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FASM - Faculdade Santa Marcelina

A Paisagem Brasileira no Século XX

Pós 1922
Pesquisa realizada para a disciplina de História da Aquarela
Professor: Norberto Stori

Curso de Pós-Graduação “Lato-Sensu” em Artes Plásticas - Pintura em Aquarela

alunos

Iracema de Macedo Almeida


Maria Roberta F. De Sanna
Rosane Rodrigues Wanderley

Agosto 1998

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Introdução

A natureza sempre fascinou o homem desde a pré-histó- casos tornar-se impossível ao espectador visualizar fo-lhas
ria. Campos florais, matas, florestas, árvores silvestres e e caules, troncos e galhos, casas ou prédios. O que pouco
pantanais foram e são desafios para numerosos artistas. ou nada preocupa o artista, interessado apenas em redi-
De Rafael a Picasso, de Van Gogh a Bonadei e Aldemir mensionar o que está a sua frente ou em sua mente. Não
Martins, a busca continua sendo a (re)presentação da fosse assim, a arte e todos os seus segmentos estariam
natureza, o (re)fazer do que já foi idealizado e concretizado fatalmente estagnados, distante anos-luz das conquistas
interminável vezes. havidas desde que o mundo é mundo.
Nos tempos recentes, de um século para cá, as obras Os pintores acadêmicos sempre trataram as paisagens
re-presentativas da natureza aparecem com freqüência tais como seus olhos as vêem. Eles são minuciosos em
durante e após a tendência Impressionista. E em seguida reproduzir todos os detalhes. Privilegiam as cores, após
pelo Cubismo, Expressionismo, Surrealismo e o Abstra- exaustivas pesquisas e confrontos espatulados, que pare-
cio-nismo. Isso tradu-zido significa que a natureza em cem não ter fim. Até que chegam às tonalidades próximas
sua infinita beleza e esplendor original, ganha formas que ao real. Só assim sentem-se recompensados.
poucos fazem lembrar da peça original retratada. É a O perfeccionismo entra nessa batalha de cores e formas,
contemporaneidade em pleno processo de reformulação na busca incansável para a reprodução quase fotográfica
na tentativa de recriar tudo o que já foi criado. do que estão pintando, Assim agiram os pintores brasi-
Essa livre (re)interpretação do artista pela chamada pai- leiros Alexandrino, Clodomiro Amazonas ou Batista da
sagem, possibilita-lhe alterar globalmente o motivo que Costa.
está sendo desenhado ou pintado, chegando em alguns Do fim do século para cá, as constantes e vertiginosas

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transformações da arte resultaram que as pinturas de Sendo natural de Taubaté, dedicou-se fundamentalmente
paisagens enveredaram por caminhos jamais imaginados. retratar a paisagem daquela região.
A simples cópia do que estava à frente do artista já não João Batista de Paula Fonseca
satisfazia. Muitos artistas, então, passaram a recriar o (Rio de Janeiro, 1887 - RJ, 1960)
conteúdo formal e cromático.
O modernismo a partir de 1922, fez novos entusiastas e Pintor. Aluno da antiga Escola Nacional de Belas-Artes,
adeptos da pintura. Excluídas as manifestações culturais recebeu orientação de Rudolf Sindemam, e mais tarde de
indígenas, a cultura que aqui se desenvolve não é mais que João Batista da Costa. Com as telas “Trecho da Gávea” e
um ramo da cultura européia, estendida até a América. “Trecho de Petrópolis”, obteve menção honrosa de Primeiro
Visconti faz a ligação entre o conceito acadêmico e a nova Grau, no Salão Nacional de Belas-Artes (1915). Em 1923.
sensibilidade que irrompe na Semana da arte Moderna, foi agraciado com o Prêmio de Viagem à Europa. Participou
não ultrapassa a fronteira do território que essa nova do Salão Nacional de Belas-Artes, Prêmio Viagem ao País
sensibilidade descobre. Ela se manifesta primeiramente (1933); Salão Paulista de Belas-Artes, laureado com a
no Fauvismo e em seguida no Cubismo. Medalha de Prata (1939). Ocupou, na Academia Brasileira
São de inspiração expressionista as obras que Anita de Belas-Artes, a cadeira cujo patrono é Antônio Parreiras.
Malfati expôs em 1917, como deriva do Cubismo e mais José Benevenuto Madureira
diretamente de Léger a pintura de Tarsila que vai resultar (Sorocaba, SP, 1903 - Santos, SP, 1976)
no “pau-brasil”. Pintor ativo em Santos, SP. Iniciou seus estudos de arte
Armando Reis Pacheco em Itapetininga. SP. com Campos Aires e depois. no Liceu
(Rio de Janeiro, 1913 - Rio, 1965) de Artes e Ofícios da capital paulista. Participou das
Pintor ativo em S. Paulo. Participou do Salão Paulista de coletivas: Salão Paulista de Belas-Artes (1941), obtendo
Belas-Artes, obtendo menção honrosa, 1943. e medalha menção honrosa. medalha de bronze e o segundo prêmio
de bronze, 1953 Prefeitura de S. Paulo (1943), pequena medalha de prata
(1951). e prêmio aquisição (1954, 1956,1957 e 1962).
Clodomiro Amazonas Marie Nivouliès de Pierrefort
Paisagista, toda a sua obra reflete a atração pela nature- Suas telas situam-se na mesma faixa de transição da lin-
za, revelando também a influência dos pintores chamados guagem pictórica de onde se percebe um gosto mais moderno
acadêmicos. do colorido e maior desenvoltura no tratamento das figuras
e dos planos de cor.
Pedro Alexandrino Borges
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(São Paulo, SP, 1856 - 1942)
Com onze anos trabalhou na decoração da catedral de Cam- Nascimento de uma
Arte Nova
pinas, com coordenação do decorador francês Claude Paul
Barandier, decorando também casas particulares. Iniciou seus
estudos com José Ferraz de Almeida Júnior aos vinte sete A arte nova aparece através da atividade crítica e
anos. Estudou na Academia Imperial de Belas Artes do Rio literária de Oswald de Andrade, Menotti del Picchia,
de Janeiro em 1887 com pensão do Governo de São Paulo, de
onde retorna sem conclusão do curso; voltando a trabalhar Mário de Andrade e alguns artistas que vão se cons-
e estudar com Almeida Júnior. Em 1894 e 1895 participou cientizando do tempo em que vivem. São feitas em
da Exposição Geral de Belas Artes no Rio de Janeiro, onde
foi premiado as duas vezes. Como pensionista do Governo do
Estado de São Paulo foi à França completar seus estudos.
Participou dos Salões de Paris de 1899 a 1903. Regressou em
1905, abriu ateliê na Rua Sete de Abril, tendo como discípulos:
Anita Malfatti, Tarsila do Amaral, Aldo Bonadei, Renèe Lefèvre
e Alice Gonçalves, entre outros.

