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Comunidade e democracia: a teoria de Putnam

1. 1. COMUNIDADE E DEMOCRACIA: a experiência da Itália moderna Robert


D. Putnam Claudio Lima e Douglas Marques
2. 2. O autor – Robert Putnam • Cientista política britânico; • Estudou em Oxford; •
Membro da Academia Nacional de Ciências • Ex-presidente da Associação
Americana de Ciência Política • Professor de política pública na Escola de
Governo em Harward, nos Estados Unidos. • Escreveu vários livros, entre eles -
Comunidade e Democracia: a experiência da Itália Moderna - Bowling Alone:
The Collapse and Revival of American Community - Better Together: Restoring
the American Community.2
3. 3. ESTRUTURA • Cap.1: cenário • Cap.2: mudanças temporais • Cap.3:
mudanças espaciais: análise comparativa dos processos e decisões referentes à
adoção de políticas nas várias regiões • Cap. 4: a comunidade cívica: a
verificação da teoria • Cap. 5: As origens da comunidade cívica • Cap. 6: Capital
social e desenvolvimento institucional3
4. 4. DESEMPENHO INSTITUCIONAL Modelo de governança Demandas
sociais Interação implementação política Opção de governo política No caso
italiano, o autor ressalta que o modelo institucional manteve-se constante; os4
governos regionais apresentavam estrutura organizacional similar ao governo
central
5. 5. A obra COMUNIDADE E DEMOCRACIA • Debate teórico e pesquisa
aplicada relacionando desenvolvimento e capital social FUNCIONAMENTO
EFICAZ DE INSTITUIÇÕES REPRESENTATIVAS O que é preciso para criar
instituições fortes e eficientes e como estas influenciam o comportamento
político e social • Análise abrangente de duas décadas sobre os novos governos
regionais criados na Itália a partir de 1970. • Hipótese: as reformas institucionais
modificam o comportamento? • Faltava um ambiente controlado onde testar
estas hipóteses5
6. 6. MétodosA metodologia seguida no estudo procurou diversificar os
instrumentos paraaumentar o potencial e compensar deficiências individuais. –
observação de campo; – estudo de caso; – entrevistas; – gravações; – As
impressões e os contrastes tem que ser comprovados e as técnicas quantitativas
podem alertar quando as impressões, baseadas em 1 ou 2 casos notáveis, podem
estar equivocadas.Para descobrir evidências sistemáticas no tempo e no espaço,
realizou-se por 20 anos: – 700 entrevistas com conselheiros regionais, em 4
baterias – 3 baterias de entrevistas com líderes comunitários nas seis regiões
escolhidas; – 6 sondagens nacionais; – dezenas de outras sondagens entre o
eleitorado;6
7. 7. Capítulo 1 – Cenário• No pós-guerra (1950-1970), o crescimento italiano foi
enorme, com migração do Sul para o Norte.• A política e o governo não
acompanharam as mudanças sociais da sociedade italiana;• No início da década
de 70, um tumultuado período de reformas rompeu com a secular tradição
italiana de governo centralizado• Governos regionais passaram a dispor de
poderes e recursos7 para administrar localmente
8. 8. O caso da implantação dos governos regionais na Itália é uma ‘oportunidade
ún estudar sistematicamente o nascimento e desenvolvimento de uma nova
institu8
9. 9. Capítulo 2 – Mudanças ao longo do tempo • Como as mudanças se
processaram temporalmente? • No início dos anos 70, um arraigado sistema
clientelista minava a eficiência administrativa no Sul. As esferas da política
pública eram todas controladas por Roma. Os italianos já estavam desconfiados,
após anos de mudanças institucionais que deram em nada; • Frase: “Se um dia
(cidade x) tornar-se uma nova Califórnia, será apesar do seu governo regional, e
não por causa dele”.9
10. 10. Logo após a instalação dos governos regionais BARI BOLONHA • Os
apúlios não escondem o • Na praça central, seus cidadãos desprezo pelo governo
discutem problemas políticos. regional • A sede do governo regional é • Não
costumam considerar moderna e resolve problemas governo como ‘seu’, mas
como com eficiência imposição política. Os cidadão que debatem na praça
central de Bolonha não deixam de criticar seu governo, exigindo um
desempenho institucional cada vez melhor10
11. 11. Capítulo 2 – Mudanças das regras • Na primeira série de entrevistas, em
1970, os recém-eleitos conselheiros regionais mostravam-se esperançosos e
entusiasmados; • Contudo, uma aliança nacional de políticos conservadores, a
burocracia arraigada na sociedade e um Judiciário tradicionalista se uniram para
impor restrições às novas regiões. • Em 1976, os entrevistados mostravam-se
bem menos confiantes na capacidade das regiões de afirmar sua autonomia. Ao
invés de reivindicações individuais, começaram a fazendo o “jogo político
centro- periferia’ não mais um-contra um, mas todos-contra-um; • A estratégia
funcionou e as relações de confiança entre políticos e líderes de uma região e
outra se fortaleceu;11
12. 12. Capítulo 2 – Mudanças das regras • Essa vitória de todos-contra-um foi tão
grande que eles já não tinham mais como culpar as autoridades centrais por suas
próprias deficiências • Assim, os novos poderes políticos, conquistados com a
coalizão, deu aos governos regionais mais controle orçamentário e o poder de
conceder licenças a donos de restaurantes, motoristas de táxis, portadores de
armas: poderes de fiscalização, uma revolução no governo. • Os novos poderes
incluíam poder formular planos regionais de urbanização e assumir o controle
das terras e das câmaras de comécio.12
13. 13. Elite política regional: novo modo de fazer política • Os críticos do novo
formato político afirmaram que os novos conselhos regionais se tornariam antros
de políticos decadentes; • Contudo, desde o início, os conselhos regionais foram
constituídos por políticos em ascenção, capazes e altamente profissionais. • Os
legisladores regionais são muito ligados às suas regiões, com experiência em
questões partidárias. • Assim, na política italiana, o cargo de conselheiro
regional começou a marcar claramente a passagem do político amador para o
profissional13
14. 14. Elite política regional: novo modo de fazer política • A hostilidade partidária
deixou de representar um obstáculo às questões práticas, com os líderes
regionais menos radicais e mais abertos à negociação; • O percentual de
políticos que entendiam que ‘nas atuais questões sociais e econômicas’ é
fundamental que as considerações técnicas tenham maior peso’ saltou de 28%
em 1970 para 63% em 1989 • As questões práticas ganharam maior peso: os
conselheiros falavam mais em prestação eficiente de serviços e investimento em
estradas e menos em capitalismo, socialismo, liberdade ou exploração. • ¾ dos
conselheiros dizem que as atividades do conselho são mais marcadas pela
colaboração que pelo conflito.14
15. 15. Elite política regional:novo modo de fazer política • Em termos partidários,
isso levou a uma despolarização esquerda- direita. A reforma regional criou um
novo meio de fazer política,15
16. 16. Elite política regional:novo modo de fazer política16
17. 17. Elite política regional: novo modo de fazer política• A economia regional foi
