como uma festa
bonita de comunidade pequena e o alfa disse algumas palavras de
agradecimento, olhando bem para os rostos dos presentes, tentando
identificar ali algum possível traidor. Cameron segurava Billy nos braços e
se enchia de orgulho do alfa, que também era o homem por quem ele estava
apaixonado. Mal podia acreditar que aquele homem parecia querê-lo.
Suspirava ao olhar para ele, sentia o coração bater forte e rápido.

Cameron não se importava com a pequena diferença de altura entre eles e


torcia para que aquilo não importasse também para Russell. Principalmente
porque ao discursar ali, ou em qualquer outra ocasião, Russell era
grandioso, firme, grandiloquente, exalava poder e autoridade e para muitos
não lhe faltavam centímetros para liderar a alcateia. Mas outros ainda
torciam o nariz para o seu tamanho e o queriam fora dali. Não por isso,
entretanto, mas porque ele era bem diferente do antigo e tirano alfa.

Depois do discurso, Russell foi falar com Abel e o levou até Cameron para
apresentá-los oficialmente. Um pouco intimidado pelo ômega, Cameron
ficou quieto e então o pequeno Billy chamou Russell para brincar com ele
no tiro ao alvo. Antes de ir com o garotinho e seu tio,

Russell chamou Finnegan e pediu para que ele fizesse companhia para
Abel. Saiu sorrindo de lá, deixando o amigo louco de raiva.

— O Finnegan gosta dele. — Russell cochichou para Cameron,


aproveitando para eliminar qualquer cisma.

O rosto de Cameron se iluminou como a lua.

— Oh! O Finn é um ótimo sujeito. Será muito bom para seu amigo.

— Mas o Abel está dificultando as coisas...

— Poxa. — Cameron fez uma carinha triste. — Tomara que ele mude de
ideia, então.

— Tomara, querido. — disse Russell, pegando Billy pela mão e indo com
ele até a mesa de tiro, enquanto seu tio ficava para trás, saboreando o fato
de o alfa tê-lo chamado de "querido".
— Esse garotão quer atirar. Ele pode se sentar aqui? — o alfa perguntou
simpaticamente para a garota da barraca de tiro, colocando Billy sentado
sobre a bancada.

— Claro, alfa! — ela sorriu, entregando uma arma de brinquedo, que


atirava bolinhas.

— Preparado, amigão? — o alfa perguntou a Billy, quando Cameron se


aproximou, suspirando pela forma carinhosa que o alfa tratava seu
sobrinho.

Era tão grande a palpitação em seu peito que Cameron não conseguia falar,
apenas sorria vendo os dois se divertirem. A vida enfim parecia ter
encontrado um tempinho para ser boa com ele, pensou o lobo, quando um
shifter arrogante e mal-intencionado do bando se aproximou.

Sem perceber que era o próprio alfa ali com Billy, ele provocou Cameron
como sempre fazia.

— E aí, bobão? Não vai lamber as botas do alfa hoje? Se você acha que ele
quer alguma coisa com você, está enganado. Ninguém vai querer um
idiota...

— Cala a boca, Payton! — Cameron disse nervoso, contornando o homem


que tinha a sua altura.

— Cam! — Russell o chamou. Sua voz calma mostrava que ele não tinha
ouvido a conversa.

E honestamente Cameron preferia assim, porque no geral ele já tinha se


acostumado com algumas gracinhas, mas ele tinha um pouco vergonha
quando o chamavam daquela forma na frente do alfa.

Mas Cameron era calmo, não gostava de revidar e entrar em confusão,


principalmente quando tinha Billy por perto.

— Você pode ficar aqui com Billy um pouco? — Russell perguntou para
Cameron.
— Claro, alfa. — ele foi, não sem antes ver Payton sair rindo, divertindo-se
às suas custas.

O lobo, porém, nem sequer conseguiu alcançar alguma distância quando


dois dedos cutucaram suas costas.

— Payton. — o alfa disse calmamente. — Eu vou te dar um único aviso. Se


eu ouvir, souber, ou desconfiar que você ofendeu o meu companheiro mais
uma vez, eu te expulso dessa alcateia e antes arrebento a sua cara. Você me
escutou bem?

— Sim, alfa. — o homem se assustou com o tom do alfa e baixou a cabeça.


— Se você tiver algum problema comigo, podemos resolver isso na nossa
forma humana ou de lobo. Só nós dois, sem armas. Você quer me desafiar,
Payton? — a ferocidade no olhar de Russell suplantava seu tom de voz,
tornando desnecessário qualquer grito.

— Não, alfa. Eu estava brincando. Me desculpe.

— Não é a mim que você deve desculpas. É a Cameron. Agora vá até ele e
se desculpe. —

Russell exigiu.

Concordando com a cabeça. O homem foi até a bancada onde Cameron


segurava Billy e fez o que o alfa mandou. Contrariado, mas fez. E depois de
resolvido o problema, Russell se aproximou de Cam e acariciou suas costas,
sem dizer coisa alguma sobre o incidente, apenas perguntando se Billy tinha
acertado o tiro.

— Acertei, tio alfa! Ganhei um boneco.

— Que legal, Billy! Agora é minha vez. Vou ver se consigo ganhar um urso
pro seu tio Cameron. — Russell sorriu para Cam, ganhando um sorriso de
volta. — Será que ele vai gostar daquele ursinho ali?

— Vai, tio alfa! Titio vai! — Billy comemorava batendo as mãos em


palminhas de comemoração animada.
— Então, se eu acertar, nós vamos comer hot dogs. — Russell piscou para
Billy antes de atirar.

Distante dali, Abel resmungava. Não era bem aquilo que ele tinha pensado
quando saiu de casa para emboscar os canalhas que o tinham atacado.

— Você vai ficar me vigiando como um cão de guarda mesmo? — ele


perguntou ironicamente para Finnegan.

— Não estou te vigiando. Estou te protegendo, Abel. E seguindo uma


ordem direta do meu alfa. — Finn respondeu calmamente.

— Eu sempre soube que cães gostam de obedecer. — seu tom cínico e


claramente provocador não afetou os ânimos de Finnegan como ele
gostaria.

— Isso não é incomum. Mas eu só sigo ordens em algumas ocasiões, Abel.


Em outras, eu sei bem como conduzir. Não duvide disso. — o beta
respondeu educadamente, sem se exaltar e sem parecer que havia caído nas
garras da provocação do ômega.

Abel, por sua vez, sentiu o corpo esquentar, permitindo que sua mente
vagasse por terrenos impróprios. O rubor tornou seu rosto róseo e ele
emudeceu.

— Você gostaria de comer alguma coisa enquanto esperamos por algum


sinal? — Finnegan perguntou.

— Não se incomode comigo...

— Claro que eu me incomodo. Quero que você fique confortável. — disse


Finn, olhando profundamente para o ômega, que não soube o que falar.

— Você gosta de hot dog ou de algodão doce? De refrigerante? — o beta


insistia na ideia da comida, porque ele não estava disposto a desistir do
lindo loiro por nada. Não depois de sentir o seu cheiro especial, doce e
açucarado. Não. Não havia uma chance no inferno de Finnegan desistir do
homem. Então de repente uma luz se acendeu na escuridão e Abel
respondeu às suas perguntas com um discreto aceno concordante de cabeça,
indicando que ele aceitaria a comida.

— Então me espere que eu volto em um minuto. — sorriu Finn, saindo em


busca dos hot dogs, mas sem deixar de ficar de olho no ômega.

Levou lanches e refrigerantes para os dois e comeram lado a lado, sentados


em dois bancos, sem conversar. Enquanto comia, Finnegan observava o
ambiente para ver se notava algum olhar atravessado para o urso, mas além
de Payton, que olhava atravessado para todo mundo, ele ainda não tinha
percebido nada.

Não era fácil olhar ao redor quando tinha Abel ao seu lado, fazendo seu
lobo enlouquecer com seu delicioso perfume doce e seu incrível
temperamento difícil. Rhett e seus amigos, que eram os principais suspeitos,
não estavam lá e Finn mal sabia por onde procurar.

— Você quer mais um? — Finn perguntou quando ele terminou de comer.

— Não. Obrigado. — Abel parecia mais calmo, mas estava apenas


resignado por ter sido abandonado pelo amigo.

— Eu já volto. Por favor, não saia daqui. — Finn reforçou.

Normalmente Abel retrucaria, mas o beta conseguia fazer com que suas
palavras não soassem como uma ordem. Ainda assim, seria motivo para ele
reclamar, afinal, ele era um urso forte, que sabia lutar e estava armado. Só
tinha sido pego pelos lobos, porque estava desprevenido e eles em maior
número. Detestava ser tratado como um garotinho indefeso que precisava
de ajuda para atravessar a rua ou de um babador para comer macarrão. Ele
não era uma criança e fez questão de verbalizar isso para Finnegan quando
ele voltou, mas suas feições nervosas suavizaram quando ele viu o lobo
estender para ele um algodão doce cor-de-rosa.

— Você gosta de algodão doce? — Finnegan sorria perguntar ao entregar


para ele.
Abel se sentiu meio amolecido com o gesto. E meio besta por ficar
amolecido com aquela besteira.

— Gosto... — seus olhos brilharam para o lobo pela primeira vez, talvez. —
Obrigado... —

ele falou sem jeito, olhando para a nuvem rosa em sua mão, em seguida
para o sorriso suave no rosto do lobo.

Desajeitadamente, ele pegou um pedaço com os dedos e sorriu quando o


algodão doce afundou. Rapidamente lembrou de sua infância, quando ainda
tinha sua mãe e ela o levava nos parques. Não conseguia recordar da última
vez que tinha comido um daquele.

Olhando sorrateiramente, Finnegan perdeu o ar quando viu os lábios de


Abel se tingirem do rosa do doce. No mesmo instante ele fantasiou com o
sabor que eles deveriam ter naquele momento, que ele daria qualquer coisa
para provar. Engoliu saliva, olhou para outro canto, pediu licença e foi
buscar água, para os dois, porque se Finnegan tentasse engolir outra vez,
sua garganta seca o impediria.

Feliz com o algodão doce e secretamente confortável com a companhia de


Finnegan, Abel esqueceu que estava ali para caçar seus agressores e olhava
a festa com um sorriso ameaçando esticar no rosto.

Entretido com Cameron e Billy, Russell também mal se lembrava do amigo


e o intuito de descobrir os traidores naufragava. Emergia, por outro lado,
uma gostosa proximidade entre os três, na qual Russell não se furtava de
tocar Cameron carinhosamente, vez ou outra, mostrando que aquele não era
um passeio qualquer. E cada toque, a cada olhar, Cameron se desmanchava
de felicidade.

Cameron apoiou seu ursinho nas pernas quando os três comiam hot dogs
com refrigerantes. E embora Russell desse sempre uma olhada para ver
onde estava Abel, não saiu do lado de Cameron. Sempre que via que
Finnegan estava ao redor do amigo, ele ficava tranquilo e aproveitava seu
momento, divertindo-se vendo Billy comer seu terceiro algodão doce.
— Eu vou embora. — Abel avisou a Finnegan depois que bebeu água.

— Não. Espere mais um pouco.

— Isso não vai dar em nada e Russell está mais preocupado com o
companheiro do que em descobrir quem me atacou. — Abel levantou,
mostrando-se meio bravo.

— Eles são companheiros? — Finn sorriu.

— Parece que sim.

— Que coisa boa. Cameron merece alguém que seja bom pra ele. — o beta
falou como se para si mesmo, já que o urso parecia não se importar com
nada sobre ele.

— Eu já vou. — Abel insistiu.

— Eu acompanho você até seu carro.

— Não precisa. — o urso rosnou.

— Por favor. Me deixe te acompanhar. — Finn pediu com jeito e a forma


que ele olhava para Abel era capaz de desmontar suas resistências,
deixando-o um pouco nervoso por isso.

Abel não disse nada, apenas foi andando.

— Você não vai se despedir de Russell?

— Não. Ele não se importa comigo.

— Eu me importo com você. — Finnegan segurou sua mão, olhou em seus


olhos azuis e ainda que ele estivesse com o cenho franzido como sempre, o
beta sentiu uma imensa vontade de pegá-lo nos braços e beijar sua boca
com calma até conhecer cada canto dela.

Mas Abel tratou de se soltar.


— Aposto que Russell também se importa.

— Ele não se importa. — ele se virou novamente e então Finnegan fez o


que nunca fazia, o que não deveria fazer, e puxou Abel pela mão, levando-o
até seu corpo. Sentiu-o quente, o perfume o envolvendo como uma nuvem
doce.

— Até quando você vai resistir, meu companheiro? — Finnegan perguntou.

— Me solta agora! — Abel se soltou, verdadeiramente irritado. — Nunca


mais na sua vida toque em mim! Entendeu? Eu não te dei autorização!

Dizendo isso raivosamente, Finn o viu entrar no carro e ir embora. Sentiu o


rosto quente de vergonha, porque ele não era de fazer aquelas coisas.
Nunca! Ele jamais queria que o ômega

tivesse se sentido daquela maneira. Finnegan não era o tipo de homem que
fazia as coisas à força, mas seu lobo uivava pelo homem, exigindo-o,
gritando que ele era seu.

Ele não tinha sido muito invasivo, mas sabia, conscientemente, que não
podia sair abraçando as pessoas. O que tinha dado em sua cabeça?

Finn não conseguia raciocinar direito e então resolveu que iria embora. Só
avisaria o alfa que tinha ido com Abel até o carro e que estava tudo bem.
Foi o que fez. Em seguida, foi para a sua casa, triste e envergonhado, por ter
magoado e ofendido Abel e provavelmente ter colocado tudo a perder com
o homem que ele mais desejou em sua vida. Afastando ainda mais o seu
companheiro de si.

Capítulo 09

Eu contava os minutos para estar sozinho com ele. Não que eu não gostasse
do Billy, porque o garotinho era adorável, mas até o momento, eu tinha tido
pouco tempo a sós com Cameron e eu estava louco para beijar a boca dele
outra vez. Se Billy não estivesse junto, eu certamente o teria beijado na
festa, mas eu já tinha percebido que ele não gostava de ter intimidade perto
do garoto, então esperei até levar os dois para a casa e para a minha sorte,
quando chegamos, Billy já estava dormindo.

Desci do carro, abri a porta de trás e ele pegou Billy que não acordou.

— Posso te esperar aqui? — perguntei.

— Você não quer entrar?

— Quero, claro. — eu sorri, fechei o carro e o acompanhei, levando seu


ursinho e os brinquedos que Billy tinha ganhado na festa.

A casa era mesmo pequena e esperei na sala, o vendo entrar em uma das
portas e logo voltar. Assim que ele voltou, eu o puxei pra mim, beijando sua
boca com a ansiedade que eu tinha acumulado a noite inteira e por todos
aqueles dias.

Quando percebi estávamos deitados no sofá, entrelaçados. No único,


pequeno e um tanto duro sofá da casa. Tirando o fato de eu me sentir mal
por ele não ter uma casa confortável para morar, aquilo não me
incomodava. Sua boca e seu corpo eram completamente confortáveis pra
mim.

— Você não se importa que eu seja mais baixo? — eu perguntei, revelando


os traços ainda existentes da minha tola insegurança.

— Não... você se importa que eu seja um pouco burro?

Aquilo cortou meu coração. Me entupiu de raiva.

— Não diga isso! Você não é burro...

— Claro que eu sou... — ele virou o rosto, envergonhado.

— Você não é, Cam. Você é a pessoa mais incrível que eu já conheci e eu


gosto de tudo em você. — eu falei. E era verdade.

— Russell... — ele me abraçou como um garotinho, se envolvendo em meu


pescoço com aquele tamanhão. Ele era simplesmente adorável de uma
forma única e saber que ele pensava aquelas coisas de si mesmo me fez ter
vontade de dizer para ele a todo instante como ele era maravilhoso.

Mas logo ele estava me beijando por toda parte e eu tirava sua camisa.

— Não podemos fazer isso aqui, não é? — eu perguntei.

— Podemos ir pro meu quarto se você quiser.

— Eu quero... — eu sorri lascivamente.

— Eu não trago ninguém para dormir aqui por causa do Billy. — ele dizia,
enquanto me levava pro quarto. — A senhora Moore disse que não é bom
trazer homens em casa com criança.

— A senhora Moore está certa. — eu parei. — Vamos ficar no sofá e depois


a gente vê como fazer isso... — o levei de volta.

— Como você fazia antes? — perguntei assim que voltamos a deitar.

— Ah... em carro, ou até mesmo... — ele pareceu envergonhado.

— Pode falar... eu já fiz em lugares estranhos também...

— Na floresta, algumas vezes...

— Hum... acho que podemos ir pro meu carro um dia, então... mas eu
queria muito estar com você em uma cama. — falo e beijo sua testa. Ele
fecha os olhos e sorri.

— Eu tinha um namorado quando minha irmã se foi... mas... ninguém gosta


de um homem com uma criança pra cuidar. Então ele me deixou... não que
você seja meu namorado... mas eu não queria que você me deixasse por
isso.

— Mas que coisa horrível! Eu sinto muito, meu anjo... e eu não penso em te
deixar por isso ou por coisa alguma. — encaixei nossos lábios assim que
terminei de falar. — Aliás, ainda bem
que o idiota do seu namorado se foi, porque eu ia odiar te conhecer e saber
que você já tinha alguém... — brinco e ele me beija, um beijo profundo e
apaixonado.

Pressiona o corpo grande contra o meu e eu sinto sua ereção crescente.


Passo a brincar com minha língua em sua boca e meu corpo o exige, meu
lobo e tudo em mim o deseja, então eu paro. Ele aproveita o desenlace para
tirar minha blusa e naquele momento em percebo que perderei a cabeça.

Sua boca percorre meu pescoço, me lambe e me suga. Suas mãos nas
minhas costas acariciam minha pele, me fazendo arrepiar por completo.
Sinto seus dedos desenharem meus músculos e levo meus lábios à sua
orelha, onde digo que gosto do que ele está fazendo. Então sinto seu corpo
descer e seus lábios alcançam meu peito. Ele chupa, lambe como um filhote
de lobo cuidando dos próprios pelinhos. Mas os pelos que ele cuida é minha
pele, é o meu corpo humano, que estremece ao toque de sua língua.

Então nossos olhos se encontram. Ele com a boca a tomar meu mamilo, eu
louco de desejo a admirar. Sua boca me solta ao mesmo tempo em que sua
mão escorrega alcançando meus testículos.

— Você sente dor aqui como eu? — ele sussurra a pergunta, porque os
sente inchados.

— Eu consigo aguentar... — respondo com um sorriso.

— Me deixa tirar sua dor... — ele pede.

— Eu deixo o que você quiser, Cam... — murmuro quando ele alcança meu
pau com a mão e minha boca como a dele ao mesmo tempo.

Sinto sua mão apertar em volta, como se quisesse sentir, conhecer, antes de
brincar. Dos seus lábios saem um gemido ao me sentir pulsar forte, de modo
que logo sua língua me invade a boca e sua mão se movimenta no meu
pênis duro. Duro pra ele. E ele sabe bem o que fazer comigo, com pau, com
corpo.
Com movimentos suaves e me enchendo de beijos, ele me faz gozar e sem
pensar duas vezes, eu coloco o seu pênis para fora e desço até ele, deixando
beijos pelo percurso. Ele se ajeita no sofá, eu vou por cima. Começo por
baixo, massageando e o sentindo carregado, cheio de sêmen que também
quer se libertar. Passo a língua em suas bolas com poucos pelos, chupo
devagar, o sinto gemer baixo, tremendo, então é a vez de seu pau. Minha
língua o deixa todo molhado antes de começar a chupar. O cheiro da luxúria
me inebria e eu quero entrar em seu corpo. O desejo faz meu pau se encher
novamente, mas minha boca trabalha na glande, depois desce lentamente
em movimentos apertados e cadenciados, ansiando por tomar o seu gozo,
que logo explode pra mim, me inundando a garganta. Saboreio seu líquido e
sinto o sabor do seu prazer, que é o único que eu quero sentir pro resto da
vida. Subo e o beijo. Controlo minha vontade de invadir seu corpo e
desconto em beijos meu desejo sedento de foder aquele homem até nossos
corpos caírem exaustos.

Ficamos apenas beijando e depois o enrolo em mim. Conversamos um


pouco e quanto mais eu descobria sobre ele, mais rápido eu queria aquele
pescoço e o levar pra minha casa de vez.

Resolvi que iria com calma, para não o deixar assustado. Antes eu precisava
dizer a ele tudo o que eu queria. Que eu o queria pra mim.

Ter ele deitado com a cabeça no meu peito me encheu de um sentimento tão
bom, que eu sentia que poderia passar a noite toda com ele naquele sofá
duro. No entanto, eu me despedi.

Não poderia aguentar outra sessão de beijos. Meu pênis não desinchava e
toda vez que a boca dele me tocava, eu me sentia vazar. Com certeza eu
molharia minhas calças de tanto tesão, mesmo que já tivesse gozado.

Me despedi, prometendo voltar, porque no dia seguinte ele não iria à minha
casa. Tínhamos combinado que ele teria folga da ajuda que me dava lá
também. Ele não queria, mas ele precisava descansar e ficar com Billy. Eu,
porém, precisava vê-lo, então prometi que voltaria e ele pareceu feliz. Me
levou até o carro, onde nos beijamos mais um pouco e nos despedimos.

— Eu gostei muito, Russell. — ele me falou, meio tímido.


— Eu adorei, Cam. — eu sorri pra ele de dentro do carro e fui embora,
depois de ele se debruçar e me dar outro beijo.

Mesmo sem conseguir fazer com ele tudo o que eu queria e precisava,
mesmo sem falar sobre minha necessidade de marcá-lo como meu, eu fui
embora satisfeito. Sorrindo e flutuando.

Tudo parecia ter dado certo. A festa, meu passeio com Cam e Billy, aquela
brincadeira na sua casa.

Eu não tinha conseguido prestar atenção em Abel e aquela era uma falha
minha que eu precisaria consertar. Mas isso ficaria para depois. No
momento eu só queria aproveitar a delícia que era a sensação de ter estado
com Cameron, com o meu companheiro.

***

Flutuando também estava Cameron depois daquela noite com Russell.


Esperou o carro sumir na rua para voltar para a casa, com um sorriso
escaldante a brilhar na face. Mas logo gritos raivosos fizeram o sorriso
desaparecer e o lobo de Cameron ganiu, alertando o perigo.

De longe, viu a luz da casa de Cody acesa e sabia que era de lá que vinham
os gritos.

Lembrou-se que não o viu na festa e antes Cody era um rapaz alegre, que
gostava de festejar.

Agora gritos pedindo ajuda saíam da casa dele.

Os gritos eram tão altos, implorando para que alguém parasse, que até
mesmo a senhora Moore acordou, saindo pela porta, ajeitando sua roupa de
dormir sobre o peito. Cameron olhou para ela sem saber o que dizer quando
passou correndo. Ainda a ouviu falar:

— Corra, meu filho. Ajude-o...

Cameron correu. Esmurrou a porta de Cody, chamando por ele e os gritos


cessaram. Mas ele ouviu o choro e por isso empurrou seu corpo forte contra
a porta até que a fechadura cedeu.