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São Paulo, 11 a 18 de Fev. 1922
Organizadores: Di Cavalcanti, Graça Aranha, Guilherme de Almeida, Mário de Andrade, Menotti del Picchia, Oswald de Andrade,

São Paulo duas exposições de pintura que colocam a Mas, foi a polêmica em torno da mostra de Anita Mal-
arte moderna de modo concreto para os brasileiros: fatti, em 1917, que deflagrou o movimento modernista.
a de Lasar Segall, em 1913, até recentemente acredi-
tava-se que passara desapercebida do meio cultural
paulista, com importância apenas cronológica. Estudos Semana De Arte Mo-
recentes, comprovam que foi uma preparação para
compreensão da modernidade. derna

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estudos. Na Alemanha, freqüenta a Academia de Belas Artes de Berlim e o Museu de Dresden, entrando em contato
com Lowis Corinth e Bishoff Culm, mestres do expressionismo. Em 1915, Anita está nos Estados Unidos aprendendo
pintura na Independence School of Art, cujo diretor, Homer Boss, desempenha um papel importante na sua formação
artística. Regressando à pátria, diversos artistas, entre os quais Di Cavalcanti, entusiasmados pelo seu trabalho,
insistiram para que fizesse a exposição que tantos debates causaria – a de dezembro de 1917, à Rua Libero Badaró,

Ronald de Carvalho e Ruben Borba de Moraes no Teatro Municipal as atividades da Semana de Arte Moderna,
Integrantes: Anita Malfatti, Di Cavalcanti, Ferrignac, John Graz, com uma conferencia de Graça Aranha, recebidas tanto com
Martins Ribeiro. Paim Vieira, Vicente do Rego Monteiro, Yan de aplausos quanto com vaias. 0 evento tem em sua programação
Almeida Prado e Zina Aita (Pintura e Desenho); Hildegardo conferencias e leituras de poemas, recitais de musica, alem da
Leão Velhos, Victor Brecheret e Wilhelm Haarberg (Escultura); mostra de artes plásticas. Pretendendo agitar o ma-rasmo
Antônio Moa e Geogr. Przirembel (Arquitetura); Ernani Braga, da cultura nacional, a Semana propunha uma arte que não
Guiomar Novaes e Heitor Villa-Lobos (Musica); Afonso Schmi- fosse mera reprodução da natureza, mas resultado de uma
dt, Graça Aranha, Guilherme de Almeida, Mário de Andrade, liberdade de pesquisa estética, deixando entrever uma tomada
Menotti del Picchia, Oswald de Andrade, Plínio Salgado, Ronald de consciência da realidade nacional. Entretanto, como coloca
de Carvalho e Sérgio Milliet (Literatura), entre outros Roberto Pontual, como toda ponta-de-lança, a Semana de Arte
Moderna pagava o prego do pioneirismo: era mais vontade do
Histórico/Objetivos que concretização, mais ebulição de idéias do que aplicação de
Afinal, de quem foi a idéia da Semana de Arte Moderna? Mário ideologia”. De fato, foi apenas no decorrer da década de 20 que
de Andrade afirma não ser dele. Di Cavalcanti afirma ter sido os modernistas, assimilando concretamente as inovações da
o idealizador do evento, sugerindo a Paulo Prado a realização arte moderna européia, realizaram uma obra mais consistente.
de “uma semana de escândalos literários e artísticos de meter Anita Malfatti (São Paulo, SP, 1893 – 1964)
estribos na burguesia paulistana”. Anita nasceu em 1893, em São Paulo, e é da mãe que
Somados os esforços desde a Exposição de Anita Malfatti em obtém seus primeiros conhecimentos de pintura. Já em
1917, os defensores da arte moderna decidem tornar pu-blicas
1912, a jovem segue para a Europa a fim de prosseguir seus
suas idéias.
Assim, no ano do centenário da Independência, inauguram-se
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nº 111. Porém, o ambiente artístico que precedera a Sema- micas e sociais da Universidade Suíça. Logo dedicou-se a
na de Arte Moderna de 1922 não estava suficientemente poesia, publicando três livros de poemas em francês. Em
maduro para compreender o vanguardismo de suas obras. I922, regressou ao Brasil tomando parte na Semana de
Entretanto, é indiscutível que a ação reveladora das obras Arte Moderna; como animador do movimento. Foi secre-
de Anita contribuiu de forma decisiva para a eclosão do tário geral da USP (1932 a 1931). De 1922 a l943 tornou-
movimento da semana da Arte Mo-derna. se critico para alguns dos principais jornais e revistas
Di Cavalcanti (Rio de Janeiro, RJ, 1897 – 1976) literárias e artísticas do pais e do estrangeiro. Em 1954,
Sua atividade artística continha o germe do inconfor- foi designado adido cultural da Embaixada Brasileira na
mismo; seus primeiros desenhos marcavam um cunho de Suíça. Foi diretor do Museu de Arte :Moderna de S. Paulo
rebeldia às tradições. de 1952 a 1956. Foi membro da Associação Internacional
Iniciou os estudos de Direito em São Paulo, ao mesmo dos Críticos de Arte (Aica). Desde 1945, começou a dedi-
tempo que trabalhava para o jornal “O Estado de São car-se à pintura, tento exposto nas galerias do Salão de
Paulo” e evoluía como pintor. Abandonou a faculdade para Arte Moderna, Domus, Itá e KLM.
dedicar-se ao movimento intelectual que encontraria sua
definição na Semana de Arte Moderna de São Paulo, de-
dicando-se, desde então, inteiramente à arte.
Grupo Cândido Porti-
Vive em Paris de 1923 a 1925 em contato com as maiores
personalidades do mundo artístico da época. Isto lhe dá nari
um amadurecimento que, voltando ao Brasil, descobre a Após a Semana de arte Moderna e a agitação que ela
cor, a luz, as frutas, as paisagens tropicais, pintando o provocou nos meios artísticos, aos poucos foi surgindo
Brasil mais brasileiro que já se pintou. Retrata muito a um novo grupo de artistas plásticos, que se caracterizou
mulata com sua cor, graça e malícia. pela valorização da cultura brasileira. Além disso, esses
Foi capaz de transformar as influências européias numa artistas não eram adeptos dos princípios acadêmicos,
produção muito pessoal e associada aos temas nacionais. mas preocupavam-se em dominar os aspectos técnicos
da ela-boração de uma obra de arte. Faziam parte desse
Sérgio Milliet (S. Paulo, 1898 - S. Paulo, 1966) grupo Cândido Portinari (1903 – 1962), Guignard (1898
Pintor, escritor e critico de arte. Fez seus estudos primá- – 1962), Ismael Neri (1900 – 1934), Cícero Dias (1908 -)
rio e ginásio em S. Paulo. Em 1913, com 15 anos de idade. e Bruno Giorgi (1905 -).
seguiu para a Europa entrando na Escola de Comercio de
Genebra, ingressando depois, na seção de ciências econô- Alberto da Veiga Guignard (1898-1962)
Após uma longa permanência no estrangeiro, Guignard
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retorna e se sente extasiado diante da luminosidade da pai-sagem brasileira e maravilhado com a amplidão dos seus
espaços.
É nessa época, por volta de 1940, que o artista, devido a problemas materiais e psicológicos, resolve viajar para a

região de Itatiaia, e volta a se sentir bem em meio à ve- resoluta verdade dos objetos de um interior flamengo.
getação local, dando longos passeios e contemplando a Guignard parece ter estudado pacientemente cada pi-
pai-sagem do Vale do Paraíba. nheiro ou folha de árvore, contemplou demoradamente
Nas paisagens que pintou desta região, os elementos co- a variada vegetação, buscou o melhor ângulo, e encarou
locados em primeiro plano são encarados com a mesma com a paixão de um topógrafo cada saliência do terreno.
Pintou tudo com o maior verismo.

