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A PRÁTICA RELIGIOSA E A POSTURA SOCIAL DOS GRANDES LÍDERES RELIGIOSOS: O PEQUENO HOMEM DE ALMA GRANDE

Mohandas Karamchand Gandhi, depois Chegada a época de fazer um curso


chamado de Mahatma Gandhi (mahatma quer universitário, 1888, Gandhi foi para Inglaterra
dizer “grande alma”), nasceu em 1869 na estudar Direito, deixando a família na Índia.
província de Gurajate, na Índia. Sua família era Tentou exercer a advocacia em sua terra natal,
de classe média, profundamente religiosa, porém sem muito sucesso. Conseguiu, então,
sobretudo sua mãe, a quem era ligado. trabalho como advogado de uma empresa
Tímido pequeno e muito magro, Gandhi foi indiana na África do Sul, onde iria passar muitos
criado dentro dos preceitos do hinduísmo, mas anos.
sua mãe pertendia ao jainismo, outra religião A África do Sul também era colônia da
da Índia, que prega a pureza, o Inglaterra, e os negros os verdadeiros donos
desprendimento dos bens terrenos e o daquela terra, eram talvez até mais escravizados
vegetarianismo. do que os indianos. Naquele país, era proibida a
Quando completou 13 anos, segundo um convivência entre as diversas nacionalidades e
costume antigo, Gandhi casou-se, por arranjo cores: os negros e os indianos eram obrigados a
de família, como uma menina da mesma idade ficarem distantes dos bons lugares onde
que ele, Kasturbai. A vida inteira a esposa estavam os brancos. Indignado, Gandhi
seria para ele uma grande amiga e resolveu, a partir daí, lutar pelos direitos de seus
Gandhi e a mulher Kasturbai,
companheira de seus ideais. compatriotas. em foto de 1915
Foi nessa época que Gandhi começou a usar seus A cada lei injusta dos ingleses, Gandhi dava início a um
métodos de não-violência. Seu raciocínio era o seguinte: movimento de resistência. Com isso, sempre colocava o
diante das leis injustas dos ingleses, os indianos governo britânico diante de uma situação muito delicada: ou
deveriam desobedecer, não cooperar com o male com a prendia e matava todos eles, o que seria absurdo, ou acabava
injustiça, mas jamais usar a violência, ainda que os por mudar a lei. E esse era o objetivo de Gandhi.
ingleses reagissem com violência. E eles reagiam: com Gandhi não se limitava a organizar movimentos de
pancadas, prisão e até morte. desobediência à lei. Fundou também uma ashram na África do
Sul, chamado Fazenda Tolstoi, em homenagem ao escritor
Um exemplo das ações de Gandhi na África do Sul: lá, russo que foi um dos inspiradores de suas ideias de não-
um indiano não podia andar na mesma calçada que um violência.
europeu e tinha de portar um documento especial, que Nesse ashram, procurava-se viver de forma diferente: não
não era exigido para os brancos. Gandhi, então, havia empregados ou servos para limpar, cozinhar ou arar a
organizou um movimento de queima desses terra, e todos faziam o trabalho; as crianças recebiam
documentos. educação com amor e diálogo; um jornal era impresso para
divulgar as ideias de não-violência. O ashram de Gandhi era
Por ações como essa, foi várias vezes preso e visitado por pessoas de todo mundo. Gandhi permaneceu na
espancado, assim como outros indianos e sua própria África do Sul com a família durante 22 anos, deixando marcas
mulher, que sempre esteva com ele. importantes naquela comunidade.
INDEPENDÊNCIA SEM SANGUE

Em 1915, de volta à Índia, Gandhi logo assumiu a liderança


do movimento pela libertação do país da Inglaterra. Começou,
então, a aplicar todos os métodos que já havia experimentado
na África. Por exempli, convocava greves nacionais em que
todos permaneciam durante um dia sem trabalhar, apenas
orando, como protesto contra o domínio inglês.

Como a indústria de tecidos inglesa arruinava a indústria


indiana, Gandhi pediu à nação que queimasse todos os
tecidos ingleses que possuísse e usasse apenas tecidos
feitos na Índia.

