Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
06
Quando o magnata grego Nik Demetrious convidou Vicky para ser sua
secretária particular, ela ficou apavorada. Por que ele escolheu a mais humilde
de suas funcionárias? Trabalhar ao lado de um homem tão poderoso e fascinante
foi uma experiência arrasadora: Vicky apaixonou-se perdidamente. E sua
felicidade chegou ao auge quando, de repente, Nik a pediu em casamento. Ela
aceitou, deslumbrada. Mas logo descobriu a amarga verdade: ele não a amava.
Ao contrário, odiava-a! Queria vingar-se de Vicky com crueldade. Por quê? O que
Vicky tinha feito de errado? Era um mistério...
Publicado originalmente em 1983 pela Mills & Boon Ltd., Londres, Inglaterra
Copyright para a língua portuguesa: 1984 Abril S.A. Cultural — São Paulo —
Brasil
Esta obra foi composta na Tipolino Artes Gráficas Ltda., São Paulo, Brasil
e impressa na Divisão Gráfica da Editora Abril S.A.
Foto da capa: Keystone
CAPITULO I
CAPÍTULO II
Quando Gordon lhe comunicou que Nik iria para Nova York durante duas
semanas, sentiu-se imensamente aliviada. É claro que sentiria falta de sua
energia e espírito de iniciativa, mas sabia, por outro lado, que agora poderia
respirar. Aquela ausência lhe possibilitaria refletir melhor sobre seus sentimentos
e voltar à normalidade. Não tinha o menor desejo de se apaixonar por quem quer
que fosse, pois sabia que jamais conseguiria encarar a intimidade que tal situação
acarretaria. Além do mais, seria uma tolice muito grande apaixonar-se por um
homem como Nik Demetrious, que devia ter levantado há muito tempo uma
barreira contra todas as mulheres que trabalhavam com ele.
O alívio de Vicky transformou-se em desespero, quando lhe foi comunicado
que devia viajar para Nova York na companhia de seu chefe. Ele próprio fez a
declaração e ela o encarou muito surpreendida, o que possivelmente o deixou
irritado.
— Vamos, srta. Brown, deve saber muito bem que a secretária de um homem
tão ocupado quanto eu precisa acompanhá-lo, de vez em quando, em suas viagens
ao exterior.
— Sei, sim.
O nervosismo de Vicky deixou-o ainda mais irritado.
— Já discutimos este assunto.
— Sim, claro, e não me importo nem um pouco.
— A senhorita é muito prestativa... — observou ele secamente, olhando seus
cabelos, que estavam novamente penteados no antigo estilo.
— O senhor não esqueceu que estou fazendo um estágio de um mês, não é
mesmo?
— Sim, e ele termina esta semana. É claro que não esqueci e decidi contratá-
la.
Ela esperava aquela declaração havia três semanas; por que sentia, de
repente, aquele medo terrível?
— Quer então que eu fique? — murmurou, rezando para que ele mudasse de
ideia.
— Quero, sim — declarou Nik, encarando-a com firmeza, como se tentasse
decifrar a confusão que ela experimentava naquele momento. — Acho-a uma
secretária extremamente competente e gostaria que trabalhasse para mim durante
um ano.
— Mas é costume assinar um contrato tão longo?
— Srta. Brown, não tenho a menor intenção de discutir — declarou Nik,
estendendo-lhe o contrato, o que a deixou muito surpreendida. — Ou aceita este
emprego e tudo o que ele significa, ou não o aceita!
Vicky, tonta, olhou o contrato. Os termos eram extremamente generosos e o
salário era mais alto do que ela receberia em qualquer outro lugar. Além do mais,
não era um compromisso para toda a vida!
— Quando encontro pessoas competentes e em quem se pode confiar, gosto de
mante-las em seus cargos — declarou Nik, assim que ela pegou a caneta para
assinar.
Vicky compreendia sua posição, e Nik, examinando a assinatura, dobrou o
contrato, enfiando-o no bolso.
— Gordon providenciará tudo o que é preciso para a viagem — declarou ele,
saindo para atender a um compromisso. — Esteja pronta para partir a qualquer
momento.
Vicky sentiu-se aliviada, ao saber que Gordon faria parte da viagem.
— Não costumo acompanhar Nik — declarou Gordon, enquanto esperavam o
vôo no aeroporto —, mas há muito trabalho pela frente. Nik precisará de mim.
Vicky sabia o quanto Gordon seria útil, mas duvidava de sua própria
capacidade. Tinha ouvido falar muito bem da eficiência das secretárias
americanas e temia perder com a comparação, decepcionando Nik Demetrious e
Gordon.
— Tudo isso pode lhe parecer muito estranho, mas é preciso começar a
aprender — disse Gordon, sensato como sempre. — Um pouco de experiência e
você será tão eficiente quanto a srta. Devlin. Ela costumava viajar um bocado
conosco.
— Mas isso deve levar anos... — murmurou Vicky, olhando para Nik, que
conversava com um funcionário da alfândega.
— E daí? Não tenha receio, Vicky. Você é jovem, inteligente e está tão bonita,
hoje... Tem tudo a seu favor. O que mais podepedir?
Vicky sabia que ele tinha razão e que confiava muito pouco em si mesma. Até
mesmo Vera zombava dela, declarando que era excessivamente modesta. No
entanto, Nik a contratara por um ano, numa demonstração do quanto confiava
nela. Talvez devesse refletir mais e apreciar melhor suas qualidades.
Os últimos dias tinham sido tão ocupados que ela mal tivera tempo de pensar.
Ao lado do trabalho no escritório, apresentaram-se outras tarefas. Ela, no entanto,
sentiu-se surpreendentemente revitalizada por toda aquela atívidade. Conforme
Gordon havia sugerido, se ela se desse uma oportunidade, talvez fosse capaz de
realizar muito mais do que imaginava.
Nik Demetrious sugerira-lhe que levasse na viagem dois ou três vestidos mais
requintados. Abrira o talão de cheques, preenchera um deles e entregara-o a
Vicky, dizendo-lhe que tirasse uma tarde de folga e fosse ao cabeleireiro.
— Do jeito como você se penteia, não poderá viajar comigo! Não sei a quem
tenta impressionar, com esse estilo de penteado, mas a mim não convence de
modo algum!
— Não estou procurando impressionar a quem quer que seja — respondera
ela, sentindo uma estranha vontade de chorar.
— Por favor, Vicky, não discuta comigo.
Ela mal notara que Nik, após várias hesitações, se havia decidido a chamá-la
pelo primeiro nome. Não notara também um brilho de ironia no olhar dele,
percebendo apenas que seu coração disparava loucamente.
Foi Gordon quem sentou ao lado dela, no avião. Viajavam na primeira classe,
que lhe pareceu muito confortável. Seu companheiro disse que, apesar de
trabalhar em Londres, tinha de viajar bastante, o que o aborrecia um bocado. Não
era sempre que tinha uma garota bonita com quem conversar.
Vicky sentiu-se muito feliz, ao conversar com ele, e desejou que seus olhos não
se fixassem com tanta frequência sobre Nik Demetrious. Assim que entraram no
avião, ele fora cumprimentado calorosamente por uma bela norte-americana e
agora dava-lhe muita atenção. Gordon achava que Nik a tinha conhecido há
alguns anos e estava certo de que aquele encontro não passava de uma
coincidência.
— Essas coisas sempre acontecem. É por isso que, nas viagens mais curtas,
quase sempre usamos o jatinho particular de Nik. Só assim podemos trabalhar.
Nik, pelo visto, não estava se divertindo nem um pouco! Vicky sem conseguir
disfarçar a inveja, o viu conversando com a mulher a seu lado. Ele usava um
terno de corte impecável e parecia muito seguro de si. Inclinou-se para ouvir
melhor o que sua companheira dizia, e ao endireitár-se, voltou a cabeça e encarou
Vicky.
Assim que seus olhares se cruzaram, ela não conseguiu mais olhar em outra
direção. Sentiu a boca seca e um nó no estômago. Tinha a impressão de estar se
afogando nas ondas de uma emoção profunda e não podia fazer nada a respeito.
