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Caros amigos,

Logo chegará o dia do nosso encontro O Antídoto para o Caos, e como você
já sabe, decidi introduzir algumas coisas que irei abordar, durante a aula, através desta
carta aberta, disponível para todos os que se inscreveram.

Começo com uma pergunta retórica: Como agir de forma propositiva no


mundo?

Muito freqüentemente me vêm à memória umas palavras ditas por Luigi


Giussani, em 1968, quando encontrou um aluno seu preparando uma barricada numa
praça de Milão convulsionada de estudantes revoltados, no alvoroço do Maio de ’68.
Giussani perguntou ao aluno o que ele estava fazendo e a sua resposta foi: “Estou aqui
com as forças que mudam a história”. Ao que o educador Luigi Giussani respondeu
imediatamente: “As forças que mudam a história são as mesmas que mudam o
coração do homem”. O que isso quer dizer? O que significa que aquilo que muda o
meu coração é capaz de mudar a história?

Não vou lhe pedir para me dar, agora, uma resposta a um problema como este.
Mas, posso lhe pedir para não me deixar sozinho diante desta provocação: pensa um
pouco nisso, me acompanha um pouquinho numa reflexão. Topa? O problema que se
põe, inicialmente, é justamente “o que é capaz de mudar o meu coração?”. E aí?
Você sabe o que impacta você ao ponto de mudar o seu coração? Mas… espera aí!
Você sabe o que é coração, nessa frase? Opa! Sabia… você estava pensando num
coração “sentimental”, não é? Você estava achando que se tratava de alguma coisa
relacionada com a sua capacidade afetiva. Talvez, inclusive, você pode ter pensado no
músculo pulsante bem no centro do seu peito… Não! Não é nem uma coisa nem outra.

Você já usou ou ouviu a expressão “o coração da batalha”? “Coração”, num


caso como este, significa “centro”, “alma”. Na frase do Giussani, “coração” tem esse
sentido de ponto central da nossa pessoa, tutano da nossa pessoa. Voltemos, então,
para a nossa pergunta: o que muda o seu coração? Ou seja, o que é capaz de mudar
aquilo que você é, em última instância?… “Mudar como?”, você talvez se perguntaria.
Há uma imagem que, certamente, ajuda bem a responder a esta pergunta: você já ouviu
falar num pintor francês chamado Henri Matisse? Pois é, ele tem um quadro chamado
Icarus. É estranho! Porque, a imagem que todos temos do mitológico filho de Dédalo
é de um homem com asas, fugindo com seu pai da Ilha de Creta. No entanto, o Icarus
de Matisse não tem asas: está no céu azul, entre estrelas amarelas, com apenas um
ponto vermelho vivo bem no meio do peito.

O Icarus de Matisse voa, toca a estrelas, não por ter asas de cera com penas de
pássaros, mas voa porque tem um coração que ama o mistério do céu estrelado. Aqui
está: o que muda? A consideração (con + siderius = estar junto das estrelas) do
mistério, o estar na vida certo de que o ponto de mudança da realidade é o que me
muda, ou seja, não é a força do meu braço, não é a força do meu grito, não é a minha
inteligência, não é o meu dinheiro, meu berço, minha beleza, minha adesão
ideológica… mas o próprio Mistério do qual dependemos. Sim, dependemos! Eu e
você dependemos, não nos fazemos por nós mesmos.

E só nos realizamos na vida, só nos tornamos protagonista da história, na


medida em que reconhecemos, em primeiríssimo lugar, esta condição inextinguível:
somos feitos e dependemos misteriosamente dAquele que nos faz. E, em segundo
lugar, se afirmamos, reiteradamente, a urgência que temos de nos relacionarmos com
este mesmo Tu que nos faz. “Pacheco, mas eu não tenho fé!”. E quem foi que lhe disse
que é preciso ter fé para reconhecer este fato evidentíssimo? Trata-se de uma evidência
que, se não pudermos afirmá-la, não poderemos afirmar absolutamente mais nada do
que vemos com os nossos próprios olhos.

Para isso, basta a sua razão: “eu não me faço por mim mesmo! Sou como uma
fonte de água… se eu fosse uma e tivesse consciência de mim, eu notaria que este
borbulhar de água na superfície, que eu vejo e que o mundo vê, é só o aspecto
fenomênico de uma realidade que é muito mais profunda, de onde emano, instante
após instante”. Não é preciso fé para dar este passo inteligente. Eis o ponto: o que me
muda? O que muda o meu coração?

Fiquemos com a imagem da fonte: será o fato de eu ter colocado uma torneira de ouro na
“boca” da fonte? Será o fato de eu ter colocado uma bacia de prata sob a “boca” da fonte? Será o
lugar onde a fonte brotou? Nada disso… o que muda é capaz de me mudar é justamente a
“fonte” da “fonte que eu sou”: quanto mais me relaciono, profundamente, com este
ponto de partida, com este Tu do qual parte o que eu sou, agora, tanto mais eu mudo,
porque serei tanto menos determinado pelas condições externas da minha biografia,
do lugar onde vivo, da história do meu tempo etc.

Então, dito isto, o passo seguinte é entender o que significa que isto que me
muda é capaz de mudar a história. Ou seja, como posso ser protagonista no mundo,
como posso ser propositivo no mundo? O que essa consciência de mim mesmo pode
significar quando o que anseio é deixar uma marca no tempo, na história, no mundo?
Todos cremos que isso só acontecerá na medida em que “tiver meus três minutos de
fama”, na medida em que “chegar ao primeiro milhão de seguidores”, na medida em
que ficar milionário, na medida em que “tiver escrito um livro, plantado uma árvore e
tido um filho”, na medida em que for o “suprassumo da virtude”… Nada disso! O
mundo não vai mudar com seus seguidores, seu milhão, sua fama, seus filhos, livros e
árvores. A história não muda com seu empenho voluntarista de virtude forçada.
O mundo e a história vão mudar na medida em que você for uma presença real, autêntica. E
é impossível ser presença se você não estiver consciente de que tudo o que você é o
relacionamento contínuo com Aquele que lhe está fazendo, agora, neste instante. Não
é preciso muito. Basta uma consciência. Precisamos, por isso, todos nós - a começar
por mim e por você -, buscar os meios para fazer crescer em nós a consciência de nossa
dependência última. Não seremos propositivos por sermos “eficazes”, “funcionais”,
“bonitos”, “fortes”… Não! Seremos propositivos, na verdade, na exata medida
em que nos propomos a nós próprios: na medida em que formos, no mundo e
na história, presenças vivas, com tudo o que somos… nada de asas de ceras!
Mas, sim, um coração sedento de Beleza, de Verdade, de Bondade.

Alcemos vôo!

Te espero em breve, dia 08/11, às 20h, para O Antídoto para o Caos.

Abraço,

D.r Paulo Pacheco.


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