Madonnamania

A artista escolhe Copacabana para o maior show da sua carreira, um evento global
que deve superar um milhão de pessoas. O encerramento da turnê que celebra
seus 40 anos nos palcos mexe com a economia e o turismo do Rio: hotéis lotados,
dezenas de voos extras e esquema de segurança comparável ao Réveillon. A mais
bem-sucedida artista pop da história segue reinando entre as cantoras-celebridades,
gênero que ela inventou, junto a herdeiras como Taylor Swift, Lady Gaga e Beyoncé
INÊS 249
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ENTREVISTA
HELENO TORRES
Advogado tributarista

“O IVA BRASILEIRO
SERÁ UM DOS MAIS
MODERNOS DO MUNDO”
O jurista Heleno Taveira Torres, considerado um dos maiores advogados tributaristas do País, diz que a
regulamentação da Reforma Tributária que está sendo preparada pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda)
e será encaminhada à Câmara até o próximo dia 15 dotará o Brasil com uma das legislações tributárias mais
modernas e um Imposto sobre Valor Agregado (IVA) dos mais tecnológicos do mundo. Ele entende que o
IVA de muitos países, como os da Europa, envelheceram, e que o Brasil está se apropriando de experiências
de IVAs mais avançados, como os do Canadá, Austrália e Índia. Professor titular de Direito Financeiro do
Departamento de Direito Econômico, Financeiro e Tributário da Faculdade de Direito da Universidade de
São Paulo (USP), Torres acredita que a Reforma Tributária brasileira, que terá seu CBS (imposto do governo
federal que vai substituir o PIS e o Cofins) e o IBS (imposto dos estados e municípios que substituirá o ICMS
e o ISS) normatizados por Haddad nos próximos dias e que deverão ser aprovados pelo Congresso ainda
este ano, mudará por completo a cara do federalismo brasileiro, e isso será visto de forma muito acelerada.
“Veremos uma dinâmica de mudanças dentro da federação nunca vista nos últimos 50 anos”, com empresas
podendo se instalar de forma competitiva em estados do Norte e Nordeste, por exemplo, pois acabará a
política nefasta dos incentivos e a consequente guerra fiscal.

Por Germano Oliveira

EQUILÍBRIO
“O setor de serviços
vai sofrer mais, mas
as indústrias vão sair
ganhando”, diz
Heleno Torres

4 ISTOÉ 2826 10/4/2024


O presidente do STF, Luís Roberto
Barroso, disse que pode haver
judicialização caso a Reforma
Tributária exceda os 27%. Há se-
tores que serão penalizados com
uma carga acima desse teto? O sr.
acha que haverá a judicialização?
A opção de uma reforma constitucio-
nal que veio da Emenda Constitucio-
nal 132 traz o risco de uma elevada
judicialização. Pode ter um alto grau
de judicialização se houver um des-
casamento do teor constitucional e
as leis complementares que vão re-
há atraso da regulamentarção
gulamentar o texto. Haverá conflito
em alguns pontos. Já há, em diversos
aspectos, indícios de judicialização,
como no caso do Imposto Seletivo,
que trata da taxação de produtos que
fazem mal à saúde e ao meio ambien-
te. E aí já começamos pela própria
discussão a respeito do que afeta e o que não afeta a saúde
e o meio ambiente.
Pode citar um exemplo?
Vamos pensar nas bebidas alcoólicas. Haverá uma alíquota
única para a cerveja, que representa 90% do consumo dos
brasileiros de bebidas alcoólicas? Haverá alíquotas diferen-
ciadas conforme a graduação alcoólica, do tipo de fermen-
tação ou outras formas de fazer a bebida? Isso pode trazer
riscos de judicialização. E os alimentos ultraprocessados que,
na verdade, compõem a mesa daqueles que são os mais
pobres, como salsichas, macarrão instantâneo, tipo miojo,
etc.? Essas formas de tributação podem trazer riscos de
contenciosos dos produtores e dos consumidores na Justiça.
Os cálculos do IBS e CBS indicam uma alíquota de 27%, mas
existe a possibilidade de ela ser reduzida se houver a apli-
cação da alíquota de teste e se verificar que, pelo aumento
da base tributável e da quantidade de contribuintes alcan-
çados, além da redução dos incentivos fiscais, e também
combate à sonegação, pode haver a redução da alíquota.
Ou seja, podemos ter uma alíquota de 27% para alguns
setores e mais de 27% para outros, é isso?
Exato. Não é correta a afirmação de que haverá uma alíquota
única. A União tem o seu CBS — que é a Contribuição sobre
Bens e Serviços — para substituir PIS e Cofins e os estados e
municípios terão o IBS, Imposto sobre Bens e Serviços, para
substituir ISS e ICMS. Quem vai deliberar sobre a alíquota do
IBS, segundo os parâmetros das leis complementares, serão
estados e municípios na origem. Haverá um indicativo de
FOTOS: ANDRE LESSA; WILLIAM VOLCOV/BRAZIL PHOTO PRESS/AFP
INÊS 249
alíquota padrão, mas isso não quer
dizer que os estados e municípios
estejam obrigados a seguir exatamen-
te esse parâmetro.
Pode haver casos em que a alí-
quota será inferior aos 27%?
Teremos as situações de regimes
diferenciados que poderão ter alíquo-
“Lira reclamar faz parte tas reduzidas. Pode ser zero, como
há em alguns casos que já estão
do processo político. Não previstos como alíquota zero. Esse é
o caso da cesta básica e temos aque-
les que são regimes com valores re-
por parte de Haddad porque duzidos, como são os serviços finan-
ceiros. Quem vai sofrer mesmo com
os grupos de trabalho estão a Reforma Tributária será o setor de
funcionando muito bem” serviços, porque esse segmento tem
hoje uma alíquota muito reduzida,
de 2 % a 5% do ISS. Esse contribuin-
te, que está no regime cumulativo
pagando também o ISS reduzido, certamente sofrerá um
aumento de carga tributária expressivo e terá que repassar
esse custo para o consumidor. Será um capítulo a ser conhe-
cido só depois da apuração dessas alíquotas.
De qualquer forma, esse setor pode sair de um impos-
to de 5% para 27%, Não é um aumento muito grande?
O que vai pesar mesmo será esse salto de uma tributação
de 2% a 5% para 27% na somatória do IBS com o CBS. Mas
há setores, como o industrial, em que vai acontecer o con-
trário. Vai sair ganhando. Pagava 40%, 50% e a alíquota vai
cair para 27%. A Reforma Tributária é muito positiva porque
ela vai corrigir distorções da cadeia de produção e consumo.
Então, a aplicação desse regime da Reforma Tributária vai
permitir uma redução auspiciosa da carga de impostos e até
mesmo queda dos preços dos produtos.
O mais importante é que essa simplificação dos impos-
tos, com um IVA único, será um avanço que vai colocar
o país entre as economias mais modernas, certo?
A Reforma Tributária vai mudar por completo a cara do fede-
ralismo brasileiro e isso será visto de forma muito acelerada.
Veremos uma dinâmica de mudanças dentro da federação
nunca vista nos últimos 50 anos, com movimentos demográ-
ficos potenciais, porque haverá um deslocamento das empre-
sas não mais baseado no aproveitamento de benefícios fiscais
e sim na eficiência econômica. O empresário não vai colocar
uma fábrica num estado ou município só porque está rece-
bendo um incentivo fiscal. Isso pode trazer de novo uma
concentração de produção no Sul e Sudeste? É possível, >>
5
 INÊS 249
Entrevista/Heleno Torres
mas aí isso acontecerá em virtude das facilidades de trans- porque o IVA, em muitos países, envelheceu também. Na
porte, logística, da aceleração da capacidade de consumo. Europa, é um tributo envelhecido, e o Brasil está se apro-
Será muito difícil que tenhamos a concentração econômica priando de experiências em diversas situações e de IVAs
que tínhamos no passado. Também haverá redução das prá- muito avançados, como é o caso do Canadá. Está aprovei-
ticas danosas da guerra fiscal, de atração de investimentos de tando também as mudanças na Austrália e na Índia.
forma hostil unicamente baseada em incentivos.
Se não aprovarmos logo essas regulamentações, o Bra-
O sr. credita que o ministro Haddad encaminhará ao sil corre o risco de ter sua imagem arranhada no exterior,
Congresso a regulamentação da Reforma Tributária dificultando novos investimentos estrangeiros?
por lei complementar até 15 de abril? Com a aprovação da Reforma Tributária conclui-se um ciclo
Acho que sim. Deve mandar ao Congresso pelo menos uns político e isso será o grande recado para o mundo. Creio que
quatro projetos. Um projeto de lei complementar para a CBS, os investimentos e os planejamentos das empresas estran-
outro para o IBS, outro para o Imposto Seletivo e um quar- geiras, dos grandes fundos, todos terão elementos suficien-
to sobre o Comitê Gestor. tes para entender as mudanças que ocorrerão no Brasil nos
próximos cinco anos. O governo está certo em colocar toda
Podemos afirmar que a regulamentação acontecerá a sua energia nessa parte da Reforma Tributária e o Congres-
este ano ou ficará para o ano que vem? so também está certo de se comprometer em dar esse re-
Confio que, até o final de junho, o Congresso tenha condições torno, até porque é um ano em que terminam os mandatos
de votar e aprovar essas leis. dos presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco, e da Câmara,
Arthur Lira. Todos estão muito comprometidos com as suas
Então por que o presidente da Câmara, Arthur Lira, tem bases para entregar aquilo que prometeram deixar de lega-
dito que Haddad está retardando a reforma e reclamou do. Então, terão de aprovar a parte do consumo no primeiro
até com Lula? semestre e, no segundo, completar a parte da renda e do
Lira reclamar faz parte do processo político. A Câmara pre- imposto sobre folha de salários. Terá impacto na geração de
cisa ter protagonismo nesse debate. Não há atraso porque emprego e de renda.
os grupos de trabalho estão funcionando muito bem. Acho
que são legislações dificílimas. Não podemos imaginar essas Entende que o ministro Haddad vai conseguir o déficit
leis complementares sendo mera reprodução da Constituição. zero neste ano?
São técnicas jurídicas muito complexas. Quem está redigin- É uma tarefa muito difícil. A grande virtude do ministro Ha-
do precisa de tempo para fazer vários cenários de aplicação ddad nesse momento é ele perseguir esse déficit, que não foi
dessas regras. Estima-se que essa lei complementar tenha gerado por ele. Foi herdado e vem desde 2014. Desde aquele
200 páginas. São 19 grupos de traba- ano, déficits foram sendo gerados e o
lho com aproximadamente 10 ou15 compromisso do ministro Haddad em
pessoas em cada grupo e são pessoas pôr fim a esse ciclo tem que ser visto
muito qualificadas. Senti a falta de
representantes do setor privado nes-
“O déficit zero é uma tarefa como algo virtuoso. Ele tem que ser
aplaudido porque alguém tem que pôr
ses grupos de trabalho. Não abro mão muito difícil. A grande virtude fim a esse modelo que sempre foi
dessa minha posição. Continuo
achando que o governo errou ao não
de Haddad é perseguir a meta empregado nos últimos anos como
forma de gastar mais. É estranho que
integrar, nos grupos de trabalho, re- de zerar o déficit, que não os críticos acusem o governo de ser
presentações dos contribuintes. O gastador. Não apoiam o ministro nes-
que teria facilitado enormemente, por foi gerado por ele. Foi herdado se seu esforço de zerar o déficit. Acho
exemplo, a obtenção de dados de
setores específicos.
e vem desde 2014” que o arcabouço fiscal, que é uma
forma de teto fiscal na prática, é um
procedimento adequado e tem chan-
Isso atrapalhou a qualidade da ces de chegar a bom termo. Se não
nossa reforma? conseguirmos neste ano, que seja um
Apesar disso, teremos uma das legis- grande passo para que no ano que
lações mais modernas e um IVA vem, com esta Reforma Tributária, e
(Imposto sobre Valor Agregado) dos outras que estão por vir, cheguemos
mais mais tecnológicos do mundo, à melhoria das contas públicas.

6 ISTOÉ 2826 10/4/2024 FOTO: EVARISTO SÁ/AFP


APRESENTA
Por Priscila Aro • José Eduardo Dias Yunis — Fotos: Camila Gandolfi
José Eduardo Dias Yunis:
Trajetória e Visão sobre os Desafios
da Advocacia Trabalhista e Empresarial
C
om mais de três décadas de
experiência como advogado
e consultor empresarial, José
Eduardo Dias Yunis é uma figura de
destaque no cenário jurídico e corpo-
rativo. Sua trajetória inclui uma vasta
atuação em consultoria preventiva e
atuação litigiosa, ajudando empresas
a navegar pelo complexo ambiente
regulatório e a prevenir litígios traba-
lhistas.
Na recente entrevista concedida por
Yunis, ele abordou uma variedade de
tópicos relevantes para as empresas
modernas. Uma das principais discus-
sões foi sobre a importância da con-
sultoria preventiva em um contexto
de crescente normatização e transfor-
mação tecnológica. Yunis enfatizou a
necessidade de as empresas estarem
preparadas para os desafios trazidos
pela Revolução Digital e pela inteli-
gência artificial, destacando a escassez
iminente de mão de obra qualificada e
INÊS 249
que garantam a justiça e o bem-estar
de todos os indivíduos.
Ao final da entrevista, Yunis também
enfatizou que as recentes decisões do
STF sobre os temas afetos à terceiriza-
ção e a “pejotização” da mão de obra,
tem causado significativo impacto nas
relações de trabalho, alterando subs-
tancialmente a compreensão e a aná-
lise jurídica do tema, maximizando
o princípio da autonomia da vontade
dos contratantes, em detrimento da
proteção estatal da relação de empre-
go. A compreensão do STF sobre as
novas modalidades de trabalho aca-
bam por impactar diretamente as de-
cisões da Justiça do Trabalho.
Com sua vasta expertise e sua visão
abrangente, Yunis continua sendo
uma referência no campo da advoca-
cia empresarial, fornecendo orienta-
ção valiosa para empresas que buscam
se adaptar às mudanças do mundo
moderno e enfrentar os desafios do
mercado com sucesso. . ■
Saiba mais:
Site: http://www.yunis.adv.br
os riscos de exclusão social.
Destacou que a evolução do trabalho
via plataformas digitais foi muito de-
batido à época em que ele era membro
do Conselho Superior das Relações
de Trabalho da Fiesp (CORT), onde
atuou de 2017 a 2021.
Além disso, Yunis ressaltou os be-
nefícios da consultoria preventiva na
gestão de riscos e na prevenção de
conflitos trabalhistas. Ele explicou
como uma análise minuciosa das nor-
mas e procedimentos pode ajudar as
empresas a evitar litígios e a minimi-
zar passivos econômicos.
Em uma complementação impor-
tante, Yunis compartilhou sua preo-
cupação com o futuro da sociedade
diante das transformações tecnológi-
cas e econômicas. Ele alertou para a
necessidade de um debate mais amplo
sobre as consequências da automação
e da inteligência artificial, enfatizando
que a sociedade deve buscar soluções

Editorial
AS GINÁSTICAS FISCAIS DE UM
GOVERNO EM CRISE DE CAIXA
J
á lá se vai mais de um ano desde que o governo Lula
tomou posse e assumiu uma dívida pública monstro que
o País inteiro achava, desde sempre, difícil de pagar – e,
confirmando as expectativas, realmente as coisas não andam
nada bem nessa seara. Veio de bem antes o compromisso,
com as pedaladas financeiras indecentes do antecessor Bol-
sonaro para tentar se reeleger comprando apoios, deixando
de legado um rombo incomensurável nas contas, valor que
alguns chegaram a estimar em cerca de R$ 180 bilhões e que
outros falavam, em rodas fechadas de conversa, em número
que poderia ser o dobro disso. De uma maneira ou de outra,
é dinheirama a perder de vista. E a fatura chegou. O déficit
primário está batendo recorde sobre recorde. Em fevereiro
último, com a antecipação de precatórios, foi registrado um
saldo negativo de R$ 58,4 bi-
lhões, o pior em toda a série
histórica para esse mês. A infor-
mação é do Tesouro Nacional e
não restam dúvidas, pelo andar
da carruagem, de que nada de
melhor deve despontar no ho-
rizonte no curto prazo. A alta da
dívida pública brasileira vai aos
poucos criando uma espécie de
“teto” para o PIB, condenando
o Brasil a crescimentos medío-
cres e doses cavalares de juros
elevados e inflação. Definitiva-
mente, o déficit é um obstáculo
sério ao desenvolvimento. Sem um Estado sadio, falta fôlego
financeiro na praça, as fontes de crédito ficam escassas e todo
plano de investimentos indutores vai por água abaixo. O
Banco Central anda preocupado com o repique inflacionário
em meio a essa tendência de contas federais desvalidas. Nos
seus relatórios registra a ameaça do peso da dívida pública
como preponderante para o pessimismo que toma conta do
mercado. Projeções do Tesouro indicam a rarefação de recur-
sos no médio prazo. Na prática, não haverá como a atual
administração honrar com os compromissos previstos até o
final do quadriênio 2023-2026, caso as despesas avancem de
forma continuada no ritmo até aqui verificado. A defesa geral
de especialistas está centrada na ideia que um programa
amplo de controle das despesas virou prioridade inadiável.
Isso se confronta com caminhos trilhados pela gestão Lula,
8 ISTOÉ 2826 10/4/2024
INÊS 249
Carlos José Marques, diretor editorial
que prevê novos e generosos desembolsos, além de renúncias
fiscais importantes, que pesam contra a arrecadação. A pró-
pria negociação para o perdão de dívidas de entes federativos,
como uma espécie de socorro a governadores, que são assim
premiados por sua má gestão, depõe contra qualquer princí-
pio de disciplina e responsabilidade no campo tributário. Os
estados da federação já possuem juros favorecidos e estão
agora prestes a ter seus empenhos revistos para baixo, numa
benevolência fora de hora e indevida. Na mesma linha, o
governo está autorizando uma renegociação de dívidas de
produtores rurais que vencem este ano. Vem no balaio uma
proposta para alongamento das incumbências, o que pode
espetar um estouro da ordem de R$ 3,2 bilhões nos cofres da
União. A administração federal vai se comportando como um
perdulário irremediável, deve-
dor contumaz, que não pensa
no dia de amanhã. O jogo do
superávit não se resolve em um
passe de mágica. O ministro da
Fazenda, Fernando Haddad,
vinha defendendo avidamente
a conquista de um déficit zero,
que parece cada dia mais dis-
tante. Hoje já fala que um défi-
cit da ordem de 0,5% para 2025
depende do Congresso. Alega
que serão necessárias aprova-
ções de alguns projetos de lei,
encaminhados à Casa, para fe-
char a equação. Efetivamente, o que faz é empurrar a respon-
sabilidade para os parlamentares. Alega que o Brasil não pode
depender só do Executivo para realizar a tarefa. Claro que
alguma austeridade orçamentária vinda da União seria mui-
to bem recebida. Estímulos fiscais, por exemplo, nem sempre
ajudam no crescimento econômico e podem, ao contrário,
comprometer o processo na medida em que expandem
gastos e colocam, perigosamente, em xeque o fôlego finan-
ceiro para outras empreitadas. No momento, o governo está
necessitando de um esforço adicional de 1% do PIB para
poder alcançar e cumprir a meta almejada para 2025. Em
outras palavras: ele precisa saber de onde tirar outros R$ 123,9
bilhões extras, visando a entregar o que prometeu para o ano
que vem. Não é pouca coisa e o valor pode subir ainda mais,
caso nada seja feito.
FOTO: TON MOLINA/NURPHOTO/AFP
 INÊS 249

Sumário
Nº 2826 – 10 de abril de 2024
ISTOE.COM.BR

20
BRASIL STF decide que o artigo 142 da Constituição
não coloca as Forças Armadas como Poder Moderador,
ao contrário do que sustentam alguns juristas
ideologicamente de direita

32
CAPA Em apresentação única, Madonna fará no Rio
de Janeiro o último show da turnê com a qual comemora
quatro décadas de carreira. Estima-se que um milhão de
pessoas irão vê-la. Saiba qual é a estratégia da longevidade
do sucesso, carisma e encantamento da artista que
combinou perfeitamente voz e performance
42 Entrevista 4
COMPORTAMENTO A tradicional ciranda e o alegre
maracatu recebem o título de Patrimônio Cultural Brasil Confidencial 14
Imaterial do Recife. O maracatu é Patrimônio Vivo
Semana 18
de Pernambuco desde 2005
Brasil 20
Comportamento 38
Economia 56

Internacional 58
Divirta-se 64
AD NA
LAN ÃO

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A
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ch
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Você também pode

27 MAR/2024 – ANO 47 – Nº 2824 R$ 28,00
4
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2
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3 9 4 0 0 8
9 7 7 0 1 0 4

ler ISTOÉ baixando

60 a edição em seu
Smartphone e tablet
CULTURA A vida plena de grandiosidade e tragédia de A REVANCHE
Os EUA escolhem repetir o confronto presidencial entre Joe Biden e Donald Trump.
Há quatro anos, o democrata uniu seu partido e o país contra o extremismo de direita.

