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QUARTA LIÇÃO
MORFOLOGIA E SINTAXE
4-0 Apesar do Sânscrito preservar muitas particularidades formais, que não mais encon-
tramos no Português, sua oração expressa idéias que também podem ser vistas em
nossa língua. Nas duas línguas em questão, a oração gramatical requer, tanto explí-
cita como implicitamente, certa categorização.
4-1 Todas as palavras do Sânscrito podem ser divididas aproximadamente em três tipos
básicos, que poderão, por ora, ser chamados de nomes (substantivos e adjetivos),
verbos e advérbios.
4-2 É importante de início entendermos que a única razão clara para essa classificação é
mais formal que prática. Em outras palavras, apesar do que tenhamos aprendido na
escola, devemos evitar pensar em nomes (substantivos) como “coisas” e verbos co-
mo “ações”.
4-6 Assim, o verbo finito é a chave de qualquer oração ou período, e tem de ser discer-
nido e compreendido a fim de se construir a oração, e referiremos a ele repetida-
mente quando estivermos tratando da leitura da oração do sânscrito.
4-7 Como já pudemos observar nos exemplos acima, uma única palavra trata de especi-
ficar a ação, a pessoa (1.a, 2.a e 3.a) e o número do ator ou atores, o tempo da ação
(i.e. uma descrição, uma prescrição, um mandamento, um desejo etc. ) e até mesmo
a distinção entre voz ativa e voz média. Todas essas categorias na verdade encon-
tram-se especificadas num dado verbo finito sânscrito, codificado numa forma ver-
bal determinada pela presença ou ausência duma série de unidades sub-verbais.
4-8 Estas unidades são inter-relacionadas e podem variar conforme outros determinantes
na mesma palavra.
4-9 PESSOA
A “Pessoa” gramatical especifica a relação existente entre o(s) agente(es) ou sujei-
to(s) da ação de um verbo finito, o(s) usuário(s) ou orador(es) da oração na qual o
verbo participa e a audiência (pessoa, coisa ou grupo) a que a oração se dirige. As
três relações possíveis são:
a) Primeira Pessoa - “eu” representa a pessoa que fala; o agente e o orador são
os mesmos.
Exemplo: AaGaC^aiMa ) ägacchämi. (Eu estou vindo.)
b) Segunda Pessoa - “tu” representa a pessoa com que falamos; o agente e a au-
diência são os mesmos.
Exemplo: TatvMaiSa) tat tvam asi. (Tu és aquilo.)
c) Terceira Pessoa - “ele, ela” representa a pessoa ou coisa de que falamos; o
agente não é o orador, nem a audiência.
Exemplos: raMaae vdiTa ) rämo vadati. (Räma fala.)
deva NaNdiNTa ) devä nandanti. (Os deuses se regozijam.)
4-10 Todas essas pessoas, assim como no português, têm seu plural. Nós é o plural de eu;
vós é o plural de tu; eles (ou elas) é o plural de ele (ela). Todos são portanto consi-
derados, em suas aplicações específicas, sujeitos do verbo.
4-12 NÚMERO
Uma das flexões dos verbos finitos é a flexão numérica, isto é, de acordo com o
número de sujeitos (ou, em certos casos [Veja lição 9], de objetos) podem ficar,
como no português, no “singular” ou no “plural” . O sânscrito possui, como o gre-
go, um terceiro número, o “dual”, com desinência especial, que é utilizada com
verbos de dois sujeitos. O nome sânscrito e as funções dos números gramaticais são:
a) Singular - Wk-vcNaMa( ekavacanam (“fala para um”), um sujeito;
Exemplo:
Xauk-ae vdiTa ) çuko vadati (O papagaio fala.)
b) Dual - iÜvcNaMa( dvivacanam (“fala para dois”), dois sujeito;
Exemplo:
Xauk-aE vdTa ) çukau vadataù(Os dois papagaios falam.)
c) Plural - bhuvcNaMa( bahuvacanam (“fala para muitos”), três ou mais
sujeitos.
Exemplo:
Xauk-a vdiNTa ) çukä vadanti ( Os papagaios falam.)
4-13 Sabemos que o verbo indica ação ou resultado da ação (estado), mas o ato por ele
expresso pode ser praticado em épocas diferentes, e daí temos a “flexão temporal”,
que visa indicar a época, o tempo em que se realiza a ação verbal.
O tempo pode ser encarado no presente (vartamäna käla), no passado (bhüta käla)
e no futuro (bhaviñyat käla). Esses tempos não correspondem exatamente aos tem-
pos verbais do sânscrito, que serão tratados individualmente mais tarde.
