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CENTRO UNIVERSITÁRIO CAMBURY

NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA


CURSO DE DIREITO
PROJETO DE TRABALHO DE CURSO I

O SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO:

AS CONSEQUÊNCIAS DO EFEITO DA CONDENAÇÃO SOB OS FAMILIARES DO

PRESO

ORIENTANDO: VALDEMIR DE OLIVEIRA

ORIENTADOR: PROF ME. JOÃO PAULO LEÃO HILÁRIO

GOIÂNIA, 2023
VALDEMIR DE OLIVEIRA

O SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO:

AS CONSEQUÊNCIAS DO EFEITO DA CONDENAÇÃO SOB OS FAMILIARES DO

PRESO

Artigo cientifico apresentado como peça


obrigatória para obtenção de Nota para conclusão
do curso de DIREITO do CENTRO
UNIVERSITÁRIO CAMBURY, e este como parte
dos requisitos para o titulo de Bacharel em
DIREITO.

Orientador: PROF. ME JOÃO PAULO LEÃO HILÁRIO


GOIÂNIA, 2023
VALDEMIR DE OLIVEIRA

O SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO:

AS CONSEQUÊNCIAS DO EFEITO DA CONDENAÇÃO SOB OS FAMILIARES DO

PRESO

Artigo cientifico apresentado como peça


obrigatória para obtenção de Nota para conclusão
do curso de DIREITO do CENTRO
UNIVERSITÁRIO CAMBURY, e este como parte
dos requisitos para o título de Bacharel em
DIREITO.

Orientador: PROF. ME JOÃO PAULO LEÃO HILÁRIO

Goiânia, _______ de ___________ de 2.023

BANCA EXAMINADORA

JOÃO PAULO LEÃO HILÁRIO – Professor, Ms. Orientador curso de DIREITO do


CENTRO UNIVERSITÁRIO CAMBURY

Membro 1 - curso de DIREITO do CENTRO UNIVERSITÁRIO CAMBURY

_________________________________ – (Professor, Ms.PhD) do CENTRO


UNIVERSITÁRIO CAMBURY

Membro 2 - curso de DIREITO do CENTRO UNIVERSITÁRIO CAMBURY

_________________________________ – – (Professor, Ms.PhD) do CENTRO


UNIVERSITÁRIO CAMBURY

Membro 3 - curso de DIREITO do CENTRO UNIVERSITÁRIO CAMBURY


Resumo

O presente artigo tem como objetivo demonstrar através da análise literária, com base
ainda nos Códex brasileiros acerca dos institutos penais, a impossilidade na prática, da
aplicabilidade da personificação da pena na forma constitucional, tendo em vista os reflexos
sofridos pelas famílias dos apenados durante o processo de julgamento estendidos por todo o
período do cumprimento da pena. A pena privativa de liberdade no Brasil e a exemplo do que
é praticado na grande maioria dos países pelo mundo, visa restringir diretamente a liberdade
de quem pratica crimes puníveis com esse tipo de sanção, o que na teoria não deveria ser
estendido a terceiros os quais não colaboraram para a realização do delito. No entanto, na
pratica, são sofridos de modo indireto essas consequências pelos familiares dos presos, o que
pode ser facilmente percebido numa analise rasa ao grupo familiar do condenado e assim,
perceber essa transferência punitiva e a partir da análise, os transtornos pontuais na atividade
familiar do condenado. Seus entes mais próximos, afetivamente sofrem de forma significativa
os efeitos da sanção nos âmbitos sociais, psicológicos e financeiros principalmente. O
prejulgamento, o receio e a afronta à dignidade humana são algumas das dificuldades que
cercam os familiares durante todo o tempo da clausura e, ainda, depois da volta do
reeducando ao lar. Além disso, destacam-se as proteções constitucionais referentes ao
apenado e à sua família e explicam-se os aspectos do auxílio reclusão.

Palavras-chave: Sanção Penal. Pena privativa de liberdade. Família


do preso. Efeitos sobre a família.
Abstract

This article aims to demonstrate through literary analysis, still based on the Brazilian
Codex about penal institutes, the impossibility in practice, the applicability of the
personification of the penalty in the constitutional form, in view of the reflexes suffered by
the families of the convicts during the trial process extended throughout the period of serving
the sentence. The deprivation of liberty penalty in Brazil and the example of what is practiced
in the vast majority of countries around the world, aims to directly restrict the freedom of
those who commit crimes punishable with this type of sanction, which in theory should not be
extended to third parties who did not collaborate in the commission of the crime. However, in
practice, these consequences are indirectly suffered by the relatives of the prisoners, which
can be easily perceived in a shallow analysis of the convict's family group and thus, to
perceive this punitive transfer and, from the analysis, the specific disorders in the activity
convict's family. Their closest ones affectively suffer significantly from the effects of the
sanction in the social, psychological and financial spheres, mainly. Prejudgment, fear and
affront to human dignity are some of the difficulties that surround family members during the
entire period of confinement and even after the re-education returns home. In addition, the
constitutional protections referring to the convict and his family are highlighted and the
aspects of reclusion assistance are explained.

Keywords: Criminal Sanction. Deprivation of liberty. Family


of the prisoner. Effects on the family.
Lista de abreviaturas

Adm - Administrativo

AgRgnaAPn - Agravo Regimental na Ação Penal

Ac - Ação Penal

CP - Código Penal

CPP – Código de Processo Penal

CPC - Código de Processo Civil

MS - Mandado de Segurança

HC - Habeas Corpus

IExecnaAPn - Incidente de Execução na Ação Penal

LEP - Lei das Execuções Penais


Sumário

Resumo..................................................................................................................3
Abstract.................................................................................................................4
Lista de abreviaturas..............................................................................................5
Introdução..............................................................................................................7
Desenvolvimento...................................................................................................9
A Constituiçã o Federal, o Preso e a família.......................................................................................................11
AUXILIO RECLUSAO.................................................................................................................................................... 20
A FAMÍLIA DO CONDENADO...................................................................................................................................21
CONSIDERAÇÕES FINAIS..............................................................................28
Referências Bibliográficas..................................................................................31
8