Vendo Cody acuado no chão e Rhett por cima dele, dando-lhe chutes,
Cameron voou no homem, arrancando-lhe de lá. De repente, Rhett se
transformou e Cameron fez o mesmo, resultando numa luta de lobos dentro
da sala, quebrando móveis e derrubando objetos. Com uma ferocidade
desconhecida, o lobo negro de Cameron avançava no outro com seus dentes
afiados, rasgando sua pele em várias partes. Rhett tentava fugir, mas
Cameron não permitia, pulava sobre ele novamente, mordendo-o por todo
lado, enquanto Cody permanecia acuado no canto, em estado de choque.

Cansado de lutar com o lobo maior e mais forte, Rhett aproveitou a porta
aberta para fugir.

Voltando à forma humana, Cameron foi até Cody, que chorava e dizia
coisas incompreensíveis.

— Venha, amigo. Agora está tudo bem... — Cameron estendeu a mão.

— Ele vai voltar... ele vai voltar... — apavorado e todo ferido, Cody se
encolhia.

— Vem comigo. Vou te levar daqui.

Cameron vestiu sua roupa que estava toda pisoteada da luta e o levou no
colo até sua casa.

A senhora Moore preparou um chá para ele, e enquanto ele tomava,


Cameron discutia com ela o que fazer.

— Ele não pode ficar aqui, Cam. Aquele monstro vai voltar. — disse a
senhora Moore.

— Ele vai mesmo...

— Leve-o até o alfa, querido. Se você deixar o garoto aqui vai atrair Rhett
para a sua casa.

E ele pode fazer mal ao Billy. — a mulher aconselhou.


— A senhora está certa.

— Leve o meu carro. Mas leve Cody ainda hoje. — ela falou.

Assim que o ômega se acalmou, Cameron pegou o carro da senhora Moore


e o levou até o alfa. Devido ao susto e ao medo, ele não conseguiu se
transformar, de modo que quando chegaram lá, Russell se assustou com o
estado do ômega.

— Quem fez isso com ele?! — Russell quis saber.

— Rhett.

Então Cody explicou sobre as agressões e ameaças e sobre como as coisas


tinham piorado depois da morte do alfa. Contou que ele vinha tentando
terminar a relação, mas que Rhett não deixava.

— Saiba que agora você está seguro e que ele não vai mais tocar em você.
— Russell falou docemente, mas com um traço de raiva no fundo da voz.

— Se eu voltar pra minha casa ele vai me achar, alfa... — os olhinhos


negros do ômega se estreitaram e umedeceram.

— Então eu vou arrumar um lugar seguro pra você ficar até que eu consiga
ter esse Rhett longe daqui pra sempre. Fique tranquilo, querido. Agora me
conte tudo o que você sabe sobre ele.

Cameron voltou para a casa depois de se despedir do ômega e do alfa, pois


precisava deixar a senhora Moore ir dormir, sendo que ela estava em sua
casa para ficar de olho em Billy.

— Você fez bem em trazê-lo até mim, Cam. Agora tome cuidado que
aquele lobo pode estar rondando sua casa.

— Eu vou tomar, Rus. — Cameron sorriu ao chamá-lo daquela forma,


ganhando um beijo nos lábios.

Naquela mesma noite, Russell tirou Cody da alcateia, levando-o para a sua
casa na fazenda.
Assim que o instalou, foi até a casa de seu pai e avisou o que tinha
acontecido e informou que no dia seguinte ele iria pessoalmente falar com o
alfa, para pedir que deixasse o ômega lobo passar uns dias em seu território.

Beijou o pai e a mãe, despediu-se e voltou para a alcateia, com a certeza,


depois do que tinha ouvido do pobre Cody, de que Rhett estava por trás do
ataque a Abel. A alcateia tinha um inimigo. E ele estava à solta.

***

No dia seguinte à festa, Finn foi até a casa do alfa e Russell se lembra de
devolver as roupas que estavam com Abel, fazendo o beta se lembrar da
besteira que tinha feito na noite anterior.

— Ele não precisava me devolver, alfa. — Finnegan falou constrangido.

— O Abel é assim... — Russell sorriu.

Ele tinha muitas coisas para falar com Finnegan sobre os acontecimentos da
noite anterior, mas o beta estava aflito e falou primeiro.

— Alfa, eu preciso te dizer uma coisa... pedir desculpa... — Finnegan


estava com uma cara péssima.

— Fala...

— Eu tenho quase certeza que seu amigo...

— Abel... — o alfa sorriu.

— Sim. Eu acho que ele é meu companheiro e...

— Que maravilha, Finnegan! Mas você vai ter dificuldade, meu amigo. —
falou Russell, dando um tapinha em seu ombro e sentando à sua frente.

— Então... mas ontem, quando eu o estava levando até o carro... eu não sei
o que me deu, alfa, mas eu o abracei. Eu não devia ter feito isso. Foi sem
autorização dele... eu estou arrependido, queria me desculpar com você e
com ele.
Russell parou de rir.

— Você o agarrou e beijou à força? — o sangue do alfa esquentou.

— Não! Eu só o abracei, num impulso. Soltei assim que ele pediu. Eu não o
abracei para beijá-lo ou algo do tipo. Foi uma coisa... eu me senti muito
protetor. Não soube reagir.

— Hum... você certamente não devia ter feito isso, Finnegan. Mas eu sei
como são fortes nossos impulsos protetores diante de nossos companheiros.
Mas o Abel teve uma decepção amorosa muito grande e as coisas são mais
complicadas pra ele. Essa sua atitude pode fazer com que ele se afaste ainda
mais de você.

– Eu preciso me desculpar com ele, alfa. Queria sua autorização para ir até
a fazenda onde ele mora.

— Eu te dou autorização, mas saiba que ele pode te colocar pra correr de lá
debaixo de bala. — ele riu. — E se eu souber que você tentou alguma coisa
contra a vontade dele outra vez, Finnegan, eu te expulso do meu bando.

— Não! Isso nunca mais vai acontecer.

Dava pra ver que Finnegan não era esse tipo de pessoa e um abraço não era
algo tão grave, principalmente perto do que Russell soube que acontecia
com Cody. De qualquer modo, não era excessivo salientar que contato
físico sem consentimento além de crime não seria tolerado.

E aproveitando a deixa, Russell contou sobre Rhett e Cody, indicando suas


suspeitas, que já eram suspeitas também do beta. De forma que, no final da
conversa, Russell autorizou que Finn fosse até o bando dos ursos tentar
resolver seu problema, dizendo que depois iria até lá falar com alfa e mais
tarde os dois se reuniriam outra vez para traçar os planos para proteger a
alcateia e banir Rhett para sempre.

Assim, enquanto Russell tomava o café da manhã, Finn dirigia para a


fazenda onde Abel vivia, a fim de pedir desculpas pelo que tinha feito e ver
se conseguia alguma chance de se aproximar do ômega bravo.
Capítulo 10

Mesmo estando frio, Finnegan precisou ligar o ar condicionado do carro por


algum tempo para que não suasse. Com o nervosismo o consumindo, ele
chegou à casa de Abel. Se identificou na entrada da fazenda, dizendo que
tinha ido a pedido de Russell e o deixaram passar.

Antes de sair do carro, Abel sentiu seu cheiro e foi irritado em direção à
porta. No curto espaço de tempo, ele tentava negar para si mesmo que o
braço que o lobo tinha dado nele não o havia afetado, assim como vinha
tentando negar que o homem mexia com ele.

— O que você quer aqui?! — Abel gritou ao abrir a porta, sem deixar que
Finnegan desse outro passo.

Os dois se olharam a uma distância curta. Silenciaram. Corações bateram


acelerados.

Finnegan notou como os olhos do ômega ficavam ainda mais adoráveis à


luz do dia e como seus cabelos reluziam com o sol. Abel tinha uma beleza
de tirar o fôlego, mas para Finnegan aquilo representava ainda mais.
Representava o reflexo de tudo o que ele queria. Da completude de sua
vida, lá à sua frente, vestindo um short verde-água e uma camiseta branca
velha.

— Eu vim me desculpar pelo meu comportamento de ontem. — disse o


lobo.

— Vá embora. — Abel ameaçou se virar, jogando um olhar de desprezo.

— Abel. — Finnegan soou como um pedido. — Por favor, me desculpa. Eu


não devia ter te abraçado sem seu consentimento...

— Claro que não devia!

— Eu sinto muito... eu poderia usar alguma desculpa, dizer que eu me


descontrolei, porque eu fico diferente perto de você, porque você causa em
mim coisas desconhecidas. Coisas que eu não sei lidar direito, porque eu
nunca senti antes. Mas eu não quero usar desculpas. Mesmo que elas sejam
verdadeiras. Eu sou um homem, Abel. E eu não devia ter te abraçado sem
você permitir. Eu reconheço o meu erro. Estou arrependido e gostaria muito
que você me desculpasse e me deixasse te mostrar que não sou nenhum
descontrolado.

Parado, Abel tremia ao som daquelas palavras. Seu coração balançava, mas
ele era turrão e tinha medo de deixar alguém se aproximar.

— Quero que você vá embora e nunca mais chegue perto de mim


novamente... — sua voz era vacilante, mas ele não pretendia voltar atrás.

— Me dá uma chance... eu esperei tanto você aparecer, companheiro. Você


é tão... bem-vindo... — ele enfim confessava que sabia que eram
companheiros.

— Eu não quero um companheiro. Ainda mais um cachorro... por favor, vá


embora. — seu corpo trepidava ao dizer.

— Eu sou um lobo, Abel. — ele disse triste, mas com firmeza.

Finnegan respirou fundo. Ele não podia dar mais nenhum passo adiante.
Não podia abraçá-

lo e tentar mostrar com carinhos que ele estava apaixonado pelo urso arisco,
porque Abel não queria o seu carinho, não queria o seu calor.

Olhando-o profundamente, emocionado, Finnegan apenas disse:

— Sinto muito por ontem... — ele falou em tom de lamento. — Eu nunca


faria nada para te magoar.

Com essas últimas palavras, Finnegan se virou e foi embora, carregando


consigo seu coração em pedaços. Ele tinha oficialmente sido rejeitado pelo
companheiro. E não parecia haver no mundo algo que pudesse mudar
aquela situação.

***
Enquanto dirigia de volta para a sua casa, Russell ia para a fazenda de seu
pai ver como estava Cody.

Bateu na porta quando chegou. Mesmo que a casa fosse sua, ele queria
manter a privacidade do rapaz. Levava consigo algumas sacolas de mercado
com compras que ele tinha acabado de fazer, para que o garoto tivesse o que
comer nos dias em que ficasse lá.

Assustado, Cody perguntou quem era, mesmo sentindo o cheiro do lobo.

— Sou eu, Cody, Russell. Pode abrir. Estou sozinho. — disse o alfa.

Com cuidado, o ômega abriu a porta e ajudou o alfa com as sacolas,


dizendo que ele não precisava se preocupar.

— Como você está? — Russell perguntou.

— Melhor. Me transformei, me sinto melhor, alfa. Obrigado. — ele


agradeceu meio encolhido, mas se via ainda as marcas que a transformação
não pôde curar em algumas partes de seu corpo e aquilo enchia Russell de
ódio.

— Eu ainda vou falar com o alfa dos ursos para que você fique aqui, mas
tenho certeza de que ele não vai se importar. E você pode ficar o tempo que
precisar. Depois peço para o Cameron juntar suas coisas e te trago aqui.

— Mas, alfa... eu não tenho como me sustentar. Vou perder meu emprego.

— Não se preocupe com isso, Cody. Por enquanto o mais importante é sua
segurança. Você trabalha perto das casas da alcateia, não trabalha?

— Sim. Bem perto da sede.

— Então você não pode voltar pra lá. Eu vou te mostrar a fazenda, te
apresentar pros meus pais e te familiarizar com as coisas. Aqui você não
precisa ter medo, você está seguro. Lobos não vêm para esses lados. Rhett
não tem como te pegar aqui. E eu vou dar um jeito nisso para que você
possa voltar para a sua casa.
— Obrigado, alfa. Mas... se eu puder trabalhar em alguma coisa... não gosto
de ficar desocupado. — falou o ômega.

— Vou ver se alguém nas redondezas tem algum serviço pra você. Mas
primeiro vou falar com o alfa e depois volto para te apresentar aos meus
pais, enquanto isso você pode ir guardando as compras e fazendo alguma
coisa para comer.

— Muito obrigado, alfa. Eu nem sei como te agradecer.

— Não há por que. É minha obrigação como seu alfa te manter seguro. Eu
só sinto por não ter sabido antes do que estava acontecendo com você.

Dizendo isso, o alfa recebeu um sorriso. O primeiro que Cody dava em


dias. Em tantos dias que ele nem podia se lembrar.

Trancou a porta por dentro e foi guardar as compras. Sentia que aquela casa
era muito confortável, parecia demais para ele, mais do que ele merecia.
Mas dentro do peito, Cody ainda não se sentia totalmente seguro. O medo
ainda o rondava e ele parecia sentir o bafo quente e desagradável do lobo de
Rhett em seu pescoço.

Chegando à casa do alfa, Russell foi logo recebido e levado ao escritório.


Desmond ofereceu uma bebida e Russell aceitou um chá, que parecia cair
bem com o clima frio que fazia e os dois começaram a conversar.

— Então, alfa, como está indo sua alcateia. — Desmond sorriu, cruzando as
pernas e se ajeitando em sua cadeira marrom e preta, num estilo antigo, mas
bem conservada. O tom solidário do urso alfa mostrava que ele estava feliz
com a visita, bem como o fato de o filho de seu beta ter se tornado alfa da
alcateia próxima e Russell lamentou não ter ido visitar Desmond antes.

Gostava do cara. Conhecia-o desde sempre e tudo o que tinha em mente de


como ser um bom alfa vinha dele e de seu pai, Kirk, que lideravam os ursos
com firmeza e bondade. Desmond parecia agora um pouco mais velho.
Ainda que Russell o conhecesse há tempos, e mesmo no meio de um bando
que ficava entre fazendas, o cara se destacava com o visual de caubói. O
chapéu em cima da mesa, sempre acompanhava Desmond aonde ele ia. Não
importava se de dia ou à noite. Não importava o clima. E sempre o tirava
em ambientes internos.

— Ah, alfa. É mais difícil do que eu imaginava... — respondeu Russell.

— Não é fácil mesmo, Russell, mas tenho certeza de que fará um bom
trabalho.

— Obrigado, alfa. É justamente por isso que estou aqui. — o lobo falou,
explicando para o urso a questão que envolvia Cody e seu namorado
violento.

— Isso é horrível. — Desmond estreitou os olhos de raiva. — Mas é claro


que ele pode ficar.

Vou pedir, inclusive, para que reforcem a segurança na região da fazenda de


seu pai e vou avisar a todos os executores que o lobo ômega é nosso
convidado.

— Muito obrigado, Desmond. Assim que eu conseguir encontrar o cara eu


venho levá-lo para a casa de volta. Porque o coitado não pode sequer voltar
ao trabalho por causa do maldito agressor.

— Podemos arrumar algo para ele aqui, se ele quiser. Se eu não me engano,
a Tracy estava precisando de alguém na lanchonete, posso falar com ela.

— Seria muito bom, Desmond.

— E lá você pode ter certeza de que ninguém mexerá com ele.

Russell saiu de lá aliviado, com o aval do alfa e com a possibilidade de


emprego para Cody.

Um problema a menos na sua frente e ele se sentia aliviado em saber que o


ômega ficaria seguro. O lobo sabia que se Desmond falasse com Tracy, ela
contrataria o ômega, porque poucos sabiam, mas Desmond era sócio de
Tracy na lanchonete. Foi ele quem a salvou da falência em uma época
difícil e sua porcentagem era baixa perto do que ele poderia tirar ali. Tracy
o tinha como um salvador e embora Desmond fosse pouco ao lugar, apesar
de adorar os hambúrgueres preparados por Glenn, eles eram bons e velhos
amigos. De modo que Tracy não recusaria um pedido do alfa. Ainda mais
estando ela precisando de alguém para atender as mesas.

Retornando à fazenda do pai com boas notícias, Russell levou o assustado


Cody para conhecer sua família e a fazenda e só depois de ter aquilo
resolvido, ele retornou à alcateia. Já estava no fim da tarde quando ele se
reuniu com Finnegan para traçar o plano de busca de Rhett, que se iniciou
naquela mesma noite.

Foi o próprio beta, que precisava ocupar a mente depois da rejeição que
levara, que conduziu as buscas no primeiro dia. Russell iria no dia seguinte,
de modo que ele tinha aquela noite livre para estar com Cameron e por mais
preocupações que ele tivesse, sempre haveria espaço para que ele quisesse
estar com o seu adorável companheiro.

***

Tomei banho e fui até a casa dele. Acabava de anoitecer e eu já tinha em


mente o que fazer.

Só torcia para que ele aceitasse. Bati na porta e ele me atendeu rápido.
Cheirava como se tivesse acabado de tomar banho, mas seu perfume
natural, tão masculino e ao mesmo tempo tão sutil, estava ainda presente.
Porque não havia coisa no mundo que pudesse anular aquele cheiro pra
mim.

— Oi. Tudo bem? — sorrio ao perguntar.

— Tudo. Entre... — ele sorria, me dando espaço.

— Não... quero saber se você e o Billy não querem ir jantar comigo.

— Ebaa! — Billy aparece correndo e abraça minhas pernas. O pego no colo


e pergunto:

— Você gosta de pizza, garotão?


— Eu amo pizza! — ele me envolve com seus pequenos braços.

— E você, titio, gosta de pizza? — pergunto a Cameron.

— Eu também amo.

— Então vamos?

— Vamos. — o seu sorriso iluminou a noite. — Só vou pegar nossos


casacos.

Levei os dois a uma pequena pizzaria da cidade, que ficava mais perto do
bando dos ursos que da região onde viviam as pessoas da alcateia. Era um
lugar antigo, que ficava meio afastado do centro e que eu costumava ir
muito com meus pais quando era pequeno. Não me foi dada a oportunidade
de viver com meus pais biológicos, mas os que me adotaram me deram a
melhor vida possível. E a melhor educação que eu poderia ter. Coisas
simples, como jantar em uma pizzaria de subúrbio, fizeram parte da minha
infância e aparentemente muitas dessas coisas o pequeno Billy não podia
ter, porque seu tio além de ganhar pouco, tinha pouco tempo para estar com
ele, pelo que eu sabia.

Acredito que nem o próprio Cameron pôde ter em sua infância coisas bobas
e normais que muita criança tem e que a nenhuma deveriam ser negadas,
mas que a tantas eram. Eu me via um pouco no pequeno Billy, assim como
me via em Cameron. Vítimas da crueldade de shifters maus e egoístas e por
isso eu pensava, eu queria, que, no que dependesse de mim, mais nenhuma
criança daquela alcateia cresceria sem os pais. E as que não tinham, eu
queria ajudar.

Mas no caso de Billy, eu gostava mesmo, e estava totalmente louco pelo seu
tio.

Eu queria ser pra eles o que eles não tiveram, assim como eu queria que
eles fossem para mim o que eu não tinha. Porque eles eram o que faltava na
minha vida e ali, sentado com os dois, divertindo-se com uma simples pizza
de queijo, eu vislumbrava o meu futuro, eu me sentia completo.
Quase completo. Porque eu ainda precisava torná-lo meu. Dizer a ele que
ele me pertencia e que eu o queria na minha vida pra sempre. Queria os dois
na minha vida. Assim, o chamei para dormir na minha casa pela primeira
vez. Com o Billy junto, que ficaria no quarto de hóspedes.

— Eu sei que você não gosta de levar ninguém à sua casa, mas o que você
acha de passar a noite na minha? Vocês já dormiram na fazenda, sabem que
eu sou um homem comportado. —

eu ri do meu próprio e infame gracejo.

— Com o Billy? — ele cochichou.

— Claro. Tem um quarto de hóspedes. Ele pode ficar lá. E você fica
comigo. — falei bem baixo, olhando rapidamente para ele. — Pode ficar
com o Billy também, mas eu preferia que...

— Quero ficar com você. — ele me interrompeu, me fazendo sorrir.

Assim que chegamos, Billy quis ver tevê, ficamos os três na sala e eu me
sentei ao lado dele, entrelacei nossas mãos e meu corpo já implorava por
ele. Meu lobo queria sair e o agarrar. Por sorte, Billy dormiu logo. Coloquei
uma coberta sobre ele e Cameron achou melhor deixar o sobrinho na sala
mesmo, com a tevê ligada, com o volume bem baixo.

Então o levei para o quarto e fechei a porta. Eu sabia que poderíamos ser
interrompidos pelo garoto, caso ele acordasse, mas eu estava preparado. O
importante era estar com Cam ali junto comigo.

Tentei não beijar sua boca com tanta força, porque meus dentes já
ameaçavam querer crescer. Deitamos na cama e não demorou para que o
quarto esquentasse e eu me tornasse um apaixonado literalmente confesso.

— Eu estou tão louco por você, Cam... — sussurro, indo por cima dele.

Ele geme ao toque dos meus lábios, deixa que eu o invada e depois me
abraça, dizendo em meu ouvido que quer ser meu. Ofego olhando para ele.
Preciso da confirmação de que entendi certo.
— Você já fez assim?

— Não... mas eu quero sentir você em mim... — ele confirma e eu beijo sua
boca.

Entre beijos quentes eu tiro sua roupa, beijando sua pele despida, seus
pelos, seu pau.

Chupo como da outra vez, ouvindo seus gemidos baixíssimos e então abro
bem suas pernas e passo minha língua em seu ânus. Sinto que ele se contrai
e geme, arfa, pede por mais.

Correspondo aos seus pedidos e levanto de leve suas pernas, expondo sua
fenda, chupo e lambo por mais tempo, sentindo o cheiro da excitação que
escapa pelo seu pênis. Levo minha língua até a cabeça, lambuzada de tesão
e enquanto o abocanho, entro com um dedo em seu ânus lambido. Ele geme
mais alto. Solto seu pau e faço "shh", para que ele não acorde Billy. Não
queria ter que parar. Mas ele volta a gemer e chamar meu nome.

— Rus... — ele cantarola ao sentir meu outro dedo entrar.

Entro e saio, massageio, abro, preparo aquela entrada pro meu pau que já
não aguenta de ansiedade. Vou até sua boca com a minha e o beijando, fodo
com os dedos. Sinto seus lábios dançarem nos meus, gemendo meu nome e
é delicioso. Sua língua brincando na minha, seus músculos me apertando
dentro dele.

Como eu estava perto do meu limite, fui buscar o lubrificante e avisei o que
faria.

— Tem certeza que você quer isso, Cam?

— Tenho... por favor, Rus...

Ele se abriu bem para mim.

— Você é um lobo muito bonzinho... — sussurro em sua orelha. — Gosto


que se abra pra mim...
Ele geme a qualquer palavra minha e eu enlouqueço a qualquer gemido
dele. Começo a entrar, olhando em seus olhos, preciso ver se ele vai
aguentar. Ele os fecha, arqueia de leve o corpo, abre mais as pernas, mas em
seu rosto um pequeno sinal de dor. Eu paro.

— Não para. — ele me pede com o olhar doce.

Eu não posso mais aguentar. Beijo sua boca, enquanto entro em seu corpo
muito lentamente, espero que seus músculos se acostumem a mim e só
depois de muitos beijos começo a me mover. E quando alcanço um bom
ritmo, olho para os olhos dele e é como se eu fosse explodir de amor. Meus
dentes se alongam, meu lobo implora por ele. Meu coração e meu corpo o
desejam na mesma proporção. Então eu me desnudo a alma, eu me declaro.

