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AUTOR: Luís Bernardo Honwana narrador agarrou Gulamo para dar o recado.
Enquanto isso, Quim fez um gol.
Formado em jornalismo Gulamo reclamou, pois o narrador o havia
Em 1964, se integrou à FRELIMO (Frente de agarrado no momento da partida.
Libertação de Moçambique) Ninguém deu ouvidos à preocupação do
Ficou três anos preso (1964-1967), quando narrador para com o cão tinhoso.
soltou lançou o único livro Nós matamos o cão Segunda feira, na escola, o narrador (Ginho)
tinhoso voltou a falar da morte do cão tinhoso.
Quim disse que o cachorro seria morto de
OBRA: Nós matamos o cão tinhoso verdade por meio de uma bala de ponto 22.
Os dois conversavam em meio a aula de
ANO DE PUBLICAÇÃO: 1964 desenho. Quim não estava nada preocupado
com o animal.
GÊNERO LITERÁRIO: Gênero narrativo (7 contos) No intervalo, Isaura dialogou com eles sobre a
morte do cão, mas não acreditou que fosse
MOVIMENTO LITERÁRIO: Modernismo africano verdade que o cachorro fosse morto. Assim,
(questão da identidade nacional e figuras ela foi atrás do animal para dar-lhe carinho.
estigmatizadas) Dias depois, o Senhor Duarte da Veterinária
conversou com os meninos dizendo que eles
CONTO: “Nós matamos o cão tinhoso” deveriam matar o cão.
O Doutor da veterinária havia pedido ao
FOCO NARRATIVO: narração em primeira pessoa Senhor Duarte da Veterinária a morte do
(Ginho) cachorro. Os jovens deveriam passar a corda
ao pescoço do cão, levá-lo para longe e brincar
ESPAÇO: Maputo aos arredores da escola de tiro ao alvo com o bicho.
Os jovens voltaram para a escola e
ENREDO: combinaram como seria a morte do cão
tinhoso. Ginho, o narrador, se dirigiu à sua casa
Descrição do cão tinhoso próximo da escola: para buscar a corda e uma espingarda. Em
olhos azuis, cheios de lágrimas, andava seguida, ele voltou para a escola.
tremendo todo estranho, havia cicatrizes, Mais tarde, partiram em doze jovens com o cão
pelos brancos e muitas feridas. tinhoso amarrado para a estrada do
Aos arredores da escola, haviam outros Matadouro com o intuito de assassinar o
cachorros. Às vezes, ocorriam pequenos animal.
conflitos entre eles e o cão tinhoso. O narrador (Ginho) arrastava o cão que chiava
Isaura estava à procura do Cão tinhoso. Ela se baixinho. Em certo momento, teve vontade de
encontrou com o narrador (Ginho) e viram o chorar. Ele estava com pena do cão. Ginho,
cão à porta da escola. com muita pena do animal, disse que ficaria
Isaura abraçou o cão. A Senhora Professora viu com o cão, iria levá-lo para casa e cuidar do
a cena e criticou, violentamente, a postura de bicho.
Isaura para com o animal e ainda espantou o A pena de Ginho para com o cão gerou muita
cachorro. confusão entre o grupo. Todos passaram a
Certa vez, em um sábado, todos estava no debochar dele que estava com medo de matar
clube, era hábito jogarem bola e cartas nesse o cachorro. Enquanto isso, o cão tinhoso
dia. O Administrador estava jogando cartas e permanecia debaixo das pernas do narrador a
acabou perdendo. Todos debocharam dele. tremer muito.
Assim, o Administrador olhou e viu o cão Ginho tirou a corda do pescoço do cão. Ele
tinhoso a rir também e zangou-se: “Eh! Quem ainda insistia que o animal não deveria morrer.
é que disse que isso não era a Arca de Noé?”. Ginho disse que levaria o bicho para a sua casa
de tal maneira que ele não iria mais incomodar
O Doutor da Veterinária olhou o cão tinhoso e ninguém pelas ruas com a sua imagem
se queixou do aspecto grotesco do cachorro. deplorável.
Então o Administrador disse: “- O Cão Tinhoso Houve muita pressão moral com o narrador
vai morrer!”. para dar o primeiro tiro no cão.
O narrador (Ginho) saiu assustado para avisar O narrador mirou a sua arma para o cão. Teria
os colegas. Em meio à partida de futebol, o que atirar, mas estava repleto de medo.