Cleópatra, a poderosa governante do Egito, finalmente

Agora, ele luta contra a impopularidade enquanto o republicano se vinga,
já que driblou seus processos na Justiça e atraiu novos eleitores. Como esse embate
vai mudar a sociedade americana e impactar a democracia no mundo?

é contada em livro a partir de um olhar feminino

FOTO CAPA: ITAÚ/DIVULGAÇÃO 9

FOTOS EDITORIAIS: RICARDO GOMES; RICARDO STUCKERT/PR; MALAFAIA/AFP; ALFREDO DAGLI ORTI/PHOTO12/AFP
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Artigos
por Marcos Strecker

Redator-chefe de ISTOÉ

QUEM SALVA A CRIAÇÃO

A DEMOCRACIA? DA USP
á pouco tempo, havia um E no Brasil? O movimento eficaz da Universidade de São Paulo
H sentimento generalizado
de que Donald Trump iria conseguir
Justiça para punir as tentativas golpistas
de Jair Bolsonaro tem provado que
A foi fundada em 1934.
Após a derrota na Revolução
uma vitória fácil sobre Joe Biden as instituições democráticas são mais Constitucionalista em 1932, a elite
em novembro. O empresário lidera sólidas do que se supunha. O putsch paulista, nas pessoas de Júlio de Mesquita,
as pesquisas, atropelou os rivais do capitão não se viabilizou porque ele Paulo Duarte e Armando de Sales Oliveira,
republicanos e vai conseguindo driblar se defrontou com Poderes enraizados decidiram fundar uma Universidade para
as dezenas de processos contra ele. Por e não conseguiu apoio suficiente na a “investigação científica de altos estudos,
outro lado, o atual presidente sociedade. Isso explica mais o fiasco de cultura livre, e formação das classes
democrata, além de cronicamente do capitão do que a nova convicção dirigentes”. Nas palavras de Júlio de
impopular, continua sendo um motivo democrata da cúpula fardada ou o Mesquita, “Vencidos pelas armas,
de piada por sua idade avançada triunfo popular de Lula nas urnas, ainda sabíamos perfeitamente que só pela ciência
e pelas gafes em discursos. que esses fatores obviamente também e pela perseverança voltaríamos a exercer
Mas o momento eleitoral está tenham sido importantes (esse a hegemonia no seio da Federação.
mudando. Aos poucos, Biden repete argumento contraria o sebastianismo Herdáramos de nossa ascendência
seu movimento de quatro anos atrás, petista, naturalmente). Bandeirante o gosto pelos planos
angariando apoio na arrojados. Que maior monumento
sociedade e em seu partido, poderíamos erguer do que a
Nos EUA como no Brasil, a força
firmando-se como o fiador Universidade?” Interessante observar
da democracia. Usa a seu
das instituições e da sociedade que 60 anos após a fundação da USP,
favor o peso político da Casa explica por que populistas Fernando Henrique Cardoso chega
Branca, fator nada estão cada vez mais em apuros à Presidência da República para a
desprezível. Isso atormenta hegemonia de São Paulo.
o magnata, que usou e abusou Dois cientistas políticos que O matemático Teodoro Ramos foi
ilegalmente da sua cadeira no Salão defenderam em linhas gerais essa tese, então enviado à Europa, recrutando cerca
Oval para tentar melar o pleito em 2020. Marcus André Melo e Carlos Pereira, de 30 professores estrangeiros para a USP.
Um eventual êxito de Biden será um estão lançando Por que a democracia Para a Física, veio Gleb Wataghin, um
alívio para a Europa, que enfrenta a brasileira não morreu?. Os dois dos mais brilhantes discípulos de Enrico
ameaça militar russa e os movimentos remaram contra a corrente dos Fermi, que viria a quebrar o átomo pela
de extrema-direita. Apoiados pelos acadêmicos que viram no risco primeira vez em 1942 na Universidade de
amigos de Trump no continente, os populista uma catástrofe iminente. Chicago. Para as Ciências Sociais, dentre
radicais devem crescer decisivamente Com rigor acadêmico, apontam outros, vieram Lévi-Strauss, fundador da
nas eleições do Parlamento Europeu, as virtudes do presidencialismo
em junho. Se o democrata ganhar nos multipartidário. A obra de certa A USP nasceu para
EUA, ao contrário, o rastilho de pólvora forma vai na contramão da moda
“investigação científica,
dos movimentos antidemocráticos que editorial (global) dos livros sobre
explodiram desde 2016 pode começar a o fim da democracia, que perde força
altos estudos, cultura
se extinguir. Há um certo cansaço com — e pode virar obsoleta se Trump livre e formação das
essas tentativas de minar a democracia. de fato for derrotado. classes dirigentes”

10 ISTOÉ 2826 10/4/2024


por Ricardo Guedes
Ph.D. em Ciências Políticas
Antropologia Estruturalista, e Roger
Bastide. Da Física, decorreram Cesar
Lattes, Mario Schenberg, Marcelo Damy,
Paulus Pompéia, dentre tantos, na física
dos raios cósmicos. Das Ciência Sociais,
Fernando de Azevedo, Antônio Cândido,
Florestan Fernandes, e de gerações
futuras como Fernando Henrique
Cardoso, dentre outros. Na sequência,
Zeferino Vaz fundou a Escola de
Medicina de Ribeirão Peto em 1951,
organizando a Universidade de
Campinas em 1966
Conheci Gleb Wataghin em 1977
na Universidade de Campinas, onde ele
me mostrou o que seria o processador de
quartzo dos microcomputadores futuros.
Naquele momento, entendi o leitmotiv e
força de São Paulo, do conhecimento e da
determinação, que poderíamos sintetizar
em Abílio Diniz, não o único.
Joseph Ben-David. em Centers of
Learning, fala-nos sobre instituições
de ensino que desempenham papel
fundamental no desenvolvimento
dos países. Assim foi com a Universidade
de Harvard em 1636, a Universidade
de Berlim em 1810, a USP em 1934,
gerando desenvolvimento. Do projeto
do radar brasileiro durante a Segunda
Guerra Mundial do grupo de Física da
USP, nascem as bases de nossa indústria
eletromecânica. Segue-se a fundação do
ITA, com Paulus Pompéia, e na sequência
a Embraer, hoje a terceira maior
companhia de jatos comerciais do
mundo, gerando desenvolvimento.
A USP conta hoje com um corpo de
mais de 5.500 docentes e pesquisadores,
cerca de 98.000 estudantes, ranqueada
entre as 100 primeiras do mundo no
World Reputation Rankings da Times
Higher Education.
USP, ícone de nossa história.
As opiniões dos colunistas não necessariamente refletem a posição da revista
MOMENTOS
FORA DE SÉRIE
á algo inegavelmente mágico
H em mergulhar nas profundezas
do universo da adolescência. É uma
espécie de caldeirão efervescente onde
se misturam hormônios, sonhos,
e aquela sensação inebriante de que
tudo é possível — e ao mesmo tempo,
absolutamente terrível. E é nesse
turbilhão de emoções que a diretora
Olivia Wilde (Não se Preocupe, Querida;
Wake Up) decide nos lançar em seu filme
Fora de Série (2019) — disponível no
Prime. Uma obra que não é apenas
comédia, mas sim um espelho perspicaz
da juventude contemporânea.
A trama nos guia através da vida
de duas melhores amigas, Molly
(Beanie Feldstein) e Amy (Kaitlyn
Dever), que estão prestes a se formar
no Ensino Médio — e determinadas
a provar que não são apenas nerds —
e, então, decidem extravasar em uma
noite de festa antes da formatura. Elas
subitamente se dão conta de que
passaram os últimos anos tão focadas
nos estudos, que perderam todas as
experiências típicas da adolescência,
e assim, embarcam numa jornada
hilariante e tocante, repleta de
reviravoltas e autoconhecimento.
Olivia Wilde captura com maestria
a essência da juventude, com todas
as suas contradições e complexidades,
sem jamais perder de vista o humor
e as emoções que tornam essa fase
da vida tão única e inesquecível. Os
típicos estereótipos desse gênero de
filme são questionados e quebrados
— uma refrescante surpresa.
INÊS 249
por Laira Vieira
Economista e tradutora
Os ritos de passagem do
amadurecimento são explorados sem
subestimar a inteligência do público
nem cair nos clichês habituais. Sexo
e drogas estão presentes, mas não de
forma glamorizada; ao contrário, são
tratados com naturalidade, e é essa
abordagem autêntica e despretensiosa
que torna a obra cativante. Os adultos
também têm o seu espaço na película,
mas não como meros antagonistas
unidimensionais — eles são retratados
de maneira realista, com todas as suas
falhas e inseguranças, mas também
com amor e compreensão. É um
lembrete para os adolescentes que
criticam os mais velhos, como se não
fossem envelhecer também. Todos
nós enfrentamos desafios similares
nessa fase da vida.
Cada personagem é como um
fragmento de uma memória, uma
lembrança dos momentos “que
contando ninguém acredita” pelos
quais todos já passamos ao deixar os
livros de lado e sair para nos divertir. E
se você não se identificar com pelo
menos um desses personagens, então
talvez não tenha realmente
aproveitado sua adolescência.
O longa-metragem nos convida
a relembrar nossos próprios dias de
escola, repletos de sonhos e desafios
e – é claro – muita diversão. Então, se
você está pronto para uma dose de
nostalgia e diversão sagaz, não deixe
de assistir Fora de Série. E, lembre-se,
que nunca é tarde para vivenciarmos
momentos fora de série.
11
 INÊS 249
por Antonio Carlos Prado

Frases
A RÚSSIA
TEM A AUDÁCIA
E A HIPOCRISIA
DE JOGAR PEDRAS,
QUANDO ELA
PRÓPRIA POSSUI
TETO DE VIDRO”
LINDA THOMAS GREENFIELD,
embaixadora dos EUA na ONU

“ERA MUITA TRETA,

MAS MUITO AMOR.
ESSA MISTURA
RENDIA MÚSICA”
MC CACAU,, compositora
e cantora, sobre o seu
filho Márcio Jr., que
também está se
tornando um sucesso
musical no País

“CADA VEZ ESTOU MAIS

TRISTE E TENHO MENOS
VONTADE DE JOGAR”
VINI JR., atacante da seleção brasileira,
que está no Real Madrid, lamentando as ofensas
racistas que sofre na Espanha

12 ISTOÉ 2826 10/4/2024

 INÊS 249

“Se você está “A retirada de invasores

em um projeto, de terras indígenas gera uma
não pensa reação política de prefeitos
no sucesso e governadores. Neste ano
imediato. de eleições municipais isso
É como se fosse se acirra ainda mais”
o seu bebê. SONIA GUAJAJARA, ministra dos Povos Indígenas

Você não se
importa se ele
é o mais lindo
da Terra, mas,
sim, se ele está
respirando”
EIZA GONZÁLES, atriz
mexicana, que compõe
o elenco de O problema
dos 3 corpos, novo
trabalho dos criadores
de Game of Thrones

“Quando o Estado se ausenta, algo ocupa

o espaço. Aquele jovem que está sem
trabalho, sem estudar, sem perspectiva de
melhorar na vida vai procurar uma saída”
JHONATAN ALMADA, integrante da Rede Educativa da Unesco

“ÀS VEZES “TENHO PLENA CONSCIÊNCIA

SINTO CERTO DE QUE SE EU FOSSE OLIVER
DESENCANTO COLMAN E NÃO OLIVIA COLMAN
EM RELAÇÃO ESTARIA GANHANDO MUITO
À MODA MAIS DO QUE GANHO”
BRASILEIRA. OLIVIA COLMAN, atriz vencedora
NÃO É A MODA do Oscar pela atuação em A Favorita, denunciando
a disparidade de salários entre homens
EM SI. O QUE
e mulheres – elas ganham muito menos
ACHO É QUE
AINDA TEMOS
UMA VISÃO
MUITO “Uma cidade muito
COLONIALISTA” sensual”
REINALDO LOURENÇO, CHARLOTTE RAMPLING, atriz britânica,
estilista e empresário referindo-se ao Rio de Janeiro

FOTOS: ANDREA RENAULT/AFP; INSTA@MCCACAU; THIAGO RIBEIRO/AGIF/AFP; CHRISTOPHER POLK/ 13

GETTY IMAGES/AFP; GARETH CATTERMOLE/GETTY IMAGES/AFP; ANA BRANCO/AGÊNCIA O GLOBO
 INÊS 249
por Germano Oliveira

Brasil Confidencial
Colaborou: Marcos Strecker

IMPLOSÃO RÁPIDAS
Marconi Perillo
procura evitar o * Os Correios são um dos
esvaziamento
total do PSDB exemplos de que a pri-
vatização é o melhor
caminho. A estatal regis-
trou, em 2023, um preju-
ízo de R$ 596,6 milhões,
graças à queda no fatu-
ramento no setor de
encomendas. A empresa
é obrigada por lei a des-
pachar encomendas
mesmo deficitárias.

* Emmanuel Macron
não quis se encontrar
com o governador Tar-
císio de Freitas quando
O drama dos tucanos Prefeituras Vereadores visitou São Paulo, onde
Marconi Perillo, atual presidente do PSDB, A debandada dos O fracasso maior realizou um jantar no
tenta recolher os cacos do partido que vieram prefeitos paulistas acontece em SP. Os Hotel Rosewood: quis
ao chão após a luta fratricida entre Eduardo também é expressiva. tucanos governaram distância do mandatá-
Leite (RS) e João Doria (SP) pela vaga da legen- Em 2020, foram o estado por 30 anos rio paulista por consi-
da para disputar a Presidência da República eleitos 173 e hoje e Doria se elegeu derá-lo bolsonarista.
em 2022. Derrotado nas prévias por Doria, são apenas 83, pois prefeito no primeiro
Leite não aceitou o resultado democrático e a maioria foi para turno. Agora, porém, * Bolsonaro ganhou o
deu uma rasteira no ex-governador paulista. o PSD e outras os oito vereadores título de cara de pau do
Doria e aliados deixaram o ninho tucano e o legendas, como da bancada municipal ano. Pediu para o STF
partido praticamente acabou. Perillo tenta o PL. Para garantir deixaram o PSDB devolver seu passaporte
reconstruí-lo. Missão quase impossível. Afinal, candidaturas às rumo a partidos para visitar Netanyahu,
a legenda, que já teve mais de 100 deputados prefeituras este ano, que apoiam Ricardo após ter ensaiado pedido
no governo FHC, agora só tem 13 e possui Perillo espera ter de Nunes (MDB), já que de asilo na Embaixada
apenas um senador, ao invés dos sete que ti- oito a dez candidatos a direção do diretório da Hungria para eventu-
nha até recentemente. Dos oito governadores, nas 26 capitais: deseja local prefere ter al fuga. Por óbvio, Ale-
hoje são apenas três (RS, MS e PE) e mesmo eleger alguns deles candidato próprio ou xandre de Moraes negou.
assim a governadora pernambucana Raquel para manter a força apoiar Tabata Amaral
Lyra está com um pé fora. do partido em 2026. do PSB de Alckmin. * O Tesouro Nacional
mostra porque a Refor-
ma Tributária é indis-
O jogo do PT no Rio pensável. O Boletim de
A ministra Anielle Franco (Igualdade Racial), filiada ao PT, pretende obter Estimativa da Carga
o apoio de Lula para viabilizar seu nome como candidata a vice da chapa Tributária Bruta do Go-
do prefeito Eduardo Paes, que disputará a reeleição este ano, com chance verno Geral de 2023
de vitória. Como Paes pretende disputar o governo do Rio em 2026, o revela que a carga tri-
vice-prefeito que for eleito agora assumirá a prefeitura e ainda terá dois butária do ano passado
anos como mandatário da Cidade Maravilhosa. foi de 32,44%.

14 ISTOÉ 2826 10/4/2024 FOTOS: EDILSON RODRIGUES/SENADO FEDERAL DO BRASIL; EVARISTO SÁ/AFP;
MATEUS BONOMI/AGIF/AFP; ÁLVARO POVOA; DIVULGAÇÃO

“É grave que a
candidata Corina
RETRATO FALADO Yoris não possa
ter sido registrada
para disputar
as eleições na
Venezuela”
Lula condenou a decisão do seu
amigo Nicolás Maduro por ter
impedido que Corina Yoris, candidata
da oposição, pudesse se inscrever
na semana passada para disputar
as eleições na Venezuela. Yoris foi
indicada para substituir Maria Corina
Machado, principal líder da oposição,
que havia sido impedida de
concorrer ao pleito pela suspeita
Justiça do país. Agora, o ditador veta
também outra oposicionista: Maduro
realizará um pleito viciado
e sem nenhuma transparência.
PIB positivo fosse a reversão da trajetória da
Às voltas com a redação da agropecuária, que este ano terá
regulamentação tributária que uma queda de 1% em razão dos
encaminhará à Câmara até problemas climáticos (chuvas
o próximo dia 15, Haddad excessivas em algumas regiões
encontrou tempo para e secas em outras), os resultados
comemorar o recente relatório poderiam ser melhores. A
trimestral do Banco Central. Os indústria está se portando
resultados são mais otimistas melhor: o BC aponta alta de 1,7%
do que se previa. A estimativa para 2,2%. No setor de serviços
para a expansão do PIB em 2024 também houve ligeira melhora:
subiu de 1,7% para 1,9%. Não de 1,9% para 2%.
Fiasco de Marinho
O ministro Luiz Marinho errou ao se meter
num assunto que não entende: a atuação do BC.
Disse que os juros eram uma “forma burra”
de controlar a inflação. O presidente do BC,
Roberto Campos Neto, deu-lhe uma aula:
o Brasil derrubou a inflação com juros altos,
enquanto Argentina e Turquia reduziram
os juros e a inflação bateu em 100% ao ano.
Benefícios reduzem a rotatividade
Para entender como os benefícios impactam na decisão dos trabalhadores na hora de mudar de
emprego, a Onze, fintech de saúde financeira e previdência privada, fez um estudo com funcionários
de empresas e dirigentes de RH: 92% dos entrevistados têm o bem-estar financeiro como prioridade,
reduzindo a rotatividade, segundo resume Ranses Bonora, diretor comercial da Onze.
INÊS 249
TOMA LÁ DÁ CÁ
DAVID UIP, DIRETOR NACIONAL DE INFECTOLOGIA
DA REDE D’OR
Vivemos uma epidemia de dengue?
Temos situações diferentes pelo Brasil: regiões
Sudeste e Sul; Distrito Federal e Goiás; e Acre
estão muito pressionadas. Nesses casos, temos
um número que caracteriza a epidemia
(300 casos por 100 mil habitantes).
Por que o governo não toma medidas mais
drásticas?
Estamos numa situação grave nas regiões citadas
anteriormente. E digo com absoluta convicção:
é uma questão de tempo para atingir
as regiões Norte e Nordeste.
O governo está agindo
certo?
O Brasil comprou toda a produção
do laboratório Takeda referente
a 2024 e 2025: 15 milhões
de doses para 7,5 milhões
de pessoas (duas doses para
cada). E está imunizando
a população mais
exposta, de 10 a 14 anos.
Inflação arrefece
Enquanto o PIB tem pequena alta, a inflação
ainda é razão para preocupações, apesar
de os economistas entenderem que a alta dos
preços alcançada no início do ano começam
a ficar sob controle. Em janeiro e fevereiro,
os preços dos alimentos a domicílio subiram
3%, bem acima da inflação geral de 0,83%.
Melhor do mundo
O BC brasileiro foi classificado pela revista
Central Banking, no ano passado, como
o melhor do mundo, à frente do americano
e do inglês. Graças à atuação de Campos Neto,
em 2023 a economia brasileira cresceu 2,2%,
enquanto a do Reino Unido subiu apenas 0,13%,
com uma inflação maior do que a do Brasil.
Marinho precisa estudar mais sobre economia.
15