ampliada;• Membros do gabinete, líderes partidários regionais, e
administradores regionais ganharam prestígio;• Todos os grupos de fora,
independente da orientação política, todos os de fora (sindicato, empresariado,
imprensa, igreja) perderam influência.• Atitude dos conselheiros com relação ao
governo central mudou de regionalista ferrenho para moderado, entre 1970-
198917
18. 18. Capítulo 3 – Avaliação do desempenho institucional • Análise comparativa
dos processos e decisões referentes à adoção de políticas nas várias regiões; • O
ritmo da mudança institucional é lento. Os que edificam essas instituições e
aqueles que as avaliam precisam ser paciente; • Questão: por que algumas
regiões estudadas apresentaram mudanças positivas e outras não, mesmo com a
mesma estrutura de governo e com os mesmos recursos jurídicos e financeiros. •
O que explica a diferença no desempenho? Para Putnam, essa diferença pode ser
explicada pelo nível de capital social existente em uma sociedade. Esse fator
pode explicar o crescimento ou declínio do desenvolvimento econômico.18
19. 19. Capital social • Para Putnam, o capital social é definido como o conjunto de
recursos sociais possuído por um grupo, através de redes de trabalho com as
quais se constitui uma comunidade cívica, sentimentos de solidariedade e
igualdade com os demais membros da comunidade, normas de cooperação,
reciprocidade, confiança e atitudes positivas, reveladas através da confiança no
outro, no governo e no funcionamento das instituições.19
20. 20. Capítulo 3 – Avaliação do desempenho institucional20
21. 21. 21
22. 22. Conceito de VIBRAÇÃO DA VIDA ASSOCIATIVA: delineamento dos
espaços de sociabilidade (no caso da Itália a prevalência dos clubes associativos)
(p. 105) Do auxílio de um meio de comunicação, com vistas a COOPERAÇÃO
(no caso da Itália, o jornal) (p. 106); Como mensurar a participação política?
Eleições diretas Referendos Relações de ‘troca’ Motivação cívica Pouco eficaz
Eficaz22
23. 23. Componentes da comunidade cívica Voto preferencial Comparecimento a
Leitura de jornal referendos Associações desportivas e culturais De certo modo,
os grupos ‘participam da política’. O importante é avaliar o nível qualitativo
dessa participação. (p. 110);23
24. 24. VIDA SOCIAL E POLÍTICA NA COMUNIDADE CÍVICA Da afirmação:
a participação política nas regiões menos cívicas é induzida pela prática do
clientelismo. (p. 113) As regiões onde a comunidade faz uso do voto
preferencial, mas não vão aos referendos, não leem jornal, nem participam de
associações cívicas, são as mesmas descritas pelos líderes comunitários como
“política regional clientelista” e não ‘programática”. (p. 113) Pesquisa de 1988
aponta que nas regiões menos cívicas, cerca de 20% da população pede ‘ajuda” a
algum político para obter licenças, emprego, assim por diante.” Nas regiões mais
cívicas o índice é de 5%. (p. 113)24
25. 25. VIDA SOCIAL E POLÍTICA NA COMUNIDADE CÍVICA Nas regiões
mais cívicas, os líderes políticas são simpáticos a participação popular nas
decisões (p. 114); A eficácia do governo regional está estreitamente relacionada
com o grau de intercâmbio entre elite e massa na vida da região (p.118); A
cultura cívica permeia a malha das associações culturais e recreativas. Para os
italianos: os sindicatos, igrejas e partidos.25
26. 26. SINDICATOS Na Itália a sindicalização é voluntária; Na realidade, o
ecletismo ideológico: comunista, católica, neofascista, socialista, outros... O
contexto cívico é quase tão importante quanto o contexto socioeconômico na
adesão sindical. (p. 120)26
27. 27. IGREJA A igreja católica italiana conserva a lógica da obediência e da
aceitação da condição social (Contra – Reforma) (p. 120); Manifestações
religiosas (comparecimento a missa, rejeição ao divórcio) relacionam
negativamente com o engajamento cívico. (120); A Ação Católica era a versão
mais ‘cívica’ do catolicismo italiano.27
28. 28. PARTIDOS Dado a adaptação dos partidos, em ambas as regiões (mais
cívicas e menos cívicas), a filiação, o interesse e o engajamento aos partidos
coincidem. (p. 22); Assim, o importante é nos indagarmos: qual o ‘sentido’
desse engajamento? Região menos cívica Região mais cívica Obter favor
Solidariedade social28
29. 29. ATITUDES CÍVICAS (politização) Quando do baixo nível cívico, há maior
insegurança, os cidadãos são mais desconfiados e as leis são feitas para serem
desobedecidas. (p. 122); Da necessidade de “forças da ordem”, visto que a
comunidade não conta com relações horizontais de reciprocidade (p. 125); Nas
regiões cívicas o governo brando é mais forte, pois pode contar com a
cooperação e a autodisciplina dos cidadãos (p. 126); Sobre o nível de satisfação:
“a felicidade mora numa comunidade cívica” (p. 126). No nível individual, a
renda familiar e a religiosidade tem maior relevância.29
30. 30. AS ORIGENS DA COMUNICADE CÍVICA Cap. 5 Governos regionais e a
descentralização em meados de 1970 (contexto de atraso econômico e
marginalização política) (p. 133); Liberdade religiosa, a arte e a ciência. Em
1224, em Napoli, surgimento da primeira universidade publica da Europa
(p.134); Na economia, fomento a criação de portos, da ampliação do exército e
da marinha. No final do séc. XII, a Sicília é o Estado mais rico e organizado da
Europa; No campo social e político, “o governo pertencia ao imperador, por
vontade de Deus” (p. 135). A vida cívica era ordenada do centro e de cima e não
de dentro (p.135);30
31. 31. AS ORIGENS DA COMUNICADE CÍVICA Cap. 5 A formação
sociohistórica permeada por traços do feudalismo, da burocracia e do
absolutismo (135); Do período de violência e anarquia na Europa entre os
séculos XII e XVI, duas perspectivas diferentes: no sul, o caminho da hierarquia
vertical; no norte, a colaboração horizontal; (136); Das comunas: não eram
democráticas no sentido moderno, dado que a minoria da população detinha os
direitos políticos, mas a participação política era extraordinária. Temos “o
desabrochar da vida associativa” (PUTNAM, 2007, p. 137);31
32. 32. Do contrato cívico de cooperação: - Assistência fraternal em todo o tipo de
necessidade; - Hospitalidade para os forasteiros que passam pela cidade; -
Obrigação de oferecer ajuda em caso de doença; - A violação dos estatutos
implica no boicote e no ostracismo social. (p. 137);32
33. 33. AS ORIGENS DA COMUNICADE CÍVICA Cap. 5 Do caráter profissional
das comunas, depois guildas: por parte do governo, instrumentos de finanças
públicas, saneamento das terras, saúde pública... “sempre trocando ideias com
colegas das cidades vizinhas” (PUTNAM, 2007, p. 138); No sul a riqueza
advinda da terra, no norte das finanças e do comércio. Estas últimas fomentadas
pelo crédito. Sendo ampliadas, para as relações de confiança para além dos laços
de parentesco (PUTNAM, 2007, p. 140); Em suma, nas repúblicas comunais do
Norte da Itália medieval, as normas e os sistemas de participação cívica,
possibilitaram grandes melhoramentos na vida econômica e também no
desempenho governamental (PUTNAM, 2007, p. 140);33
