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INICIAIS
1 INTRODUÇÃO
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Os agentes citados foram entrevistados pela autora, na ocasião de sua pesquisa de doutorado, que
resultou na tese “Lugar, meu amigo, é minha Baixada: memória, identidade e representação social”.
Publicada no Rio de Janeiro, em 2002.
autorrepresentação dos grupos na pesquisa. Optamos, então, por buscar as narrativas
dos integrantes dos movimentos culturais.
A opção por iniciar o projeto a partir da autorrepresentação desses grupos passa
pelo reconhecimento de que a produção desses discursos se configura em uma prática
cotidiana em sociedades contemporâneas. Podemos assumir que há uma multiplicidade
de autorrepresentação imagética coletiva.
E, é na construção da autoimagem, que Gonçalves e Head (2009) anunciam o
devir imagético, um movimento no qual a imagem etnográfica passa a ser entendida a
partir da possibilidade que cada um tem na criação de suas próprias significações, sem
ser reconhecido meramente pela submissão direta em relação às forças sociais.
Nas rodas de conversas já realizadas observamos que os praticantes culturais da
Baixada Fluminense vêm se articulando em redes que extrapolam o território dos seus
municípios ou as fronteiras entre as diversas formas de manifestação artística.
Percebemos que esses praticantes culturais se espelham em dificuldades semelhantes –
como a ausência de políticas públicas de cultura adequadas à realidade das suas ações.
Essas redes, entretanto, vem ampliando a visibilidade e o fortalecimento da cena
cultural da Baixada Fluminense, como um todo.
A pesquisa vem, portanto, analisando as significações de fazer ação cultural na
Baixada Fluminense a partir dos próprios praticantes.
Esses agentes culturais dão o impulso externo a uma ação que, sem eles, não
aconteceria, uma vez que não ocorre de forma espontânea (COELHO, 2001). Mas, a
partir dessa intervenção, o grupo de indivíduos que se inserem na ação cultural passa a
se empoderar do local, da atividade, das ideias, e deixam de ser objetos da cultura,
tornando-se sujeitos (JEANSON, 1973).
Outra preocupação que pudemos depreender das narrativas dos praticantes
culturais é com relação aos Conselhos Municipais de Cultura. Segundo informações
obtidas com os grupos e confirmadas em ida às cidades, nove municípios 4 da Baixada
Fluminense têm Conselhos formalmente constituídos. Entretanto, a percepção dos
praticantes é que existem pelo menos dois problemas. O primeiro refere-se a um
suposto aparelhamento político dos conselhos. A ocupação de algumas das vagas
destinadas a representantes da sociedade civil estariam sendo preenchidas com atores
sociais articulados pelo poder público como uma forma de manter o controle sobre a
elaboração das políticas culturais municipais a ser executada pelas secretarias
municipais de cultura. Outra questão levantada é que em muitos municípios, a
implementação do Conselho Municipal de Cultura ocorreu apenas para cumprir parte
das condicionalidades junto ao Ministério da Cultura para obter acesso aos recursos do
Fundo Nacional de Cultura. Assim, em diversos municípios não obtivemos informações
sobre quantas reuniões do conselho ocorreram em 2014.
Cabe acrescentar que detectamos que há um movimento em algumas gestões
municipais da região em direção a um esvaziamento das secretarias municipais de
cultura transformando-as em subsecretaria (como é o caso do município de Mesquita)
ou integrando-as às secretarias de educação (conforme ocorreu em São João de Meriti).
A avaliação de alguns conselheiros contatados é que, como não foi possível realizar a
4
Belford Roxo, Duque de Caxias, Japeri, Magé, Mesquita, Nilópolis, Nova Iguaçu, Queimados e São
João de Meriti.
cooptação de alguns Conselhos Municipais, os gestores preferiram abrir mão dos
recursos extra-orçamentários.
Finalizando essas impressões iniciais sobre as ações culturais na Baixada
Fluminense, gostaríamos de salientar que a despeito da visão até aqui generalizada da
ausência sistemática de políticas culturais direcionadas ao fomento, fortalecimento e
consolidação de ações culturais neste território, os praticantes culturais vem fazendo
políticas culturais que podemos chamar de resistência, de baixo para cima ou, ainda,
como táticas de sobrevivência.
Seria, portanto, uma prática que se aproxima da noção de tática defendida por
Michel de Certeau (1994). Segundo o autor, a “tática é o movimento dentro do campo
de visão do inimigo (CERTEAU, 1994. p.100)”. O próprio Certeau nos explica melhor:
Nestas pistas iniciais que nos dão os praticantes culturais da Baixada Fluminense
nos parece que, apesar de não atuarem como um bloco hegemônico, utilizam a tática
nomeada por Certeau quando aceitam participar de Conselhos Municipais de Cultura ou
recursos advindos dos quase inexistentes editais de apoio às suas ações culturais.
Percebemos que em alguns momentos e/ou para alguns podem ser práticas de
resistência, e em outros momentos e/ou para outros são ações culturais com expressões
políticas diversas.
5 PISTAS E CAMINHOS
Buscamos iniciar o debate sobre quem são os responsáveis pelas ações culturais
na Baixada Fluminense, região onde as práticas culturais são sistematicamente
silenciadas. Obtivemos algumas pistas e caminhos a seguir. Eles intervém na cena
cultural, se organizam para se fortalecer, utilizam muitas das vezes recursos próprios
para suas atividades e apresentam uma visão de certo esgotamento frente às estratégias
políticas hegemônicas. Parecem procurar caminhos próprios e se ancoram nas redes
sociais para amplificar suas vozes, seus olhares e seus desejos. Vem rompendo a
barreira da invisibilidade imposta pelas mídias através das tecnologias de informação e
comunicação.
Porém, qual o potencial que as práticas contra-hegemônicas utilizadas têm frente
aos desafios dos estigmas? Sem apoio financeiro por parte dos poderes públicos locais
quais as estratégias de financiamento/sobrevivência essas ações vêm criando? Como
fortalecer os espaços de construções das políticas públicas culturais e, ao mesmo tempo,
enfrentarem o descrédito contemporâneo com algumas das instituições democráticas?
Mais do que respostas, as rodas de conversas com os representantes das ações
culturais da região vem suscitando novas perguntas. Esperamos conseguir construir
junto com eles caminhos e descobertas comuns.
REFERÊNCIAS