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LETÍCIA FEHER LINO DE ARAÚJO (14588812)

GETÚLIO VARGAS E O DIREITO COMO INSTRUMENTO DE


TRANSFORMAÇÃO ECONÔMICA NO BRASIL

Trabalho apresentado como requisito parcial


para aprovação na disciplina de Economia
Política (DEF0113), ministrada pelo Prof.
Alessandro Octaviani, no âmbito do curso de
Graduação em Direito da Faculdade de Direito
da Universidade de São Paulo.

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO


FACULDADE DE DIREITO
SÃO PAULO – SP
2023
GETÚLIO VARGAS E O DIREITO COMO INSTRUMENTO DE
TRANSFORMAÇÃO ECONÔMICA NO BRASIL

Resumo: O objetivo deste estudo consiste em abordar as seguintes indagações: "De que
maneira a economia política proporciona uma compreensão dos dilemas enfrentados pelo
processo de desenvolvimento no contexto brasileiro?" e "Qual é o papel desempenhado pelo
direito na superação das dificuldades econômicas vivenciadas pelo Brasil?". Para atingir tal
propósito, adotou-se uma abordagem metodológica fundamentada na pesquisa qualitativa,
com base primordialmente na obra intitulada "Os Boêmios Cívicos: A Assessoria
Econômico-Política de Vargas", além de outros textos abordados ao longo do curso. A fim de
responder às questões supracitadas, o conteúdo foi examinado à luz das perspectivas teóricas
da escola desenvolvimentista.O estudo destaca a importância de Getúlio Vargas na história
econômica do Brasil, sua abordagem desenvolvimentista e o papel do direito na
implementação de políticas econômicas. Vargas promoveu medidas para fortalecer o Estado,
industrializar o país e buscar autonomia energética. O direito desempenhou um papel crucial
na criação de leis e regulamentos que permitiram essas políticas, garantindo segurança
jurídica, proteção dos direitos de propriedade e regulação das atividades econômicas. A
economia política foi utilizada para compreender os desafios do desenvolvimento brasileiro,
analisando as relações de poder e as escolhas políticas e econômicas disponíveis. O direito,
juntamente com outras medidas, desempenha um papel central na superação das dificuldades
econômicas, promovendo o crescimento, o investimento e o combate à corrupção.

Palavras-chave: economia política; desenvolvimento; getúlio vargas; boêmios cívicos;


superação econômica.

Sumário: 1. Introdução; 2. A política econômica


do primeiro governo de Getúlio Vargas; 3. O
governo Dutra; 4. A política econômica do
segundo governo de Getúlio Vargas; 5. Escolas
econômicas que influenciaram os planos
econômicos de Vargas; 6. Dos problemas; 6.1 De
que maneira a economia política ajuda a
compreender os dilemas do desenvolvimento
brasileiro?6.2 Qual seria o papel do direito no

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processo de superação das dificuldades
econômicas brasileiras? Considerações Finais;
Referências.

1. Introdução

Getúlio Vargas ascendeu ao poder em um período conturbado da história brasileira e


mundial, durante a Revolução de 1930 e a recente crise de 1929, e rapidamente se tornou uma
figura contraditória amplamente reconhecida, cuja fama o acompanha até os dias atuais. Ele é
descrito por várias escolas políticas com diversos adjetivos, como "ditador", "paternalista" e
"desenvolvimentista". No entanto, independentemente da perspectiva adotada ao analisar a
figura de "Gegê" (como era aclamado em seus jingles eleitorais) (QUELER, 2015), é
incontestável sua importância para a economia brasileira, tanto no passado quanto no
presente. No entanto, para compreender como seu governo revolucionou a abordagem do
Estado brasileiro em relação à economia (e como sua visão pode contribuir para enfrentar os
desafios atuais), é necessário aprofundar-se nos momentos históricos que o cercaram e
naqueles que desempenharam um papel crucial em sua habilidade política: os boêmios
cívicos.