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Ao contemplar estas paisagens o espectador é tocado Em 1931, foi formado no Rio de Janeiro outro grupo de
primeiro pela totalidade da cena, e sente-se bem. Logo em jovens artistas que não aceitava mais os princípios tra-
seguida, em nova leitura, a vista percorre a paisagem da dicionalistas que predominavam no ensino da arte, prin-
direita para a esquerda, em relação ao que está próximo, cipalmente na Escola Nacional de Belas Artes, que ainda
até alcançar o pinheiro, de onde prossegue, buscando a era regida pelas idéias da Missão Artística Francesa.
maior profundidade. Esse grupo carioca recebeu o nome de “Núcleo Bernardelli”,
Cícero Dias (Judiá, PE, 1908 .....) em homenagem aos irmãos Rodolfo e Henrique Bernardelli
Em sua pintura, Cícero Dias tem sido sempre, totalmente que, no final do século XIX, haviam contribuído para a re-
brasileiro. Inicialmente surrealista, depois passou por um novação da arte brasileira. Dele faziam parte os artistas
período abstracionista, conservando sempre as cores dos Ado Malagoli, José Pancetti, Milton Dacosta, Expedito
canaviais que constituíram seu mundo de criança. Uma Camargo Freire, Bustamante Sá, Eugênio Proença Sigaud,
fase posterior será uma volta ao passado, um figurati- Yoshia Takaoka, Bruno Lechowski, Manoel Santiago, Edson
vismo ingênuo, não contaminado pela paisagem francesa, Motta, Bráulio Poiava, José Rescala, Martinho de Haro,
quase sempre inspirado nos temas de sua adolescência: José Gomes Correa, Yugi Tamaki e Quirino Campofiorito.
o Capiberibe, o Recife, as cantigas do Carnaval. Apesar de esse grupo ter sido renovador, ele representou
um aspecto menos radical do Modernismo.

Núcleo Bernardelli Camargo Freire (1908)

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Residindo há alguns anos em Campos do Jordão, realizou importante trabalho paisagístico sobre a região.
As suas telas representam vales e montanhas em sucessivos planos, com muita realidade. Na sua simplicidade de
feitura, revela-se um sensível colorista onde o verde queimado é a cor predominante.
José Pancetti

(Campinas, SP, 1902 - Rio de Janeiro, RJ. 1958) 1920, e em 1922 seguiu para o Rio de Janeiro. Alistou-se
Paisagista por índole, por instinto, Pancetti irá permanecer na Marinha de Guerra. Em 1925, época em que trabalhava
fiel, durante toda a sua carreira, a uma linguagem mais como pintor de bordo, começou a pintar pequenas mari-
clássica, limitada pela referência à natureza, não procu- nhas. A partir de 1933 freqüentou sessões de desenho e
rando reinventar, mas retratar. pintura do núcleo Bernardelli e participou do Salão Nacio-
Ativo no Rio nos anos 30 e 40 e depois na Bahia. Filho nal de Belas-Artes, que na sua Divisão Moderna. obteve
de imigrantes italianos, seguiu com a família para a Itália, o prêmio de viagem ao estrangeiro (1941), viagem ao país
onde fez seus primeiros estudos. Retornou ao Brasil em (1947) e meda-lha de ouro (1948). Só a partir de 1946,
quando passou para a reserva da marinha, dedicou-se

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integralmente à pintura. Histórico/Objetivos
Henrique Cavalleiro e Manoel Santiago Em 1930, Lúcio Costa foi nomeado diretor da Escola
Aproximam-se da linguagem pictórica surgida com o mo- Nacional de Belas-Artes por Francisco Campos, ministro
dernismo, não se libertam inteiramente do gosto anterior. da Educação e Saúde do governo Getúlio Vargas. 0 jovem
Nessa linha, são quadros representativos da sua obra os arquiteto, mesmo mantendo os antigos professores da
que pertencem a coleção. A “Chacrinha dos Tuneleiros”, de Escola, reduto da arte acadêmica, contratou outros de
atmosfera goyesca, explora mais as nuanças e relações tendência renovadora, como Gregori Warchavchik, Leo Putz
de luz e sombra do que os valores cromáticos intensos e Celso Antônio. Costa também supervisionou a comissão
- presentes em “Haydéa e Assumpção” - que melhor ca- de organização da 38ª Exposição Geral de Belas-Artes
racterizam a pintura a de Manoel Santiago. Na paisagem em 1931, composta por Manuel Bandeira, Anita Malfatti,
“Montanhas de Teresópolis”, Cavalleiro consegue expressiva Portinari e Celso Antônio. Esta comissão atraiu os mo-der-
síntese dos elementos da paisagem natural que lhe serve nistas do Rio de Janeiro e de São Paulo, e de forma inédita
de motivo. decidiu aceitar todas as obras inscritas, provocando a

Salão Revolucionário
Rio De Janeiro, Set. 1931
Integrantes: Anita Malfatti, Antônio Gomide, Bonadei,
Cardosinho, Carlos Oswald, Celso Antônio, Cícero Dias,
Di Ca-valcanti, Flávio de Carvalho, Gregori Warchavchik,
Guignard, Hélios Seelinger, Henrique Bernardelli, Ismael
Nery, John Graz, Lasar Segall, Leo Putz, Lúcio Costa, Or-
lando Teruz, Luiz Correia de Araújo, Portinari, Quirino da
Silva, Regina Graz, Rescala, Rossi Osir, Sigaud, Tarsila do
Amaral, Victor Brecheret, Vittorio Gobbis e Waldemar da
Costa, entre outros