Introdução

O “Direito” é um conjunto de regras que governa diferentes aspectos de nossas vidas,


todas as pessoas (pais, filhos, herdeiros, empresários, proprietários, consumidores, cidadãos,
etc.) possuem direitos e obrigações. De acordo com a Constituição Federal de 1988, o próprio
Estado brasileiro deve obedecer às regras da lei, pois o direito se remete também a justiça.
Dentro do Direito, existem vários ramos para disciplinar e definir as normas, o Direito
Penal é uma dessas normas, sendo o código mais conhecido por tipificar os crimes, podendo
ser definido como um complexo de normas jurídicas que regem a vida das pessoas em
sociedade, sempre impondo sanções àqueles que não cumprem essas normas. Quando é
cometido crime, a pessoa que o comete pode receber a pena de reclusão, sendo então a pena
cumprida nas prisões, cujo a natureza é de punir os crimes para que seja praticado uma
justiça. Deve-se sempre apurar o conceito do que seria justiça a partir da relação entre
a sociedade e o direito positivado, portanto, verifica-se que a base da sociedade é a família,
devendo sempre demonstrar a importância que reside na unidade familiar, verificando as
relações existentes pelos membros da família e a influência exercida sobre as pessoas que a
constituem, tendo enorme e inquestionável relevância social, ética e histórica.

As penas de prisão representam as penas mais severas do sistema penal brasileiro,


pela gravidade de seu impacto, tem função auxiliar em termos de aplicabilidade, ou seja, é
considerada uma razão de estado final. Este recurso, considerando que a aplicação do direito
penal se limita apenas quando não há outro meio de controle social que possa proteger
integralmente os bens jurídicos relativos aos indivíduos e à sociedade, ela tem o direito de
restringir a capacidade de contencioso criminal do país.

Não se pode dizer que quem está diretamente relacionado com a pessoa condenada à
prisão não sofrerá as consequências dessa pena, o estigma acaba sempre se estendendo aos
familiares, que sofrem as consequências das sanções penais que indiretamente são impostas
aos familiares condenados de várias maneiras.

Nesse sentido, esse artigo traz a necessidade de mostrar tais implicações das sanções
impostas em relação a família, considerando inicialmente as garantias constitucionais dos
apenados e seus familiares e a precariedade do sistema prisional do Brasil.
9

Será delineado, de forma breve, sobre características da família do preso, bem como
a transcendência da pena, explorando os diversos efeitos da punição sobre a unidade família.

Desenvolvimento

Atualmente, o sistema penitenciário, está bem aquém do que representaria as


expectativas da sociedade brasileira, pois suas características desagradáveis eliminam o
convívio social, leva o apenado a viver num ambiente insalubre, além de gravar fatores que
prejudicam o principal objetivo das prisões, que seriam a reinserção dos indivíduos que
infringiram a norma por algum motivo, e colocá-los de volta a sociedade da qual fazia parte.

A efetividade e eficiência adotados como normas disciplinares e de conduta


comportamental, aplicados aos sentenciados, pelos sistemas judiciais brasileiros, refletem de
negativamente a cognição da sociedade no que deveria ser o mais ideal para que efetivamente
surtissem os efeitos esperados quanto à aplicação da lei no sentido não se de ter o condão
punitivo do Estado, mas também de coibição de práticas tidas como transgressão à lei.

Notadamente, o cárcere representa não o início da exclusão social, mas a


continuidade desta que fora iniciada antes mesmo da entrada do condenado no
estabelecimento prisional. A tradução disso seria estabelecer ao indivíduo à margem
da sociedade, um tipo de vida enquanto cumpre sua pena e o colocando em perigo de vida e
de existência social e com isso, prejudicando de modo incorrigível a vida do apenado.

Assim, os malefícios que são originados com a punição prolatada não acabam com o
término da sanção penal prevista na decisão do magistrado, mas sim este passa a ser
considerado pela sociedade de maneira pejorativa e preconceituosa, de modo que toda a sua
vida, durante e após o cumprimento da pena, haverá o tratamento preconceituoso, o que vai
estabilizar a sua exclusão do convívio social.

Como se isso não bastasse, aqueles que se relacionam diretamente com o indivíduo
condenado à pena privativa de liberdade, sofrem de forma contumaz com os reflexos da pena
aplicada. É inegável que de modo significativo existe a extensão aos familiares que, em
diversos aspectos, sofrem as consequências da sanção aplicada ao membro da família que fora
condenado onde se nota uma transferência punitiva, ou seja, a extensão dos efeitos da punição
àqueles alheios aos elementos causadores da punição e que de qualquer forma, ajudaram na
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realização do delito. Esses fatores provocam um realinhamento familiar ao redor do instituto e


do sistema carcerário, que acabará exercendo seu poder disciplinar também a unidade familiar
do preso.

Pressuposições que se subentendem de uma situação da punição no âmbito da família


que este artigo se sustenta. A proposta central dele é a de realizar as devidas considerações em
volta do tema e assim invocar a proteção constitucional que deveria ser garantida a família e
ao preso. Adiante, os breves desenhos conceituais acerca da família do apenado e sobre
o princípio da personalização da pena, assim explorando os diversos efeitos da punição sobre
a unidade familiar e seus reflexos ante a sociedade.

A Lei de Execução Penal em seu artigo 1º, prevê que, além do objetivo da execução
penal ser, efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal, a mesma tem como função
proporcionar condições harmônicas ao condenado para a integração social do mesmo.

A Constituição Federal, o Preso e a família

O maior desafio do sistema prisional brasileiro é o princípio básico de valorizar de


forma abrangente a dignidade humana na forma do artigo 1º da Constituição Federal.
Considerando a ligação indissociável entre eles, é necessário entender até que ponto esses
seguros afetam suas famílias. Em outras palavras, é necessário entender que existe uma
entidade familiar que deve ser preservada por trás do comportamento ilegal do infrator, a qual
não podem ser legalmente ou socialmente respondidas pelo verdadeiro autor do crime.

Do ponto de vista psicológico, existe muitos efeitos negativos sobre os prisioneiros e


suas famílias. O constrangimento e o medo são sentimentos que atormentam a família, pois
por exemplo, a vergonha de ir visitar uma prisão, e o medo do parente que está preso ser
abusado ou enfrentar algum perigo interno da prisão, ou até mesmo se assumiu dívidas, que
poderiam ser cobradas da família de alguma forma, antes de ser preso.

