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A Produção Artística Juvenil

UNIVERSIDADE DE SOROCABA (UNISO)

PRÓ- REITORIA DE PÓS- GRADUAÇÃO E PESQUISA

PROGRAMA DE PÓS - GRADUAÇÃO EM PEDAGOGIA DO TEATRO

AUTOR: LINDINALVA BARBOSA DE SOUZA

A PRODUÇÃO ARTÍSTICA JUVENIL - A EXPERIÊNCIA DOS FESTIVAIS DE TEATRO


JOVEM

SOROCABA (SP) 2010

ARTIGO DE CONCLUSÃO DO CURSO DE PÓS- GRADUAÇÃO EM PEDAGOGIA DO TEATRO PARA


A OBTENÇÃO DO TÍTULO DE ESPECIALISTA EM PEDAGOGIA DO TEATRO PELA UNIVERSIDADE
DE SOROCABA (UNISO)
AREA DE CONCENTRAÇÃO: ARTES CÊNICAS

ORIENTADORES: JOAQUIM CESAR MOREIRA GAMA E TÂNIA CRISTINA DOS SANTOS BOY

SOROCABA- SP

2010

Ao grande mestre Augusto Boal, um exímio jogador.

(In memorian)

AGRADECIMENTOS

Agradeço a todos os integrantes do Grupo de Teatro Jovem Estrelas de David, pela


dedicação, trabalho e entrega nos processos artísticos desenvolvidos no período de cinco
anos de trabalho.

A todas as pessoas que sempre me apoiaram na criação de um núcleo de Teatro Jovem,


entre elas Fátima Lisboa, amiga e companheira que sempre me incentivou em meu
trabalho, ao meu filho Victor Tayon, que sempre entendeu a proposta de meu trabalho e
encorajou-me sempre a realizar minhas idéias e que tem um carinho especial pelo
espetáculo “Peça de Horror”, dizendo-me, - Mãe, foi seu melhor trabalho até agora!

Aos meus pais Zacarias Barbosa de Souza e Valdinha Soares de Souza (in memorian), que
sempre me incentivaram e me encorajaram na carreira que decidi seguir. Com certeza,
aprovam tudo o que fiz e o que faço no decorrer desta.

A todas as crianças, adolescentes e adultos que “jogam” comigo todos os dias, apenas
confirmando o poder da sua prática e impulsionando a estes “jogadores”, vivenciarem o
processo criativo seja em que arte for.

Aos colegas de carona na trajetória deste curso em especial a amiga Aládia Cintra uma
verdadeira Brincante.

A todos vocês, o meu aplauso, sempre!

Lindy Barbosa.

A experiência é em primeiro lugar um encontro ou uma relação com algo

que se experimenta, que se prova.

Jorge Larrosa Bondia

RESUMO

Este artigo é sobre o processo de montagem do espetáculo “Peça de Horror” de Judith


Johnson, que fez parte da primeira edição do Conexões da Cultura Inglesa, em parceria
com o Britsh Council.

British Council é a organização internacional oficial do Reino Unido para assuntos culturais
e educacionais, que fornece apoio e estímulo à apresentação da arte britânica no Brasil,
trazendo informações do cenário artístico britânico e promovendo a cooperação entre
artistas e profissionais britânicos e brasileiros.
Este festival tem como objetivo a montagem de textos de autores Ingleses e Nacionais.
Uma nova dramaturgia para jovens.

Os grupos se inscrevem e passam por um sorteio, os selecionados recebem os textos para


leitura e estudo, fazem a escolha do qual querem montar, ou seja, a escolha é
democrática, após este processo, os grupos passam por uma “imersão”, onde o “jogo” é a
grande ferramenta para o entendimento do texto.

Entre os meses de Maio a outubro, os grupos participantes estarão imersos em seu trabalho
de construção do espetáculo, que será apresentado em Novembro, na Mostra Conexões de
teatro Jovem no teatro cultura inglesa em Pinheiros, SP. Durante o período de ensaio,
profissionais pedagogos de teatro estarão realizando visitas e supervisionando o trabalho
de cada um dos grupos. O texto não pode ser alterado, ou seja, a montagem é na integra.
Portanto o que vale é como cada grupo, mesmo montando o mesmo texto, pode chegar a
resultados tão diferentes.

Este é o processo de criação valorizado no festival, que não tem fins de competição e sim
de integração e socialização do teatro. No ano de 2007, fomos uns dos pioneiros no
Festival, que já está na sua quarta edição.

Apresentamos o espetáculo “Peça de Horror” da inglesa Judith Johnson, que escreve para
o público jovem no festival Conexões que acontece no Reino Unido já há 10 anos.

Por se tratar de um Projeto que visa à pedagogia aplicada a cada um dos procedimentos
de criação e construção de um espetáculo, e por ser uma experiência valorosa de
crescimento pessoal e profissional de todos os integrantes do grupo relato nosso trabalho,
que é uma boa fonte de pesquisa em Pedagogia do teatro.

PALAVRAS CHAVE: Teatro e educação, Teatro Jovem, Festival Estudantil, Processos de


criação, Criar, Arte teatral, Experimentos, Vivências Culturais.

Abstract
This article is about the mounting process of the play "Scary Play” by Judith Johnson,
which was part of the first edition of Connections of English Culture, in partnership with
the British Council. This festival aims at mounting British and National authors texts.

The groups enroll and go through a draw, the selected ones receive the texts and after
reading and studying them, they choose which one they want to mount, that is, the choice
is democratic. After this process, the groups go through an "immersion" where the "game"
is a great tool for understanding the text.

From May through October, participating groups will be immersed in their work of building
the play, which will be presented in November at the Exhibition Connections of Youth
Theatre at Culture InglesaTheatre in Pinheiros, SP. During the rehearsal period,
professional pedagogues will be doing visits and overseeing the work of each group.

The text cannot be changed, that means that the mounting is in full. So what matters is
how each group, even mounting the same text, can reach such different results. What is
valued at the festival is the process of creating, and it has no end of competition but of
integration and socialization of the theater.

In 2007, we were one of the pioneers in the Festival, which is already in its fourth edition.
We introduced the play "Scary Play" by Englishwoman Judith Johnson, who writes for the
young audience at the Connections that has taken place in the UK for 10 years.

Because it is a project that aims at applied pedagogy to each of the creation procedures
and building a play, and for being a valuable experience for personal and professional
growth of all members of the group, I report our work, which is a good source of research
in theatre Pedagogy.
PALAVRAS CHAVE: Drama in education, Young´s Theatre, Studant´s Festival, Create,
experiment,

INTRODUÇÃO

No ano de 2004, conheci a comunidade do jardim varginha através da ONG que prestava
serviços como Arte-Educadora em Teatro. A Brascri ministrava projetos extracurriculares
nas Escolas Estaduais para o ensino fundamental e Médio, sendo os cursos voltados para
conhecimentos artísticos, Teatro, Artes visuais, Novos autores, Canto Coral, Bateria de
escola de samba e de formação profissional, informática e telemarketing. Nesta
comunidade, a parceria entre a ONG Brascri e a E.E. David Zeiger dava certo, pois os
jovens não tinham outras alternativas a não ser este centro comunitário que a escola se
tornou.

Comecei a dar aulas de teatro em dois períodos, duas vezes por semana e cada aula tinha
3 horas de duração, ou seja, existia um tempo bom de trabalho e isso também contribuiu
para o andamento das atividades.

O período da manhã era direcionado aos alunos do fundamental e o período da tarde aos
alunos do Ensino médio e da oitava série do fundamental. Inicialmente as turmas eram
cheias, em média 30 a 35 alunos por período, mas a seleção natural era algo que eu previa
desde o planejamento do curso e antes mesmo do final do bimestre essa média já havia
sido reduzida e assim até o final do semestre. Ao reiniciarmos as aulas de teatro em
agosto a turma já estava em um numero atraente de 16 alunos e estes alunos foram o
embrião do Grupo Teatral Estrelas de David, hoje caracterizado como Grupo de Teatro
Jovem.