2. A política econômica do primeiro governo de Getúlio Vargas

Antes marcada pelo tradicional esquema político conhecido como "política do café
com leite", caracterizado pela alternância entre líderes políticos de Minas Gerais e São Paulo
na presidência, a política brasileira passou por um movimento de transformação quando
Getúlio Vargas, natural de São Borja, Rio Grande do Sul, e seu vice-presidente, João Pessoa,
natural de Umbuzeiro, Paraíba, se candidataram como uma alternativa opositora por meio da
Aliança Liberal. Essa dupla representava os estados que estavam excluídos das políticas que
favoreciam apenas as oligarquias dominantes. No entanto, o curso dessa trajetória sofreu um
grave revés: em julho de 1930, João Pessoa foi assassinado em crime político. Esse evento foi
o catalisador para a Revolução de 1930, que, por fim, conduziu Getúlio Vargas a uma
presidência de caráter provisório.

Foi precisamente durante o período de seu governo provisório, de 1930 a 1934, que
Getúlio Vargas adquiriu sua notória fama contraditória. Logo após assumir o Palácio do
Catete, localizado no Rio de Janeiro, a então capital federal, Vargas tomou medidas polêmicas
para consolidar sua posição de poder, devido à intensa instabilidade política e tensões entre as
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diversas facções opositoras, o que lhe rendeu a alcunha de ditador. Entre suas decisões,
destacam-se o fechamento do Congresso Nacional, a revogação da Constituição de 1891
(permitindo-lhe governar por meio de decretos-leis) e a supressão dos partidos políticos.
Infelizmente, ao buscar proteger seu governo, Vargas acabou minando o poder democrático e
político da população brasileira.

Apesar das medidas controversas adotadas no âmbito social durante seu primeiro
mandato, o presidente tomou decisões de grande relevância no setor econômico do país, as
quais influenciaram toda a extensão de seu governo. Na era da República Velha, o Brasil
possuía uma economia frágil e vulnerável, dependente da importação de produtos e
exportação de poucos commodities. Devido à recente crise da quebra da bolsa de valores em
1929, a economia global estava profundamente debilitada. Nesse contexto, ficou evidente que,
se o país continuasse subordinado às economias dos Estados Unidos e da Europa, nossa
própria economia estaria fadada ao fracasso. Portanto, Vargas direcionou sua atenção para o
mercado interno e promoveu um notável crescimento industrial.

Antecedendo o início de seu segundo mandato, Getúlio Vargas estabeleceu as


diretrizes do programa econômico do Estado Novo por meio da Carta de São Lourenço. Essas
diretrizes incluíam medidas como a criação do Conselho Nacional do Petróleo, a
nacionalização das fontes de energia e das jazidas minerais, bem como o estabelecimento de
uma indústria de base com foco na siderurgia. Todas essas medidas foram implementadas com
o propósito de fortalecer o Estado nacional, apresentando uma abordagem desenvolvimentista
e industrialista.

3. O governo Dutra

Interrompendo a trajetória estabelecida por Getúlio Vargas, Eurico Gaspar Dutra foi
eleito presidente da República em 1945. Nesse mesmo ano, durante a Assembleia
Constituinte, tornou-se evidente desde o início o alinhamento predominante do governo com
princípios liberais, enfatizando o laissez-faire e uma aliança total com os Estados Unidos.
Dessa forma, foram desconsiderados os esforços do governo anterior para buscar a
independência econômica do Brasil em relação ao mercado externo.

Como resultado dessa mudança abrupta de direção, uma grande recessão econômica se
instaurou. Isso ocorreu porque Dutra negligenciou o mercado interno, resultando em um
aumento nas importações brasileiras, o que por sua vez reduziu as reservas econômicas e
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levou a um crescimento da dívida externa. Como consequência dessa situação econômica
fragilizada, a condição dos trabalhadores deteriorou-se significativamente.

Foram implementadas diversas medidas com o intuito de enfrentar a crise econômica,


destacando-se o renomado Plano Salte (Saúde, Alimentação, Transporte e Energia) - o qual,
segundo Almeida (1986), consistia principalmente em uma "reunião de recursos de
investimento, sob o nome de plano". Além disso, foi estabelecida a Missão Cooke, que
enfatizava dois princípios fundamentais: a melhoria do padrão de vida dos brasileiros e o
crescimento do comércio exterior. Dentre as propostas divulgadas para atingir tais objetivos,
destacava-se uma política de industrialização por meio de um plano estatal e a sugestão de
criação de bancos industriais (LIMA, 2013) - mecanismos que seriam utilizados por Getúlio
Vargas durante seu mandato subsequente.