Coluna do Mazzini
TÃO
PERTO,
TÃO LONGE
A despeito das especulações sobre
minirreforma na Esplanada,
o presidente Lula da Silva deve
arrumar primeiro a cozinha.
Os palacianos Rui Costa (Casa Civil) e
Miriam Belchior (secretária-executiva
da Casa) mal se falam, garante quem
acompanha a rotina. Belchior não
repassa todos os assuntos que trata
direto com o presidente, em especial
projetos do PAC III. Os colegas
palacianos tentam, sem sucesso,
armistício entre a dupla ou uma saída
honrosa para Belchior, já que Costa
é da cota do senador Jaques Wagner
(PT-BA), o conselheiro do presidente –
e quem o Barba gostaria que assumisse
o posto desde o início. Tem um
ingrediente eleitoral nesse cenário.
Míriam não tem voto, é a face técnica
do governo – herdada da gestão Dilma
Rousseff. Já Costa vem da Bahia, que
deu 1,5 milhão de votos de frente
para Lula na eleição de 2022 contra Jair
Bolsonaro. Se dependesse de Costa,
Míriam já teria saído do cargo, avisam
aliados. A preferida para a vaga é a sua
chefe de gabinete, Talita Nobre Pessoa.
Lula deve arrumar
primeiro a cozinha
palaciana antes de
mexer no inquilinato da
Esplanada para reforçar
as relações com o
Congresso Nacional
16 ISTOÉ 2826 10/4/2024
INÊS 249
Destilados nos copos da Receita
O setor de destilados levou à Receita Federal dados técnicos que podem
ter impacto na regulamentação da Tributária. Técnicos do órgão receberam
um documento da Associação Brasileira de Bebida Destilada pontuando
que, no caso do IPI, produtos de venda em larga escala, como a cerveja,
sofrem incidência de 3,9% à alíquota. Em contraste, os destilados são
onerados por alíquotas até cinco vezes maior, chegando ao patamar de
19,5%. Quando se observa o consumo, o de cerveja é de 84 litros per capita
enquanto o dos destilados é de apenas 4,1 litros. “Uma impressionante
diferença superior a 20 vezes entre as categorias”, destaca o documento.
Turma do home-office
A PF abriu investigação contra
10 servidores da Penitenciária Federal
de Segurança Máxima de Mossoró.
Seriam suspeitos de facilitar a fuga dos
dois detentos ligados ao Comando
Vermelho. Como a Coluna já publicou,
há desconfiança de que todos estavam
num surreal “home-office”. E não seria
a primeira vez, de tanto que
consideravam segura a prisão.
Apagada, Tebet busca rotas para a urna
Desiludida pela falta de protagonismo
na Esplanada, a ministra do Planejamento,
Simone Tebet (MDB), confidencia a
aliados que merecia mais no Governo pelo
fator que representou na equação eleitoral
de 2022, mas não cobra o chefe. Saídas
honrosas não faltam à mesa. Há até quem
indique uma candidatura à Prefeitura
de Três Lagoas, seu reduto onde ela
e o falecido pai já foram prefeitos,
o que a ministra rechaçou. Ficar longe
de Brasília após a vitrine nacional da
campanha está na contramão. Tebet tem
mágoas de Lula e seu entorno, por isso
não descarta voltar ao Estado para uma
candidatura a governadora.
FOTOS: DIVULGAÇÃO; ANDRESSA ANHOLETE; JEFFERSON RUDY/AGÊNCIA SENADO
 INÊS 249

por Leandro Mazzini

Com equipes: DF, SP e RJ

NOS BASTIDORES
Incompetência brazuca
O Legislativo ficou invisível na
passagem de Emmanuel Macron pelo
Brasil. O Grupo Brasil-França do
Senado não conseguiu se reunir por
quatro anos, desde a sua criação.

Com pijama, na paz

Dois generais da reserva podem
se gabar de vestir com tranquilidade
os pijamas. Hamilton Mourão
Câmaras viram o sonho do recomeço e Santos Cruz passaram incólomes
Para quem gosta do Poder, se acostuma e sem ele não vive, o importante é não no governo Bolsonaro e são da turma
ficar sem mandato — mesmo que o projeto eleitoral conote um “rebaixamento”. que não acordará com visita às 6h.
O ex-prefeito Cesar Maia no Rio de Janeiro deu exemplo e puxou o bonde.
É candidato à reeleição como vereador. Agora, surgem os anúncios do
ex-senador Elmano Ferrer em Teresina, do ex-governador Anthony Garotinho Marçal, um cristão...
na capital fluminense e da ex-deputada Janaína Pascoal em São Paulo como Influencer e coach que promete
pré-candidatos a vereadores. O ex-senador Mão Santa é prefeito de 2º mandato sucesso profissional, Fábio Marçal
em Parnaíba (PI), e não se descarta candidatura a edil numa próxima. filiou-se ao Democracia Cristã,
do famoso Eymael. Quer ser candidato
à prefeitura de São Paulo. Marçal foi
“Mais Cubanos”: Brasil é novo lar guia que deixou grupo de seguidores
Desde o Mais Médicos, o Brasil sedia silenciosa e permanente imigração em apuros numa serra paulista.
de cubanos para nosso País. São os que ficaram e agora trazem famílias.
A situação só piora lá. Na quarta-feira (27/3) houve protestos em Havana.
O governo cortou a internet, e o racionamento de energia chega a 18h.

Ex-porco aéreo
Tensão na Eletrobras O mistério de Barros Aconteceu há duas semanas
Termina este mês o prazo para A reunião do deputado Ricardo
no espaço aéreo do Recife.
adesão voluntária ao plano de Barros (PP-PR) com o presidente
demissão oferecido pela nova direção Lula da Silva no Palácio da Alvorada O piloto de um avião Baron
da Eletrobras, longe do controle caiu como bomba no partido, comunicou que precisou
da União, aos servidores de carreira. porque ainda é cercada de mistério. fazer alijamento de porco
Causou mais tensão na empresa. Aliado de Jair Bolsonaro, mas selvagem do voo. O bicho
Há indicativos de pressão por parte de trânsito suprapartidário, amigos
anestesiado acordou
dos acionistas, a fim de contratar apontam que ele pode se tornar
autônomos para os serviços. líder na Casa ou ministro palaciano e mordeu a tripulação.
A empresa tem alegado altos custos. de articulação com Congresso.

A opinião do colunista não necessariamente reflete a posição da revista 17


PROTEÇÃO Edifício no
condado de Hualien: estrutura
já feita para não desmoronar
em tremor de terra
TAIWAN
Tecnologia, modernidade e o mais forte
terremoto dos últimos 25 anos
Taiwan foi atingida pelo mais
forte terremoto ocorrido na
região nos últimos 25 anos, na
manhã da quarta-feira 3. No dia
seguinte, informações davam
conta de que pelo menos nove
pessoas haviam morrido e cerca
de novecentas estavam feridas. O
número de desaparecidos ainda se
fazia impossível de ser estimado.
“No momento, a prioridade é
resgatar aqueles que estão entre
os escombros ou esmagados por
pedras, mas ainda com vida”,
declarou de imediato o
presidente eleito Laui
Ching-Te. Segundo
as autoridades, outra
preocupação voltava-se
“às crianças que estavam
indo para as escolas”. Os
moradores de locais não
atingidos assistiram em
pânico, por transmissão
televisiva, ao que estava
acontecendo, sobretudo
no montanhoso condado
de Hualien, epicentro
onde se registrou a
FOTO: CNA/AFP
forte magnitude de 7,4. Vale
observar, no entanto, que Taiwan
é um centro de tecnologia e
modernidade. Isso permitiu que
inúmeras edificações, já erguidas
com proteção contra tremores
de terra, vergassem, mas não
desmoronassem. E, assim, a
morte de uma infinidade de
indivíduos foi evitada. Alertas
de aproximação de tsunami
chegaram a ser enviados ao
sul do Japão e às Filipinas, e o
terremoto foi sentido também
na China – Taiwan é
uma pequena nação
10
insular, localizada a
180 quilômetros da
costa leste chinesa. As
Era o número duas usinas nucleares
de mortos até taiwanesas não foram
a quinta-feira 4 afetadas. O mais
arrasador terremoto
1150
nessa ilha ocorreu em
1999, com magnitude
Pessoas ficaram de 7,6. Matou 2,4 mil
feridas pessoas e danificou
logo nas cerca de 50 mil
primeiras horas edifícios.
INÊS 249
FUNDADOR
DOMINGO ALZUGARAY (1932-2017)
EDITORA
Catia Alzugaray
PRESIDENTE EXECUTIVO
Caco Alzugaray
DIRETOR EDITORIAL
Carlos José Marques
DIRETORES
DE REDAÇÃO: Germano Oliveira DE EDIÇÃO: Antonio Carlos Prado
REDATOR-CHEFE: Marcos Strecker
EDITORES
Felipe Machado, Luiz Cesar Pimentel
e Vasconcelo Quadros (Brasília)
REPORTAGEM
Ana Mosquera, Alan Rodrigues, Denise Mirás,
Elba Kriss, Marcelo Moreira, Mirela Luiz
e Carlos Eduardo Fraga (estagiário)
COLUNISTAS E COLABORADORES
Cristiano Noronha, Elvira Cançada, Erika Mota Santana, José Vicente,
Laira Vieira, Marco Antonio Villa, Mentor Neto, Rachel Sheherazade,
Ricardo Amorim, Ricardo Guedes, Ricardo Kertzman e Rosane Borges
ARTE
DIRETORA DE ARTE: Renata Maneschy
EDITOR DE ARTE: Wagner Rodrigues
DESIGNERS: Sandro Soares e Therezinha Prado
WEB DESIGN: Alinne Nascimento Souza
AGÊNCIA ISTOÉ
Editor: Frédéric Jean
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ISTOÉ (ISSN 0104 - 3943) é uma publicação semanal da Três Editorial Ltda.
Redação e Administração: Rua William Speers, 1.088, São Paulo – SP, CEP:
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Istoé não se responsabiliza por conceitos emitidos nos artigos assinados.
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Brasil/Justiça
CRÍTICO
Luís Roberto Barroso
propôs a mudança
do alcance do foro
privilegiado em
2018. Agora, o STF
pode ampliar seu
entendimento

SEM BRECHA PARA

A IMPUNIDADE
O STF está a um voto de
ampliar o alcance do foro
privilegiado, uma decisão
que afeta Bolsonaro.

H
Com isso, o ex-presidente
não se beneficiará pelo
deslocamento de seus
inquéritos para a primeira
instância, escapando do
rigor da Corte
Vasconcelo Quadros
erança do período imperial, sempre alargado em benefício da elite domi-
nante, o foro privilegiado está mais uma vez na pauta do Judiciário, agora
para corrigir e ampliar uma decisão que o próprio Supremo Tribunal Fe-
deral (STF) havia deixado incompleta em 2018. A apenas um voto para
formar maioria, a Corte deve decidir que presidentes da República, minis-
tros, deputados e senadores que cometerem crimes durante os mandatos ou no
exercício dos cargos não poderão mais se utilizar de artifícios para retardar ações
penais ou inquéritos até a prescrição. Uma vez abertos no STF, os processos lá
serão julgados, mesmo em casos de renúncia, cassação ou de personagens que não
tenham sido reeleitos. Não haverá mais deslocamentos ou as idas e vindas de

20 ISTOÉ 2826 10/4/2024 FOTOS: SÉRGIO LIMA/AFP; MAURO PIMENTEL/AFP

 INÊS 249

processos ao sabor da vontade dos réus. A mudança vai im- A proposta do líder do PL na Câmara dos Deputados,
pactar a vida de centenas de políticos, entre eles o ex-presi- Sóstenes Cavalcante, visa reformular o sistema de julgamen-
dente Jair Bolsonaro, que apostava no deslocamento para a tos de congressistas, cujos processos passariam a correr nos
primeira instância dos cinco inquéritos em que é alvo. Era a tribunais regionais federais (TRFs), enquanto no STF ficariam
última porta por onde pretendia retardar seu inevitável en- apenas os casos dos presidentes dos Poderes. A proposta
contro com a Justiça depois de uma série de crimes quer ter- mantém, no entanto, a possibilidade recursos ao STJ e ao
minaram na tentativa de golpe nos dois meses depois da próprio STF, mas apenas para dirimir dúvidas constitucionais.
derrota, em 2022, e nos ataques do 8 de janeiro de 2023 Já a PEC 333 é mais simples. “O ideal seria o presidente Arthur
contra os três Poderes. Lira colocar na pauta a PEC que já está na Câmara. Ela acaba
Nos últimos dias, diante do cerco da Polícia Federal cada vez de vez com o foro. Há alguma razão para os presos do 8 de
mais apertado, o ex-presidente voltou a insinuar que não acei- janeiro estarem sendo julgados no STF?”, diz o deputado
tará a prisão, principalmente depois que o ministro Alexandre Alberto Fraga (PL), da tropa
de Moraes negou a devolução do passaporte pedida pela defe- de choque bolsonarista. Em
sa a pretexto de uma viagem que Bolsonaro pretendia fazer a comum, as duas propostas
Israel. Ao se “hospedar” na embaixada da Hungria, despertando têm a finalidade de evitar o
a forte suspeita de que tenha procurado uma alternativa de STF, que vem atuando no
A experiência
asilo logo após a operação Tempus Veritatis, o ex-presidente sentido contrário, amplian- recente revela
acabou demonstrando que pode tentar escapar, o que, na inter- do o alcance da atuação da que o Supremo
pretação de juristas, poderia caracterizar obstrução de justiça,
argumento que justificaria eventual prisão preventiva.
Corte. Até agora cinco minis-
tros votaram — Gilmar Men-
está preparado
des, o relator, Cristiano Za- para instruir
DEFESA DE BOLSONARO nin, Dias Toffoli, Flávio Dino e julgar ações
A defesa de Bolsonaro apresentou recurso pedindo o deslo- e Alexandre de Moraes —, penais complexas.
camento dos inquéritos em que é alvo para a primeira instância. todos eles favoráveis à ex-
Seus movimentos estão alinhados com a estratégia do PL, que tensão da atuação do STF.
Também
deu início na Câmara dos Deputados a uma ofensiva para des- O presidente do STF, Luís comprova que
gastar o governo do presidente Lula e confrontar a provável Roberto Barroso, que havia esse exercício
decisão que manteria no STF os inquéritos e ações penais que
devem ser abertas contra ele. Apoiada nas alas conservadoras,
pedido vista, mas já liberou
o processo para julgamento
não ofusca suas
a bancada está pressionando o presidente da Câmara, Arthur a partir do dia 12, sempre foi
demais funções
Lira, a colocar o tema na pauta através de duas institucionais
frentes: uma PEC (Proposta de Emenda à Gilmar Mendes,
ministro do STF
Constituição) acabando com o foro privilegiado
de deputados no STF, mas transferindo para
outra instância, e outra, a 333/2017, que já
passou pelo Senado e está pronta para ser
votada na Câmara. Esta propõe a extinção do
foro privilegiado em todos os níveis. Em qual-
quer dos casos, Bolsonaro deixaria de ser jul-
gado pelo STF, que é seu grande temor em
função do longo período de ataques contra o
Judiciário. Caso consolide mesmo o entendi-
mento de que a perda do cargo ou do manda-
to não desloca os processos, o STF deve decidir
também o destino do inquérito em que o de-
putado Chiquinho Brazão e seu irmão, conse-
lheiro do TCE-RJ, Domingos Brazão, são
apontados como mandantes do assassinato da
ex-vereadora Marielle Franco e do motorista
Anderson Gomes, em março de 2018. Quando
o crime foi praticado, Chiquinho era vereador.

21
 INÊS 249
Brasil/Justiça
TEMOR as razões que fomentaram a outorga de
Para evitar o STF, competências originárias aos Tribunais. O
Jair Bolsonaro
apostava no que ocorre é justamente o contrário. É nesse
deslocamento dos instante que adversários do ex-titular da
seus inquéritos
para a primeira posição política possuem mais condições de
instância exercer influências em seu desfavor, e a
prerrogativa de foro se torna mais necessária
para evitar perseguições.”

CONTRA MANIPULAÇÕES
Mendes considera que no contexto políti-
co atual, com o País polarizado, a extensão da
competência do STF calibra a Justiça. “A
prerrogativa de foro se torna ainda mais fun-
damental para a estabilidade das instituições”,
disse o relator, que foi seguido pelos outros
quatro ministros. Mendes citou a velocidade
das ações penais instauradas contra os auto-
res dos ataques de 8 de janeiro, mesmo as
tratadas no plenário virtual que, segundo
destacou, ocorreram num ritmo bom, com os
réus exercendo, sem sobressaltos, a ampla
contra o foro privilegiado, mas em 2018 ajustou sua compre- defesa. “A experiência recente revela não somente que o Tri-
ensão sobre o tema. Barroso chegou a dar declarações consi- bunal está preparado para instruir e julgar ações penais com-
derando que a prerrogativa gera impunidade, não se justifica plexas envolvendo detentores de prerrogativa de foro. Ela
numa República e desgasta o STF que, na sua avaliação, não também comprova que o exercício dessa competência não
era aparelhado para instruir ações penais. “Quando está quase engessa o funcionamento da Corte nem ofusca suas demais
sendo julgado, o sujeito renuncia, (o caso) baixa para a 1ª funções institucionais, como a jurisdição constitucional.”
instância e começa tudo de novo.” Em 2018, quando ele foi O ministro Cristiano Zanin acha que a mudança na com-
relator no julgamento de uma questão de ordem em uma ação preensão do STF previne manipulações e manobras passíveis
penal, seu voto estabeleceu que com a publicação do despacho de acontecer por ato voluntário do agente público e fortalece
para alegações finais sobre crimes ocorridos durante o man- os tribunais originários. Flávio Dino acrescentou que os crimes
dato a competência dos tribunais superiores não será mais subsistem mesmo depois de cessada a permanência do acu-
afetada, mesmo que o réu já não esteja mais no cargo que sado num cargo público. “Em qualquer hipótese de foro por
motivou a prerrogativa de foro. Além de Barroso, faltam ainda prerrogativa de função não haverá alteração de competência
votar os ministros Luiz Fux, Cármen Lúcia, Edson Fachim, com a investidura em outro cargo público, ou sua perda,
André Mendonça e Nunes Marques. prevalecendo o foro cabível no momento da instauração da
O foro privilegiado voltou à pauta do STF a pedido de dois investigação pelo Tribunal competente.” O ministro Alexandre
congressistas, o senador Zequinha Marinho de Moraes antecipou seu voto logo após o
(Podemos) e a ex-senadora Rose de Freitas pedido de vista do presidente do STF. Ele
(MDB). Marinho impetrou um habeas corpus A mudança pode destacou que nos sete anos que separam a
num caso que corre na primeira instância impactar centenas decisão do STF de manter na Corte apenas
em que é acusado da prática de rachadinha de políticos, os casos em que os réus foram acusados de
quando era deputado, enquanto Rose pede praticar crimes no exercício dos cargos ou
anulação de um processo deslocado para a
inclusive mandatos não há registro de que os julga-
primeira instância, no qual é acusada de Chiquinho e mentos tenham se tornado mais rápidos em
corrupção. O relator, ministro Gilmar Men- Domingos Brazão, outras instâncias. Moraes justificou o voto no
des, argumentou que a prerrogativa, por não
ser um privilégio pessoal, deve permanecer
implicados no relatório pela necessidade de estabelecer um
critério “focado na natureza do fato crimino-
no STF mesmo com o fim do mandato dos assassinato de so, e não em elementos que podem ser ma-
parlamentares. “A saída do cargo não ofusca Marielle Franco nobrados pelo acusado”.