Esses alunos tinham um perfil particular de serem muito interessados nas artes em geral,
na música, na dança, em particular. As aulas de teatro eram o alimento que precisavam
para que a verve criativa desse vazão e fomentassem outros processos, todo este material
resultou em nosso primeiro espetáculo com dramaturgia desenvolvida por dois alunos
baseada em um conto de fadas trabalhado em improvisação com Jogo teatral aplicado. O
texto “Azulada de Neve e os quatro cabritinhos gaúchos”, foi montado a partir de jogos
que criavam as cenas. Foi o primeiro trabalho do grupo e foi apresentado na escola David
Zeiger e também em outras escolas estaduais próximas da região.
Outro Perfil dos adolescentes era que achavam chato a leitura de textos, eles gostavam do
jogo e das improvisações, ou seja, eu tinha um desafio a vencer com a turma que se
firmou, conquistá-los ao interesse e prazer com a dramaturgia teatral. Foi algo percebido,
porém não trabalhado de imediato e sim, com calma, pequenos textos, pesquisas, letras
de música e materiais que os estimulassem. Foi através da pesquisa que montamos o
segundo espetáculo do grupo, uma outra adaptação de um musical da Broadway,
“Grease – o Musical!

Neste espetáculo, tivemos como Modelo de Ação, o filme Grease- Nos tempos da
brilhantina, mas não realizamos cópia e sim, jogo e criação. Foi também um espetáculo de
sucesso do grupo que realizou apenas cinco apresentações.

Como exercício, montamos um Auto de natal “A caminho de Belém”, a ser apresentado no


final do ano na própria escola. Foi neste ano, final de 2006, que recebi o material da
primeira edição do Conexões da cultura inglesa e resolvi arriscar, inscrevi o grupo e em
março de 2007, tivemos a excelente notícia de sermos sorteados para participar do
Festival. Enquanto a empolgação adolescente comemorava, eu via a oportunidade de
trabalhar mais elaboradamente o texto teatral.

Assim, iniciamos um processo de sete meses de trabalho, onde a incubadora, os jovens da


E.E David Zeiger e sua Artista orientadora Lindy Barbosa iriam realizar a criação e
encenação do espetáculo “Peça de Horror” da inglesa Judith Johnson.

Concretizou-se então a formação do Grupo de Teatro Jovem Estrelas de David, residente


no segundo ano do Festival Conexões em 2008, realizando a montagem do texto: - O
Primeiro Vôo de Ícaro de Luis Alberto de Abreu.

DESENVOLVIMENTO

1.1. A escolha do texto e o workshop de Imersão


Após o sorteio realizado no dia 29.03.2007, recebi os textos que fariam parte do Festival,
para a leitura e escolha, os textos eram:-

Treta no jardim de David Farr

Peça de Horror de Judith Johnson

Meio fio de Marcelo Rubens Paiva

Osama, o homem bomba do rio de Caco Barcellos

Ou seja, dois autores ingleses e dois brasileiros conhecidos do grande público.

Ao definirmos a escolha do texto, já havia se passado quase um mês e Entravamos no mês


de maio, onde era esperado o WORKSHOP DE IMERSÃO Com os autores e com os outros
grupos participantes. O processo do workshop Foi de extrema valia para todos os
integrantes do grupo e também para os Jovens dos outros grupos, pois foi nesse momento,
que trocaram experiências E contatos a Conexão começava a criar teias.

O workshop foi durante um final de semana, durante os dias 26 e 27 de Maio e

Foi dividido da seguinte maneira:-

Dia 26- Imersão com os autores – 1.a parte: Leitura dramática\ dúvidas das cenas\
esclarecimentos gerais

2.a parte: Jogos e Improvisação – O tema gerador dos jogos aplicados era o

Aprofundamento do medo

3.a parte: Fórum com os autores

Dia 27- Oficina de corpo com Renata Melo

Oficina de voz com Rubens Caribé


Após entrarmos em estado de imersão total através do workshop, ficou uma dúvida:-

Qual seria o nosso modelo de ação& Esse foi o nosso segundo passo

Jogos aplicados no Workshop de imersão- Maio\2007. (figura 1)

1.2. A pesquisa do Modelo de Ação

O exercício artístico, propiciado pelo modelo de ação, propõe questões


didáticas em muitas direções. Uma primeira questão que surge é sobre a
educação do educador. Como pode ser introduzida a pedagogia do Lehrstuck&

(Koudela, 1999)

O conceito de modelo de ação nasce da teoria do Lehrstuck de Bertold Brecht que


propõe dois instrumentos didáticos para a experimentação prática: O modelo de ação e o
estranhamento.

O estranhamento, entendido como procedimento didático- pedagógico,


através dos meios do jogo teatral, visa à construção do conhecimento que
está prefigurado no modelo de ação.

(Koudela, 1999)

Tendo como foco uma proposta de montagem de espetáculo, fundamentada no Jogo


Teatral e no Modelo de ação, precisava escolher as ferramentas com a qual trabalharia,
pois estava diante de um texto onde o tema principal eram o Terror e o medo, portanto a
pesquisa se iniciaria com a busca por materiais de apoio com a temática em questão.
Durante a semana segui as informações dos alunos e marcamos uma “imersão” em vídeos
sobre a temática TERROR assistindo a três deles.

Filmes sugeridos:-

- Psicose de Alfred Hitchcock

- A Bruxa de Blair de Daniel Myrick e Eduardo Sanchez

- IT- O palhaço assassino de Stephen King

A escolha destes filmes foi de acordo com o entendimento do texto de buscar Conteúdos e
ações de medo e terror que envolvesse A casa misteriosa e o Personagem sinistro,
elementos presentes no filme Psicose. A busca pela Aventura e o desconhecido, assunto do
filme A Bruxa de Blair e o Personagem Cômico e terrorizante que aparece na Cena 07 do
texto, não apenas um, mas Muitos que são os palhaços assustadores e se encontra no filme
IT- O Palhaço Assassino.

Na peça, Kal é um menino de dez anos que comemora seu aniversário com uma festa do
pijama, para animar a festa começam a contar histórias, especificamente de terror, seu
amigo Mal, resolve dar uma idéia brilhante a turma, visitar a tal casa assombrada que Kal
narra na história e que tem um homem, um provável psicopata que tem um macaco de
estimação e usa este para aprisionar as crianças, assim se desenvolve a trama.

Após realizarmos essa pesquisa em vídeo, partimos para a segunda parte Desse processo
que foi selecionarmos cenas para serem trabalhadas com os Jogos teatrais que
colaborariam com o desenvolvimento do clima tenso e terror Que o texto solicitava,
considerando que os personagens são crianças entre oito e 11 anos.

