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No estudo que realizou sobre os governos regionais italianos, Putnam procurou avaliar o desempenho institucional por meio de três
critérios: (i) a continuidade administrativa; (ii) as deliberações sobre as políticas e; (iii) a implementação das políticas. A premissa
que orientou a análise de Putnam é a de que a eficácia de uma instituição depende sobretudo de sua capacidade de bem conduzir
seus negócios internos (1996, p.79).
Ao quadro empírico observado por Putnam, dimensionado de forma avaliativa a partir do critério de modernização (critério de
desempenho institucional), o cenário observado é adverso. Em alguns cenários observados nas regiões italianas, regiões mais
atrasadas em seu desenvolvimento econômico são mais eficientes em seus governos que regiões mais desenvolvidas (2003, p.100).
Como consequência, uma das indagações que surgem (e diretamente oposta a boa parte da literatura de Ciência Política que atrela o
desenvolvimento democrático ao desenvolvimento econômico) é: é a modernidade uma das causas do desempenho institucional? Ou
o desempenho institucional é, talvez de certa forma, uma das causas da modernidade?
Quanto aos fatores sócio-culturais, Putnam considera que a comunidade cívica é um determinante mais forte que o desenvolvimento
econômico. Quanto mais cívica a região, mais eficaz seu governo. Segundo Putnam, as regiões economicamente mais desenvolvidas
têm governos regionais mais eficientes simplesmente porque há mais participação cívica (1996, p.112). Outro ponto a ser considerado
é de que não é o grau de participação política que distingue as regiões cívicas das não-cívicas, mas sim a natureza dessa participação.
Para Putnam, regiões menos cívicas são as mais sujeitas a “velha praga” da corrupção política. O contexto cívico é importante para o
funcionamento das instituições e o principal fator explicativo do bom desempenho de um governo é a medida em que a vida social e
política de uma região se aproxima do ideal da comunidade cívica.
Ao discorrer sobre os dilemas da ação coletiva, Putnam observa que a incapacidade de cooperação para o aproveitamento mútuo
não significa necessariamente ignorância ou mesmo irracionalidade. Tanto que, a partir da teoria dos jogos, apresenta quatro
aspectos do dilema: (i) o drama dos bens comuns; (ii) o bem público; (iii) a lógica da ação coletiva e; (iv) o dilema do prisioneiro. Em
todos os quatro cenários, as partes envolvidas teriam a ganhar caso cooperassem, mas na falta de um compromisso mútuo confiável,
cada qual prefere desertar. Uma saída para o impasse, segundo Putnam, é a “saída hobbesiana”, caracterizando uma terceira parte,
caracterizada por uma maior “neutralidade”.
O problema para um cenário de coerção imposto por um terceiro ( o Estado) é o de que sociedades que enfatizam muito o uso da
força costumam ser menos eficientes, mais sacrificantes e menos satisfatórias do que aquelas onde a confiança é mantida por outros
meios. O maior problema para Putnam é o de que a coerção imparcial é em si mesma um bem público, estando sujeita ao mesmo
dilema básico que ela busca resolver (1996, p. 175). Na leitura que Putnam realiza da teoria dos jogos, a coerção imparcial de um
terceiro não constitui geralmente um “equilíbrio estável”, isto é, aquele em que nenhum jogador tem motivos para modificar seu
comportamento. Entretanto, no clássico dilema do prisioneiro e nos dilemas correlatos da ação coletiva, a deserção é uma estratégia
de equilíbrio estável para todos os participantes, embora essa teoria subestime a cooperação voluntária, segundo Putnam (1996,
p.175). Como consequência uma pergunta desdobrada emerge: como e por que se formam as instituições formais que ajudam a
superar os problemas de ação coletiva?
A resposta se encontra na premissa de que as instituições formais surgem para diminuir os custos de transação. A superação dos
dilemas da ação coletiva e do oportunismo contraproducente daí resultante depende do contexto social mais amplo em que
determinado jogo é disputado. Para Putnam, a cooperação voluntária é mais fácil numa comunidade que tenha herdado um bom
estoque de capital social sob a forma de regras de reciprocidade e sistemas de participação cívica. Por capital social Putnam
considera: (i) confiança; (ii) normas; (iii) cadeias de relações sociais. Para Putnam, a confiança social pode derivar de duas fontes
conexas: (i) as regras de reciprocidade e (ii) os sistemas de participação cívica.