— Eu queria tanto isso, Cam. Queria tanto estar dentro de você, meu
companheiro.

— Oh, Russell... — ele abre bem os olhos, abre ainda mais as pernas para
me receber bem fundo. — Eu sou seu? Diga que eu sou seu... — ele pede
em gemidos.

— Você é meu, bebê... você é meu companheiro... — meu corpo não para,
entra e sai, enquanto sua boca me beija e ele se aperta em mim. Continuo
dizendo que ele é meu, que é meu companheiro e quando falo que nunca
vou deixá-lo, sinto seu ânus apertar meu pênis, ele goza. Goza pra mim.

Vejo seu corpo ir se soltando aos poucos, admiro o sorriso de satisfação que
se abre em seu rosto e vendo aquela imagem mais linda, do meu
companheiro saciado, eu me derramo dentro dele, declarando mais uma
vez, que ele é meu, estreitando nosso vínculo, aumentando nossa conexão.

Desabo sobre aquele corpo maior e ele envolve as pernas em torno de mim,
me abraçando com elas. Sorrio e deixo um beijo em sua boca. Deitados, é
como fôssemos do mesmo tamanho.

Ele parece menor, mais doce. Escorrego para o lado e o levo para o meu
corpo, oferecendo abrigo, ao passo que acaricio seus cabelos bagunçados.
— Isso foi maravilhoso... — ele diz, atracado em meu corpo.

— Foi perfeito, companheiro.

— Eu sou mesmo seu companheiro? — ele levanta o rosto e me pergunta.

— Você não acha que é?

— Acho... mas... eu não sabia se você ia me querer como... eu não sei...

— Por favor. Não termine. — silencio sua boca com o dedo. — Eu não
tenho motivo para não querer você, Cam. Eu quero. Quero muito.

Sorrindo, ele me beija. Volta a encostar a cabeça em meu peito e sinto uma
ou duas lágrimas escorrerem nele. Me emociono, mas não digo nada.
Apenas aproveito para sentir como é ter meu companheiro nos braços e na
minha cama pela primeira vez. Satisfeito e emocionado.

Emocionado comigo. Por mim. Por nós.

Assim dormimos. Para nos ajudar, Billy só acordou de manhã, chamando


pelo tio, dizendo que precisava fazer o número dois. Cameron se trocou e
foi cuidar dele, enquanto eu fazia o café da manhã.

Eu estava feliz. Sentia que todas as minhas manhãs poderiam ser como
aquelas, com os dois na minha casa, com os dois pra sempre na minha vida.

Capítulo 11

Havia dois dias que Cody estava preso dentro da casa de Russell sem sair
para nada. Tinha se sentido bem ao conhecer os pais do alfa, mas ele ainda
tinha medo de pôr a cara para fora.

Sentia como se Rhett o espreitasse. Mas Abel foi até lá e o incentivou a sair.

Russell tinha ligado e pedido para o amigo levar Cody até a Tracy, porque
Desmond havia dito que falaria com ela sobre um emprego para o ômega.
Abel resmungou só até ouvir a história toda, depois ficou penalizado pelo
cara. Mesmo que detestasse lobos e estivesse puto da vida com aquele lobo
que insistia em procurá-lo em sua casa e em seus sonhos, ele foi ajudar
Cody.

Afinal, ele também era um ômega e Abel não estava morto por dentro, no
fim das contas.

Ouvindo pela própria boca de Cody o que ele havia passado, Abel percebeu
que havia coisas que um homem podia fazer a outro que eram bem piores
que traição.

Cody ficou aliviado por ser levado por um ômega. Depois de tudo o que
tinha acontecido, ele preferia estar ao redor de ômegas ou de mulheres, em
vez de homens de qualquer tipo.

— Mas você sabe que se trabalhar em uma lanchonete terá muitos homens
para atender, não sabe? — indagou Abel.

— Ah, sim. Mas a dona é uma mulher... e eu preciso de um emprego. —


Cody encolheu os ombros.

— Então você é o lobo que me indicaram? — Tracy perguntou sorrindo e


indo na direção dos dois.

— Sim. — Cody estendeu a mão para a mulher de aparência extravagante e


sorriso simpático, com um cabelo cacheado pintado de vermelho e preso
desleixadamente no alto da cabeça.

— Mas que belezinha você é! — ela sorriu mais aberto, apertando a mão
dele. — Você tem experiência em lanchonete ou restaurante?

— Só em bar.

— Perfeito! É o que eu preciso, porque a ideia era isso ser uma lanchonete,
mas esses ursos praticamente fazem do lugar um bar. — ela riu
gostosamente. — Mas não se preocupe, querido, você pode trabalhar até no
cio que ninguém vai mexer com você.

Cody sorriu e foi andando com ela para conhecer o lugar.


— E você nem precisa ser um casca grossa como o Abel... — ela voltou a
rir.

— Ei! Eu não sou casca grossa! — Abel rebateu.

— Claro que não, querido. Eu só estou brincando. Você é uma florzinha


delicada. — disse Tracy, fazendo Cody sorrir.

— Venha que eu vou te mostrar tudo... — ela falou e Cody a seguiu,


enquanto ela mostrava a cozinha, o balcão e explicava as coisas.

— Então? Quando pode começar?

— Sério? — ele ficou animado.

— Claro. O próprio alfa te indicou, querido. Você já está contratado.

Cody não disse nada sobre não conhecer o alfa, pois imaginava que tinha
sido a pedido de Russell. E naquele mesmo dia ele iniciou o trabalho.

De algum modo, ele se sentia seguro perto de Tracy e mesmo que a


lanchonete fosse frequentada majoritariamente por homens a presença dela
e a de Glenn, o cozinheiro, davam a Cody alguma sensação de segurança.
Não completa, porque enquanto Rhett estivesse por aí ele não teria paz, mas
estar entre os ursos parecia bom para o lobo ômega.

Aos poucos Cody ia se sentindo mais leve, mas sempre na hora de ir


embora ele ficava apavorado. Ainda que a lanchonete não ficasse distante
da fazenda do beta e ainda que ele não fosse embora tarde do trabalho, ele
sempre tinha medo. Não dizia a ninguém, mas sentia como se Rhett pudesse
pegá-lo a qualquer momento. Assim como tinha pesadelos com o homem.

Já fazia alguns dias que ele estava trabalhando na Tracy quando conheceu o
alfa dos ursos.

Desmond não foi lá com esse intuito, mas aproveitou para conhecer o
ômega lobo que ele estava abrigando em seu território.
— Bom dia, Tracy, já vou lá atrás pegar as bebidas. — Cody entrou
esbaforido, lembrando que tinha esquecido de repor algumas bebidas na
geladeira do bar.

Queria fazer tudo corretamente, porque estava feliz trabalhando com Tracy.
Ela e Glenn eram bons de se trabalhar e de se ter por perto e ele não queria
perder a vaga. Por isso, vestiu rapidamente o avental, que ficava pendurado
perto do balcão e foi caminhando para o depósito quando ela o chamou.

— Vem aqui, querido. Quero te apresentar nosso alfa.

Desde que o ômega pisou na lanchonete, Desmond, que estava sentado em


um dos bancos do balcão, ficou boquiaberto. Perdeu o ar, perdeu a fala.
Toda a sua atenção se voltou para ele, para o dono daquele perfume e da
beleza mais estonteante que ele já tinha visto.

Rindo da cara de bobo do alfa, Tracy, que nunca o tinha visto daquele jeito,
chamou Cody para apresentá-lo, pois tinha descoberto ali que eles não se
conheciam pessoalmente.

— Este é Desmond, o nosso alfa, Cody.

O coração do alfa batia descontroladamente no peito, seus olhos se fixaram


nos do ômega e não pareciam dispostos a deixá-los por nada.

— Prazer, alfa... — Cody falou, acanhado, olhando para aquele homem que
o fitava de forma penetrante. — Obrigado por me deixar ficar no seu
território.

— O prazer é meu, Cody. Sinta-se bem-vindo. — o alfa falou cordialmente.


Não estendeu a mão, porque certamente iria querer puxá-lo para o seu
corpo.

"Meu", seu urso grunhia com força.

Tomou o uísque que estava em seu copo, vendo o garoto sair para o
depósito, enquanto a amiga ria e enchia o copo novamente.

— Mais um pouco vai precisar de um babador, Des. — Tracy brincou.


— Ficou tão claro assim, Tracy?

— Como a luz do sol, meu querido alfa. — ela riu. — Eu não sabia que
você gostava de lobos...

— Eu também não, Tracy. Eu também não. — ele disse em um tom


sombrio.

Em seguida, mesmo que quisesse ficar e pôr os olhos naquela criatura


celestial novamente, ele pegou seu chapéu, despediu-se de Tracy e foi
embora sem dar explicações. Afinal, ele era o alfa e depois de anos de
existência, ele enfim tinha achado seu companheiro. Não tinha que dar
explicações a ninguém. Só lamentava internamente não o ter encontrado
antes. Não ter impedido que o machucassem.

A raiva lhe atingia em ondas crescentes como aquela fortíssima e imediata


atração que sentiu ao olhar pra ele. Raiva de si, do mundo, de Deus. De
tudo. Seu companheiro estava tão perto, por que ele não foi até lá? Uma vez
que tivesse ido até a alcateia teria sido o suficiente para saber que ele estava
lá. Por que deixar que Cody sofresse? Por quê?!

— Cody... — ele falava sozinho no carro. Saboreando cada letra, cada som
de seu nome, do nome do homem que era dele, enquanto pensava nas
dificuldades que teria para se aproximar de alguém que tinha acabado de
passar por um grande trauma.

Desmond queria abraçá-lo e cuidar dele. Queria dizer que tudo ficaria bem
e que ninguém mais o machucaria. Queria poder falar "você é meu, querido.
Venha comigo", mas ele não podia.

Ele não podia.

Por isso, no dia seguinte, mais uma vez, ele foi até o restaurante. Tracy
sorriu com malícia, indo até a mesa em que ele estava sentado.

— Tudo bem, alfa? — o sorriso de Tracy era um deboche em si.


— Tudo, Tracy. E você? — perguntou Desmond com sua costumeira
cordialidade.

— Estou ótima, querido. Quer que eu te traga o cardápio ou já sabe o que


vai pedir?

— Eu gostaria de ver o cardápio, por favor.

— Já venho trazer. — ela disse e logo voltou com ele na mão.

— Dois dias seguidos, hein? Acho que nunca o vi por aqui duas vezes em
uma mesma semana. — a amiga brincou, enquanto ele parecia escolher
alguma coisa no menu.

Desmond levantou os olhos e os fixou nela com firmeza.

— Espero que não se incomode, querida Tracy. — ele falou sem sorrir.

— De forma alguma, alfa. — Tracy encolheu o riso e esperou que ele


escolhesse, porque Desmond podia ser o homem mais gentil do mundo, mas
ela, como ninguém, sabia o quanto ele também podia ser assustadoramente
bravo. Como o maior urso e o mais feroz de todo o bando, a amiga já o
tinha visto nervoso mais uma vez, já o tinha visto em batalha e certamente
não iria querer tirá-lo do sério, principalmente conhecendo sua afeição por
privacidade.

Ele respeitava a dos outros e exigia o mesmo respeito e por mais que Tracy
e ele fossem amigos há anos, nem mesmo ela conversava com o alfa sobre a
intimidade dele. Nem Tracy, nem ninguém. Isso porque Desmond sempre
acreditou que por ser o líder, seus gostos e interesses pessoais não tinham
que ser tornados públicos. Isso poderia dificultar sua vida e no fim das
contas, ele devia pensar no coletivo. Assim, tornou-se o urso mais
reservado do bando.

E embora as pessoas conhecessem sua preferência por homens, apesar de já


terem ouvido uns poucos boatos, ninguém nunca o via com alguém. Além
de um namorado que ele teve no passado, não se sabia mais da vida
amorosa e sexual do alfa. Ao contrário da maioria do bando, que vivia a
escancarar as conquistas e as celeumas amorosas.

Como não havia muita opção, Desmond pediu um cheeseburguer com


batatas fritas. Não era o que ele gostava mais de comer, mas o hambúrguer
de Glenn era realmente bom.

— Vai beber o quê, Des?

— Água, por favor. Com gelo.

Tracy piscou para o homem que estava sentado estrategicamente na última


mesa e já buscava com os olhos o motivo de sua visita. Depois de passar o
pedido para Glenn, Tracy foi para trás do balcão e explicou para Cody que
não era para cobrar de Desmond, porque ele era seu sócio no lugar.

— Quando ficar pronto, você pode levar pra ele. — ela sorriu ao dizer,
porque sabia que o alfa estava lá para ver o garoto.

— Tudo bem, Tracy. — Cody sorriu e foi pegar o pedido de outra mesa na
janelinha da cozinha.

Levou até as duas garotas que estavam esperando, enquanto era observado
disfarçadamente pelo alfa. Seu cheiro intoxicava os sentimentos de
Desmond, afloravam seus sentidos e faziam com que ele não quisesse
deixar de olhar para o ômega.

Desmond estava feliz que seu companheiro estava à sua frente. Ele era
pequeno, mas não tão jovem, embora fosse muito mais novo que o urso. Já
havia barba em seu rosto, curtíssima e seus traços eram fortes e delicados
ao mesmo tempo. Seu sorriso se abria para os clientes com facilidade, mas
seus olhos indicavam uma tristeza profunda, até mesmo medo.

O alfa gostou de tudo nele, exceto daquela tristeza. Ao contrário do dia


anterior, sentiu-se abençoado por Deus. Seu companheiro era lindo, suave,
tão perfeito e podia lhe dar filhos. Deus, ele já imaginava o homem
carregando seus bebês. Que bênção maravilhosa seria!
Então vieram os temores. E se ele não me quiser? Se não me aceitar? Se me
achar velho demais? Se não gostar de ursos? Tudo se passava pela cabeça
de Desmond, que se esquecia por um momento do possível principal
motivo para uma recusa, a violência que Cody sofrera.

— Mesa 6! — Glenn gritou e tocou a campainha. Cody pegou o pedido,


colocou em uma bandeja e em seguida pegou a garrafa de água mineral,
juntou ao pedido e colocou gelos em um copo. Levou tudo para a mesa do
alfa.

— Com licença, senhor. Aqui está seu pedido. — ele sorriu, fazendo o dia
de Desmond valer a pena.

— Me desculpe por não trazer sua água antes, senhor. — Cody se


desculpou, colando um pouco da bebida no copo.

— Não tem problema. Eu gosto da bebida com a refeição. Dizem que não é
recomendado, mas eu não consigo comer sem beber nada. — Desmond
falou com Cody em poucos segundos mais do que costumava falar com
seus amigos mais próximos ao longo de uma semana.

— Mas isso não tem problema para nós, shifters. — Cody cochichou com
um sorriso suave.

— Isso é verdade. — Desmond sorriu largo daquela doçura.

— Bom apetite, senhor. Se precisar de alguma coisa, pode me chamar. —


ele disse cheio de simpatia, mas com aquela tristeza profunda nos olhos que
cortava o coração do grande alfa.

Sim, porque Cody era pequeno, mas não tanto como a maioria dos ômegas.
Na verdade, ele era pequeno se comparado a Desmond. Devia ter a altura de
Russell, mas Desmond era mesmo grande, ultrapassando a marca dos 1,90
facilmente. Sua sobriedade e calma faziam com que ele não fosse um
homem assustador, mas Cody estava longe de querer se aproximar de
homens de qualquer tamanho. Ele queria voltar a ter uma vida normal, que
ele nem se lembrava mais como era, já que não lembrava como era não
sentir medo todos os dias.
O alfa comeu cheeseburguer, enquanto via o seu companheiro atender as
poucas pessoas que havia no local, admirando-o a cada passo, a cada
movimento, imaginando uma maneira suave de se aproximar.

***

Abel estava agitado. Não queria, mas pensava naquela droga de lobo a todo
o tempo. Ele não iria ceder, nem mesmo que o cio o consumisse. Ele não
iria até ele. Pra quê? Para ser traído outra vez? Não. Ele jurou que nenhum
outro homem faria com que ele sofresse de novo.

Achava em seu íntimo que Finn parecia uma boa pessoa. Mas seu ex
também parecia e o filho da puta tinha uma família completa, com bicicleta
na garagem e tudo. Abel não queria ter o coração despedaçado outra vez,
por isso não deixava mais ninguém se aproximar. Ele não contava, porém,
que encontraria seu companheiro. Honestamente, ele preferia que isso não
tivesse acontecido, porque agora ele ficava desejando secretamente o
homem, sonhando com ele e sofrendo.

Naquela noite, ele foi até a casa de Cody ver como ele estava e levar
algumas roupas de cama. Ele não contava que poucos minutos depois de
chegar lá, Finnegan também chegaria, para levar as roupas de Cody, a
pedido de Russell.

Sentiu a boca secar ao ver o lobo na porta, com as sacolas estendidas para o
ômega e seu sorriso gentil de sempre. Droga, ele era tão suave que fazia
com que Abel quisesse tentar ser feliz outra vez.

Cody o chamou para entrar, mas depois que viu Abel lá dentro, ele recusou.
Contou que estavam ainda atrás de Rhett e disse que o ômega lobo não seria
abandonado.

— Muito obrigado, Finn. Diga ao alfa que eu agradeci também.

— Digo, sim, Cody. Qualquer coisa você pode me ligar. Anota o meu
número. Qualquer coisa que precisar. — ele falou, dizendo o número na
sequência.
Sentado no sofá, Abel ouvia a conversa e observava o lobo de rabo de olho.
Inferno! Ele era atraente. Tão atraente que Abel mal podia se lembrar de
alguém que o tivesse atraído mais.

Mas agora já era tarde, ele tinha dispensado o cara grosseiramente, como
costumava fazer com todo mundo. Ainda que soubesse que ele não era
qualquer um.

Não negou a si mesmo a verdade sobre ter se sentido mal por Finn nem
mesmo tê-lo cumprimentado. Ele tinha pedido pelo afastamento, mas doía.
Ele não queria que doesse, mas ardia em seu peito ouvir a caminhonete
barulhenta do beta dos lobos ir embora.

Pensava ele que o lobo já estava resignado, que logo encontraria alguém
para pôr no lugar que deveria ser seu, sem saber que Finnegan ia embora
com o coração quebrado e mesmo assim, sem intenção alguma de substituir
seu companheiro por qualquer outro homem.

Capítulo 12

Eu já não conseguia ficar muito tempo longe dele. Almoçarmos todo dia
juntos já não era o suficiente pra mim. Eu precisava reivindicá-lo e ter uma
conversa honesta com ele sobre isso.

Ele estava feliz, eu sabia. Ele me dizia, seu sorriso me dizia e aquilo me
incentivava. Ver a alegria de Cameron era a melhor coisa. Então, durante o
almoço, eu sondei o terreno.

— Cam, será que você conseguiria que a senhora Moore ficasse uma noite
com Billy? Uma noite inteira. Só uma. — dei um sorriso sugestivo.

— Eu posso falar com ela. — ele sorriu de volta.

— Você quer ficar sozinho comigo, Rus? — ele perguntou todo bonitinho.

— Quero, bebê. Eu preciso de uma noite inteira sozinho com você, porque
quero te ouvir fazer bastante barulho. — eu brinquei, mas foi inevitável
sentir meu pau subir.
— Rus... — ele piscou devagar. — Desse jeito não vou conseguir terminar
de comer.

— Por que, bebê? Você quer fazer barulho pra mim essa noite? Isso te deixa
excitado?

— Russell... — ele soltou um gemido, sorriu e se ajeitou na cadeira.

— Você pode me fazer gritar agora que estamos sozinhos... — ele sugeriu.

— Eu iria adorar, Cam, mas tenho que ir até a casa de Kurt em poucos
minutos. Mas essa noite, se você puder vir, me liga que eu vou te buscar. —
o alfa levantou, levando o prato até a pia.

— Desculpe deixar a mesa antes de você, mas estou mesmo atrasado pro
compromisso. —

ele passou e deixou um beijo na cabeça de Cam. — Almoce tranquilo, Cam,


mais tarde a gente se vê. E se não der não tem problema... — ele foi escovar
os dentes antes de sair.

À noite, antes que pudesse ligar para Cameron, ele bateu na porta. Russell,
que terminava de se trocar depois do banho, vestiu a camiseta correndo e
foi atender. Jogando um sorriso lindo para o alfa, Cameron o beijou em
seguida.

— Eu ia te buscar, Cam. Entra...

— Eu fiquei ansioso.

Russell queria agarrá-lo ali mesmo, antes do jantar, tamanha a sua


meiguice.

— Que bom que conseguiu. É muito importante pra mim que esteja
sozinho. — o alfa falou, levando-o pela mão até a mesa de jantar que ficava
na sala.

Russell tinha preparado uma noite romântica para eles. Infelizmente, a


comida era comprada, porque ele não tinha conseguido tempo para
cozinhar. E ele tinha aprendido com os ursos que cozinhar era uma forma
de demonstrar amor, portanto, era muito importante fazer as próprias
refeições e cozinhar para quem se ama. Mas ele tinha pressa, precisava estar
logo sozinho com Cameron.

O lobo ficou maravilhado com a mesa arrumada como nos filmes, as velas
sobre ela, os pratos bonitos.

— Nunca ninguém fez isso pra mim... — ele confessou, quando comiam.

— Eu quero fazer muito mais por você, bebê. Quero fazer tudo. — Russell
acariciou sua mão. Cameron queria chorar. Sentiu-se bobo por se emocionar
com aquilo, mas tudo o que envolvia o alfa o deixava muito emotivo. E ele
ficou feliz por estarem à meia luz.

— Eu não posso fazer muita coisa por você... — Cameron balbuciou, com a
cabeça levemente baixa.

— Você faz muito mais por mim, Cam. Você nem imagina o quanto...

— Faço? — ele levantou os olhos.

— Faz... você e o Billy foram um presente que eu ganhei e eu quero que


você saiba que eu só pedi pra você vir sem ele hoje, porque queria ter um
momento romântico com você antes de te fazer gritar no quarto. — a
brincadeira de Russell arrancou uma risada espontânea e divertida de
Cameron.

— Eu quero te dizer uma coisa, mas só depois da sobremesa. — Russell se


levantou para tirar os pratos já vazios.

— A comida estava muito boa. Obrigado pelo jantar.

— Não precisa agradecer, meu anjo. — Russell falou já distante, abrindo a


geladeira e pegando o doce de morango que ele tinha feito no dia anterior.

Cameron comeu duas vezes, deliciando-se com a sobremesa. E assim que


ele terminou a segunda rodada, e recusou a terceira, Russell tomou um bom
gole de água e aproximou sua cadeira da dele. Viu-o fazer o mesmo, depois
se olharam.

— Eu sei que você não me conhece há muito tempo e o que eu vou te pedir
exigiria talvez mais tempo, mas eu não aguento mais viver longe de você,
Cam. Quero dormir e acordar com você todos os dias, como vamos fazer
essa noite. — Russell segurava as mãos dele, que suavam.

— Eu quero viver com você, Cam. Quero te reivindicar. Quero estar


acasalado com você.

— Russell... — Cameron tremia quando o abraçou. Ele ofegava quando se


beijaram com gosto dos morangos frescos do doce.