Inicialmente, delimitamos sobre a supremacia da Constituição Federal de 1.988, que


sob seu manto regrou a reserva legal infraconstitucional, que trouxe consigo os preceitos
legislativos regulamentados pelo Código de Processo Penal, e este formulado em 1941. Assim
como outros códex semelhantes em sua forma, possuem o condão de obedecer, de forma
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majoritária, a Carta Magna, adequando às suas diretrizes de forma hermenêutica, aplicando


por extensão seus conceitos e entendimentos.

Os condenados que cumprem suas penas tiveram guardados e foram definidos na


Constituição Federal de 1988 e também por outros institutos e princípios, suas “garantias” e a
exemplo disso, a Lei de Execução Penal, tendo em vista a definição constitucional
devidamente pontuando seu apreço ao princípio constitucional da dignidade da pessoa
humana, conforme se lê no artigo 1º, inciso III, da Carta Magna pátria.

Em síntese, são direitos constitucionais assegurados ao preso:


1) Não ser preso fora das hipóteses legais de prisão;
2) Imediata comunicação da prisão e do lugar onde se encontra ao juiz competente e
à família do preso ou à pessoa por ele indicada;
3) Ser informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe
assegurada a assistência da família e de advogado;
4) A identificação dos responsáveis por sua prisão ou por seu inerrogatório policial;
5) Ao imediato relaxamento da prisão ilegal;
6) A liberdade provisória, com ou sem fiança, quando a lei a admitir.
Conforme o artigo 41 da Lei de Execução Penal (LEP), são direitos do preso:
I - alimentação suficiente e vestuário;
II - atribuição de trabalho e sua remuneração;
III - Previdência Social;
IV - constituição de pecúlio;
V - proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a
recreação;
VI - exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas
anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena;
VII - assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa;
VIII - proteção contra qualquer forma de sensacionalismo;
IX - entrevista pessoal e reservada com o advogado;
X - visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados;
XI - chamamento nominal;
XII - igualdade de tratamento salvo quanto às exigências da individualização da
pena;
XIII - audiência especial com o diretor do estabelecimento;
XIV - representação e petição a qualquer autoridade, em defesa de direito;
XV - contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura e
de outros meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes;
XVI - atestado de pena a cumprir, emitido anualmente, sob pena da responsabilidade
da autoridade judiciária competente. (Incluído pela Lei nº 10.713 , de 13.8.2003).
Parágrafo único. Os direitos previstos nos incisos V, X e XV poderão ser suspensos

ou restringidos mediante ato motivado do diretor do estabelecimento.


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Fonte: (Artigo 1º, inciso III, Constituição Federal de 1.988).

Todavia, os apenados estejam em cumprimento de suas penas em virtude do


cometimento de conduta infratora e, danosa ou ameaçadora aos bens tutelados pelos Estado,
foram fundamentalmente detalhados um conjunto de direitos, esses que podem por eles serem
usufruídos e invocados.

Nesse prisma, fora positivado um complexo de normas em prol da execução dos


direitos dos apenados, entendendo assim, a extensão dessas seguridades às suas famílias, haja
vista o vínculo indissolúvel entre elas. Em termos mais claros, existe a necessidade de
compreender que uma entidade familiar deve ser preservada por trás das condutas
transgressoras dos seus entes infratores, a qual afasta a punição jurídica ou social dos
familiares que não foram autores dos crimes. A partir daí a tarefa não tão simples das
entidades públicas na averiguação da participação, da coautoria ou do nível de influência dos
seus familiares, sendo estes últimos passíveis de responsabilização criminal em casos
confirmados, mas não devendo serem sujeitos de sanções indevidas ou excessivas.

Ainda nesse sentido, levando em consideração os direitos dos transgressores estarem


virtualmente associados aos de seus entes, as garantias constitucionalmente asseguradas
expressas acima, serão extensivas, e assim, esses possuem legitimidade para invoca-los diante
das autoridades judiciais para favorecê-los, ou, para obter a concretização dos seus anseios
pessoais dentro da legalidade jurisdicional, bem como fazendo cessar situações diversas
impostas sem o amparo legal durante o cumprimento de penas em cárcere.

O poder pode ser definido como a capacidade de fazer com que as pessoas ajam como
desejamos, quando tenham agido de outro modo, mas para os resultados do que desejamos.
[...]O poder de uma pessoa está na proporção da sua capacidade de fazer com que outros
ajam de acordo com os seus desejos, ou de impedi-los de agir de outro modo. Define-se de
modo semelhante o poder de um grupo, por referência aos seus desejos coletivos ou
dominantes (RUSSELL, 1979, p.119).

A prisão subjuga o detento ao comando de uma estrutura autoritária e de uma rígida


rotina, perdendo seu direito básico de ir e vir, e que opera como uma grande máquina
impessoal. Assumindo o total controle sobre a população carcerária, esse poder é exercido
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de forma agressiva e ininterrupta, regrando de modo detalhado e particular todos os


movimentos e momentos de sua vida. O sistema é orientado a preservar a ordem, a disciplina,
evitando fugas ou motins, essa organização penitenciária se faz de forma eficaz submetendo o
recluso, cerceando assim, quaisquer possibilidades do exercício de sua autonomia (Thompson,
1976).

O preso somente para a obter acesso a determinados bens ou prerrogativas na prisão,


quando se adapta as regras internas. Assim nota-se que vontades e necessidades que na vida
em sociedade de tão básicas sequer eram notadas, dentro do ambiente carcerário para a ser
encaradas como privilégios. O simples ato de tomar um café, ir sem pedir permissão para ir ao
banheiro, ou mesmo estar indisposto para laborar, se torna algo intangível nos primeiros
momentos do cárcere.

Fonte: https://www.istockphoto.com/br/foto/as-m%C3%A3os-de-um-prisioneiro-em-grade-de-pris%C3%A3o-gm108269216-10354953

Segundo Goffman – 1996, o sujeito apenado passa por essa adaptação seguida da sua
despersonalização que nas palavras do autor, o apenado sofre sua “mortificação”.