Comecei com a caminhada no espaço e substância no espaço. E a seguinte


Narrativa:- “Andando vamos nos imaginar em um lugar muito confortável, seguindo o
ritmo da música,(música suave) respirando, soltando os músculos da face, do pescoço,
ombros, tórax, descendo para a barriga, púbis, músculos da coxa, do joelho e da batata
da perna. Este relaxamento atinge os meus pés e sinto-me completamente relaxado,
caminhando e sentindo a substância confortável na qual me encontro. No mesmo ritmo,
sinto-me flutuando e uma extrema sensação de paz faz parte de mim. Pulo e salto em um
colchão macio, gostoso e extremamente confortável. De repente (quebra de ritmo) um
espinho espeta meus pés e surge uma sensação de desconforto, você não sabe de onde
veio e não entende como esse espinho começa a crescer e a ir atrás de você. Você precisa
fazer algo, pois o espinho cresce cada vez mais e o segue, você é a presa,o espinho quer
te agarrar e laçar você e você corre, corre cada vez mais procurando fugir desse enorme
monstro que se transformou esse espinho. Congela! Mantenha o estado físico interno que
você se encontra e improvise a seguinte ação: - Como você vai sair dessa situação&”

O próximo passo foi o trabalho de Partitura Gestual, como não estava definido ainda, qual
ator faria tal personagem, este procedimento seria utilizado para a escolha deles. É claro
que os jovens, tinham em si as aspirações a este ou aquele personagem, porém,
respeitaram que os jogos auxiliassem ao grupo a melhor maneira de encontrar o
personagem ao qual cada um se adaptaria melhor. Nos jogos de partitura gestual, eu
instruía ao grupo, pesquisar o andar de cada personagem, o timbre de voz, os gostos
pessoais, as brincadeiras que as crianças fariam juntas, as músicas que gostariam de ouvir,
explorar ao máximo o universo das crianças de hoje e suas particularidades.

Os exercícios de Partitura Gestual levaram os alunos a improvisarem uma abertura para o


espetáculo intitulado de “A festa de Aniversário de Kal”, usando uma música da Banda
Pet Shop Boys (You all alwyas on my mind), a favorita das crianças e esta cena foi
incorporada ao espetáculo como a cena de abertura.

As frases usadas para instruir o jogo teatral evocam a descoberta! O encenador é o


catalisador do esforço coletivo, aquele que busca canalizar as energias dos
jogadores e transformar o medo da espontaneidade em uma atitude que promove
atenção necessária para estabelecer contato com o desconhecido. Como estimular
a intuição& É a intensidade do foco do diretor no jogo e o uso de instruções
habilidosas o que estimula a expansão do lúdico.
(Koudela, 2006)

A partir do momento que os alunos foram estimulados pelos jogos e improvisações,


sentiram-se seguros para criar e desenvolver cenas. Esta é uma habilidade teatral, que o
jogo proporciona para o ator, seja ele profissional ou estudante de teatro, e para o grupo
de trabalho, solucionando, assim, problemas de direção e encenação.

Através do processo de jogos e da solução de problemas de atuação, as


habilidades, a disciplina e as convenções do teatro são aprendidas
organicamente. Os jogos teatrais são ao mesmo tempo atividades lúdicas e
exercícios teatrais que formam a base para uma abordagem alternativa de
ensino e aprendizagem. (Koudela, 1999)

Encarei esse fato, como uma certa maturidade do grupo e como o momento exato de
definirmos os personagens, afinal, eles próprios haviam proposto na improvisação, quem
seria qual. Realizei o jogo da Máscara corpórea e após o termino defini em conjunto com o
grupo os personagens do espetáculo.

KAL- Suevelin BOFF - Cristiane MACACO- Luísa

RO- Rosana O HOMEM- Elaine MÃE MORTA- Ana Fábia

MAL- Fabrício TILLY - Ana Fábia PALHAÇOS

JAZ- Érika LOU – Regiane VAMPIROS E ZUMBIS- Coro

VIGIA NOTURNO- Elaine


Com a definição do elenco, tínhamos a missão de resolver a cenas dos medos, que
originalmente propunha mais atores em cena. Como nosso grupo estava fechado em nove
jovens atores, iniciei o trabalho com jogos que propusessem certa coralidade as cenas. Os
jogos escolhidos para este procedimento foram: Siga o seguidor, Quem iniciou o
movimento, Quem é o espelho.

Caminhada no espaço Substância no espaço

(figura 2) (figura 3)

1.3 . Coro, Coreografias e Construção de Personagens

No teatro, a presença dos coros sempre cria a representação conjuntos de efeitos


convergentes que visam modificar a relação do espectador com a fábula. O trabalho
operado pelo coro no interior da forma dramática desestabiliza as categorias usuais
da representação, segundo os quais se opõem o inteligível ao sensível, o palco a
platéia, a fala ao canto: ele impõe ao espectador um regime de representação
multiforme orientado para o espetáculo total participativo e dionisíaco, outrora
pressentido por Nietzsche e Artaud.

Sarrazac, Jean-Pierre (org.) Lexique Du drame modern ET contemporain.


Os jogos foram aplicados sempre com o uso da musicalidade. Procurava utilizar clássicos e
sons desconstruídos que despertassem o suspense. Uma sugestão da aluna, a jovem atriz
Rosana Natália, A Banda Lacrimosa, me colocou diante da trilha perfeita para o
espetáculo. Pois ela sugeria o clima de suspense e terror que queríamos estabelecer nas
cenas.

Os jogos Siga o seguidor e Quem é o espelho, definiu as coreografias utilizadas para as


cenas dos medos de Palhaços e Vampiros.

O jogo Quem iniciou o movimento foi à base da construção da cena do medo da Mãe
morta, um processo muito natural e vivencial ao qual os jovens realmente se apropriaram
e dominaram. Foram cenas muito fortes do espetáculo, outra comprovação do poder do
jogo na energia da cena, seja ela qual for.

O medo do dentista foi trabalhado em improvisações, onde todo o grupo mostrava seu
desespero em extrair um dente, neste caso o QUEM, ou seja, o dentista era substituído
pela figura do macaco. A situação do improviso era, ir ao dentista e no momento da
extração, ao invés do médico dentista, aparecia o macaco como dentista.

É impossível negar o grau de comicidade que essa cena causou durante os improvisos e na
apresentação do espetáculo.

Definimos então as coreografias de abertura e do coro que representavam os medos. Essas


cenas enriqueceram o trabalho trazendo a valorização da imagem na cena e uma certa
ludicidade em relação as fantasias que as crianças tem,ou seja, eram aterrorizantes, mas
foram representados de maneira a respeitar o imaginário infantil.

Os jogos foram importante ferramenta para adentrar a todo o universo solicitado no texto,
a infância, seus medos, seus dramas, suas brincadeiras e seus diálogos, para isso, era
necessário afinar a atuação dos jovens atores neste sentido.

O fato de o elenco ser em maioria feminino, não foi uma barreira, pois as jovens atrizes
que representavam os papéis masculinos, que eram também crianças, meninos da idade de
dez anos, trabalharam bem essa questão, que foi trabalhada em jogos de partitura
corporal. A observação foi o ponto de partida para a construção desses personagens. Eu
instruía as alunas a observarem sempre os meninos desta idade e sua forma de brincar,
nos ensaios, durante os jogos de aquecimento, a instrução era trabalhar o material
observado em improvisações das cenas do espetáculo.

Através do entendimento do texto, eu pedia para improvisarem com as idéias contidas no


subtexto de cada personagem, sempre exagerando nos gestos e na maneira de falar, o
exagero da situação permitia que quando fossem para a cena real, ela fluísse de maneira
natural e este era o foco que eu pretendia chegar como resultado das cenas. A
naturalidade. Os jogos propostos para a construção de personagens foram os relacionados
ao QUEM, O QUÊ E ONDE.

(figura 5) (figura 6)

Siga o seguidor e Quem é o espelho foram ferramentas na construção do Coro e


Coreografias.

Suevelin para Kal

A grande dificuldade é criar em cima do texto, deixar de ser uma garota e


passar a ser um menino de dez anos de idade.

É óbvio que a criança (menino) mais fácil de criar um contexto é o Kal, por
ele ser o grande manipulador da história, é o que demonstra mais confiança e poder
sobre as crianças.

Essa idéia de manda-chuva ajudou muito. Andei observando crianças dessa


faixa etária e tirei algumas conclusões para meu personagem.
Cada ensaio, cada passagem de cena é uma tentativa nova, aderimos algo,
descartamos algo, até chegarmos naquilo que para nós faz sentido.