— Você me deixa reivindicar você, bebê? Me aceita como seu


companheiro?

— Mas... Rus... e o Billy?

— Eu quero vocês dois na minha vida, Cam. Quero que vocês dois morem
comigo. Prometo que vou cuidar de vocês e não vou...

— Aceito, Rus! Eu aceito... — Cameron o envolveu outra vez com os


braços, deixando cair aquelas lágrimas silenciosas.

Logo sua boca foi beijada e o choro cessou. Beijos e abraços se


intercalavam na mesa de jantar, quando os dois já se aqueciam.

— Acho que agora você pode me levar para o seu quarto e me fazer gritar...
— Cameron sorriu, quebrando o beijo.

— Vou te levar pro nosso quarto, companheiro. Nosso quarto. — Russell


segurou seu rosto para falar e depois de um beijo curto, os dois foram para a
cama, onde Cameron seria marcado e os dois iniciariam a vida juntos.

***

Cameron não era muito de falar, mas naquela noite, talvez por estarmos
sozinhos ele falou.
Antes, durante e depois. E tudo o que ele disse foi especial, principalmente
porque foi nesse dia que ele disse que me amava pela primeira vez.

Assim que tiramos as roupas e nos deitamos, ele sussurrou sua declaração
em meu ouvido e eu não sabia que um "eu te amo" podia ser tão sexy.
Quase tanto quanto ele pedir no meu ouvido se podia me chupar.

— Pode, Cam... pode me chupar o quanto quiser. — afasto as pernas para


que ele ajeite entre elas e minha visão é a melhor do mundo.

Sua língua percorrendo minha glande, seus lábios se fechando em torno de


mim, descendo e me tomando. Ver meu companheiro me chupar, enquanto
geme de prazer é maravilhoso, quase tão bom quanto o ver se virar e
mostrar sua entrada pra mim.

O quarto estava iluminado pelo fogo da lareira da sala, a porta aberta


deixava luz ígnea entrar, e Cameron não deixava o fogo sair.

Prontamente, me coloquei entre suas nádegas e o lambi, o chupei. Trouxe


para trás as bolas e o pau e chupei tudo, ele todo, deixando por todo lado
minha saliva. Ele já começa a se mexer, pedindo para ser penetrado.

— Você quer assim, bebê? — perguntei ao espalhar o lubrificante em seu


ânus.

— Posso ir por cima de você?

— Você pode vir como quiser, meu companheiro...

Lambuzei meu pênis com um pouco do lubrificante e sentei no centro da


cama. Em segundos, aquele homem grande já se preparava pra se encaixar
em mim, me deslizando para dentro do seu corpo, bem devagar. Deixei que
ele conduzisse os movimentos, ao passo que eu passeava com minha língua
em seu peito sem pelos.

Nenhum de nós tínhamos muito pelo no peito e a fricção que nossos corpos
faziam, dos nossos músculos suados era algo realmente excitante.
Segurando suas costas, o deitei na cama,
sem sair de dentro dele. E então foi minha vez de conduzir. Mostrei pra ele
como eu queria fazer com que ele gemesse, com que ele gritasse. E ele
gemeu, e gritou.

Só quando minha mão, que o masturbava, sentiu seu pau inchar ainda mais,
que eu anunciei que o marcaria. Os dentes do meu lobo já estavam há muito
pra fora, então eu só precisei avisar, e pedir sua submissão.

— Está preparado pra ser meu, bebê?

— Estou, alfa... me marca. — ele esticou o pescoço como seu lobo faria
para o meu e depois de beijar sua boca com profundidade, meus dentes
encontraram sua pele, entraram em sua carne. E eu o fiz gritar. O fiz gozar,
reivindicando o que era meu. Marcando meu lobo, por fora e por dentro.

***

— Eu sou seu companheiro agora, Rus? — ele me perguntou pela manhã,


enquanto ainda estávamos na cama.

— Você já era meu companheiro. — eu sorri e beijei seus cabelos. — Agora


estamos acasalados.

— Hum... eu gosto de estar acasalado com você.

— Que bom, bebê. Porque eu não penso em desgrudar mais de você.

— Você quer mesmo que eu venha pra cá?

— Sim. Você e o Billy. De preferência hoje mesmo. Já até arrumei o quarto


de hóspedes pra ele.

— Oh, Rus... você é muito bom pra gente.

— Eu amo você, Cam. Amo vocês dois. Quero que sejam minha família.

— Rus... — Cameron o apertou.

— Eu nem acredito que vamos morar juntos. Isso parece tão bom...
— Vai ser maravilhoso, querido. E eu prometo que só te faço gritar quando
Billy não estiver.

— Cam riu.

— Rus... e se eu quiser fazer você gritar um dia? — Cameron sorriu


travessamente.

— Você diz... entrar na minha bunda?

Cameron gargalhou com a forma que Russell falou.

— Sim...

— Eu nunca fiz isso. Mas você também nunca tinha feito e pareceu gostar
bastante...

podemos tentar se você quiser...

— Ah, eu gosto muito, Rus... você vai gostar também.

— A gente tenta e eu te falo se gostei... — Russell riu.

— Vamos tomar café da manhã e eu te levo pra casa. Você precisa buscar o
Billy, não precisa?

— Preciso. Mas antes eu preciso fazer outra coisa, Rus.

— O quê? — o alfa perguntou, quando sentiu seu companheiro se enfiar


embaixo das cobertas, entre suas pernas.

— Ah, lobinho... — Russell sorriu, abrindo as pernas para que ele pegasse
seu membro já rígido.

— Eu quero você de café da manhã, Rus... — Cameron falou antes de


enfiá-lo na boca.

E foi a vez de Cameron fazer o alfa gemer, pra começar o dia bem.
***

Por mais que procurassem, ninguém tinha notícias de Rhett. Russell


adoraria ir até a sua casa na fazenda dos pais e dizer a Cody que ele podia
voltar, que tudo estava resolvido, mas não estava. Por mais empenhado que
Finn estivesse, não achavam o homem em lugar algum. Russell até queria
dar as buscas por encerradas, mas Finn pediu para continuar. Além de
inconformado

com aquela história toda, ele tinha motivos para engajar em tudo que era
trabalho que aparecesse, porque não aguentava lidar com a rejeição do
companheiro.

Já era noite quando, depois de voltar de uma busca solitária pela cidade e
pela floresta, ele chegou em casa cansado e tomou um banho. Nem quis
comer, preferindo ir direto para a cama quando farejou aquele perfume
inconfundível no ar. Fraco e distante, mas seu lobo sabia que era ele. Em
algum lugar das proximidades ele estava. Provavelmente iria falar com o
alfa.

Seu instinto protetor dizia para que ele seguisse o perfume, mas a
lembrança das palavras duras do ômega agitou sua memória e ele ficou.
Deitado no sofá, em alerta, para o caso de o perfume mudar de notas e ele
sentir o medo rondando, então iria em seu auxílio. Só nesse caso.

Mas o cheiro chegava cada vez mais perto, sempre doce, sem notas de
medo. Então ele ouviu o carro parar, escutou-o descer. Parou em frente à
porta, titubeou e bateu. Com o coração acelerado, Finn foi atender. Tentou
parecer calmo, mas por dentro estava agitado, como sempre ficava perto do
ômega de olhos azuis e cara de bravo.

— Oi, Abel.

— Eu não quero acasalar com você. — disse o ômega de supetão.

— Eu sei que não. — Finn falou calmamente. — Você já deixou isso nem
claro. Você veio aqui pra falar isso de novo?
— Não.

— Então por que veio?

Abel parou. Não conseguia responder. Não sabia o que ou como dizer.
Então seu olhar mudou. A raiva deu lugar ao medo e talvez Finn
compreendesse.

— Você quer entrar?

O ômega balançou a cabeça e o beta deu passagem. Ele mal cabia em si de


felicidade, mas manteve a calma, afinal, ele realmente não compreendia
Abel por completo.

— Você disse que não é descontrolado.

— Eu não sou. — Finn confirmou.

— Eu também nunca senti isso antes... — Abel confessa. — Mas... eu não


consigo confiar em mais ninguém. Estou estragado por dentro.

— Não. Não diga isso... eu tenho certeza que não está estragado... eu sei
que você tem medo e... não precisamos fazer nada. Só me deixa te mostrar
que eu não sou uma pessoa ruim.

— Você diz isso agora e depois aparece com uma família.

— Não vou aparecer com uma família... a não ser que você queira acasalar
comigo. —

Finnegan riu.

— Bobo... — Abel riu também.

— Não precisamos mesmo fazer nada mesmo. Podemos ser amigos e se um


dia você confiar em mim, damos um passo adiante. Um de cada vez.

— Parece bom assim...


Finn sorriu tão feliz que teve medo de o cara achá-lo tolo.

— Agora deixa eu te mostrar minha casa, para você ver que não tenho uma
família escondida...

Abel sorriu e o acompanhou.

— Você pode ter outra casa...

— Não tenho. — Finn riu de leve, olhando para baixo, vendo o ursinho
ômega caminhar pela sua casa. — Nem essa casa era minha... — o beta
falou e continuou mostrando para o ômega que só morava ele naquele lugar
e iniciando com ele uma amizade.

Parecia bem longe do ideal, mas com certeza era alguma coisa por onde
começar.

***

Pelo quarto dia seguido, Desmond almoçou na Tracy. Já não aguentava


mais ter sanduíche de almoço e então Glenn passou a fazer algumas opções
diferentes para o alfa. Naquele dia era purê de batatas e filé.

— Por favor, Cody, diga ao Glenn que estava uma delícia. — disse o alfa,
que fazia questão de pagar pela refeição todos os dias em seu restaurante,
apenas para deixar uma boa gorjeta para o novo garçom.

Sem notar que o homem ia lá por causa dele, Cody trabalhava


normalmente. Aos poucos sentia que poderia ter uma vida normal de novo,
sem nem mesmo ter um conceito de normalidade definido. Ele gostava do
lugar. Tracy e Glenn eram bem mais velhos que ele e durões, o que fazia
Cody se sentir seguro, pelo menos quando estava lá dentro.

O problema era quando tinha que ir embora no começo da noite. Ele tremia
quase o percurso inteiro e só não o fazia correndo, porque o chamariam de
louco. Ele não queria assustar os ursos, ou irritá-los. Estavam sendo tão
bons pra ele, que ele queria fazer o possível para passar despercebido, para
não incomodar ninguém.
No quinto dia, Cody não foi trabalhar, porque era sua folga. Tracy não
avisou Desmond, pois queria ver sua cara de decepção e confirmar suas
suspeitas.

— Onde está Cody? — o alfa perguntou quando ela atendeu a mesa.

— Hoje é folga do lobinho, Des. Sinto muito, mas vai ter que se contentar
comigo. — a amiga riu.

Desmond respirou fundo e a cara que Tracy queria ver estava lá, à sua
frente. Inegável, indisfarçável. Mesmo assim ele pediu comida e mesmo
assim ele pagou. Mas o sorriso e a vontade de conversar não estavam lá.
Assim que terminou foi embora cabisbaixo, de modo que Tracy quase teve
pena do homem. Desmond parecia mesmo estar apaixonado.

Tracy não sabia que o amigo tinha encontrado seu companheiro e por isso
estava indo lá todos os dias para vê-lo e um dia sem ver Cody parecia
terrível para ele. Até dias atrás ele nem o conhecia, mas agora, um dia sem
pôr os olhos no cara já parecia matá-lo. Por isso, tomado por aquela
saudade difícil de explicar, que só companheiros separados entendem,
Desmond foi até a fazenda de Kirk e bateu na porta de Cody.

— Oi, alfa... — os olhos de Cody se arregalaram em surpresa. — Há algo


de errado? Eu preciso ir embora? — ele perguntou assustado.

— Não, querido... não. — Desmond se repreendeu internamente por


assustá-lo.

— Eu só vim ver se está tudo bem... se você está precisando de alguma


coisa.

— Ah... nossa! — ele sorriu, soltando o ar. — Eu pensei que tinha feito
alguma coisa errada.

— Não... você não faz nada errado, Cody. — o alfa olhava para ele
maravilhado.

— Eu estou bem. Está tudo bem. Obrigado. — Cody sorriu.


Desmond não sabia o que dizer em seguida. Os dois apenas se olharam e o
alfa notou que o sorriso que ele lhe lançava era aquele de simpatia que ele
dava igualmente para todos os clientes e que escondia sua tristeza.

— Se precisar de alguma coisa, por favor, peça que me avisem... —


Desmond ofereceu o que podia.

— Obrigado, alfa. O senhor é muito gentil.

Os dois se despediram e Desmond foi embora totalmente despedaçado.


Aquele "senhor"

dito pelo companheiro, certamente implicava em muitas coisas. Não só em


uma distância respeitosa, mas também em uma distância temporal,
denotando que o ômega o achava muito velho.

Para o alfa, era claro que Cody sabia que ele já tinha muitos anos. Os
cabelos brancos que já apareciam em sua barba e começavam a tingir suas
têmporas, mostrava que ele já passara dos oitenta anos. Cody teria quantos?
Vinte e sete? Vinte e oito, no máximo. Desmond não sabia, mas a cor viva
de seus cabelos e o viço reluzente de sua pele diziam que ele era bem
jovem.

Indo para a sua casa, o alfa ficou imaginando como seria o homem com
quem ele se relacionava fisicamente. Quis matá-lo ao lembrar que ele tinha
agredido seu companheiro, o ômega que Deus tinha feito para ele. Porque
Desmond acreditava ferrenhamente em Deus e via nos shifters apenas uma
de suas criaturas. Por baixo de suas camisas, não raro carregava um terço.
Cria nos ensinamentos de Jesus e embora não costumasse ir à igreja,
considerava-se um

bom cristão. Não gostava de morte e assassinatos eram proibidos em seu


bando, exceto em caso de auto-defesa, por isso ele se repreendia pelos
desejos de matar o homem que feriu seu companheiro. Repreendia-se, mas
aceitava sua falha, porque não havia forma de fazê-la ir embora.

Ele procurava ser um homem bom, tinha uma firmeza digna de nota, mas
sabia que não era perfeito. E sempre que pensava em alguém machucando
Cody, seu urso desejava resolver o problema como animais resolvem.

Ele grunhiu ao pensar naquilo. Ele desejava tanto estar com Cody, mas
sabia que não poderia ser agressivo em sua abordagem. O problema é que
ele não fazia ideia de como abordá-

lo.

***

— Agora que você viu que não tem um marido embaixo da minha cama...

— Ou uma esposa! — Abel retrucou.

— Ou uma esposa... — Finn riu. — O que achava de ficar pra jantar? Eu


ainda não comi.

— Não. Vocês lobos não devem saber cozinhar... — o loiro provocou.

— Por que não fica e me deixa provar que eu sei?

— Amanhã. — disse Abel.

— Que horas eu te busco?

— Eu venho até aqui, lobo.

— Não é seguro...

— Estou armado. — Abel levantou a camisa. — Amanhã eu volto às sete.

— Por que você é tão teimoso? — a pergunta de Finn fez Abel revirar os
olhos.

Sem deixar Finnegan protestar, ele saiu pela porta e entrou no carro. O lobo
ficou tão atordoado com a saída como com a chegada imprevista do urso. Já
previa que Abel daria trabalho com toda aquela teimosia, mas ele estava
feliz com a surpresa e com a inesperada chance que o companheiro tinha
lhe dado.
Capítulo 13

Vinte minutos depois do horário combinado, Abel chegou à casa de


Finnegan.

— Eu já estava preocupado... — disse o beta.

— Se você continuar me tratando como se eu fosse um bebezinho frágil


teremos problema, lobo. — Abel estreitou os olhos, fazendo Finn sorrir.

— Entre, Abel.

— Você precisa parar de rir das coisas que eu falo.

— Não estou rindo. Estou sorrindo. Não tenho culpa que você é adorável.

— Eu não sou adorável!

— Ah, não?

— Então o que você é?

— Sou um urso assustador.

Finnegan se esforçou para não rir. Mais porque ele estava feliz como um
bobo por enfim conseguir um encontro com seu companheiro, que por estar
tirando sarro do urso.

— Você duvida? Eu posso te mostrar. — Abel lançou um olhar cínico sobre


o ombro.

— Então mostre. — Finnegan falou, pois já conhecia os boatos de que os


ursos machos adoravam se exibir em suas formas animais. Claro que os
ômegas deveriam ser diferentes, mas Abel era um ômega atípico.

O encontro mal tinha começado e os dois já estavam se provocando. O que


Finnegan ainda não sabia — e deveria saber — era que Abel não lidava
bem com provocações, de modo que sempre revidava
desproporcionalmente. E a desproporção naquele caso foi tirar a roupa toda.
Afinal, ele precisava se transformar.

Fez questão de fazer aquilo na frente do lobo, porque Finn não sabia, mas o
ômega estava mesmo disposto a testar todos os seus limites antes de decidir
se aceitaria ser seu companheiro.

E Abel tinha quase certeza de que Finnegan não passaria em seus testes.

Abel então ficou nu. Sua pele clara, quase sem pelos apareceu diante dos
olhos do lobo.

Finn paralisou ao ver Abel pelado, de costas. Seus músculos pequenos, sua
bunda redondinha, suas pernas torneadas. Ele era lindo, perfeito, delicioso.
Seu lobo ficou louco, sentiu os dentes quererem pular, seu corpo humano se
esquentar, pedindo passagem ao lupino. Mas ele não podia demonstrar
descontrole na frente do ômega.

O urso enorme então pareceu. O corpo quente do beta logo foi esfriando,
porque embora magnífico, aquele grande animal peludo em sua sala não
despertava nele a mesmas sensações que a bunda branquinha que ele tinha
acabado de admirar. Sua ereção foi logo embora ao primeiro bramido do
animal, que ficou em pé para mostrar como era grande. Sim, ele era um
urso exibido, por isso fez aquele som novamente e embora Finnegan
quisesse sorriu, ele se controlou. Afinal, Abel era meio maluco e em sua
forma de urso era bem possível que ele ficasse agressivo. E Finnegan não
estava tentado a lutar com um urso antes do jantar.

— Impressionante! — ele exclamou.

Não era mentira, de fato. Ele estava impressionado com o tamanho do urso
do ômega, embora já o tivesse visto lutar. Quis se aproximar e acariciar seus
pelo, mas outra vez o receio de ser atacado bateu, além de se lembrar de sua
promessa.

Sem tocar. Ele lembrou. Seja humano, ou urso, ele não deveria tocar Abel.
E assim o fez, até que novamente o humano estivesse nu na diante de si,
dessa vez de frente. O beta arquejou, tentando controlar o desejo de descer
com os olhos. Conseguiu permanecer no rosto, até se virar e ir para a
cozinha, sentindo o corpo esquentar mais uma vez.

Abel sorria ao se trocar. Um sorriso travesso, provocador, de quem atingiu o


alvo. Ao terminar de se vestir, foi até a cozinha onde Finnegan terminava de
preparar a comida.

— Espero que goste de carne. Estou fazendo uma receita que aprendi com a
minha mãe.

— Eu adoro carne. Mas, não importa qual seja a receita, você está fazendo
errado. — Abel falou, sem se importar se pareceria impertinente.

— Errada por quê?

— Porque a panela já pegou pressão e você deveria ter baixado o fogo. —


ele foi até o fogão e diminuiu o fogo. — Essas panelas são perigosas. Por
isso quase ninguém usa por aqui.

— Obrigado, Abel. — Finn sorriu, porque ele estava certo quanto ao fato de
quase ninguém usar aquelas panelas, mas sua mãe sempre usava e ele tinha
uma por isso.

Depois da demonstração de tamanho e força do ômega, além de exibir seus


conhecimentos em utensílios de cozinha, o jantar transcorreu normalmente.
Finn tentava não olhar para ele com desejo. Tentava não demonstrar o
tempo inteiro como estava feliz por ele estar ali, mas talvez isso
transparecesse mais do que ele gostaria. Mas o medo e a insegurança de
Abel o impediam de ver. Aquele medo que ele tentava disfarçar com afronta
e rebeldia o cegava parcialmente, mas ele estava lá, tentando dar uma
chance ao seu companheiro, porque ele se sentia péssimo sempre que
estavam separados.

Não era de boa vontade que ele estava na casa do beta. Era verdade quando
dizia que não queria companheiro e que não era o maior fã de lobos. Mas
desde que tinha conhecido Finnegan, ficar longe dele causava um estrago
em seu coração e mesmo se odiando por isso, Abel estava disposto a tentar
afagar o próprio peito depois de tantos anos sozinho.
Mas ele não facilitaria as coisas para Finn. Se ele o quisesse mesmo, teria
que estar disposto a lutar por isso.

Assim, os dois passaram a fazer coisas juntos como amigos. Jantavam


juntos, iam ao cinema, Abel até chamou Finnegan para cavalgar, em um
cavalo mesmo, na fazenda onde morava. Finn tinha até conseguido
convencer o urso a não ir mais sozinho à região da alcateia até que tivessem
resolvido o problema de Rhett, mas conforme os dias iam passando, as
buscas se tornavam mais escassas e o perigo parecia estar longe. Rhett
parecia estar distante e os dois lobos que estavam envolvidos no ataque a
Abel não foram pegos. Talvez sem a presença de Rhett eles ficassem menos
irascíveis e não apresentassem perigo. De qualquer modo, o medo foi
diminuindo, mas Finnegan continuava com seus instintos protetores em
alerta.

Os dois, porém, conviviam como grandes amigos e só às vezes Abel se


referia aos lobos, para Finn, chamando-os de cachorros ou vira-latas e
sempre causava mais riso que raiva no beta, que já estava acostumado com
jeito atrevido do ômega.

Finnegan tinha encontrado uma forma de engolir e disfarçar seu desejo por
Abel. Ele estava empenhado em conquistar sua confiança e mesmo que
tivesse vontade de beijá-lo e o abraçar toda vez que o via, ele fingia não se
afetar.

O ômega parecia satisfeito, porque aplacava sua necessidade de estar perto


do lobo sem precisar se comprometer, porque ele morria de medo de se
envolver — mesmo com seu companheiro — e ser traído de novo. Embora
ele também desejasse contato físico com Finn, talvez ele preferisse as
coisas como estavam.

Assim os dois iam se vendo apenas como amigos, fingindo que não se
amavam e que não estavam loucos para se tocar. Mas o toque era proibido e
Finnegan tinha prometido que nunca mais ultrapassaria essa linha de novo.
Abel, por sua vez, não parecia disposto a tirar as barreiras e permitir que
eles criassem intimidade.

***
Com toda a indefinição acerca de Rhett, Cody permanecia exilado no bando
dos ursos. Mas ele estava bem e gostava de lá. Às vezes jantava com os pais
de Russell, já passeava pela fazenda sozinho de vez em quando e não tinha
tanto medo ao voltar do trabalho, principalmente, porque sempre tinha um
urso o acompanhando disfarçadamente. Ele fingia que não via, mas sabia
que estava lá. Pensava ser a pedido de Russell, mas era a pedido do alfa,
que continuava indo almoçar na lanchonete onde ele trabalhava.

Todos os dias conversavam bastante durante o atendimento e Desmond já


era o cliente preferido de Cody. Além de ser agradável, simpático e gentil, o
homem tinha o cheiro mais gostoso de todo o bando. Algo misturado com
canela e Cody simplesmente amava canela. Fora

que ele tinha aquele ar de caubói sério e sensual e parecia ter saído de um
filme do velho oeste, com aquele chapéu e aquelas botas.