Exemplos:
raMaae vNa& GaC^iTa )
rämo vanaà gacchati (Räma vai à floresta.);
raMaae vNa& AGaC^Ta( )
rämo vanaà agacchat (Räma foi à floresta.);
raMaae vNa& GaiMaZYaiTa )
rämo vanaà gamiñyati (Räma irá à floresta.);
vNa& JaGaMaeiTa v+YaiTa )
vanaà jagameti vakñyati (Ele dirá: “Eu fui à floresta.”).
4-14 MODO
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4-15 VOZ
A voz indica a forma como a ação ou estado do verbo se refere ao sujeito. A classi-
ficação ou distinção quanto à voz é um dos aspecto mais sutil do sânscrito, que de
início, se não for bem entendido, pode gerar alguma confusão. Resumindo, temos
duas categorias de vozes, que são indicadas juntamente com a pessoa e o número,
nos paradigmas da flexão verbal. Mas o curioso nesse caso, não é a dificuldade de
memorização delas, Tal dificuldade é mínima, pois as terminações ou desinências
desses dois grupos são bem parecidas entre si. A verdadeira dificuldade reside no
fato de que, apesar de no sânscrito a voz já ter perdido a sua importância semântica,
ela ainda persiste como uma formalidade por demais importante para ser negligen-
ciada.
cal como o sufixo “ya”), e na terceira pessoa singular do aoristo. (Veja Nona Lição
)
4-18 São essas, portanto, as principais categorias na conjugação verbal do sânscrito. Ob-
viamente, tendo no todo três pessoas, três números, cerca de cinco modos, quatro
tempos e duas vozes, poderá ocorrer no verbo sânscrito uma grande variedade de
formas.
Exemplos:
raMaae vNa& GaC^iTa ) rämo vanaà gacchati (Räma vai à floresta.)
SaqTaal/+Ma<aviPa vNa& GaC^Ta" ) sétä-lakñmaëav api vanaà gacchataù
(Sétä e Lakñmana também vão à floresta.)
SaqTae ik&- >aazSae ) séte kià bhäñase (Sétä, o que dizes[ para ti].)
Ya}a GaC^iNTa vqraSTa}aaiPa GaC^aMYahMa( ) yatra gacchanti véräs taträpi
gacchämy aham (Onde forem os heróis, lá também irei eu.)
SaaDau vYaMaiPa GaC^aMa" ) sädhu vayam api gacchämaù
(Muito bem, nós também vamos.)
Podemos observar que existem indicações na desinências que caracterizam a pessoa,
número e voz.
a) O “i” ( w ) é típico do singular ativo (ekavacanam parasmaipada) e da ter-
ceira pessoa do plural ativa (prathama-puruña bahuvacanam parasmaipa-
da).
b) O “e” ( W ) é característico de todas as declinações ätmanepada.
c) O “t” ( Ta( ) é característico da terceira pessoa do singular (prathama-puruña
ekavacanam), tanto ativo (parasmaipada) como médio (ätmanepada).
Veja bem que a desinência da primeira pessoa do singular (uttama-puruña ekava-
canam) média(ätmanepada) é simplesmente o “e” ( W ), sem qualquer consoante
caracterizante.
O contraste entre as vozes pode visto no seguinte esquema:
Parasmaipada ParSMaEPad Ätmanepada AaTMaNaePad
-ti iTa -te Tae
-si iSa -se Sae
-mi iMa -e W
4-21 Os paradigmas dos verbos vd( vad “falar” parasmaipada e >aaz( bhäñ “fa-
lar [para si]” ätmanepada são os seguintes:
vad
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YauÅ( yuïj +ANTae ante (Ä) YauÅTae ) yuïjate (eu [se] junge. )
YauÅ( yuïj +AiNTa anti (P) YauÅiNTa ) yuïjanti (ele junge.) [não cai, pois é P]
Verbo que liga o atributo ao sujeito
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4-29 Existem sete funções de caso diferenciadas no sânscrito. Tal fato, apesar de assustar
os iniciantes pelo seu número, proporciona um sistema de declinações muito mais
lógico, com suas definições sutis, do que ocorre em as outras línguas indo-
européias, que têm que definir as mesmas relações gramaticais com um número bem
menor de casos. Os sete casos recebem o nome de iv>ai¢- vibhakti (lit. “diferenci-
ação”) e são identificados pelos sete primeiros numerais ordinais do sânscrito. A
seguir teremos os casos com seus nomes em sânscrito, nome ocidental, principais
funções e preposições que os traduzem para o português:
1 - Pa[QaMaa prathamä (primeiro) - Nominativo
caso do sujeito(na voz ativa) ou predicativo.
2 - iÜTaqYa dvitéya (segundo) - Acusativo
caso do objeto direto.
3 - Ta*TaqYaa tåtéyä (terceiro) - Instrumental
caso do agente, instrumento ou sujeito (na voz passiva).
[com, a, de, por meio de, através de, na companhia de.]