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Contudo, a pressão moral do grupo obrigava-o bastante pena de matar o animal, dois
a fazer aquilo que ele não desejava. Ginho, o personagens negros num colégio dominado
narrador, com o cão sob a sua mira, fechou os por brancos, pode ser compreendida como
olhos para não ver o animal. Ginho, de olhos resultado da ligação estabelecida entre os três
fechados, pedia desculpas ao cão. excluídos – também eles dotados de
Ginho apertou o gatilho. Houve muito barulho sentimentos, como compaixão e piedade, algo
e gritos. Em seguida, Isaura aparece abraçando que o poder dominador
o cão tinhoso.
O tiro do narrador não acertou o animal. Ginho Entendemos que a ambiguidade pode ter sido
tentou tirar Isaura de cena, mas ela continuava um caminho utilizado pelo autor para pensar a
abraçada ao cão. complexidade das questões de caráter
Tiraram Isaura de perto do cão. histórico-político e social que aparecem como
Quim estava em cima da pedra e todo o grupo temas na narrativa.
apontava as armas para o cão.
Em seguida, todos atiraram nele. Como alegoria, a narrativa pode ser lida em sua
Isaura procurou apoio no abraço do narrador. ambiguidade, que vai sendo percebida através
Após a morte do cão, Isaura se lançou na mata da relação que os partícipes da sociedade
e desapareceu, muito triste e assustada. colonial estabelecem com o cão na narrativa. A
O conto terminou com um diálogo entre partir dessas relações é que podemos fazer
Ginho, o narrador, e Quim. Este disse ao uma leitura do cão como uma figura decadente
narrador que foi melhor o cão tinhoso morrer, do colonizador, do sistema colonial português
pois os cachorros não brincavam com ele. ou como uma representação do território ou
Na verdade, essa desculpa é um álibi para do indivíduo colonizado, que tem sua imagem
Quim justificar a sua violência. Ginho disse que execrada por determinada parcela da
Isaura pediu ao pai dela para agredir a malta sociedade.
pelo assassinato do cão. No final do conto, a
professora apareceu chamando os jovens para Sem descartar tal leitura aprioristicamente e
a aula. trabalhando com o cão enquanto
representação do colonizador/sistema
PERSONAGENS: colonial, a primeira imagem sugestiva que
surge no texto é a dos olhos azuis do Cão-
1) Isaura Tinhoso (p.5), convencionalmente associada
2) Ginho ao homem branco europeu, o que parece vir
3) Quim ao encontro de uma suposta inferência ou
4) Senhora Professora expectativa de que o cão morto ou assassinado
5) Senhor Administrador devesse ou precisasse ser o colonizador,
6) Doutor da Veterinária sugerido desde os títulos do conto e do livro.
7) Doutor Duarte
8) Gulamo Dessa forma, se antes nos concentramos no
9) Cão Tinhoso interesse da elite branca em matar o Cão-
10) Lobo Tinhoso, agora atentaremos precisamente na
atuação de Ginho e de Isaura, dois
ALGUNS PONTOS IMPORTANTES SOBRE O CONTO personagens que representam a população
negra moçambicana na narrativa. O primeiro,
Nesse sentido, observe como os nomes dos na nossa leitura, passou por um processo de
personagens detentores do poder, todos eles transformação, melhor dizendo, alterou a
brancos, no universo infantil de Ginho, são estrutura de sua consciência em relação à
todos identificados pelo cargo que ocupam e morte de Tinhoso e dos possíveis
pela letra maiúscula, como em Senhora desdobramentos dessa ação. Já a menina
Professora, Senhor Administrador ou Doutor nutria uma cumplicidade inabalável ao cão,
da Veterinária – seria, portanto, como se colocando-se contrária à sua morte até o
fossem, eles próprios, representantes do último momento. Esses dois posicionamentos
sistema colonizador. dos personagens podem denotar tanto a
dicotomia que se formou no interior da
A reação de Isaura de defender o Cão Tinhoso FRELIMO como pode aludir à presença do
com o próprio corpo e de Ginho, de ter “inimigo interno” do movimento.
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PERSONAGENS:
1) Madala
2) Maria
3) Pitarrossi CONTO: “Papá, cobra e eu”
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CONTO: “As mãos dos pretos” assim dizer, ênfase da obra de Bernardo
Honwana em geral.