34. 34. TRADIÇÕES CÍVICAS APÓS UNIFICAÇÃO (SEC. XIX) Dos adventos:
Revolução Francesa (1789) e Revolução Industrial (1840), do “surto de
sociabilidade social” (AGULHON apud PUTNAM, 2007); Durante o contexto
da Unificação Italiana (1870), as associações cívicas se davam através das
sociedades de mútua assistência (p. 149); Da relação: Altruísmo X Cooperação
pragmática visto “os riscos econômicos da vida moderna” (PUTNAM, p. 150);
Do surgimento, por volta de 1889, de uma forma de solidariedade social: AS
COOPERATIVAS (agrícolas, trabalhadoras, crédito...);34
35. 35. Dos contrastes das manifestações da solidariedade cívica: Na Itália central: -
Trocas de serviços familiares nas épocas de colheitas e debulha; - Nas noites
frias, encontros das famílias nos estábulos ou na cozinha; - Trocas de
hospitalidades; ( P. 153); Na Itália sul: - Hábito de insubordinação e despotismo;
- Estratégias para que as boas fraudes ‘funcionassem’; - Cada um cuida melhor
dos seus interesses( P. 153)35
36. 36. A grande tese: Que contexto (ou natureza ) de relações provoca este
contraste? “O Sul (da Itália) não é apolítico ou associal. O fundamental não é a
existência ou não de vínculos sociais, mas entre os vínculos sociais horizontais
de solidariedade mútua e os vínculos sociais verticais de dependência e
exploração” ( p. 154);36 ESTÁGIO III - CHARLES KUNST
37. 37. TRADIÇÕES CÍVICAS APÓS UNIFICAÇÃO (SEC. XIX) “A combinação
da pobreza e a desconfiança mútua minou a ‘solidariedade horizontal...”
(PUTNAM, 2007, P. 154); Assim, temos como desdobramentos: - As relações
de dependência vertical; - A incapacidade do Estado de fazer cumprir as leis.
Para historiadores, temos nas tradicionais relações clientelistas, o surgimento do
crime organizado, a máfia;37
38. 38. CAPITAL SOCIAL E DESENVOLVIMENTO INSTITUCIONAL “Teu
milho estará maduro hoje; o meu estará amanhã. É vantajoso para nós dois que
eu te ajude a colhê – lo hoje e que tu me ajudes amanhã. Não tenho amizade por
ti e sei que também não tens por mim. Portanto não farei nenhum esforço em teu
favor; e sei que se eu te ajudar, esperando alguma retribuição, certamente me
decepcionarei, pois não poderei contar com a tua gratidão. Então deixo de te
ajudar – te; e tu me pagas na mesma moeda. As estações mudam; e nós dois
perdemos nossas colheitas por falta de confiança mútua” (HUME, 1986, p. 106)
O capital social é “a capacidade de uma sociedade de estabelecer laços de
confiança interpessoal e redes de cooperação com vistas à produção de bens
coletivos. (DARAUJO, 2003)”38
39. 39. GESTÃO E CAPITAL SOCIAL Dos benefícios: - Redução dos custos
(transação); - Produção coletiva; - Cooperação espontânea (crédito rotativo); - A
possibilidade da auto – gestão (relação com o Estado); - Resolução de problemas
mais complexos (processo de acumulação); - O bem normalmente publico
(relações sociais); Na modernidade, as regras sociais de reciprocidade
balanceada (trocas por permuta) e reciprocidade generalizada (trocas contínuas);
(p. 181)39
40. 40. GESTÃO E CAPITAL SOCIAL Da relação dos vínculos fortes (familiares)
e vínculos fracos (associativos, extensos...) Da complexidade nas sociedades
industrializadas ou pos – industrializadas, onde “as vantagens do oportunismo,
da trapaça e da transgressão aumentam...” (NORTH, p.35)40
41. 41. Do debate: onde se localiza o problema, na estrutura ou na cultura? Podemos
sugerir: “as instituições, para serem efetivas, necessitam de praticas e normas
sociais de cooperação e reciprocidade. A comunidade quando fomenta relações
de confiança mútua contribui para a prosperidade econômica, social e cultural”.
(nossos grifos)41
42. 42. REFERÊNCIAS DARAÚJO, Maria Cecília. Capital Social. Coleção passo a
passo. Ciências Sociais. nº 25. Rio de Janeiro. Ed Jorge Zarar. 2003 HAZRAEL,
Ben. Resenha Comunidade e Democracia. Disponível no endereço eletrônico
<http://poliarquias.blogspot.com.br/2010/07/resenha-comunidade-e-
democracia-de.html Acesso em 15 Mar. 2012 PUTNAM, Robert. D.
Comunidade e Democracia: a experiência da Itália Moderna FGV Editora, São
Paulo: 2005
Duas perguntas fundamentais para o problema de pesquisa do estudo de Robert Putnam podem ser identificadas como: (i) por que
alguns governos democráticos tem bom desempenho e outros não? (ii) E quais são as condições necessárias para criar instituições
fortes, responsáveis e eficazes? No recorte teórico institucionalista, Putnam identifica dois elementos convergentes nas abordagens do
institucionalismo da escolha racional, do institucionalismo sociológico e do institucionalismo histórico: (i) as instituições moldam a
política; (ii) as instituições são moldadas pela história. Segundo Putnam (1996): “as instituições influenciam o resultado porque
moldam a identidade, o poder e a estratégia dos atores.”
Para Putnam, as instituições se caracterizariam pela inércia e robustez, corporificando trajetórias históricas bem como momentos
decisivos, remetendo a observação fundamental, para o autor, de que a história importa porque segue, necessariamente, uma
trajetória. Em sua definição metodológica do trabalho, Putnam considerou como variável independente as instituições. O autor
buscou empiricamente observar como a mudança institucional influencia a identidade, o poder e a estratégia dos atores políticos.
Como variável dependente Putnam considerou como o desempenho institucional é condicionado pela história. Uma das premissas
refletidas por Putnam é a de que o desempenho prático das instituições é moldado também pelo contexto social em que elas atuam.
Para Putnam (bem como para Douglas North), as instituições seriam as “regras do jogo”, as normas que regem a tomada de decisões
coletivas, o palco onde os conflitos se manifestam e (às vezes) se resolvem. Mas Putnam acrescenta um outro aspecto à definição das
instituições: elas seriam mecanismos para alcançar propósitos, não apenas com o fim de alcançar acordos, ou seja, as pessoas querem
que o governo faça coisas, não apenas decida coisas. Como consequência, é necessário se pensar o que se constitui como “desempenho
institucional” e mais ainda: o que pode ser identificado como êxito institucional? Para Putnam, êxito institucional significaria
capacitar os atores a resolver suas divergências da maneira mais eficiente possível, considerando suas diferentes preferências. Neste
sentido, os resultados da ação governamental, mesmo quando planejada e implementada, pode não ser aqueles que os proponentes
esperavam.
Ao pensar sobre o desempenho institucional, Putnam também considerou as consequências da mudança institucional, avaliando,
quanto a sua análise específica, o “antes” e o “depois” do ponto de vista da evolução dos governos regionais italianos. Ao se refletir
sobre o desempenho institucional, o mesmo pode ser atrelado a dois fatores: (i) sócio-econômicos (a modernização sócio-econômica
como condição indispensável para um governo democrático estável e eficaz); (ii) sócio-culturais (a conexão tocquevilliana entre os
costumes de uma sociedade e suas práticas políticas).