22 ISTOÉ 2826 10/4/2024 FOTO: ALLISON SALES/FOTORUA/AGÊNCIA O GLOBO


APRESENTA
Por Priscila Aro • Dra Moniele M. C. Manzini — Fotos: @rodrigopessoafotógrafo
Dra. Moniele: A Humanização no Emagrecimento
e a Transformação de Vidas
A
trajetória da Dra Moniele Ma-
tos Cadamuro Manzini é uma
inspiração de superação e de-
dicação ao bem-estar de seus pacien-
tes. Médica por muitos anos na área
de urgência e emergência, sua jornada
na Nutrologia começou após enfren-
tar desafios pessoais com o peso, es-
pecialmente após a gestação, quando
ganhou 40 quilos a cada gravidez. Essa
experiência a levou a buscar soluções
eficazes para o emagrecimento, encon-
trando na Nutrologia não apenas uma
profissão, mas uma missão de vida.
A abordagem da Dra. Moniele é
marcada por uma visão holística e
humanizada, compreendendo que o
emagrecimento vai além da simples
perda de peso. Ela entende que envol-
ve aspectos físicos, emocionais e com-
portamentais, e por isso adota uma
abordagem multidisciplinar em seu
tratamento.
A Dra. Moniele destaca que “quando
falamos de sobrepeso e obesidade, es-
INÊS 249
ria da autoestima de seus pacientes.
Seu trabalho é reconhecido não ape-
nas pelos resultados físicos, mas pelo
impacto positivo na qualidade de vida
e na autoconfiança de quem busca seu
auxílio.
Recentemente, seu trabalho foi reco-
nhecido internacionalmente pela Or-
ganização das Nações Unidas (ONU),
que a homenageou por sua excelência
no cuidado com a saúde e na transfor-
mação de vidas através de sua aborda-
gem humanizada e eficaz no emagre-
cimento.
Em resumo, a Dra. Moniele perso-
nifica a delicadeza, a humanização e o
compromisso com o bem-estar de seus
pacientes, oferecendo não apenas um
tratamento médico, mas uma jornada
de transformação e qualidade de vida
para todos que buscam sua ajuda. ■
Saiba Mais:
Instagram: @dramonielemcmanzini
Contato: (17) 3421.7091
(17) 9 9739.0105
tamos diante de uma doença crônica,
progressiva e recidivante, reconhecida
internacionalmente pela Classificação
Internacional de Doenças (CID)”. Ela
ressalta que o uso de medicações tor-
na-se um dos pilares do tratamento,
sendo considerado por ela como uma
opção eficaz para a perda de peso. No
entanto, seu método vai além da me-
dicação, incluindo acompanhamento
psicológico, orientação alimentar e
atividade física personalizada.
As consultas com a Dra. Moniele
são marcadas pela atenção e dedica-
ção, durando cerca de duas horas para
garantir um atendimento completo e
individualizado. Ela enfatiza a impor-
tância de uma relação saudável com a
comida, destacando que não se trata
apenas de comer menos, mas de co-
mer melhor.
Além do acompanhamento médico
e nutricional, a Dra. Moniele oferece
tratamentos complementares para au-
xiliar no emagrecimento e na melho-
 INÊS 249
Brasil/Forças Armadas

S
em alarde, o Supremo Tribunal
Federal enterrou toda a argu-
mentação jurídica que a direita
– na qual se enfileiram generais
com quatro estrelas – tentou
usar para manter o ex-presidente Jair
Bolsonaro no poder através de uma fra-
cassada tentativa de golpe de Estado. Ao
reafirmar que o artigo 142 da Constituição
não dá às Forças Armadas qualquer papel
moderador sobre os Poderes constitucio-
nais, por tabela o STF afastou também a
sensação de tutela sobre os civis que o
militarismo golpista alimentava desde
que a República foi proclamada. O texto
do artigo 142 é claro, mas foi necessário
que o relator de uma Ação Direta de In-
constitucionalidade em julgamento, a
ADI 6657, ministro Luiz Fux, numa rea-
firmação do óbvio, desenhasse que “não
se observa no arcabouço constitucional
qualquer espaço à tese de intervenção
militar, tampouco de atuação moderado-
ra das Forças Armadas”. Fux foi seguido

FREIO NO
pelo presidente da Corte, Luís Roberto
Barroso, e pelos ministros Edson Fachin,
Gilmar Mendes, Flávio Dino e André
Mendonça, este último indicado por
Bolsonaro. A votação no plenário virtual
só termina no próximo dia 8, mas os seis

MILITARISMO
votos depositados já formam maioria para
sepultar definitivamente a tese delirante.
A tendência é a de uma decisão unânime.
Único dos 11 ministros de origem par-
tidária comunista, Flávio Dino anunciou
seu voto no domingo, 31, data em que o

GOLPISTA
golpe militar de 1964 completou 60 anos.
Ele ressaltou que os militares são subal-
ternos aos poderes civis, afastou a tese de
poder moderador e afirmou que o golpis-
mo é “abominável”. No final, para “expun-
gir desinformações que alcançam alguns
membros das Forças Armadas”, determi-
nou que a Advocacia Geral da União e o STF afasta tese de poder intervencionista das Forças
Ministério da Defesa façam uma difusão
ampla da decisão nas organizações mili-
Armadas que Bolsonaro tentou usar para dar o golpe,
tares, inclusive nas escolas de formação, reforça a subordinação dos militares aos governos
aperfeiçoamento e similares, onde o civis e sepulta o fantasma da tutela que pairava sobre
germe do golpismo é “inoculado”. Estu-
dioso do militarismo, o historiador e o País. Decisão deve ser difundida na caserna como
professor da UFRJ Francisco Carlos Tei- contraponto ao golpismo Vasconcelo Quadros

24 ISTOÉ 2826 10/4/2024 FOTOS: ALEXANDRE SCHNEIDER/AFP; MATEUS BONOMI/AFP


PACIFICADO O general Tomás Paiva, comandante do Exército, diz que já estava
consolidada a certeza de que as Forças Armadas nunca tiveram poder moderador
xeira acha que a decisão do STF “é boa,
mas ruim” porque, se de um lado expli-
cita o óbvio, de outro levou a Corte a se
ocupar do julgamento de um tema que
já era claro no texto constitucional e
ainda havia sido reforçado por outras
duas leis complementares anexadas.
“Nelson Rodrigues já dizia que no Brasil
o óbvio precisa ser explicado.” A tese de
poder moderador, lembra ele, foi herdada
da monarquia por ter sido o Exército que
proclamou a República, mas não há aco-
lhimento desde a Constituição de 1890.
“Só mostra que a cultura política brasilei-
ra é pobre e que as instituições militares,
formadas por coronéis, generais, brigadei-
ros e almirantes, entendem aquilo que
querem da Constituição.” Em vez de
julgar, Teixeira acha que o STF deveria
ter rechaçado a demanda numa sentença
INÊS 249
AMEAÇA Bolsonaristas em São Paulo, em
março de 2021. Interpretação maldosa da
Constituição ludibriou manifestantes, que
foram às ruas pedir intervenção e até um
novo AI-5 como “garantia” de liberdades
de não acolhimento. “O que mais vão
colocar em votação?”
ARTIGO 142
No inquérito da Polícia Federal que
investiga a tentativa de golpe, o artigo 142
é citado por vários militares envolvidos.
Segundo o ex-ajudante de ordens de
Bolsonaro, tenente-coronel Mauro Cid, o
ex-ministro da Saúde e hoje deputado
federal Eduardo Pazuello estimulou Bol-
sonaro a usar o texto constitucional para
promover a ruptura. Em longo depoimen-
to à PF, o general da reserva Laércio Vir-
gílio chega ao desatino de afirmar que a
ruptura seria feita “dentro da lei e da or-
dem” e que procurou convencer o ex-
-comandante do Exército, general Marco
Antônio Freire Gomes, da “constitucio-
nalidade” da intervenção militar, confor-
me parecer do jurista Ives Gandra Mar-
tins. Recusada por Freire Gomes e pelo
ex-comandante da Aeronáutica, tenente-
brigadeiro Carlos Baptista Júnior, no pe-
ríodo mais agudo da tentativa golpista, a
tese foi definitivamente sepultada pelo
ministro da Defesa, José Múcio Monteiro,
que considerou a decisão uma “confirma-
ção do óbvio”, e pelo atual comandante
do Exército, general Tomás Paiva. Ele
afirmou que a decisão do STF consoli-
dou o texto constitucional e sustentou
que não existe no Brasil o poder mode-
rador que tentaram atribuir às Forças
Armadas. “Não há novidade para nós.
Isso já estava consolidado como enten-
dimento e não causava dúvidas no
Exército brasileiro.” Paiva acha que a
interpretação do STF foi correta e afirma
que as Forças Armadas têm seu papel na
defesa da soberania e dos interesses
nacionais definidos na Constituição, mas
não exerce nenhum poder moderador.
“Isso já estava consolidado.”
25
 INÊS 249
Brasil/Meio Ambiente

RETROCESSO AMBIENTAL
Projetos no Congresso que autorizam desmatamento (PL-SC), ferrenha apoiadora do ex-pre-
sidente Jair Bolsonaro e integrante da
em áreas maiores do que as atuais, liberam garimpo bancada ruralista.
em reservas, extinguem taxas que custeiam A maioria dos especialistas em le-
gislação ambiental considera que a
o Ibama e reduzem recursos contra incêndios
ofensiva contra o meio ambiente re-
estão preocupando ambientalistas, que enxergam monta aos piores momentos do gover-
uma ofensiva do setor ruralista no anterior e pode integrar uma espé-
cie de desmonte orquestrado dos
Marcelo Moreira
mecanismos legais de preservação de
matas, florestas e rios. O ambientalista

O
meio ambiente está sob ataque em risco não apenas a Amazônia, mas Carlos Bocuhy, presidente do Institu-
no Congresso Nacional. É assim regiões fragilizadas, como o Pantanal. O to Brasileiro de Proteção Ambiental
que ambientalistas e parlamen- texto foi analisado em caráter termina- (Proam), já alertava para os retrocessos
tares ligados ao meio ambiente tivo pela comissão e seguirá diretamen- no setor que vinham sendo gestados
enxergam a movimentação da te para o Senado, caso não haja nenhum desde o final do ano passado. Em uma
bancada ruralista em comissões temá- recurso para análise no plenário da série de artigos, o especialista afirmou
ticas, e no próprio plenário da Câmara, Câmara. A comissão atualmente é pre- que o abrandamento dos termos de
com a intenção de flexibilizar legisla- sidida pela deputada Carol de Toni licenciamentos ambientais no País,
ções ambientais e ampliar permissões
para desmatar áreas maiores, assim
como restringir fiscalizações e amenizar
RISCO
punições aos infratores. A situação Um dos projetos em
ameaçadora mais recente foi a aprova- análise na Câmara é
ção de um projeto que libera o desmate o que afrouxa uma
série de medidas
de vegetação original em biomas que preventivas no
não são florestas. Essa medida, que re- combate a incêndios
em áreas rurais
duz a proteção às florestas, teve o aval
da Comissão de Constituição e Justiça
(CCJ). Outros cinco textos ampliam as
flexibilizações de leis ambientais, como
a liberação de mineração e garimpo em
reservas extrativistas; afrouxam medi-
das de prevenção contra incêndios em
áreas rurais; e extinguem taxas que
custeiam o Ibama (Instituto Nacional
de Meio Ambiente e Recursos Naturais
Renováveis), enfraquecendo a fiscaliza-
ção ambiental.
As entidades que congregam am-
bientalistas e os deputados “verdes”
estão alarmados com a aprovação na
CCJ de um projeto que permite desma-
tar vegetações nativas não florestais em
todos os biomas brasileiros, colocando

26 ISTOÉ 2826 10/4/2024

 INÊS 249

A Frente Parlamentar Ambientalista

iniciou no começo do ano uma mobili-
zação de conscientização e esclareci-
mento a respeito dos riscos que os no-
vos projetos em análise na Câmara
podem trazer ao meio ambiente, mas
admite não estar sendo fácil enfrentar
o rolo compressor da bancada ruralista.
O projeto que permite desmatar vege-
tações nativas não florestais foi aprova-
do na CCJ por 38 votos contra 18, o que
mostra a força dos ruralistas. A expec-
PORTEIRA ABERTA tativa é de que haja uma resistência
Comissão de Constituição e Justiça maior no Senado. “Esse projeto pode
da Câmara, que hoje é presidida
pela deputada Carol de Toni abrir precedentes. O risco é ampliar a
(à esq.), aprovou a permissão flexibilização de leis ao ponto de colocar
de desmatamento em áreas
não florestais e avalia liberar áreas em risco para favorecer atividades
o garimpo em reservas econômicas em áreas de preservação,
para não falar na questão da fiscaliza-
ção, que inibe o crime”, diz o deputado
por exemplo, colocam em risco as Nilto Tatto (PT-SP), coordenador da
florestas caso textos como o do PL Frente Ambientalista.
2.159/2021, que trata da Lei Geral do
Licenciamento Ambiental, sigam REAÇÃO
adiante. “Isso faz parte de uma suces- O garimpo em áreas de conservação
são de tentativas de abrandar, ao é outra preocupação grande dos ecolo-
longo das últimas duas décadas, o li- gistas. Aqui o temor é abrir mais prece-
cenciamento ambiental, que é um dentes para o desmonte de legislações
instrumento democrático instituído que são eficazes na preservação do
pela Política Nacional de Meio Am- meio ambiente. O relator do projeto,
biente (PNMA)”, escreveu Bocuhy. deputado Coronel Chrisóstomo (PL-
RO), afirmou em discurso no plenário
ROLO COMPRESSOR que a lavra garimpeira de pequeno
A Câmara analisa ainda textos que porte é compatível com as característi-
facilitam o garimpo em reservas, o que cas das reservas, o que é contestado
os ambientalistas afirmam ser uma pelos ambientalistas. Esse é um dos
grande ameaça até mesmo a aldeias pontos que Carlos Bocuhy apontou em
indígenas. Outro projeto prevê o afrou- relação ao licenciamento ambiental.
xamento de medidas preventivas de Para os parlamentares que tentam con-
combates a incêndios, com a subse- ter o avanço dos ruralistas, esse texto é
quente amenização das punições e a consumação da frase dita pelo ex-
multas. Os parlamentares discutem ministro do Meio Ambiente, Ricardo
também a flexibilização das Áreas de Salles, hoje deputado pelo PL-SP, de
Prevenção Permanente (APAs), a dimi- que o governo Bolsonaro iria “abrir a
nuição das taxas de controle e fiscaliza- porteira e deixar passar a boiada”, em
ção ambiental, que subsidiam o Ibama, alusão ao relaxamento das medidas
e a proposta que torna “a silvicultura protetivas. A Frente Ambientalista já
uma atividade sem impacto ambiental”, articula a reação aos ataques, contando
outro sinal que seria um grande retro- com a atuação da ministra do Meio
cesso na legislação. Ambiente de Lula, Marina Silva.

FOTOS: MICHAEL DANTAS/AFP; CÂMARA DOS DEPUTADOS; ALAN CHAVES/AFP 27

 INÊS 249
Brasil/Política

UMA
VITRINE
PARA 2026
Eventual cassação de Sergio Moro,
que uniu PT e PL contra ele,
abre mais um front na disputa eleitoral
que se dará entre os dois partidos
antagonistas, antecipando o
confronto de 2026: Michelle Bolsonaro
e Gleisi Hoffmann deverão se enfrentar
pela vaga do ex-juiz no Senado
Marcelo Moreira

A
gonizando, mas ainda sobrevi-
vendo, o senador Sergio Moro
(União-PR) é pivô de uma dis-
puta política que, em um pri-
meiro momento, uniu PT e PL
em torno do pedido de sua cassação em
uma luta pelos eventuais despojos do
outrora “herói” da Operação Lava Jato.
Mas a briga ganhou uma dimensão
nacional envolvendo as duas maiores
forças políticas do País. Os dois partidos
antagônicos contam os dias para uma
sentença que retire o ex-juiz do Senado
e começam, desde já, a elencar possíveis
candidatos à sua vaga, dando como
certa a cassação, que pode se consumar
nesta segunda-feira, 8. Caso ocorra o
afastamento de Moro, haverá uma elei-
ção suplementar ainda neste primeiro
semestre para a escolha do novo sena-
dor. Esse pleito extra ganha ar de uma
vitrine do embate nacional que aconte-
cerá em 2026, colocando frente a fren-
te um candidato petista contra um
bolsonarista. Não se descarta o enfren-
tamento entre a presidente nacional do
PT, Gleisi Hoffmann, e a ex-primeira-
-dama Michelle Bolsonaro.
As duas, contudo, terão que passar
por uma disputa interna em seus parti-
dos. Gleisi enfrenta a oposição do de-
putado Zeca Dirceu (filho do ex-minis-
tro José Dirceu) que também pretende
disputar a eventual vaga de Moro. Já a
esposa do ex-presidente terá que der-
rotar dentro do PL o ex-deputado Pau-
lo Martins, que ficou em segundo lugar
em 2022, perdendo a disputa com Moro
— e seria o candidato natural. Mas o
presidente nacional do PL, Valdemar
Costa Neto, já aventou a possibilidade
de lançar a ex-primeira-dama para ava-

28 ISTOÉ 2826 10/4/2024 FOTOS: MARCELO CAMARGO/AGÊNCIA BRASIL; MARCOS OLIVEIRA/AGÊNCIA SENADO;
FABIO RODRIGUES POZZEBOM/AGÊNCIA BRASIL; GUSTAVO BEZERRA; ERNANI OGATA/AGÊNCIA O GLOBO

ESPERANDO
PELA QUEDA
DO EX-JUIZ
ROSÂNGELA MORO
A mulher do senador é
deputada federal e
pretende ocupar o espaço
do marido
MICHELLE BOLSONARO
Sua indicação seria um
teste para avaliar suas
chances de disputar a
Presidência em 2026
GLEISI HOFFMANN
A presidente do PT pode apoiar
o PSB à Prefeitura de Curitiba em
2024 em troca do apoio pela
vaga de Moro
ZECA DIRCEU
O filho do ex-ministro José
Dirceu é deputado federal e
antagonista de Gleisi. Prega a
renovação do PT no Paraná
EMPATE O desembargador Luciano Carrasco Falavinha Souza votou contra
a perda do mandato: a decisão final só deve sair na segunda-feira, dia 8
liar seu potencial como candidata a
presidente em 2026, uma vez que seu
marido está inelegível. A mulher do
ex-juiz, a deputada Rosângela Moro
(União-SP), também está se habilitando
para a disputa e já está transferindo seu
domicílio eleitoral de São Paulo para o
Paraná. Além delas, outros personagens
da política paranaense prometem na-
cionalizar a eventual eleição suplemen-
tar. O ex-governador Roberto Requião
deixou o PT e acaba de se filiar ao nani-
co PRD. No MDB, o nome em alta é o
do deputado federal Sergio Souza.
Correndo por fora, pelo PP, aparece o
ex-ministro da Saúde e ex-deputado
Ricardo Barros, que foi líder do governo
Bolsonaro na Câmara.
GILMAR MENDES
Moro, no entanto, ainda tenta ganhar
fôlego e evitar a cassação no Paraná,
embora tanto o PT como o PL prome-
tam levar o caso ao TSE para sacramen-
tar a perda do mandato do rival. O ex-
juiz começou a ser julgado pelo Tribu-
nal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-
PR) nesta semana em Curitiba, respon-
dendo por abuso de poder econômico
na pré-campanha eleitoral de 2022,
quando teria gasto R$ 4,8 milhões além
do que a legislação eleitoral autoriza. A
votação, que foi suspensa por um pedi-
do de vistas, está empatada em 1 a 1 e
será retomada nesta segunda-feira, com
os votos de outros cinco juízes. O relator
do processo, desembargador Luciano
INÊS 249
Carrasco Falavinha Souza, votou contra
a perda do mandato e, portanto, pela
absolvição do ex-juiz, mas o desembar-
gador José Rodrigo Sade divergiu e
considerou como parcialmente proce-
dente o processo da cassação. Além
disso, votou pela inelegibilidade por
oito anos a partir de 2022. Ou seja, o
ex-juiz só poderá voltar a disputar uma
eleição em 2030.
Em meio à tensão, Moro foi ao STF
se encontrar com o ministro Gilmar
Mendes, um antigo desafeto e crítico
ferrenho da Lava Jato. O ex-juiz teria
pedido que Mendes mantivesse um
“canal aberto” ao diálogo. Mas a inicia-
tiva não parece ter sido bem-sucedida,
já que Gilmar voltou a criticar a atuação
de Moro quando era juiz e teria dito que
ele deveria aproveitar sua experiência
no Senado “para aprender”.
No TRE-PR, as ações ajuizadas pela
coligação do PT, PV e PCdoB desde o
início foram rechaçadas pela defesa do
senador. Em depoimento, ele desqua-
lificou as acusações e disse que os
partidos não comprovaram o abuso de
poder econômico. A situação do sena-
dor é considerada delicada. É consenso
que mesmo que ele saia vitorioso no
Paraná, dificilmente conseguirá rever-
ter o impeachment no TSE. Foi o que
aconteceu com o ex-procurador da
República Deltan Dallagnol, que foi
absolvido no Paraná por 6 a 0, mas
perdeu o mandato de deputado federal
no TSE pelo mesmo placar.
29
 INÊS 249

