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Direito Comercial I 2023/2024

Estabelecimento Comercial

Manuel Rocha explora há vários anos um café na zona do Saldanha, em


Lisboa, chamado “Manuel Rocha dos Cachorros”, instalado em imóvel
que tinha arrendado ao senhorio Sebastião. O negócio tornou-se pujante
quando passou a incluir no seu menu o famoso cachorro-quente
“kamikaze” com uma receita única e original que atraía gente de todo o
país e também do estrangeiro, após uma reportagem publicada no The New
York Times. Manuel Rocha, que começava a achar-se velho e cansado para
o negócio, decide vendê-lo a Maria Botelho. Para o efeito, as partes
limitaram-se a assinar um contrato no qual se estabelecia o seguinte:
Manuel da Rocha vende a Maria Botelho o café sito na Praça Duque do
Saldanha pelo valor de EUR 50.000,00.
O contrato foi celebrado no dia 10 de outubro de 2023. No dia 11 de
outubro, já com a chave do café, Maria Botelho repara que, durante a
noite, Manuel Rocha tinha retirado do café metade das cadeiras (deixando
as mesas) e tinha levado consigo a receita do cachorro “kamikaze”.

1. Maria Botelho pretende reagir por entender que Manuel da


Rocha não poderia rer atuado como atuou. Tem razão?

2. Se, do próprio contrato celebrado entre as partes, resultasse a


exclusão de metade das cadeiras e da receita do cachorro
“kamikaze”, tal teria efeito na qualificação do contrato?

Como necessitava de dinheiro para fazer umas obras de melhoria, Maria


Botelho resolve pedir ajuda ao Banco dos Comerciantes, S.A., que lhe diz
que apenas lhe emprestaria o dinheiro necessário contra a prestação de uma
garantia que incidisse sobre o estabelecimento. Maria Botelho está
preocupada: (i) o imóvel não é dela; (ii) como é que vai fazer o inventário
de tudo e (iii) prestando a garantia iria ficar na indisponibilidade dos bens
afetos ao estabelecimento.

3. As preocupações de Maria Botelho têm fundamento?


No dia 31 de outubro de 2023, Sebastião, senhorio do imóvel em que o
estabelecimento se encontra instalado, decide passar pelo Manuel Rocha
dos Cachorros e fica estarrecido quando se apercebe que Manuel da
Rocha tinha vendido o café sem lhe dar disso conhecimento. De imediato
exige que Maria Botelho abandone o local e, já agora, lhe pague as 4
rendas em atraso que Manuel da Rocha lhe ficou a dever.
4. Analise as pretensões de Sebastião quanto à restituição do
locado, tendo em consideração a posição compreensiva do
senhorio no contexto do trespasse de estabelecimento.

5. Caso o Manuel da Rocha dos Cachorros fosse detido pela


sociedade Rocha Café, Unipessoal, Lda. (da qual Manuel da
Rocha era o sócio único) e Manuel da Rocha tivesse alienado a
sua quota única naquela sociedade a Maria Botelho, alteraria a
resposta dada na questão anterior?

6. Tem Maria Botelho a obrigação de pagar as rendas em atraso a


Sebastião?

Ainda no mesmo dia, Maria Botelho liga para António das Carnes, S.A.,
fornecedor que, desde o primeiro momento, forneceu carne e alguns dos
ingredientes de extrema qualidade para o café. O administrador daquela
sociedade responde-lhe que não a conhece de lado nenhum, que o único
contrato de fornecimento que existia tinha sido contratado com Manuel da
Rocha e que, se este lhe tinha vendido o café o contrato “não passava”
para Maria Botelho que, ainda por cima, oferece muito menos garantias de
pagamento do que Manuel da Rocha oferecia.

7. Tem o fornecedor razão para defender que não existiu


transmissão da posição contratual no contrato de fornecimento
de Manuel da Rocha para Maria Botelho?