No estudo que realizou sobre os governos regionais italianos, Putnam procurou avaliar o desempenho institucional por meio de três
critérios: (i) a continuidade administrativa; (ii) as deliberações sobre as políticas e; (iii) a implementação das políticas. A premissa
que orientou a análise de Putnam é a de que a eficácia de uma instituição depende sobretudo de sua capacidade de bem conduzir
seus negócios internos (1996, p.79).
Ao quadro empírico observado por Putnam, dimensionado de forma avaliativa a partir do critério de modernização (critério de
desempenho institucional), o cenário observado é adverso. Em alguns cenários observados nas regiões italianas, regiões mais
atrasadas em seu desenvolvimento econômico são mais eficientes em seus governos que regiões mais desenvolvidas (2003, p.100).
Como consequência, uma das indagações que surgem (e diretamente oposta a boa parte da literatura de Ciência Política que atrela o
desenvolvimento democrático ao desenvolvimento econômico) é: é a modernidade uma das causas do desempenho institucional? Ou
o desempenho institucional é, talvez de certa forma, uma das causas da modernidade?

Quanto aos fatores sócio-culturais, Putnam considera que a comunidade cívica é um determinante mais forte que o desenvolvimento
econômico. Quanto mais cívica a região, mais eficaz seu governo. Segundo Putnam, as regiões economicamente mais desenvolvidas
têm governos regionais mais eficientes simplesmente porque há mais participação cívica (1996, p.112). Outro ponto a ser considerado
é de que não é o grau de participação política que distingue as regiões cívicas das não-cívicas, mas sim a natureza dessa participação.
Para Putnam, regiões menos cívicas são as mais sujeitas a “velha praga” da corrupção política. O contexto cívico é importante para o
funcionamento das instituições e o principal fator explicativo do bom desempenho de um governo é a medida em que a vida social e
política de uma região se aproxima do ideal da comunidade cívica.
Ao discorrer sobre os dilemas da ação coletiva, Putnam observa que a incapacidade de cooperação para o aproveitamento mútuo
não significa necessariamente ignorância ou mesmo irracionalidade. Tanto que, a partir da teoria dos jogos, apresenta quatro
aspectos do dilema: (i) o drama dos bens comuns; (ii) o bem público; (iii) a lógica da ação coletiva e; (iv) o dilema do prisioneiro. Em
todos os quatro cenários, as partes envolvidas teriam a ganhar caso cooperassem, mas na falta de um compromisso mútuo confiável,
cada qual prefere desertar. Uma saída para o impasse, segundo Putnam, é a “saída hobbesiana”, caracterizando uma terceira parte,
caracterizada por uma maior “neutralidade”.
O problema para um cenário de coerção imposto por um terceiro ( o Estado) é o de que sociedades que enfatizam muito o uso da
força costumam ser menos eficientes, mais sacrificantes e menos satisfatórias do que aquelas onde a confiança é mantida por outros
meios. O maior problema para Putnam é o de que a coerção imparcial é em si mesma um bem público, estando sujeita ao mesmo
dilema básico que ela busca resolver (1996, p. 175). Na leitura que Putnam realiza da teoria dos jogos, a coerção imparcial de um
terceiro não constitui geralmente um “equilíbrio estável”, isto é, aquele em que nenhum jogador tem motivos para modificar seu
comportamento. Entretanto, no clássico dilema do prisioneiro e nos dilemas correlatos da ação coletiva, a deserção é uma estratégia
de equilíbrio estável para todos os participantes, embora essa teoria subestime a cooperação voluntária, segundo Putnam (1996,
p.175). Como consequência uma pergunta desdobrada emerge: como e por que se formam as instituições formais que ajudam a
superar os problemas de ação coletiva?
A resposta se encontra na premissa de que as instituições formais surgem para diminuir os custos de transação. A superação dos
dilemas da ação coletiva e do oportunismo contraproducente daí resultante depende do contexto social mais amplo em que
determinado jogo é disputado. Para Putnam, a cooperação voluntária é mais fácil numa comunidade que tenha herdado um bom
estoque de capital social sob a forma de regras de reciprocidade e sistemas de participação cívica. Por capital social Putnam
considera: (i) confiança; (ii) normas; (iii) cadeias de relações sociais. Para Putnam, a confiança social pode derivar de duas fontes
conexas: (i) as regras de reciprocidade e (ii) os sistemas de participação cívica.
(Photo by Cris Faga/NurPhoto via Getty Images)
As normas sociais que fortalecem a confiança social: “vingam porque reduzem os custos de transação e facilitam a cooperação”,
sendo a mais importante das regras a da reciprocidade (1996, p.182). As comunidades onde a regra da reciprocidade é obedecida têm
melhores condições de coibir o oportunismo e solucionar os problemas de ação coletiva. Contrariando a tese de Mancur Olson (de
que os pequenos grupos de interesse não têm nenhum motivo para trabalhar pelo bem comum da sociedade e todos os motivos para
engajar-se em atividades especulativas onerosas e ineficientes, tornando-se cada vez mais numerosos, sufocando a inovação e
entravando o crescimento econômico. Outra tese descartada por Putnam é a de Migdal ( que aponta que grupos mais numerosos e
mais fortes significam um governo fraco), Putnam considera teórica e empiricamente que as normas e os sistemas de participação
cívica promoveram o crescimento econômico, em vez de inibi-lo, observando-se uma forte relação entre associações cívicas e
instituições públicas eficazes (1996, p. 186).
Em todas as sociedades, os dilemas da ação coletiva obstam as tentativas de cooperar em benefício mútuo, seja na política ou na
economia. Para Putnam, a coerção de um terceiro é uma solução inadequada para este problema. A cooperação voluntária depende
do capital social. As regras de reciprocidade generalizada e os sistemas de participação cívica estimulam a cooperação e a confiança
social porque reduzem os incentivos a transgredir, diminuem a incerteza e fornecem modelos para a cooperação futura.

Para finalizar, o professor José Álvaro Moisés compara a confiança


política nos poderes executivo e legislativo com a confiança em outras
instituições como bombeiros, igreja e poder judiciário. Uma excelente
oportunidade de ampliar a discussão sobre capital social, democracia e
confiança nas instituições políticas. Ressalto que essa vídeo aula sobre
qualidade da democracia faz parte da iniciativa da Univesp, uma das
iniciativas de educação a distância mais sensacionais que acompanho.