Mais uma vez seu coração disparou e exatamente naquele momento uma
aeromoça passou por entre eles, o que a deixou aliviada, pois não saberia como
desviar-se daquele olhar sombrio e enigmático.
Depois disso, Vicky esforçou-se para não olhar para ele, concentrando-se na
pilha de revistas que Nik, muito surpreendentemente, comprara para ela no
aeroporto.
Levou vários minutos para parar de tremer e muito mais tempo para perceber
o que estava lendo. Não conseguia explicar nem para si mesma o que tinha
acontecido naqueles breves momentos em que mergulhara no olhar de Nik,
quando o mundo havia parado completamente. Ficou até certo ponto chocada, ao
sentir seus receios se dissolverem. Sentia uma vontade imensa de estar mais
próxima de Nik Demetrious e até mesmo de abrigar-se em seus braços. Aquele
sentimento, ainda que ligeiro, a deixou aterrorizada. Surpreendeu-a, perceber que
as antigas barreiras que havia levantado entre ela e os homens pudessem ser
removidas com tamanha facilidade.
CAPITULO III
Na manhã seguinte acordou com muita dor de cabeça e olhou com certo
ressentimento para Nik, ao surpreendê-lo saboreando com vontade um farto café da
manhã.
— Bom dia, Vicky. Como está? A sua aparência não me parece nada boa...
— Estou bem, obrigada — respondeu ela, sentando-se, pois, só de vê-lo, sentia-
se fraca. — Desculpe, mas creio que dormi demais. Além das tarefas que me
deixou, precisa de mais alguma coisa?
— Não, creio que você ficará ocupada durante algumas horas. Preciso que me
acompanhe após o almoço.
— É uma reunião de negócios?
— Não, quero levá-la para dar uma volta pela cidade. Você não pode voltar para
Londres sem conhecer pelo menos parte dela.
Vicky engoliu em seco, incapaz de disfarçar a surpresa que experimentava.
Era muito raro Nik mostrar-se tão bem-humorado pela manhã e, além do mais,
o convite era inesperado.
— Você irá, Vicky? — indagou ele, antes que ela tivesse tempo de aceitar.
— Gostaria imensamente!
Ela deu um grande sorriso e seus olhos brilhavam como duas estrelas. Não
se importou com o fato de Gordon estar parado junto à porta, tendo
provavelmente ouvido parte da conversa.
Será que Nik não esqueceria do convite? Ficou preocupada a manhã inteira,
pois, se aquilo acontecesse, não suportaria tamanha decepção. A dor de cabeça
diminuiu, voltando em seguida com toda força, pois achava impossível relaxar.
Estava tomada por tamanha ansiedade que, na hora do almoço, só
conseguiu comer um sanduíche. Trocou de roupa logo em seguida e, quando
Obelia anunciou que Nik estava à sua espera, não lhe foi possível disfarçar o
alívio que experimentou.
Radiante, pegou a bolsa e foi ao encontro dele. Havia uma certa expressão
em seus olhos que fez com que o coração de Vicky disparasse. Sabia que estava
muito bonita, em seu vestido novo de algodão, mas algo lhe dizia que não devia
levar Nik muito a sério. Afinal de contas, ele era seu patrão e, por mais que se
sentisse envolvida, não era suficientemente tola a ponto de admitir que ele
corresponderia. Um magnata grego estava fora de seu alcance e faria muito bem
em não esquecer esse detalhe!
No entanto, não conseguia deixar de se emocionar ao notar que Nik a
encarava com curiosidade. Ele usava calças de brim e uma camisa esporte. Seu
corpo forte e perturbador adquiria novas dimensões. Agora Vicky acreditava
naqueles antepassados camponeses sobre os quais ele havia falado, homens
cuja força havia domado uma natureza ingrata e cujos descendentes haviam
construído impérios. A camisa estava aberta, no peito coberto de pêlos negros e
sedosos, e ela, incomodada, desviou rapidamente o olhar.
— Você está o próprio retrato da inocência ameaçada, Vicky. Como é que
consegue semelhante coisa?
Ela sentiu-se indignada com aquela observação e corou violentamente. Em
se tratando de sua pessoa, qualquer sugestão de inocência parecia deixá-lo
indignado. Por que seria?
— Pois sou inocente...
Como era possível alguém fazer uma tal confissão? Era ingénua demais
para ser convincente!
Nik sorriu, o que era muito raro, e Vicky, nervosa, procurou saber o que
havia por trás daquele sorriso, quando o chofer apareceu.
— Para onde vamos? — perguntou ela, enquanto o carro seguia pelo centro
da cidade. De cada lado das ruas, os arranha-céus atingiam alturas
inacreditáveis. No íntimo, Vicky receava tamanha imponência, imaginando o
que aconteceria se eles acaso desabassem.
— Já lhe disse que vamos dar um passeio. Escolha: podemos pegar um
barco, ir de helicóptero e até mesmo andar.
— Acho melhor você decidir. Não sei qual é a melhor alternativa.
— Pois então sugiro prosseguir com o carro. Talvez possamos andar um
pouco pelo Central Park mais tarde e reservar o helicóptero para amanhã.
— Naturalmente, você já conhece isso tudo, não?
— Sim, mas já fiz esse passeio há tanto tempo que provavelmente não me
lembro de mais nada. Nova York é uma cidade onde se trabalha demais e não
nos deixa tempo para conhecê-la melhor.
— Mas você costuma vir muito aqui.
— Censura as minhas vindas frequentes ou o modo como eu trabalho?
— Não tenho certeza — declarou ela, assustada com a própria audácia. —
Você trabalha demais e, às vezes, parece muito cansado. Talvez fosse melhor se
tivesse um lugar fora da cidade, onde pudesse descansar de vez em quando.
— Ah, sei... Um lugar bonito, que fosse também do agrado dos meus
funcionários, não é mesmo?
Por que Nik desconfiava tanto das intenções alheias?
— Não posso falar pelos outros, mas não estava pensando em mim.
— Desculpe. Tenho certeza de que se preocupa com o meu bem-estar, srta.
Brown, mas está se esquecendo de algo. Meu lar é na Grécia e, apesar de
passar menos tempo lá do que nos outros lugares, eu a amo acima de tudo.
Vicky, indignada e ao mesmo tempo frustrada, desviou rapidamente a
cabeça, olhando pela janela. Nik era um homem motivado por fortes emoções,
mas com que frequência seu coração era afetado por elas? Que ternura ele
dispensava aos lugares ou às mulheres? Tinha casos, mas duvidava de que
seus sentimentos fossem afetados por eles.
Com os olhos cheios de lágrimas, Vicky desejou jamais ter sido beijada por
ele. Parte dela ainda se sentia chocada, diante da profunda reação física que
seu contato com Nik havia provocado. Passara o resto da noite tentando
compreender os sentimentos que ele tinha despertado. Ficara espantada ao
constatar que ele havia conseguido destruir certas inibições e, agora que estava
tão próxima a Nik, ficou ainda mais espantada, pois desejava intensamente ser
tomada novamente em seus braços. Aquilo não fazia sentido, pois passara
muitos anos mantendo os homens a distância, e suspirou profundamente.
Acreditando que aquele suspiro era devido ao fato de ela sentir-se de
alguma forma incomodada, Nik perguntou se estava com calor.
— Agosto não é o melhor mês para se visitar Nova York, pois a umidade é
grande.
— Não me incomodo nem um pouco. Provavelmente estará chovendo,
quando voltarmos para a Inglaterra.
Após percorrerem boa parte da cidade, decidiram ir até o bairro chinês e,
em seguida, a Greenwich Village, onde residem os artistas e boémios de Nova
York. As ruas, no entanto, pareciam perfeitamente normais e nelas se viam
jovens mães, empurrando carrinhos de bebé, e velhos sentados nos bancos, em
conversa animada.
Nik decidiu que passariam o resto da tarde no imenso Central Park, lugar
muito agradável, bem no centro da cidade.
Nos dias que se seguiram, Vicky teve muitas vezes a sensação de que devia
estar sonhando e esperava nunca mais acordar. Nik a levava a todos os
lugares. Após percorrerem toda a ilha de carro, ele lhe mostrou a cidade de
barco e de helicóptero, e ela apreciou-a imensamente. Foi a tantos lugares
famosos, como, por exemplo, a Sede das Nações Unidas, que começou a anotar
seus nomes, o que provocou uma pergunta de Nik.