A primeira parte é essa, a segunda, a meu ver, é o texto, estar na ponta da


língua, sem criar e nem tirar, tudo certinho.

A partir de agora é só aperfeiçoar o que se tem e brilhar, brilhar e


brilhar....

(Suevelin Cintia)

As instruções de trabalho ficam claro neste protocolo da aluna, a jovem atriz demonstra
que encontrar o subtexto para uma improvisação, não é tão fácil assim e que tem mais
elementos inseridos que é o fato do seu personagem ter dez anos de idade e ser um
menino. Algo que pode parecer complexo se torna simples quando estabelece- se uma
ação e uma situação. Quando ela diz que o fato de ser um manda chuva ajudou muito,
está deixando clara a ação do Kal, O QUE ele esta fazendo& esta manipulando! Então meu
personagem É, (QUEM) domina uma situação. Sua construção parte deste principio.

(figura 7 ) (figura 8)

Jogos do Quem, O que e Onde utilizados na construção de personagens.

Rosana como Romeu (RO)

Para construir meu personagem, primeiro usei os princípios básicos: Quem


sou, Onde estou e o que faço. Um bom estudo de texto. O mais difícil é ser um
menino, tomar cuidado com as ações, tento fazer movimentos com o corpo meio
endurecido.

Meu personagem exige muito medo não esta totalmente construído, mas já
tenho um corpo e voz para o personagem. O que dificulta é o fato do meu
personagem ter poucas falas, ele praticamente só faz perguntas.
No começo cheguei a pensar que não gostaria de fazê-lo, mas não o trocaria
por outro. Ele é tão medroso que chega a ser cômico.

A cada vez que estudo o texto mais próximo eu chego dele. Espero honrar o
personagem.

(Rosana Natália)

É interessante notar a conquista que se tem do personagem. A idéia que a maioria dos
atores demonstram no início ao montar um espetáculo. Muitas vezes parte-se da idéia do
personagem atraente, aquele que se quer fazer, porém ele pode apenas te conquistar,
pois o conhecimento a respeito dessa pessoa pode fazer com que simplesmente goste dela.
Fica clara essa idéia no protocolo da jovem atriz a respeito do seu estudo para a
construção do seu personagem.

Esse processo de apropriação do texto não visa perguntar, num primeiro


momento, pelo seu sentido. Ao “brincar”, com o texto, os jogadores
permitem o livre jogo de associações, de imagens e significados que o texto
provoca, sem se fixar em um único significado ou buscar uma mensagem|
lição totalizante.

(Koudela, 1999)

O improviso e o “brincar” com o texto possibilitam melhor entendimento e


apropriação da história e dos personagens.

1.4. Cenários, Figurinos e Adereços

O teatro deve ser teatral& Além do real. Nas fantasias, contos de fadas,
musicais, óperas cômicas, dança, ficção científica, Shakespeare, no Story
Theatre de Paul Sills, o além do real é elaborado por meio de efeitos
especiais, iluminação, som figurino, música, roteiros. É um mundo onde
toda condição humana, rima ou visão pode ser explorada, um mundo
mágico, onde pode ser invocado para com ele conversarmos.

(Spolin, 1985)

O texto original sugeria que o cenário tivesse o quarto do Kal em primeiro plano, arbustos,
a velha casa e um patamar que dividia as cenas dentro e fora da casa. Os figurinos para as
crianças propostos eram pijamas e camisolas apropriadas às idades das crianças, camisetas
do time de futebol preferido para os meninos.

Adereços de cenas eram vários, faca, machado, lanternas, cachorrinho de pelúcia,


mochila, corda de alpinismo, óculos de nadador, bússola, livro de mapas, máscara de
esqui, coleira com corrente.

Por se tratar de uma produção de um grupo de estudantes, não poderia pensar em uma
grande produção, nem em termos de cenários como também de figurinos. Mesmo assim
realizamos uma pesquisa de construção dos figurinos e adereços o que foi criado
coletivamente com o grupo.

Optei por utilizar a iluminação como o cenário. O quarto e a casa eram delimitados de
acordo com o desenho da luz , bem como o caminho realizado pelas crianças, que eram
corredores escuros e sombrios e a cena dos medos era trabalhada em cores quentes e
fundo azul como um código de estabelecimento do imaginário infantil.

Para definir os personagens infantis dos personagens de terror, criamos máscaras para
cada cena. Os palhaços tiveram um tipo de máscara, os Vampiros outra e os Zumbis outra.
As máscaras foram definidas em exercícios de partitura corporal que criavam a expressão
de cada personagem de terror.

A maquiagem teatral também foi um recurso na pesquisa pelas expressões das máscaras
de cada personagem.

As personagens da Mãe Morta e a Morte que vinha busca- la tiveram o mesmo


procedimento de criação.
Os adereços todos foram mantidos como no original do texto e os figurinos foram
carinhosamente costurados por uma senhora que se voluntariou ao trabalho, os tecidos
foram doados e ao final tínhamos tudo. Os pijamas, as camisolas das meninas, inspiradas
pelas próprias jovens atrizes, as camisetas de time, pantufas, macacões dos palhaços,
capas para os vampiros e uma capa desconstruídas para os zumbis. O personagem do
Homem ganhou uma máscara e túnica o que tornava seu ar mais sombrio. A Mãe Morta e a
Morte, tiveram o figurino inspirados em um clipe da Banda Evanescence, estabelecendo
um código de gótico nas personagens e todo esse processo, foi realizado em conjunto com
os jovens atores que envolvidos em todo processo, confeccionaram suas próprias máscaras
e adereços.

É recomendável fazer o desfile de figurinos junto com um ensaio de


maquiagem. Em poucas palavras, o desfile é apenas isso: um grupo
de atores, completamente vestidos e maquiados de forma que você
possa ver como estão sob os refletores. (Spolin, 1985)

Depois de todo esse trabalho, realizamos um ensaio geral com todos os figurinos e
adereços e o desfile dos personagens se tornou um jogo interessante de descobertas e
possibilidades cênicas de todos os personagens.

Tivemos um ensaio no teatro Cultura Inglesa na unidade de Pinheiros. Este ensaio seria
importante para afinarmos as cenas de acordo com o espaço e verificar se o mapa de luz
estava de acordo com as possibilidades técnicas do teatro. Estava tudo de acordo e pouca
coisa foi alterada.

Nossas apresentações no Festival Conexões foram nos dia 25 e 26 de novembro de 2007.

Se existe um Deus do Teatro, se Dionísio é esse Deus, ele é o Deus


da felicidade. (Fabrício Nascimento)

Realizamos apresentações em outros espaços durante os anos de 2008 e 2009. Foi uma
ótima experiência.
CONCLUSÃO

A criança, o adolescente e o jovem, não devem ser privados da oportunidade de


expressões artísticas, seja ela qual for. Fomentar ações para que esse público tenha
acesso às oficinas, atividades extracurriculares e curriculares é uma missão de todo artista
que pretende também ser um educador da sua arte. O Arte educador, o pedagogo de
teatro.

Projetos como o Conexões, possibilitam que se conheça também o que esta sendo
realizado nas escolas e nas comunidades. Mostra o valor do jovem e toda a sua vontade
transformadora, pois o coloca como protagonista de uma ação que ganha a sua valoração
através da experiência.

Por ser um projeto Britânico ele denota características específicas, pois no Reino Unido já
é uma práxis a aplicação do jogo desde a infância. O que acontece também na América de
onde deriva os Jogos Teatrais de Viola Spolin.