Capítulo 1 – Introdução: estudo do desempenho institucional


Por que, alguns governos democráticos têm bom desempeno e outros não? O autor inicia
comentando qual a relação entre duas cidades além da distância e de seus problemas: uma no
norte próxima de Milão (Sevesso) com sérios problemas ambientais devido a um acidente em
uma indústria química que contaminou toda a cidade, e a outra ao sul, próxima de Nápoles
(Pietrapertosa) onde a vida ainda era conduzida de uma maneira medieval, havia poucos
recursos para a população, os poucos que obtiveram sucesso foi devido a busca de trabalho no
norte da Europa.
Com a instalação de governos regionais as necessidades regionais puderam ser atendidas com
maior eficiência e rapidez, ou talvez não. Conforme é relatado na região de Bari, por exemplo,
a comunidade enfrentava dificuldades devido a conchavos políticos ali existentes, as pessoas
não estavam organizadas, entre outras questões. Quanto a região da Emilia Romagna, como já
havia uma estrutura social, econômica e cultural mais organizada, o processo fluiu com mais
facilidade.
Quais são as condições necessárias para criar instituições fortes, responsáveis e eficazes? Estas
instituições podem se desenvolver de forma idêntica? Como no caso da Itália as respostas
transcendem as fronteiras italianas, por que o novo institucionalismo atua conforme as regras
do jogo, por que a região é fornecedora de conhecimento, mercadorias, cultura, entre outras
para o mundo. Dessa maneira, o estudo da experiência regional italiana, foi tomado como
variáveis dependentes e independentes, as instituições, que moldam a política através da
influência da identidade, do poder e a estratégia dos atores. Bem como, as instituições não
abandonam a sua bagagem histórica: os indivíduos podem escolher suas instituições, mas não
o fazem em circunstâncias que eles mesmos criaram, e suas escolhas por sua vez influenciam
as regras dentro das quais seus sucessores fazem suas escolhas. Uma terceira variável foi o
desempenho prático das instituições, que segundo autores, é moldado pelo contexto social em
que elas atuam.
O que é desempenho institucional? Representam apenas as regras do jogo, as normas que
regem a tomada de decisões coletivas, palco onde os conflitos de manifestam e as vezes se
resolvem? As instituições são mecanismos para alcançar propósitos, não apenas para alcançar
acordos? Queremos ação e não teorização, o estudo deste autor baseia-se na simples
governança: demanda social – interação política – governo – opção política – implementação –
baseado em fatores sócio-econômicos e sócios-culturais.
Conclusão capítulo 2: O que devemos compreender é que o desenvolvimento de uma
instituição (s) não pode ser avaliado de uma maneira imediatista. Os ritmos da mudança são
lentos devido a modismos ou caprichos de seus membros que acabam encobrindo as
tendências mais profundas. As tendências das instituições sofrem alterações em função dos
movimentos históricos dos seus membros, por exemplo, mudança de opinião em relação a
determinado assunto.
Há, portanto, indícios inequívocos de que a reforma regional influencia significativamente a
política local. Os políticos passam a defender outros ideais, visualizam os problemas de outro
modo, seguem outras trajetórias em suas carreiras, enfrentam outros adversários, colaboram
com novos parceiros. Cidadãos e líderes comunitários cobram ação governamental de outros
órgãos. Com isso, ganha-se apoio do eleitorado, as questões públicas são bem mais
importantes, as instituições ganham autonomia e os governantes estão mais próximos do
povo. As regiões mais organizadas conseguiram assumir as responsabilidades de educação,
saúde, agricultura, assuntos sociais e assuntos urbanos, desvinculando do governo central em
Roma, apesar da oposição das autoridades centrais. Mas até aqui, é ilusório fazer um
julgamento coerente sobre a experiência regional italiana, devido a sua heterogeneidade das
regiões e de seu desempenho.
Capítulo 3 conclusão: certas regiões são bem mais governadas do que outras, isso é óbvio!!!
Apesar dos governos regionais apresentarem os mesmos recursos jurídicos e financeiros. O
que explica essas diferenças no desempenho institucional???
Capítulo 4: explicação do desempenho institucional
Poderemos iniciar em duas possibilidades genéricas: a modernidade sócio-econômica –
revolução industrial e a comunidade cívica; padrões de participação cívica e solidariedade
social.
Modernidade sócio-econômica: A partir da revolução industrial os padrões de vida se
alteraram para melhor, grandes multidões saíram do campo e foram para a cidade. As
estruturas das classes sociais se alteraram. O capital físico e humano se avolumou, níveis de
educação e padrões sanitários se elevaram. A capacidade econômica e tecnológica se
multiplicou. Os sociólogos políticos desde há muito sustentam que as perspectivas de um
governo democrático estável dependem dessa transformação social e econômica. Isto é,
fatores não econômicos também devem ser levados em conta para o desenvolvimento de uma
democracia bem sucedida. Alguns autores explicam as diferenças de desempenho através da
modernização como sendo o eixo central da questão.
As regiões situadas no norte da Itália são mais ricas, mais modernas, pois despendem mais
recursos materiais e humanos. No sul, os governos regionais lutam com graves problemas de
subdesenvolvimento contando com pouca assistência social, que apesar de receber mais
incentivos do governo central do que o norte, essa distribuição fiscal não compensa os
problemas de infra-estrutura sócio-econômica e tecnológica. Apesar so desenvolvimento
econômico e a riqueza não explicarem tudo, o desempenho de cada região está diretamente
relacionado com as ações do seu governo regional e sua comunidade cívica mais ativa ou não.
Comunidade cívica: algumas especulações teóricas.
Segundo Maquiavel, o êxito ou o fracasso das instituições livres dependiam do caráter dos
cidadãos, ou seja, de sua virtude cívica. A coletividade pode ser o caminho da democracia bem
sucedida: devemos nos comprazer mutuamente, fazes nossas as condições dos outros,
regozijarmo-nos juntos, prantear juntos, trabalhar e sofrer juntos, tendo sempre em mente a
comunidade como membros de mesmo corpo.Participação cívica: Numa comunidade cívica, a
cidadania se caracteriza primeiramente pela participação nos negócios públicos podendo
existir a dicotomia do interesse próprio e o altruísmo, desde que o interesse próprio seja
corretamente entendido, definido no contexto das necessidades públicas gerais. Igualdade
política: Na comunidade cívica, a cidadania implica direitos e deveres iguais para todos. Tal
comunidade se mantém unida por relações horizontais de reciprocidade e cooperação, e não
por relações verticais de autoridade e dependência. Tal comunidade será tanto cívica quanto
mais a política se aproximar do ideal de igualdade política entre cidadãos que seguem as
regras de reciprocidade e participam do governo.Solidariedade, confiança e tolerância: Os
cidadãos virtuosos são prestativos, respeitosos e confiantes uns nos outros, mesmo quando
divergem em relação a assuntos importantes. A comunidade cívica não está livre de conflitos,
pois seus cidadãos têm opiniões firmes sobre questões públicas, mas são tolerantes com seus
oponentes. A confiança mútua é talvez o preceito moral que mais necessita ser difundido
entre as pessoas, caso se pretenda manter a sociedade republicana. A confiança permite a
sociedade cívica superar mais facilmente o oportunismo, no qual os interesses comuns não
prevalecem porque indivíduo, por desconfiança, prefere agir isoladamente e não
coletivamente.Associações: estruturas sociais da cooperaçãoSegue como exemplo a
comunidade cívica americana que conseguem em conjunto alcançar o alvo das aspirações
comuns e aplicam esta técnica ao maior número de objetivos. Diz-se que as associações civis
contribuem para eficácia e estabilidade do governo democrático, não só por causa de seus
efeitos internos sobre o indivíduo, mas também por causa de seus efeitos externos sobre a
sociedade. No âmbito interno, as associações incutem em seus membros hábitos de
cooperação, solidariedade e espírito mútuo. No âmbito externo, a articulação de interesses e a
agregação de interesses, são intensificadas por uma densa rede de associações secundárias.
Organizações locais implantadas de fora, apresentam um alto índice de fracasso, enquanto que
as organizações locais autóctones são bem mais sucedidas, participativas e coesas. Existe
alguma conexão entre o civismo de uma comunidade e a qualidade de sua governança??A
comunidade cívica: verificação da teoriaAs evidências sistemáticas dos padrões de
solidariedade social e participação cívica estão referendados em 4 indicadores de civismo da
vida regional: 2 correspondem diretamente à concepção geral de Tocqueville a cerca de
sociedade cívica e 2 mais precisamente relacionados ao comportamento político. As regiões
onde há muitas associações cívicas, muitos leitores de jornais, muitos eleitores politizados e
menos clientelismos parecem contar com governos mais eficientes. O que tem de tão especial
essas comunidades??Vida social e política na comunidade cívicaA participação política nas
regiões menos cívicas é induzida pela prática do clientelismo personalista e não por
compromissos programáticos com as questões públicas. A maioria dos contatos pessoais com
os seus representantes, que são muito freqüentes, são assuntos que envolvem questões
pessoais em vez de questões públicas de interesse geral. Ao contrário da participação política