— Por que você está fazendo isso? — indagou, tirando da mão de Vicky a
caderneta de anotações e lendo-a.
— Acho que é para mostrar para os meus netos, um dia — disse ela, rindo e
ficando muito corada ao perceber o significado de suas palavras.
— Mas primeiro você terá de se casar, não é mesmo?
Vicky mordeu o lábio, muito constrangida. Apesar de admitir para si mesma
que amava Nik, nunca tinha ido tão longe. Procurou tratar o assunto com
superficialidade:
— Foi apenas um comentário tolo...
— Tolo, mas interessante.
— Nem tanto... Foi uma observação bem comum. Você sabe como é, a gente
compra jóias, propriedades, guarda velhos retratos e diz que é para mostrar aos
netos.
— Vicky, você não está dizendo nada que eu não saiba. Não estou nem um
pouco interessado nos netos dos outros, mas talvez me interesse pelos seus.
Será que ele não percebia o quanto estava sendo cruel? O rosto de Vicky, de
vermelho que estava, tornou-se muito pálido.
— Provavelmente não terei nenhum.
— Nunca se sabe...
Ele pegou subitamente sua mão e a levou aos lábios, beijando-a duas vezes.
O coração de Vicky disparou e ela experimentou intensa emoção, que precisava
pôr para fora. Era a segunda vez que Nik a beijava e ela sentia vontade de lhe
pedir que sua atitude fosse para valer. Uma garota experiente sempre consegue
dar a entender a um homem aquilo que ela deseja, sem precisar colocar seus
sentimentos em palavras. Quantas vezes ouvira suas colegas de escritório
expressarem essa opinião? Como desejava ser mais experiente! Não sabia
absolutamente o que deveria fazer para que Nik tomasse conhecimento de seus
anseios.
CAPITULO IV
CAPITULO V
CAPITULO VI
— Pois ainda digo que você está cometendo um engano! Não se trata de mim
nem é possível semelhante coisa! Jamais fui apresentada a seu tio e nem sequer
sei o nome dele!
— Pare de mentir! — disse Nik, indignado, sacudindo-a. — Talvez achasse
que conseguiria arrancar dinheiro dos outros sem ser punida, mas estou aqui
para impedi-la de se aproveitar da infelicidade alheia. A polícia tem muito
interesse em mulheres como você!
— Você não está falando sério!
— Pois veremos. Para início de conversa, esta casa será vendida e o dinheiro
devolvido a meu tio Philip.
— Quantas vezes terei de dizer que jamais conheci seu tio? E se acaso fosse
culpada de tudo o que você me acusa, isso seria pior do que você me fez? Jamais
teve intenção de casar comigo! Foi apenas uma farsa, mediante a qual procurou
me enganar durante todo esse tempo. Deixou que eu me apaixonasse por você e
permaneceu de cabeça fria. Não sei como teve coragem de fazer semelhante coisa!
— Pois saiba que vou fazer muito mais do que isso. Apreciarei demais ver todo
mundo zombando de você, enquanto colhe a recompensa do seu fingimento.
— Não voltarei para a firma...
— Voltará, sim, sua trapaceira! Lembre-se de que assinou contrato por um
ano e terá de cumpri-lo. Irá sofrer demais e será uma lição de que nunca se
esquecerá.
Vicky ficou a encará-lo, sentindo-se completamente desamparada. Não sabia
como convencê-lo de sua inocência. A história que Nik acabara de contar era
trágica e não podia ser inventada. Ela tinha estado na ilha de Corfu e a garota de
quem ele falava correspondia perfeitamente ao seu tipo. Como conseguiria
convencê-lo de que ele tinha se enganado?
— A única coisa que posso fazer, Nik, é repetir que não conheço seu tio. Talvez
tenham lhe dado informações erradas.
— Você nem sequer tem a coragem de fazer uma confissão honesta!
— Mas é que não tenho nenhuma confissão a fazer!
Ele, em resposta, deu um bofetão em seu rosto molhado de lágrimas, o que a fez
cambalear.
— Ficará comigo até se resolver a fazer uma confissão completa. Só depois
disso, e quando me pedir perdão de joelhos, eu a deixarei partir.
— Por favor, Nik, não me faça uma coisa dessas!
— Farei, sim. Você não demonstrou a menor piedade por uma pessoa da minha
família e não fique se lamentando como uma covarde.
Vicky ainda se arrependia por ter sido precipitada, alguns dias mais tarde,
quando o avião que os transportava, vindo de Atenas, sobrevoava as florestas e o
mar azul de Corfu. Toda a coragem que demonstrara no escritório de Nik tinha
desaparecido, dando lugar à apreensão. Será que ele a teria trazido até ali, se não
estivesse tão seguro de sua culpa? Agora começava a duvidar da própria sanidade
mental. Começava até mesmo a se perguntar se não seria a mulher que havia
enganado o tio de Nik, e precisou recorrer a toda a sua firmeza de espírito a fim
de prosseguir.
Nik estava sentado a seu lado, arrogante como sempre e com o aspecto de
quem está se entediando profundamente. A aeromoça mal tirava os olhos dele,
mas não era correspondida.
Durante a breve permanência ern Atenas, ele continuara a tratá-la muito mal,
mas, felizmente, viam-se muito pouco. A srta. Devlin, que agora estava com
muito boa aparência, voltou a trabalhar para Nik, e Vicky recebeu a
comunicação de que deveria descansar no esplêndido apartamento de cobertura de
seu ex-noivo. Não sabia como ele tinha explicado sua presença para a srta. Devlin,
que se limitou a olhá-la fixamente, sem fazer nenhuma pergunta.
Vicky, incapaz de repousar, devido à agitação que sentia, gostaria de passear
pela cidade, mas Nik a proibira. Como iriam partir na manhã do dia seguinte,
observou que não valeria a pena.
Estivera com ele apenas na hora do jantar, o qual, como era de se esperar,
terminou por uma áspera discussão. Nik jamais se descontrolava em relação a
quem quer que fosse e por isso mesmo Vicky ficou admiradíssima de ouvi-lo gritar
daquele jeito.
Durante o jantar, servido por mais de uma empregada, ele a ignorou, cuidando
apenas de que fosse bem atendida. Tratava-se de um ato de cortesia e que nada
tinha a ver com ela, no plano pessoal. Foi somente durante o café, quando estavam
a sós, que ele tocou no assunto de sua virgindade:
— Surpreende-me que nenhum homem tenha tocado em você até hoje.
Vicky corou, sem saber como se defender. Ele a olhava com insolência e
parecia querer adivinhar os contornos de seu corpo.
— Não pode responder à minha observação?
— Creio que não é assunto para uma conversa após o jantar.
— Quero saber!
— Nunca pensei nesse assunto. Gosto de ser como sou, pois isso tem as suas
vantagens.
Não tinha muita certeza do que queria dizer com aquilo, mas estava muito
pouco preparada para o pequeno sermão que se seguiu.
— Garotas como você são piores do que prostitutas. A inocência não deve ser
estimada, quando ela é usada apenas para enfeitiçar um homem e levá-lo à morte.
Não posso afirmar como Philip reagirá, quando voltar a vê-la — murmurou Nik em
seu ouvido, depois que desceram do avião e partiram novamente em seu
helicóptero. — Aparentemente, somos gente muito civilizada, mas, no fundo, as
velhas paixões da nossa raça ainda ardem.
Vicky não precisava que ele lhe dissesse semelhante coisa. Sempre havia
sentido certa violência em seus beijos e agora entendia o ódio que levava Nik a
agir. Houve um tempo em que ficou assustada pelo fato de seu corpo reagir tão
prontamente ao contato com Nik, mas agora sentia-se satisfeita por conseguir
imaginar-se nos braços dele sem que isso a emocionasse.
— Vamos diretamente para a casa de seu tio?
Por mais inocente que fosse, Vicky sentia-se um pouco mal, ao pensar em
encontrar um homem que tinha sofrido muito. O mistério que havia percebido em
Londres ainda pairava, levando-a a temer aquele encontro, pois não sabia o que
poderia descobrir. Agora se arrependia de ter cedido às provocações de Nik,
viajando em sua companhia.