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 INÊS 249
Capa/Música Madonna escolhe a
praia icônica para
encerrar turnê mundial
que comemora seus
40 anos de carreira.
O evento movimenta
milhões de pessoas
e incrementa
o turismo e
a economia
do Rio de
Janeiro

Luiz Cesar Pimentel

32 ISTOÉ 2826 10/4/2024

 INÊS 249

GIGANTE
Cartaz da festa na praia promete transformar
Copacabana na maior pista de dança do
mundo na noite de 4 de maio

A
Prefeitura do Rio de Janeiro
trata o evento como um Ré-
veillon antecipado, com esque-
ma de segurança igual ao da
maior festa de final de ano do País. Mais de
um mês antes, os hotéis cariocas anunciam
taxas de reservas iguais às do Carnaval (en-
tre 80% e 90%) e trabalham com expectati-
va de lotação máxima. A Embratur (Agência
de Promoção Internacional do Turismo)
divulgou aumento de 27% no número de
turistas estrangeiros programados para
desembarcar na primeira semana de maio.
Companhias aéreas montaram bases tem-
porárias no Aeroporto do Galeão para darem
conta dos 170 voos extras programados.
Toda essa movimentação para atender

FOTOS: DIVULGAÇÃO; LEON NEAL/AFP; WAGNER MEIER/AFP; 33

DAVE HOGAN/AFP; REPRODUÇÃO

Capa/Música
ao maior show da artista mais bem-sucedida da
música, Madonna, que escolheu a praia de Co-
pacabana para encerrar sua comemoração de 40
anos de carreira, em 4 de maio. Será a quarta vez
que a rainha do pop se apresenta no Brasil. Caso
supere o público de 1,3 milhão dos Rolling Sto-
nes na mesma areia célebre, em 2006, ela pro-
tagonizará mais um recorde e superará a soma
de todos os 80 concertos anteriores da sua Ce-
lebration Tour, que passou pela Europa, pelos
EUA e fará escala no México antes daqui. É a
confirmação da Madonnamania, caso de amor
recíproco desde que ela surgiu, em 1983.
O fanatismo por Madonna não é exclusivida-
de brasileira, tanto que no dia em que datas e
ingressos da turnê foram disponibilizados, as
entradas esgotaram em 7 minutos em Paris, 10
em Amsterdã, 15 em Nova York e 20 em Londres,
o que fez com que aumentassem as 35 apresen-
tações iniciais para 51. Ela atrasou a tour ao
contrair uma séria infecção bacteriana no meio
do ano passado e, quando se recuperou, sua
agenda já tinha 80 shows. O último a confirmar
foi justamente o do Brasil.
INÊS 249
Tamanha devoção global tem a ver com a
condução da carreira da artista desde que surgiu
nos prolíficos anos 1980. Madonna é a matriz
do fenômeno da cultura de massa, que já tinha
seus representantes masculinos na música,
como Elvis Presley e os Beatles. No universo
artístico, há dois grupos protagonistas: clássicos
e pontuais. Os últimos tendem a ser mais co-
merciais, aproveitam uma trilha fértil e nascem
com data de validade. Já a estrela clássica é a
que perdura e se torna referência, com mistura
de pioneirismo, qualidade e originalidade, tor-
nando-se inspiração para os pretendentes se-
guintes. Nos anos 1980, quem atingiu esse pa-
tamar foram ela e Michael Jackson.
SWIFTERS
Atualmente, há fenômeno parecido com a
cantora Taylor Swift. Os seus números de con-
sumo e alcance, aliás, são maiores do que os de
Madonna, só que mais uma vez recorrendo ao
espírito de quatro décadas atrás, a construção
da carreira da rainha do pop foi tão mais lenta
quanto mais envolvimento conquistou de fãs,
que reproduziam a devoção pelos meios de
comunicação de massa. Na época, ela e Michael
Jackson eram figuras conhecidas por todas as
classes, credos e gerações, da avó à neta. Hoje,
a atual diva sobressai mais em faixa etária e CONTROLE
A rainha do pop
classe social específicas. “A Madonna perdura posa durante
porque ela é pioneira. Falava em sexualidade gravação de
quando isso era tabu. Deu início aos mega sho- campanha que
escreveu, estrelou
ws, circulava na moda, no cinema e quando e dirigiu
aparecia vinha com um elemento chocante
aliado a uma figura disruptiva”, diz Tiago Andra-
de, professor de Sociologia e coordenador de

CAMALEOA
LIKE A VIRGIN
No embalo de um dos
primeiros hits, ela lançou
a moda da noiva sexy,
que marcou os anos 1980

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Portugal, tinha familiaridade com a língua e

convidou Anitta para cantar com ela. A aproxi-
mação entre as duas ocorreu quando postaram
foto no camarim do Madison Square Garden, em
Nova York, onde a brasileira se apresentou. E
pouco depois, a diva pop postou uma das filhas
dançando música da carioca. “Tenho tantos fãs PRÍNCIPE
no Brasil, não podia só cantar uma música de DO ELECTRO
Portugal... Não há coincidências”, justificou o A leitora e o leitor
podem pensar que
dueto. No clipe da canção, há imagens do País e a foto abaixo é de
até da vereadora Marielle Franco. “Ela é irreve- Madonna. Não é.
Trata-se de seu fã
rente, brinca com a própria imagem e tem olhar Daniel Peixoto
sempre carinhoso com o Brasil. Além de uma (também ao lado)
postura nada colonizadora em relação ao Sul
global, o que a torna muito simpática a nós”, diz
Gisela Castro, pesquisadora em Subjetividade,
Comunicação e Consumo. “Ela namorou com o
DJ e modelo Jesus Luz e trabalha com brasileiros
em sua equipe há muitos anos, como o diretor

Ciências do Consumo da ESPM. “Sempre foi

vanguarda na sonoridade e introduziu de forma
especial gêneros underground em suas músicas
como referência, o que impulsionou hip hop e
eletrônico, por exemplo”, acrescenta o produtor
Rick Bonadio, principal revelador de talentos no
Brasil, como Mamonas Assassinas, Charlie Bro-
wn Jr., Rouge e NX Zero.
O desbravamento musical é a tinta da penúl-
tima carta de amor dela ao Brasil, antes da defi-
nição de transformar Copacabana na maior
pista de dança do mundo, como anota o cartaz
do show. Em 2019, no álbum Madame X, Ma-
SERTÃO POP
donna gravou a faixa Faz Gostoso, da funkeira Peixoto a conheceu ainda criança, em
portuguesa (nascida no Ceará) Blaya. Morava em Crato, no Ceará, e estará em Copacabana

LIKE A PRAYER AMBIÇÃO LOIRA

No final dos 1980, ela Em 1987, Madonna abraça
provocou a Igreja em o então prefeito de Paris,
música e videoclipe, Jacques Chirac, em evento
com cabelos escuros para as vítimas da AIDS

FOTOS: DIVULGAÇÃO;
JASON MERRITT/AFP;
DAVID CANTOR/AFP; 35
JEAN-LOUP GAUTREAU/AFP
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Capa/Música
de arte Giovanni Bianco. Tem conhecimento da
nossa cultura, é fã de Caetano Veloso, Lulu
Santos e adora Bossa Nova, como Astrud Gilber-
to. Além disso, também fala e entende muitas
palavras em português”, completa Rafael Arena,
presidente da mais antiga comunidade da can-
tora no País, Madonna Online.

O SERTÃO VIROU PISTA

O cearense Daniel Peixoto é exemplo do alcan-
ce e influência de Madonna por aqui. Ele nasceu
na época em que a artista explodiu e durante sua
infância, ela era das poucas que chegavam pelo
rádio ao município de Crato, no sertão do Estado,
onde morava. Fez aulas de canto, piano, teatro e
uma tatuagem da musa. Com a banda Montage,
tornou-se o príncipe do electro nacional, elogiado
pelo jornal inglês The Guardian e figurante de
playlist de Justin Timberlake. Mas a música que
primeiro alcançou um milhão de execuções foi
cover de La Isla Bonita, da cantora. Desde 2018,
quando ela completou 60 anos, Daniel alterna
show autoral com apresentação em homenagem
a Madonna. Ele só não esteve na estreia nos palcos
brasileiros da artista, em 1993, na tour The Girlie
Show (do álbum Erotica). Em 2008, na Sticky &
Sweet (do disco Hard Candy), e em 2012, acompa-
nhou de perto. “Na turnê MDNA (2012) cheguei à
tarde e a peguei passando o som, sem maquiagem,
FAMÍLIA
à luz do dia. Ela quis trocar ideias, aprender pala- No aniversário de 63
vras em português. E a vi ensaiar Vogue 12 vezes anos, posou com os
seguidas”, afirma. “Já estou me preparando para o seis filhos; (em sentido
horário) Lourdes Leon,
show no Rio. Protetor solar e chegar cedinho, pois Rocco Ritchie,
tenho certeza que ela vai ensaiar durante o dia.” David Banda, Mercy
James e as gêmeas
Certeza ainda não há referente a detalhes da Estere e Stella
festa no Rio. Existem especulações sobre a par-
ticipação de Anitta e sobre as costumeiras visitas
que faz às comunidades cariocas. Em 2009, ela SORORIDADE
Em 2018, com
foi ao Morro de Santa Marta, em Botafogo, para Anitta: “Sempre
levantar fundos à sua ONG, SFK (Success For bom topar com
amiga talentosa
Kids). Em 2012, assistiu ao projeto social Afro- e linda”, postou
Reggae em Vigário Geral. Lá, visitou a casa de Madonna
moradora e o local onde Michael Jackson gravou
o clipe de They Don´t Care About Us. Há sete

SUPER BOWL 2012 AERÓBICA

Em show de 13 minutos A fase de corpo mais
no intervalo do jogo de malhado de Madonna foi
futebol, a loira teve mais em 2005, quando lançou
audiIencia que a partida tributo à discoteca

FOTOS: REPRODUÇÃO INSTAGRAM @MADONNA;

JONAS ROOSENS/AFP; LEON NEAL/AFP;
36 ISTOÉ 2826 10/4/2024 THOMAS COEX/AFP; JOHN LAMPARSKI/AFP;
DIMITRIOS KAMBOURIS/AFP; ETHAN MILLER/AFP;
DAVE HOGAN/AFP
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anos, quando veio para o casamento de seu
empresário, Guy Oseary, com a modelo brasilei-
ra Michelle Alves, foi ao Morro da Providência
para conhecer o projeto social Casa Amarela.
É certo que neste encerramento de turnê
retrospectiva ela tocará seus principais sucessos.
Os shows costumam durar pouco mais de duas
horas, com roteiro bem amarrado. Após abertu-
ra com Nothing Really Matters, de 1998, vem um
bloco oitentista com Burning up, Holiday, Every-
body e Like a prayer. Com a filha Mercy James
ao piano, canta Bad Girl e emenda bloco anos
1990 — Vogue, Human nature, Bedtime story, Ray
of light e Rain. Vira cowgirl em Don’t tell me, toca
cover do clássico de Gloria Gaynor I will survive,
traz Like a virgin misturada a Billie Jean, de
Michael Jackson, e encerra com a ode a sí pró-
pria, Bitch, I’m Madonna, Celebration e Music.
ABERTA PARA BALANÇO
A fase revisionista da cantora não se restringe
à música. A turnê interrompeu o filme autobio-
gráfico que ela mesma dirige, Little sparrow
(Pequeno pardal). Retornou à gravadora Warner,
onde começou a carreira de 400 milhões de
álbuns vendidos e que cuidará do relançamento
de seu catálogo, com novas versões e material
inédito. Além disso, costuma levar quatro de
seus seis filhos ao palco durante os shows —
Mercy James toca piano, David Banda, violão, e
Lourdes Leon e Rocco Ritchie participam do
baile cenográfico em Vogue. As gêmeas Stella e
Estere, aos 12 anos, vão a alguns shows. Já os
pais da artista são exibidos em fotografias no
telão em Mother and father.
O balanço de carreira se reflete no palco. O
cenário é dividido em cinco partes que repre-
EMPODERADA
Na turnê Sticky
& Sweet, de
2008, um
trono no palco
mostrava que
ela seguia rainha
sentam zonas de Nova York, onde ela começou
a trajetória — Uptown, Downtown, Midtown,
East e West. Da clássica e transgressora apresen-
tação de Like a Virgin no MTV Music Awards,
de 1984, quando se vestiu como uma noiva sexy,
o enorme bolo de casamento decora uma área.
Há passarelas e plataformas espalhadas pelo piso
para que ela se aproxime do público, apareça e
desapareça em cena, e a reprodução de boate de
Manhattan que ela frequentava, Danceteria, na À MOSTRA
Em 2016, deixou nuas
qual se apresentou pela primeira vez. partes íntimas de seu
A estrutura será montada em frente ao Hotel corpo para protestar
Copacabana Palace, de onde serão instaladas contra etarismo
oito duplas de torres de retorno de som e vídeo,
com telões pela areia até a Avenida Princesa
Isabel, que separa a praia do show do Leme, a
650 metros de distância. Pela dimensão de pú-
blico esperada, a Prefeitura carioca optou por
reproduzir o esquema de segurança de sua
festa mais tradicional na praia, o réveillon. Após
a experiência ruim no ano passado de um show
do DJ Alok em Copacabana, marcado por arras-
tões e pela prisão de mais de 500 pessoas, a
polícia militar carioca instalou pontos de revista
com reconhecimento facial, detectores de me-
tais, torres de segurança e na virada de ano o
número de detenções baixou para 12. CYBER
“O Rio possui reputação internacional em Madonna sempre
brinca com looks
grandes eventos, sejam festivais de música como entre o retrô e
o Rock in Rio, sejam festas populares, como futurismo para
Carnaval e o Réveillon. Quando Madonna anun- não ser encaixada
em rótulos
cia o show, a resposta do turista estrangeiro, que
correu para comprar passagens, demonstra o
nível de confiança na cidade. Já há agências
estrangeiras organizando voos fretados”, afir-
mou o presidente da Embratur, Marcelo Freixo.
“A artista escolheu o Rio de Janeiro para esse
grande final de turnê. Vamos mostrar para o
mundo o impacto desse grande evento, aberto
ao público, realizado na Praia de Copacabana,
cenário que domina o imaginário global como
exemplo de beleza natural”, diz Luiz Oscar
Niemeyer, presidente da Bonus Track, respon-
sável pela vinda da cantora.

MET GALA 2016 ALFAIATARIA

Baile fashion, Foi o look do
que tinha como Grammy 2014,
tema A moda em quando promoveu
era de tecnologia, casamento coletivo de
realçou a ousadia 34 casais na premiação

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Comportamento/Educação

ESTUDANTES
BRASILEIROS
INVADEM A
ARGENTINA
Ausência de vestibular, vagas ilimitadas, qualidade
da educação e baixo custo de vida — pelo menos
até o início deste ano — são fatores que têm atraído
jovens às universidades do país vizinho Mirela Luiz

aumento no número de mília, mas vale a pena cada ano conclu-

O estudantes brasileiros na
Argentina é um fenômeno
que ganhou destaque nos
últimos anos. Só os alunos
que cursam Medicina, por exemplo,
quintuplicaram: passaram de quatro mil
para mais de 20 mil, em sete anos, de
2015 para 2022, último dado do governo
local. Na Universidad de Buenos Aires
(UBA), a de maior relevância no país,
9,5% dos alunos de graduação são es-
trangeiros. Na pós-graduação, que exige
cobrança de taxas, esse número é de
16,5% de acordo com o jornal La Nación.
A Argentina é considerada um país
bastante aberto a imigrantes. Segundo a
Constituição, gozam quase dos mesmos
direitos que os habitantes locais. Um em
cada quatro alunos de medicina é estran-
geiro (24%), incluindo peruanos e para-
guaios. “São sete anos longe da sua fa-
ído”, declara a estudante paulista Fer-
nanda Martins, aluna do terceiro ano do
curso de Medicina da Fundación Barce-
ló, em La Rioja.
Entre os motivos que levam os brasi-
leiros a escolher estudar Medicina na
Argentina estão a ausência de vestibular,
o número ilimitado de vagas, a qualida-
de da educação e os custos mais acessí-
veis, em comparação com o Brasil. “Hoje,
60% da minha sala é de brasileiros.
Acredito que, se mais estudantes tives-
sem acesso a informações sobre o curso,
haveria ainda mais brasileiros aqui”,
declara Fernanda. Segundo o último
levantamento feito pelo Itamaraty, cerca
de 65 mil brasileiros estudam Medicina
no Paraguai, Bolívia ou Argentina. Esse
número cresceu muito nos últimos anos
e já representa um terço dos estudantes
desse curso nas universidades do Brasil.

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No entanto, recentemente, o aumento
dos preços e a desvalorização do dólar
‘blue’ tem feito com que alguns repensem
essa decisão. Alguns até desistem do
curso. “A inflação é um problema real.
Hoje as frutas estão um preço, amanhã
custam o triplo. Isso acaba deixando a
vida mais cara, mesmo para quem recebe
em real”, diz Fabiana Fogaça Monteiro,
estudante do último ano de Medicina na
Universidad Nacional do Rosario (UNR).
Apesar dos desafios, como a barreira do
idioma e relatos de preconceito, muitos
brasileiros têm se adaptado à vida acadê-
mica argentina e encontrado formas de
SATISFAÇÃO
Tomás Henrique de Oliveira
Barros, aluno da Fundación
H. A. Barceló: vantagens
para brasileiros
FOTOS: ARQUIVO PESSOAL/DIVULGAÇÃO
COMUNIDADE
Fernanda Martins
(à dir., no
laboratório da
universidade)
e ao lado de
seus colegas
brasileiros, do
curso de medicina
(à esq.), realizam
atividades no
Dia Mundial do
Coração: amizades
que vão além da
sala de aula
se integrar à comunidade local. “No co-
meço foi muito difícil, porque não falava
o idioma, não conseguia entender. Hoje
já estou bem integrada. Tenho amigos e
um namorado argentino, me sinto um
pouco mais em casa”, afirma Fabiana.
ACOLHIMENTO
Associações atléticas, cervejadas e
outras atividades típicas do universo
nacional têm se proliferado nos arredo-
res dos campus argentinos, criando uma
atmosfera familiar para os estrangeiros.
“Fiz amigos no primeiro ano do curso e
nos tornamos uma família. Comemora-
mos a Páscoa, mas também festa junina
e outras datas típicas”, revela a forman-
da. No entanto, nem tudo são flores. A
exigência de fluência no espanhol, as
dificuldades nas provas orais e a incer-
teza em relação ao futuro profissional
fazem com que muitos se deparem com
INÊS 249
dilemas ao longo do curso. “Já havia
feito Biomedicina e pós-graduação em
Hematologia e Hemoterapia, na Unifesp.
Como já tinha mais idade, não quis fazer
cursinho para entrar na faculdade no
Brasil. A mensalidade custava na época
cerca de R$ 800, enquanto no Brasil era
cerca de R$10 mil. Por isso fui cursar
fora”, conta Thais Miranda Bresciani,
formada em 2018 pela Fundacion H. A.
Barceló, em Buenos Aires. Hoje ela é
médica e mora em Santos. Atua pelo
programa Mais Médicos, do Governo
Federal, porque ainda não conseguiu
fazer o Revalida. A decisão de perma-
necer na Argentina e exercer a profissão
ou voltar ao Brasil e prestar o Revalida
é um dos desafios que os alunos enfren-
tam ao final da graduação. “Não preten-
do voltar para o Brasil, mas para o
Chile, um dos países que reconhecem
nosso diploma”, explica Fabiana.
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 INÊS 249
Comportamento/Esporte

Mairiporã, capital
mundial do ciclismo
Cidade paulista na Serra da Cantareira recebe as maiores estrelas do mountain bike
olímpico e deverá atrair público de 30 mil espectadores Denise Mirás