nas regiões localizadas no norte, mais cívicas e os assuntos a serem tratados é da ordem de
assuntos legais, administrativos e políticas.As elites políticas entre as duas regiões (norte e sul)
também existem diferenças. Nas regiões menos cívicas as políticas são caracterizadas por
relações verticais de autoridade e dependência. A elite política das regiões menos cívicas são
de origem do segmento mais privilegiado da população, enquanto que nas regiões mais cívicas
muitos líderes políticos são de origem mais modesta. Os líderes políticos destas regiões
apoiam mais entusiasticamente a igualdade política do que seus colegas das regiões menos
cívicas.A igualdade é uma característica essencial da comunidade cívica. Nada prova que a
política nas regiões cívicas esteja menos sujeita a conflitos e controvérsias, mas seus líderes
estão mais dispostos a dirimir seus conflitos. Em termos operacionais, a comunidade cívica se
define em parte pela densidade da malha de associações culturais e recreativas locais.
Excluindo três filiações muito importantes aos italianos: os sindicatos, a igreja e os partidos
políticos.SindicatosA sindicalização está baseada na motivação política e na tradição ideológica
secundarizando a estrutura econômica. Isto aumenta a importância cívica dos sindicatos.
Portanto a afiliação sindical é muito maior nas regiões mais cívicas. A sindicalização nestas
regiões não estão relacionadas com grau de instrução, faixa etária, urbanização e diferenças de
classe social.Igreja e religiosidadeDos italianos que vão à missa mais de uma vez por semana,
52% dizem que raramente lêem jornais e 51 % dizem que jamais discutem política; entre os
ateus confessos, os índices correspondentes são 13 e 17%. Os que vão à missa demonstram
maior satisfação com a vida e com o regime político vigente do que os demais italianos. Eles
estão mais preocupados com a cidade de Deus do que com a cidade dos
homens.PartidosObter favor dos poderosos continua sendo mais importante nas regiões
menos cívicas. Lá os contatos são cruciais para a sobrevivência, e os melhores contatos são
verticais, de dependência e dominação e não horizontais, de colaboração e solidariedade.
Apesar do indivíduo sulista ser também altamente politizado. Como vimos anteriormente, não
é o grau de participação política que distingue as regiões cívicas das não-cívicas, e sim a
natureza dessa participação.Atitudes cívicasOs cidadãos das regiões menos cívicas, sentem-se
explorados, alienados e impotentes. A falta de instrução e o ambiente pouco cívico acentuam
o sentimento de exploração e impotência. Os mais instruídos sentem-se mais eficazes, pois a
educação representa status social, capacidade pessoal e contatos. Mas mesmos essas
vantagens não suprem inteiramente o cinismo e a alienação que imperam nas regiões menos
cívicas. Os cidadãos mais instruídos das regiões menos cívicas sentem-se tão importantes
quanto os cidadãos menos instruídos das regiões mais cívicas. Os cidadãos não fazem e nem
podem fazer o que bem entendem, pois sabem que sua liberdade é uma conseqüência de sua
disposição para deliberar e agir de comum acordo. Numa comunidade menos cívica, ao
contrário, há maior insegurança, os cidadãos são mais desconfiados, e as leis, concebidas pelos
maiorais, são feitas para ser desobedecidas.Em resumo das constatações que fizemos até
agora, nas regiões mais cívicas existem muitas sociedades orfeônicas, clubes de futebol, clubes
de ornitófilos e Rotary clubs. A maioria dos cidadãos acompanham atentamente os assuntos
comunitários nos jornais diários, se envolvem nos negócios públicos, confiam em que todos
procedam corretamente e obedeçam a lei. Os líderes são razoavelmente honestos, acreditam
no governo popular e dispõem em entrar em acordo com seus adversários. Tanto os cidadãos
e os líderes entendem que a igualdade é congenial. As redes sociais e políticas se organizam de
forma horizontal e não hierarquicamente. A comunidade valoriza a solidariedade, o
engajamento cívico, a cooperação e a honestidade. O governo funciona.Por outro lado, as
regiões não-cívicas a vida pública é organizada hierarquicamente, o conceito de cidadão é
deformado, no ponto de vista do indivíduo a coisa pública é problema dos outros, dos chefões,
políticos e não meu. Poucos querem fazer parte das deliberações sobre o bem público, e
poucas oportunidades existem apara isso. A participação política é movida pela dependência
ou ambição pessoal, enão pelo interesse coletivo. A afiliação a associações culturais e sociais é
inexpressiva. A corrupção é geralmente considerada a norma, mesmo pelos políticos e estes
são cínicos quanto aos princípios democráticos.Então...como as regiões cívicas vieram a tornar-
se o que são? E como as normas e os sistemas de engajamento cívico alicerçam o bom
governo? Porque certas regiões são mais cívicas do que as outras???
Capítulo 6 capital social e desempenho institucional - Dilemas da ação coletiva
Será que as pessoas que vivem nas regiões problemáticas não aprenderam absolutamente
nada com a sua triste experiência? Certamente elas deveriam perceber que sua situação seria
melhor se todos cooperassem para o bem comum. Segundo o filósofo escocês, a éca já
existia...no século XVIII...conforme sua parábola...por que vou te ajudar se eu não confio em
você...então eu perco a minha colheita e você também...eh...eh...eh...A incapacidade de
cooperar para o mútuo proveito não significa necessariamente ignorância ou irracionalidade...
os exemplos mostrados mostram como indivíduos perfeitamente racionais podem produzir,
sob certas circunstâncias, resultados que não são racionais do ponto de vista de todos os que
estão envolvidos. Não há garantia de que ninguém irá roer a corda...para haver cooperação é
preciso não só confiar nos outros, mas também acreditar que se goza da confiança dos outros.
Nessas circunstâncias, todos consideram irracional cooperar, e no final o resultado é aquele
que ninguém deseja – colheita sacrificada, pastoreio excessivo, impasse do governo.O
desempenho de todas as instituições sociais, dos mercados de crédito internacionais ou dos
governos regionais até as filas de ônibus, depende de como esses problemas são resolvidos.
Um mundo altruísta é uma premissa quixotesca para quaisquer ações ou teorias sociais. O uso
da coersão de um terceiro como forma de propiciar o proveito mútuo poderá causar a
parcialidade.Capital social, confiança e associações de crédito rotativoA superação dos dilemas
da ação coletiva e do oportunismo é mais fácil numa sociedade que tenha herdado um bom
estoque de capital social sob a forma de regras de reciprocidade e sistemas de participação
cívica. A difusão do capital social como as normas e as cadeias de relações sociais, multiplicam-
se com o uso e minguam com o desuso. Por todos esses motivos, cabe esperar que a criação e
a dilapidação do capital social se caracterizem por círculos virtuosos e círculos viciosos. Uma
característica específica do capital social – confiança, normas e cadeias de relações sociais é o
fato que normalmente constitui um bem público, ao contrário do capital convencional, que
normalmente é um bem privado. O capital social costuma ser insuficientemente valorizado e
suprido pelos agentes privados. Por exemplo, minha reputação de credibilidade beneficia
tanto a mim quanto a você, já que nos permite estabelecer uma cooperação mutuamente
compensadora. A confiança é um componente básico do capital social. Como será que a
confiança pessoal se transforma em confiança social?
Regras de reciprocidade e sistemas de participação cívica
“Nenhum dever é tão indispensável quanto o de retribuir um favor. Todos desconfiam de
quem se esquece de um benefício prestado”A regra da reciprocidade generalizada é um
componente altamente produtivo do capital social. As comunidades em que essa regra é
obedecida tem melhores condições de coibir o oportunismo e solucionar os problemas da ação
coletiva. A boa regra da reciprocidade generalizada em geral está associada a um amplo
sistema de intercâmbio social.Toda a sociedade moderna ou tradicional, autoritária ou
democrática, feudal ou capitalista, se caracteriza por sistemas de intercâmbio e comunicação
interpessoais, tanto formais quanto informais. Alguns desses sistemas são basicamente
horizontais, congregando agentes que têm o mesmo status e o mesmo poder. Outros são
basicamente verticais, juntando agentes desiguais em relações assimétricas de hierarquia e
dependência. Na realidade, quase todos eles combinam ambas as características: até mesmo
um time de boliche tem um capitão, e nas prisões os guardas confraternizam com os internos.
Na prática os sistemas de relações sociais que caracterizam uma organização podem ser
incompatíveis com a ideologia que a inspira.Os sistemas de participação cívica, assim como as
associações comunitárias, as sociedades orfeônicas, as cooperativas, os clubes desportivos, os
partidos de massa e similares, representam uma intensa interação horizontal. Quanto mais
desenvolvidos forem numa comunidade, maior será a probabilidade de que seus cidadãos
sejam capazes de cooperar em benefício mútuo. Porque eles aumentam os custos potenciais
para o transgressor em qualquer transação individual, promovem sólidas regras de
reciprocidade, facilitam a comunicação e melhoram o fluxo de informações sobre
confiabilidade dos indivíduos e corporificam o êxito alcançado em colaborações anteriores,
criando assim um modelo culturalmente definido para futuras colaborações.
Criar capital social não será fácil, mas é fundamental para fazer a democracia.