Nas escolas britânicas, a maior parte do tempo das crianças entre 5


e 7 anos de idade é empregada no jogo, e muitas já em nível
primário(7-11 anos) tem horários especiais para o jogo dramático.
Nas escolas secundárias (11 + anos) há um crescimento constante:
havia poucos professores especialistas em teatro em 1948, mas, já
em 1966, havia todo um conjunto de escolas com horários especiais
dedicados ao teatro em seus currículos. (Courtney, 1974)

A importância da tradução das obras de Viola Spolin e o acesso ao que acontece em outros
países em termos de pesquisa em teatro e educação, possibilita que o profissional
brasileiro crie e amplie suas ações pedagógicas através do teatro, do jogo. Os Festivais
Estudantis acontecem, mas ainda são poucos em relação a demanda que existe. Quando
acontece, parte muitas vezes de iniciativas privadas, onde as condições para a
participação dos grupos se tornam precárias, em outras palavras, o grupo precisa arcar
com todas as despesas para mostrar sua produção artística, que esta intrisicamente ligado
a sua experiência vivencial em todo o processo.

Cumpre-se nesta atitude a função do teatro de manifestar um desejo, uma vontade de


expressão que está além de outros valores e assim o teatro na escola vai acontecendo por
ser algo que está além de simples projetos educacionais. É a expressão, o conhecimento
de si, do outro, o encontro coletivo, a convivência e a experimentação.

Jogar, torna-se portanto, necessário. Segundo Larrosa a experiência é o que nos passa, o
que nos acontece, o que nos toca e uma vez que passamos por ela, faz sentido querer
outra vez, desde que, passemos por algo diferente. A experiência do jogo, irá possibilitar
um novo encontro com uma nova experiência. Mas é necessário também que se pare,
reflita, pense.

A experiência, a possibilidade de que algo nos aconteça ou nos toque, requer um


gesto de interrupção,um gesto que é quase impossível nos tempos que correm:
requer parar para pensar, parar para olhar,parar para escutar, pensar mais
devagar, olhar mais devagar, e escutar mais devagar; parar para sentir, sentir
mais devagar, demorar-se nos detalhes, suspender a opinião, suspender o juízo,
suspender a vontade,suspender o automatismo da ação, cultivar a atenção e a
delicadeza, abrir os olhos e os ouvidos, falar sobre o que nos acontece, aprender a
lentidão, escutar aos outros, cultivar a arte do encontro, calar muito, ter
paciência e dar-se tempo e espaço.

O relato sobre o processo de montagem do espetáculo “Peça de Horror”, é portanto, uma


materialização do processo experimental do Grupo de Teatro Jovem Estrelas de David, sua
participação no Festival com o foco na dramaturgia para jovens, e sua constante vontade
de olhar, de escuta, de sentir, de fazer e refletir.

Um processo de Pedagogia do Teatro.


BIBLIOGRAFIA

COURTNEY, Richard. Jogo, Teatro&Pensamento- As bases intelectuais do Teatro na


Educação. SP: Ed. Perspectiva, 1980.

KOUDELA, Ingrid Dormien. Texto e Jogo. Uma didática Brechtiana. SP: FAPESP\
Perspectiva, 1999

.............................................. Brecht: Um jogo de aprendizagem. SP\EDUSP\


Perspectiva, 1991.

..............................................Jogos Teatrais.SP: Perspectiva, 1984.

.............................................Nós ainda brincamos como vocês brincavam& - O


processo de encenação.SP:Uniso,2006.

SPOLIN Viola. O jogo Teatral no livro do diretor; tradução Ingrid Dormien Koudela e
Eduardo Amos- SP: Ed. Perspectiva, 2008.

..........................................Improvisação para o Teatro.tradução Ingrid Dormien


Koudela e Eduardo Amos- SP:Ed. Perspectiva, 1978.

.........................................Jogos Teatrais na sala de aula: Um manual para o


professor.tradução Ingrid Dormien Koudela- SP:Perspectiva,2008.

BONDÍA, Jorge Larrosa. Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Tradução


João Wanderley Geraldi- Unicamp- Depto de Linguística-SP: 2002

SARRAZAC, Jean-Pierre (Org.). Lexique Du drame modern ET contemporain. Beval: Circé,


2005. Pgs. 40-43. Traduzido livremente por Samir Signeu.
Postado por Lindy Barbosa às 18:33 Nenhum comentário:

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Inovação!
Olá Pessoas queridas, em breve, este blog será reavivado e reativado!!!

Postado por Lindy Barbosa às 12:04 Nenhum comentário:

sábado, 24 de janeiro de 2009

Brecht e Boal!!!
1. Título

“Caleidoscópio cênico – Brecht e Boal : uma possibilidade de encontro por um teatro social

2. Resumo

Através da técnica de “Análise Matricial”, pesquisar as metodologias do “Teatro do


Oprimido”

de Augusto Boal e “Teatro Épico” de Bertold Brecht, buscando as semelhanças entre os

procedimentos/ elementos utilizados por cada autor, a partir da matriz “social”.

3. Introdução

No livro “Jogos para atores e não atores” o teórico Augusto Boal diz “o nosso desejo é o de

melhor conhecer o mundo que habitamos, para melhor transformá-lo da melhor maneira. O
Teatro
é uma forma de conhecimento e deve ser também um meio de transformar a sociedade”.

Esta é a citação de um artista convicto de sua crença, que não teve medo de percorrer pelo
exílio,

Buscando os discípulos de sua mesma fé. Estes por sua vez, perceberam que fé é antes de
tudo

raciocínio, trabalho, reflexão, compaixão, pela experiência vivencial de ser eu e respeitar o


outro,

mas questionar esse outro diante de sua condição como ser social.

O trabalho de Boal expandiu-se, assim como ele procura, através de sua metodologia,
expandir

as mentes de seus espect atores e espect atrizes que aderem a proposta de trabalho do seu

teatro.

Em décadas anteriores ao trabalho de Boal, e em outro território que não a América- latina ,

Existiu uma época. A época Brecht. Tumultuada por rebeldia e protesto. Refletem-se em suas

Obras os problemas fundamentais do mundo atual: a luta pela emancipação social da

humanidade.

O teatro épico e didático caracteriza-se em Brecht pelo cunho narrativo e descritivo

cujo tema é apresentar os acontecimentos sociais ao mesmo tempo como ciência e como arte.

A alienação do homem para Brecht não se manifesta como produto da intuição artística.
Brecht

ocupa-se dela de maneira consciente e proposital. Mas não basta compreendê-la e focaliza-
la. O
essencial não é a alienação em si, mas o esforço histórico para a desalienação do homem,

podemos então dizer que as técnicas utilizadas pelo Teatro do Oprimido, que incluem o
teatro

fórum, é um desses esforços do qual Brecht compreende.

O papel do autor dramático não se reduz a reproduzir em sua obra, a sociedade de seu
tempo. O

principal objetivo, quer pelo conteúdo, quer pela forma, é exercer uma função
transformadora, que

atue revolucionariamente sobre o ambiente social.

Brecht diz: “Não nos podemos esquecer que somos filhos de uma era científica. A ciência e a
arte

têm em comum o fato de que ambas existem para simplificar a vida do homem: uma
ocupada

com a subsistência material e a outra em proporcionar uma agradável diversão. Tal como

transformação da natureza, a transformação da sociedade é um ato de libertação.

Cabe ao Teatro de uma época científica transmitir o júbilo desta libertação.

O que Boal propõe em seu teatro, é justamente essa oportunidade de expressão, que leva a

reflexão e que resulta a esta libertação.

Dentro do meu trabalho como Professora de Teatro e orientadora de grupos, faço-me valer
desta

metodologia, que enriqueceu o meu trabalho e daqueles que o vivenciaram, pois como o
próprio
Boal cita: “O teatro é isso: a arte de nos vermos a nós mesmos, a arte de nos vermos vendo!”