Para o autor, quanto maior a intensidade do ajustamento ao sistema social da prisão,


maiores as possibilidades de se alcançar os privilégios de que ela dispõe. Ao contrário,
mostrar-se resistente acarretará ao indivíduo punido um maior rigor, severidade e
endurecimento de seu regime.
14

Apesar disso, relacionando o preso e seus familiares resta relembrar a definição


amplamente atribuída à família, como uma instituição, delineando com precisão àqueles que
são veridicamente detentores desses direitos. Desta feita, o Direito Constitucional
compreendeu ser a família titular de especial proteção do Estado, e em seus termos o artigo
226 da Constituição Federal, então vejamos:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

§ 8º O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram,


criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.

Já o Código Civil, nas palavras do doutrinador Sílvio de Salvo Venosa (2008, p. 1)


relativa acerca do tema:

“o Direito Civil moderno apresenta como regra geral, uma definição restrita,
considerando membros da família as pessoas unidas por relação conjugal ou de parentesco”.

Na concepção biológica, psicológica e, sobretudo, sociológica, na medida em que as


sociedades evoluem dado o progressivo aumento de sua complexidade, também torna-se
imprescindível lembrar a amplitude do conceito da família, e nas palavras da consagrada
Maria Berenice Dias (2007, p. 30):

“existe uma nova concepção de família, formada por laços afetivos de carinho e
de amor. ”

Figuram em síntese, como detentores dos direitos extensivos aos presos não só os
pais, ascendentes e descendentes advindos de consanguinidade ou relação matrimonial, mas
também àqueles provenientes de uniões estáveis ou novas conformações afetivas.

É mister ressaltar estruturação do conceito moderno de família enquanto instituição


jurídica, assim compreenderemos com maior clareza quais são as pessoas passíveis de
requererem seus direitos perante a condição de seu ente apenado ou, ainda, de pleitear pelos
direitos dele na condição de parente ou posto semelhante.

Dessa forma, após analisarmos as considerações feitas pelos doutrinadores e em


contrapartida com o que traz nossa lei positivada, consegue-se compreender com clareza o
conceito extensivo dos direitos da família do preso, acerca do direito reivindicatório desses,
em função dos princípios constitucionais de cidadania, humanidade e da dignidade da pessoa
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humana, estampados na Constituição Federal e nos principais tratados internacionais dos


quais o Brasil é signatário.

Se por um lado, certa parcela dos infratores apenados destina o fruto de seus
rendimentos e esses advindos do crime, ao subsídio de suas famílias, justificaria, portanto, a
necessidade de recursos subsidiados pelo Estado para a manutenção dessas famílias, tendo em
vista a subtração monetária ocorrida no ambiente familiar e as dificuldades decorrentes desse
fato. Dessa forma, não seria errado a presunção da aplicação das bases estruturais do direito
no Brasil, em auxilio a essas famílias e com isso, consagrando a supremacia dos direitos
constitucionais, os quais defendem a arguição de direitos concernentes ao preso sob o enfoque
extensivo às famílias de modo a priorizar os direitos fundamentais do cidadão.

Nessa seara, as garantias constitucionalmente detalhadas aos componentes do


sistema carcerário brasileiro, bem como às suas famílias – ou afetos que recebem tal título –
sob a luz constitucional, cabe mencionar a existência dos direitos fundamentais já discorridos,
os quais por serem amplos à sociedade acabam por atingirem o público alvo desse estudo.

Destarte, o Art. 5.º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade
do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

I - Homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta

Constituição;

II - Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude

de lei;

III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;

IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;

V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização

por dano material, moral ou à imagem;

VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre

exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de

culto e a suas liturgias;

VII - é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas

entidades civis e militares de internação coletiva;

VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de


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convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação

legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei;

IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de

comunicação, independentemente de censura ou licença;

De acordo com Guimarães e Machado (2014, p. 572)

“Destarte, o sistema prisional tem o dever de garantir ao infrator condições que assegurem a
dignidade da pessoa humana, sendo este, um princípio constitucional que preside os demais
direitos e garantias fundamentais objetivando que o sistema prisional ofereça todas as
condições necessárias para inseri-lo na sociedade novamente.”

A preservação dos direitos fundamentais esculpidos no artigo em questão nos termos


do inciso III, é o que se espera do Estado, visto que os Direitos Humanos, enquanto
instituição, atua tutelando esses direitos, e a exemplo disso, nos procedimentos de segurança
submetidos aos visitantes nos dias abertos à visitação da população carcerária, bem como aos
próprios presos no interior do sistema prisional, objetivando evitar constrangimentos,
agressões ou situações que porventura possam interferir na integridade física ou psicológica
dessas pessoas.

Como se não bastasse, em meio a toda essa problemática, estudos apontam que 70%
dos presos que são reintegrados à sociedade, voltam a cometer crimes.

De acordo com uma análise estatística realizada pela Instituto Igarapé recentemente,
fatores que mais aumentam as taxas de reincidência são:

• não voltar a morar com a família depois da experiência de privação de


liberdade

• ter praticado o primeiro delito na adolescência.

Segundo o estudo, a ausência de trabalho também é uma variável que impacta a


dinâmica de reincidência, mas como uma mediação entre as outras duas. Nas palavras dos
autores, “provavelmente, porque aqueles que não têm uma família que possa recebê-los após a
experiência de cárcere encontrarão maior dificuldade em obter um emprego, ainda mais se
começaram a carreira criminosa cedo, acumulando uma grande quantidade de passagens pela
polícia, mesmo quando muito jovens”.
17

Para (Madeira, 2008), os programas existentes para os egressos são de difícil acesso,
posto que distantes das comunidades de residência desses sujeitos.

Corroborando a isso, a principal demanda, que é a inserção no mercado de trabalho, é


exatamente a que esses projetos menos conseguem ajudar (Julião, 2009), haja vista que os
incentivos previdenciários dados a quem contrata o preso são interrompidos quando este se
torna egresso (Rocha, 2013).

Parafraseando (Castanho, 2019), Os ex-presidiários encontram ao fim de suas penas,


aliadas a tudo de ruim que viveram no cárcere, como suas únicas redes de relacionamento,
outros presidiários e isso acaba impedindo seu reingresso ao convívio social e o que faz com
que a rede de relacionamentos desses sujeitos seja mais restrita ao mundo do crime (Castanho,
2019).