Para “ajudar à festa”, Maria Botelho recebe uma comunicação de Manuel


da Rocha que lhe diz: “Conforme sabe – ou devia saber – já é hora de
mudar o nome do café, dado que não quero o meu nome associado a esse
projeto que conduz de forma ruinosa”.
8. Podia Maria Botelho ter mantido a designação Manuel da Rocha
dos Cachorros associado àquele estabelecimento?

Volvidos uns meses, Catarina da Rocha queixa-se ao pai que tem


saudades dos tempos em que vendia cachorros-quentes e que tem pena que
o pai tenha vendido o negócio. Manuel da Rocha para a confortar diz-lhe
que, se ela quiser, ele pode ajudá-la a montar um novo café, dando-lhe todo
o aconselhamento técnico e de negócio. Catarina da Rocha está eufórica e
decide tomar de arrendamento um imóvel na zona das Amoreiras em
Lisboa e instala o Novo Rocha dos Cachorros que entra em funcionamento
em 1 de janeiro de 2024. Ao saber do sucedido, Maria Botelho pretende,
de imediato, por termo à situação.

9. Poderá Maria Botelho reagir? Com que fundamentos e por que


meios?

Recomendações (e apenas isso e não mais que isso) de bibliografia e


jurisprudência

 AA. VV., Leis de Arrendamento Urbano Anotadas, coord. António


Menezes Cordeiro, Almedina: Coimbra (2014)
 AA. VV., Código Civil Anotado, I, 2.ª ed., coord. Ana Prata,
Almedina: Coimbra (2019)
 António Menezes Cordeiro, Direito Comercial, 5.ª ed., Almedina:
Coimbra (2021)
 António Pinto Monteiro / Paulo Videira Henriques, A cessação do
contrato no Regime dos Novos Arrendamentos Urbanos, 136 O
Direito (2004), 289-314
 António Pinto Monteiro / Paulo Mota Pinto, Compra e venda de
empresa – a venda de participações sociais como venda de empresa
(“share deal”), 3947 RLJ (2007), 76-102
 António Pires de Lima / João Antunes Varela, Código Civil Anotado,
II, 4.ª ed., reeimp, Coimbra Editora: Coimbra (2010)
 Fernando Gravato de Morais, Novo Regime do Arrendamento
Comercial, 3.ª ed., Almedina: Coimbra (2011)
 Filipe Cassiano dos Santos, Transmissão e cessação de contratos
comerciais: Direito Comercial e Direito Civil nas relações comerciais
em Nos 20 anos do Código das Sociedades Comerciais – Homenagem
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Vasco Lobo Xavier, I, Coimbra Editora: Coimbra (2007), 283-303
 Filipe Cassiano dos Santos, Direito Comercial Português, I, Coimbra
Editora: Coimbra (2007)
 Januário Costa Gomes, Cessão da posição do arrendatário e direito de
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Cordeiro, Luís Menezes Leitão e Januário da Costa Gomes, Almedina:
Coimbra (2003), 493-536
 Januário Costa Gomes, Contratos Comerciais, Almedina: Coimbra
(2013)
 João Espírito Santo, Direito Comercial Geral da Ohada e da Guiné-
Bissau, AAFDL Ed.: Lisboa (2020)
 Jorge Coutinho de Abreu, Curso de Direito Comercial, I, 13.ª ed.,
Almedina: Coimbra (2022)
 Jorge Pinto Furtado, Comentário do Regime do Arrendamento
Urbano, 3.ª ed., Almedina: Coimbra (2021)
 José Engrácia Antunes, Direito dos Contratos Comerciais, Almedina:
Coimbra (2009)
 José Engrácia Antunes, A empresa como objeto de negócios – “Asset
Deals” vs “Share Deals”, 68 ROA (2008), 715-793
 José Ferreira Gomes, M&A – Aquisição de empresas e de
Participações Sociais, AAFDL Ed.: Lisboa (2022)
 José Oliveira Ascensão / António Menezes Cordeiro, Cessão de
exploração de estabelecimento comercial, arrendamento e nulidade
formal, 47 ROA (1987), 845-927
 Manuel Nogueira Serens, Obrigações de não concorrência na
negociação definitiva da empresa, Almedina: Coimbra (2017)
 Maria Elisabete Ramos, Trespasse de estabelecimento comercial –
obrigação de não concorrência, Revista Jurídica da Universidade
Moderna, I (1998), 331-359
 Nuno Aureliano, A obrigação de não concorrência do trespassante de
estabelecimento comercial no direito português em Estudos em
Homenagem ao Professor Doutor Inocêncio Galvão Telles, IV, coord.
António Menezes Cordeiro, Luís Menezes Leitão e Januário da Costa
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 Orlando de Carvalho, Critério e estrutura do estabelecimento
comercial, Atlântida: Coimbra (1967)
 Paula Ponces Camanho, Autorização do senhorio e locação de
estabelecimento, 12 Direito e Justiça (1998), 323-360
 Paulo Olavo Cunha, Direito Comercial e do Mercado, 3.ª ed.,
Almedina: Coimbra (2021)
 Pedro Pais de Vasconcelos / Pedro Leitão Pais de Vasconcelos,
Direito Comercial, 2.ª ed., Almedina: Coimbra (2020)
 Ricardo Costa, O novo regime do arrendamento urbano e os negócios
sobre a empresa em Nos 20 anos do Código das Sociedades
Comerciais – Homenagem aos Professores Doutores A. Ferrer
Correia, Orlando de Carvalho e Vasco Lobo Xavier, I, Coimbra
Editora: Coimbra (2007), 479-523
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STJ 21-nov.-1996 (Mario Cancela), proc. n.º 96B453