4. Justificativa

Quando decidimos por uma carreira acadêmica, demoramos por vezes a encontrar o nosso
real

objeto de pesquisa. Como Atriz e Arte-educadora, vivi o conflito de me encontrar lado a lado
com

esse objeto, mas não conseguir enxergar as partes, pois sempre via o todo, sem
fragmentações.

O título desse projeto, não é ao acaso, pois foi necessário quebrar esse objeto e lançar-lhe em
um

caleidoscópio, para então, fragmento, do fragmento do fragmento, pudesse realmente ver a

dimensão e delimitação do problema.

O caleidoscópio também representa a diversidade encontrada em meu trabalho. As


possibilidades

de se fazer teatro, e a compreensão de sua linguagem poderosa, que traz um primeiro facho
de

luz a quem se predispõe a uma reflexão, e através desta se propõe a uma transformação.

A necessidade desta pesquisa, visa, depois de retalhado o processo, e analisado


cuidadosamente

suas partes, provocar uma junção bem compactada destas experiências, que poderá servir de

apoio a muitos outros que como eu, são multiplicadores. Conscientes e dedicados no
processo de

trabalho que escolheram realizar.


A pesquisa se origina a partir deste príncipio.

E considero, de alguma forma esse processo, Sagrado

7. Bibliografia

- Boal, Augusto,( 1931 ) Jogos para atores e não atores, - 4.a edição revisada e ampliada –
Rio de

Janeiro: Ed. Civilização brasileira, 2001.

- Boal, Augusto, (1931) Teatro do Oprimido e outras poéticas políticas, Rio de Janeiro,

Civilização Brasileira, 1988.

-Boal, Augusto, (1931) O arco-íris do desejo, Rio de Janeiro, Civilização brasileira, 1996.

- Vasconcellos, Luiz Paulo da Silva, Dicionário de Teatro/ Luiz Paulo da Silva


Vasconcellos-

Porto Alegre: L&PM, 2001 232p.::il:21cm.

- Spolin, Viola, Improvisação para o teatro, Ed. Perspectiva, 4ed, SP, 2001

- Koudela, Ingrid Dormien, Jogos Teatrais, Ed. Perspectiva, SP, 1972

- Peixoto, Fernando, O que é Teatro, Nova Cultural – Brasiliense, SP, 1986

- Coelho, Raquel, Teatro – No caminho das artes, Formato editorial, BH ( MG), 1999.

- Saiani, Cláudio, Jung e a educação: uma análise do professor aluno- 3 ed. – Escrituras

editora, SP, 2003.


- Arruda, Solange, Arte do Movimento( As descobertas de Rudolf Laban na dança e na
ação

humana ). Ed. PW gráficos e associados, SP, 1988.

- Silva, Armando Sérgio da, (0rg.), Diálogos sobre teatro ( J. Guinsburg ), 2ed. Revisada e

ampliada – SP – Ed. Da USP, 2002, pp277 ã 286, Rubens José Souza Brito e J. Guinsburg.

Postado por Lindy Barbosa às 15:31 Nenhum comentário:

A artista que cala!


Camille Claudel - A artista que Cala!!!

Introdução

Segundo a médica psiquiatra Nilse da Silveira, o processo de loucura se instala , quando o


indivíduo não consegue lidar com os conteúdos internos acumulados, havendo uma quebra
“psíquica” iniciando assim o distúrbio.

No caso de Camille nos perguntamos como uma jovem vivaz, com enorme capacidade
criativa, cultura elevada, inteligente, perspicaz, uma artista de renome que marcou sua
época, pode ser internada e mantida até a morte trinta anos mais tarde ?

Camille foi uma mulher que decidiu quebrar os laços com sua classe social, com a moral e
com normas de conduta não aceitas em sua época.

Não sabemos porque, uma certa “intelectualidade” sente prazer irresistível pela tragédia
moral e exalta, como ponto de virtude o sofrimento da artista. Ao que compreendo quanto
mais estilhaços melhor, quanto mais dolorido, mais doce, quando o que deveria importar
num momento em que se faz revisão de sua obra, seria destacar o seu alto valor estético,
sua ruptura com uma manifestação escultural adormecida e que já era, depois de um
certo tempo construção oficial das formas em Rodin. Isto sim deveria ser exaltado , não
sua desgraça. É claro, que não podemos negar o gênio a Rodin, mas devemos questionar o
quanto de preconceito e de sua postura como inverso de mestre prejudicaram um talento
manifesto, que não era apenas florescente, mas exigia ar e aparecimento, como qualquer
artista, e que poderia ser mais do que ele, e isso lhe era insuportável.

Era pouco conhecida do público. O reconhecimento de seu talento ficava restrito a outros
artistas e intelectuais, mas mesmo entre eles o seu comportamento incomum, era tido
como desvarios. Sua família era rica, mas a adolescente apaixonada por esculturas não se
deixava ficar na condição de mulher passiva e obediente, à espera de um marido bem
aquinhoado e cordato. Desde menina fugia para extrair barro para as suas esculturas, a
mãe se opunha a sua ambição, assim como a sociedade francesa preconceituosa e
machista, também colocava muros à sua frente. Ela tentou passar por todos eles, mas
talvez tenha sido demais a sua condição: Mulher, Artista, Amante, Não reconhecida, Sem
apoio, Sem amigos. O fracasso o álcool, o descrédito total somado à todas as outras
decepções, fizeram-na indignar-se à tal ponto, que em dado momento, destrói as peças
que havia criado

Camille

Ave para recolher os dons de Fênix

Estrela que encontrou de vez na sombra e no oceano

E que esteve entre o Sol e a poeira, na maciez do barro enfim ressuscitado.

Ela esteve no mar, depois , na praia descoberta, e no final do túnel – vão da escada

Amor derrota bem próximo à janela

Seu corpo exaltava exílio e ostras

O coração pulsava como um incêndio, mas as mãos tocando chama e desespero

Inigualável Horror

O corpo tombava como touro tomba

Tomba na Arena, só. Prostrado.


A voz – A mesma que calou ao pronunciar Rodin

Jamais conteve o astro.

( Anônimo )

Infância e Adolescência ( 1864 – 1882 )

Camille nasceu dia 08 de dezembro de 1864 em Villeneuve-sur-Fére , região de Ardennes,


nos arredores de Paris. Família burguesa, o pai Louis Prosper Claudel era funcionário do
imposto, a mãe Louise Cervaux, mulher simples e sem vivacidade. O casal teve quatro
filhos, sendo que o primeiro morreu com 15 dias, seguindo- se Camille, Louise e Paul.
Camille que nasceu um ano depois do irmão morto seria a rejeitada materna e protegida
do Pai. Louise seria a protegida materna e Paul o incompreendido por ambos. O ambiente
familiar opressor e entremeado por brigas constantes. Paul e Camille imbuíram-se da idéia
de perecerem a um grupo privilegiado, em parte devido a influencia do Pai que tinha
ideais artísticos e literários e sentia-se frustado por não realiza-los, projetando assim suas
aspirações nos dois filhos, principalmente em Camille com quem se manteve forte e
intempestivamente ligado.

Aos doze anos já lia com avidez Goethe, Shakespeare e Victor Hugo, estimulando também
o irmão. Mais tarde ambos freqüentariam as reuniões na casa do poeta Mallarmé.

Destacava-se pela beleza, intensos olhos azuis, corpo sensual e harmonioso e presença
atraente e marcante, um ligeiro defeito numa perna faria mancar de leve, o que não
impedia as andanças e passeios com o irmão.

Começou a esculpir cedo. Observação aliada a imaginação, uma insaciável curiosidade,


seriam características que carregaria até a maturidade.