Enumeradas várias das desvantagens, temos então um desalinhamento nos âmbitos


familiares, comunitários, tecnológicos, informacionais, relacionais, além das de trabalho e
profissionalização). Segundo informações na grande mídia feitas pelo Departamento Nacional
Penitenciário (Depen), dos egressos das prisões, os crimes mais praticados após ganharem a
liberdades são os roubos, furtos e tráfico de drogas.

Para (Paixão, 1983), os novos delitos dos egressos tendem a ser prontamente
identificados pela polícia, dado o excesso de ações de policiamento ostensivo nas áreas pobres
das periferias das grandes cidades, que têm como foco especial os “ex-presidiários” (Monteiro
& Cardoso, 2013). Esse procedimento acaba por contribuir para que haja uma maior chance
de segunda detenção, o que terá efeitos pontuais e severos na nova experiência de privação
de liberdade.

Fatores que contribuem para a acumulação de desvantagens que condicionam a


trajetória de reincidência prisional:
18

FONTE: Instituto Igarapé Rio de Janeiro - RJ – Brasil

No estudo apontado pelo Instituto Igarapé, ainda aponta conforme quadro abaixo os
fatores elencados que contribuem e são condicionantes da reincidência,
19

FONTE: Instituto Igarapé Rio de Janeiro - RJ – Brasil

AUXILIO RECLUSAO

Umas das questões mais polêmicas acerca do tema é aquela relativa ao auxílio-
reclusão recebido por parte dos dependentes do preso. Severas críticas demonstram,
efetivamente, a ignorância por parte de seus críticos sobre conhecimento por menor que seja,
das particularidades e requisitos que delineiam a política pública empreendida.

Fato é que, terão direito ao auxílio reclusão, os trabalhadores condenados e presos


que ao tempo dessas prisões e antes de serem condenados exerciam uma atividade
regulamentada e, de tendo como requisito básico, suas contribuições percebidas pelo INSS
(Instituto Nacional de Seguro Social). Assim, ao estarem inseridos no regime fechado ou
semiaberto, farão jus ao benefício previdenciário em questão já que para os casos dos
apenados em sistema aberto, não se adéquam a tal benesse já que nesses casos, existe a
20

possibilidade de se estabelecer o cumprimento de trabalho formal ou informal por parte do


apenado.

A premissa básica para que o apenado seja assegurado com veemência o auxílio-
reclusão é o princípio da personalidade da pena. Denota se então que o recurso monetário em
menção comprova a não responsabilização dos familiares (ou pessoas afetivamente
vinculadas) pelas atitudes de outrem.

Dessa forma, a negativa da concessão do referido abono financeiro do Estado para a


família do apenado, seria uma violação da Constituição Federal, especificamente em seu art.
1º, inciso IV, ao passo em que haveria interferência ao direito social do trabalho, gravando
assim o desrespeito aos impulsos sociais dos trabalhadores que por motivos diversos
adentraram no sistema prisional.

A própria Carta Magna assume essa tutela ao afirmar que entidade famíliar, como
sendo passiva de especial proteção do Estado.

Ademais, além de tais requisitos e esses já mencionados, para o acesso dos


dependentes como beneficiários desse direito, e do programa, será necessária a classificação
dos apenados como sendo de baixa renda, e dessa forma,

Na data do recolhimento da prisão tiveram como último salário de contribuição o


valor igual ou inferior a R$ 915,05, de acordo com a Portaria nº 02, de 6/1/2012. (...)

O auxílio-reclusão terá valor correspondente a 100% do salário-de-benefício, que,


por sua vez, é a média dos 80% maiores salários-de-contribuição do período contributivo, a
contar de julho de 1994. Dessa forma, o valor do auxílio-reclusão não é fixo e vai variar de
acordo com as contribuições de cada segurado (MOURÃO, 2012).

A FAMÍLIA DO CONDENADO

O indivíduo apenado acaba perdendo alguns direitos que fazem parte da vida de
qualquer ser humano como a liberdade, a pessoa fica isolada do convívio familiar, da
sociedade e perde os direitos como o de ir e vir, o direito à sua autoimagem, e direitos
estampados no Código Civil Brasileiro. O condenado uma vez preso, ao entrar na prisão,
recebe número de registro além de deixar seus pertences e roupas, vestindo um uniforme
21

sendo obrigado a adotar postura submissa, como regra devem andar com as mãos para trás, e
não encararem as autoridades.

No âmbito da cadeia, ficam sem seus direitos familiares e civis como o direito ao
voto, o direito de se responsabilizar pelos próprios filhos, sem direito à privacidade visto que
na grande parte dos presídios brasileiros sequer existe privacidade para uso ao banheiro por
exemplo.

O detento é exposto constantemente aos olhares dos outros presos, quer seja no pátio,
no banho de sol, no dormitório coletivo e no banheiro. É obrigado a conviver de maneira
intima com pessoas que não se escolhe e que por muitas vezes não são bem toleradas pelos
seus comportamentos e outras que não tem mais nada a perder, de forma que esses indivíduos
passam a temer pela própria vida. As visitas são públicas, e seu sigilo a correspondência
violados ou censurados. Até os gestos dos encarcerados são constantemente vigiados de forma
a perder qualquer possibilidade de dignidade sendo esses mantidos pelo estado, porém com
dividas internas para se manter, dormir, usar banheiro e até para se manter vivo, o que recai
sobre suas famílias.

O cárcere, portanto, nesse conjunto de barbáries físicas e morais e porque não dizer
psicológicas, que gravam o indivíduo, possui papel relevante enquanto ambiente que qualifica
o criminoso como inadequado ao convívio social, fazendo com que esse indivíduo assuma,
perante à sociedade, uma imagem de descrédito que por sua vez é estendido aos seus
familiares.

Francesco Carnelutti (2009) é acertadamente preciso, quando afirma que o preso,


uma vez classificado judicialmente como tal, perde, quase que instintivamente, sua
humanidade.