(Photo by Cris Faga/NurPhoto via Getty Images)
As normas sociais que fortalecem a confiança social: “vingam porque reduzem os custos de transação e facilitam a cooperação”,
sendo a mais importante das regras a da reciprocidade (1996, p.182). As comunidades onde a regra da reciprocidade é obedecida têm
melhores condições de coibir o oportunismo e solucionar os problemas de ação coletiva. Contrariando a tese de Mancur Olson (de
que os pequenos grupos de interesse não têm nenhum motivo para trabalhar pelo bem comum da sociedade e todos os motivos para
engajar-se em atividades especulativas onerosas e ineficientes, tornando-se cada vez mais numerosos, sufocando a inovação e
entravando o crescimento econômico. Outra tese descartada por Putnam é a de Migdal ( que aponta que grupos mais numerosos e
mais fortes significam um governo fraco), Putnam considera teórica e empiricamente que as normas e os sistemas de participação
cívica promoveram o crescimento econômico, em vez de inibi-lo, observando-se uma forte relação entre associações cívicas e
instituições públicas eficazes (1996, p. 186).
Em todas as sociedades, os dilemas da ação coletiva obstam as tentativas de cooperar em benefício mútuo, seja na política ou na
economia. Para Putnam, a coerção de um terceiro é uma solução inadequada para este problema. A cooperação voluntária depende
do capital social. As regras de reciprocidade generalizada e os sistemas de participação cívica estimulam a cooperação e a confiança
social porque reduzem os incentivos a transgredir, diminuem a incerteza e fornecem modelos para a cooperação futura.
Resenha de:
Destaca Coutinho em seu artigo, sete tendências da inovação nas principais economias
capitalistas, que deveriam ganhar corpo ao longo dos anos 90, são elas: o peso crescente
o complexo eletrônico; um novo paradigma de produção industrial; revolução nos
processos de trabalho, transformação das estruturas e estratégias empresariais; novas
bases de competitividade; globalização como aprofundamento da internacionalização e
as “alianças tecnológicas” como forma de competição.
Neste mesmo contexto, são examinados os doze indicadores que abrangem a eficácia
governamental nas 20 regiões da Itália e as correlações destes indicadores com as
avaliações realizadas pelo autor, comparativamente, região por região para análise do
êxito ou fracasso da instituição. São os doze indicadores: estabilidade do gabinete;
presteza orçamentária; serviços estatísticos e de informação; legislação reformadora que
se divide em três critérios, a abrangência da legislação, a coerência da legislação e
criatividade da legislação; como quinto indicador a inovação legislativa; creches;
clínicas familiares; instrumentos de política industrial; capacidade de efetuar gastos na
agricultura; gastos com a unidade sanitária local; habitação e desenvolvimento urbano e
sensibilidade da burocracia.
Estes indicadores buscam dar uma noção da diversidade de coisas que os governos
modernos fazem para os cidadãos e pelos cidadãos. São notáveis em termos absolutos as
diferenças nos níveis de desempenho reveladas pelos indicadores. Entre elas:
orçamentos que atrasam três semanas em uma região e sete meses em outras; em regiões
há muito mais creches, clínicas familiares, empréstimos e subsídios para a agricultura e
habitação do que em outras, mesmo havendo igualdade de acesso aos recursos, regiões
que as solicitações dos cidadãos são atendidas e em outras que simplesmente são
ignoradas.
Pelo menos na Itália, foi notado em toda parte que o povo sabe distinguir o bom
governo do mau governo, contrariando o que dizem em outras partes do mundo os que
asseveram que quando o governo é corrupto, letárgico e ineficiente é porque o povo
quer assim. Identificou-se sempre um bom governo onde este dedicou boa parte do
tempo a servir aos interesses da maioria das pessoas.