Em 1881 o pai é nomeado para outra cidade decidindo instalar-se em Paris. Camille tinha
então dezessete anos, e imenso desejo de aperfeiçoar-se freqüentando então a Academia
Colarossi e alugando seu primeiro ateliê com outras três colegas inglesas, uma delas Jessie
, seria uma das poucas que a visitaria no Asilo posteriormente. Desta época duas
esculturas já prenunciavam a obra da maturidade: Paul Claudel com treze anos e Retrato
da Velha.
Auguste Rodin

Aos quarenta anos, estava em plena efervescência. Observador minucioso, procurando


sempre o movimento, destacava-se pela maneira anticonvencional de esculpir, sendo por
isso criticado pelo Academicistas. Modelava pequenas superfícies luminosas, breves
pinceladas de sombra e reflexo que fazem ressaltar o corpo e o irradiam.

Apoiado por escritores e críticos de vanguarda, fez grande sucesso entre os pintores
impressionistas em 1880, apesar de permanecer sempre independente.

A grande Paixão ( 1883- 1893 )

Quando dança a menina se banha em luz...

O corpo fala mais alto do que o espírito,

Mas é o espírito o tema do seu falar.

Rodin.

O ateliê de Rodin fervilhava de trabalho. Havia encomendas e Rodin necessitava de alunos


e escultores práticos, ajudantes e modelos. Foi nessa época que Camille começou a
freqüentar o seu ateliê e a trabalhar com Rodin, sendo a única mulher que logo passou a
colaboradora, por sua estupenda criatividade, fazendo também o papel de modelo. Rodin
fascinava-se com sua beleza ,inteligência e personalidade. Rodin ocupava-se em acabar Os
burgueses de Calais e em executar As portas do inferno e deixava que ela modelasse pés e
mãos de obras importantes.

A mútua colaboração acabou se aprofundando em um relacionamento afetivo que duraria


aproximadamente quinze anos.

A obra de ambos floresceu. Camille estimulava Rodin, levava-o para os salões onde
freqüentavam os intelectuais, discutiam projetos. Este abriu-se ao lirismo e a
sensualidade, não cansando de desenha-la. Ele via em Camille uma inteligência aguda e
pouco convencional, que eram grande fonte de inspiração. Surgindo assim as Obras: Eva, O
beijo, A eterna primavera, O eterno ídolo, As Sereias, A Danaide ( Onde Camille foi a
Modelo ) Fugit Amor, Paolo e Francesca, O Pensamento, A Aurora, São Jorge.

Camille afirmava e fixava seu estilo, onde aprende muito de técnica com o mestre, porém
sem perder sua personalidade. Concluiu obras como, Paul Claudel aos 16 anos, Busto de
Rodin, Giganti, Torso de mulher, e o busto da irmã Louise em bronze.

O diálogo amoroso estava presente nas obras, trabalhavam juntos, apaixonadamente. A


obra Sakuntala foi considerado por alguns o mesmo tema de O Beijo. Rodin esculpiu O
eterno ídolo, semelhante ao casal de Sakuntala.

Em 1888, Camille sai da casa dos pais e vai para o novo ateliê que Rodin escolhera para
ficarem juntos, amantes públicos. Entre os anos de 1887 à 1890, a fama de Rodin se
afirma, assim como sua relação no meio intelectual de livres pensadores.

Em 1893, Camille rompe com Rodin, devido a um provável aborto, onde a perturbação,
insegurança e solidão se tornam transparentes. Passa então a viver no Boulevard Italie,
afastando-se de Rodin, mas não em rompimento definitivo, começa então as pressões, as
crises nervosas, sentia-se usada como mulher e como artista. O significado da ruptura é
simbolizado nas esculturas. Em Rodin com A Convalescente, O adeus, A aurora, Orfeu e
Orfeu e Eurídice. Em Camille com A pequena castelã, A valsa e O clotho.

O Isolamento ( 1893 – 1905 )

Sim, quero ir direto e calmo na vida

Em direção ao objetivo onde a sorte dirigirá meus passos

Sem violência, sem remorsos e sem inveja:

Serás o dever feliz aos alegres combates.

Verlaine

Com trinta e quatro anos, cortou de vez o vínculo com Rodin e passou a viver
solitariamente, sem freqüentar as pessoas. Seriam anos totalmente dedicados à sua obra.
Em 1894, apresentou um estudo em gesso de O Deus que voou, e uma variante , A
Implorante, parte do grupo, A Idade Madura, terminado posteriormente. Essa escultura
pode ser interpretada como uma alegoria da separação, mostrando o abandono.

Quando expôs o bronze, ele foi elogiado, mas também criticado pela crueza com que
retratava a decadência e o sofrimento. Conseguiria uma encomenda depois retirada e
ressentiu-se pois Rodin nada fez para intervir ao seu favor.

Em 1895, expôs o gesso As Faladeiras, que depois seria feito em Ônix. Obra muito
elogiada, considerada nitidamente distinta das obras de Rodin pelo estilo e pelo tema,
pois se baseava em fatos da vida cotidiana e sua simplicidade.

Sua capacidade de realização estava em franca evolução; criava cada vez mais um estilo
próprio, inspirando-se em seus sentimentos, sua história, relatos míticos e observação do
cotidiano, da rua, das pessoas ao seu redor. Valorizava sutilezas, nuances, evitando o nu
exposto rodiniano, realçando drapeados, ondas de harmonia.

Nesse anos seu caráter arisco acentuou-se; sem nunca ter sido muito sociável, fugia do
contato social. O que também prejudicava-a profissionalmente.

O aspecto material, era infelizmente, de miséria quase total. Em suas correspondências,


os apelos de socorro financeiros são constantes, mas quando pede algo é sempre ligado à
alguma produção.

Em 1898, apareceu o artigo de M. Mohardt, “Mlle. Camille Claudel”, no Mercure de


France; foi o primeiro estudo importante sobre sua vida e sua obra. Sendo um admirador,
sustentou-a publicamente, preocupou-se com ela e interessou-se em ver sua obra
devidamente reconhecida. Junto com a mulher, ajudou-a em momentos difíceis, como em
doenças, mas ela acabou rompendo com eles por serem amigos de Rodin.

Em 1899, expôs o mármore de Clotho, O Profundo pensamento , Hamadryade e a Maquete


de Perseu. A escultura em mármore já existia em gesso e foi a confirmação de uma
ruptura. A fundação presidida por Rodin iria encaminhar a peça para o Museu de
Luxemburgo, mas ele não parecia se empenhar muito, apesar dos apelos insistentes de
Morhardt. O Museu nunca recebeu a escultura, que acabou se extraviando; Camille,
acabou acusando Rodin de ter-lhe roubado Clotho.
A partir de 1900, Rodin expande plenamente a sua fama, após a Exposição Universal, onde
ele teve um pavilhão inteiro. Camille por ter duas obras recusadas, retirou as demais,
mesmo se debatendo em dificuldades financeiras. Este fato trouxe-lhe mais
ressentimentos em relação ao escultor e sua mundanidade, com relações nas rodas de
política e sociais da moda.

Mesmo assim, em 1902, expõe Perseu e Medusa em mármore e em 1905 A Tocadora de


Flauta, A Aurora e A fortuna.

Atingiu uma obra plena e madura, afastando-se do estilo de Rodin, com tendências mais
clássicas, talvez prestes a uma maior aceitação pública, se não tivesse interrompido a sua
carreira. Apesar das dificuldades, e de pouco reconhecimento, sua reputação havia
crescido. Apresentou obras a quase cada ano, realizando obras importantes, poucas para
vinte anos de produção, mais heróicas por outro lado.

Aos quarenta anos sua aparência era de cinquenta. Os efeitos do álcool, de mágoas,
ressentimentos, aliados ao mau trato de si mesma e sua vida miserável, eram reflexos, de
uma artista incompreendida, que resolveu calar.