A partida de Londres fora precipitada. Assim que concordou em vir para a
Grécia com ele, Nik não lhe deu a menor oportunidade de mudar de ideia.
Cancelou todos os seus compromissos, deixando Gordon encarregado de tomar
uma série de providências.
Decorridos alguns dias, aliás exaustivos, Vicky percebeu que não tinha notícias
de Gilda Becker, mas não ficou nem um pouco surpreendida quando ela telefonou,
pedindo para falar com Nik. Não tinha a menor ideia do que ele dissera a Gilda,
mas, para aumentar ainda mais sua confusão, descobriu que estava gelada por
dentro, enquanto Nik conversava com sua rival.
Agora sobrevoavam a ilha, que era maravilhosa. Não conseguia olhar para toda
aquela beleza sem estremecer. Nik não tinha respondido à sua pergunta e ela
voltou a interrogá-lo, julgando que ele não tivesse ouvido:
— Iremos ver Philip amanhã de manhã. Primeiro preciso saber se ele está bem.
Ao ouvir o suspiro de Vicky, Nik devia ter adivinhado o que lhe passava pela
cabeça, pois dirigiu-se a ela com aspereza:
— Não lhe fará mal nenhum esperar um pouco mais. Acho melhor repousar
bastante por enquanto, depois de Philip dizer tudo o que pensa a seu respeito,
levará muito tempo para dormir!
Vicky olhou pela janela, observando as compridas praias e o mar muito azul.
O calor estava sufocante, mas a paisagem era muito verde. As montanhas, ao
longe, eram quase tão belas quanto o magnífico litoral. Havia amado Corfu
quando estivera lá em férias, mas agora a viagem seria inteiramente diferente.
Não tinha a menor ilusão a respeito. Independentemente do que viesse a
acontecer, seu instinto a prevenia de que iria sofrer. Agora sabia que existiam
diferentes formas de tortura, algumas das quais não poderia suportar. Um tremor
apoderou-se de seu corpo, apesar do calor, e Nik perguntou bruscamente o que
estava acontecendo.
— Você jamais compreenderia...
— Compreendo, sim, mas a culpa é toda sua.
— Pois você é quem vai levar um choque... — ela retrucou, mas ele não disse
nada, olhando-a com descrença.
A villa era um lugar simples e agradável, quase na beira da praia, que também
pertencia a Nik. Lá havia alguns criados, mas não eram tão numerosos como em
Atenas. Um casal cuidava da casa e do jardim e uma jovem criada dava conta do
resto.
Nik apresentou-lhes Vicky como sendo sua secretária. A senhora chamava-se
Daphne, seu marido Cyprian e a criadinha tinha o nome de Delta.
A villa, mobiliada com singeleza, era muito espaçosa. Os jardins e a vista eram
tão bonitos que Vicky duvidava de que alguém quisesse ficar dentro de casa muito
tempo.
— Vou sair — anunciou Nik, no momento em que Daphne se preparava para
mostrar a Vicky seu quarto. — Se não voltar a tempo, jante sem mim, mas de
modo algum saia da villa ou vá até o mar. Se tiver vontade de nadar, há uma
piscina lá no jardim.
Vicky só voltou a vê-lo tarde da noite. Quando ele voltou, preparava-se para
deitar. Como tinha passado um dia terrível, solitária e entregue a seus
pensamentos, seu rosto estava pálido e abatido.
— Espero que tenha passado um bom dia — observou ela com amargura.
— Conversar com um homem que ainda se sente infeliz e humilhado só pode
me deixar deprimido.
— Refere-se a seu tio?
— É evidente. Por que não o chama de Philip? Não creio que hesitasse tanto,
há alguns meses.
— Não é minha culpa se ele se sente tão mal. Naturalmente, acredita que o
que está fazendo por ele irá ajudá-lo.
— É tudo o que me resta fazer.
— Acha que o fato de me ver poderá lhe fazer bem? Se eu fosse a garota que
ele amou, não lhe parece que a minha presença o faria sentir-se ainda pior?
— Você é essa garota. Foi para fazê-la admitir este fato e para provocar uma
reação em Philip que eu a trouxe até aqui. Pretendia levá-la à presença dele
mostrando-a exatamente como você é, mas agora vejo que isso poderia ser um
erro.
Vicky encarou-o, tremendo de incerteza, enquanto os olhos de Nik a
examinavam com insolência. Ele havia passado o braço em torno de sua cintura,
num gesto quase tão cruel quanto sua expressão. Os criados tinham-se retirado,
pois não dormiam na villa. Sentiu medo, ao perceber o quanto estava isolada.
— Como Philip se sentiria melhor, se eu lhe apresentasse uma mulher
humilhada e infeliz, em vez de alguém com a aparência de um anjo
incompreendido. . . Se você passar a noite comigo, tenho certeza de que
ninguém irá confundi-la com a criatura que você está muito longe de ser.
— Não! — gritou ela, no momento em que os lábios de Nik a procuraram.
Tentou escapar, mas, assim que sentiu seu hálito quente e perturbador, percebeu
que estava perdida. Não tinha como se opor à tremenda força física de Nik nem
como evitar seu louco raciocínio. Ele agarrou-a pelo queixo, imobilizando-a, e
esmagou seus lábios contra os dela. Vicky sentiu dor ainda maior quando
tentou livrar um braço, a fim de esbofeteá-lo, mas ele continuava a agarrá-la com
toda força. Um medo tal como nunca tinha experimentado apoderou-se de todo o
seu ser, no nomento em que Nik ergueu a cabeça e perguntou se aquilo bastava.
— É mais do que suficiente! — disse ela com desprezo.
— Você tratou Philip como se ele não existisse e gostaria de me tratar da mesma
maneira. Não fica surpreendida pelo fato de eu me sentir tentado a lhe dar uma
lição?
— Você se arrependerá!
— Não me arrependerei, não! Fui um tolo em não pensar nisto antes.
Provavelmente está disposta a enganar Philip novamente! Irá até ele, fingindo
inocência, e queixando-se de que eu a espanquei!
— Você deve estar louco!
— Não, começo a enxergar claro. Apenas quero tomar uma atitude, a fim de
que ele não se importe mais com você.
— Eu te odeio! Você não se importa com isso?
— E por que haveria de me importar? Apenas posso lhe prometer que você
vai gostar...
Vicky, horrorizada, sentiu que suas resistências afrouxavam. Um forte calor
invadiu todo seu corpo e submeteu-se àquelas mãos que a acariciavam e
desciam o zíper de seu vestido. O mundo oscilou perigosamente, enquanto as mãos
ousadas de Nik exploravam seu corpo esguio. Com um gemido de êxtase, Vicky
agarrou-se a ele, retribuindo todos os seus beijos. A paixão explodiu com
violência e ela enterrou os dedos nos cabelos de Nik.
Exatamente no momento em que ele a tomou nos braços, sem disfarçar suas
intenções, o telefone tocou. Ele hesitou, com a intenção de ignorá-lo, mas voltou a
pô-la no chão.
— Philip disse que telefonaria. Prometi que lhe daria uma informação. Se não
atender, ele ficará insistindo.
Vicky deu um passo atrás.
— Não se mexa — ordenou Nik.
Vicky esperou até que ele falasse com seu tio e saiu correndo. Trancou a porta
de seu quarto, esperando que Nik não conseguisse entrar. A janela estava aberta,
mas ela a fechou, jogando-se na cama e rezando para que Nik não se
aproximasse.
Conseguiu dormir muito pouco, mas não ouviu nenhum barulho durante a
noite. Quando o dia começou a nascer, estremeceu, aliviada. Só soube por que Nik
tinha mudado de ideia quando tomaram o café da manhã.
— Não achei que valesse a pena arrombar a porta por sua causa — disse ele
com desprezo. — Decidi confiar no bom senso de Philip.
Vicky usava um vestido singelo de algodão azul, sem mangas e que, pelo visto,
lhe desagradou.
— Não podia usar algo mais recatado, em vez de se exibir desse jeito?
Vicky, evitando encará-lo, foi buscar um casaquinho, recusando-se a mudar de
vestido. Nik absteve-se de fazer mais comentários.