LARGADA Mairiporã abre a temporada do mountain bike olímpico entre os dias 11 e 14 deste mês. Próxima etapa será em Araxá (MG)

P
ela beleza das trilhas na Serra da
Cantareira, mais o interesse da
Warner Bros. Discovery (WBD)
pela imensa audiência que o
mountain bike garante com os
brasileiros, Mairiporã foi escolhida para
cenário da abertura da Copa do Mundo
de XCO, a categoria olímpica dessa mo-
dalidade. São esperados 318 atletas, repre-
sentando pelo menos 25 países, para as
provas entre a quinta-feira 11 e o domingo
14, no Arena iMTB Bike Park. E as dispu-
tas não serão só pelo pódio, mas também
por pontos no ranking da Union Cycliste
Internationale, que determinam parte das
vagas para a competição em Paris. Com
tamanho interesse, os hotéis na cidade e
ainda em Atibaia e Bragança foram rapi-
damente ocupados, segundo Fabio Cal-
deo, responsável pela organização do
MTB Festival (já um “esquenta” neste fim
de semana) e também por essa primeira
etapa da World Cup Series 2024 da UCI.
Uma segunda onda de espectadores é
aguardada, para lotar acomodações da
Zona Leste de São Paulo e na cidade de
Guarulhos, porque ao menos 30 mil
pessoas devem acompanhar ao vivo os
melhores do mundo do mountain bike.
A modalidade foi criada por ciclistas
da Califórnia que, nos anos 1970, deixa-
ram velódromos e estradas para se aven-
turarem por trilhas, fomentando a produ-

40 ISTOÉ 2826 10/4/2024 FOTOS: ARENA IMTB/DIVULGAÇÃO; INSTA@AVANCINIMTB

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ção de bicicletas especialmente desenha-

das para terrenos acidentados, que se
tornou uma indústria de ponta em duas
décadas. Em Atlanta 1996, o MTB entrou
para o programa olímpico, atraindo fãs
das provas com obstáculos desenhados
na natureza, para saltos espetaculares em
pistas de seis quilômetros.
Mas, já pelos anos 1980, o brasileiro
Mazinho Bender se interessava pela no- BIKE PARK
Beleza da Serra
vidade, ao mesmo tempo em que prati- da Cantareira atrai
cava asa-delta e motocross na região de até 400 ciclistas
Mairiporã, e passou a improvisar bicicle- de mountain bike
a cada fim
tas para trilhas a partir de artigos em re- de semana
vistas de Tom Ritchey e Gary Fisher,
precursores no desenvolvimento de
componente em série para as bikes refor-
çadas. Hoje, segundo Fabio Caldeo, há
modelos de pelo menos R$ 100 mil para
competição e R$ 3 mil para lazer, que
contam com a Inteligência Artificial para
“ajustar” suspensões dianteiras e traseiras
durante o percurso, enviando dados a
celulares para análise posterior “do rolê”.
Depois de Bender, vários praticantes
de ciclismo começaram a se mudar para
a cidade e o “atestado” de Mairiporã como
capital do MTB no Brasil se deu com as
conquistas de seu morador Henrique
Avancini, duas vezes campeão mundial NA PONTA
na categoria maratona (não-olímpica) — Humberto Avancini
em Val di Sole, na Itália, em 2018, e em (à esq.) se tornou
consultor técnico
Glasgow, na Escócia, em 2023. Aposen- das pistas do bike
tado, o ciclista se tornou consultor técni- park de Fabio
Caldeo
co para a construção das mais recentes
das 12 pistas do bike park, que recebe de
300 a 400 dos cerca de mil ciclistas que
circulam pela cidade a cada fim de sema- 68% da audiência internacional e coloca Apenas da WBD vêm 800 pessoas
na (Caldeo calcula um total de dois mi- o Brasil como grande consumidor de para a transmissão das competições de
lhões de praticantes de MTB no País). MTB, como observa Fabio Caldeo. Daí a uma modalidade que tem o suíço Nino
decisão da UCI de abrir seu calendário Schurter e a holandesa Puck Pieterse na
O BRASIL NA FITA para etapas aqui no País de sua Copa do liderança dos rankings mundiais mascu-
Foi justamente o interesse dos brasi- Mundo (a World Cup Series). E, para lino e feminino do XCO. Mas os brasileiros
leiros pelas transmissões de mountain “compensar” a vinda à América do Sul, terão a oportunidade de ver de perto as
bike da Red Bull TV que chamou a depois da abertura do circuito em Mai- estrelas do MTB internacional antes da
atenção da UCI. Nada menos que 1,6 riporã já haverá a segunda etapa, na Olimpíada de Paris. Lá, as provas em 28
milhão desses telespectadores acompa- mineira Araxá (de 19 a 21 de abril) — os e 29 de julho serão na Colline d’Élancourt,
nha o MTB Festival, realizado anualmen- ingressos, assim como vales de estacio- região mais alta dos arredores da capital
te em Mairiporã com o Campeonato namento, devem ser comprados anteci- francesa — e também conhecida como
Paulista incluído, o que corresponde a padamente pelo site mtbfestival.com.br. “A Colina da Revanche”.

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Comportamento/Regional

CENTENÁRIO
Maracatu Cambinda
Brasileira: caboclos de
lança são destaque
na expressão de
origem rural

Patrimônio
pernambucano
S
e você chegar ao Nordes- Maracatu e ciranda são pessoas na maior empatia. O ritmo do
te sem conhecer nin- maracatu é alucinante, e ele é importan-
guém e entrar em uma
declarados bens imateriais te porque faz o resgate de uma ancestra-
roda de ciranda, você já do Recife e reafirmam lidade”, afirma Iêdo Paes, professor na
dá as mãos e começa a importância das Universidade Federal Rural de Pernam-
dançar na mesma alegria buco e integrante do Maracatu Fantásti-
e balanço”, diz Anderson Miguel, mestre manifestações para co A Cabra Alada. Três das manifestações
do Maracatu Rural Cambinda Brasileira, cultura, renda e educação culturais mais relevantes e integradoras
cirandeiro, cantor e compositor. “Nós de Pernambuco, a ciranda, o Maracatu
da sociedade
vamos passando nas festas de rua, prin- de Baque Solto e o Maracatu de Baque
cipalmente no Carnaval, e vemos as Ana Mosquera Virado, acabam de ser reconhecidas

42 ISTOÉ 2826 10/4/2024 FOTOS: TARSIO ALVES; CARLOS ALBUQUERQUE;

PREFEITURA DO RECIFE/DIVULGAÇÃO

como Patrimônio Cultural Imaterial do Recife, o que deve
resultar em um maior reconhecimento da impor-
tância cultural e religiosa das tradições locais.
Em decorrência de projetos de autoria do
vereador Almir Fernando (PSB), sancionado
pelo prefeito João Campos (PSB), ainda
foi instituído o Dia Municipal do Mara-
catu de Baque Solto em 12 de novem-
bro. O maracatu já é Patrimônio Vivo
de Pernambuco desde 2005 e Patrimô-
nio Cultural Imaterial do Brasil há dez
anos, enquanto a ciranda recebeu o título
nacional pelo Iphan em 2021. “O recebimen-
to de títulos e o reconhecimento como patri- Sua difusão entre
mônio, tanto local quanto nacional, fortifica
a difusão dos ritmos dentro do nosso estado
as secretarias
e do Brasil”, diz Paes. de educação
Desde a Constituição de 1988 são conside- e cultura é
rados bens culturais de natureza imaterial “as importante
práticas e domínios da vida social que se
manifestam em saberes, ofícios e modos de
para que sejam
fazer; celebrações; formas de expressão cêni- inseridos em
cas, plásticas, musicais ou lúdicas; e nos luga- novas pastas
res”, segundo o site do Instituto do Patrimônio Iêdo Paes, integrante
Histórico e Artístico Nacional (Iphan). No País, do Maracatu Fantástico
há as baianas do acarajé (Iphan), o artesanato
em barro do Vale do Jequitinhonha (Governo
do Estado de Minas Gerais) e as paneleiras de Goiabeiras, recen- universo que ainda é majoritariamente masculino.
temente contempladas pelo Governo do Estado do Espírito
Santo. “São culturas que geram renda para a comunidade. RAÍZES PARA O MUNDO
Conseguimos tirar muitas crianças da rua ao levá-las para o De extrema importância para o estado, há diferenças
EM RODA Espontânea e democrática: tradição que une integrantes e turistas
reafirma o lugar da rua como palco para os cirandeiros
INÊS 249
maracatu. Damos oficinas, como aulas de percussão e
de bordado para as fantasias, mesmo com todas as
dificuldades. Além de incentivá-los a ir à escola,
cresce o senso de responsabilidade e compro-
misso”, diz Anderson Miguel.
Há 20 anos inserido no cotidiano
das atividades, ele reitera a impor-
tância do reconhecimento, da desti-
nação de recursos financeiros e da
inserção da cultura popular nos even-
tos municipais. “A validação é muito im-
portante não só para maracatu e a ciranda,
mas para o todo o segmento cultural, que
engloba manifestações como o coco de roda
e o cavalo-marinho.” São quase 150 grupos
de maracatu no estado, segundo dados do
Iphan e da Associação dos Maracatus Nação
de Pernambuco (Amanpe). Apenas em Na-
zaré da Mata, a 70 km de Recife, considera-
da “a capital dos maracatus”, há 18: um
deles é a Cambinda Brasileira, o mais antigo
em atividade em Pernambuco, e o Maraca-
tu Feminino Coração Nazareno, de forma-
ção feminina. Sua Mestra Gil, falecida em
fevereiro, foi a primeira mulher a chefiar um
maracatu rural e a cantar sobre a igualdade
de gênero e questões ambientais em um
entre cada maracatu e a ciranda. Além das
características sonoras, o Maracatu de Ba-
que Solto tem origem na zona rural, com
os escravizados nas plantações de cana-de-
açúcar, e seu personagem mais importante
é o caboclo de lança. Já o Maracatu de Ba-
que Virado está mais ligado à área urbana,
também tem raízes africanas e, em suas
apresentações, um cortejo real desfila na
companhia de um grupo percussivo. De
origem portuguesa, a ciranda chegou a
Pernambuco na década de 1960 e reúne
dança, música e canto. Todos, porém, via-
jam o Brasil e o mundo e contam com forte
representação no eixo Sul-Sudeste. “A
desterritorialização da manifestação cultu-
ral requer um olhar apurado e um cuidado
de quem está à frente para apresentar a
tradição de maneira genuína, de acordo
com suas origens”, diz Paes.
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Comportamento/Gastronomia

Balcão
acolhedor
O lugar onde anteriormente as pessoas se aglomeravam nos restaurantes à espera de
uma mesa torna-se, cada vez mais, um prazeroso ponto para beber, almoçar ou jantar
— onde é possível manter-se em silêncio, conversar com quem se acabou de conhecer
e ver o chef no preparo dos pratos Ana Mosquera

E
m busca de experiências inti-
mistas, uma vez que o cliente
pode ficar próximo do chef de
cozinha, muitas pessoas vêm
ocupando lugares nos balcões
de restaurantes não apenas à espera de
uma mesa. “O que sempre foi comum
em lanchonetes e bares começa a ser
disputado nos restaurantes como lugar
privilegiado de serviço especializado”,
diz Raphael Hoelz, chef executivo e
diretor de alimentos e bebidas do Grand
Hyatt Rio de Janeiro. No restaurante
Shiso, no interior desse hotel, o balcão
é formado por pedra e madeira — não
importa seu formato ou comprimento,
a madeira é de uma mesma árvore.
Apesar de já tradicional em restaurantes
japoneses, Hoelz admite o aumento da
disputa pelos balcões. “Não existe nada
mais prazeroso do que se sentir parte
de algo e desfrutar de um jantar acom-
panhando cada etapa e tornando tudo
mais inesquecível”, diz o chef Uilian
Goya, do Goya Zushi, em São Paulo.
Os cozinheiros se beneficiam dessa
tendência, ao mesmo tempo em que
veem suas cozinhas ainda mais expos-
tas — os balcões costumam dar de

44 ISTOÉ 2826 10/4/2024


INTERAÇÃO O Nelita, na capital paulista, da chef Tássia Magalhães: menu
degustação preparado diante do cliente permite que ele participe da operação
frente para elas. “Pensar no conforto é
importante, pois é preciso trazer uma
experiência prazerosa para os clientes,
que passam a integrar a cozinha e o bar,
e estar sempre atento aos barulhos, co-
municação e temperatura”, diz Danyel
Steinle, sócio e sommelier do Nelita, na
capital paulista, onde o balcão é reserva-
do ao menu degustação. O ambiente em
torno do balcão passa a ser melhor pen-
sado, com bancos confortáveis, luzes,
decoração e até música personalizada.
“A luz não pode ser direta no cliente
porque ele precisa ver a comida e, se
quiser, as outras pessoas. É como se você
estivesse sentado olhando para um
palco onde, por três horas, uma peça
estará acontecendo”, diz o chef Thomas
Troisgros, do restaurante Oseille, no Rio
de Janeiro. A inspiração veio dos japo-
neses, mas também do Chef’s Table at
Brooklyn Fare, em Nova York, e do Ki-
tchen Table, em Londres.
ESTRELA PRINCIPAL
O Bar Balcão, em São Paulo: com
projetos de Fernando Villan e Paulo
Fecarotta, estrutura de 25 metros
é disputada pelos clientes habitués
FOTOS: ROGERIO CASSIMIRO
INÊS 249
“Uma das vantagens dos
balcões é deixar o cliente
em contato com o chef.
Conversa-se sobre tudo
e, é claro, fala-se, e muito,
de temas gastronômicos”
Thomas Troisgros, chef de cozinha
É fato que diversos restaurantes atu-
almente valorizam os benefícios dos
balcões, mas é fato também que eles já
fizeram histórias em restaurantes e bares
tradicionais É o caso dos paulistanos
Izakaya Kintaro (bar japonês), da famosa
Leiteria Ita, frequentada por acadêmicos
e intelectuais, que serve prato feito no
centro da cidade. Podemos lembrar
ainda do charme do extinto Longchamp.
Segue mais vivo do que nunca e borbu-
lhando até altas horas da noite o Bar
Balcão, que fez da estrutura de 25 metros
de comprimento um “personagem da
boemia intelectual paulistana” nas pala-
vras do jornalista e cronista Gilberto
Dimenstein, já falecido, em texto come-
morativo aos dez anos do local.
Aberto há 30 anos, o estabelecimento
gira em torno da estrutura tortuosa cer-
cada por 60 lugares (além do mezanino).
O sócio Francisco Villan reconhece que a
proposta à época foi ousada (e até mesmo
questionada por colegas cariocas). “Eles
falavam ‘o que esse bar carioca está fazen-
do em São Paulo?’ Porque o carioca tem
esse trânsito de sair da praia, tomar uma
cerveja no balcão, conversar. Mas o Bar
Balcão veio para provar que os paulista-
nos também interagem entre si.” A prin-
cipal instituição que inspirou Villan foi a
padaria. “Lá é onde acontece de tudo. As
pessoas fazem piada, discutem política e
futebol. O balcão de padaria é um agrega-
dor de bairro.” No Bar Balcão os pratos
podem ser compartilhados e os sanduí-
ches também são servidos como aperiti-
vo. “Eu vejo mais como um acontecimen-
to social, porque as pessoas vêm até aqui
para viver uma parte das suas vidas e não
apenas para se alimentarem.”
45

Comportamento/Ciência
Impressão
animal
Tecnologia que cria órgãos e tecidos em impressoras
3D começa a atuar em benefício da proteção dos
animais; material criado serve para testes de segurança
e até para substituir carne Luiz Cesar Pimentel
A
impressão de órgãos em 3D cresceu,
ganhou funcionalidades além de
enxertos humanos e alcançou a
proteção animal. Com a evolução da
tecnologia, tecidos de pele, intestino e
fígado passaram a protagonizar testes de
segurança da indústria de cosméticos e
até manipulação de alimentos para con-
fecção de substitutos da carne nos cres-
centes mercados vegetariano e vegano.
Em operação no Brasil, um aparelho
semelhante a uma antiga fita cassete re-
serva espaço para os tecidos humanos
reconstruídos, onde são nutridos com
46 ISTOÉ 2826 10/4/2024
IMERSÃO
O fígado recriado
é produzido
com células
mergulhadas
em agarose
líquido que simula corrente sanguínea. A
partir da composição, farmacêuticas ava-
liam a toxicidade de produtos em desen-
volvimento sem a necessidade antiga e
cruel de teste na prática em animal vivo.
O dispositivo tem o nome de body-on-a-
-chip (BoC). Essa é a mais promissora das
técnicas que substituem os testes de se-
Técnologia testa a criação de filés de peixe a
partir de farinha de soja, feijão e grão-de-bico.
A ideia é criar opções para os mercados
vegetariano e vegano
INÊS 249
gurança e eficácia de produtos de beleza,
higiene e perfumes com cobaias animais,
proibidos desde março do ano passado.
Os tecidos recriados também evolui-
ram na capacidade de reproduzir fun-
ções dos órgãos originais — as células
do intestino apresentam capacidade de
formar barreira com camada externa
(epitélio) e liberação de muco, enquan-
to o fígado produz bile, responsável
pela absorção de gorduras, e realiza
processo de desintoxicação.
Já a Embrapa Recursos Genéticos e
Biotecnologia começou usar a técnica
do 3D em testes de transformação de
produtos vegetais, como farinha de soja,
feijão e grão-de-bico, em filés de peixe.
A ideia é expandir para criar opções para
os mercados vegetariano e vegano.
IMPRIMINDO ÓRGÃOS
A reprodução de tecidos segue o prin-
cípio da impressão 3D tradicional para
recriação de organismos vivos. Em vez do
material plástico injetado para confecção
de objeto, como no processo convencio-
nal, utiliza-se seringa, que deposita mis-
tura de células com solução de colágeno
sobre placas apropriadas. O computador
transmite à impressora coordenadas de
dimensão e formato do órgão ou tecido,
que é construído em camadas.
O intestino, por exemplo, fica nos
compartimentos da placa, que é man-
tida em incubadora a 37ºC durante 21
dias. É o período necessário para que as
células formem a barreira intestinal, que
absorve nutrientes e produz muco. As
células de pele ficam 10 dias em incu-
bação para adquirirem formato defini-
tivo. Já os tecidos de fígado são produ-
zidos manualmente com células mer-
gulhadas em solução de agarose. Ficam
cinco dias na incubadora até que for-
mem agregados circulares.
FOTO: FAPESP/DIVULGAÇÃO
INÊS 249
 INÊS 249
Comportamento/Decoração

ESPECIALISTA A personal organizer Sheila Marques: transformação daquilo que incomoda as pessoas e mais funcionalidade no dia a dia

ORGANIZAR
É O NEGÓCIO
Em casa ou no escritório, estudos estudo Personality and Social Psychology Bulle-
apontam que manter os objetos no lugar
e dar o destino correto a cada um deles
está diretamente ligado à saúde mental.
Profissionais aplicam técnicas específicas
para deixar os ambientes em ordem —
O tin, publicado pela consultoria internacional
SAGE, apontou que pessoas que consideram a
própria casa bagunçada demais têm mais ten-
dência ao cansaço ou depressão. Outra pesqui-
sa da empresa sobre comportamento concluiu que uma co-
zinha mal organizada resulta em más escolhas alimentares.
Já o relatório do The Journal of Neuroscience, da Sociedade
e a vida das pessoas mais leve Norte-Americana de Neurociência, sugere que “organizar o
Ana Mosquera ambiente pode aumentar a capacidade mental”.