CAPÍTULO 6 DO LIVRO "COMUNIDADE E DEMOCRACIA"


(ROBERT D. PUTNAM)

Estou fazendo os trabalhos do Mestrado, e, resolvi publicar esse resumo sobre o


Capítulo 6 do livro Comunidade e Democracia - a experiência da Itália moderna de
Robert Putnam. O livro é ótimo, linguagem razoavelmente acessível, e, extremamente
útil para compreensão de muitos temas obscuros sobre o desenvolvimento e outros
aspectos sobre a cultura em geral.

Capital social , em suma, é o conceito dado a relação baseada em confiança e


cooperação. Podemos dizer que capital social é a confiança que uma pessoa deposita na
atuação de seu colega, ou seja, José somente fará sua parte porque confia que João
também fará a sua parte.. Quanto maior a confiança e a consequente cooperação
existente entre os atores sociais, maior será o desenvolvimento econômico do local.
Porém, é difícil incutir a idéia de confiança na mente de pessoas individualistas, que
entendem que somente o seu esforço poderá trazer lucros e desenvolvimento. Da mesma
forma, ninguém quem ajudar o outro sem ter uma retribuição, com medo de sentir
"usado".A fim de visualizar o problema trazido pela falta de confiança e cooperação
entre atores, citamos uma pequena parábola contada por David Hume, filósofo escocês
do seculo XVIII :
" Teu milho está maduro hoje; o meu estará amanhã. É vantajoso para nós dois que eu te
ajude a colhe-lo hoje e que tu me ajudes amanhã. Não tenho amizade por ti e sei que
também não tens por mim. Portanto, não farei nenhum esforço em teu favor;e sei que se
eu te ajudar, esperando alguma retribuição, certamente me decepcionarei, pois não
poderei contar com tua gratidão. Então, deixo de ajudar-te ; e tu me pagas na mesma
moeda. As estações mudam; e nós dois perdemos nossas colheitas por falta de confiança
mútua."
Tomando como exemplo a parábola acima apresentada, concluímos que ambas as partes
teriam vantagens se agissem com cooperação. Porém, como garantir que a ajuda
prestada por um será realmente retribuída? Ou pior ainda, como saber que a outra parte
tem confiança na minha palavra?
Afinal, como já dizia Diego Gambetta: "para haver cooperação é preciso não só confiar
nos outros, mas também acreditar que se goza da confiança dos outros".
Tendo conhecimento de que a confiança mútua é uma ótima ferramenta para o
desenvolvimento passamos a visualizar uma nova etapa, que é a busca de uma solução
adequada e eficaz para que a confiança mútua faça parte de uma sociedade. E, a
primeira solução visualizada é a aplicação de penalidade para aquele que descumprir
sua palavra. E, obviamente, essa punição deverá ser aplicada por um terceiro, que não
faça parte da relação em questão.
Seguindo a teoria de Hobbes, temos que o Estado seria o terceiro responsável pela
coerção do individuo a praticar determinada conduta, sob pena de ser punido. Ou seja, o
sujeito tem uma determinada obrigação para com outrem, e, caso não cumpra essa
obrigação, o Estado intervém e aplica uma penalidade. Porém, sabemos que para
movimentar a estrutura do Estado temos custos elevados, além de não termos certeza da
imparcialidade de seu julgamento.
O capital social é indispensável dentro de uma sociedade possibilitando a realização de
determinados projetos que se baseiam na confiança mútua. Um exemplo de projeto
baseado na confiança mútua são as associações de crédito rotativo. Nas associações de
credito rotativo cada associado contribui com determinada quantia mensal, essa quantia
será destinada a um de seus associados, sendo que cada mês um associado será
contemplado com a totalidade do valor arrecadado.
Mesmo após o sujeito ser contemplado pelo crédito ele continua efetuando o pagamento
das suas parcelas, na tentativa de dar continuidade a associação. Para ele, é importante
estar adimplente, pois, o reconhecimento de sua integridade e honestidade é necessária
para que ele continue fazendo parte do grupo.
Geertz cita um exemplo japonês de práticas de mutua assistência, semelhante ao crédito
rotativo: " o ko é apenas uma das muitas formas tradicionais de mútua assistência
existentes nas aldeias japonesas, incluindo-se aí a permuta de serviços, a troca de
presentes, o mutirão para construir e reformar casas, o amparo da comunidade em casos
de morte, doença e outros transtornos, etc. Portanto, assim como nas áreas rurais de
Java, a associação de crédito rotativo é mais do que uma simples instituição econômica:
é um mecanismo que fortalece a solidariedade comunitária".
UM ESTUDO HISTÓRICO SOBRE INOVAÇÃO, CAPITAL SOCIAL E
DEMOCRACIA

Resenha de:

COUTINHO, L. A terceira revolução industrial e tecnológica: as grandes


tendências de mudanças. Economia e sociedade. Campinas (SP): UNICAMP 1992.

PUTNAM, R. D. Comunidade e democracia: a experiência da Itália moderna. Rio


de Janeiro (RJ): FGV, 2002.

Por Paulo Henrique Corrêa Brum1

Resenha apresentada a disciplina de “Paradigmas Organizacionais e Sociedade” – Prof.


Dr. Vilmar Antônio Boff.

No artigo “A Terceira Revolução Industrial e Econômica”, Luciano Coutinho inicia


apontando a instalação do crescimento econômico nas principais economias mundiais
capitalistas. Destaca dois aspectos importantes neste quadro: de um lado a capacidade
política de coordenar e de outro a aceleração da acumulação produtiva do capital com a
inovação, ambos alimentando um círculo virtuoso.

A sinalização da uma coordenação entre os estados capitalistas para as flutuações


cambiais com vias a manter a estabilização do câmbio, um ponto indispensável diante
da prevenção de novas crises econômicas e políticas. Concomitantemente, a cooperação
entre as potências capitalistas articulam um conjunto poderoso de inovações
mercadológicas com base em novas tecnologias emergentes nas indústrias das principais
economias capitalistas.

Destaca Coutinho em seu artigo, sete tendências da inovação nas principais economias
capitalistas, que deveriam ganhar corpo ao longo dos anos 90, são elas: o peso crescente
o complexo eletrônico; um novo paradigma de produção industrial; revolução nos
processos de trabalho, transformação das estruturas e estratégias empresariais; novas
bases de competitividade; globalização como aprofundamento da internacionalização e
as “alianças tecnológicas” como forma de competição.

O autor culmina o texto asseverando que um novo cenário mundial se descortina


alavancado pela inovação e o uso da tecnologia em todos os setores produtivos,
sustentado pela cooperação política entre as principais economias capitalistas mundiais.

Em outra situação de análise, em um cenário mais específico, Robert D. Putnam


examina por um período de quase vinte anos a partir de 1970 o desempenho
institucional formal de alguns governos democráticos da Itália que receberam novas
delegações e poderes. Esta análise da evolução dos governos regionais em seus dois
primeiros decênios inclui uma comparação entre o “antes e o depois” para avaliar o
impacto das reformas institucionais.

Adotando como método investigativo a técnica da criteriosa observação de campo e do


estudo de caso, num processo de “impregnação e investigação a fim de conhecer seus
costumes suas práticas, seus pontos fortes e fracos assim como o cotidiano destes
governos. Tendo o autor como principal objetivo examinar as origens do governo
eficaz.

Trazendo a baila às questões de “quem governa” e “quão bem governa” a instituição


analisada é o governo representativo e sua capacidade de percepção às demandas do
eleitorado assim como sua eficiência. Segundo os teóricos da democracia, “a principal
característica de uma democracia é a constante sensibilidade do governo em relação às
preferências de seus cidadãos”.

A forma de estudar o desempenho institucional de forma criteriosa e convincente tem


que preencher quatro requisitos rigorosos segundo o autor. Desta forma tem que serem
abrangentes, internamente coerentes, confiáveis e corresponder aos objetivos e aos
critérios dos protagonistas e dos membros das instituições.

Neste mesmo contexto, são examinados os doze indicadores que abrangem a eficácia
governamental nas 20 regiões da Itália e as correlações destes indicadores com as
avaliações realizadas pelo autor, comparativamente, região por região para análise do
êxito ou fracasso da instituição. São os doze indicadores: estabilidade do gabinete;
presteza orçamentária; serviços estatísticos e de informação; legislação reformadora que
se divide em três critérios, a abrangência da legislação, a coerência da legislação e
criatividade da legislação; como quinto indicador a inovação legislativa; creches;
clínicas familiares; instrumentos de política industrial; capacidade de efetuar gastos na
agricultura; gastos com a unidade sanitária local; habitação e desenvolvimento urbano e
sensibilidade da burocracia.

Estes indicadores buscam dar uma noção da diversidade de coisas que os governos
modernos fazem para os cidadãos e pelos cidadãos. São notáveis em termos absolutos as
diferenças nos níveis de desempenho reveladas pelos indicadores. Entre elas:
orçamentos que atrasam três semanas em uma região e sete meses em outras; em regiões
há muito mais creches, clínicas familiares, empréstimos e subsídios para a agricultura e
habitação do que em outras, mesmo havendo igualdade de acesso aos recursos, regiões
que as solicitações dos cidadãos são atendidas e em outras que simplesmente são
ignoradas.

A eficácia e a sensibilidade – dois parâmetros fundamentais do governo democrático –


mostraram-se no caso em estudo, estritamente interligadas. O desempenho institucional,
tal como avaliado, e na verdade o único indicador seguro da satisfação ou insatisfação
com o governo regional. A aprovação das atividades do governo não está relacionada
com nenhuma das categorias sociológicas tradicional. Nas regiões que com bom
desempenho, em análise feita, as pessoas estão relativamente satisfeitas, enquanto que
nas regiões com mau desempenho se observou pessoas insatisfeitas em sua maioria.