Cody realmente não queria saber de homens, mas não fazia mal em apreciar
um homem bonito, quando esse sorria para ele de forma tão convidativa. Os
dois falavam se coisas corriqueiras e Desmond sempre aproveitava para
descobrir alguma coisa nova sobre o ômega, por mínima que fosse.

— Eu adoro cavalos. Todos os dias eu passo e vejo os cavalinhos. Passo a


mão neles. Mas nunca subi. — disse Cody, em certa ocasião, em resposta a
uma pergunta do alfa.

— Você tem medo?

— Não. Eu me dou bem com eles. Nunca ficam bravos comigo... deve ser
porque eu sou um ômega, porque eu já ouvi dizer que eles não se dão muito
bem com lobos. Ficam agitados.

Desmond sorria ouvindo-o falar.

— Acho que isso é apenas boato. — Desmond falou. — E mesmo se não


fosse, tenho certeza de que qualquer um deles se sentiria bem perto você.

Cody se sentiu esquentar.


— Você gostaria de aprender a montar? Posso te ensinar qualquer dia.

— Eu adoraria, alfa. Se algum de seus executores estiver disponível um dia


para me ensinar.

Claro que a resposta quebrou as expectativas do alfa, mas ainda assim ele
designou uma executora para ensinar Cody a montar, em sua fazenda, onde
ao menos poderia vê-lo de longe e aquilo já seria bastante para Desmond.

Naquele dia, Cody sorria ao colocar gelo no copo para servir a água que
Desmond tomava todos os dias, depois de ter atendido sua mesa.

— Parece que alguém está caidinho por você... — Tracy sussurrou em seu
ouvido, passando por trás dele, achando que já estava na hora de Cody
acordar.

O rosto de Cody se fechou no mesmo instante. Ele procurou com os olhos


de quem a mulher estava falando. De imediato pensou em um urso que
vinha o assediando discretamente, mas só havia Desmond lá naquele
momento

— O alfa?! Você está doida! — ele se espantou ao constatar que Tracy se


referia a Desmond.

— Você acha que ele almoçava aqui antes de você ser o garçom? — ela riu.

— Ai, Tracy... tenho certeza que tem outro motivo. — Cody ficou vermelho
ao imaginar o alfa interessado nele e nem ouviu o que a mulher falou na
sequência.

— Você é o motivo, bebê. Esquece seu ex escroto e cai de boca no ursão. —


ela gargalhou, deixando Cody ainda mais corado.

Desmond não ouviu. Seguramente ficaria incomodado com a interferência


da amiga, mas olhava o celular e não notou a gracinha feita por Tracy.

— Sua água, alfa. — Cody falou ao servir a bebida e logo se retirou, sem
conseguir olhar para o cara.
Como se tivesse sido atingido por um automóvel, Cody recebeu aquela
informação. Ele simplesmente não sabia o que fazer ou o que pensar. Parte
dele queria que fosse verdade e outra parte se sentia idiota por sentir aquilo.
Como poderia pensar em homem depois de tudo o que passou? Tratou de
empurrar os pensamentos para longe e foi atender a mesa recém ocupada.

Para o seu azar, era justamente Kevin, o cara que o andava importunando.

— Pois não. — falou seco.

— Tudo bem, belezinha? — o urso lançou aquele olhar de quem queria


devorá-lo. Tudo o que Desmond se preocupava em não fazer, o imbecil
fazia.

— O que vai querer?

— Eu quero um lobo ômega para o meu almoço... — ele segurou a mão de


Cody, obrigando-o a puxá-la com força. Assustado e enojado, Cody pensou
em se afastar e correr, pedir a ajuda de Tracy, mas antes que ele precisasse
fazer qualquer coisa, viu corpo do homem ser içado por trás.

— Você vai pedir desculpas para ele agora! — Desmond agora segurava o
homem pelo colarinho.

Kevin não era um homem pequeno, mas nas mãos fortes do alfa ele parecia
um ratinho apavorado. Talvez tivesse sido naquele momento que Cody
percebeu que o alfa era tão mais alto que ele.

— Desculpa, alfa, eu não... — o homem tentou dizer.

— Pra mim, não. — Desmond o soltou, porque não havia mais necessidade
de segurá-lo, já que o tinha controlado. Exalando potência e dominância,
ele continuou:

— Olhe para Cody e peça desculpas a ele. — Desmond ordenou.

— Desculpa, Cody.

O ômega apenas rosnou assustado.


— Agora você vai desaparecer daqui e nunca mais volte a pisar nessa
lanchonete. E se você olhar para Cody novamente, eu te expulso, Kevin.
Espero que tenha compreendido.

— Sim... sim, alfa... — envergonhado, o homem pegou o chapéu de cima


da mesa e saiu de lá correndo.

— Eu sinto muito que você tenha tido que passar por isso, Cody. —
Desmond olhou para ele com carinho. — Você está bem? — o alfa afagou
seu braço, perto do ombro.

— Estou, alfa. Obrigado.

— Eu te prometo que ninguém mais vai te incomodar, querido. — ele o


olhava pro fundamente.

— Obrigado... — ômega falou baixinho.

Desmond nem sequer terminou de comer. Pegou seu chapéu, deixou o


dinheiro sobre a mesa e saiu fuzilando de raiva. Minutos depois todos os
executores estavam convocados para uma reunião em sua fazenda.

— Chamei vocês aqui pra explicar uma coisa e serei breve. Tem um lobo
ômega morando vivendo entre nós, como muitos de vocês já sabem. Ele
trabalha na Tracy, acho que alguns já o viram. Quero que saibam que quem
mexer com ele será punido. Ou terá que me desafiar. Tem um motivo pra
ele estar vivendo aqui. Motivo particular que não interessa a ninguém.
Além disso, ele é meu companheiro e quem ousar importuná-lo arcará com
as consequências. —

Desmond falava com calma, mas havia uma ferocidade em seus olhos que
nem todos conheciam.

— Na verdade, como vocês sabem, não quero vocês importunando


ninguém.

Principalmente os ômegas. Mas se eu desconfiar que alguém desagradou


meu companheiro as coisas ficarão bem sérias. Espero ter sido claro.
— Sim, alfa... — os homens concordavam.

— Podem ir.

Alguns dos executores foram até o alfa cumprimentá-lo antes de ir embora,


porque sem dúvida encontrar o companheiro era um acontecimento e tanto.
Eles só não sabiam que o próprio companheiro de Desmond ainda não
sabia.

Ainda perdido e confuso com tudo o que tinha passado, além das mudanças
pelas quais sua vida enfrentava, ele não fazia ideia de que seu companheiro
estava à sua frente, esperando por ele, ansioso para ser reconhecido.

Capítulo 14

Cody e Abel tinham se tornado amigos e o lobo estava feliz por enfim
poder ter amigos em paz, sem que alguém o tentasse impedir ou atrapalhar.
Tirando um ou outro idiota como Kevin, no geral os ursos pareciam muito
bons e bastante respeitosos. E era verdade, ele podia trabalhar até estando
no cio que não mexiam com ele.

Por isso, ele estava tranquilo naquele dia. Imaginou que depois da bronca
do alfa, Kevin não apareceria lá tão cedo. Mal sabia Cody que Kevin não
apareceria nunca mais na lanchonete.

Pelo menos não enquanto ele estivesse trabalhando lá.

Ficou pensando muito naquilo, no alfa o defendendo. Além de Cameron


que o tinha salvo do espancamento de Rhett, nunca alguém o tinha
defendido daquele jeito e de certo modo ele se sentia estranhamente bem,
enquanto limpava o balcão e lembrava do dia anterior. Nem percebeu Abel
entrar.

— Uma cerveja, por favor, senhor garçom. — o ômega urso brincou.

— Oi! — Cody sorriu como se tivesse acabado de acordar.

— Tudo bem?
— Tudo ótimo. E você? — Cody perguntou, entregando a cerveja aberta.

— Bem também.

— Como andam as coisas com seu companheiro? — o lobo parou para


conversar, aproveitando que o lugar estava vazio.

— Estamos bem. Indo devagar. Mas ainda não consigo confiar nele. —
Abel tomou a cerveja da garrafa.

— O Finnegan é uma das melhores pessoas daquela alcateia. Ele é um cara


legal. — Cody falou, sem querer se prolongar, porque ele também não
sentia muita confiança nos homens e achava que qualquer um poderia
mudar de postura de repente. Embora ele soubesse, no fundo, que Rhett deu
sinais de agressividade desde o início.

— Acho que o problema sou eu... — Abel lamentou. — Mas nós temos
saído sempre e eu gosto de ficar perto dele.

— Hum... isso é bom... e não rolou nem um beijinho? — Cody brincou.

— Não. Enquanto eu não sentir confiança, não vai rolar nada. — Abel
franziu as sobrancelhas, fazendo sua cara de menino bravo.

— E ele não pede?

— O quê? Um beijo?

— É. — Cody sorria.

— Não...

— Acho que até eu que também não consigo confiar ia querer beijar meu
companheiro... o homem deve ter mesmo bastante autocontrole.

O lobo sorriu ao dizer e disse sem qualquer intenção profunda ou


significado subentendido.
Apenas falou o que pensava, sem saber que aquilo afetaria Abel de várias
maneiras. Isso porque, a partir daquilo, o urso ômega passou a teorizar e
criar paranoias que lhe diziam que Finn já não o queria mais, que ele tinha
se acostumado a ser apenas seu amigo e não precisava de nada além disso.
Abel passou então a analisar as atitudes do lobo para ver se fazia sentido o
que vinha pensando. Afinal, ele era um ômega e o lobo seu companheiro.
Quem aguentaria ficar perto de um companheiro ômega sem tentar possuí-
lo? Sem tentar um beijo que fosse?

Que merda eu quero, afinal?! Ele se questionava ao pensar que não queria
que Finnegan o tocasse, mas ao mesmo tempo achava estranho — e talvez
até um pouco ofensivo — o fato de o cara nem tentar. Abel tentava lidar
com suas próprias contradições, enquanto observava as atitudes do beta dos
lobos.

— Depois do jantar você quer ver um filme lá em casa? — Finn perguntou,


quando dirigia para o restaurante em que jantariam.

— Sim. — Abel respondeu e em seguida olhou para o lobo para ver se


decifrava algum sinal em seu rosto.

Possivelmente ele tinha alguma segunda intenção ao chamar Abel para a


sua casa. Mas no rosto de Finn brilhou um sorriso normal de satisfação,
nada que indicasse uma alegria fora do comum. Era verdade que eles já
tinham estado sozinhos tanto na casa de um quanto na do outro, mas estar a
sós não era algo que faziam o tempo todo e Abel pensou que talvez Finn
poderia ficar um pouco mais feliz do que demonstrava.

Jantaram em um restaurante francês, o único da cidade, que particularmente


o ômega não gostou muito, mas nada disse, a fim de não desagradar o beta
que parecia já não saber mais aonde levá-lo. Os dois se divertiram no jantar,
porém. Davam-se bem, riam juntos, falavam bobagens, mas nada de o beta
fazer algum movimento em direção a Abel.

Já em casa, por estar frio, Finnegan acendeu a lareira e abriu um vinho. A


bebida era mais para criar um clima do que para se embebedar mesmo,
porque sendo os dois shifters, praticamente nada os deixava alterados. Era
mais fácil a presença dos companheiros, ou o cio dos ômegas afetarem os
shifters, já que entre eles só ômegas tinham cio, do que ficarem
embriagados por álcool.

Mas, aparentemente, Abel não afetava tanto seu companheiro como ele
imaginava, como Finn o afetava, e aquilo já começava a causar
preocupação.

Sentando-se no sofá, Finnegan ligou a tevê e entregou o controle para que


Abel escolhesse um filme.

— Pode escolher você. — Abel falou, enquanto o olhava, analisando seus


modos.

Percebia que o homem já não o admirava furtivamente como no começo,


quando pegava Finn babando por ele escondido, com uma carinha de bobo.
Finn parecia apenas à vontade e acostumado com ele. Tomado pela
preocupação e pela insegurança e ainda sob aquele forte de desejo de testar
os limites do homem, Abel resolveu mudar o jogo.

— Estou com frio. — ele falou.

— Vou pegar uma coberta pra você.

— Não! — Abel colocou a mão em seu braço, impedindo-o de levantar. —


Se eu me cobrir vai ficar muito quente. Posso ficar perto de você?

— Claro. — Finnegan falou com naturalidade, quando na verdade seu


estômago estava como se fervesse.

Sem rodeios, Abel foi até ele e o abraçou. Pela primeira desde o famigerado
abraço de Finn, eles se tocavam. Abel ficou trêmulo, arquejante, sem
conseguir prestar atenção às reações de Finn como queria, porque ele
mesmo sofria aquelas reações todas, como se aquele fosse o primeiro toque,
o primeiro encontro.

Talvez fosse porque, pela primeira vez, ele estava realmente mais aberto e à
vontade em torno do lobo e podia aproveitar sem medo os efeitos que seu
corpo sentia. Ele então mergulhou naqueles efeitos e nos braços de Finn,
que se abriram para recebê-lo junto de seu corpo, fazendo Abel acreditar
que com ele tudo poderia ser diferente, porque não dava para comparar
aquele abraço com s outras coisas que ele já tinha vivido com outros
homens. Finn era mesmo diferente para ele.

O intuito era provocar alguma reação no lobo, mas ao se ajeitar em seu


peito, ele próprio teve reações que não esperava, teve sensações deliciosas e
profundas, do tipo que só sente quem encontra o amor de verdade. Absorto
e ensimesmado, Abel não percebeu o coração de Finn acelerar bem perto do
seu rosto. Não notou que ele ofegava e suava frio. Tão preocupado que
estava com o que sentia, ele perdia o que precisava observar, até que
Finnegan aos poucos foi conseguindo controlar seus loucos sinais vitais,
como se a vida pulsasse dentro dele como nunca e Abel continuou achando
que o homem já não o queria. Achava que de companheiros eles se
tornaram amigos, assim em tão pouco tempo e Finnegan já não o desejava
como homem.

Suspirou, aspirando seu perfume, fechou os olhos para aproveitar o seu


calor e durante todo o filme, Finnegan suprimiu seu desejo e sua paixão,
lutando para não demonstrar como Abel o afetava. Seu lindo e perfumado
ursinho ômega, que exalava para ele seu cheiro, aquecendo seu humano e
seu lobo naquele aconchego doce do primeiro abraço prolongado e
consentido.

Finnegan saboreou o céu. Que controle extraordinário ele precisou ter para
controlar a vontade de envolvê-lo com os dois braços, de afundar o rosto
em seus finos cabelos ensolarados.

Claro que o beta queria possuí-lo, afinal ele era seu, mas se daria por
satisfeito, pelo menos naquela noite, se pudesse ter tido um pouco mais de
Abel. O pouco que ele poderia ter degustado, mas que não sabia que podia e
por isso dirigia de volta para a alcateia, depois de deixá-lo em casa, ainda
ébrio por ele, como se precisasse de mais, como se sempre fosse
insuficiente, a despeito do avanço daquela noite.

Em sua cama, Abel mantinha os sentimentos confusos e conflitantes, mas


algo aumentara dentro dele depois daquele abraço de duas horas. Sua
vontade de voltar a ser desejado pelo lobo crescia como o seu próprio
desejo por ele. Porque se no fim das contas é isso que companheiros
sentem, esse desejo incontrolável e inconteste, porque o seu só aumentava
enquanto o de Finn diminuía?

Sem saber que estava perdido, Abel se perdia. E sem saber que estava
apaixonado, ele sofria.

***

Na casa de Russell tudo ia bem como nunca. Cameron e Billy já tinham se


mudado e os três viviam como uma família. Apesar do clima de lua de mel
entre os companheiros acasalados, os dois deixavam as manifestações de
amor mais carnais para depois que Billy já estivesse dormindo, mas não se
furtavam a dar beijos de bom dia nos lábios e de segurar a mão um do
outro.

Em dada manhã, acostumado acordar mais tarde, o alfa pegou Cam


explicando de um jeito palatável para uma criança o que eram
companheiros e apesar de sua doçura característica, Cameron não parecia
nada lento. Ele era diferente, apenas. Até podia ser confuso com algumas
coisas, mas sabia o que estava fazendo com relação à educação do sobrinho
e Russell sempre sorria quando presenciava cenas como aquelas daqueles
dois, que tinha conquistado seu coração.

— Então eu também vou ter um companheiro, titio?

— Você pode ter uma companheira. Ainda não sabemos, porque isso só vai
acontecer quando você crescer. E você ainda nem foi pra escola. —
Cameron dizia, enquanto colocava as coisas na mesa para o café da manhã.

— Tio, Rus! — Billy correu para os seus braços, enquanto ele estava
parado na entrada da cozinha, vendo os dois à vontade na casa, exatamente
como ele queria que fosse.

Tinha conseguido que Billy deixasse de chamá-lo de "tio alfa", mas de vez
em quando ainda escapava, ao que ele não o repreendia. Sentou-se para
comer com eles, depois de selar os lábios do companheiro, com quem tinha
feito amor por longo tempo na noite anterior e percebeu que ele precisava
começar a acordar mais cedo, porque não queria perder aquilo. A delícia de
tomar café da manhã com a sua família.

***

O bando dos ursos não era numeroso, mas por ser unido e harmonioso,
comemorações eram comuns. E sempre perto do fim do inverno eles faziam
uma festa ao ar livre, na qual todos levavam suas especialidades na cozinha
e eles realizavam um grande almoço coletivo, com uma enorme fartura de
pratos doces, para celebrar antecipadamente a ida do frio.

Não que a primavera e o verão fossem muito quentes, mas eram mais
amenos e isso merecia ser celebrado.

Como cresceu entre os ursos, Russell foi convidado para a comemoração


pelo próprio pai, que foi junto com a companheira jantar na alcateia e
puderam conhecer o companheiro do filho e seu sobrinho Billy.

Os dois se encantaram pelo garotinho e estavam orgulhosos e felizes por


Russell. Era visível sua felicidade e que pais não desejam mais do que tudo
ver os filhos bem?

Russell então confirmou sua presença e disse que levaria Cam e Billy.

— E como está indo Cody? — Rus perguntou aos pais.

— Parece que está indo bem. O vemos pouco e ele não dá trabalho nenhum,
filho. — disse a mãe.

— Eu soube que ele é companheiro do alfa. — Kirk falou como se desse


um "bom dia".

Cameron engasgou, Russell riu.

— Não brinca! — exclamou o alfa.

— Sim. Parece que eles não estão acasalados, mas Desmond já contou que
são companheiros pros executores. Não sei se contou pro rapaz. — Kirk
brincou.
— Talvez não seja fácil pra ele. Acabou de sair daquele relacionamento
horrível.

— Amor, o alfa dos ursos é bom como você? — Cam perguntou


preocupado. Russell sorriu e pegou sua mão para beijar.

— Desmond é uma ótima pessoa. Cody será feliz se aceitar ficar com ele.
— Russell tranquilizou o companheiro.

— Fique tranquilo, querido. Nosso alfa é um homem maravilhoso. Só não é


melhor do que o seu. — a mãe de Rus fingiu cochichar a última parte,
tirando um risada gostosa de Cam, que apertou a mão de Russell com
fervor.

Depois do jantar, os quatro ainda ficaram um bom tempo conversando,


enquanto Billy dormia no colo de Cameron, que acabou não indo até a porta
se despedir dos pais do companheiro.

— Fique aí, querido. Está frio lá fora. — disse a mãe de Russell. — Mas foi
um prazer conhecer você e espero vocês três na festa. — disse ela,
acenando de longe para não acordar o garotinho.

— O prazer foi meu. Muito obrigado pelo convite. — Cameron sorriu,


despedindo-se de Kirk em seguida.

Quando entrou, Russell pegou Billy do colo do companheiro com cuidado e


o colocou em seu quarto. Depois os dois foram tomar banho juntos antes de
dormir, para encerrar bem aquela noite que já tinha sido perfeita.

***

Muito mais tranquilo, Cody foi trabalhar ainda estando no cio. Estranhou
apenas que Desmond não apareceu por lá no dia após o incidente com
Kevin. A verdade é que Desmond chegou a ir até a porta, mas ao sentir o
perfume do cio do seu companheiro, ele nem chegou a tirar o chapéu, indo
embora antes mesmo de entrar.
Ele não era um descontrolado. Depois de viver por tantos anos, tinha
adquirido aquela calma e paciência necessárias para lidar com os problemas
diários. Mas tudo o que envolvia Cody parecia forte demais para ele e
diferente de tudo o que ele já conhecia. Era apenas dolorido sentir o
perfume do seu ômega sem poder tocá-lo, ainda que brevemente,
carinhosamente.

Nem precisava ser algo sexual, embora ele quisesse muito algo sexual com
Cody também. O fato é que ainda que ele não tivesse medo de se
descontrolar, era difícil estar no mesmo ambiente que seu companheiro no
cio. Seu urso ficava todo agitado, assim ele preferiu voltar dois dias depois.

O coração de Cody mudou o ritmo e a intensidade das batidas ao vê-lo


depois de dois dias.

Seu sorriso se esticou de modo que ele não conseguia disfarçar a felicidade
ao ver o alfa e Desmond também não conseguia esconder o entusiasmo ao
vê-lo.

— Ai, ai... o amor... — Tracy cantarolava uma provocação passando atrás


de Cody, mas ele não deu atenção, porque seu olhar e seu sorriso tinham um
rumo certo e estavam aprisionados no rosto másculo do urso alfa.

— Oi, alfa. — Cody falou, todo sorridente, mas ainda ignorando que o
homem era seu companheiro.

— Tudo bem, Cody? — Desmond sentou perto dele no balcão,


diferentemente do que fazia todos os dias.

— Tudo bem. Posso te servir alguma coisa?

Desmond sorriu, esforçando-se para espantar os pensamentos desonestos.

— Acho que vou querer um uísque.

— Sem gelo, certo? — o ômega indagou sorridente.

— Isso. — Desmond o observava, enquanto ele se movia para pegar a


bebida. Sua imagem era tão estonteante quanto seu perfume e tudo nele
envolvia o alfa como numa suave rede confortável da qual ele não queria se
desprender.

A noite já ameaçava chegar e embora não ficasse embriagado como os


humanos, Desmond não gostava de beber durante o dia. Achava
deselegante e um pouco derrotista, mas como ele já tinha almoçado havia
tempo, precisava de algum pretexto para ficar ali perto do ômega. Na
verdade, ele não precisava, ele queria um pretexto, porque tinha um motivo
forte para estar ali.

— Logo vai dar seu horário de ir embora, não é?

— É, sim, alfa...

— Você me deixaria te levar para a sua casa? — Desmond parecia


tranquilo. Por fora, ninguém via aquelas fortes pontadas em seu peito e
estômago que fazia tanto tempo que ele não sentia que achou nem ser mais
capaz de ter tais sensações.

— Não precisa se incomodar, alfa... — Cody respondeu nervoso.

— Não será incômodo. Eu gostaria muito de te levar...

Cody ficou totalmente confuso. Enquanto ele apenas olhava para o homem
de longe, de vez em quando, tudo estava sob controle. Era um homem
bonito, atraente e nada mais. Mas receber um convite, mesmo para algo tão
banal, colocava a coisa em outro patamar. Ele talvez não estivesse
preparado para estar sozinho com um homem. Com qualquer que fosse.