48 ISTOÉ 2826 10/4/2024 FOTOS: CLAUDIO GATTI; DIVULGAÇÃO

 INÊS 249

“Aproveitei para tirar o que não

usava e enviei tudo para doação.
Uma organização profissional
tem um impacto muito positivo”
Mônica Francisco Pereira, empresária

Organizar a vida e os ambientes de convivência,

na casa ou no trabalho, não é tarefa fácil. Falta
tempo, incentivo e, muitas vezes, conhecimento.
Com a popularização do home office, a situação
ficou ainda pior: é por isso que, cada vez mais,
pessoas vêm procurando especialistas conhecidos
como personal organizers para dar um jeito na
vida. Nos EUA, o mercado movimentou mais de
US$ 10 bilhões em 2020, segundo a publicação A
Casa Minimalista, de Joshua Becker. No Brasil,
estima-se que cerca de três mil profissionais ofe-
recem esse tipo de serviço, de acordo com dados
do congresso Personal Organizer Brazil.
Com especialização em organização pós-
-mudança pelo Senac, Sheila Marques iniciou a
carreira há sete anos. Sua base é no Rio de Ja-
neiro, mas atua em outros estados e até fora do PRIORIDADE O relações públicas Márcio Vieira: mudanças
País. Hoje já soma mais de 200 clientes, além levaram à economia de tempo e rotinas mais dinâmicas
de mentorias, consultorias, aulas, palestras e
workshops sobre o tema. Casas, ambientes
corporativos e até containers de figurinos de artistas entram CASA E MENTE SÃ
nessa conta, além de enxovais de bebê e mudanças de re- Há 13 anos a especialista em organização pessoal Marie
sidências. Antes voltado apenas à classe A, o mercado vem Kondo lançava o livro A Mágica da Arrumação. Na última
mudando. “É como o personal trainer”, compara Sheila. década, o aumento de programas e documentários sobre
“Minha proposta é levar a organização para todo mundo, o assunto — Santa Ajuda (GNT) e The Minimalists e Ordem
transformando o que incomoda a pessoa e aplicando fun- na Casa com Marie Kondo (Netflix), entre outros — insti-
cionalidade ao dia a dia do cliente.” Ela atende desde pe- gou a curiosidade de um público ainda maior. Pessoas
quenos apartamentos a residências que possuem um closet como a empresária Mônica Francisco Pereira, que recebe
por morador. “É tudo personalizado”, define. a visita de Sheila a cada três meses: “Ela organiza minha
Formada em psicologia, a profissional explica que há quatro mente e minha vida, assim consigo manter tudo mais
etapas no processo. A seleção do que fica ou sai — decisão harmônico”, diz ela. Graças à rotina dinâmica, Márcio
sempre tomada em conjunto com o cliente —, categorização, Vieira, relações públicas internacional, também apostou
organização e identificação. “A casa passa a transmitir leveza no trabalho da personal organizer. “O que eu levava três
e paz. Não é raro ouvir os clientes dizerem que parece que horas, hoje faço em dez, quinze minutos. E fica perfeito”,
tirei um peso da vida deles”, diz ela. Sheila lembra ainda que afirma o RP. Ele recomenda o serviço para todos. “Nessa
beleza é fundamental: a disposição das cores em um guarda- correria da vida moderna, ter tempo é fundamental. É um
roupa, por exemplo, é essencial para um resultado satisfatório. tipo de trabalho que deveria estar no topo da lista de
“Já atuei na casa de acumuladores e fiz palestras abordando a prioridades de qualquer pessoa.”
importância de manter o ambiente clean para reduzir a ansie-
dade e aumentar o bem-estar. A transformação é enorme: ver
um lar organizado é como pintar uma tela em branco. É pre- Para saber mais acesse o perfil no Instagram:
ciso respeito e cuidado no atendimento, pois são os objetos @POSSIVELPRAVOCE
de outra pessoa, seus documentos, suas lembranças”, diz ela.

49

Comportamento/Tendência
Comidas
do fim do
mundo
Os kits de alimentos para bunkers
apresentados pela indústria como
soluções para o caos se baseiam
no medo, mas em um suposto
planeta pós-apocalíptico as saídas
não seriam pelo individualismo,
e sim pelo compartilhamento
e cooperação Denise Mirás
P
ara um planeta retratado em filmes
e discursos fanáticos como à beira do
caos, destruído por extremos climá-
ticos, pandemias e guerras, os kits de
comidas para o pós-apocalipse andam
florescendo entre consumidores, princi-
palmente dos EUA. Não apenas alimentos
muitas vezes ultraprocessados — o opos-
to dos frescos e saudáveis — mas também
latas e vidros para conservas e até cons-
trução de bunkers em casas fazem parte
dos negócios. Ofertas desses kits para o
fim do mundo se espalham em sites,
muitos deles ligados a extremistas, com
cardápios e preços variados, por ordem
de validade para armazenamento, e que
vão de manteiga de amendoim a atum
enlatado, de feijões a leite em pó. A Te-
chnavio, agência de análise de mercados,
prevê aumento de US$ 3,20 bilhões
nesse setor até 2028, com potencial de
retorno calculado em 7,35%. A questão é:
além dos investidores que apostam no
medo do caos, os consumidores desses
kits têm algum ganho no mundo real?
50 ISTOÉ 2826 10/4/2024
NO LUCRO Muitos dos caros kits para estocagem ainda embalam
comida ultraprocessada, o oposto do saudável
A resposta é negativa para a nutricio-
nista Karine Durães, especialista em
comportamento alimentar, e para o
psiquiatra Filipe Doutel. As saídas para
um suposto planeta pós-apocalíptico
não estariam no individualismo, e sim
no compartilhamento. Ninguém, ou
nenhuma família, sobreviveria apenas
com a própria comida em meio a cida-
des em ruínas se não houvesse um
trabalho de reconstrução com a coope-
ração de todos.
“Ninguém sobrevive
só de comida. Precisa
de gente ao redor”
Karine Durães, nutricionista
“Na verdade, já estamos destruindo o
planeta, por escolhas do dia a dia. Não
acredito em estocar alimentos e se man-
ter distante da realidade da fome: quem
não come nem hoje, não tem tempo de
guardar comida”, diz Karine, lembrando
INÊS 249
que “esperar o pior tira a pessoa do pre-
sente; ela se prepara para o abstrato,
deixando de lado o agora”. Essas neuro-
ses inclusive induzem à ansiedade e à
compulsão por comer, como explica a
nutricionista. Para ela, ao contrário do
individualismo, alimentação tem a ver
com troca, inclusive no preparo. “E nin-
guém sobrevive só de comida em um
bunker. Precisa de gente ao redor.”
Filipe observa que já vivemos em
condições ambientais mais extremadas
e pandemias mais frequentes. “Não é
ficção científica, é realidade. E se fechar,
estocando comida em um bunker, não
serve de nada”, afirma. Essa sensação de
Apocalipse, segundo o psiquiatra, é ali-
mentada pelo medo e pelo ódio, senti-
mentos primitivos, instintivos, ao con-
trário de amor e tristeza, que são mais
elaborados. “É preciso sair dessas estru-
turas toscas, preto ou branco, compran-
do armas ou ‘se armando’ de comida”,
assinala. “Para dificuldades coletivas, as
soluções têm de ser coletivas.”
FOTO: DIVULGAÇÃO
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Gente
por Ana Mosquera

Vale a pena
ver de novo
Ao interpretar Mariana no
remake da novela Renascer
(Globo), Theresa Fonseca passa
por cima das críticas, assim
como Adriana Esteves, a atriz
da versão original. Os desafios
vão além de ser reconhecida
como a personagem polêmica
que se envolve com pai e
filho por desejo de vingança.
“Mariana é fiel ao que sente,
mas inconsequente quando
se relaciona com as pessoas.
Apesar disso, eu a defendo
com unhas e dentes.” Antes do
horário nobre, ela passou pela
novela das 18h Mar do Sertão e
gravou Guerreiros do Sol, aposta
da Globoplay para 2025.

Intimidade familiar
Marcado pela versatilidade e por seus recém-completados 53 anos, o ator
Ewan McGregor estreia na série A Gentleman in Moscow (Paramount),
ao lado da esposa Mary Elizabeth Winstead. A novidade da vez é que os
dois contaram com um coordenador de intimidade para as cenas de sexo.
“Se você estivesse fazendo uma cena de dança, teria um coreógrafo”, disse
o ator ao Radio Times, após reiterar a importância do profissional, sobretudo
para o trabalho de jovens atores. Para o ano que vem, ele anunciou o lançamento de
um suspense em que contracena com Anne Hathaway.

54 ISTOÉ 2826 10/4/2024 FOTOS: THEREZA HELENA/DIVULGAÇÃO; THENEWS2, M10S/NURPHOTO/AFP

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De casa nova
Conhecido por ter reerguido a Gucci, triplicando
seu faturamento em oito anos e reconquistando o público
jovem com uma estética de brechó, Alessandro Michele
acaba de assumir a direção criativa da também italiana
Valentino. No backstage do mundo da moda não faltam
especulações sobre o que a chegada do profissional
representará para uma marca tão sólida da alta
costura. Os curiosos terão que esperar até a coleção
de primavera-verão, em setembro, para vislumbrar
os primeiros resultados da saída de Pierpaolo Piccioli,
que estava na casa desde 1999.

Sem comodismo Quem sabe faz ao vivo

Após viver um gay A cantora e compositora LARA,
conservador na premiada filha do apresentador Fausto Silva,
A Herança, Reynaldo dá início a novo projeto musical,
Gianecchini voltará ao de nome ainda não revelado.
teatro em junho, como Além de “dar nova cor” àsmúsicas
Mitzi/Tick no musical do EP Faíscas, lançado no final
Priscilla, Rainha do Deserto. de 2023, ela apresentará
Para viver a drag queen, ele regravações de Lana Del Rey,
vem encarando aulas de Marisa Monte, Billie Eilish
canto e dança de maneira e Adele. “Ouvir versões ao vivo
intensiva, além de críticas ou acústicas dos meus artistas
por não ter afinidade com preferidos sempre me
o universo. “Hoje em dia, fascinou,” disse à ISTOÉ.
penso muito em me Com lançamento previsto para
desafiar em lugares em que maio, o projeto audiovisual
ainda não me aventurei. Isso tem menos a ver com gravado no estúdio Trama
o personagem e mais com outras formas de atuação NaCena tem foco na
em novas narrativas.” Nos cinemas, o ator é o cenografia. “Esses formatos
protagonista do lançamento Uma Família Feliz, mais genuínos têm um pulso
em que vive um pai de três filhos e marido da diferente das produções e
personagem de Grazi Massafera. gravações de álbum normais.”

A voz das multidões

Depois de dois anos da sua última visita ao Brasil,
a cantora e multi-instrumentista Corinne Bailey
Rae anuncia duas datas de apresentações no País,
em Porto Alegre e São Paulo. A compositora tem na
conta dois Grammys e dois MOBO, prêmio britânico
voltado para a música de origem negra, além de uma
série de indicações em listas de jornais renomados,
como o The Guardian. No repertório dos shows estão
faixas do álbum mais recente, Black Rainbows, e
clássicos como Put Your Records on, que já atingiu a
incrível marca de quase 700 milhões de reproduções
nas plataformas de streaming.

FOTOS: @ALESSANDRO_MICHELE; @REYNALDOGIANECCHINI; KIMBERLY KOECHE; @CORINNEBAILEYRAE 55

 INÊS 249
Economia/Energia

CONCESSIONÁRIAS
NA MIRA
Após uma sequência de apagões
na maior cidade do País,
o Ministro de Minas e Energia
promete medidas mais duras
contra a distribuidora Enel.
Aumento nas reclamações no País
mostra que cresce a insatisfação
com os serviços Mirela Luiz

N
a segunda quinzena de março, a
maior metrópole do País teste-
munhou um fenômeno que
cresce no País: a deficiência no
serviço de concessionárias, que
tem indignado a população e agora final-
mente mobiliza as autoridades. Na época,
uma série de apagões atingiu São Paulo.
Foram dias e dias de falhas no forneci-
mento de energia — sob responsabilidade
da Enel, concessionária italiana com
contrato até 2028. Os casos se somaram
ao apagão registrado meses antes, em
novembro do ano passado, quando dois
milhões de clientes ficaram no breu de-
pois de um temporal. Para além dos
apagões, a Enel registrou 340 mil quedas
de energia não programadas em 2023, o
que equivale a uma interrupção a cada
um minuto e meio, afetando mais de 35
mil clientes, uma alta de 37% em relação
à média dos anos anteriores.
Os números oficiais atestam a irritação
crescente dos clientes. No ano passado, a
Agência Nacional de Energia Elétrica
(Aneel) recebeu 68 mil reclamações de
falta de luz no País, número 48% maior
que o ano anterior e 130% maior que 2018.
Em 2024, só nos três primeiros meses, os
registros cresceram. Se a média de queixas
por mês for mantida, haverá um novo
recorde. A insatisfação popular está pro-
vocando reações. O Tribunal de Contas do
Município já tinha criado um grupo de
estudo para analisar o contrato com a Enel
e agora o ministro de Minas e Energia,
Alexandre Silveira, formalizou o pedido
de um processo disciplinar para tirar a
concessão da empresa.
Mas há dúvidas se a iniciativa terá o
potencial de tirar a concessão da Enel em
São Paulo, ainda que a companhia já tenha
perdido seu contrato em Goiás após pres-
são do governo local, que também se
queixava dos serviços prestados. “Cassar
uma concessão não é tão simples como
parece. Há contratos, normas e o interes-
se público”, alerta o advogado especiali-
zado em Direito do Consumidor Paulo
Akiyama. Caso a Aneel decida pela cassa-
ção da concessão da Enel, isso significaria
que a empresa perderia o direito de operar
no estado e teria que devolver a concessão
para o governo. Mesmo que o desfecho
mais extremo não se concretize, analistas
apontam que o endurecimento do órgão
regulador já pode surtir efeitos positivos.
“As medidas que a Aneel venha a tomar
contra a Enel podem dar um recado às
concessionárias de serviço público, sobre-
tudo as de energia. O impacto também
pode motivar algumas revisões da lei e
aprimoramentos”, afirma Rafael Marinan-
gelo, especialista em licitações, contratos
e infraestrutura.
A Associação Brasileira de Distribuido-
res de Energia Elétrica (Abradee) afirma
que apesar dos problemas recorrentes
houve investimentos de R$ 31 bilhões em
distribuição no ano passado, o dobro de
2020. “Ressaltamos a responsabilidade
das companhias de estarem atentas aos
desafios, buscando junto com outros

56 ISTOÉ 2826 10/4/2024 FOTOS: MARCO ANKOSQUI; ROBERTO SUNGI/ATO PRESS/AGÊNCIA O GLOBO; MARK FELIX/AFP

segmentos da sociedade as respostas
adequadas”, diz a entidade em nota. Esses
números não atenuaram a indignação
demonstrada pelo ministro – que está
alinhado com o discurso do presidente
Lula, crítico das privatizações. Ele tem
criticado constantemente os contratos
REPAROS atuais com as distribuidoras de energia,
Funcionário classificando-os como “frouxos” e dizendo
da Enel faz
reparo da que não atendem às necessidades básicas
rede elétrica dos consumidores. “O ministro pode
durante propor mudanças nos contratos para ga-
apagão em
novembro rantir uma maior transparência, e isso
passado pode incluir penalidades mais severas por
interrupções no serviço, metas mais rigo-
rosas de qualidade e investimentos em
infraestrutura”, cita Stefano Ribeiro Ferri,
especialista em direito do consumidor.
Por enquanto, as punições não foram
suficientes para reverter uma situação que
aflige um número crescente de consumi-
dores. A Enel recebeu mais de R$ 320
milhões em multas por falhas no serviço
desde 2018, a maior delas de R$ 165 mi-
lhões, em fevereiro deste ano, devido ao
apagão no centro de São Paulo e imedia-
ções, o que afetou cerca de quatro milhões
de pessoas. E esse fenômeno não é local.
Estudo do Instituto Brasileiro de Defesa
MÉDIA MENSAL
DE RECLAMAÇÕES
5.285 em 2023
9.228 em 2024
AUMENTO DE
74,6 %
FONTE: ANEEL
NO ESCURO Comércio
sem luz da região do
Largo Paissandú (SP)
amarga prejuízo
INÊS 249
REAÇÃO Ministro Alexandre
Silveira levanta possibilidade de cassar
concessão do contrato da Enel
do Consumidor (Idec) de 2022 apontou
que 28,4% das unidades consumidoras
do País sofreram com queda de energia.
“As multas em si não garantem a melhora
na qualidade de fornecimento de energia.
Para de fato otimizar o cenário atual, seria
importante um nível de investimento
suficiente para melhora contínua do ser-
viço”, ressalta Lucas Paiva, engenheiro
elétrico e COO da Lead Energy, empresa
de diagnóstico e soluções energéticas.
INVESTIMENTOS
A concessionária italiana alega estar
fazendo tudo o que foi preestabelecido
nas cláusulas contratuais e regulatórias,
investindo cerca de R$ 8,36 bilhões des-
de 2018 (quando assumiu as operações
da antiga Eletropaulo) na melhoria da
qualidade do serviço. A empresa destaca
que continuará investindo e enfrentando
desafios no setor, com planos de inves-
timento de US$ 3,64 bilhões no Brasil
para os próximos anos. Já a Energisa,
concessionária que atua em nove esta-
dos, está investindo R$ 16 bilhões. “Acre-
ditamos sim na possibilidade de alguma
penalidade, mas não achamos que exis-
tam motivos ou razões jurídicas para
uma atitude extrema com uma caduci-
dade da concessão. A iniciativa do minis-
tro forçará a Enel a apresentar o que está
adotando para que tais eventos não
ocorram, ou ainda que ao acontecer
possam ser solucionados no prazo”, ar-
gumenta Alexei Vivan, diretor presiden-
te da Associação Brasileira de Compa-
nhias de Energia Elétrica (ABCE).
57
 INÊS 249
Internacional/Europa

DE LAVADA Turcos comemoram a

vitória da oposição ao presidente
Recep Tayyip Erdogan (à dir.) nas
eleições municipais

Populistas
em queda
U
Há décadas no poder, ma combinação de cansaço e AKP (Partido da Justiça e Desenvolvimen-
Recep Tayyip Erdogan, falta de perspectiva de eleito- to), ele teve sua reeleição ameaçada em
res com relação a partidos 2023 pelo candidato da oposição Kemal
presidente da Turquia, tradicionais ajudou na expan- Kiliçdaroglu, do CHP (Partido Popular
e Viktor Orbán, são do discurso fácil da extre- Republicano), e acaba de receber um re-
ma-direita pelo mundo. Ago- cado bem explícito das urnas, calcado na
primeiro-ministro
ra, o ciclo político parece se inflação que beira os 70% no país e as
da Hungria, veem inverter. Uma onda de rejeição atinge denúncias de corrupção: nas eleições
multidões nas ruas populistas como Recep Tayyip Erdogan, municipais realizadas no domingo, 31, o
presidente da Turquia desde 2014, mas CHP ganhou nas principais cidades do
pedindo suas cabeças no poder desde 2003, quando assumiu país, com 37,8% dos votos contra 35,% do
Denise Mirás como primeiro-ministro. Fundador do AKP. E se milhares de pessoas foram às

58 ISTOÉ 2826 10/4/2024 FOTOS: CHRIS MCGRATH/GETTY IMAGES EUROPE/GETTY IMAGES/AFP; ADEM ALTAN/AFP;
ATTILA KISBENEDEK/AFP; BRENDAN SMIALOWSKI/AFP
 INÊS 249

ruas comemorar a vitória da oposição na vadora. Erdogan chegou ao pior momen-

Turquia, outros milhares saíram para
protestar na Hungria contra Viktor Orbán,
premiê que desafia a democracia há 15
anos. Persegue oposição, mídia e mino-
rias — e em 2018 já concedeu asilo políti-
co ao macedônio Nikola Gruevski, aju-
dando na fuga para escapar de cumpri-
mento de pena na cadeia por corrupção.
Para Rodrigo Gallo, coordenador de
Relações Internacionais do Instituto
Mauá de Tecnologia (IMT), uma série de
questões locais e conjunturais leva ao
crescimento da extrema-direita. No caso
de alguns países europeus, a grande
quantidade de refugiados associada à si-
tuação econômica convence parte da
população a acreditar nas respostas “fá-
ceis” de populistas. Mas também pode
ocorrer um reflexo pendular da política:
“Depois de um tempo, com as medidas
não surtindo os efeitos esperados por
inúmeras razões, surgem frustrações que
podem se converter em crises políticas”.
PROTESTOS
Aos 70 anos e com mandato até 2028,
Erdogan se reelegeu por pouco em maio
passado, com 52,18% dos votos contra
47,82% de Kiliçdaroglu. Vinha de críticas
pela demora no socorro às vítimas do
terremoto que, em fevereiro, havia deixa-
do perto de 45 mil mortos e de acusações
de “anistia” ao descumprimento de leis
de 2018, sobre padrões de segurança para
ACUSADO Denúncias de corrupção
sobrevoam Viktor Orbán e todo
o governo da Hungria
construções e infraestrutura. A crise eco-
nômica se agravou com a guerra na
Ucrânia. Há também o fator religioso, com
o AKP conservador e islâmico contra o
CHP, defensor do Estado laico e que se
apresenta como conciliador, contra a bi-
polarização “religião versus secularismo”.
Assim, o CHP saiu vitorioso nas eleições
das maiores cidades do país como Istam-
bul, a capital Ancara, Izmir e Bursa, esten-
dendo sua base de classe média urbana
para a área central do país, mais conser-
to de sua vida política em 21 anos no
poder. Na Turquia, a oposição comemora.
Na Hungria, a oposição protesta. Aos
60 anos, Viktor Orbán foi colocado contra
o muro porque vazaram gravações de
figuras de seu governo manipulando
documentos judiciais para encobrir seu
envolvimento em corrupção, divulgadas
por seu ex-aliado Peter Magyar. As acu-
sações começaram ainda no início de
fevereiro, quando Katalin Novak, a presi-
dente da Hungria e correligionária da
extrema-direita de Orbán, foi exposta
pelo perdão concedido a um condenado
que encobriu provas de abusos de crian-
ças, como cúmplice do acusado (um di-
retor de orfanato estatal). Caiu a presiden-
te e Judit Varga, ministra da Justiça (e
ex-mulher de Magyar), que aparece nas
gravações “sugerindo” o que deveria ser
removido de um processo de corrupção
contra o ex-juiz Pal Volner, então secre-
tário de Estado. Tamas Sulyok foi o indi-
cado pelo Parlamento para a Presidência,
que assumiu em 5 de março.
Em voo político solo, Peter Magyar foi
às ruas de Budapeste discursar em praça
pública. Estava aberta a brecha para mi-
lhares de húngaros sufocados saírem às
ruas contra a corrupção sistê-
mica, pedindo a cabeça de
Viktor Orbán, o amigo de Do-
nald Trump, Vladímir Putin
— e da família Bolsonaro.