Outro fator importante para o desempenho institucional abordado por Putnam foi o
capital social. Pontos como o “espírito cívico”, que podemos contextualizar hoje como
algo próximo a cidadania, cooperação e confiança mútua, foram estudados e
demonstraram-se fatores vitais para o cumprimento das obrigações das instituições
analisadas. “Para haver cooperação é preciso não só confiar nos outros, mas também
acreditar que se goza da confiança dos outros. Neste ponto da obra, o autor trás ao
estudo a “teoria dos jogos” e o dilema do prisioneiro para contracenar com a análise
comportamental do capital social em foco.
A cooperação voluntária é mais fácil numa comunidade que tenha herdado um bom
estoque de capital social sob a forma de reciprocidade e sistemas de participação cívica.
Esta cooperação se baseia numa noção muito viva da importância recíproca dessa
cooperação para os participantes. Assim é importante para qualquer eventual
participante, quando se toca a crédito cooperativo, ter uma reputação de honestidade e
confiabilidade. A incerteza quanto à reputação e o risco de descumprimento são
minimizados por normas rígidas e por uma densa teia de compromissos recíprocos. A
cadeia de relações sociais permite transmitir e disseminar confiança.
Muitas das formas de capital sociais existentes – confiança, por exemplo – são
denominados “recursos morais”, isto é, recursos cuja oferta aumenta com o uso, em vez
de diminuir, e que se esgotam se não forem utilizados. Por todos esses motivos, cabe
esperar que a criação e dilapidação do capital social se caracterizam por círculos
virtuosos e círculos viciosos. Podemos dizer que a confiança é um componente básico
do capital social e anota o autor que esta confiança não é cega, mas aquela que deriva do
conhecimento da disposição, da capacidade dela e tudo mais, decorrente do convívio
íntimo com aquela pessoa.
Nos modernos e complexos contextos, a confiança social pode verter de duas fontes
seguras conforme a obra em foco: regras de reciprocidade e sistemas de participação
cívica. As regras de reciprocidade implicam em duas visões, a “balanceada” que diz
respeito à permuta de itens de igual valor, quando, por exemplo, colegas permutam suas
folgas; e a reciprocidade “generalizada”, quando a uma contínua relação de troca, como
exemplo a amizade. Sendo esta última altamente produtiva para o capital social,
coibindo o oportunismo e proporcionando a solução de problemas da ação coletiva,
servindo para conciliar interesse próprio com solidariedade.
Observa também o autor que quanto maior for à comunicação, tanto direta quanto
indireta entre os participantes, maior será sua confiança mútua. Os cidadãos de
comunidades cívicas descobrem em sua história exemplos de relações horizontais bem-
sucedidas, enquanto os cidadãos das regiões menos cívicas encontram, quando muito,
exemplos de suplicação vertical. Assevera o autor que um sistema vertical, por mais
ramificado e por mais importante que seja para seus membros, é incapaz de sustentar a
confiança e a cooperação social, pois os fluxos de informação vertical costumam ser
menos confiáveis que os horizontais, pois os verticais proporcionam o controle das
informações.
Por outro lado, o autor aponta que a estratégia de “jamais cooperar” constitui também
um equilíbrio estável, pelos motivos expostos nas versões habituais do dilema do
prisioneiro – teoria dos jogos. Neste ponto da obra é trazida a baila uma característica
histórica apresentada por alguns autores que se chama “subordinação a trajetória”, onde
estes contextos sociais ficam atrelados a este caminho trazido pela tradição histórica.
A consciência que cada um tem seu papel e de seus deveres como cidadão, aliada ao
compromisso com a igualdade política, constitui o cimento cultural da comunidade
cívica e o contrato social que sustenta esta colaboração não é de cunho legal, e sim
moral.
Outra lição da pesquisa é que a história institucional costuma evoluir lentamente quando
se trata de instituir regras de reciprocidade e sistemas de participação cívica.
E culminamos com a frase final do capítulo seis da obra: “criar capital social não será
fácil, mas é fundamental para fazer a democracia funcionar”.