— Como sabe que seu tio quer me ver? — perguntou ela, enquanto percorriam
as estradas da ilha num jipe capaz de ir a qualquer lugar.
— Não estranhe que ele queira rever alguém que zombou da sua pessoa e lhe
roubou muito dinheiro. Você haverá de lhe prometer que devolverá até o último
centavo.
— Pelo visto, ninguém da sua família deve ser maltratado, mas tratar os outros
com aspereza é um direito que você se concede!
— Onde está querendo chegar?
— Não preciso explicar. Você prometeu casar comigo e mudou de ideia.
— Mas aquilo foi diferente, e eu tinha um propósito muito específico.
— Percebo somente agora, mas, mesmo assim, foi uma trapaça. Julguei que
você me amava.
— Acho bom pôr essa ideia de lado imediatamente.
— De fato, a ideia já não me agrada. Não o quero mais, nem que você me
procure de joelhos.
— Já disse que você deve ter pena de outras pessoas, e não de si mesma. Pare
de fingir que é uma criatura inocente e jovem.
— Sou jovem, sim. Tenho vinte e dois anos.
— Vou mandar conferir essa informação. Tenho boas razões para pensar que
você é mais velha do que quer aparentar.
— Em se tratando de mentiras e de trapaças, eu, na sua opinião, deveria
merecer uma medalha de ouro!
— Sem a menor dúvida.
Vicky ficou em silêncio. Era inútil discutir com ele. A opinião que Nik tinha a
seu respeito não podia ser pior e nada a modificaria. Até onde iria o remorso dele,
quando ela visse seu tio? Mesmo que Nik lhe pedisse mil desculpas, o fato não
faria a menor diferença para ela. Desprezava-o, e nada modificaria seu sentimento.
Quanto à confusa reação a seus beijos, na noite anterior, preferia não pensar no
assunto. As pessoas conseguem sentir atração sem amor, pois se trata apenas de
uma espécie de reação química.
A manhã estava linda e Vicky contemplou a paisagem. Corfu era uma ilha
belíssima e gostaria de tê-la conhecido antes que os turistas chegassem. Em
todos os lugares via-se uma quantidade enorme de árvores: carvalhos, louros,
laranjeiras, ciprestes, limoeiros, castanheiros... Ficou surpreendida ao constatar
que conseguia se distrair durante alguns momentos, esquecendo a cena terrível que
a aguardava. A mente era incrível! Podia proteger e, ao mesmo tempo, crucificar.
Infelizmente, não conseguia deixar de pensar que, no fim da estrada, era
aguardada por um homem que a denunciaria. Desde quando ali chegara, Vicky
ficara a imaginar se conseguiria provar sua inocência. Apenas naquele momento
ocorreu-lhe que talvez tivesse uma sósia!
Levaram meia hora para chegar à villa de Philip. Não era tão isolada quanto a
de Nik e tinha duas vezes seu tamanho. Vicky contemplou com admiração os
jardins muito bem cuidados, que se estendiam até o mar, no qual estava
ancorado um elegante iate.
A embarcação era branca, o céu e o mar, muito azuis. A cena era
impressionante. Qualquer um poderia chegar facilmente à conclusão de que Philip
Demetrious era milionário!
— Philip está sozinho. A irmã dele saiu. Providenciei para que ela se afastasse, a
fim de lhe poupar humilhações.
— Claro. Espero que seu tio aprecie os seus atos de consideração...
— Você não existe! — disse Nik, indignado.
Vicky achou que ele não tinha a menor razão para ficar tão pálido. Afinal de
contas, o único propósito daquela viagem era provar que ela era culpada, que
mentia, e, com isso, o tio de Nik voltaria a recuperar a tranquilidade. No
entanto, onde estava a confiança que ele demonstrava sem cessar? Vicky
encarou-o, notando seu rosto perturbado, e não soube o que pensar.
Dirigiram-se para a casa sem dizer nada. Lá, um criado os aguardava, e os
levou até a sala de estar. O vestíbulo era arejado e revestido de lajotas. Vicky
gostaria de permanecer ali durante algum tempo, mas Nik tomou-a pelo braço,
obrigando-a a prosseguir. Embora soubesse que nada tinha a temer, o coração dela
batia com tamanha rapidez que achou que Nik poderia ouvi-lo. A terrível
sensação de que algo de negativo estava para acontecer voltou com toda força e,
durante alguns instantes, pensou em fugir. Nik, ao perceber, sua intenção,
segurou-a com mais força.
— Nem pense em escapar! — murmurou, levando-a à presença de seu tio.
CAPITULO VII
No dia seguinte deveriam voltar para Londres e Vicky não saberia dizer se a
ideia lhe agradava. Ao chegar ao apartamento, desejou-lhe boa-noite, recusando
o drinque que Nik lhe oferecia. Fechou rapidamente a porta do quarto,
apoiando-se contra ela, e tentou não tremer. Odiava-o, e por que então permitia
que ele a atingisse tanto? Quem sabe, a situação melhoraria em Londres... Lá
poderia recomeçar tudo. Várias vezes Gordon a convidara para sair com ele e ela
havia recusado, mas de agora em diante isso não aconteceria mais. Teria de
continuar a trabalhar para Nik, mas evitaria vê-lo em outras circunstâncias.
Quando ia descer o zíper do vestido, percebeu que estava encrencado. Lutou
com ele durante dez minutos antes de desistir. Nik talvez ainda se encontrasse na
sala de estar, mas hesitava em se aproximar dele. Vicky repreendeu-se por ser tão
infantil. Ele não tinha tocado nela desde que haviam partido de Corfu e era muito
pouco provável que o fizesse agora!
Não o encontrou na sala e muito menos no escritório, onde ele costumava
trabalhar de vez em quando. Preocupada, Vicky decidiu dormir vestida. Talvez
não fosse muito confortável, mas não fazia o menor sentido despertar a criada.
Tinha de passar pela porta do quarto de Nik a fim de chegar ao dela e ficou
assustada quando ele a abriu.
— Você está sem sono? — perguntou ele com ironia.
— Que susto você me deu!
— Eu também me assustei. Ouvi passos pela casa e achava que todo mundo
já estava deitado.
Nik estava vestido apenas com a calça do pijama e ela corou, diante daqueles
braços musculosos e do peito atlético.
— O zíper do meu vestido encrencou e achei que você ainda estaria acordado.
— Ah, está querendo ajuda? E o que faria, se eu não estivesse presente?
— Dormiria vestida.
— Vire-se — ordenou Nik, com um estranho brilho no olhar. — Não consigo
enxergar direito — disse, após passar a mão nas costas de Vicky, com uma tal
insistência que ela sentiu vontade de gritar. — Precisamos ir até o seu quarto,
onde a luz é mais clara.
Naquele momento, ela não sentia a menor vontade de discutir.
— Pois então vamos — disse, indo na frente dele.
CAPITULO VIII
— Experimente puxar o zíper para cima e para baixo, mas com todo cuidado
— sugeriu Vicky, muito ansiosa. Por que Nik tinha fechado a porta do quarto?
— Consegui! — disse ele, com ar de triunfo, e ela agarrou rapidamente o
vestido que caía no chão. Quando se inclinou para pegá-lo, Nik lhe segurou as
mãos.
— Deixe-o onde está... — murmurou, contemplando-lhe as curvas do corpo.
— Solte-me! — disse Vicky, indignada, dando um passo para trás. Não
contava com o que aconteceu, pois tropeçou no vestido, que tinha caído até a
altura de seus tornozelos. Nik caiu por cima dela e ria, o que a deixou ainda mais
indignada. Que direito tinha de coçoar dela? Não fizera outra coisa durante a
noite inteira e ela não apreciava nem um pouco aquele tipo de humor.
Subitamente, ele parou de rir e começou a lhe dar beijos perturbadores, que a
deixaram praticamente sem fôlego. Percebendo o brilho sensual do olhar dela, ele a
obrigou a abrir os lábios, como se estivesse esperando por aquele momento.
O sangue subiu ao rosto de Vicky e ela começou a tremer, embora
procurasse se controlar. Sentia uma fraqueza traiçoeira apoderar-se de todos os
seus membros e sabia que tinha de fazer algo, antes que fosse tarde demais.