FOCO NARRATIVO: narração em primeira pessoa As mãos dos pretos”, em particular. A versão
da mãe se apresenta a nós como dramática
apresentação da sabedoria africana, a única
Esse conto não possui um enredo. Ele é uma que pode discorrer sobre si mesma a partir de
espécie de reflexão do narrador a respeito dos dentro, com conhecimento de causa, sem a
lugares comuns que procurar explicar a contaminação ideológica de ex-potências
condição da cor negra. Na verdade, a respeito coloniais brancas, que veem a África como
das mãos brancas dos negros. O conto é uma território de rapina e os negros como seres
belíssima reflexão sobre as escolhas humanas inferiores.
a respeito de valores e verdades sociais. O
racismo, por exemplo, é fruto da escolha CONTO: “Ninguitimo”
humana.
Se a história é obra de mãos humanas, fica FOCO NARRATIVO: narração em primeira pessoa
evidente o equívoco da petição de princípio (narrador sem nome)
que perpetua a violência contra negros.
As mãos sintetizam, assim, as potencialidades ESPAÇO: grande parte da narrativa ocorre na cantina
humanas, para o bem ou para o mal e muito do Rodrigues
bem indicam que o ser humano, por meio
delas, se relaciona com a natureza e com ENREDO:
outros seres humanos, organizando a ordem
social e histórica em que vivem. O conto é aberto por meio de uma descrição
Essa imagem da fabricação é desqualificadora das pombas nas machambas. Há um certo
para os negros, sobretudo pela menção a incômodo na presença dos pássaros.
instrumentos de segunda mão; além disso, eles Em seguida, o narrador descreve a cantina do
não são criados, de acordo com a tradição Rodrigues, espaço marcado pela segregação
bíblica, mas fabricados, coisificados. Por outro de classe e etnia. No espaço, se bebia muito e
lado, essa ideia pode se ajustar de forma havia a presença de prostitutas. No lugar,
interessante ao que diz a mãe do narrador, no haviam homens brancos também.
final do conto; a vida humana, sobretudo em A figura de Vírgula Oito apareceu à cantina.
sua dimensão social, é fabricada por mãos Esse rapaz moçambicano trabalhava nas terras
humanas. Sobre a fabricação da realidade, do Rodrigues.
Blikstein dá explicações teóricas convincentes Vírgula Oito também possuía a própria
e em correspondência com o que Honwana faz plantação.
em termos literários. A realidade é construída. O primeiro encontro com Vírgula Oito para o
As estruturas objetivas da realidade não narrador foi algo marcante.
passam de “estruturações impostas à Na cantina, a conversa dos homens caiu sobre
realidade pela interpretação humana”. a plantação de milho. Vírgula Oito queria que o
Esses locutores representam o saber e a “nhinguitimo” viesse e destruísse a plantação
ciência (professor, um livro), a religião (padre), dos brancos. Além disso, pensou em jogar fogo
o poder econômico (Coca-Cola); todas essas na mata durante três dias para atrapalhar a
falas, digamos, são externas aos africanos, com plantação dos brancos. Assim, ele, Vírgula
exceção da mãe. Parecem ser os personagens Oito, ficaria rico como Lodrica (Rodrigues).
todos estrangeiros, a julgar pelos nomes que Ao ouvir a fala de Vírgula Oito, Maguiguana
têm; não há dúvidas quanto a motivações e disse que os brancos ficarão zangados com o
efeitos dos discursos que produzem. progresso de Massinga (Vírgula Oito).
Podem ser enquadradas, no conto, duas Vírgula Oito, ingenuamente, disse que os
categorias de explicação: 1) exógenas: o preto brancos não ficariam incomodados com o
impuro, animalizado, é inferior, por isso foi progresso dele, pois não fazia nada de errado.
escravizado; 2) endógena: pela explicação da Não roubava, trabalhava muito e pagava
mãe, o preto é igual ao branco e as injustiças impostos, justificou Vírgula Oito.
que sofreu são produzidas pela vontade Havia outro grupo conversando na cantina do
humana. Rodrigues, isso deixa o conto um pouco
Essa perspectiva, é urgente haver iniciativas confuso no momento da leitura.
conscientes de descolonização, que é, por
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PERSONAGENS:
1) O narrador
2) Vírgula Oito (Alexandre Vírgula Ôto Massinga)