4. A política econômica do segundo governo de Getúlio Vargas

“Bota o retrato do velho outra vez


Bota no mesmo lugar
Bota o retrato do velho outra vez
Bota no mesmo lugar
O sorriso do velhinho faz a gente trabalhar”

A composição musical intitulada "Retrato do Velho" foi empregada durante as


celebrações da vitória de Getúlio Vargas nas eleições presidenciais de 1950. A canção,
composta por Haroldo Lobo e Marino Pinto, explorou a imagem de Vargas como o "pai dos
pobres" e o "protetor dos trabalhadores".

Aproveitando o contexto estabelecido pelo governo anterior, Getúlio Vargas buscou


conciliar um projeto de desenvolvimento nacionalista com a inserção no mercado
internacional, contando com o apoio dos Estados Unidos. Nesse sentido, ele assinou um
acordo de cooperação técnica denominado "Comissão Mista Brasil-Estados Unidos". O
objetivo desse acordo era obter financiamento para um programa de reestruturação da
infraestrutura da economia brasileira. Como resultado do trabalho realizado pela Comissão
Mista, foi criado o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE) para gerir os
recursos e fornecer financiamento para os projetos. Dessa forma, os planos de Vargas
coincidiam com as propostas da Missão Cooke, que visavam a recuperação econômica após a
recessão causada pela gestão de Dutra.
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Após a formação da Assessoria Econômica de Vargas, composta por intelectuais
provenientes de camadas socioeconômicas menos privilegiadas, como Rômulo Almeida,
Jesus Soares Pereira, Ignácio Rangel e Cleantho de Paiva Leite, o segundo governo de Getúlio
Vargas se pautou pela busca da emancipação econômica e do progresso social. Sua estratégia
consistia em alcançar tais objetivos por meio de investimentos internos, estímulo ao
desenvolvimento do mercado, estabelecimento de indústrias e a construção de uma base
energética autônoma. Essas melhorias e inovações em conjunto impulsionariam a economia
brasileira, resultando na melhoria das condições de vida da população e no ajuste dos salários.

5. Escolas Econômicas que influenciaram os planos econômicos de Vargas

Segundo o pensamento de Chang (2015), a abordagem desenvolvimentista parte do


pressuposto de que os países subdesenvolvidos, como o Brasil, devem aumentar sua
capacidade produtiva para superar o atraso econômico. Naturalmente, algumas atividades
econômicas são mais eficazes do que outras para impulsionar o desenvolvimento industrial de
um país. Devido à fragilidade dessas economias, tais atividades não se desenvolvem
organicamente e, portanto, precisam ser promovidas pelo Estado. Dentro dessa tradição, além
do estabelecimento de indústrias (como foi feito por Alexander Hamilton, 1791, para
impulsionar a economia dos Estados Unidos), o protecionismo também desempenha um papel
fundamental. Portanto, a abordagem adotada por Vargas, ao concentrar-se na industrialização
e no mercado interno em seu plano econômico durante o Estado Novo, pode ser considerada
essencialmente desenvolvimentista.

6. Dos problemas

6.1 De que maneira a economia política ajuda a compreender os dilemas do desenvolvimento


brasileiro?

A economia política desempenha um papel importante na compreensão dos dilemas


do desenvolvimento brasileiro, permitindo uma análise abrangente das relações de poder,
instituições políticas e políticas econômicas que influenciam o processo de desenvolvimento
do país. Por meio dessa abordagem, é possível examinar como as decisões políticas, as
estruturas de poder e as políticas econômicas moldam e afetam o desenvolvimento econômico
e social do Brasil.

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Uma análise da economia política do Brasil revela a influência das instituições e das
escolas econômicas na formulação e implementação das políticas econômicas. Ao investigar
essas instituições, é possível compreender como elas moldam as escolhas políticas e
econômicas disponíveis para o governo, afetando assim as opções de desenvolvimento do
país. Além disso, a economia política examina como fatores externos, como o comércio
internacional, os fluxos de investimento estrangeiro e as relações com organizações
internacionais, impactam a capacidade do Brasil de promover políticas de desenvolvimento
autônomas.