A Queda ( 1905 – 1913 )

Por instantes eu sou pobre navio

Que corre sem mastro no meio da tempestade,

E não vendo Notre Dame brilhar

Para abismo se prepara rezando

Verlaine.

A idéia delirante do roubo de sua obra por Rodin, colocava Camille no seguinte dilema:
Que boa parte de sua genialidade fora retida por ele.
É difícil avaliar o grau de responsabilidade de Rodin. Se existiu uma dose de egoísmo e de
uso, ampliada destrutivamente pelo ambiente e pelos conflitos interiores, aguçados com a
estimulação inconsciente da criatividade.

Muitas esculturas de Rodin, produzidas após 1893, traziam temas que repetiam aqueles em
que Camille tinha trabalhado. Ao ver nas exposições, e com colecionadores, estas obras
modificadas, um sentimento compreensível de revolta devia apoderar-se dela.

Em uma carta destinada a Paul em 1909, ela traça um paralelo, do quanto ganham os
fundidores, os moldadores e os marchands, a cada vez que ela coloca uma obra em
circulação, e que para ela é sempre 0+0 = 0. A carta já mostra traços de sua obssessão de
que todos ganhavam com ela, especialmente Rodin. Não é difícil perceber os sentimentos
da mulher rejeitada condensando essas idéias.

Em 1902, chegara a recusar um convite para Praga porque não queria ver sua obra exposta
perto da de Rodin, orgulho ao qual Camille não deveria ter.

Aos quarenta e um anos, oito antes de sua internação, suas inquietações e angústias
transformaram-se em idéias fixas, instalando-se a psicose.

A dificuldade de vencer esses pensamentos de perseguição era reforçada pela atitude de


raiva e rejeição que provinha da mãe e da irmã. No projeto de escultura A falta, mostra o
sentimento de culpa e o estado de pecado no qual se via jogada. A irmã permanecia
indiferente ao seu sofrimento, dando vazão a rivalidade e inveja por sua fama e a atenção
do Pai. O irmão a quem sentia-se ligada, também se ausentou.

Nos anos que antecederam sua internação, Camille rodeava-se de pessoas desconhecidas,
que, passavam as noites no ateliê bebendo, nessas ocasiões, vestia-se com roupas
extravagantes, enfeitando os cabelos com fitas de cores berrantes. Esses excessos
contrastavam com momentos de terror, onde sentia medo e perturbada dizia que os
modelos de Rodin, forçavam as venezianas para entrar e matá-la.

Até a morte alienada ( 1913 – 1943 )

Eu não creio em Deus, abjuro e renego


Todo pensamento, e quanto à velha ironia,

O amor, gostaria que não falassem mais.

Cansada de viver, tendo medo de morrer, igual

Ao brigue perdido joguete do fluxo e do refluxo,

Minha alma para horríveis naufrágios se aparelha.

Verlaine

Após a morte do pai, a pedido do irmão que arrumou uma certidão médica, foi pega à
força por dois enfermeiros que arrombaram seus aposentos, onde no meio da sujeira,
haviam gessos ressecados e na parede recorte das quatorze cenas da Via Sacra. Era o
momento da concretização das idéias de perseguição.

Um ano depois foi transferida para Montdevergues, um lugar infame, onde as pessoas eram
despejadas, esperando a morte.

Desde a internação, insistia em fazer apelos comoventes para ser liberada, todos sem
sucesso.

Continuou acreditando que todos tinham um complô contra ela. Fortunas se acumulavam
com suas obras sendo que nada para ela, por isso, mandaram prende-la, para que não
fosse uma ameaça.

Diagnóstico

O quadro clínico de C.C. foi corretamente diagnosticado como psicose paranóide, que é
caracterizada pelo delírio dito sistematizado, pois se desenvolve na ordem e na clareza. O
paciente manifesta uma convicção dogmática que se constrói logicamente a partir de
elementos falsos ou ilusórios, se conduz e pensa em função de sua concepção delirante,
em vez de seguir a realidade comum.
A Psicose paranóide era considerada sem cura até a década de 1960, quando estudos sobre
efeitos de medicação específica cresceram consideravelmente. O que dificulta a cura,
tornando-a quase impossível é o tipo de paciente: desconfiados, sem estabelacer vínculo
com o terapeuta, séria alteração do seu sistema psíquico. Mas há casos de cura
surpreendentes.

Infelizmente C.C. viveu em uma época com poucos recursos por parte da Medicina e da
Farmacologia. O sinistro de seu quadro é que o doente mental era visto como vergonhoso
e portador de uma doença imoral, por atingir a psique. As famílias queriam ver-se livres
deles e não se interessavam em tratá-los, ou talvez acreditassem que não fosse possível.

Nos anos que passou no Asilo, C.C. não produziu nada. Várias foram as tentativas de
entregar-lhe argila para que pudesse esculpir, todas sem sucesso.

C.C. manteve-se sempre distante. Não criou vínculos, mas manteve-se informada e sua
cultura não se perdeu. Sabia o que estava acontecendo no mundo. Sentia-se feliz quando
recebia visitas de seus sobrinhos e em suas cartas a pergunta sempre era “quando você
vem me visitar”?...... Seja para quem escrevesse.

Conclusão

O que a conteceria se C.C. tivesse casado com Rodin, o filho tivesse nascido, juntos
tivessem construído uma carreira?

E se mesmo com a separação Rodin tivesse facilitado as coisas para C.C.?

Teria C.C. vencido a barreira da sua relação mal resolvida com a mãe e a irmã?

Teria vencido a culpa por trair os princípios que seu Pai acreditava e que seu irmão
também?

São apenas pensamentos, pois uma história não é feita de “Se”, mas da evidências dos
fatos tais como são, e C.C. não é apenas uma vítima de toda uma época, e sim vítima de
seus próprios preceitos, tais como o orgulho e a descrença.
A loucura existe, sim, mas é o resultado de toda uma série de desequilíbrios, ao qual sua
cultura e inteligência não foram capazes de detectar, pois estava presa as suas raízes, que
são os Claudel, e estes eram diferentes dos demais.

Talvez, se o Artista pudesse descer um patamar, que o liga diretamente com a


humanidade nua e crua, não vivenciaria melindres e chistes, que acabam por perturbar
sua própria criação. Pois é fato que o canal criativo está além de outras faculdades que
nossa mente possa desenvolver, e que este mesmo poder de criação e sua manifestação,
têm efeito contrário, se não associarmos à todas as outras.

Poderia C.C. ter uma história diferente? Sim, poderia. Se encontrasse dentro de suas
próprias obras um motivo para viver bem com elas. Não pelo trabalho obssessivo, em
busca de títulos, ou para provar que se é melhor, pois tudo é uma consequência.

Ao analisar sua biografia, penso se realmente existia amor em seu trabalho. Diria que até
um determinado período sim, porém fica evidente sua ânsia de ser melhor, de se destacar
mais, e a obssessividade criativa, que com certeza levaram-na a frustação, perdendo o fio
e entregando-se totalmente aos desvios e perturbações, que levam muitos artistas a
criarem, no seu caso ela conseguiu destruir.

É sem dúvida, uma grande artista. Difícil não se apaixonar por sua história. Difícil não
imaginar o quanto ela e Rodin embelezariam o mundo juntos, pois mesmo separados,

Sentimos a beleza e o amor ( não esculpido ) que ambos sentiam um pelo outro.

Bibliografia

Wahba, Lilian Liliano; Camille Claudel- Criação e Loucura; Ed. Rosa dos Tempos.

In: www.psiconeam.hpg.ig.com.br/2002/09

www.google.com.br/2002/09
Disciplina: Tópicos especiais em Artes Corporais – AT- 302

Profa. Dra. Elisabeth Bauch Zimmermman

Aluna: Lindinalva Barbosa de Souza

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