STJ 13-mar.-2007 (Nuno Cameira), proc. n.º 06A4523

STJ 26-jun.-2007 (Afonso Correia), proc. n.º 07A1274

STJ 25-nov.-2008 (Azevedo Ramos), proc. n.º 08A3399

STJ 19-mai.-2015 (Fonseca Ramos), proc. n.º 3397/04.0TCLRS.L1.S1

STJ 24-mai.-2018 (Fernanda Isabel Pereira), proc. n.º


7471/15.9T8CBR.C1.S2

RLx 10-mai.-2001 (Salazar Casanova), proc. n.º 2899/01

RLx 28-out.-2003 (Pimentel Marcos), proc. n.º 6591/2003-7

RLx 23-mar.-2004 (Pimentel Marcos), proc. n.º 8247/2003-7

RLx 27-jun.-2006 (Maria José Simões), proc. n.º 2968/2006-1

RLx 15-dez.-2009 (Maria José Simões), proc. n.º 1924/05.4TMSNT.L1-1

RLx 24-mai.-2011 (Gouveia de Barros), proc. n.º 726/05.2TJLSB.L1-7

RLx 21-jun.-2018 (Ilídio Martins), proc. n.º 26253/16.4T8LSB.L1-8

RLx 29-set.-2020 (José Capacete), proc. n.º 6013/18.9T8LSB.L1-7

RPt 15-out.-2004 (João Bernardo), proc. n.º 0434478

RPt 31-jan.-2013 (Leonel Serôdio), proc. n.º 7675/09.3TBVNG.P1

RPt 11-out.-2017 (Rodrigues Pires), proc. n.º 1771/10.1TJPRT.P1

RPt 22-out.-2018 (Fernanda Almeida), proc. n.º 20580/15.5T8PRT.P1


RCb 7-abr.-2017 (Luís Cravo), proc. n.º 443/11.4TBSRT.C1

RCb 12-set.-2017 (Luís Cravo), proc. n.º 7471/15.9T8CBR.C1

RCb 10-mai.-2022 (Luís Cravo), proc. n.º 75/21.9T8MGL.C1

REv 07-dez.-2012 (Paulo Amaral), proc. n.º 3809/10.3TBPTM

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