A questão é muito mais grave. O preso, ao sair da prisão, crê já não ser um preso,
mas nós, não. Para nós ele é sempre um preso, um encarcerado; pelo mais, diz ex-encarcerado
sendo nesta expressão registrada a crueldade e está o engano. A crueldade está em pensar que,
tal como foi, deve continuar sendo. A sociedade crava em cada um o seu passado.
(CARNELUTTI, 2009, p. 113).

A prisão é uma forma fantástica de punir os infratores das normas penais, no entanto,
o que carece esse sistema é a falta de políticas públicas, regulamentação do Estado, para
resultados efetivos e uma sociedade menos violenta.
22

Ao perceber que as famílias ocupam uma posição de notoriedade quando se discute


o tema da criminalidade e da progressiva violência urbana, não é um erro atribuir a família
papeis dentro de tais questões, muitas vezes, seriam paradoxais entre si. Nesse contesto,
observa-se que a família vez assume o papel de culpada do abandono do encarcerado, e por
outras vezes sendo vítimas do azar da situação de pobreza, por exemplo.

A agressão virtual sofrida pelas famílias, além de se mostrar na realidade financeira,


tem um peso incomensurável no psicológico, haja visto que sofrem não somente com a falta
do ente no convívio do lar, mas principalmente ao lembrar das condições em que ele se
encontra, entra dia e sai dia.

Nesse ponto vale que a família é o ambiente primário no qual o indivíduo irá iniciar
seu processo de desenvolvimento e socialização, e nas palavras de SCHENKER, é onde, pela
primeira vez, terá relações interindividuais e pessoais. Exerce, por isso, grande influência na
formação psicológica e social de seus membros, justamente pelo fato de constituir o meio
primitivo de transferência de valores e condutas (SCHENKER; MINAYO, 2003).

O ambiente familiar no processo de cognição e formação do indivíduo, é de suma


relevância por sua capacidade de fornecer cuidados necessários a componentes variados quer
sejam culturais ou de conhecimento de leis por exemplo, tanto de forma temporária quanto de
modo perene. Nesse diapasão, conclui o bispo João Carlos Petrini (2003, p. 43) que

“quanto mais frágeis os vínculos e os cuidados que a rede da solidariedade familiar


oferece, tanto menores são as chances de integração social para os seus membros‖. Percebe-se,
assim, o imenso valor da unidade familiar para a vida de um condenado a uma pena a qual
restringe sua liberdade, visto ser a família o maior liame que ele possui com a realidade fora
do estabelecimento prisional” (OLIVEIRA, 2010, p. 7).

Partindo para a análise da família do indivíduo tido como criminoso, delimitam-se


algumas características comumente encontradas no seu ambiente de desenvolvimento e nesse
contexto, geralmente, as unidades familiares dos presos evidenciam uma dinâmica
disfuncional, isto é, são de alguma maneira, desestruturadas.

Nesse sentido, podem não possuir a presença de um elemento com função parental, o
pai ou a mãe, apresentar uma situação socioeconômica crítica, conviviam com portadores de
vícios, ou até mesmo, podem combinar todos esses fatores, por exemplo (GARCIA, 2003,
p.108).
23

Os reflexos da sanção penal, portanto, perturba a estrutura familiar remetendo a uma


situação ameaçadora e dessa forma sugere tanto um aspecto regulador no funcionamento do
sistema, quanto projeta um cenário que possam denunciar as questões não solucionadas, que
se mostram ocultas ou disfarçadas no convívio da família.

A realidade dos presídios hoje é a falta de manutenção das cadeias públicas que
deveria ser feito pelo estado, mas não é o que acontece de fato, ocasionando rebeliões e fugas,
proliferação de doenças e nesse cenário, as celas não são devidamente higienizadas, há
consumo de drogas e até comercialização.

Uma das consequências mais grave desta falência prisional é a superlotação pois, o
número elevado de presos acarreta vários problemas. Um presídio que tem capacidade para
350 presos, e está com 1.000, quase três vezes mais que sua capacidade, não terá condições
nenhuma de fornecer uma local de sobrevivência a nenhum deles. Com a cadeia superlotada
vai faltar espaço para abrigar todos, acaba que eles têm que se adequar ao que eles têm, sendo
assim dormindo em locais de muita precariedade; no chão de sua própria cela, no banheiro,
dormindo juntos com os ratos, baratas e convivendo lado a lado com vários tipos de doenças.

Em consequência disso, já é possível presumir que a prisão causa efeitos intramuros


e extramuros, não somente no preso, mas nos agentes penitenciários que trabalham nos
ambientes prisionais, como se extrai do relato trazido por Dráuzio Varella (2012).

Após leitura da obra de Dráuzio Varella, intitulada Carcereiros, na qual o autor, em


razão da sua vivência como médico do cárcere, faz graves relatos deixando exposta a
realidade carcerária, onde é possível constatar uma série de efeitos (sociológicos, psicológicos
e biológicos) da prisionização.

A assimilação pelos indivíduos, do comportamento de grupos e comunidades


existentes dentro da prisão, conhecidos por gangues, facções ou coletivos e não apenas isso,
existe uma cultura própria desses grupos com regras próprias e código de conduta próprio.
Dessa forma, carcereiros, internos, as famílias e, até mesmo seus defensores advogados
passam a utilizar a mesma linguagem e os mesmos vícios linguísticos que compõem a cultura
local dos presídios.

É como se fosse um idioma estrangeiro, outra língua que deve ser aprendida.
Praticamente, isto significa um dos aspectos da recodificação da existência do indivíduo
preso. (RESENDE, 2013, p. 367).
24

A ideia dos direitos do preso tem origem recente e decorre da consequência racional
de se considerar que a privação de liberdade como uma medida extremada, não teria o condão
de retirar do apenado suas garantias básicas de subsistência. Tais limites deveriam serem
estabelecidos, de forma definitiva, os quais são reforçados pela comprovação através de uma
análise mesmo raza de que é um mal, para o qual ainda não se encontrou substituto. Por outro
lado, não parece existir esforços sérios para reduzi-lo, pelo menos em nosso país e ao
contrário disso, há um clamor popular de quem nunca passou ou teve alguém próximo
cumprindo pena, no sentido de afunilar ainda mais a penúria de quem se encontra na situação
de detento.