Pelo menos na Itália, foi notado em toda parte que o povo sabe distinguir o bom
governo do mau governo, contrariando o que dizem em outras partes do mundo os que
asseveram que quando o governo é corrupto, letárgico e ineficiente é porque o povo
quer assim. Identificou-se sempre um bom governo onde este dedicou boa parte do
tempo a servir aos interesses da maioria das pessoas.

Outro fator importante para o desempenho institucional abordado por Putnam foi o
capital social. Pontos como o “espírito cívico”, que podemos contextualizar hoje como
algo próximo a cidadania, cooperação e confiança mútua, foram estudados e
demonstraram-se fatores vitais para o cumprimento das obrigações das instituições
analisadas. “Para haver cooperação é preciso não só confiar nos outros, mas também
acreditar que se goza da confiança dos outros. Neste ponto da obra, o autor trás ao
estudo a “teoria dos jogos” e o dilema do prisioneiro para contracenar com a análise
comportamental do capital social em foco.

A cooperação voluntária é mais fácil numa comunidade que tenha herdado um bom
estoque de capital social sob a forma de reciprocidade e sistemas de participação cívica.
Esta cooperação se baseia numa noção muito viva da importância recíproca dessa
cooperação para os participantes. Assim é importante para qualquer eventual
participante, quando se toca a crédito cooperativo, ter uma reputação de honestidade e
confiabilidade. A incerteza quanto à reputação e o risco de descumprimento são
minimizados por normas rígidas e por uma densa teia de compromissos recíprocos. A
cadeia de relações sociais permite transmitir e disseminar confiança.

Muitas das formas de capital sociais existentes – confiança, por exemplo – são
denominados “recursos morais”, isto é, recursos cuja oferta aumenta com o uso, em vez
de diminuir, e que se esgotam se não forem utilizados. Por todos esses motivos, cabe
esperar que a criação e dilapidação do capital social se caracterizam por círculos
virtuosos e círculos viciosos. Podemos dizer que a confiança é um componente básico
do capital social e anota o autor que esta confiança não é cega, mas aquela que deriva do
conhecimento da disposição, da capacidade dela e tudo mais, decorrente do convívio
íntimo com aquela pessoa.

Nos modernos e complexos contextos, a confiança social pode verter de duas fontes
seguras conforme a obra em foco: regras de reciprocidade e sistemas de participação
cívica. As regras de reciprocidade implicam em duas visões, a “balanceada” que diz
respeito à permuta de itens de igual valor, quando, por exemplo, colegas permutam suas
folgas; e a reciprocidade “generalizada”, quando a uma contínua relação de troca, como
exemplo a amizade. Sendo esta última altamente produtiva para o capital social,
coibindo o oportunismo e proporcionando a solução de problemas da ação coletiva,
servindo para conciliar interesse próprio com solidariedade.

Em geral a reciprocidade generalizada esta ligada a um sistema de intercâmbio social.


Observou-se onde a confiança é retribuída exista maior probabilidade de intercâmbio, e
este quando acontece de forma contínua incentiva à reciprocidade generalizada, desta
forma os problemas de ação coletiva são melhores atacados e resolvidos. A
interatividade pessoal neste processo está ligada ao desenvolvimento de confiança.
Então conclui o autor que: como lembra o teorema popular da teoria dos jogos, as
relações sociais existentes fomentam a confiança.

Alguns destes sistemas são basicamente “horizontais”, congregando agentes como o


mesmo status e o mesmo poder, e outros “verticais”, unindo agentes desiguais em
assimétricas de hierarquia e dependência. Na realidade, quase todos combinam ambas
as características. Os sistemas de participação cívica, associações comunitárias,
cooperativas, clubes desportivos, partidos de massa e similares examinados representam
uma intensa interação horizontal.

Observa também o autor que quanto maior for à comunicação, tanto direta quanto
indireta entre os participantes, maior será sua confiança mútua. Os cidadãos de
comunidades cívicas descobrem em sua história exemplos de relações horizontais bem-
sucedidas, enquanto os cidadãos das regiões menos cívicas encontram, quando muito,
exemplos de suplicação vertical. Assevera o autor que um sistema vertical, por mais
ramificado e por mais importante que seja para seus membros, é incapaz de sustentar a
confiança e a cooperação social, pois os fluxos de informação vertical costumam ser
menos confiáveis que os horizontais, pois os verticais proporcionam o controle das
informações.

Outro ponto exponencial do capítulo seis da obra é a observação e a citação do


clientelismo, prática onde a “amizade é desequilibrada” e mina as organizações dando
curso a deslealdade. Em suma a relação vertical caracteriza-se pela dependência e não
pela reciprocidade e são menos úteis na solução de problemas coletivos, talvez seja uma
das razões por que a democracia revelou-se mais eficaz do que a autocracia do século
XX. Assim, quanto mais horizontais os sistemas de participação cívica, melhor a
solução de problemas coletivos e melhor o desempenho institucional na comunidade.
Existe uma forte correlação apontada, sociedades horizontais de participação cívica,
capital social corporificado favorece o desempenho do governo e da economia.
Sociedade forte, economia forte, Estado forte.

A confiança é uma propriedade do sistema sócia, tanto quanto um atributo social. Os


indivíduos podem ser confiantes por causa das normas e dos sistemas em que se inserem
seus atos. Os estoques de capital social, como confiança, normas e sistemas de
participação, tendem a ser cumulativos e a reforçar-se mutuamente. Os círculos
virtuosos redundam em equilíbrios sociais com elevados níveis de cooperação,
confiança, reciprocidade, civismo e bem estar coletivo. Eis as características que
definem a comunidade cívica.

Por outro lado, o autor aponta que a estratégia de “jamais cooperar” constitui também
um equilíbrio estável, pelos motivos expostos nas versões habituais do dilema do
prisioneiro – teoria dos jogos. Neste ponto da obra é trazida a baila uma característica
histórica apresentada por alguns autores que se chama “subordinação a trajetória”, onde
estes contextos sociais ficam atrelados a este caminho trazido pela tradição histórica.

Interessante para entendimento deste comportamento social é o caso da colonização das


Américas, onde ambas foram feitas em tempos e situações similares, com abundância de
recursos e idênticas oportunidades de crescimento. Porém, as repúblicas da América do
sul, com colonização latina, principalmente herdadas da Espanha medieval foram
fortemente influenciadas pela tradição do autoritarismo centralizado, do familismo e o
clientelismo, legando características de dependência vertical e exploração. Por outro
lado, os norte-americanos foram beneficiados pelas características inglesas de
descentralização e parlamentarismo herdando a tradição do civismo. O fato é que
contextos sociais historicamente determinados trouxeram diferentes oportunidades e
motivações aos indivíduos inseridos nestes cenários.

Caminhando para as conclusões finais deste trabalho temos várias observações


relevantes trazidas pelo autor para nossas reflexões. As instituições de cunho
cooperativo requerem aptidões e confiança interpessoais, mas essas aptidões e essa
confiança são permeadas pela colaboração organizada. A subordinação a trajetória
significa que a história realmente importa, o contexto social e a história condicionam
profundamente o desempenho das instituições. Estamos começando a entender que o
governo democrático trás inúmeros benefícios a homens e mulheres. Em uma
comunidade cívica é fundamental colaborar visando interesses comuns, pois este
caminho gera imenso capital social.

A consciência que cada um tem seu papel e de seus deveres como cidadão, aliada ao
compromisso com a igualdade política, constitui o cimento cultural da comunidade
cívica e o contrato social que sustenta esta colaboração não é de cunho legal, e sim
moral.

Mudando-se as instituições formais pode-se mudar a prática política e a reforma


regional observada proporcionou aprendizado social na prática, induzindo a mudança
informal e tornando-se auto-sustentada.

Outra lição da pesquisa é que a história institucional costuma evoluir lentamente quando
se trata de instituir regras de reciprocidade e sistemas de participação cívica.
E culminamos com a frase final do capítulo seis da obra: “criar capital social não será
fácil, mas é fundamental para fazer a democracia funcionar”.

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