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desistência dos acadêmicos de renome. 0 Salão Revolucionário, como se tornou conhecido, reuniu 506 trabalhos de
106 pintores, 129 de 41 escultores e 35 projetos de 10 arquitetos, formando, em alguns casos, verdadeiras mos-
tras individuais. Pela primeira vez no Brasil, os moder-nistas tinham presença significativa em uma exposição oficial,
Pressionado pelos acadêmicos que dominavam a ENBA, e sem ter respaldo político, Lúcio Costa demitiu-se enquanto

ainda se realizava o polêmico Salão, retornando a escola Segall deixa Vilna em 1906, sua cidade natal, para estu-
a sua estrutura tradicional. dar em Berlim e Dresden, onde participa ativamente do
Antonio Gomide (1895-1967) movimento expressionista alemão. Sempre em busca de
Retornando ao Brasil, em 1930, depois de um longo perío- novos caminhos, vem ao Brasil em 1913, realizando ex-
do na Europa, onde recebeu forte influência do movimento posição em São Paulo e Campinas, tida como a primeira
cubista, Gomide demonstra esse traço adquirido, aliado a manifestação de Arte Moderna promovidas no país. Segall
um lirismo bem seu de redescoberta da terra, da gente, e regressa à Europa mas retorna definitivamente em 1923,
cenas decorrentes. É essa sua fase mais realista, quando naturalizando-se brasileiro. Depois de passar 4 anos em
dedicou-se aos temas folclóricos e às cenas populares, Paris – de 1928 a 1932 – volta a São Paulo, onde traba-
acentuando o seu reencontro com a natureza e o ambiente lha sem cessar até o fim da vida. Sua produção vigorosa
brasileiro. marcou profundamente a história das artes plásticas
brasileiras, sendo considerado um dos grandes nomes do
Cardosinho (1861-1947) nosso modernismo.
Ele procura captar com seu pontilhismo sutil o mistério do
seu mundo objetivo e da subjetividade humana. Ele trans- Orlando Teruz (Rio de Janeiro, RJ, 1902 – 1984)
figura o real, faz com que uma vista de Paquetá adquira
a estranheza e o fascínio das coisas vistas em so-nho.
Lasar Segal
(Vilna, capital da Lituânia, 1891 – São Paulo, 1957)
Pintor, desenhista, gravador e escultor, o russo Lasar
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Embora com formação essencialmente acadêmica, Teruz Tarsila do Amaral
lutou, juntamente com Lúcio Costa e Portinari, pela im- (Capivari, SP, 1886 – São Paulo, 1973)
plantação das novas tendências, para a criação da divisão Com Tarsila do Amaral a pintura brasileira começa a
moderna do Salão Nacional, o que se concretiza em 1940. procurar uma expressão moderna, porém mais ligada às
Participou dos eventos patrocinados pela vanguarda pau- nossas raízes culturais. Apesar de não ter exposto na
lista, como o II Salão da Sociedade Pró-Arte Moderna, em Semana de 22, Tarsila colaborou decisivamente para o
1934, que visava aproximar os artistas do Rio e de São desenvolvimento da arte moderna brasileira, pois produziu
Paulo. uma obra indicadora de novos rumos.
Cultivando temas suburbanos, demonstrando sensibilidade Sua carreira artística começou em 1916. Em 1920, foi para
para os problemas sociais, figurou na “Exposição de Pin- a Europa, onde estudou com mestres franceses até 1922.
turas Modernas Brasileiras”, na sede da Royal Academy Em 1923 a artista voltou à Europa. Passou pela influência
of Art, de Londres, em 1944. impressionista e, a seguir, encontrou o Cubismo. Nessa
Trabalhando a matéria pictórica sem textura, retratou as fase, ligou-se a importantes artistas do modernismo eu-
favelas, embora diluindo o caráter dramático da represen- ropeu, tais como Fernand Léger, Picasso, De Chirico, entre
tação, pela expressão lírica na mensagem. outros. No ano seguinte, ou seja, em 1924, estava nova-
mente no Brasil. Foi quando iniciou a fase que ela própria
SPAM chamou de Pau-Brasil. Segundo o crítico Sérgio Milliet, as
características dessa fase são “as cores ditas caipiras,
Em São Paulo, no ano de 1932, um grupo de artistas e rosas e azuis, as flores de baú, a estilização geométrica
intelectuais fundou a Sociedade Pró Arte Moderna – a das frutas e plantas tropicais, dos caboclos e negros, da
SPAM. Desse grupo fizeram parte, entre outros, o ar- melancolia das cidadezinhas, tudo isso enquadrado na
quiteto Gregori Warchavchik (1895-1967) Anita Malfatti solidez da construção cubista.
(1896-1964), Tarsila do Amaral (1886-1973) e Regina A sua obra traz a mistura da técnica estrangeira e da
Graz Gomide (1902-1973). vivência nacional. As impulsões surreais fazem emergir
Em abril de 1933, foi inaugurada a primeira Exposição figu-ras primordiais em paisagem selvagem nativa. Usando
de Arte Moderna da SPAM. Essa exposição, além de
mostrar os trabalhos dos seus integrantes, criou a
oportunidade de se tornarem conhecidas, no Brasil,
obras de importantes artistas modernos estrangeiros,
como Pi-casso, Léger, Brancussi e De Chirico.
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temas ligados à natureza, seus trabalhos refletem paisagens subconscientes, como Sol Poente, O Lago, Sono, Cartão
Postal e Urutu, onde há simplificações, gigantismo de formas e alteração da paleta pau-brasil, com uma invasão de

verdes e terras. Por volta de 1935-36 tomava consistência em São Paulo um


As fases “pau-brasil” e “antropofágica” são os pontos núcleo de artistas de origem social modesta, concentrados em
culminantes de sua carreira como pintora e os responsá- ateliês improvisados do Palacete Santa Helena, no centro da
veis por sua inscrição na história da arte no Brasil. cidade, onde se localizavam numerosos escritórios de profissio-
nais liberais e onde tinha sede a entidade representativa dos
sindicatos dos operários. Descendiam quase todos de famílias
Grupo Santa Helena de imigrantes italianos e sua condição proletária ou pequeno
-burguesa caracterizava-os no confronto com os mo-dernistas