Mas ele podia recusar um convite do alfa? Seria cordial de sua parte fazer
isso com o homem que estava lhe dando abrigo em seu bando? Tanto tempo
acostumado a receber ordens, que Cody nem sabia o que dizer quando
podia escolher. E se por um lado ele gostava de estar próximo a Desmond,
por outro, ele tinha medo. E isso talvez foi a única coisa que o fez ficar
parado, olhando para o alfa sem saber o que responder.

— Você não é obrigado... — Desmond sorriu suave e tão simpático, que


Cody se animou.
— Tudo bem. Mas eu saio em meia hora.

— Não tem problema. Eu espero. — disse o alfa. — Eu esperaria mais se


precisasse. — ele sorriu, deixando Cody envergonhado.

Nos trinta minutos seguintes, Cody atendeu as mesas, enquanto Tracy


serviu outra dose de uísque para o amigo.

— Ele ainda está muito machucado. — Tracy falou. — Vá devagar com ele.

— Eu sei, Tracy. Não pretendo machucá-lo mais, ou apressar as coisas.

— Você está apaixonado, meu amigo. — ela jogou um sorriso malicioso,


secando as mãos no avental verde.

— Ele é meu companheiro, Tracy. Você tem ideia de como eu me sinto? De


como esperei por ele?

— Tenho. Quando meu companheiro apareceu eu fiquei completamente


louca. Sei bem o que você diz e por isso te digo: tenha calma, porque Cody
é especial.

— Eu tenho toda calma do mundo. — Desmond parou de falar quando


Cody chegou, avisando Tracy que estava indo embora.

Tirou o avental, dobrou para levar para a casa, porque estava sujo e ele fazia
questão de lavar os próprios aventais. E, um pouco nervoso, despediu-se da
dona da lanchonete e de Glenn.

— Vamos? — o alfa chamou.

— Sim.

Os dois se olharam e saíram pela porta, preparando-se para ficarem


sozinhos pela primeira vez.

Capítulo 15
Desmond destravou as portas de sua SUV e a abriu para que Cody entrasse.
O urso era um homem de outra época. Apesar de se atualizar bem aos novos
tempos e até mesmo à tecnologia, o alfa tinha alguns hábitos antigos que
certamente destoavam de muitos homens mais jovens.

Desde a forma que ele olhava para Cody, até seu modo de falar com ele,
tudo eram muito distinto daqueles usados por Rhett ou até mesmo por
alguns antes dele. Se bem que nem se Rhett vivesse por trezentos anos, ele
teria a metade da elegância viril e da hombridade de Desmond. Isso era algo
que simplesmente não fazia parte dele.

Enquanto iam para a fazenda de Kirk, Cody se lembrava do ex. Não


conseguia evitar que ele viesse à sua mente como uma assombração.
Lembrou de que no começo era melhor, mas nunca fora de fato bom. E
sempre que pensava nisso se sentia culpado por não ter colocado um fim
antes.

Foi impossível que sua mente não o carregasse ao tempo em que ele chegou
a querer ter uma relação séria com Rhett. Cody já quis que ele ficasse e o
assumisse. Presumindo que não encontraria mesmo seu companheiro e com
medo de ser usado pelo alfa, ele pediu para o namorado reivindicá-lo, para
ele ir morar com ele, mas Rhett sempre se recusava.

Agora só de imaginar tal coisa ele se arrepiava de desespero. Sem saber que
estava ao lado do homem que a vida lhe tinha reservado, ele lembrava de
Rhett o rejeitando e ainda que nunca mais quisesse vê-lo, doía.

— Pra que isso, Cody? Já estamos juntos. Isso não basta? — Rhett
costumava dizer.

— Mas Rhett... — Cody tentou ficar com o homem. Como um tolo.

— Chega dessa conversa. Não quero mais falar disso. — era o que ele
sempre falava em resposta.

Então Cody olhou para Desmond, tão calmo e suave, grande e bonito. Não
parecia o tipo de homem que trataria alguém mal à toa.
— Não precisa ficar com medo de mim. — o alfa falou, como se lesse seus
pensamentos.

— Aliás, eu sinto muito por não ter encontrado você antes e te poupado de
passar pelo que você passou. — Desmond falou sem que Cody
compreendesse ao todo suas palavras.

Mesmo sem entender por completo, ele estremeceu. Não de medo, mas de
algo que ele não compreendia bem, mas o atingia fortemente no centro do
peito. Desmond tinha acabado de estacionar em frente à casa de Russell na
fazenda e os dois então se olharam sem saber mais o que falar.

Então Desmond pôs os pés pelas mãos e trocou as borboletas no estômago


de Cody por um súbito medo do futuro.

— Você gostaria de sair comigo um dia desses, Cody? — foi o que


perguntou o alfa, ainda precocemente, fazendo o ômega se arrepiar de
medo, encolhendo suas negras sobrancelhas grossas e expressando no rosto
todo o seu receio.

— Eu... — ele tremia e suava. — Eu agradeço, alfa, mas... acho que ainda
não estou pronto para isso... — ele tentou ser respeitoso, dentro do turbilhão
de sentimentos que o assolava.

— Claro... — Desmond engoliu saliva, claramente sem jeito. — Eu... sinto


muito, Cody.

— Tudo bem, alfa... eu... boa noite. Obrigado pela carona. — o ômega
correu com as palavras, descendo do carro, entrando rápido em casa.

Ele tinha acabado de dar um fora no alfa. E se por um lado isso era ruim,
porque talvez no fundo ele queria ter coragem para ter um encontro com
aquele homem tão intrigante e diferente de tudo o que ele conhecia, por
outro ele sabia que devia estar orgulhoso de si mesmo, porque conseguiu
dizer "não" e fazer valer sua vontade. Ele não estava estragado, de todo
modo. Mas esperava que a recusa não o fizesse ser expulso, porque se isso
acontecesse, Cody certamente não teria mais motivos para acreditar em
ninguém.
***

Seria impensável para Desmond mandar Cody embora por uma recusa, ou
por qualquer outra coisa. Isso nem sequer passou por sua cabeça, mas ele
estava com vergonha por ter se precipitado e por esse motivo não foi à
Tracy no dia seguinte, nem no outro. Não sabia como olhar para Cody
depois daquilo e não queria que o ômega se sentisse pressionado aceitar um
convite apenas pelo fato de ele ser o alfa.

Depois de ter deixado clara a sua intenção, Desmond achou que era hora de
se afastar, deixando Cody em paz. Não era como facilidade que ele fazia
isso, porém. Sozinho em sua casa, toda noite, o alfa pensava nele,
imaginando quão boa a vida podia ser ao seu lado. Sonhando e desejando
que um dia Cody conseguisse superar o que tinha passado e sentindo a dor
aguda de sua ausência.

Tinha vivido sem ele até então, mas depois de o encontrar, parecia que não
seria mais capaz de ter uma vida feliz se não fosse ao seu lado. Suas noites
pareciam vazias e durante o dia ele precisava controlar sua vontade
desnorteante de correr até ele e se certificar de que Cody estava bem.
Mandava executores disfarçadamente à lanchonete, tinha reforçado a
segurança e colocado homens à disposição de Russell para ajudar a
encontrar Rhett, mas Russell estava em lua de mel e a cada dia as buscas
iam se tornando menores.

Cody passou quase uma semana sem ver o alfa. Nesse tempo, muitos
questionamentos surgiram, enquanto ele enfrentava altos e baixos diante
daquela abstinência. Ele tinha consciência de que deveria estar preocupado
apenas em esquecer Rhett e ter uma vida normal, mas era impossível não
notar que a ausência de Desmond o incomodava. Impossível não se
importar com aquilo ou não esperar com ansiedade evidente que ele
entrasse pela porta, tirando seu chapéu e jogando um sorriso atraente e
suave para Cody.

Tais pensamentos, vez ou outra, davam lugar à ideia de que aquilo de fato
era melhor, a ausência e o afastamento. Não queria se meter em problemas
outra vez e embora tivesse menos medo que Abel, mesmo tendo sofrido
mais, ele ainda assim tinha medo.
A mente é um mistério. Cada uma contém em si um universo, cheio de
segredos e recantos próprios, únicos, que acabam por ajudar a fazer de cada
pessoa um ser singular. E a singularidade de Abel o fazia mais medroso que
Cody, embora parecesse completamente o contrário, mas uma coisa os dois
tinham em comum. Os dois estavam apaixonados. E outra coisa eles tinham
de diferente: Abel já sabia que Finn era seu companheiro, enquanto Cody
ainda não fazia ideia.

Isso até chegar o dia da festa. E esse dia foi um divisor de águas.

Como sempre, duas enormes mesas foram armadas no gramado da fazenda


do alfa. O

entorno decorado com bandeirinhas e flores davam boas-vindas à primavera


que ainda não estava tão perto. As pessoas vestiam seus casacos e alguns
costumavam se transformar em seus ursos para simular alguma luta na
grama. Coisa de urso. Se tinham seus companheiros ou companheiras por
perto aquela exibição era quase como uma dança de acasalamento,
altamente estimulante.

Evidentemente que Desmond não faria algo como aquilo, embora seu urso
tivesse uma vontade imensa de se mostrar para Cody. Sua discrição, porém,
o impedia. Os outros ursos, no entanto, não eram como ele e assim que
Cody chegou, escoltado por um executor, um urso que estava sentado
próximo ao alfa gritou:

— O companheiro do alfa! Sente aqui perto dele!

— Paul! — Desmond tentou repreendê-lo discretamente, mas não adiantou,


o homem continuou gritando.

— Aqui!! Companheiro do alfa! — ele acenava para Cody.

— Eu? — o lobo perguntou, olhando em volta, procurando por outra


pessoa, sentindo a cabeça rodar.

— Sim! Você mesmo! — o homem sorria, feliz por estar fazendo um favor
de ceder o lugar ao companheiro do alfa, mas Cody estava totalmente
confuso. Desmond não sabia bem o que fazer, então se levantou.

— Eu acho que ele me confundiu com alguém... — Cody olhou para


Desmond que estava em pé. O alfa não disse nada. Não sabia o que dizer e
simplesmente não conseguia negar. Estava prestes a se desculpar por não ter
contado para ele antes, quando Cameron e Russell chegaram e tomaram sua
atenção.

Respirando aliviado, Desmond joga um olhar feio para Paul, que acena para
ele sorridente, achando que fez uma coisa boa. O alfa apenas revira os
olhos, pensando no que alguns de seus homens tinham de bons, tinham
também de tapados.

Algumas pessoas já comiam e se divertiam, quando o alfa foi cumprimentar


Russell e seu companheiro que tinham acabado de chegar.

Enquanto Cody falava com o pequeno Billy, ainda meio atordoado com
aquela coisa de companheiro, o alfa conversava com os lobos. Em seguida,
Russell foi falar com Cody, para saber como ele estava. Só depois dos
cumprimentos, eles foram sentar e Cody se sentou com os lobos, em vez de
sentar no lugar vago ao lado do alfa. Não por desfeita, ou algo do tipo, mas
porque até o momento ele estava convicto de que o cara tinha se
confundido. Ele não era o companheiro do alfa.

Desmond ficou um pouco chateado com aquilo, porque, afinal, ele o queria
ao seu lado.

Todos comiam e conversavam felizes. Os lobos foram bem recepcionados,


pois os ursos eram em sua maioria hospitaleiros e enquanto a celebração
acontecia, o urso alfa olhava furtivamente para o seu companheiro, a fim de
verificar se ele estava se divertindo. Era importante para Desmond que o
ômega se divertisse, mas ele o notava tenso. Por mais que sorrisse ao
conversar com Cameron e com Billy, algo parecia incomodá-lo e,
preocupado, assim que ele se levantou para ir ao banheiro, Desmond foi
atrás dele. Esperou um tempo para ver onde ele ia e depois que viu ele
entrar em sua casa, seu coração bateu forte e ele foi atrás.
O alfa não esperava que ao sair do banheiro, Cody fosse encontrar um
membro do bando que fosse parabenizá-lo por ser seu companheiro. Se
soubesse, ele teria virado as costas e saído quando ainda dava tempo, mas
Cody já o tinha visto, não sendo mais possível retroceder.

— É um prazer conhecer o companheiro do alfa! — o executor apertava a


mão de Cody, que o olhava confuso.

— Não. Você deve estar me confundindo... — ele dizia para o homem que
sorria e apertava sua mão.

— Você é Cody, não é? O lobo?

— Sim...

— Então! Parabéns! Espero que sejam muito felizes!

Cody nem conseguiu agradecer. Olhou para Desmond que chegava e


perguntou:

— Por que ficam me dizendo que sou seu companheiro?

— Bem... — Desmond pensava em como responder ele.

— Eu sou? — a cor tingiu as maçãs de seu rosto e um brilho rosado cobriu


seus lábios, tornando-os ainda mais desejáveis para o urso.

— Sim. Eu sinto muito se eu não sou do seu agrado...

— Eu... — Cody se sentia tonto, com sentimentos girando dentro dele. —


Porque você não me falou?

— Achei que fosse perceber.

— Eu... eu quero ir embora... — Cody falou.

— Eu sinto muito, Cody. Me deixa te levar...


— Não precisa... — o ômega estava realmente confuso, precisando estar
sozinho.

— Vou pedir para alguém te acompanhar, então. — Desmond informou,


com chateação dançando nos olhos.

— Eu quero ir sozinho.

— Eu prefiro que alguém te acompanhe, por segurança.

Cody consentiu com a cabeça, envergonhado demais para olhar nos olhos
do homem.

— Ei... — Desmond segurou com leveza seu queixo e o levantou. — Eu


não vou te obrigar a ficar comigo. Ser meu companheiro não significa que
você é obrigado a fazer nada que não

queira. — ele o soltou. — Se você preferir eu paro até de ir à lanchonete, tá


bom? Não quero que tenha medo de mim.

Mais uma vez, Cody balançou a cabeça.

— Pode ficar tranquilo.

Foi a última coisa que Desmond falou antes de pedir para uma executora
levar o ômega até sua casa. Sentia-se quase obrigado a se desculpar por ser
companheiro do cara e isso partia seu coração dentro do peito. Voltou à
festa sem vontade de festejar e desejando que terminasse logo, porque para
ele não havia mais motivo de comemoração.

Assim como não havia para Abel, que tinha convidado Finn e o esperou,
mas ele não foi.

Oscilando entre a chateação, a decepção e a raiva, ele também foi para a sua
casa mais cedo, disposto a não responder mais as mensagens do lobo.

Mas logo que anoiteceu ele não aguentou e foi descobrir porque Finn não
tinha ido até lá, afinal. Já tinha tomado banho e estava deitado para dormir
quando a agonia bateu e ele precisou pegar o carro e ir até a alcateia. Por
mais que todos dissessem que aquilo era perigoso, Abel não ouvia ninguém.

— Tem alguém com você? — Abel perguntou sem rodeios assim que Finn
abriu a porta.

— Não. — Finnegan sorriu, vendo o ômega cheirar o ar em busca do rastro


de alguém.

— Você não quer mais sair comigo? — ele perguntou em seguida.

— Claro que quero.

— Então por que você não foi à festa hoje?

— Porque eu pensei que talvez você quisesse uma folga de mim.

— Pois eu não quero. Quando eu quiser, eu te falo.

— Tá bom.

— Você quer uma folga de mim, não quer?

— Não... eu nunca vou querer uma folga de você, Abel.

— Então por que não foi, poxa? Eu fiquei te esperando.

— Me desculpe... eu... pensei que me convidou por educação.

— Finnegan! Eu sou mal-educado. Você não percebeu ainda? — Abel


sorriu lindamente e Finn quis tanto abraçá-lo que seu corpo doeu. E aquele
era o verdadeiro motivo para ele não ter ido à festa. Ficar perto dele sem
poder tocá-lo era tão dolorido quanto ficar longe e às vezes ele precisava
revezar entre a dor no corpo e a dor na alma.

— O que você está fazendo?

— Vendo um filme.
— Posso ver com você? — Abel pediu.

— Claro. — Finn deu passagem. — Você está com fome?

— Não. Comi o dia todo.

A casa estava quente, aconchegante. No sofá, almofadas e um cobertor. O


filme pausado indicava que o beta falava a verdade e assim que Finn sentou
no sofá, seu tormento começou.

Sentando entre suas pernas, Abel se aninhou nele, como se fossem


namorados, como se estivessem acostumados àquilo, como se Finn pudesse
tocá-lo.

— Eu não gostei de ficar sem você... — Abel sussurrou perto de seu


pescoço, consciente do que poderia causar no lobo.

Já não tinha mais em mente a tola ideia de levá-lo à loucura, de testar seus
limites. Abel apenas queria que Finnegan cedesse sem que ele precisasse
pedir, mas Finn não podia fazer isso e correr o risco de perder seu
companheiro para sempre. Era preferível ter aquelas dores horríveis nos
testículos, do que ofender e magoar Abel.

Ele não sabia que Abel não se ofenderia mais. Que já tinha ganhado a
confiança do ômega depois de tantos dias de brava resistência. Mas ele
ainda resistia. E mesmo com uma almofada ali entre eles, era como se Abel
estivesse em seu colo, com a cabeça deitada ora em seu peito, ora perto de
seu pescoço. E toda vez que ele falava, seu hálito quente fazia com que o
lobo se arrepiasse e quisesse abraçá-lo.

Abel sentou, abraçou, sussurrou e até deitou sobre Finn e o homem


resistindo fortemente à maior tentação da sua vida que era o seu delicioso
companheiro ômega ali dançando sobre seu colo, tentando seduzi-lo meio
desajeitadamente.

Até que Abel dormiu, e ele ficava lindo dormindo também. Finn sorriu
olhando para ele, sua respiração já ficando pesada, como seu corpo, e
enroladinho no do beta.
Finnegan latejava ainda nas suas calças quando achou melhor levar Abel
para dormir na sua cama. Resolveu que dormiria ali no sofá mesmo, assim,
o ajeitou em seu colo, ouvindo uns poucos resmungos baixos, que o fizeram
sorrir e se levantou, levando-o em seu colo.

Com o sono ainda leve, Abel acordou no meio do caminho. Suspirou ao ver
que flutuava nos braços de Finn e passou os seus em torno do pescoço do
lobo.

— Você vai me levar pro seu quarto? — ele murmurou no ouvido do alfa.

— Vou... mas não se preocupe. Não vou ficar lá com você.

Com o coração disparado por estar indo para o quarto do companheiro em


seus braços e vendo que Finn não voltaria atrás em sua promessa, Abel
tomou atitude ele mesmo e beijou a boca do beta quando entravam quarto.

Completamente aturdido, Finn parou. Não com o beijo, apenas de andar. E


com Abel ainda nos braços, ele se entregou ao primeiro beijo que sua boca
ganhava do seu companheiro.

Seria impossível que ele não correspondesse ao toque dos lábios do homem
que era dele.

Finn podia resistir à vontade de ir até ele, de tocar sua pele, de abraçá-lo,
mas fugir de um movimento de Abel ele jamais faria. Se aquilo fosse um
teste, ele não passaria, porque não só permitiu que a língua do seu ômega
invadisse sua boca, como brincou com a sua na boca dele, massageando e a
pressionando contra a língua ávida do ômega, que parecia saber bem os
caminhos que desejava percorrer.

Sem romper aquele beijo tão esperado, Finn voltou a andar e colocou Abel
na cama. Deixou um beijo curto em seus lábios para encerrar aquele longo e
tratou de sair rapidamente do quarto.

Abel queria muito pedir para ele ficar, mas com o corpo todo dolorido e
extasiado como estava, ele não conseguiu dizer nada. Seu peito se movia
aceleradamente e ele só queria correr para a sala, pular no colo do seu
homem e pedir pra beijar sua boca até o amanhecer. Mas ele ainda não
conseguia se mover, seu corpo dava sinais de excitação evidentes demais
para que ele conseguisse ir até lá e apenas beijar o homem. Então ele ficou.
Levou um bom tempo para conseguir dormir, mas Abel estava feliz e
realizado, porque passaria a noite na cama do seu companheiro, sentindo o
cheiro gostoso e lembrando do sabor do seu beijo.

Capítulo 16

Finnegan apertava os lábios, um contra o outro, deitado no sofá, sorrindo,


lembrando do beijo do seu ursinho bravo. Também foi difícil dormir, ainda
mais com o cheiro de Abel por toda a sua roupa, em toda a sua casa.

A proximidade com a primavera trazia uma chuva fria e persistente, mas


Finn fez questão de acordar cedo para preparar o café da manhã para seu
companheiro. Comeram juntos, sem se tocar e sem mencionar o beijo da
noite anterior. Abel estava mais quieto que de costume e não tinha feito
nenhuma de suas piadas sobre a possibilidade de Finn fazer xixi em suas
pernas, já que era um cachorro. O urso estava mais sério que o normal e foi
logo embora. Claro que o lobo não queria que ele fosse, mas ainda pisava
em ovos com ele e, sem saber o que podia fazer, não pediu para ele ficar.

A indefinição pairou no ar durante todo aquele dia, até que, à noite, o lobo
achou que deveria pelo menos enviar uma mensagem dizendo que tinha
amado aquele beijo mais do que qualquer coisa, ou deveria chamar Abel
para jantar. Entre confessar seu óbvio sentimento e ter a possibilidade de
ver o seu ômega, ele escolheu a segunda opção, e foi buscar Abel na
fazenda sem fazer a confissão.

Levou-o para jantar em vez de jantarem em sua casa, conversaram e se


divertiram como sempre faziam, porque nessas coisas os dois já tinha
alguma intimidade e Finn adorava o humor do urso, sempre irônico e um
pouco ácido, mas muito mais meigo do que podia supor.

Sem saber para onde ir depois do jantar, Finn dirigiu de volta para a
fazenda, parou em frente à casa de Abel e então os dois se olharam.
— Achei que você ia me levar pra sua casa. — Abel me eu nos cabelos ao
falar e Finn sabia que aquilo significava que ele estava nervoso.

— Eu não sabia se você queria ir pra lá.

Impulsivo, Abel o abraçou. Fechou os olhos com força, apertando bem os


braços em volta do homem, aspirando seu perfume. Soltou um gemidinho,
desejando sentir as mãos de Finn o envolver, mas o lobo apenas se deixou
abraçar, sem saber se devia ou podia retribuir.

— Você não sente desejo por mim? — Abel perguntou, soltando-se.

— Muito. Você não pode imaginar o quanto... — Finn sentia o coração o


estrangular.

— Você não gostou de me beijar ontem? — o ômega se aproximou de sua


boca.

— Eu amei, Abel... foi a melhor coisa que já me aconteceu... — o lobo


murmurou.

— Então porque você não me abraça? — seus lábios estavam cada vez mais
próximos.

— Porque eu prometi que nunca mais faria nada sem o seu consentimento.
E eu prefiro não te abraçar do que te perder de vez... você não sabe como
tem sido difícil pra mim todos esses dias...

Abel ofegou, sem dizer nada ainda, foi sobre o seu colo e então falou, ainda
mais perto de sua boca:

— Então você tem meu consentimento, pode fazer comigo o que quiser.