LÍDERES REJEITADOS
Candidatos podem estar inaugurando
a era da impopularidade na política dos EUA
Analistas da política americana destacam que
nunca houve uma eleição nos EUA com candidatos
tão impopulares: Joe Biden, para 55% dos eleitores,
e Donald Trump, para 53% (segundo dados do site
fivethirtyeight.com, que reúne médias de pesquisas).
Também observam eleitores entrincheirados em
seus campos partidários, o que talvez anuncie uma
era de “candidatos presidenciais perpetuamente
impopulares”. E ainda se perguntam: quando há
tamanha rejeição, o índice de popularidade
(43% para Trump e 40% para Biden) é o fator
decisivo? A resposta mais provável: “Não
necessariamente”. A chave para o vencedor
da eleição de 5 de novembro seria, sim, a conquista
de eleitores que não gostem dele. E talvez esteja aí,
na “medida do ódio”, a maior chance de Biden: pelos
termômetros de pesquisa, quem odeia Trump “odeia
mais” do que aqueles que odeiam Biden.
INVERSÃO Joe Biden e seu adversário Donald Trump
disputam quem é menos odiado

59
 INÊS 249

LIVROS por Luiz Cesar Pimentel

MITO
A Morte de Cleópatra
(1675), obra de
Francesco Cozza:
desafio às ideias
de sua época

A redenção de
Cleópatra
Autora norte-americana narra a história da rainha do Egito a partir de
um ponto de vista mais equilibrado entre os gêneros, sem o viés que os
autores masculinos atribuíram à personagem ao longo dos séculos

60 ISTOÉ 2826 10/4/2024


C
leópatra, uma das mulheres
mais famosas e poderosas
da história, foi a última rai-
nha do Egito até seu impé-
rio cair, sob domínio romano, em 30 a.C.
Tudo que se sabe sobre sua vida, no en-
tanto, não veio de seus próprios escritos,
mas da lenda imortalizada por escritores
como William Shakespeare, George Ber-
nard Shaw e Georg Ebers — todos eles,
homens. Embora a primeira imagem que
venha à cabeça quando se ouve o seu
nome seja o rosto de Elizabeth Taylor, é
bom lembrar que o popular filme de 1963
foi dirigido por Joseph L. Mankiewicz —
com roteiro adaptado pelo diretor, Ra-
nald MacDougall e Sidney Buchman. A
produção foi baseada no livro Vida e
Época de Cleópatra, de Carlo Maria
Franzero, inspirado por histórias de
Plutarco, Suetónio e Apiano. Ou seja:
mais uma vez, apenas homens recebe-
ram a missão de eternizar a rainha.
Essa visão masculina fez de Cleópatra
um arquétipo da astúcia, sedução e ma-
nipulação. A escritora norte-americana
Francine Prose tenta consertar esse traço
tendencioso em Cleópatra: seu Mito, sua
História. Na obra, narra como ela amea-
çou o reinado masculino e despertou o
desejo e a ira dos políticos e militares
mais poderosos de seu tempo. A autora
utiliza fontes históricas egípcias, gregas
e romanas, assim como representações
modernas da arte, do teatro e do cinema,
para elaborar uma crítica às narrativas
convencionais. Prose a descreve como
uma líder corajosa e competente, uma
estrategista militar que desafiou as ideias
da sua época. Traça ainda paralelos entre
as versões ficcionais e a figura real, e co-
mo isso influenciou os conceitos de be-
leza e feminilidade contemporâneos.
Poderosa estrategista
militar, ela sempre foi
retratada como um
arquétipo de sedução,
astúcia e manipulação
FOTOS: ALFREDO DAGLI ORTI/PHOTO12/AFP; FRANCES DENNY
LÍDER
Francine Prose:
“Precisamos
hoje de alguém
como ela”
“EU VOTARIA EM CLEÓPATRA
PARA PRESIDENTE DOS EUA”
ISTOÉ entrevistou Francine Prose, autora da nova biografia
Quanto da Cleópatra, sobre a qual
estamos acostumados a ouvir
falar, reproduz a figura real?
A dimensão da beleza, de usar
métodos femininos para alcançar
o poder, de ser manipuladora, isso
se destaca. Ao longo do tempo,
historiadores usaram muitos artífi-
cios para não admitir o fato de que
uma mulher governou por décadas
um país complicado e difícil.
Ela recebe crédito por tudo que
realmente realizou?
Não, há pouco crédito e atenção.
Parece haver mais interesse por seus
relacionamentos amorosos. Quem
assiste aos filmes de Hollywood se
pergunta: “mas afinal, o que ela fez
para se tornar rainha?”. Parece que a
única coisa que ela sabia fazer era
seduzir poderosos romanos.
Quais foram os seus principais
achados sobre a rainha egípcia?
Não há novidades factuais. O que
foquei, principalmente, foi a repre-
sentação feita dela, e o que me
pareceu ser imprecisões e injusti-
ças. Quis eliminar a visão sexista e
racista sobre a forma como ela e
seu governo foram retratados.
A beleza de Cleópatra sempre foi
muito idealizada. Sabemos como
INÊS 249
ela era fisicamente?
A única evidência que temos são
as moedas com sua efígie. De todas
as imagens, livros e filmes, não há
nenhuma versão em que Cleópatra
tenha sido retratada como uma
mulher acolhedora. Ela sempre foi
definida como uma beldade, como
se isso fosse necessário e essencial
para que chegasse ao poder.
Ela era realmente poderosa?
Seu poder é subestimado. Tinha
diversas habilidades e talentos.
Imagine governar um país em crise
por tanto tempo, como ela fez,
além de mantê-lo unido e protegi-
do. Além disso, ela entendia de ar-
quitetura, ajudou a construir a ci-
dade de Alexandria e a estabelecer
sua famosa e extraordinária biblio-
teca. Ela, que falava diversas lín-
guas, foi reduzida a alguém que
brigou com Marco Antônio. É uma
subestimação grosseira de quem
ela foi e do que fez.
Se vivesse nos dias de hoje, que
tipo de líder ela seria?
Precisamos desesperadamente de
uma Cleópatra atualmente. Se esti-
vesse viva e quisesse se candidatar
à Presidência dos EUA, seria ótimo.
Eu votaria nela, sem dúvida.
61

Cultura/Cinema
D
esvio de milhões de dólares,
ligações com a Máfia, fuga cine-
matográfica, assassinato miste-
rioso. O documentário Morcego Negro,
que conta a trajetória do empresário
Paulo César Cavalcante Farias, o PC
Farias, segue o estilo dos thrillers polí-
ticos de Hollywood, mas tem sotaque
brasileiro — alagoano, para ser mais
exato. Um detalhe, no entanto, subver-
te os clichês do cinemão norte-america-
no: a figura do vilão era evidente, mas
até hoje ninguém sabe quem foi o herói.
Dirigido por Chaim Litewski e Cleisson
Vidal, o filme é um mergulho no Brasil do
final dos anos 1980 e o início da década de
1990, época ainda marcada pela redemo-
62 ISTOÉ 2826 10/4/2024
INÊS 249
O vilão da
história
Em estilo de thriller político, o documentário
Morcego Negro narra a trajetória do tesoureiro
PC Farias, operador do governo Collor, cuja
ascensão meteórica terminou em tragédia
Felipe Machado
IMPEACHMENT Fernando Collor deixa o Palácio do Planalto:
acusações de corrupção levaram ao seu afastamento
cratização do País, recém-saído da famige- O empresário PC Farias surge na
rada ditadura militar. A história começa história como tesoureiro da campanha
com a ascensão do candidato Fernando de Collor. Sua participação, no entanto,
Collor de Melo, que ganhava a atenção na ia bem além do simples arrecadador de
mídia com o slogan populista e demagó- doações. Era o chamado “operador fi-
gico “caçador de marajás”. Jovem e auda- nanceiro”, o homem que “fazia aconte-
cioso, conseguiu se transformar de azarão cer”, segundo os depoimentos do docu-
em favorito na primeira eleição presiden- mentário. Os lobistas, aqueles que fa-
cial após a volta da democracia. Em 1989, zem a intermediação entre o capital e
o novato alagoano venceu Lula com a os candidatos, sempre existiram na
ajuda de um personagem que pavimen- política em todo o mundo. O diferencial
tou, com apoios espúrios e muito dinhei- aqui é que a última campanha presiden-
ro, seu caminho para o Palácio do Planalto. cial havia acontecido há décadas, então
FOTOS: AGÊNCIA ISTOÉ; WILSON PEDROSA/AE; DIVULGAÇÃO; REPRODUÇÃO
 INÊS 249

via, ligado a PC Farias. “Eles descarta-

ram a ligação do brasileiro com o tráfico
de drogas, mas comprovaram que PC
Farias e o crime organizado mundial
usavam os mesmos esquemas para es-
conder dinheiro ilegal no Caribe e na
Suíça”, afirma o co-diretor.

DUPLO ASSASSINATO
Litewski e Vidal destacam ainda o
papel da imprensa não apenas na co-
bertura do caso, mas como fonte de
informações para o filme. “Era um pe-
ríodo áureo para o jornalismo. Com a
pesquisa, que teve apoio da Editora
Três, entendemos melhor o pensamen-
to da época e compreendemos como
PERSONAGEM Cleissom Vidal e Chaim Litewski: para os diretores, contar a época da havia sido de fato a campanha presi-
redemocratização por meio da trajetória de PC Farias enriquece a visão sobre o País dencial”, afirma Vidal. Segundo ele, era
preciso rememorar os fatos, mas com
a função precisava ser reinventada. PC ambos protagonistas na chamada Repú- um olhar de afastamento e sem fazer
Farias fez isso, mas à sua maneira. “O blica das Alagoas, surgem envelhecidos um novo julgamento, do ponto de
que chamava a atenção nele era sua e serenos, bem mais contidos do que vista histórico. “Foi muito interessante
personalidade e carisma”, afirma Chaim nos distantes tempos de glória. sentir a temperatura da época. PC Fa-
Litewski. Para o co-diretor, ele não era O documentário exibe ainda uma rias era retratado como o vilão da his-
como os lobistas tradicionais, do eixo série de materiais inéditos. A conexão tória e pagou um preço alto por isso.”
Rio-São Paulo, mas também era diferen- do grupo alagoano com a Máfia, por Segundo Livetski, foi importante ter
te da turma ao redor de Collor. exemplo, que na época era vista mais acesso aos arquivos e acervo fotográfi-
“PC estudou em seminário, sua mãe como um boato exótico do que uma co de ISTOÉ. “A postura da revista foi
queria que ele fosse padre. Falava bem ligação real, confirma-se na voz de de- de independência. Em relação ao assas-
francês e latim, leu os clássicos, gostava legados da polícia italiana e inspetores sinato de PC, por exemplo, não aceitava
de música erudita. Era do departamento anti- a versão de que havia sido crime pas-
um personagem interes- -drogas dos EUA. “Havia sional, fato que foi comprovado pela
sante, por isso sua histó- coisas no ar que precisá- Justiça mais tarde.”
ria nos atraiu. Contar vamos olhar mais a fun- Assassinado em 1996 ao lado da
aquele período por meio do”, explica Cleisson Vi- companheira, a jovem Suzana Marcoli-
de sua trajetória enrique- dal. “PC entrou por acaso no, em uma casa de praia, PC Farias le-
ce a visão sobre o País.” na mira das autoridades vou consigo segredos não apenas da
Fruto de dez anos en- europeias, que estavam República das Alagoas, mas de todo o
tre pesquisa e produção, atrás do tráfico de dro- status quo do poder no País. No julga-
Morcego Negro — apelido gas, lavagem de dinheiro mento de 2013, a Justiça finalmente
do jatinho favorito de PC e ligações com o sub- comprovou que não houve “crime pas-
Farias, cuja pintura era Imprensa forte mundo do crime. Nessa sional seguido de suicídio”, como alguns
escura — reúne dezenas Reportagem de busca, encontraram uma defendiam à época, mas um duplo as-
de entrevistas, de fami- ISTOÉ: entrevista conta de PC que recebia sassinato. Uma terceira pessoa chegou
liares e seguranças ao exclusiva com o recursos desse univer- a ser apontada na cena do crime, mas
ex-presidente Fernando motorista Eriberto so.” O documentário re- nunca se descobriu quem era. Outrora
Henrique Cardoso. Mui- comprovou vela que a polícia italiana festejado como o dono do cofre no go-
tos dos personagens re- o esquema de veio à América do Sul e verno Collor, PC Farias morreu sem
tratados, como Fernando corrupação no interrogou o empresário glórias, mas seu modus operandi conti-
Collor e Renan Calheiros, governo federal argentino Jorge La Sal- nua presente na política brasileira.

63
 INÊS 249
Cultura/Divirta-se

TERROR PARA LER

Uma Família Feliz: O ativista judeu Davi
“suspense arrebatador”,
segundo Grazi Massafera Rieseman faz um discurso
polêmico em um auditório
lotado. Anos
depois, suas
palavras
inspiram
um incidente
importante
na política
brasileira.
Esse é o enredo de Passeio
com o Gigante, do autor
gaúcho Michel Laub.

FILME

Uma família
UM JOVEM
MESTRE DO
quase perfeita TERROR
Autor de Uma Família
Feliz, cujo texto foi
PARA VER
Inspirada na trilogia de
Produção do cinema nacional narra a adaptado e sai agora Juan Gómez-Jurado, a série
história de mãe que luta para se defender também em livro, o espanhola Rainha Vermelha
após ser acusada de agredir as filhas escritor Raphael Montes (Prime Video) narra a vida
(foto) vem consolidando de uma mulher superdotada

C
om exceção dos clássicos de Zé do Caixão, o mercado a sua carreira de que ajuda a polícia a
cinematográfico brasileiro não tem o costume de apos- roteirista. Ele conta resolver crimes complexos.
tar em filmes de terror. Estrelado pelo popular casal o que o atraiu no novo Dirigida por Koldo Serra,
global formado por Reynaldo Gianecchini e Grazi Massafera, no trabalho: “Ao seguir de La Casa de Papel.
entanto, Uma Família Feliz tem tudo para se tornar um sucesso regras preestabelecidas,
de bilheteria. Dirigido por José Eduardo Belmonte, o longa é um um filme de gênero
suspense dramático cujo ponto de partida é um tema delicado: permite discutir assuntos
a depressão pós-parto. Eva (Grazi) acabou de dar à luz o seu sérios e a sociedade”.
terceiro filho e enfrenta uma angústia em relação a sua vida Para Montes, as chaves
supostamente perfeita. Quando suas filhas gêmeas aparecem do suspense são pouco
machucadas, a tranquilidade de sua família é abalada. Acusada exploradas no cinema
pela comunidade de ser a agressora, Eva passa a ser questionada brasileiro. “O que me PARA OUVIR
pelo próprio marido. “É um suspense arrebatador”, afirma a atriz. interessa é despertar Liderados pelo compositor
“A história me arrepiou desde o primeiro momento.” Belmonte emoções na plateia”, diz. e vocalista James Walsh,
afirma que buscou subverter o estilo das produções do gênero, os britânicos do Starsailor
conhecido pelos tons sombrios de suas cenas. “Quis fazer um lançaram um dos melhores
suspense iluminado. O terror geralmente opta por uma estética trabalhos do ano até agora:
mais escura, por isso eu quis fazer o contrário”, afirma. O longa Where the Wild Things
tem roteiro de Raphael Montes (leia mais no quadro ao lado), Grow reúne uma coleção
que ficou conhecido pela audiência das plataformas de streaming de belas canções sobre
após escrever a série Bom Dia, Verônica e o filme A Menina que o amor e suas desilusões.
Matou os Pais, sobre a história de Suzane von Richtofen.

64 ISTOÉ 2826 10/4/2024 FOTOS: REPRODUÇÃO; DIVULGAÇÃO; RONALDO GUTIERREZ


TEATRO
Filosofia e religião
Sucesso de crítica e público pelo bom elenco e texto profundo,
O Deus de Spinoza volta a São Paulo após turnê pelo interior
do Estado. O espetáculo resgata o pensamento do filósofo
holandês Baruch de Spinoza, condenado no século XVII por
sua reflexão sobre a relação do ser humano com Deus e com
a natureza. Foi renegado por séculos, mas hoje suas teorias
servem de inspiração para estudos no mundo inteiro. Com
texto de Régis de Oliveira, tem direção de Luiz Amorim e Bru-
no Perillo no papel principal. Em cartaz no Teatro UOL, até 31/5.
SHOW
Uma dupla britânica do barulho
O Royal Blood, grupo formado pelo baixista/vocalista Mike
Kerr e o baterista Ben Thatcher, volta ao País com seu rock
pesado e dançante para apresentações únicas em São Paulo
(13/4) e no Rio de Janeiro (16/4). Os britânicos começaram a
carreira em 2013 e, no mesmo ano, foram indicados ao prêmio
BBC Sound, da renomada emissora de TV do Reino Unido.
Venceram ainda o Brit Awards, como melhor grupo britânico,
e o NME Awards, como artista revelação. Eles apresentam no
Brasil seu trabalho mais recente, Back to the Water Below.
INÊS 249
por Felipe Machado
POP
Beyoncé volta em estilo country
Uma das maiores cantoras da atualidade surpreendeu os fãs
ao apresentar o estilo do seu novo disco. Beyoncé acaba de
lançar Cowboy Carter, álbum que homenageia a cultura
country norte-americana. E começou bem: já tornou-se a pri-
meira artista negra a atingir o topo da parada especializada
no gênero favorito dos caubóis. O disco apresenta ainda duas
versões do passado: Blackbird, dos Beatles, cuja letra fala de
Martin Luther King Jr., e Jolene, clássico de Dolly Parton.
“A alegria de criar música é que não há regras,” diz Beyoncé.
FESTIVAL
A força das mulheres na animação
Um evento de animação feito apenas com filmes dirigidos
por mulheres. Essa é a proposta do festival online Elas que
Animam, que conta com dez animações de curta-metragem
realizadas em São Paulo, Pará, Rio Grande do Sul, Bahia,
Pernambuco e Paraná. Entre as produções há obras premia-
das, que mostram o papel importante das mulheres no au-
diovisual brasileiro. Entre eles estão Guida, de Rosana Urbes,
e Torre (foto) de Nádia Mangolini. A programação gratuita
está disponível na plataforma www.itauculturalplay.com.br .
65
 INÊS 249

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