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com atri-butos comuns, reflete em primeiro lugar o extrato dos anos 20. Autodidatas ou ex-alunos do Liceu de Artes e
social a que pertencem – e demonstra-o o seu proletarismo, Ofícios, também por esse aspecto diferenciavam-se da ge-ra-
como afirma Mário de Andrade Prevalecem em suas represen- ção pioneira. Exerciam-se na pintura decorativa de residência,
tações, as paisa-gens humildes despojadas, os arrabaldes entre outras tarefas, e este vinculo profissional tornou-se
operários anônimos, as naturezas-mortas, a figura humana fator decisivo para a sua aproximação, que perdurou com mais
popular, os temas religiosos e alguns outros raros motivos por força até o inicio dos anos 40. Foi sem idéias pré-concebidas
onde definiram as limi-tações do seu próprio quadro de vida, que deram forma a uma existência comunitária. Mostravam-se
Nas soluções plásticas predominou o registro tecnicamente ciosos da necessidade do conhecimento dos materiais e das
acurado das emoções experimentadas, valendo-se nas cores técnicas da arte e esteticamente tiravam proveito da petite
de terras e cinzas. Pertencem ao Grupo Santa Helena os pin- sensation do Impressionismo, como das formas construídas
tores Francisco Rebolo Gonsales, Mário Zanini (1907 - 71), os de Cézanne ou ainda do trago incisivo de Van Gogh. É de rele-
primeiros a instalar atelier no prédio, Aldo Bonadei (1906- 74l, var-se a influência que recebiam da pintura italiana à qual se
Alfredo Volpi, Clóvis Graciano (1907), Fulvio Pennacchi, Manoel ligavam naturalmente pela sua quase sempre origem peninsular
Martins, Alfredo Rullo Rizzotti (1909 – 72) e Humberto Rosa ou pelo que captavam de pintores visitantes ou ra-dicados no
(1908 - 48). Vários outros artistas, porém, freqüentavam os meio e ainda pela informação fotográfica. A pintura do Grupo
ateliês do edifício da velha praça da Sé, sobretudo os de Rebolo e “Novecento” , por exemplo, repercutia na capital paulista. Não
Mário Zanini. se aproximando das linhas de vanguarda, mas ao mesmo tem-
po guardando distancia das regras acadêmicas, escolheram o
Aldo Cláudio Felipe Bonadei
cami-nho de um Modernismo contido. A obra que produziram,

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(São Paulo, SP, 1906 - S. Paulo, 1974 )
Pintor. Começou a estudar desenho com Alexandrino e Antônio Scavone. Aperfeiçoou-se com Carone na Academia de

Florença. Itália ( 1930). Em 1933. regressou ao Brasil e aparente simplicidade: é o subúrbio paulistano, meio ci-
integrou-se ao grupo Família Artística Paulista. Participou dade, meio roça.
da coletiva Salão Nacional de Belas-Artes Rio de Janei- Conseguiu assimilar as virtudes da nossa cultura com
ro. Obteve menção honrosa (1928), medalha de bronze suas potencialidades cromáticas, seguindo orientações
(1930) medalha de prata (I940), medalha de ouro (1950). estéticas desligadas da Praxis.
Realizou individuais, destacando a da galeria Bonino, Rio Francisco Rebolo Gonsales (1902-1980)
de Janeiro (1963). Possui obras no acervo do Museu Na- Rebolo é um pintor essencialmente paisagista. Suas pai-
cional de Belas-Artes, Rio de Janeiro e no Museu de Arte sagens, no dizer de Sérgio Milliet, eram “humildes e ler-
Contemporânea de Campinas. S. Paulo. das”, daí o encanto um tanto primitivo dessas telas, sua
A arte de Bonadei, caracteriza-se por uma tensão cons- espontaneidade e frescura. Permaneceu, até sua morte,
tante entre seu lirismo e sua vontade de contenção, tan- fiel a esse tipo de pintura.
to no grafismo como na cor. Essa contradição pode ser Suas obras eram poemas de amor ao chão ao qual se
encontrada em todas as suas fases, levando o seu apego sentia ligado. Sem pretender estabelecer comparações,
ao negro e aos tons pouco luminosos. sua pintura se identificava tão profundamente com a fi-
Alfredo Volpi (1896-19..) sionomia espiritual e material dos pequenos aglomerados
Nasceu em Lucca na Itália e veio para o Brasil com apenas humanos, situados na orla de São Paulo, quanto as de
um ano de vida. Utrillo com os encantadores recantos de Paris.
Símbolo de nossa arte contemporânea, iniciou como pintor Fulvio Penacchi (1905)
de paredes executando numerosos afrescos em residên- Nascido na Itália, Penacchi chega ao Brasil em 1929,
cias, enquanto pinta pequenas paisagens da infância. Na
pintura destes anos destaca-se a cor vibrante e uma
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Prado Jr.), sessões com modelo vivo, concertos e recitais quando inicia um trabalho árduo, “onde, inspirado nas téc-
(Camargo Guarnieri e Elsie Houston), tornando-se um mo- nicas compositivas dos artistas toscanos, transporta as
vimentado ponto de encontro de artistas e intelectuais. Influências assimiladas para o seu novo mundo atual, de
Seu Teatro da Experiência, criado por Flávio de Carvalho, onde retira os elementos de que se nutre a sua pintura.
foi fechado pela policia após a terceira apresentação da As suas cenas campestres tem como componentes es-
peça inaugural “0 Bailado do Deus Morto” , o que motivou senciais, algo de antigo é de muita intensidade realística,
um abaixo-assinado de artistas e intelectuais. 0 CAM, que onde a policromia dos céus, as curvas dos montes e as
fechou suas portas pouco tempo depois, foi, para Paulo longínquas casas refletem uma aparência suficientemente
Mendes de Almeida, “um grande e vibrante movimento de mística e profunda.
arte e inteligência, que dificilmente se repetirá”.

Clube dos Artistas Mo-



dernos - CAM
Grupo Seibi São Paulo, 24 Nov. 1932/1933
Não deve ser ignorado outro movimento surgido no meio
paulistano na segunda metade do decênio de 1930 e de Fundadores: Antônio Gomide (1895-1967), Carlos Prado
caráter mais fechado por reunir exclusivamente artistas da (1908), Di Cavalcanti (1897-1976) e Flávio de Carvalho
colônia japonesa. 0 Grupo Seibi era formado inicialmente (1899-1973)
pelos pintores Tomoo Handa (1906), Tomie Otake (1913),
Walter Shigeto Tanaka (1910-70), Yuji Tamaki e Yoshyia Histórico/Objetivos
Takaoka, a sua figura de maior projeção. Estes dois últimos Idealizado e presidido por Flávio de Carvalho, o CAM visa-
já haviam sido atuantes no Núcleo Bernardelli. 0 Seibikai va, entre outras coisas, promover intercâmbio entre os
(Grupo de Artistas plásticos de São Paulo, que abriu a artistas e defender os interesses da classe. Sua sede
primeira exposição em l 938, teve longa duração, sofreu funcionava no prédio em que os fundadores tinham ateliê e
uma interrupção devido a Segunda Guerra, incentivou a contava com um salão para eventos, biblioteca sobre arte
prática amadora da arte, só se extinguindo na década e bar. Enfatizando os aspectos sociais e políticos da arte,
de 1970. Seus participantes daquele período, em geral de o Clube promoveu exposições (Kaethe Kollwitz; cartazes
ní-vel modesto, revelavam todavia tragos comuns a índole russos; desenhos de crianças e loucos), conferencias e
dos componentes do Grupo dos “19” debates (David Siqueiros; Tarsila do Amaral; Mário sa; Caio
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Grupo dos "19"
Pertencentes a geração formada no período da Segunda Guerra Mundial, surgia em São Paulo, em 1947, participando
da exposição “19 Pintores” , uma leva de jovens que antes da chegada das correntes abstratas conduzia-se dentro
de normas figurativas de predominância expressionista A mostra servia ao seu lançamento “oficial” , sob a circuns-