***

Ainda balançado com a revelação de que era companheiro do alfa, Cody


não sabia bem o que fazer com aquela informação. Mas o medo que achou
que sentiria não o atingiu e no fundo ele estava louco para que Desmond
entrasse pela porta da lanchonete para ver como seu corpo reagiria agora
que, enfim, sabia porque gostava tanto do homem.

Passou o dia todo ansioso. Qualquer um que chegava, ele olhava para a
porta, esperando que fosse ele, mas nunca era. Nunca era Desmond.

Não que o alfa não quisesse ir. Estava ele também louco para ver Cody, mas
precisava dar a ele espaço. Já tinha sofrido muito com aquele lobo
desgraçado e a última coisa que Desmond queria era pressionar o ômega.
Então passou o dia ajudando a limpar as coisas de seu quintal, porque o alfa
era um homem de pôr a mão na massa.

Costumava participar das atividades coletivas do bando como qualquer


outro e fazia o que fosse preciso. Depois se reuniu com Kirk em sua casa
para resolver se encerrariam as buscas junto aos lobos. O beta achava que
talvez o lobo que agredira Abel e que provavelmente era o ex de Cody já
devia estar longe e possivelmente era desnecessário continuar as buscas na
mata.

Desmond concordou. Ainda que se sentisse melhor com aquilo, as buscas se


mostravam inúteis e Kirk já tinha conversado com Russell que também
concordava em encerrá-las. Mas manteriam as fronteiras bem vigiadas e as
fazendas também, como sempre faziam.

O beta aproveitou para parabenizar o alfa por ter encontrado seu


companheiro e então Desmond contou para o velho amigo que estava muito
longe de poder reivindicar o seu lindo ômega. Assim a conversa entre os
dois prosseguiu na casa do alfa, enquanto na lanchonete, o lobo sentia em
seu coração uma imensa vontade de ver Desmond outra vez.

***

Depois daquele aval expresso verbalmente, ardentes beijos foram trocados


no carro e Finn se sentiu à vontade para enfim tocar seu ômega sem medo.

— Eu achei que nunca fosse poder sentir o gosto do meu companheiro. — o


lobo confessou, apertando o pequeno urso contra o seu corpo.
— Finn... eu achei que você nunca ia me abraçar assim... — Abel se
enganchou nele, usando um tom notadamente mais manhoso que o normal,
que agradou Finnegan grandemente.

— Eu não podia arriscar outra vez... você é um ursinho muito bravo...

— Não sou um ursinho... — Abel sorriu e se esfregou nele, marcando-o


com seu perfume.

E, inferno, Finn estava louco com essa versão mais doce do seu ômega.

— Você é o meu ursinho, Abel... — Finn falou sem medo e beijou sua boca
em seguida. Um beijo forte e muito mais dominador que os outros, que
deixou Abel ainda mais molinho em seu colo.

— Eu sou chato, Finn... mas eu gosto de você. — Abel cortou o beijo para
se confessar e aquilo era algo que nem ele próprio esperava dizer tão cedo,
mas seu coração já não aguentava mais de ansiedade, assim como seu
corpo, que implorava pelo companheiro.

— Você não é chato... — Finn acariciou seu rosto. — Não posso dizer que
você seja fácil...

— os dois riram. — Mas eu esperaria o tempo que fosse preciso pra você
confiar em mim, meu amor.

— Você me torturou com sua paciência, lobo! Nem eu esperava que você
fosse aguentar tanto... — Finnegan riu ao ver o cenho de Abel se franzir.

— Posso te levar pra minha casa e acabar com essa espera, ursinho?

— Por quê? A minha é logo ali...

— Porque a minha cama é maior e eu sou um lobo grande...

— Você nem conhece a minha cama... — Abel riu.

— Eu esperei por tantos dias, meu ursinho... você não pode mesmo esperar
até chegarmos a minha casa? — Finn falou com jeito.
— Você é um manipulador, lobo! — o urso deu um beijo em sua boca e
desceu de seu colo.

— Mas amanhã quero você na minha cama! — Abel cruzou os braços,


fazendo birra.

— Eu irei aonde você quiser, ursinho... aonde você quiser... — Finnegan


sorria, ligando o carro, preparando-se para passar a primeira noite ao lado
do seu companheiro.

Os dois começaram a se beijar na sala, onde Finn tirou a blusa de Abel,


deslizando as mãos pelas laterais do corpo magro e deliciosamente
musculoso do urso. Era maravilhoso poder tocá-

lo sem receio, mas era ainda melhor poder beijá-lo. Na boca, no pescoço, e
onde quisesse. Tinha carta branca e a usaria com gosto.

Levou-o pela mão para o quarto para lá continuar o que fazia.

— Eu quero te beijar a noite inteira, meu ursinho. — diz Finn, segurando


seu pescoço com jeito, fazendo Abel amolecer.

— Se você me segurar por aí vai ter que fazer mais que me beijar, lobo...

— Então você gosta de ser segurado por aqui, meu pequeno?

— Você gosta de me segurar assim?

Deus, Abel era sexy.

— Você é um safadinho, não é, meu ômega? Quem diria que você gostaria
de se sentir controlado? — Finn sorriu satisfeito.

— Quem diria que você gostava de controlar? — Abel provocou,


entregando os lábios e pressionando o pescocinho contra a mão forte.

— Eu posso te agradar de muitos jeitos, meu amor...

— Eu sou seu amor?


— Claro que é... você é tudo o que eu esperei, companheiro...

— E você vai me morder, Finn? Vai me deixar todo marcadinho?

— Abel... — Finn latejou. — Claro que vou morder você, meu ômega...
mas antes, já que você me chamou cachorro todos esses dias... acho que
está na hora de você me compensar, não acha?

— E como você quer essa compensação, meu lobo?

Ele se aproxima e sussurra em seu ouvido, mostrando o macho dominante


que é.

— Quero que você seja o meu lobinho hoje e comece a me lamber.

Como um garotinho obediente, o ômega loiro fez o que o seu companheiro


lobo mandou e o lambeu todo, antes de Finn cuidar dele de volta, beijando
seu ursinho em toda parte e dizendo a todo momento que ele o pertencia.

Depois de tantos dias de provocações e tantos anos sem ser tocado, não foi
possível que Abel aguentasse muito tempo. Quando as mãos habilidosas do
seu grande lobo o despiram ele já expelia uma quantidade tão grande de
excitação pelo pênis que Finn achou que ele fosse gozar antes que seus
lábios pudessem tocar o seu ponto rosa.

Isso, no entanto, não foi o que mais impressionou Finn, mas, sim, o fato de
haver facas e pistolas nas meias e em fitas amarradas no ômega. O lobo
sorria ao tirar aquelas armas do corpo do seu pequeno companheiro,
colocando cada uma delas sobre a mesinha de cabeceira.

Aquilo tinha o seu charme de qualquer maneira e combinava com o jeito


sexy e arredio de Abel. Mas Finn estava enganado. Abel não gozou antes
que o lobo tocasse seu ânus com a língua, mas pouco tempo depois, antes
mesmo de seu dedo entrar para abrir passagem para o pênis.

Finn sorriu para o ursinho, levando-o para o seu colo, abrigou-o em seu
corpo e acariciou seus cabelos, enquanto o sentia ofegar. Logo Abel
procurou a boca de Finn para mais beijos e ficou duro de novo.
— Você quer entrar em mim agora?

— Você quer, ursinho?

— Quero, lobinho... — Abel sorriu provocador. — Me lubrifique antes.

— Claro, meu anjo... você quer deitar na cama?

— Não. Quero ficar aqui no seu colo...

Finn então se levantou com Abel no colo, fazendo-o rir, pegou o


lubrificante na gaveta e voltou com ele para a cama. Abriu e espalhou em
seu pênis, assim como na porta de Abel, a qual ele massageou e pressionou
até que seu dedo entrasse.

Beijavam-se enquanto Abel rebolava e pedia outro dedo, já duro de tesão.

— Me fode, Finn... — ele pedia mais que o dedo.

O lobo deu a ele muito mais do que ele pediu. Ou exatamente o que ele
queria. Uma foda forte e carinhosa, cheia de beijos e olhares, culminando
em mordidas inebriantes e amorosas. 5

Abel terminou a noite como vinha fantasiando em segredo. Enrolado em


seu lobo, saciado e todo reivindicado, como ele tinha sonhado sem contar
pra ninguém.

Capítulo 17

Mesmo depois de alguns dias, o alfa continuou sem visitar a lanchonete.


Sofria de saudade do perfume do companheiro, mas precisava dar tempo e
espaço ao lobo, sem saber que a saudade que Cody sentia já tomava quase
todos os seus pensamentos, transformando-se ora em tristeza, ora em
ansiedade.

O lobo ômega já quase não se lembrava dos sofrimentos passados, quando


pensava no alfa e em como poderia ser bom qualquer coisa com ele. Deus,
Cody tremia em sua cama ao se imaginar com Desmond. Em que mundo
ele poderia pensar que um homem como aquele poderia querê-lo? Tão
educado, viril, firme, tão lindo. E um urso. Achava tão sexy e quente aquela
coisa de urso caubói e agora ele entendia por que Desmond cheirava tão
deliciosamente.

Talvez Cody apenas precisasse de um tempo para processar a ideia de ter


um companheiro, de fato, mas o tempo já tinha passado. Por que o homem
não ia até ele e o reivindicava? Teria ele tinha perdido o interesse?

Deu um longo suspiro quando Tracy passou pelas suas costas e resolveu
perguntar a ela, de uma vez, se sabia do amigo.

— Eu nunca mais vi o alfa. Você sabe por que ele não vem mais?

— Bom, desde que você deu o fora nele, ele partiu pra outra. Soube que ele
tem até um encontro. Deve estar tentando te esquecer, né, lobinho? Já que
você não quer nada com ele.

Aquilo partiu o coração de Cody em múltiplos pedaços. Não que ele tivesse
esperança que o alfa fosse esperá-lo para sempre. Mas tinha se passado
apenas poucos dias.

— Eu... não dei um fora... — Cody mal conseguiu falar, assim como mal
conseguiu terminar de trabalhar naquele dia.

Flutuou seu corpo pela lanchonete o dia todo com vontade de chorar e com
o coração quebrado. Chegou em casa arrasado, com o rosto inchado de
chorar pelo caminho. Entrou no chuveiro e lá chorou mais, lamentando
aquele infortúnio. Não imaginava que aquilo fosse incomodá-lo como
estava incomodando.

Quando saiu do banho, saiu tomou uma decisão. Trocou-se e foi até a casa
do alfa. Se ele estivesse com alguém lá, pelo menos colocaria logo um fim
naquilo.

Procurou o executor que fazia a ronda na fazenda de Kirk e pediu que o


levasse até a casa de Desmond. O homem o levou de carro e depois voltou
para a fazenda. Antes de bater na porta, Desmond a abriu. Vestindo uma
calça solta e uma camiseta velha, de uma forma totalmente diferente da que
Cody costumava vê-lo sempre, o homem tinha os cabelos levemente
desalinhados. Não parecia estar num encontro.

— Cody! Está tudo bem? Aconteceu alguma coisa? — Desmond perguntou


ao abrir a porta.

— Você está acompanhado? — Cody perguntou antes de responder.

— Não. — o alfa franziu a sobrancelha.

— Não está em um encontro? — Cody estava perto de voltar a chorar. Por


algum motivo tão estranho, ele não queria perder aquele homem que ele
mal conhecia.

— Claro que não, querido... — Desmond usou um tom doce e Cody


desabou em seus braços.

— Não desiste de mim. — ele pediu da forma mais meiga que Desmond já
vira e ainda que não tivesse pedido, não havia forma de que Desmond
desistisse dele.

— Por que você acha que eu faria isso? — o alfa segurou seu rosto para
dizer e então Cody se esticou, encostando seus lábios com pressa, pulando
em seus braços.

Sem quebrar aquele primeiro beijo, Desmond levou seu ômega para dentro
e fechou a porta, podendo se entregar melhor ao companheiro. E Cody
estava ansioso por ele, beijando-o como se fosse mesmo perdê-lo.

— Calma, meu anjo... está tudo bem... estamos só nós dois aqui. — Des o
abraçou com carinho.

— Você não vai mesmo fazer isso? Não vai me trocar por outro?

— Cody querido... por que acha isso?

— A Tracy me disse que você tinha um encontro.

Desmond riu.
— Ela te enganou.

— Não acredito! Que maldade! Eu até chorei...

— Não me diga isso, meu anjo... não quero que chore. Saiba que não
importa o que te disserem, eu não vou trocar você por ninguém. Mesmo se
você não me quisesse, eu te esperaria.

Não teria encontros com ninguém, porque desde que eu te conheci é só


você que eu quero na minha vida e mais ninguém, Cody.

— Desmond...

Os dois, então, se abraçam e se beijam. Beijos doces e levemente quentes,


porque Desmond decide ir devagar com o lobinho. Por isso, leva-o de volta
para a fazenda depois de um tempo curto e promete ir vê-lo no dia seguinte
na lanchonete, para terem um encontro de verdade.

Mas algo muito estranho acontece quando Desmond chega todo sorridente e
ansioso no dia seguinte, tirando o seu chapéu, procurando Cody com os
olhos.

— Onde está Cody? — ele pergunta a Tracy.

— Ele não veio hoje. Achei que estivesse com você. — ela sorri, lembrando
da peça que pregara no lobo.

— Não. Comigo, não. — o peito de Desmond dá uma pontada. — Será que


ele está com Russell?

— Difícil ele não me avisar. — Tracy estranha.

— Eu vou até a fazenda de Kirk ver o que aconteceu.

Ao chegar à casa de Cody, o alfa se desesperou. Encontrando a porta aberta


e sinais de luta, ele tinha certeza de que algo havia acontecido. Cody não
estava em nenhuma parte. Nem na casa, nem na fazenda. Ninguém o tinha
visto e então Desmond teve certeza: alguém o tinha levado.
Contatou Russell imediatamente para que uma varredura fosse feita nas
casas dos membros da alcateia. Todos se mobilizaram para encontrar o
ômega desaparecido, mas tanto Desmond quanto Russell sabiam que Rhett
estava envolvido no sequestro, o problema é que ninguém sabia onde ele
estava, onde ele se escondia.

***

Estava ainda atordoado quando acordou. O mal cheiro do lugar e as


correntes que o prendiam pelo braço e pelo pescoço o faziam lembrar da
noite anterior, quando viu o rosto de Rhett sobre ele na cama. Tentou lutar,
tentou gritar, mas foi em vão. Logo foi se sentindo tonto e mole e então
dormiu. Tinha sido sedado.

Desde a época do alfa anterior, eles já faziam testes com sedativos e


conheciam doses capazes de derrubar shifters lobos com facilidade. Assim,
aproveitando a troca de turno dos executores dos ursos, Rhett agiu. Ele e
seus dois homens vinham observando as movimentações havia alguns dias.

No início eram quatro, mas foi rápida a desistência de um deles e seu


retorno para a alcateia. Não queria ser banido por andar com Rhett. No
fundo, ele nem sequer detestava o novo alfa, de modo que os dissidentes
perderam um membro e as coisas estavam cada vez mais difíceis.

Vivendo em uma cabana na floresta que o antigo alfa usava para esconder
armas, afastada e escondida, os três planejavam a morte de Russell, mas
antes que isso fosse possível, Rhett queria seu namorado de volta. Porque
achava que Cody era propriedade dele, ainda que não fossem
companheiros.

O homem não queria reivindicá-lo, mas também não aceitava o término.

Cody estava preso a uma cama, amarrado e dopado para que não
conseguisse se transformar e fugir. Quando acordou, sua cabeça rodava e
ele sentia uma forte vontade de

vomitar. Não tinha forças para se levantar e sentia que suas roupas estavam
molhadas. Ele tinha se urinado. A sensação era horrível, mas pior ainda era
sentir o cheiro de Rhett e saber que a qualquer momento ele entraria por
aquela porta e faria com ele o que quisesse.

Um dos homens levou um lanche e um copo com água para Cody, mas ele
não conseguiu comer. Tinha fome, mas se sentia enjoado pela alta dose de
sedativo. Pediu calças secas, mas o homem disse que apenas Rhett poderia
fazer isso e ele não estava. Cody voltou a dormir molhado e fraco como
estava.

Acordou horas depois, com Rhett arrancando suas calças e trocando sua
roupa.

— Espero que logo eu possa te soltar, Cody. Quando você não quiser mais
fugir de mim. —

o lobo falou.

Cody tentou se encolher, cobrir sua intimidade, mas amarrado como estava,
não foi possível.

— Para de ser bobo! — o homem falou rudemente. — Não tem nada aqui
que eu não tenha visto. E comido. — ele gargalhou.

Ainda mole, Cody engoliu em seco.

— Não vou fazer nada com você agora. Quero você bem acordado pra
quando a gente for brincar. E saiba que nunca mais você vai fugir de mim.
Nem que eu tenha que te manter preso pra sempre. — Rhett acariciou seu
rosto e Cody tentou se esquivar, cheio de asco.

Então um tapa forte foi dado em sua face.

— Não se afaste! — Rhett gritou. — Acho que você não entendeu que eu
posso fazer o que eu quiser com você. Ainda mais do que antes. — um
sorriso cínico e vencedor brilhou no rosto sádico do homem.

Rhett gostava daquela sensação de superioridade, porque no fundo ele era


um frustrado, que não conseguia se destacar em nada sem oprimir alguém.
Quando ele saiu, as lágrimas escorreram pelo rosto marcado de Cody e ele
chorou até seu corpo adormecer novamente, sem forças para uma mudança
e pouca esperança de ser resgatado, o ômega desabava na cama, sentindo a
dor das amarras e daquela humilhação.

Mas Russell já mobilizara todo o esforço disponível para ir atrás do ômega.


Inclusive ele e Cameron estavam nas buscas, assim como Finn e Abel,
munido de suas armas. Mas Abel foi com os homens de seu bando, porque
pela primeira vez em anos, ursos entraram em peso, e juntos, na floresta, a
fim de encontrar o companheiro do alfa.

Os lobos se concentraram mais na região da cidade, os ursos na floresta,


não apenas para otimizar os esforços, mas porque os instintos de Desmond
diziam que era para lá que eles deviam ir.

Embora não fosse um trecho longo de mata, a cabana ficava bem escondida
e no extremo noroeste do lugar, uma região de mata mais densa que
nenhum shifter costumava frequentar.

Nem mesmo os lobos. Buscas já haviam sido feitas por ali e nada foi
encontrado, porque a cabana ficava realmente escamoteada entre árvores e
os lobos sabiam disfarçar o próprio cheiro com uma mistura de plantas
específicas passada no corpo.

Ninguém encontrou o esconderijo de Rhett. Os lobos retomariam as buscas


no dia seguinte e já era quase de manhã quando os ursos também
desistiram. Desmond dispensou seus homens, mas ele e Abel continuaram
até seus corpos não aguentarem mais. E quando isso aconteceu, eles se
transformaram para conseguir energia para continuar.

Já amanhecia quando Desmond fez com que Abel voltasse para a sua casa.
Ele tentou retrucar, mas estava cansado demais. Foi. Desmond foi apenas
até seu carro, estacionado na entrada da mata e lá dormiu por cerca de duas
horas, antes de retomar as buscas. Sozinho na floresta, pôde sentir melhor
os odores no ar e assim ele se concentrou em cada rastro que poderia ter
deixado o seu doce companheiro.
Caminhou por algum tempo até o algo voou até ele. Desmond o farejou,
rastreou um pequeno sinal de Cody e aquilo era o suficiente. Ninguém mais
o sentia como ele. Ninguém mais o encontraria a uma distância tão grande.

Porque Rhett se achava muito esperto, sabendo manusear sedativos e erva


capazes de diminuir odores. Andava quase livre pelos lugares, embora
sempre se escondendo, por causa dessa habilidade, mas sua esperteza era
limitada e ele não passou em Cody a mistura de plantas.

De modo que sem outros odores para confundi-lo, Desmond conseguiu


distinguir o cheiro do ômega, especialmente porque aquele era o seu ômega.

O alfa estava cheio de raiva. Como nunca antes, em todo o seu tempo de
vida, ele estava obstinado e assim que encontrou a origem do perfume,
atirou no primeiro homem que surgiu na porta, pois ele já tinha sentido o
seu cheiro. O tiro preciso na cabeça o fez ir ao chão, então a fúria tomou
conta de Desmond e seu urso tomou seu lugar. E o animal tinha proporções
tão descomunais que o outro lobo que estava dentro da casa não conseguiu
atirar, perdendo o controle nas mãos. Desmond correu até ele e quebrou seu
pescoço, vendo-o cair no chão. Urrou para o alto, jogando o que havia à sua
frente para o lado e rumando em direção ao odor agora inequívoco do seu
companheiro.

Com facilidade, fez a porta do quarto ir ao chão e então o viu, acorrentado e


entorpecido, chorando e tentando sorrir, num misto de dor alívio, porque
embora nunca tivesse visto o urso do alfa, sabia que era o seu companheiro
ali para salvá-lo.

Desmond então começou a quebrar as correntes que prendiam Cody,


tentando dizer com o olhar que tudo ficaria bem, mas o ômega estava fraco
e nem seu choro e seu riso conseguiam sair direito. O urso quebrava as
amarras quando uma voz terrível se anunciou por trás.

— Solte-o ou eu atiro nele!

O urso bramiu feroz, olhando para trás. O humano por dentro sabia que
seria preciso disparar muitas balas para atravessar o urso e atingir o lobo
preso à cama, por isso Desmond não se intimidou. Se Cody corresse algum
risco, se ele não estivesse certo de que a enormidade de seu corpo o
protegeria, não caminharia irado pra cima de Rhett como fez. Não o
agarraria e apertaria seu corpo tão forte, tão violento, que era possível sentir
seus ossos se quebrando, rasgando os órgãos.

Quando Desmond o soltou, foi direto para onde estava Cody, sem perceber
que mesmo todo quebrado, o corpo caído de Rhett estava mudando, ele
estava se transformando em seu lobo e quando isso acontecesse, ele fugiria
dali com vida. Mas nem Rhett nem o alfa contavam com a desobediência de
Abel, que, em vez de voltar para casa, ficou pela floresta esperando o
momento certo de pegar o maldito lobo que o tinha atacado e que tinha
sequestrado seu amigo.

A transformação estava quase toda completa e quando Rhett se preparava


para fugir, sete tiros foram disparados em sua direção.

— Morre, lobo filho da puta! — gritou o ômega, entrando no recinto com


sua arma calibre 12, atirando muito mais que o necessário para aniquilar
Rhett de vez.

O lobo oportunista perdia a vida, enquanto na floresta a única coisa que se


ouvia era o forte urro do urso do alfa, ao mesmo tempo em que brilhava no
rosto do ômega, um sorriso satisfeito.

***

Transformado, Desmond carregou seu companheiro desmaiado até o carro,


na companhia de Abel. Uma longa caminhada que ele fez totalmente nu.
Assim que o colocou no banco, ligou para Russell e avisou que o tinha
encontrado e o estava levando para a casa.

Agradeceu a Abel pelo caminho, sem mencionar o fato de sua


desobediência. Até mesmo Desmond sabia que Abel não tinha jeito e de
todo modo ele o tinha ajudado.

O próprio Desmond deu banho e trocou seu companheiro quando chegou.