Ele chamava isso de não-cooperação: não cooperar com o


que se considera injusto. Com esse movimento Gandhi
incentivou a volta do artesanato local. Gandhi tece em sua roca: um
exemplo de independência
Em outra ocasião, Gandhi desafio o Império Britânico com
a “marcha do sal”. Entre outras injustiças praticadas
contra a Índia, havia o monopólio do sal: apenas a
Inglaterra podia produzir e vender sal, e portanto, cobrar o
preço que quisesse.
Gandhi reuniu milhares de pessoas e andou a pé
quatrocentos quilômetros até chegar ao Oceano Índico.
Diante da multidão e de câmeras fotográficas de jornais
do mundo inteiro, produziu sal, como um ato de
desobediência à lei. Depois desse gesto, em todos os
recantos da Índia, seguidores de Gandhi passaram a
produzir sal.
A cada ação organizada por Gandhi, os ingleses enchiam
Marcha do Sal
as prisões de rebeldes, mas não conseguiriam deter a
desobediência dos indianos. O próprio Gandhi esteve na
cadeia várias vezes, numa delas, por seis anos. Mas
nunca desistiu da ideia de liberar a Índia e nunca apelou Gandhi apanha um punhado de
sal natural, durante a Marcha
para violência.
do Sal, em 1930.
A ideia de fraternidade entre as religiões era apenas uma parte de sua
AS IDÉIAS DE GANDHI
proposta de não-violência. Ela incluía a piedade pelos animais, e Gandhi
Gandhi não pretendia apenas libertar a Índia, era estritamente vegetariano, não comia carne de espécie alguma.
mas viver de maneira exemplar ideias que Outra ideia era sua renúncia a todos os bens materiais. Quando morreu,
julgava verdadeiras e boas para toda a Gandhi possuía apenas um par de óculos, um par de sandálias, uma
humanidade, inspiradas no hinduísmo e no túnica e uma bacia. Dizia que possuir mais do que os mais pobres era
cristianismo. Ele amava profundamente Jesus uma espécie de roubo: “enquanto houver alguém no mundo que não
e adotava seus ensinamentos. Eis, aliás, a tenha o necessário para viver, será injusto que tenhamos coisas
primeira característica da sua filosofia: a ideia supérfluas, das quais não precisamos”. Acima de tudo, a proposta de não-
de que todas as religiões eram verdadeiras e violência de Gandhi significava tentar mudar o mundo, tocando a
todos continham bons ensinamentos que consciência do injusto para que ele enxergasse sua própria injustiça, e
podiam ser aproveitados; ao mesmo tempo, assim, acabar com a injustiça. “E mais: nunca punir quem erra, mas tornar
todas também tinham abusos que deveriam para si o sofrimento a fim de despertar o arrependimento de quem errou”.
ser criticados.
Gandhi admirava Buda, Jesus, Maomé. Ele
era o mais tolerante entre os tolerantes e
chegava a dizer: Sou ao mesmo tempo hindu,
cristão, mulçumano, judeu...
AS CONQUISTAS E A MORTE
Foram necessários trinta anos, desde que Gandhi iniciara Essa divisão provocou uma guerra interna entre
o movimento, para que a Inglaterra finalmente mulçumanos e hindus, causando morte de milhares
reconhecesse a independência do povo indiano. Gandhi de pessoas. Foi então que Gandhi jurou fazer jejum
dizia sabiamente: “o bem viaja com a velocidade de uma até a morte, para que cessassem os conflitos.
lesma. Aqueles que querem praticar o bem não são Passavam-se mais de quinze dias e Gandhi já
egoístas, não estão com pressa, sabem que é preciso estava definhando quando mulçumanos e hindus,
comovidos, declaram a paz.
muito tempo para impregnar as pessoas com o bem”.

Entretanto, deu-se um fato doloroso para ele, que era


chamado “bapu” (pai) pelo povo de sua terra. Foi
decidido, contra sua vontade, que a Índia seria dividida
em dois países: a Índia, com a maioria de adeptos da
religião hindu, e o Paquistão, com a maioria de adeptos
da religião mulçumana.

Ali Jinnah, primeiro presidente do Paquistão e Gandhi


Gandhi retornou à vida. Mas foi por poucos dias. Em 1948,
ele se dirigia a uma oração pública, amparado por duas
sobrinhas. Um jovem aproximou-se, saudou-o e disparou
três tiros em seu peito. Gandhi só pode dizer: “O Deus! ”. O
jovem era um hindu, inconformado com a paz.

Sua morte foi rápida, instantânea. Mas o bem que deixou


ainda está entre nós, caminhando como lesma, para
impregnar todos os seres humanos.

Funeral de Gandhi, em 31 de janeiro de


1948
PALAVRAS DE GANDHI
Sobre as religiões: Após estudos e muitas experiências, cheguei à conclusão de que:
1) todas as religiões são verdadeiras;
2) todas as religiões contem em si alguma margem de erro;
3) todas as religiões são para mim quase tão queridas quanto o meu próprio hinduísmo, principalmente na medida em que
todos os seres humanos deveriam ser para mim tão queridos quanto meus próprios parentes. Minha veneração pessoal por
outros credos é a mesma que dedico à minha própria fé.

(Mohandas Gandhi. Gandhi r o cristianismo. São Paulo, Paulus, 1996.)

Gandhi fala ao público, em encontro realizado e,


Bombaim, em 1931.
Sobre Deus: Percebo vagamente que, embora tudo à minha volta esteja sempre mudando, sempre morrendo, há por
baixo de tudo que muda um poder vivo que é imutável, que a tudo reúne, cria, dissolve e recria. Esse poder de formação,
ou espírito formador, é Deus. E, uma vez que nada mais que eu perceba através dos órgãos dos sentidos pode persistir
ou persistirá, somente Ele é.
E esse poder é benévolo ou malévolo? Considero-o puramente benévolo. Pois, posso ver que, em meio à morte,
persiste a visa; em meio à inverdade, persiste a verdade; em meio às trevas, persiste a luz. Por isso presumo que Deus é
Vida, Verdade, Luz. Ele é Amor. Ele é o Supremo Bem.

(Mohandas Gandhi. Gandhi r o cristianismo. São Paulo, Paulus, 1996.)

Sobre o amor e a não-violência:

 O ahinsa (amor) não é somente um estado negativo que consiste em não fazer o mal, mas também um estado positivo
que consiste em amar, em fazer o bem a todos, inclusive a quem nos faz mal.
 Só podemos vencer o adversário com o amor, nunca com ódio.
 Não há ninguém no mundo que tenha caído tão baixo que não possa ser convertido ao amor.
 A única maneira de castigar a quem se ama é sofrer em seu lugar.

(Gandhi, o apóstolo da não-violência. São Paulo, Martin Clarete, 1983.)


ATIVIDADES

1. Com base nos textos acima, responda: qual era para Gandhi o maior poder do ser humano?

2. Na sua opinião, Gandhi fracassou ou teve sucesso em seus propósitos? Por que?

3. Qual foi a maior lição que você tirou dessa história de vida?

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