4 - cTauQas caturthé (quarto) - Dativo
caso do objeto indireto.
[a, para.]
5 - PaÄMaq païcamé (quinto) - Ablativo
caso do adjunto adverbial que expressa procedência, causa, razão.
[de, por causa de, devido a.]
6 - zïq ñañöhé (sexto) - Genitivo
caso do adjunto adnominal restritivo de sentido possessivo.
[de.]
7 - SaáMaq saptamé (sétimo) - Locativo
caso do adjunto adverbial de lugar ou que expressa situação, localização.
[Em, entre, pelo, perto de.]
Exemplo: (os números acima das palavras indicam os casos)
dXarQaSYa vcNa& é[uTva NaGaraNa( iNa"Sa*TYa )
l/+Ma<aeNa SahehaGaTYa DaMaaRYa vNae vSaiTa raMa" ))
daçarathasya(6) vacanaà(2) çrutvä(verbo1), nagarän(5) niùsåtya (verbo2)
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A essa lista podemos somar um oitavo item, que não chega bem a ser um caso. Tra-
ta-se do vocativo, ou Sa&>aaeDaNaMa( saàbhodhanam, a forma apelativa ou chamativa.
Exemplo:
hre k*-Z<a hre k*-Z<a k*-Z<a k*-Z<a hre hre )
hre raMa hre raMa raMa raMa hre hre ))
hare kåñëa hare kåñëa kåñëa kåñëa hare hare,
hare räma hare räma räma räma hare hare
“Ó Harä! (rädhä), ó Kåñëa!, ó Harä! (rädhä), ó Räma!”
4-30 Os nomes no sânscrito possuem várias declinações, que dependem da estrutura fo-
nológica (final do radical ou tema) e do gênero inerente.
Forma onde as terminações já podem ser afixadas diretamente
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“O Senhor Todo-
Atrativo”
eka-vacanam dvi-vacanam bahu-vacanam
Singular Dual Plural
prathamä k*-Z<a" k*-Z<aaE k*-Z<aa"
Nominativo kåñëaù kåñëau kåñëäù
dvitéyä k*-Z<aMa( k*-Z<aaE k*-Z<aaNa(
Acusativo kåñëam kåñëau kåñëän
tåtéyä k*-Z<aeNa k*-Z<aa>YaaMa( k*-Z<aE"
Instrumental kåñëena kåñëäbhyäm kåñëaiù
caturthé k*-Z<aaYa k*-Z<aa>YaaMa( k*-Z<ae>Ya"
Dativo kåñëäya kåñëäbhyäm kåñëebhyaù
païcamé k*-Z<aaTa( k*-Z<aa>YaaMa( k*-Z<ae>Ya"
Ablativo kåñëät kåñëäbhyäm kåñëebhyaù
ñañöé k*-Z<aSYa k*-Z<aYaae" k*-Z<aaNaaMa(
Genitivo kåñëasya kåñëayoù kåñëänäm
saptamé k*-Z<ae k*-Z<aYaae" k*-Z<aezu
Locativo kåñëe kåñnayoù kåñëeñu
saàbodhanam ( he ) k*-Z<a ( he ) k*-Z<aaE ( he ) k*-Z<aa"
Vocativo (he) kåñëa (he) kåñëau (he) kåñëäù
NAPUÀSAKA- vanam s.n.
LIÌGA (Neutr.) “floresta”
eka-vacanam dvi-vacanam bahu-vacanam
Singular Dual Plural
prathamä vNaMa( vNae vNaaiNa
Nominativo vanam vane vanäni
dvitéyä vNaMa( vNae vNaaiNa
Acusativo vanam vane vanäni
tåtéyä vNaeNa vNaa>YaaMa( vNaE"
Instrumental vanena vanäbhyäm vanaiù
caturthé vNaaYa vNaa>YaaMa( vNae>Ya"
Dativo vanäya vanäbhyäm vanebhyaù
païcamé vNaaTa( vNaa>YaaMa( vNae>Ya"
Ablativo vanät vanäbhyäm vanebhyaù
ñañöé vNaSYa vNaYaae" vNaaNaaMa(
Genitivo vanasya vanayoù vanänäm
saptamé vNae vNaYaae" vNaezu
Locativo vane vanayoù vaneñu
saàbodhanam ( he ) vNa ( he ) vNae ( he ) vNaaiNa
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disso, na oração raMaae vNa& GaC^iTa ) rämo vanaà gaccha-ti (Räma vai à flo-
resta.), vanam, o destino da ida de Räma, é tratado como se fosse um objeto
direto (apesar de, em português, o verbo “ir” ser intransitivo e “à floresta” um
adjunto adverbial de lugar.)
Exemplo:
ik-MaNaeNa PauSTake-Na ) kim anena pustakena (Qual o uso desse livro?)