tancia tutela da União Cultural Brasil Estados Unidos. No Brasil a arte dos chamados artistas primitivos,
Os organizadores, ao reuni-los, haviam pensado somente passou a ser valorizada após o movimento modernista,
no que os pudesse identificar em linhas mais gerais, isto que apresentou, entre as suas tendências, o gosto
é , no fato de cada um ser “novo” e de ser “moderno” por tudo o que era genuinamente nacional. Geralmente
Constituíam esse aglomerado (mais propriamente que este artista é autodidata e criador dos recursos e
grupo) os artistas Lothar Charoux, Maria Leontina, Aldemir técnicas com que trabalha.
Martins, Luís Sacilotto, Odetto Guersoni, Marcelo Gras-
Entre os primitivos brasileiros mais importante estão:
smann, Eva Lieblich I1925), Otávio Araújo, Mário Gruber
Cardosinho, Heitor dos Prazeres, Djanira e Mestre Vitalino.
(“1927), Flavio-Shiró (1928) e Jorge Fiori (1933), ao lado
de outros de presença efêmera ou mais esporádica na arte Djanira da Motta e Silva
(Avaré, 1914 – Rio de Janeiro, 1979)

Primitivos do Brasil
Nasceu e cresceu numa fazenda da pequena cidade ca-
feeira de Avaré, no interior de São Paulo. Autodidata,
baseou-se na tradição popular para compor uma obra de

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amor à terra e à gente brasileira.
Iniciou sua participação no Salão Nacional de Belas-Artes, em 1942, mesmo ano em que seus quadros foram adqui-

ridos na mostra de pintores brasileiros, na Grã-Bretanha, , pintado em Parati.


tendo ainda, realizado a primeira exposição individual na Em 1972, Djanira ingressou na Ordem Terceira do Carme-
associação Brasileira de Imprensa, no Rio de Janeiro. lo, passando a usar, desde então, o hábito e o nome de
Reconhecida como um talento natural na arte brasileira, Irmã Teresa do Amor Divino. Envolta pela espiritualidade
colecionou diversos prêmios em vários salões oficiais In- e pela fé religiosa, recebeu, em 1973, a Comenda Papal,
cluída em verbete na “Current Biography, Who’s New and e foi escolhida para representar o Brasil, na nova galeria
Why”, em janeiro de 1961, em Nova Iorque, realizou, no ano moderna da Pinacoteca do Vaticano, quando pintou a tela
seguinte, seu trabalho de maior dimensão, “Festa do divino” “Senhora Santana de Pé”.
Heitor dos Prazeres (1898-1966)

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Pintor primitivista, participou da I Bienal de São Paulo e foi o primeiro pintor ingênuo a Ter premiação neste certame
de vanguarda internacional, com o quadro “Moenda”.
Nos últimos anos de sua vida, integrou várias mostras importantes no Brasil e no exterior, além de realizar exposições

individuais, nos museus e galerias das capitais nacionais.


Ficou consagrado especialmente por sua pintura, por um A arte contemporânea
desenho peculiar da figura humana e a ingenuidade da ver- Depois da década de 50, a arte brasileira evoluiu
são cenográfica de sua cidade e do cotidiano de seu povo. em novas e diversas direções. Surgiram importantes
O artista é considerado no exterior, como um dos poucos e gravadores, como Marcelo Grassmann, Carlos Scliar,
verdadeiros pintores primitivos de importância que o Brasil Maria Bonomi, Fayga Ostrower, Renina Katz, Mário
possui, constando de catálogos de museus internacionais. Cravo Júnior, Iole di Natale e Iberê Camargo. Alguns
pintores como: Wesley Duke Lee, Manabu Mabe, Tomie
Ohtake, Lygia Clark, Lothar Charoux, Norberto Stori,
Gilberto Salvador, entre outros, ligaram-se a diferen-

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Concretismo
Serviu para designar a tendência artística que surgiu como evolução do Abstracionismo. É uma arte construída ob-

tes movimentos estéticos, como o Abstracionismo e geométrica, manifestou-se em nosso país sobretudo nos
o Concretismo. trabalhos de alguns artistas japoneses que se radicaram
no Brasil entre as décadas de 30 e 60. Os mais conhe-
Abstracionismo cidos do grupo são: Manabu Mabe (1924) e Tomie Ohtake
Esse movimento, ligado à estética não figurativa e não (1913),

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jetivamente e em estreita ligação matemática. sionista. O seu trabalho é dotado de grande conteúdo
Depois da I Bienal, os concretistas brasileiros começaram emocional e os seus temas prediletos são a paisagem
a agrupar-se dando origem a duas tendências principais urbana e a figura humana. Pintor, desenhista e gravador,
que ficaram conhecidas como o Grupo do Rio de Janeiro Darel é mais conhecido por esta última atividade. Isto
formado pelos pintores Ivan Serpa (1923-1973), Lygia se deve ao seu grau de maestria e à imensa obra criada,
Clark (1920-1980), Hélio Oiticica (1937-1980) e Abraão sempre dotada de forte grau de atração.
Palatnik (1928)), não era dogmático quanto á linguagem Fayga Ostrower (1920. Polônia)
geométrica do concretismo, pois não a considerava um Fayga é uma das principais gravadoras brasileiras. O seu
ponto de chegada, mas sim um campo aberto á experiência trabalho é dotado de grande sutileza e delicadeza de fei-
e á indagação e o Grupo de São Paulo com os pintores tura, e o principal núcleo deste trabalho são as formas
Waldemar Cordeiro (1925-1973), Geraldo Barros (1923) abstratas que a artista desenvolve há muitos anos. De-
(1923), Luiz Sacilotto (1924), Judith Lauand (1922). senhista, pintora, ilustradora, gravadora, escritora, Fayga
Esses artistas preocupavam-se mais rigidamente com os tem desenvolvido uma fecunda discussão da criatividade,
princípios matemáticos da arte concreta e exploravam a do ensino e do caminho da arte e da estética atual. A sua
possibilidade do movimento como efeito óptico de linhas posição, estreitamente vinculada à tradição humanística,
e cores. tem influenciado fortemente a discussão estética entre
Antônio Bandeira (1922-19..) nós. Hoje o seu trabalho é um dos geradores de nossa
Participou de movimento abstrato internacional dos anos gravura.
60. Suas paisagens, de execução livre e expressiva, que
se situa numa fase de transição entre o figurativo e o
abstrato.
Darel Valença Lins (Pernambuco 1924)
Aluno de Henrique Oswald e Oswaldo Goeldi, Darel Valença
é um gravador e desenhista fiel à grande tradição expres-

