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Direito Comercial I 2022/2023

Estabelecimento Comercial

Manuel Rocha explora, desde há vários anos, um café na zona do


Saldanha, em Lisboa, chamado “Manuel Rocha dos Cachorros”. O
negócio que, no início, apenas dava para “sobreviver” tornou-se pujante
quando passou a incluir no seu menu, o famoso cachorro quente
“kamikaze” com uma receita única e original que atraia gente de todo o
país e também do estrangeiro, após uma reportagem publicada no The New
York Times. Manuel Rocha que começava a achar-se velho e cansado para
o negócio, decide vendê-lo a Maria Botelho. Para o efeito, as partes
limitaram-se a assinar um contrato no qual se estabelecia o seguinte:
Manuel da Rocha vende a Maria Botelho o café sito na Praça Duque do
Saldanha pelo valor de EUR 1.500.000,00.
O contrato foi celebrado no dia 10 de outubro de 2022. No dia 11 de
outubro, já com a chave do café, Maria Botelho repara que, durante a
noite, Manuel Rocha tinha retirado do café metade das cadeiras (deixando
as mesas) e tinha levado consigo a receita do cachorro “kamikaze”.

1. Maria Botelho pretende reagir por entender que Manuel da


Rocha não poderia rer atuado como atuou.

2. Se, do próprio contrato celebrado entre as partes, resultasse a


exclusão de metade das cadeiras e da receita do cachorro
“kamikaze”, tal teria efeito na qualificação do contrato?

Maria Botelho, que, entretanto, tinha contratado uma equipa de


profissionais de restauração, fica estarrecida quando encontra os
trabalhadores que tinham sido contratos anteriormente por Manuel Rocha
à porta do café e prontos para trabalhar, pois considera que, uma vez
vendido o café, os trabalhadores “vão à sua vida”.
3. Tem Maria Botelho razão em defender que nada tem a ver com
os trabalhadores anteriormente contratados por Manuel Rocha?
Como necessitava de dinheiro para fazer umas obras de melhoria, Maria
Botelho resolve pedir ajuda ao Banco dos Comerciantes, S.A., que lhe diz
que apenas lhe emprestaria o dinheiro necessário contra a prestação de uma
garantia que incidisse sobre o estabelecimento. Maria Botelho está
preocupada: (i) o imóvel não é dela; (ii) como é que vai fazer o inventário
de tudo e (iii) prestando a garantia iria ficar na indisponibilidade dos bens
afetos ao estabelecimento.
4. As preocupações de Maria Botelho têm fundamento?

No dia 31 de outubro de 2022, Sebastião, senhorio do imóvel em que o


estabelecimento se encontra instalado, decide passar pelo Manuel Rocha
dos Cachorros e fica estarrecido quando se apercebe que Manuel da
Rocha tinha vendido o café sem lhe dar disso conhecimento. De imediato
exige que Maria Botelho abandone o local e, já agora, lhe pague as 4
rendas em atraso que Manuel da Rocha lhe ficou a dever.
5. Analise as pretensões de Manuel da Rocha quanto à restituição
do locado, sem prejuízo da análise compreensiva da posição do
senhorio no contexto do trespasse de estabelecimento.

6. Caso o Manuel da Rocha dos Cachorros fosse detido pela


sociedade Rocha Café, Unipessoal, Lda. (da qual Manuel da
Rocha era o sócio único) e Manuel da Rocha tivesse alienado a
sua quota única naquela sociedade a Maria Botelho, alteraria a
resposta dada na questão anterior?

7. Tem Maria Botelho a obrigação de pagar as rendas em atraso a


Sebastião?

Ainda no mesmo dia, Maria Botelho liga para António das Carnes, S.A.,
fornecedor que, desde o primeiro momento, forneceu a carne e alguns dos
ingredientes para o café e que eram a chave do sucesso comercial daquele
espaço. O administrador daquela sociedade responde-lhe que não a conhece
de lado nenhum, que o único contrato de fornecimento que existia tinha
sido contratado com Manuel da Rocha e que, se este lhe tinha vendido o
café o contrato “não passava” para Maria Botelho que, ainda por cima,
oferece muito menos garantias de pagamento das obrigações do que
Manuel da Rocha.
8. Tem o fornecedor razão para defender que não existiu
transmissão da posição contratual no contrato de fornecimento
de Manuel da Rocha para Maria Botelho?

Para “ajudar à festa”, Maria Botelho recebe uma comunicação de Manuel


da Rocha que lhe diz: “Conforme sabe – ou devia saber – já é hora de
mudar o nome do café, dado que não quero o meu nome associado a esse
projeto que conduz de forma ruinosa”.

9. Podia Maria Botelho ter mantido a designação Manuel da Rocha


dos Cachorros associado àquele estabelecimento?

Volvidos uns meses, Catarina da Rocha queixa-se ao pai que tem


saudades dos tempos em que vendia cachorros-quentes e que tem pena que
o pai tenha vendido o negócio. Manuel da Rocha para a confortar diz-lhe
que, se ela quiser, ele pode ajudá-la a montar um novo café, dando-lhe todo
o aconselhamento técnico e de negócio. Catarina da Rocha está eufórica e
decide tomar de arrendamento um imóvel na zona das Amoreiras em
Lisboa e instala o Novo Rocha dos Cachorros que entra em funcionamento
em 1 de janeiro de 2023. Ao saber do sucedido, Maria Botelho pretende,
de imediato, por termo à situação.