Nik desabotoou seu sutiã e ela ficou horrorizada, ao sentir que suas carícias se
tornavam cada vez mais atrevidas.
— Pare com isso! — murmurou com voz estrangulada, tentando repeli-lo. Seus
esforços desesperados se revelaram muito pouco eficazes.
— Pelo amor de Deus, Vicky... — disse Nik, gemendo. — Se não quer casar
comigo, pelo menos deixe-me fazer amor com você.
— Não!
Vicky sabia o perigo que corria, ao notar a excitação cada vez maior de Nik. Os
lábios dele agora roçavam todo o seu corpo, e ela sentia que estava a ponto de se
entregar.
— Vicky, você quer me enlouquecer?
Se ele não tivesse dito nada, talvez ela tivesse desistido. Já começava a se
esquecer de tudo, mas encontrou suficiente energia para se afastar.
— Não! — gritou, empurrando-o. Chocada, percebeu que ambos estavam
praticamente nus.
— Fique quieta! — disse ele, colando seus lábios aos dela.
Vicky estremeceu e procurava não se deixar dominar por aquele rosto duro e
sensual. Chocava-a descobrir que ainda se sentia fisicamente atraída por ele.
— Se você não me soltar, eu grito!
— Você não é capaz de ter nenhum pensamento original, não é mesmo? Quem
iria ouvi-la?
— E de que outro modo posso me defender de você?
— Sabe muito bem que, se quiser, eu posso possuí-la. Isto não aconteceu com
nenhum outro homem, não é mesmo, Vicky? Não me diga que sou o único homem
que te desejou.
— Você poderia perder todo interesse, se acaso eu disesse que é...
— Vi outros homens olhando para você. Posso ler os pensamentos deles. Você
não é tão indiferente a mim conforme julga.
— Estou fazendo o possível para que isso aconteça.
Nik beijou-a novamente, como se tivesse a intenção de fazê-la engolir aquelas
palavras. Vicky precisou recorrer a um esforço sobre-humano, a fim de libertar-se
dos seus braços.
— Um dia você dirá sim, caso eu lhe dê mais uma oportunidade... — observou
ele, ficando de pé. — A propósito, Vicky, você está enfiando o braço na manga
errada — observou com ironia, enquanto ela se vestia. — Não precisa pôr o
vestido. Eu vou embora.
— Ótimo!
— Continue desse jeito, srta. Brown, e homem algum se interessará por aquilo
que está tentando cobrir!
Nik retirou-se, batendo a porta com toda força, e Vicky pensou que era uma
louca por ter imaginado um dia que amava um homem tão insensível. Seu rosto
queimava e tomou uma ducha fria, sentindo-se um pouco melhor quando foi deitar.
Será que algum dia se tornaria indiferente a tudo o que ele dizia e fazia? Em
Londres, pensava, ficaria livre daquela presença perturbadora, mas se enganou
redondamente.
Na noite em que chegaram, Nik insistiu para que ela dormisse em seu
apartamento, em vez de ir para a casa dela.
— Não posso permitir semelhante coisa. Já passa das dez e você está fora há
quase duas semanas. Não deve ter nenhuma comida na geladeira.
— Posso pedi-la emprestada à minha vizinha.
— Não discuta comigo, menina.
Mais tarde, deitada numa daquelas camas forradas com lençóis de cetim,
Vicky entregou-se à indignação que sentia. À medida que relaxava, o curso de
seus pensamentos modificou-se. Começou a pensar na mudança sutil por que
passava seu relacionamento com Nik. Ele era novamente o patrão dominador,
mas havia agora em seus modos uma familiaridade que não existia antes.
Deveriam ser dois estranhos um para o outro, mas agora pareciam mais
próximos do que nunca, fato que ela não conseguia entender.
Nik despertou-a, na manhã seguinte, avisando que iriam direto para o
escritório. Sob protestos, ela se vestiu às pressas e mal teve tempo de tomar uma
xícara de café.
Assim que os dois entraram no imponente saguão do prédio, a atenção de
numerosos funcionários fixou-se neles. A maior parte das pessoas limitava-se a
cumprimentar Nik, ignorando a presença de Vicky. Tudo aquilo lhe parecia falso
demais e as pessoas davam a impressão de serem um tanto servis. Ficou
bastante aborrecida, ao notar que uma ou duas funcionárias a encaravam com
evidente inveja, e decidiu nunca mais chegar lá na companhia de Nik.
Sentiu tamanho alívio ao ver Gordon que quase o abraçou. Se Nik não
estivesse lá, bem que o teria feito.
— Vicky, meu bem, que bom vê-la novamente!
— O mesmo digo eu! Trouxe-lhe um presente.
— Oh, um presente! O que é? Não aguento esperar!
— Vocês dois já terminaram? — perguntou Nik com rispidez. — Não pago as
pessoas para vê-las folgando.
Gordon, que já estava familiarizado com as atitudes bruscas de Nik, não se
ofendeu, limitando-se a pedir desculpas.
— Bem, vamos começar a trabalhar. Sabe se Henderson teve notícias do
navio Attika? E Veiga? Em que pé estão as negociações com ele?
Gordon respondeu afirmativamente à primeira pergunta, não sendo tão
conclusivo em relação à segunda. Nik entrou em sua sala e Vicky começou a pôr
a mesa em ordem.
Ficava surpreendida ao notar como Nik estava a par dos menores detalhes
relativos à companhia. Veiga, a quem ele tinha se referido, era proprietário de
uma pequena frota de navios e sua companhia ia muito bem. Nik possuía algumas
ações e havia boatos de que o presidente da firma estava para se aposentar.
Gordon deu-lhe mais notícias do negócio durante o almoço. Era a primeira vez
que almoçavam juntos, mas ela tinha passado a manhã inteira muito deprimida e
ficou contente de aceitar seu convite. Enquanto tomavam o café, Vicky deu-lhe
uma estatueta que havia adquirido em Atenas e perguntou a respeito de Veiga.
— Acha que ele venderá a companhia para Nik?
— Psiu! Fale baixinho! Ninguém deve saber que Nik está interessado no
assunto.
— E o que vai acontecer em seguida?
— Veiga é muito esperto. Gostaria de vender a companhia, mas quer mantê-la
na família.
— E como pretende conseguir isso?
— Não é difícil entender como a mente dele funciona. Ele tem uma filha
solteira e Nik não é casado. Oh, desculpe, Vicky, falei o que não devia.
— Não tem importância, Gordon. Já superei essa história. A viagem à
Grécia me ajudou muito.
— É a melhor notícia que você poderia me dar!
— E o sr. Veiga tem esperanças de tentar Nik?
— Dizem que a srta. Veiga é linda, e, se ela trouxer como dote a companhia
de navegação do pai, quem poderá resistir à tentação?
Voltaram para o escritório daí a cinco minutos e Vicky percebeu que Nik tinha
pedido alguns sanduíches, o que era bem pouco habitual, pois ele costumava sair
para o almoço.
— Desculpe. Não sabia que pretendia comer aqui.
— Da próxima vez certifique-se, ouviu? Bem, mudando de assunto: amanhã
haverá uma festa e quero que você me acompanhe.
— Mas não somos mais noivos!
— Mesmo assim, não dispenso a sua presença.
— Algumas pessoas poderão estranhar...
— O que há de errado com a sua memória, srta. Brown? Não lhe disse que
necessitaria da sua companhia para atender a vários compromissos?
— Sim, mas não o levei a sério.
— Essa agora foi notável.
— Sei muito bem que há ocasiões em que precisa de uma secretária, mas não
sabia que as festas estavam incluídas na minha agenda. Quem oferece a
recepção?
— Alguém chamado Veiga. Já deve ter ouvido falar dele, não é mesmo?
Vicky fez que sim, sem entrar em maiores detalhes. Sentia uma dor na boca
do estômago e não sabia se aquilo tinha a ver com o fato de ter comido demais
no almoço ou com a insolência com que Nik a encarava. Desculpou-se e se
retirou sem que ele a impedisse.