Obs.: Essas formas são pronomes declinados e não adjetivos. Portanto não pre-
cisam concordar com os nomes que modificam. Guarde bem isso, especialmen-
te no que se refere ao caso genitivo (zïq ñañöhé).
Exemplos:
MaMa Pau}a" mama putraù [m.] (meu filho).
MaMa >aaYaaR mama bhäryä [f.] (minha esposa).
MaMa PauSTak-Ma( mama pustakam [n.] (meu livro).
QUARTA LIÇÃO
LEITURA
QUARTA LIÇÃO
EXERCÍCIOS
A - Traduzir o texto de leitura acima, para o português.
B - Traduzir o seguinte para o sânscrito
1. O filho do brähmaëa vê o rei irado.
2. O povo diz que nosso rei é um tolo. (Use iti)
3. O rei e o brähmaëa vêem o nosso filho.
4. O rei mata o belo veado com sua flecha.
5. O brähmaëa diz novamente que o rei faz uma má ação. (Use iti)
6. Räma, o glorioso, reside lá sem sofrimento.
7. Ó! O veado (é) morto pelo rei Daçaratha.
8. O brähmaëa irado vê e amaldiçoa o rei piedoso.
9. Ao mesmo tempo, o menino também sentiu dor.
10. “Ó! Räma está com medo”, pensa o tolo. (Use iti)
11. O tolo vê os dois veados mortos e novamente fica muito irado.
12. Como é isso que o menino e o rei não perecem?
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QUARTA LIÇÃO
VOCABULÁRIO
ABREVIATURAS
m. masculino f. Feminino pron. Pronome
popr. nome próprio pl. Plural indecl. indeclinável (advérbio)
n. neutro lit. literalmente adj. adjetivo
Ä. ätmanepada - voz ativa P. parasmaipada - voz reflexiva
(os números são das classes de conjugação verbal).
AiTav
ativa (indecl) - Excessivamente, muito.
ANau + >aU - ANau>aviTa
anu + bhü (1P), anubhavati - Experimentar, sentir.
AiTav
api (indecl) - Também, e, além disso; embora, mesmo, ainda
que; (dá sentido indefinido ao pronome interrogativo
quando for por ele precedido) qualquer, algum, um.
[Veja 6-18,19]
ASa( - AiSTa
as, (1P) asti - Ser, haver.
AhMa(
aham (pron.) - Eu.
Ahae
aho (indecl) - “Ó !”
Aa + GaMa( - AaGaC^iTa
ä + gam (1P), ägacchati - Vir a, chegar a.
wiTa
iti (indecl) - Ponto de citação (Veja 4-47, 46)
wv
iva (indecl) - Como, assim como, semelhantemente( ao mesmo
tempo); como que, de certo modo, a bem dizer, me-
lhor dizendo, para assim dizer (depois da palavra a
que refere-se.)
Wk-da
ekadä (indecl) - Uma vez, numa ocasião, um dia.
WvMa(
evam (indecl) - Deste modo, assim, desta maneira, nesse caso.
k-QaMa(
katham (indecl) - Como? De que modo?
ik-iMaiTa
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Na
na (indecl.) - Não (partícula de negação).
NaXa( - NaXYaiTa / NaXaYaiTa
naç(4P), naçyati - Morrer, perecer, ser destruído.
naçayati - Causar a destruição, matar.
NaaMa
näma (indecl.) - Denominado, chamado (lit. “Pelo nome de”).
Na*Pa"
nåpaù (m.) - Rei (lit. “protetor dos homens”).
PaXa( - PaXYaiTa
paç(4P), paçyati - Ver.
Paqi@Ta
péòita (adj.) - Aflito, angustiado, oprimido
Pau}a"
putraù (m.) - Filho
PauNa" - PauNar(
punaù punar (indecl.) - Outra vez, novamente; PauNa" PauNa" punaù punaù:
sem cessar, uma e outra vez.
bal/k-"
bälakaù (m.) - Rapazinho, jovem, menino
b]aø<a"
brähmaëaù (m.) - Sacerdote brähmaëa
>aaz( - >aazTae
bhäñ (1Ä), bhäñate - Falar, dizer.
>aqTa
bhéta (adj.) - Com medo, assustado, aterrorizado.
>aU - >aviTa
bhü(1P), bhavati - Ser, existir; estar; nascer, vir a ser, acontecer, ori-
ginar-se de.
>aUiMaPa"
bhümipaù (m.) - Rei (lit. “protetor da terra”).
MaNa( - MaNYaTae
man(4Ä), manyate - Pensar, crer, julgar, considerar como.
MaU%R"
mürkhaù (m.) - Tolo, bobo, parvo, estúpido.
Ma*Ga"
mågaù (m.) - Veado, cervo, antílope.
raMa"
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