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Fernando Odriozola (Oviedo, Espanha, 1921)
Em 1952 viaja para o Brasil, fixando-se em São Paulo. A arte de Odriozola é uma visão onírica do mundo e da na-
tureza. Céus vermelhos, amarelos e azuis banham os pássaros misteriosos que desenha. O colorido, quase sempre

noturno, procura mais a harmonia de tons suaves que os em Tomé-Açu, no Pará. Seus estudos artísticos foram em
contrastes. As telas são povoadas de fundos de mares São Paulo e no Rio de Janeiro, sob orientação de Tadashi
transparentes, nos quais se movimenta uma estranha Kaminagai. Suas paisagens figurativas completam-se com
fauna, luminosa e colorida. “Não gosto”, diz ele, “da figura detalhes surrealistas.
humana. Tem um aspecto muito transitório. O fato de eu Aos poucos vai abandonando o figurativismo passando a
haver nascido nas Asturias talvez explique o amor que fazer uma espécie de realismo lírico: as paisagens não são
sinto por temas da natureza, pássaros, prados, sol, lua, mais definidas em todos os pormenores, mas constituem
flores e horizontes.” formas vagas, obtidas através de manchas coloridas.
Classificado por muitos como surrealista, Odriozola envolve Em 60 sua pintura sofre novas transformações, aban-
seus quadros em um clima fantástico e cheio de signos. donando o abstracionismo ortodoxo, para constituir um
Desde sua chegada ao Brasil, participa de inúmeras expo- misto de abstração e figuração. Quando surgem em suas
sições. Individualmente, expõe no Museu de Arte Moderna telas, florestas de máquinas fantásticas, desenvolvidas
de São Paulo, em 1955, e em galerias. No final da década em intensos arabescos e cores brilhantes.
de 60, Odriozola apresenta temas ligados à terra e ao
espaço, trabalhando com pedaços de madeira entalhada, Ione Saldanha
quadrados de metal, espelhos e ferros retorcidos. Desde o inicio, Ione demonstra grande preferencia pelas
paisagens de Ouro Preto, que interpreta de maneira inti-
Flávio-Shiró Tanaka mista, colocando em primeiro plano todos os elementos
Nascido na cidade de Sapporo, no Japão, em 1928, veio importantes da composição, enquanto a paisagem, ao
para o Brasil com três anos de idade e passou sua infância longe, dilui-se em sombras esfumaçadas. É a partir des-
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sas representações, onde são enfatizados os elementos primeira vez no Salão Nacional de Belas Artes. Retorna
verticais, que a artista inicia uma síntese das formas, após a morte de sua esposa e trabalha incessantemente.
reduzindo-as a aglomerados verticais de figuras geo-mé- Nomeado diretor da Escola Nacional de Belas Artes, ali
tricas. A cor também se transforma adquirindo tons vi- permanece até sua morte. Paisagista acadêmico, descreve
vos e alegres. Quadros dessa fase são apresentados na -as com visão real, recriando a serenidade das paisagens
primeira exposição individual da pintora, no Rio de Janeiro, tranqüilas.
em 1956. Uns seis anos mais tarde, seu abstracionismo José Guyer Salles. (São Paulo -1942).
geométrico torna-se lírico, revelando formas suaves’ e co- É um artista da nova geração brasileira, com aperfeiçoa-
res claras, que conferem aos quadros uma luminosidade e mento no exterior e vivência internacional de seu trabalho.
uma transparência cada vez mais intensas. Participa de Os seus assuntos são simples, a paisagem e a nature-
salões oficiais, das bienais paulistas, realiza individuais. za-morta. Com estes temas aparentemente esgotados,
Jenner Augusto da Silveira (Aracaju - 1924) Guyer Salles tem obtido excelente repercussão. A sua
Trabalhando desde os onze anos de idade, Jenner dedi- gravura tem algumas particularidades, entre elas a sua
cou-se a várias atividades antes de iniciar sua carreira capacidade de conferir uma aparência de aquarela para a
artística. Não pode em sua vida difícil, seguir um curso gravura. Pintor, gravador, professor, Guyer Salles produz
regular de pintura, mas estudou autodidaticamente. uma obra intensa na qual cada imagem é pesquisada va-
Em 1944 após ter percorrido o interior de Sergipe, volta garosamente.
para Aracaju e aí realiza sua primeira exposição individual. Lívio Abramo (São Paulo - 1903)
A paisagem urbana da Bahia é a temática principal, re- Lívio Abramo, com Oswaldo Goeldi e Carlos Oswald, é o
presentada sempre ao longe, sob um céu imenso, cuja cor trio central pioneiro da gravura moderna brasileira. Au-
não é necessariamente o azul. Em algumas obras o artista todidata, jornalista, ilustrador, desenhista, Lívio Abramo
aborda temas religiosos, descrevendo figuras de padres viria a marcar a nossa gravura por um trabalho extenso,
e coroinhas, com uma concepção totalmente figurativa. de forte conotação inicialmente expressionista, no qual
João Batista Da Costa (Itaguaí, RJ, 1865 - 1926) retrata a vida dos trabalhadores. Lívio Abramo, atento a
Teve infância sofrida, ficando órfão aos oito anos, acolhido vida dos pobres, registra uma parte importante da vida
por tios muito pobres, com os quais não se adaptou. Foge, nacional. A sua serie de macumba, com as manifestações
perambula pelas ruas do Rio e acaba no Asilo de Menores afro-brasileiras, faz parte, definitivamente, da iconografia
Desamparados. Estuda na Imperial Academia de Belas brasileira. Incisivo, severo, a sua gravura em madeira abriu
Artes. Em 1894 recebe o prêmio viagem concedido pela novas luzes nas relações entre o branco e o preto. Funda-
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dor do Estúdio Gravura, com Maria Bonomi, em 1960, ele Bajé, RS. A paisagem dos pampas impressionou Norberto
foi uma das grandes influências da arte na cidade de São Stori, incorporando-a de forma persistentre a seu re-per-
Paulo e no Brasil. Ha muitos anos radicado no Paraguai, tório de imagens.
trabalhando junto ao serviço diplomático brasileiro, desdeDesde então tem sido um firme cultor da paisagem bra-
1962 ele é uma das fortes influências e incentivador da sileira.
arte moderna naquele pais. Suas aquarelas fogem completamente dos cânones aca-
Maciel Babinsk (Varsóvia 1931) dêmicos. Ele mistura aquarela, guache, usa papéis colo-
Chegou ao Brasil em meados de 1953, dedicando-se a uma ridos, tecido, telas, ampliando as dimensões do suporte,
forma de pintura mais complexa. Foi só a partir de 1977 eli-minou as áreas de respiros.
que desenvolveu um trabalho paisagístico. Gestos largos produzem sugestões de paisagens com céus
Ele mesmo afirma: “É importante a percepção do lugar cheios de tons contrastantes, que vão desde um violento
onde a gente está, porque lilás, até os mais suaves tons de amarelo e rosa. Assim
estar e ser são a mesma coisa. como Nolde, Norberto Stori trabalha com saturação de
Trabalho com imagens muito antigas, relacionadas com a cores em tons fortes.
natureza. Eu faço parte da natureza, e a minha possibili- Oswaldo Goeldi,
dade de ser é diretamente ligada à percepção da natureza, De formação e temperamento europeus, enriquece a arte
que muito ensina de como funciona o universo não estático brasileira com sua sabedoria técnica e um sentimento
e fechado, mas estruturado abertamente, um fato que profundo da modernidade. Fiel à expressividade específica
assusta quem gosta das coisas muito determinadas”. da xilo, introduziu nela, mais tarde, a cor - mas, como ele
Norberto Stori (São Joaquim da Barra, SP - 1946) mesmo dizia, “a cor gravada”, que difere da cor superficial-
Formado em Desenho e Artes Plásticas pela Faculdade mente acrescentada à gravura, cor apenas estampada.
de Artes Plásticas e Comunicação da Fundação Armando Renina Katz (1925) Rio de Janeiro
Álvares Penteado, em 1971 e com cursos de especialização Pintora, desenhista, muralista, gravadora, professora,
no Brasil e no Exterior. Re-nina Katz desenvolveu o seu trabalho a partir de uma
Norberto é um dos artistas sensíveis ao fascínio da pai- figu-ração de caráter realista, com forte conotação
sagem. Ele redescobriu a aquarela e a paisagem em 1976, expressionista, até formas abstratas nas quais revelou
durante o I Encontro Nacional de Artistas Plásticos, em