Naquela noite sonhou que Nik nadava em águas profundas e que Veiga lhe
oferecia sua filha na ponta de um anzol. Era uma isca irresistível e Nik engoliu-a
sem hesitar. Acordou sobressaltada e sua garganta doía, como se fosse ela que
tivesse engolido a isca. Agora percebia que Nik planejava suas menores atitudes
e era exatamente por isso que a levava àquela festa. Se acaso não gostasse da
filha de Veiga, poderia voltar novamente para ela! Todo mundo sabia que ela era
sua secretária e talvez não ignorassem que tinha sido noiva de Nik. Se tivesse
Vicky a seu lado, a situação ficaria suficientemente misteriosa e as pessoas não
saberiam o que pensar. Se, ao contrário, a srta. Veiga satisfizesse seus
propósitos e ele a achasse uma criatura agradável, Vicky muito em breve seria
colocada à margem, sem a menor chance!
No dia seguinte combinaram que Nik iria buscá-la e ele pediu que Vicky
usasse algo conveniente. Com isso queria naturalmente insinuar que ela devia
pôr um vestido que neutralizasse totalmente sua presença. Ela escolheu um
traje branco, mas não notou que, se a cor era das mais dicretas, o corte estava
longe de sê-lo. Seus belos cabelos louros estavam muito bem penteados e lhe
caíam pelos ombros. Os lábios, cheios e voluptuosos tinham sido pintados com
um belo tom de rosa. Ela estava, ao mesmo tempo, sensual e inocente.
A campainha tocou e ela deu os últimos retoques no penteado, indo abrir a
porta em seguida. A expressão de Nik modificou-se assim que ele a viu.
— Desculpe se o fiz esperar... — disse ela, confusa, sem ter coragem de
encará-lo, adivinhando o quanto ele estava elegante e sedutor.
— Não precisa se desculpar. Eu é que me adiantei um pouco — retrucou com
a aspereza de sempre, mal olhando para ela, entraram no carro, que era dirigido
por Dion. Nik sentou-se ao lado de Vicky, no banco de trás, e permaneceu em
silêncio.
— O sr. Veiga faz as coisas em grande estilo! — observou ela, ao se
aproximarem do elegantíssimo Hotel Savoy.
— Creio que você apreciará a festa. Acho que precisa ter mais confiança em
si mesma.
— Nem todo mundo está acostumado com lugares como este, mas eu não
chego a tremer.
— Fique a meu lado e tudo dará certo.
Seria verdade? Vicky duvidou, sobretudo quando entraram naquele setor do
hotel onde estava sendo dada a festa. Não estava tão assustada com as pessoas,
mas com o brilho de tudo aquilo, como se cada convidado possuísse um milhão de
dólares.
Os salões estavam repletos de convidados elegantes e sofisticados. Uma
pequena orquestra tocava num dos cantos e Vicky percebeu que muitos olhares
convergiam sobre Nik, assim que eles entraram. Sua reputação de homem rico era
muito conhecida, bem como seus traços duros e marcantes. Ele se movia com uma
segurança que falava por si mesma. Vicky sentiu-se contente por estar usando um
vestido elegante, muito embora soubesse que não era ela que atraía as atenções.
Nik foi cumprimentado por várias pessoas e Vicky ficou admirada ao notar com
que habilidade ele conseguia livrar-se da maior parte daqueles que queriam lhe
falar. Fazia-o com tamanho encanto que ninguém se ofendia e durante o tempo todo
segurava o braço de Vicky, mesmo quando ela fez um gesto discreto, pois queria se
afastar.
— Comporte-se! — murmurou ele.
Ela o detestava pelos comentários que aquilo poderia provocar e acabou
desistindo. Sentia uma vontade enorme de conhecer o sr. Veiga e sua filha. Seria
ela tão formosa quanto se dizia? Não imaginava sua reação, caso visse Nik com
essa mulher.
Alguém bateu em seu braço. Era sir Clive Martin.
— Olá, querida!
— Prazer em vê-lo. Clive — disse Nik, com certa frieza. — Como vai sua
mulher?
Clive deu de ombros e convidou Vicky para dançar. Sorriu e olhou para sua
mão direita, que não mostrava o anel de noivado.
— Talvez eu devesse perguntar como vai esse compromisso, não? Talvez
acabaram decidindo que não foram feitos um para o outro, não é mesmo?
Nik ignorou o comentário, apesar de ficar visivelmente contrariado.
— Vicky poderá dançar com você mais tarde. Vou buscar um drinque para
ela. Com licença.
Nik levou-a consigo e ela o encarou com indignação.
— Como sabe que não quero dançar agora?
— Achei que estaria com muita sede. Depois de beber, pode deixar bem
claro o que deseja.
Ele era mesmo impossível! Ficou tão zangada que quase tropeçou. Teve de
apoiar-se nele e sentiu vontade de esbofeteá-lo, ao notar seu sorriso de satisfação.
— É o seu vestido — comentou ele, olhando para o decote generoso. — Seu
gosto é deplorável, e você merecia ter caído.
— Mas o que há de errado com ele?
— Você está quase nua.
— Não é verdade! Olhe para os vestidos das outras mulheres e verá que o
meu, em comparação, até que é muito recatado.
— Em comparação com você, nem todas as mulheres presentes têm muito
que mostrar...
— Creio que está exagerando — disse ela, corando violentamente. — Uso
aquilo que mais me agrada, da mesma forma que tenho o direito de escolher
os meus amigos.
— Pois então não esqueça que Clive Martin é casado. O título dele pode ser
irresistível, mas sua mulher é ciumenta.
— E eu tenho um patrão muito pouco razoável!
— Se estivéssemos a sós, poderia lhe dar uma resposta bem eficiente —
declarou ele, apertando-lhe o braço com toda força.
Vicky estremeceu, ao sentir aquele punho de aço que a imobilizava. Seu
coração disparou e ela começou a tremer. Tensa, deu um passo atrás e
chocou-se com um homem que se aproximava. Ele pediu desculpas, tomando
a si toda a culpa e, em vez de prosseguir, falou com Nik:
— Desculpe não estar presente quando chegou, sr. Demetrious.
— Estava dançando com minha secretária. Srta. Brown, sr. Veiga.
— Muito bem! Espero que o senhor não assuma compromissos com quem
quer que seja, antes de ser apresentado à minha filha.
Vicky sentiu-se indignada, pois eles falavam como se ela não existisse.
— Ah, sim, sua filha! — Nik se exprimia com evidente interesse, o que
aumentou a indignação dela.
— Venha comigo, ela está do lado de lá.
Nik não largava Vicky e ambos seguiram o sr. Veiga. Este também tinha
um ligeiro sotaque, a exemplo de Nik. Era mais velho, mas igualmente
astucioso. Aqueles dois, se brigassem, poderiam ser formidáveis rivais, mas
Vicky desconfiava que Nik sairia triunfando.
Rita Veiga era uma jovem de vinte e poucos anos e dona de considerável
beleza. Alta, seus cabelos curtos e negros emolduravam uma bela cabeça.
Tinha a pele muito alva e lábios vermelhos como rubi. Seus olhos eram
grandes, tinham uma expressão atrevida, e seu corpo era voluptuoso. Vicky
sentiu-se colocada num segundo plano.
Nik parecia bem impressionado e não tirava os olhos de Rita. Vicky não
queria acreditar que ele estivesse tão fascinado por seus encantos, conforme
parecia. Convidou-a para dançar, como se não pudesse mais esperar o
momento de tê-la só para si. Passou o braço em torno de sua cintura e
afastou-se, sem tirar os olhos dela.
— Que belo casal! Não acha, srta. Brown? — comentou o sr. Veiga,
satisfeito como um gato que tivesse acabado de receber um carinho.
— Com efeito...
O sr. Veiga talvez notasse sua palidez e pediu a um garçom que servisse
um Martini para Vicky.
— Vamos deixar o champanha para mais tarde, não é mesmo, srta.
Brown? — Ele bebia vodca e o garçom voltou a encher seu copo. — Ouvi um
boato de que o sr. Demetrious ficou noivo recentemente.
— De fato, ele estava noivo.
— E não está mais?
— Não, rompeu o noivado.
Vicky tomou o Martini e imediatamente puseram outro copo em sua mão.
Desconfiou que o sr. Veiga, com aquilo, queria fazê-la soltar a língua, mas não
se importava.