Assim, Lei de Execução Penal não passa de uma "carta de intenção", onde a falha
estrutural, aliada ao total descaso dos governantes corrobora de forma marcante na conversão
dos centros penitenciários brasileiros em verdadeiras "universidades do crime".

Se por uma perspectiva, a precariedade e falência do sistema prisional acabam tendo


o condão de fazer o apenado se arrepender dos crimes cometidos, por outra, o ambiente
insalubre ao qual são submetidos causam estrema revolta.

Na maioria dos casos, o homem quando privado de liberdade, sobrecarrega a mulher


que neste momento assume as responsabilidades que dele seriam, acumulando com isso, além
da função de mãe e cuidadora dos filhos quando menores, ainda com a lacuna financeira
deixada pelo homem preso e dessa forma não vê outra saída senão a de encontrar novos meios
de bancar a casa e os filhos. Um claro exemplo a exemplo da candidatura a outro emprego ou
da submissão a uma carga maior de trabalho. Assim, para garantir o sustento da família, terá
que mudar sua rotina, abrindo mãos de mais tempo com a família para assumir uma carga
horaria maior nos empregos a fim de suprir a situação deixado pelo homem preso.

Nesse interim, as famílias acabam precisando de recorrer a subsídios do Estado,


como o auxílio reclusão, bolsas e outros. Tal alternativa não garante a solução do
desdobramento sobretudo financeiro decorrente da separação de um dos membros da família.

Wacquant afirma:

“A entrada na prisão é tipicamente acompanhada pela perda do trabalho e da


moradia, bem como da supressão parcial ou total das ajudas e benefícios sociais. Esse
25

empobrecimento material súbito não deixa de afetar a família do detento e, reciprocamente, de


afrouxar os vínculos e fragilizar as relações afetivas com os próximos (separação da
companheira ou esposa, "colocação” das crianças, distanciamento dos amigos etc.)
(WACQUANT, 2005 apud

OLIVEIRA, 2010, p. 26).

Em meio a essa problemática nota-se um acentuado empobrecimento


econômico afetando não somente as condições financeiras do condenado e de sua família,
mas tornando um fator fundamental e determinante para que seu convívio social jamais volte
aos níveis da normalidade assim, os deixando sob a mácula quase infinita de ter tido um ente
apenado.

O problema vai se asseverando com a falta de qualquer acompanhamento psicológico


ou psiquiátrico.

Apesar disso e ainda corroborando com os efeitos da clausura e esses agravados pelo
próprio sistema que ao ser incapaz de tornar a vida dos apenados menos ociosa, acaba por
fomentar pensamentos ruins e esses aliados aos que acima fora chamado de “faculdade do
crime”, quando o delinquente readquire a liberdade, se depara-se com os obstáculos impostos
pela sociedade preconceituosa que o excluí e não consegue enxergá-lo como um indivíduo
normal, aplicando-lhe outras sanções pesadas, além das já impostas pelo Estado, e este por
sua vez ao não conseguir se recolocar no mercado de trabalho, se vê na encruzilhada do
cometimento de novos crimes para tentar com isso sobreviver.

A pretensão de que a penas privativas de liberdade possam preparar o indivíduo para


a vida em sociedade acabam por falir e perder seu objeto. O caminho adotado acaba por
propiciar a formação de uma sociedade de artificial, na qual o indivíduo necessita das
motivações da sociedade livre, adquirindo características grosseiras e primitivas, e essas
tendem a se repetir e persistir após a recuperação da liberdade, que ao entrar em conflito com
a sociedade livre, têm a oportunidade de manifestar-se.

Nas palavras de Schilling e Miyashiro significa:

“marca ou cicatriz deixada por ferida; qualquer marca ou sinal; mancha infamante e imoral na
reputação de alguém; sinal infamante outrora aplicado, com ferro em brasa nos ombros ou
braços de criminosos, escravos etc.; aquilo que é considerado indigno, desonroso; falta de
lustre, brilho ou polimento; moral; desonra, descrédito, infâmia, demérito, descrédito,
26

deslustro, enxovalho, infâmia, labéu, mácula, nódoa, perdição, perdimento, raiva, vergonha”.
(SCHILLING; MIYASHIRO, 2008, p. 248). Atribui-se tal denominação à Erving Goffman.

A vergonha assola a família do detento. O medo é um sentimento latente de uma


ferida que não se fecha e esses sentimentos ruins, atormentam a unidade familiar.

A chegada da família no ambiente prisional para visita por exemplo, se deparando


com as condições precárias em que vivem os seus entes ou o fato de não se saber ao certo se o
membro da família privado de liberdade está sendo maltratado, ou se está enfrentando
situações perigosas dentro do próprio ambiente de reclusão, ou, até mesmo, se antes de ser
preso contraiu dívidas que poderão ser cobradas de algum modo à família.

É a pena servindo ao seu papel primordial, sua função primeira, de punir. Rudnicki et
al. (2017, p. 611) em suas afirmações traz “[...] logo o direito penal é utilizado como forma de
controle social e, nesse sentido, o estigma, que resulta do aprisionamento, mostra-se a
ferramenta mais marcante de exclusão social”.

Entretanto, por mais que exista normas e até mesmo princípios constitucionais que
zelam o bem-estar do preso, muitas vezes a família do preso não tem tanto respaldo, sendo
abandonadas e com isso as consequências da sanção penal não recaem.

Vale ressaltar as palavras de Cabral e Medeiros (2014, p. 20):

No tocante ao Direito Penal, analisado sob o enfoque do texto constitucional,


entende-se que a proteção aos direitos fundamentais deve ser extremamente priorizada no
caso dos indivíduos condenados à pena privativa de liberdade. Não obstante haver a proteção
constitucional ao instituto da família e ao indivíduo encarcerado, clama-se pelo amparo da
família do apenado, extremamente fragilizada pelo afastamento de um de seus membros. Isso
implica dizer que é essencial respeitar os direitos dos presos e, do mesmo modo, daqueles que
vivem ao seu redor, haja vista a garantia dos direitos de um ocorrer somente com a
preservação dos direitos do outro.