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extrema sensibilidade. O seu universo icnográfico sempre foi de ser uma abstração de paisagens, adquirindo grande
requintado e, nos últimos anos, tomou um sentido cósmico, espiritualidade. Os tons dourados assumem importância
com paisagens fantásticas e cenas alusivas. O que já se e o pincel cede lugar à espátula. Enquanto a matéria e a
verificava igualmente, no seu trabalho anterior, no qual se textura tornam-se o ponto fundamental de suas obras,
destaca uma série figurativa de conotação fantástica. as tintas vão sendo elaboradas numa transparência cada
Artista de excelente formação teórica, Renina Katz tem vez mais sublime e diáfana.
participado ativamente da vida intelctual brasileira, e o seu
trabalho didático se afirmou pela severidade e seriedade
de postura. Núcleo de Aquarelis-
Tikashi Fukushima (Fukushima, Japão - 1920)
Aos vinte anos de idade, Tikashi Fukushima trabalhava tas da FASM
como desenhista numa fabrica de aviões em Fukushima, A Durante a década de 80 foi criado em São Paulo o
iminência da guerra, entretanto, obriga-o a deixar seu pais, Núcleo de Aquarelistas da FASM, que reúne artistas
Em 1940 vem para o Brasil e, radicado em Lins, no Es- desde 1986, buscando manifestar o respeito pelo va-lor
tado de São Paulo, passa a depender do trabalho braçal à genuína expressão pessoal apesar das diferenças
para sobreviver, Nessa época. conhece Manabu Mabe e, existentes, devido ao grande números de artistas que
influenciado pelo artista, começa a dedicar suas horas o núcleo aglutina. Existem artistas dos mais diversos
vagas à pintura. Em 1946, muda-se para o Rio de Janeiro estilos, como paisagistas, figurativos, abstratos, e
e, fazendo molduras para o atelier de Tadashi Kaminagai, tantos mais, podemos citar alguns: Iole Di Natale,
encontra, nesse pintor, um grande mestre, que o orienta Norberto Stori, Carla Petrini, Célia Custarella, Wilson
na execução de paisagens impressionistas. Três anos mais Gottardi, e muitos outros.
tarde, o jovem artista transfere-se para São Paulo, onde
realiza as primeiras exposições.
Ao fim de três anos, define um estilo próprio, interpre-
tando, em seus quadros abstratos, as líricas paisagens Bibliografia
impressionistas da fase inicial. Após essa transformação,
o artista realiza sucessivas exposições e alcança grande A arte de Eurico Bianco. Léo Christiano Editorial Ltda, RJ
êxito. Apesar de consagrada, a pintura de Fukushima A arte no Brasil nas décadas de 1930/40 - O grupo santa
continua a amadurecer. Aos poucos, seus quadros deixam helena. livraria Nobel s/a, 1991, SP.

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Grandes Mestres. Renot Escritório de Prestação de ser- A natureza na arte brasileira. Volkswagem do Brasil S/A
viço... A paisagem brasileira 1650-1976. Coleções de sócios da
Grupo Santa Helena. MAM, SP Sociarte, Paço das Artes, 1980.
Klintowitz, Jacob. A cor na Arte Brasileira. A Pinacoteca do Estado, Banco Safra S/A, impresso no
Klintowitz, Jacob. Mestres do desenho Brasileiro. Volkswa- Brasil, 1994
gem do Brasil S/A; A pintura no Brasil. Abril Cultural
Livro do Acervo da Pinacoteca Municipal - Divisão de Artes Novis, Vera. Antonio Bandeira - Un Raro. Editôra Sala-
plásticas, seção de catalogação, conservação e montagem, mandra,
São Paulo: Centro Cultural, 1996 Arte Brasileira - 50 anos de história, acervo do MAC -
O Museu Lasar Segall, Banco Safra S/A, impresso no USP, 1920-1970
Brasil, 1991 Arte Brasileira do Séc. XX, Gráfica Editora Hamburg
Renina Katz, Ed. USP Artistas Gravadores do Brasil, Raízes Artes Gráficas,
Santos, Maria das Graças Vieira P. dos. História da Arte. 1984
Editora Ática Ateliê Calcográfico Iole - 15 anos, SESC - Serviço Social
Zanini, Walter. História geral da arte no brasil - vol.II. Ins- do Comércio de São Paulo
tituto Walter Moreira Sales, São Paulo, 1983. Belluzzo, Ana Maria de Moraes. O Brasil dos viajantes
– Vol. I, II, III. Meta livros, Salvador BA. Fundação Emílio
Odebrecht, 1994.
Boghici, Jean. 150 anos de pintura no Brasil (1820-1970).
Ed. Artes Gráficas, RJ, 1989.
Cadernos História da pintura no Brasil. Instituto Cultural
Itaú
Catálogo do Festival de Inverno Campos do Jordão. apoio
RTC - Fundação Padre Anchieta, 1983.
Frederico Morais Guignard. Edição Centro de artes novo
mundo, MAM do Rio de janeiro
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Conclusão

A Paisagem Brasileira tem surgido sempre renovada, quer pelo emprego de no-
vas técnicas de pintura, quer pela sensibilidade do artista na disposição dos ele-
mentos, no estudo das cores e principalmente pela paisagem que, independente
da observação o artista tem dentro de sí e que aparecerá em sua obra, resultado
de todo o seu conhecimento e da sua relação com a paisagem brasileira.

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