10.Poderá Maria Botelho reagir? Com que fundamentos e por que


meios?
Recomendações (e apenas isso e não mais que isso) de bibliografia e
jurisprudência

 AA. VV., Leis de Arrendanento Urbano Anotadas, coord. António


Menezes Cordeiro, Almedina: Coimbra (2014)
 AA. VV., Código Civil Anotado, I, 2.ª ed., coord. Ana Prata,
Almedina: Coimbra (2019)
 António Menezes Cordeiro, Direito Comercial, 5.ª ed., Almedina:
Coimbra (2021)
 António Pinto Monteiro / Paulo Videira Henriques, A cessação do
contrato no Regime dos Novos Arrendamentos Urbanos, 136 O
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 António Pinto Monteiro / Paulo Mota Pinto, Compra e venda de
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 António Pires de Lima / João Antunes Varela, Código Civil Anotado,
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em Nos 20 anos do Código das Sociedades Comerciais – Homenagem
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 Filipe Cassiano dos Santos, Direito Comercial Português, I, Coimbra
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 João Espírito Santo, Direito Comercial Geral da Ohada e da Guiné-
Bissau, AAFDL Ed.: Lisboa (2020)
 Jorge Coutinho de Abreu, Curso de Direito Comercial, I, 13.ª ed.,
Almedina: Coimbra (2022)
 Jorge Pinto Furtado, Comentário do Regime do Arrendamento
Urbano, 3.ª ed., Almedina: Coimbra (2021)
 José Engrácia Antunes, Direito dos Contratos Comerciais, Almedina:
Coimbra (2009)
 José Engrácia Antunes, A empresa como objeto de negócios – “Asset
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 José Ferreira Gomes, M&A – Aquisição de empresas e de
Participações Sociais, AAFDL Ed.: Lisboa (2022)
 José Oliveira Ascensão / António Menezes Cordeiro, Cessão de
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formal, 47 ROA (1987), 845-927
 Manuel Nogueira Serens, Obrigações de não concorrência na
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 Maria Elisabete Ramos, Trespasse de estabelecimento comercial –
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 Nuno Aureliano, A obrigação de não concorrência do trespassante de
estabelecimento comercial no direito português em Estudos em
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 Orlando de Carvalho, Critério e estrutura do estabelecimento
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 Paula Ponces Camanho, Autorização do senhorio e locação de
estabelecimento, 12 Direito e Justiça (1998), 323-360
 Paulo Olavo Cunha, Direito Comercial e do Mercado, 3.ª ed.,
Almedina: Coimbra (2021)
 Pedro Pais de Vasconcelos / Pedro Leitão Pais de Vasconcelos,
Direito Comercial, 2.ª ed., Almedina: Coimbra (2020)
 Ricardo Costa, O novo regime do arrendamento urbano e os negócios
sobre a empresa em Nos 20 anos do Código das Sociedades
Comerciais – Homenagem aos Professores Doutores A. Ferrer
Correia, Orlando de Carvalho e Vasco Lobo Xavier, I, Coimbra
Editora: Coimbra (2007), 479-523

STJ 21-nov.-1996 (Mario Cancela), proc. n.º 96B453

STJ 13-mar.-2007 (Nuno Cameira), proc. n.º 06A4523

STJ 26-jun.-2007 (Afonso Correia), proc. n.º 07A1274

STJ 25-nov.-2008 (Azevedo Ramos), proc. n.º 08A3399

STJ 19-mai.-2015 (Fonseca Ramos), proc. n.º 3397/04.0TCLRS.L1.S1


STJ 24-mai.-2018 (Fernanda Isabel Pereira), proc. n.º
7471/15.9T8CBR.C1.S2

RLx 10-mai.-2001 (Salazar Casanova), proc. n.º 2899/01

RLx 28-out.-2003 (Pimentel Marcos), proc. n.º 6591/2003-7

RLx 23-mar.-2004 (Pimentel Marcos), proc. n.º 8247/2003-7

RLx 27-jun.-2006 (Maria José Simões), proc. n.º 2968/2006-1

RLx 15-dez.-2009 (Maria José Simões), proc. n.º 1924/05.4TMSNT.L1-1

RLx 24-mai.-2011 (Gouveia de Barros), proc. n.º 726/05.2TJLSB.L1-7

RLx 21-jun.-2018 (Ilídio Martins), proc. n.º 26253/16.4T8LSB.L1-8

RLx 29-set.-2020 (José Capacete), proc. n.º 6013/18.9T8LSB.L1-7

RPt 15-out.-2004 (João Bernardo), proc. n.º 0434478

RPt 31-jan.-2013 (Leonel Serôdio), proc. n.º 7675/09.3TBVNG.P1

RPt 11-out.-2017 (Rodrigues Pires), proc. n.º 1771/10.1TJPRT.P1

RPt 22-out.-2018 (Fernanda Almeida), proc. n.º 20580/15.5T8PRT.P1

RCb 7-abr.-2017 (Luís Cravo), proc. n.º 443/11.4TBSRT.C1

RCb 12-set.-2017 (Luís Cravo), proc. n.º 7471/15.9T8CBR.C1

RCb 10-mai.-2022 (Luís Cravo), proc. n.º 75/21.9T8MGL.C1

REv 07-dez.-2012 (Paulo Amaral), proc. n.º 3809/10.3TBPTM

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