A análise dos momentos históricos e das estratégias econômicas adotadas ao longo do


tempo também é fundamental para a compreensão dos dilemas do desenvolvimento brasileiro.
Um exemplo relevante é o caso de Getúlio Vargas, sendo que sua abordagem
desenvolvimentista buscou superar o atraso econômico do país e fortalecer o Estado nacional.
Para isso, Vargas adotou medidas como a industrialização, o estímulo ao mercado interno e a
busca por autonomia energética. O papel ativo do Estado na promoção dessas atividades
econômicas foi evidente, por meio da implementação de políticas protecionistas e da criação
de instituições financeiras como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE).

6.2 Qual seria o papel do direito no processo de superação das dificuldades econômicas
brasileiras?

O direito desempenha um papel fundamental na criação e implementação das políticas


econômicas, fornecendo o arcabouço jurídico necessário para regular as atividades
econômicas, promover a segurança jurídica e estimular o desenvolvimento.

No caso de Getúlio Vargas, por exemplo, seu governo adotou medidas econômicas que
envolveram a criação de instituições financeiras, como o BNDE, e a implementação de
políticas protecionistas. O direito desempenhou um papel central na criação das leis e
regulamentos que permitiram a implementação dessas medidas. Ele forneceu a base legal para
a nacionalização das fontes de energia e das jazidas minerais, bem como para a criação de
uma indústria de base focada na siderurgia.

Além disso, o direito desempenha um papel importante na proteção dos direitos de


propriedade, garantindo a segurança dos contratos e promovendo a confiança nos negócios.
No contexto econômico, isso é essencial para estimular os investimentos, a inovação e o
crescimento econômico.
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O direito também está envolvido na regulação econômica, estabelecendo o marco
regulatório que orienta as atividades econômicas e promove a concorrência saudável, a
proteção dos consumidores e a sustentabilidade ambiental. Ele contribui para a criação de
regras claras e consistentes que incentivam o investimento e reduzem a incerteza jurídica.

Além disso, o direito desempenha um papel fundamental no combate à corrupção e à


impunidade, que representam obstáculos significativos para o desenvolvimento econômico. A
existência de leis anticorrupção eficazes e mecanismos de responsabilização contribui para
criar um ambiente de negócios íntegro e atrativo para investimentos.

Considerações Finais

Em conclusão, o estudo destaca a importância de Getúlio Vargas na história


econômica do Brasil e ressalta a sua abordagem desenvolvimentista durante o seu governo.
Vargas implementou medidas econômicas voltadas para o fortalecimento do Estado nacional,
a industrialização e a busca por autonomia energética. Essas medidas foram fundamentais
para impulsionar a economia brasileira e melhorar as condições de vida da população.

Nesse contexto, o direito desempenhou um papel crucial ao fornecer o arcabouço


jurídico necessário para a implementação dessas políticas econômicas. O direito estabeleceu
as leis e regulamentos que permitiram a nacionalização das fontes de energia, a criação de
instituições financeiras como o BNDE e a promoção de políticas protecionistas. Além disso, o
direito garantiu a segurança jurídica, proteção dos direitos de propriedade e regulação das
atividades econômicas.

A economia política foi abordada como uma ferramenta para compreender os dilemas
do desenvolvimento brasileiro, analisando as relações de poder, as instituições políticas e as
políticas econômicas que influenciam o processo de desenvolvimento do país. Essa
abordagem permitiu examinar as escolhas políticas e econômicas disponíveis, considerando o
contexto histórico e as estratégias adotadas ao longo do tempo.

Em suma, o papel do direito no processo de superação das dificuldades econômicas


brasileiras é fornecer o arcabouço jurídico necessário para regular as atividades econômicas,
promover a segurança jurídica, proteger os direitos de propriedade, incentivar o investimento,
estimular o desenvolvimento industrial e combater a corrupção. Ao lado de outras medidas e

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políticas, o direito desempenha um papel central na busca por soluções para impulsionar a
economia e superar os desafios econômicos do Brasil.

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Referências

ALMEIDA, Rômulo. Voltado para o futuro. Fortaleza: BNB, 1986.

CHANG, Ja-Joon. Economia: modo de usar. São Paulo: Penguin, 2015.

HAMILTON, Alexander. Report on Manufactures. Philadelphia: 1791.

LIMA, Marcos Costa. Os boêmios cívicos: A Assessoria econômico-política de Vargas


(1951-54). Rio de Janeiro: E-papers, 2013.

QUELER, Jefferson José. “Oh! Gegê! Vem nos salvar”: propaganda política popular
(1945-1953). Tempo, vol. 21, nº 38, dezembro de 2015.

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