— A senhorita é secretária dele e certamente conhece a verdade melhor do
que ninguém. Nunca se pode confiar nos outros, em se tratando de tais
assuntos.
Vicky esperava que o sr. Veiga não notasse sua perturbação. Pelo visto, ele
não tinha a menor ideia de quem era a noiva de Nik, e ela não viu motivos
para revelar o fato. Não conseguiria suportar a curiosidade que ele, sem
dúvida, demonstraria e não sentia vontade de responder àquele verdadeiro
interrogatório.
— O sr. Demetrious costuma passar muito tempo em Londres?
— Não, a menos que haja uma razão muito especial.
— Quando ele prefere trabalhar em Nova York ou Londres, acha que o faz
por ter interesse em que eu me aposente, srta. Brown? Na verdade, cá entre
nós, confesso que gostaria de fazê-lo, mas só quando tiver encaminhado o
futuro de minha filha.
Finalmente Vicky entendeu qual o sentido daquelas confidências.
Naturalmente, o sr. Veiga esperava que ela as transmitisse a Nik, com a
devida discrição. Sua presença, naquele momento, era providencial para o sr.
Veiga!
— Minha filha é uma jovem um pouco volúvel e precisa de uma mão firme
que a guie. Quando me aposentar, gostaria de morar no Brasil, mas Rita
prefere outros lugares.
— Ela não pode morar sozinha?
— Eu hesitaria muito em deixar uma jovem tão inocente morar sozinha
numa cidade grande.
— Compreendo...
— Não duvido. Esperava poder contar com a sua solidariedade, minha
cara, e garanto-lhe que ela será recompensada.
As coisas se esclareciam a cada minuto que passava, e Vicky ficou muito
surpreendida, mas não sabia como silenciar o sr. Veiga. Será que não percebia
que ela, no fundo, não gostava da filha dele e que, como secretária de Nik, se
encontrava numa posição muito difícil? Quando Clive Martin voltou a se
aproximar, convidando-a para dançar, ela aceitou imediatamente, procurando
não pensar na cólera de Nik ou na expressão magoada do sr. Veiga.
— Interrompi algo? — perguntou Clive, sentindo pairar um mistério no ar.
Vicky fez que não. — Estou louco para saber o que aconteceu com o seu
noivado.
— Cometemos um erro.
— Isso era de se prever, minha cara. Nik é um tolo. — Os olhos de Clive a
devoravam. — Pelo visto, está muito interessado em Rita Veiga.
— Ignoro o assunto.
— É mesmo? Pois saiba que a srta. Veiga é uma jovem muito rica.
Vicky detestava aquelas insinuações, que comprometiam Nik, mas não
tinha a menor vontade de agir em sua defesa. Mesmo assim, sentiu-se aliviada
ao ver que ele se aproximava, embora ficasse muito surpreendida quando Nik
a arrebatou dos braços de Clive.
— Com licença.
— Mas isto é necessário? — protestou Clive.
Nik olhou para ele sem dizer nada e afastou-se com Vicky.
— Pelo menos poderia ter deixado a dança chegar ao fim — reclamou ela.
— Não lhe disse para ficar com Veiga?
— Havia alguma razão para isso? — indagou ela, sabendo que a pergunta
de Nik era falsa.
— Estou com vontade de lhe contar, mas é uma notícia que não pode ser
espalhada.
— Está querendo me dizer que gostou da filha dele?
— E se for verdade? Pelo menos isso me impedirá de pensar em você.
— Ah, então está com a consciência culpada. De fato, é uma coisa dura de
suportar.
— Meus problemas nada significam, em comparação com os seus, caso
continue a encorajar Clive Martin.
— Eu não o estava encorajando! Acaso acha que gostaria de me envolver
com outro homem, após romper com você?
— Eu a magoei tanto?
— Já superei tudo. Não precisa se preocupar mais.
Nik pareceu não gostar nem um pouco do comentário, mas ambos tinham
parado ao lado do sr. Veiga e ele não pôde dizer nada. Vicky sorriu para o
anfitrião e para sua filha. Ele olhou para Vicky com ar de censura, mas
parecia aliviado com a volta de Nik. Em seguida ordenou champanha, o que
levou Vicky ao pânico. Quer dizer, então, que teriam algo a comemorar? Não
suportava aguardar o que estava para acontecer.
— Estou com uma dor de cabeça insuportável — disse a Nik. — Não se
incomoda se eu for para casa?
— Bem, se for necessário...
Ele tentava perceber se ela dizia a verdade, mas não demonstrou muita
relutância em deixá-la partir, o que a levou a arrepender-se por ter tomado
uma decisão apressada. Quem sabe, estaria até contente por livrar-se dela.
Notou que Rita Veiga o tomava pelo braço, apoiando-se nele. Nik, pelo visto,
havia chegado à conclusão de que aquela jovem lhe agradava muito e gostaria
de ter ampla liberdade para dedicar-se a ela durante o resto da noite.
— Vou ver onde está Dion e a acompanharei até o carro — anunciou Nik.
CAPITULO IX
Vicky contemplou sua madrasta com horror e sentiu-se gelada por dentro.
— Você não pode vir morar aqui. Estou vendendo a casa!
Durante alguns momentos, Vera pareceu indignada e, logo em seguida,
desatou a rir.
— Sinto muito, mas não é possível. Você ainda não a vendeu, não é mesmo?
— Ainda não.
— No testamento, seu pai deixou bem claro que a casa me pertence até eu
voltar a me casar. Como isso não aconteceu, você não tem o direito de vender a
casa.
— Mas você foi embora. Tinha tanta certeza de que iria se casar que até
mesmo me devolveu a chave.
— De fato, eu ia casar no dia seguinte, mas ele descobriu algo a meu
respeito e mudou de ideia. Poderia tê-lo processado, mas eu não queria
publicidade.
Vicky ficou a imaginar se esse seria o verdadeiro motivo. Certamente havia
numerosas provas contra Vera, o que explicava sua hesitação em tomar
semelhante atitude.
— Você nunca gostou de morar aqui — disse Vicky, com a esperança de fazê-la
desistir.
— É verdade, mas gosto de ter um lugar onde me abrigar.
As pernas de Vicky começaram a tremer e ela teve de sentar. Não sabia o que
pensar. Gostaria de interrogar Vera sobre o dinheiro que ela havia tirado de Philip
Demetrious, queria falar sobre a dor que ele sentira e que quase o levara à loucura,
mas algo a deteve. Se Vera não tinha voltado a se casar, a casa ainda lhe pertencia
legalmente e, portanto, Vicky não podia vendê-la.
Quanto mais pensava no assunto mais se convencia de que tinha de agir com
muito cuidado. Precisava proteger Philip Demetrious, pois Vera, sabendo do estado
em que ele se encontrava, era perfeitamente capaz de procurá-Io e exigir mais
dinheiro! No entanto, se agisse assim, certamente atrairia a ira de Nik, isso para
não falar no que Vera poderia fazer!
— Mas você deve ter tido meios para viver! — observou Vicky, procurando
ganhar um pouco de tempo.
— Ah, tive sorte nos cassinos e ganhei na roleta.
— Se pretende ficar aqui, sairei de casa.
— Não há a menor necessidade. Dá muito trabalho cuidar de uma casa como
esta e podemos dividir as despesas.
Como é que Vera podia fazer semelhante proposta, se não tinha dinheiro ou
emprego? Vicky estava disposta a interrogá-la, mas a cautela acabou prevalecendo.
Talvez pudesse evitar muitos conflitos se fingisse concordar com a sugestão de
Vera, até encontrar outro lugar para morar. A partir desse momento, poderia
simplesmente desaparecer. Vera jamais ousaria aproximar-se de Nik com a
finalidade de descobrir onde ela estava. Aliás, Vicky desconfiava que, a partir do
momento em que se retirasse, Vera acabaria por esquecê-la de todo. Sem dúvida,
dentro de pouco tempo encontraria outro homem que lhe daria o dinheiro de que
tanto precisava.
— Como entreguei o meu apartamento, acho que não tenho alternativa e
precisarei ficar aqui.
Vicky não deixou de notar o brilho de satisfação nos pequenos olhos
castanhos de Vera.
FIM