Com isso, as consequências da sanção penal não recaem apenas ao apenado, porém a
partir de sua condenação, além dos danos psicológicos, sociais e financeiro, vem também o
descaso do acesso à justiça e demonstrando que ainda sim a pena transcende à sua família.
27

Portanto, a pesquisa demonstra as dificuldades advindas do sistema prisional


brasileiro, pois deixa além do preso sem a aplicação de seus direitos legais, por mais que
existam leis que o respaldem, também demonstra que a família do apenado não tem um
amparo, necessitando da mudança de postura do Estado diante do cárcere e a família do
encarcerado, pois fazendo isso reduz, possivelmente, futuros criminosos reincidentes e
também preservaria a família, que é um dos pilares para a constituição, sem efeitos negativos
e com respaldo legal.

O maior desafio do sistema prisional brasileiro é fazer prevalecer as garantias


constitucionais e dentre elas senão a mais importante como o princípio básico de valorizar de
forma abrangente a dignidade humana estampadas no artigo 1º da Constituição Federal,
assim, considerando a ligação indissociável o preso e sua família, é necessário entender até
que ponto esses seguros afetam àquela. Em outras palavras, é necessário entender que existe
uma entidade familiar que deve ser preservada por trás do comportamento ilegal do infrator, a
qual não podem ser legalmente ou socialmente responder pelo verdadeiro autor do crime.
28

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao fim deste trabalho, resta uma clareza uníssona quanto aos reflexos ruins causados
pela prisão de um ente, no seio da unidade familiar. Os desdobramentos sentidos pelas
famílias em várias esferas de suas relações com o mundo expostas nesse trabalho de pesquisa,
traz uma reflexão importante, mas sobretudo a certeza de que esses reflexos gravam nas
“almas” dos familiares, cicatrizes capazes de serem lembradas por toda as suas vidas.

As garantias constitucionais e as garantias positivadas nos tratados internacionais


dos quais o Brasil é signatário, devem assumir seu papel para que a supremacia do poder
estatal possa regrar com mais isonomia primando pelos interesses mais básicos dos que estão
sob clausura, e assim, fazendo chegar aos apenados uma mínima percepção de cognição de
dignidade, enquanto cumprem suas penas.

As várias vertentes apontadas aqui, mostra uma realidade paralela a que se submetem
quem por algum motivo passou pelos portões de um presidio para cumprir qualquer pena que
fosse, e retrata o que realmente espera um egresso quando recolocado ao convívio em
sociedade.

Se faz assim necessário, uma avaliação mais aprimorada de políticas públicas


orientadas para esse grupo onde deverão ser estudados fatores específicos de proteção à
comunidade carcerária e por conseguinte no seu âmbito familiar, delineando os instrumentos
de maneira a verificar o papel de cada um das inúmeras particularidades acerca desse tema,
com destaque para aquelas que envolvam o poder público e o modo com a sua atuação possa
contribuir tanto para a proteção, quanto para a reinserção desses grupos na vida cotidiana sem
que os deixem chegar no caminho sem volta da reincidência.

Presume se que a partir daí muitas perguntas possam ser respondidas mas que outras
só poderão ser razoavelmente respondidas quando a área se ocupar com atenção de produzir
conhecimento científico com maior validade e confiabilidade a respeito do assunto. O Estado
deverá assumir seu papel regulador e criar mecanismos para que os centros prisionais possam
realmente reabilitar seus reeducandos de forma plena e não que sejam a exemplo de hoje,
meras “escolas do crime”.
29

O poder público diante de suas obrigações cogentes, deve criar mecanismos que
sejam instruídos a cuidar para que “as mentes vazias” não sejam como o dito popular,
“oficinas do diabo”.

O amparo psicológico é fundamental diante dessa tarefa, pois nenhum ser humano
vive sem motivação ou sem qualquer perspectiva de um futuro melhor. E que amparos e
benefícios sejam estendidos para os familiares mais próximos para que de certa forma possa
amenizar nas famílias, o peso que hoje recai sobre seus ombros, assim como no acolhimento
do pai, filho, filha ou outro ente egresso.

Presídio sem ocupação se torna uma escola “às avessas”: uma formadora de
criminosos cada vez mais perigosos. Nesse cenário, é obrigação do Estado, promover aos
indivíduos presos melhores oportunidades e ao longo de suas vidas, terem a chance de estudar
para garantir um futuro melhor.

O tempo que despenderá atrás das grades pode e deve ser utilizado para garantir aos
reeducandos, as oportunidades que nunca tiveram por meio de estudo, qualificação, trabalho a
todos garantindo assim a certeza de remissão de parte de suas penas bem como ao mesmo
tempo em que os promova lateralmente.

Essa população necessita de trabalhos que sejam capazes de os profissionalizar,


trabalhos que possam agregar maior valores às suas vidas. A proteção aos direitos
fundamentais nos presídios deve ser extremamente priorizada no caso dos apenados
condenados à pena privativa de liberdade.

A proteção constitucional ao instituto da família e ao indivíduo encarcerado, almeja


amparo da família do apenado, e esta por sua vez, extremamente fragilizada pelo afastamento
de um de seus membros.

Oportunamente pode se dizer que é essencial respeitar os direitos dos presos e, do


mesmo modo, daqueles que vivem ao seu redor, sua família, tendo em vista a garantia dos
direitos de um ocorrer somente com a preservação dos direitos do outro.

Também se faz necessária a mobilização para campanhas onde possam discorrer


sobre o necessário desagravo sentido pelas famílias que possuem um ente preso. Se faz de
suma importância que através dessas campanhas estatais, sejam removidos os vieses
preconceituosos que recaem sobre essas famílias e com isso reafirmar os institutos de
30

intranscendência penal com o intuito de impedir que uma pessoa que não tenha cometido um
crime, cumpra pena pela a autora do delito.

Essas medidas assistencialistas deverão garantir a aplicabilidade prática da


personalidade da sanção penal, retirando o inegável sofrimento das famílias, o qual pode ser
comparado em um grau quase de igualdade às dificuldades enfrentadas pelo próprio apenado.
Os efeitos psicológicos, financeiros e sociais com os quais as famílias acabam convivendo,
fragilizam a dinâmica familiar natural, enfraquecendo com isso a relação dos parentes com a
pessoa egressa, dificultando ainda mais o processo de cumprimento de pena e a própria
reinserção do detento quando da sua volta ao convívio social.
31

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