Ainda que estivesse nu e ele pudesse ver cada detalhe do seu lindo ômega,
não se excitou. Não tinha como se excitar o vendo tão debilitado e sem
saber o que ele tinha passado nas horas em que ele ficou em poder de Rhett,
afinal, Cody tinha passado mais de um dia nas mãos do cara, quase dois, e
estava fraco. Tudo passava na cabeça de Desmond e ele se culpava por não
ter ficado ele mesmo vigiando o seu pequeno lobo.

Secou-o e enxugou seu corpo, vestindo nele uma roupa limpa. Deitou-o em
sua cama e deu a ele de comer na boca. Uma sopa leve, de caldo fino, mas
feita com legumes e carne, bastante nutritiva para alguém que estava sem
comer.

— Me perdoe por não ter te encontrado antes, meu amor. — Des dizia ao
dar-lhe a sopa com cuidado e carinho. Cody ainda estava meio anestesiado
do forte sedativo, mas conseguia comer e sorria para o alfa. Não conseguia
ainda falar direito e explicar o que tinha acontecido, bem como ainda não
sabia que Rhett estava morto e não havia mais perigo para ele.

— Você está seguro agora. Nunca mais vou permitir que te façam mal,
querido. Agora durma tranquilo. Amanhã quando estiver bem poderá voltar
para a sua casa se quiser. Se não quiser, pode ficar aqui.

— Obrigado, Des... — ele balbuciou com dificuldade.

Acariciando de leve seu rosto, o alfa levou o prato de sopa e deixou um


abajur aceso, bem como uma frestinha aberta, para o caso de ele precisar
chamá-lo, e o deixou descansar tranquilo e em segurança.

***

No meio da noite, Cody conseguiu se transformar. A mudança fez o


sedativo ir embora e ele ficou novo em folha. Além do medo e daquele
tapa, Rhett não o tinha tocado. Assim, diante de tudo o que poderia ter
ocorrido, nada de pior aconteceu.

Mas algo o tinha marcado demasiadamente, no entanto. Algo que mesmo


entorpecido e sedado rondava sua mente em forma de sonhos estranhos, ou
imagens oníricas. A ideia de nunca mais ver Desmond, de perder seu
companheiro, de não olhar mais em seus olhos e sentir aquela coisa única e
inexplicável. O medo de nunca mais se sentir em casa, como ele se sentiu
nos braços dele.

Movido por esse sentimento, Cody se levantou e seguiu o perfume do urso


pela casa.

Encontrou o quarto em que ele estava e bateu devagar, entrando em


seguida, ansioso e apressado, procurando pela cama onde ele estava, porque
era nela que ele queria dormir, era com Desmond que Cody queria passar a
noite.

— Me deixa ficar aqui, Des? — ele pede ao alfa, já se agarrando nele na


cama.

— Claro, querido... — Desmond se sente estremecer. Não esperava aquela


visita noturna.

Procurando abrigo no corpo do alfa, Cody suspirou, sentindo as ondas de


calor e acolhimento que apenas o seu companheiro poderia proporcionar.

— Você me salvou... —

— Eu só peço desculpa por não ter conseguido chegar até você antes, meu
anjo... você estava tão perto de mim e eu permiti que te ferissem...

— Não foi sua culpa, Des... não diga isso... — Cody puxou seu rosto
levemente com a mão e levou seus lábios até os dele, provando-os pela
segunda vez.

Seu corpo despertou. O corpo de Desmond também e o alfa o levou para


mais perto, colando-o todo em si.

— Como você se sente, querido?

— Agora eu me sinto ótimo. — Cody sorriu, bem perto de seus lábios.

— Eu prometo que ninguém nunca mais vai te fazer mal... — Desmond


sussurrou, sem dizer ainda que Rhett estava morto.
— Quando eu estava lá... preso... eu só pensava em você... meu único medo
era não te ver mais, Des... eu posso dormir com você hoje? — Cody não
estava preocupado com Rhett.

— Oh, Cody... — Desmond o abraçou. — Você pode dormir comigo todos


os dias...

Então Cody soltou um pequeno grunhido de lobinho feliz e aos poucos foi
se soltando do abraço, porque ele queria a boca do alfa na sua. E assim que
o beijou, pôde mostrar para Desmond o que ele realmente queria dizer
quando falou que queria dormir com ele.

Capítulo 18

Desmond até que tentou ir devagar, porque afinal de contas, Cody tinha
sofrido muito naqueles dias, mas seu pequeno lobo ômega tinha outras
intenções. Com os calores de seu cio se aproximando e aquela doce
sensação de reencontro, ele só pensava em uma coisa. Por isso, tirou a
própria roupa devagar e foi por cima do urso alfa.

Suaves gemidos escapavam pelos lábios do ômega quando Desmond se


aprofundava nele, sentindo seu pênis se encher ao ter Cody pairando nu
sobre sua ereção, roçando-se nele, enquanto o alfa se permitiu ladear seu
corpo esguio com as mãos, sentindo a pele lisa de toda a lateral do corpo do
companheiro.

Foi com suas mãos que Cody tirou a blusa de Desmond para beijar-lhe o
tórax com a mesma vontade que o tinha beijado na boca. O ômega se
preparava para baixar suas calças quando o alfa achou que seria bom se
certificar, antes de dar o próximo passo.

— Cody... você tem certeza que quer isso?

— Tenho muita certeza, alfa... — Desmond viu seu rostinho sorrir, antes de
suas mãos buscarem o seu pênis dentro da calça.

Cody encostou seu nariz naquela maravilha, aspirando todo o perfume do


membro do alfa.
Sentiu o coração acelerar ainda mais quando seus caninos pularam e ele
salivou de vontade.

— Eu posso? — Cody perguntou com doçura.

— Claro, meu Cody... mas... olhe pra você, querido... — o alfa o segurou
pelo queixo, sorrindo. — Seus dentes estão grandes...

Delicadamente, Desmond usou um dedo para abrir aquela deliciosa boca de


Cody. Ele nunca tinha visto presas saltarem durante o sexo, e aquilo não era
comum em ômegas. Apenas machos dominantes na hora do acasalamento
colocavam seus dentes animais para fora, mas seu pequeno companheiro
estava tão excitado por ele, pelo seu cheiro, pelo seu pau, que não
conseguiu segurar.

— Eu não consegui evitar... — ele balbuciou envergonhado, pensando que


Desmond não estava gostando do que via.

— Você está adorável, meu lobo... me deixe tocar esses dentinhos. — o alfa
alisou as pontinhas salientes antes de puxá-lo para cima e beijar sua boca
com aqueles dentes afiados.

Seus lábios beijaram a boca do ômega, de maneira que ele podia sentir suas
presas com a língua que passeava por ele. Ajeitando Cody sobre seu pênis
descoberto, ele o beijava intensamente, até arrastar sua boca pela pele do
pescoço, chegando com beijos até a orelha, onde falou baixinho que era e
estava lindo.

— Estou louco por você, meu lobo...

— E eu por você, urso... — Cody sorriu com seus dentinhos à mostra. —


Eu quero te pôr na boca, Des... — ele pediu suave.

— Pode colocar, querido...

Por um tempo Desmond apreciou seu lobinho o lamber, com medo de


chupar e o machucar com as pontas afiadas. Tão logo o medo se foi, Cody o
colocou na boca. Chupou apenas um pouco, pois de fato os dentes
machucavam e então ele pediu para ser devorado.

Levando-o de volta para cima, o alfa beijou sua boca com força, sentindo-o
perder o fôlego com suas investidas para dentro dele. E antes que ele
pudesse recuperar o ar, Desmond girou seu corpo na cama, livrando-o das
roupas e desceu beijando a pele quente do seu lobinho que gemia a implorar
por ele.

Eles mal tinham começado e Cody já podia perceber o quanto Desmond era
diferente de Rhett. Beijando-o por longos períodos, admirando seu corpo
como era, tão menor e com poucos pelos, inalando sua pele por onde
passava. Chupou sua entrada, forçando a língua para dentro, como se ela
pudesse passar sem ajuda.

Cody gemia e se esticava para trás, mostrando-se para o seu alfa, deixando
claro que o queria.

— Fique assim, querido... eu já volto. — falou Desmond, deixando-o com o


traseiro todo lambido para cima, enquanto saía pelo quarto atrás de
lubrificante.

Depois de abrir uma ou duas gavetas, ele encontrou o frasco e o levou


consigo para a cama, onde iniciou a massagem para a entrada de seu pênis.

Cody se sentia flutuar, como se pudesse gozar apenas com aquilo, mas
assim que dois dedos o abriram o suficiente, sempre sob as palavras
reconfortantes do alfa, Desmond começou a entrar. A cada pedaço deixava-
o se acostumar, até que o próprio Cody começou a se mover em torno de
seu membro.

— Oh, querido, você é tão gostoso... — Desmond o virou de barriga para


cima, procurando sua boca.

Logo ele voltou a se colocar para dentro, suspendendo suas lindas pernas,
bombeando-se para o fundo.
— Eu queria tanto isso, Des... — Cody murmura, a cabeça jogada pra trás,
as unhas de seu lobo saindo e entrando nas costas do alfa.

Ele recebia o companheiro em seu corpo no justo início de seu cio e a


excitação o consumia.

Seria o momento perfeito para a reivindicação. O urso de Desmond se


chacoalhava para sair, enquanto o alfa via seu lobinho semi transformado,
tomado pelo desejo.

Mas antes que Desmond pudesse solicitar sua marcação, o ômega explodiu
com a boa fricção entre seus corpos, tomando Desmond em seu ânus, com a
força ideal, dominante e doce, sentindo seu pênis esvaziar, tingindo seus
corpos.

Vendo aquela cena, do seu companheiro gritar o seu nome, o alfa também
gozou, caindo sobre Cody, dizendo que o amava. Tendo que deixar a
marcação para depois.

***

Ainda era cedo quando Russell chegou à casa de Desmond. Queria saber
sobre Rhett e dar aquele assunto como encerrado.

Com Cody ainda dormindo em sua cama, Desmond atendeu o alfa dos
lobos no escritório e depois de uma breve conversa, na qual tudo fora
esclarecido e Russell se desculpava por não ter conseguido pegar Rhett, o
lobo deu a notícia que fez com que Desmond se arrependesse de não ter
reivindicado seu companheiro com mais rapidez na noite anterior.

— Pode dizer a Cody que ele pode voltar para a alcateia. Tudo está em
ordem agora. —

Russell falou antes de se despedir.

Desmond o acompanhou até a porta e em seguida foi preparar algo para ele
e Cody comerem. A tristeza já o acompanhava e quando ele chegou no
quarto com o café da manhã do seu ômega, o alfa não tinha vontade de
contar para ele o que Russell tinha dito.

Olhou-o dormir por alguns segundos, tão lindo espalhado entre seus
lençóis. Parecia confortável e levava ainda mais conforto ao coração de
Desmond tê-lo ali. O alfa o acordou com delicadeza e o viu sorrir. Pela
mente de Cody passava as cenas da noite anterior, com suas partes quentes
e ternas, que o enchiam de plenitude.

Como ficou feliz com aquele gesto simples de seu companheiro, mas que
significava tanto para ele, principalmente porque ninguém nunca tinha feito
a Cody aquela gentileza.

Eles comeram juntos, riram e trocaram carinhos na cama, antes de


Desmond dizer que Russell tinha ido até lá. Pensou em omitir o que havia
dito o lobo, mas seu caráter não permitiria que ele fizesse isso.

— Ele disse que você pode voltar... que a alcateia está segura. — Desmond
falou sem olhar para ele.

— Oh... — Cody sentiu o estômago enrolar. Estaria o alfa o mandando


embora? Estaria ele impondo seus limites? — Claro... eu vou... — Cody
falou baixinho, descendo os olhos para a bandeja na cama.

Ficaram em silêncio por algum tempo até que o ômega falou.

— Vou arrumar minhas coisas hoje...

— Você sabe que não precisa ir, não sabe? — Des sentia o coração pulsar
intenso.

— Russell deve estar precisando que eu desocupe a casa... — ele olhou para
baixo novamente e só então Desmond percebeu que talvez ele pudesse
também estar triste.

— Você não precisa ficar lá.

Cody olhou para ele.


— Eu seria tão feliz se você viesse morar comigo, querido Cody...

— É sério? Você me quer aqui?

— É o que eu mais quero no mundo. — Desmond falou antes de ser


abraçado e ganhar sua declaração de amor.

E foi naquela manhã que Cody ganhou sua marca. Ganhou seu
companheiro e ganhou também uma família que se iniciava. Começava de
verdade sua vida no bando dos ursos, ao lado de seu companheiro.

***

— Entao você matou Rhett? — indagou Finn, sorrindo.

— Claro. Alguém precisava fazer alguma coisa nesse lugar. — Abel


provocou, antes de entrar no banheiro e gritar desesperado.

O lobo correu até lá e o encontrou sem camisa.

— O que foi?! — Finn perguntou, assustado.

— Olha o que você fez comigo!

— O quê?

— Olhe! Veja minha barriga!

— Isso deve ser pelo tanto de doce que você comeu ontem. — Finn sorriu,
beijando sua têmpora e alisando o levemente avantajado abdome.

— Não estou com prisão de ventre, Finnegan! — Abel olhou para ele
nervoso.

— Oh, meu Deus! — Finn o levou para os braços e o encheu de beijos. —


Vamos ter bebês!

— Eu vou ter, né? É sua culpa isso, Finn! E agora? O que vamos fazer?
— Como assim que vamos fazer?

— Como vamos fazer para ter esse bebê, oras?

Finn respirou fundo de alívio.

— Vem morar comigo.

— Não. Você está louco. Não tem como eu morar em um canil. — ele riu
do próprio deboche.

— Meu amor, não existe chance no mundo de eu desgrudar de você. Eu sou


o beta da alcateia. Se você quiser mesmo e seu alfa aceitar, eu me mudo
para o seu bando, mas você vai mesmo me fazer ter que fazer isso?

Abel grunhiu.

— Você é um manipulador, lobo. — ele sorriu e Finn sabia o que aquilo


significava.

— Quando você vem?

— Quando você quer? — Abel o envolveu pelo pescoço.

— Hoje. — Finn beijou sua orelha.

— Você é tão carente, lobo... — Abel fechou os olhos para sorrir.

— Você prefere que eu te dê um gelo, ursinho? Você sabe que eu consigo...

— Nem brinque com isso, Finn! Você já me maltratou demais.

— Eu não te maltrataria, ursinho... agora venha, vou te levar pra cama pra
gente comemorar o nosso bebê. — Finn o pega no colo.

— Tomara que ele seja um urso.

— Vai ser um lobo. — Finn falou com convicção.


— Por que você me odeia tanto, Finn? — Abel dramatizou sorrindo, porque
a boca de Finn já estava em seu pescoço, causando-lhe arrepios.

— Eu amo você, lobo. Eu amo tanto você... — Abel dizia, fechando os


olhos para aproveitar o carinho, imaginando como sua vida ficaria ainda
melhor tendo uma família com aquele homem.

***

— Você não pode bater nas pessoas, né, bebê?

— Eu sei, Rus. Eu nunca faço isso.

— Eu sei que não.

— O que vai acontecer comigo? Você vai me expulsar? Não vai mais me
querer como companheiro?

— Não diga bobagem! Isso nunca vai acontecer, amor.

— Vou ficar de castigo?

— Vai. — Russell lançou um olhar lascivo em sua direção. — Já informei a


alcateia que você está suspenso.

— E o que isso significa? — perguntou com olhar inocente.

— Que você nao vai trabalhar. — Russell riu. — Vai ficar mais tempo aqui
em casa, até eu dar um jeito em você, meu grandão. — Rus o leva para o
seu colo.

— Agora me conta... por que você bateu no Payton?

— Não quero dizer.

Rus o deita na cama, já tirando sua blusa, acariciando seu peito liso e
musculoso, mas suave como como pele de bebê.

— Você vai ficar bravo comigo.


— Eu nunca fico bravo com você, meu amor.

— Ele xingou você.

Russell sorriu. Acariciando agora seu rosto.

— Ele me xingou do quê?

— Ele disse que você era um nanico filho da puta que gostava de comer
lobos grandes.

O alfa se segurou para não rir.

— Bom. Ele mentiu quando disse que gosto de comer lobos grandes.

— Mentiu?

— Mentiu... eu gosto de comer só um lobo grande, bebê... — ele cochichou


em seu ouvido, fazendo Cam se arrepiar. — E já que você bateu nele por
minha causa, acho que vou te deixar uma semana a mais de castigo aqui em
casa cuidando de mim e do Billy. O que acha?

— Eu acho que seria muito, alfa. — Cam sorriu.

— Mas agora eu vou cuidar de você, lobo grande. Vamos fazer o que
Payton disse que eu gosto de fazer... — Russell sorriu e assim começaram
os dias de suspensão de Cameron.

***

Algum tempo havia se passado desde que Cody tinha sido resgatado e os
ursos deram um fim em Rhett. Abel tinha ido morar com Finn e os dois já
eram três.

— Você precisa mesmo de tantas armas, meu amor? — Finnegan pergunta a


Abel quando o vê se trocar.

— Preciso, Finn. Não confio muito em todos esses lobos. — Abel diz ao
pegar Chloe nos braços e cheirar seus cabelos. — E eu tenho essa lindeza
pra proteger... — ele esfrega o nariz no da filha. — Ou você acha que eu
posso depender de você? — ele brincou, joga do um sorriso provocador
para o companheiro.

Finnegan riu, beijando os dois e saindo para cumprir seus deveres na


alcateia.

A bebê tinha os cabelos claros como os de Abel, mas os olhos mais escuros
como os de Finn.

Depois de seu nascimento, Finnegan ficou mais protetor com o


companheiro e Abel ainda mais preocupado. Em todo lugar que ia, estava
cheio de armas, não só porque estava agora entre

lobos — que ele não chamava mais de cachorros —, mas porque ele era tão
protetor com a filha como o companheiro era com ele, o que fazia com que
Finn pudesse trabalhar tranquilo, sabendo que a filha estava em segurança.
O que o preocupava mesmo era Abel, que era um pouco instável, embora
ele estivesse muito mais calmo e precavido depois do nascimento de Chloe.

Seu ursinho era um ômega bastante valente, mas quando estavam no quarto
ele amansava como um filhote e os dois brincavam por horas depois de
Chloe dormir.

Abel descobriu que Finn não tinha uma família escondida, ou uma vida
dupla. No fim das contas, a família que eles formaram era a coisa mais
importante de sua vida. Finn o fazia feliz como ele não imaginava que
podia ser e nem se lembrava do medo que tivera um dia de uma relação
séria. Afinal, agora era ele quem tinha uma família. Mais do que isso: uma
família cheia de amor e lealdade. E um companheiro que compreendia suas
maluquices e excenticidades. 5

Assim como a família de Russell, um pouco mais numerosa, é verdade, já


que ele tinha os pais vivos, diferentemente de Abel e Finn, de modo que
ainda que Cameron não pudessem gerar filhos, os pais do lobo alfa tinham
ganhado um netinho e todo final de semana, os três almoçavam na fazenda.
Mas não era apenas na alcateia que as coisas frutificavam. No bando de
ursos, famílias também cresciam.

— Vai pra casa, Cody! Não vou deixar você trabalhar assim.

— Mas eu me sinto ótimo.

— Olha o tamanho dessa barriga. Esse bebê já deve estar te arranhando


para sair. Vá para a casa, coloque os pés para cima e espere Desmond
chegar, porque não quero o alfa brigando comigo porque estou maltratando
seu lobinho... agora vá, vá! — Tracy o beijou antes de levá-lo para fora.

Cody pegou o casaco e foi caminhando para a casa. A casa do alfa, que
agora era também a sua e era o melhor lugar do mundo para estar. Para se
criar um filho, para ter uma família. Sua barriga estava realmente enorme,
porque ele esperava dois bebês. E tanto ele quanto o alfa não viam a hora de
tê-los nos braços, porque se juntos a vida já ganhara novas cores, com a
chegada dos filhotes, tudo seria perfeito. Como os dois queriam. Como
Cody merecia.

Epílogo

Finnegan precisou fazer a reunião sozinho naquele dia, porque eu tinha um


compromisso importante. Era o primeiro dia de Billy na escolinha e eu não
queria perder esse momento. Eu sentia como se ele fosse meu filho e
simplesmente não queria perder momento algum de sua vida, da vida de
Cameron e da nossa família.

Por isso, naquela manhã, Cam e eu colocamos o material dele dentro da


mochilinha, preparamos o lanche e depois de tomar café da manhã juntos,
nós dois o levamos para a escola.

Prendi o cinto de segurança nele no banco de trás do carro e Cameron


sentou ao meu lado. Ele estava mais nervoso do que Billy, que parecia
animado por poder fazer novos amigos.

— Calma, bebê. Vai dar tudo certo. — acariciei sua mão sobre a coxa,
enquanto eu dirigia.
Ao longo daquela semana, eu dediquei algum tempo depois do jantar a
ensinar Billy a mexer nos materiais que compramos pra ele. Como havia
pouca coisa de material escolar na casa de Cam, ele mal sabia o que era um
lápis de cor. Não havia como culpar Cameron por isso, no caso dele nem
era considerado uma falha, porque ele mesmo não tinha condições de muita
coisa. Mas agora, nós dois juntos, poderíamos proporcionar a Billy outras
oportunidades. Não apenas materiais.

Chegando na porta da escolinha, muitas crianças entravam com seus pais e


eu fiz questão de acompanhar Cameron até lá dentro, porque nervoso do
jeito que ele estava seria capaz de não conseguir se apresentar à professora.

Fomos de mãos dadas com Billy, um de cada lado, e não posso negar que
meu coração também acelerou. Por algum motivo, aquele era um momento
importante pra mim, como se consolidasse os dois como minha família de
verdade, aos meus olhos e aos olhos do mundo.

Apresentei a mim e Cameron à professora como um casal. Casal de tios de


Billy, e senti Cam apertar minha mão. Em seguida, apresentei Billy e antes
de sair ele abraçou bem forte o tio, sorrindo animadamente. Ao contrário de
algumas crianças que choravam, agarrando seus pais.

Prestes a ir com a professora, Billy puxa minha camisa e quando eu olho


para baixo, ele está de braços abertos para me abraçar como tinha feito com
Cam e então eu o levanto no colo e ele me envolve no pescoço e então,
assim como com o seu tio, o meu companheiro, ele faz toda a minha vida
fazer sentido ao dizer da forma mais doce e sincera do mundo, como só as
crianças sabem dizer:

— Eu te amo, tio alfa.

— Eu também te amo, garotão.

Emocionado e com vontade de chorar, me esforcei pra segurar as lágrimas


naquele que era um dos momentos mais sublimes da minha vida.

De mãos dadas com Cameron, eu o vi entrar na sala de aula com os outros


alunos. Ele ainda se virou para acenar para nós dois, que estávamos como
bobos ali, admirando aquela cena linda e memorável.

E enquanto o víamos entrar, ouvi meu companheiro sussurrar para mim o


mesmo que seu sobrinho tinha dito.

— Eu te amo, Rus... — voltando a apertar minha mão.

Retribuindo a declaração do meu companheiro, eu o envolvi com meu


braço, enquanto eu sentia a maior das felicidades do mundo, como se tudo
estivesse enfim no seu devido lugar. Eu, que tinha passado a vida
deslocado, encontrava a felicidade ao lado dos dois e via, naquela cena
simples, naquele dia comum, minha vida realmente começar.

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