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1

INTRODUÇÃO

O presente estudo trata, essencialmente, da Súmula Vinculante,


instituto recente no Direito Brasileiro, introduzido através da Emenda
Constitucional n° 45/2004.

Súmula vinculante, ou de efeito vinculante, como tem sido chamada,


é a atribuição, a determinadas súmulas do Supremo Tribunal Federal, através da
aprovação de no mínimo dois terços de seus membros, de efeito que obriga sua
aplicação pelos juízes inferiores.

Desta forma, uma vez editada a Súmula Vinculante, as instâncias


inferiores terão que aplicá-las nas decisões de casos análogos.

Por conta disso, divididas são as opiniões acerca do assunto, sendo


que parte delas entende ser a vinculação forma de desafogar o Judiciário,
tornando-o rápido e eficaz; enquanto outros entendem ser um retrocesso, que
contraria alguns princípios constitucionais. .

Neste estudo buscaremos estabelecer um panorama histórico do


instituto, desde seu surgimento no Direito da Common Law até os dias atuais.
Passaremos pela evolução do instituto e sua adoção em sistemas alienígenas.

Apresentaremos também o desenvolvimento do instituto no Brasil,


que adotava o sistema português dos assentos, até sua abolição e retorno na
atualidade jurídica..

Analisaremos ainda o Artigo 103-A da Constituição Federal,


introduzido pela Emenda Constitucional n° 45 de 2004, chamada de Reforma do
Judiciário, apresentando o instituto e comentando seu procedimento.
2

Indicaremos ainda os principais argumentos que levaram à adoção


do instituto em nosso ordenamento jurídico, argumentos esses que foram muito
discutidos enquanto tramitava o projeto pelo Congresso Nacional.

Depois, apresentaremos os argumentos favoráveis e contrários ao


instituto, dando suas razões, a fim de que o leitor possa efetuar seu juízo de valor
e concluir se o instituto será de grande ajuda e valia ou não.

Ainda, é um tema muito pouco ventilado em nossa doutrina, sendo


que deverá ser amadurecido e estudado com calma e atenção, para que se
chegue à conclusão definitiva, mesmo por que, até a elaboração final deste
trabalho poucas súmulas foram editadas.
3

CAPITULO I

EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA SÚMULA VINCULANTE


O DIREITO COMPARADO

Necessário esclarecer que apesar das grandes diferenças facilmente


constatáveis, as ordens jurídicas apresentam semelhanças que nos possibilitam
agrupá-las em grandes “famílias” com sistemas semelhantes, como forma de
facilitar o estudo e a compreensão do assunto.

Apesar de diversas classificações a mais utilizada é a de René David


a consagrada classificação referida, divide os sistemas jurídicos em duas grandes
famílias, a saber: Romano-Germânica e Common Law.

A primeira engloba todos os sistemas baseados no Direito Romano


Clássico ou no Direito Tedesco, abrangendo desta forma algumas das principais
ordens jurídicas internacionais, como os Direitos italiano, alemão, francês,
japonês, espanhol, português, brasileiro, entre outros.

Já na família da Common Law encontram-se os sistemas jurídicos


inglês, irlandês, estadunidense, canadense, porto-riquenho e, em geral, de todas
as colônias ou ex-colônias desses países.

Essas duas são as principais, embora existam outras famílias como a


de Direito comunista, a hindu, a muçulmana, a judaica e a africana, porém com
menor relevância no cenário mundial e para o presente estudo. Lembramos
também da existência de sistemas jurídicos paralelos, ou seja, não oficiais que
regram a vida de milhões de pessoas à revelia do Estado 1.
1
A doutrina Internacional traz alguns exemplos como as comunidades livres de Cape town, na África do Sul
em tempos de Apartheid e o sistema jurídico das favelas no Brasil.
4

A FAMÍLIA ROMANO-GERMÂNICA

A Família Romano-Germânica tem como base o Direito legislado,


sendo que parte de fórmulas ou axiomas 2 gerais que devem ser concretizados
caso a caso, através da interpretação feita pelos operadores do Direito.

Assim, o sistema estrutura-se sobre a normatização, preventiva,


exemplar e educativa, buscando na determinação geral um grande campo de
ações que ainda não ocorreram no mundo fático. No dizer de Silvio Nazareno
Costa, “o sistema volta-se para o futuro, já que é vedada a retroação das suas normas3”.

Nestes sistemas a lei é a base do Direito. Quando um caso é levado


à decisão, deve o magistrado aplicar a lei e sua interpretação. Está vinculado à lei.

A lei é o fundamento do Direito e busca ser o mais geral e impessoal


possível, prevendo situações que possam se encaixar nos seus ditames quando
da ocorrência na ordem fática.

A FAMÍLIA COMMON LAW

Em contrapartida, o sistema da Common Law tem como base o caso


concreto já decidido a partir de normas processuais predeterminadas, chamado de
2
Premissa imediatamente evidente que se admite como universalmente verdadeira sem exigência de
demonstração, ou seja, uma máxima indiscutível.
3
COSTA, Silvio Nazareno. Súmula Vinculante e Reforma do Judiciário. Editora Forense. 2002.p.9.
5

precedente4. Neste sistema, não se usam paradigmas genéricos ligados a uma


lógica dedutiva, mas busca por um raciocínio problemático caso a caso a decisão
concreta que posteriormente poderá receber autoridade geral.

A solução dos conflitos é revista a cada novo conflito. Com isso,


pode-se dizer que o sistema volta-se para o passado com base no processo,
diferentemente do Romano-Germânico que volta-se para o futuro.

Neste sistema, a norma geral abstrata possui apenas papel


secundário, sendo que a norma processual ganha importância maior.

Desta forma, a norma que guia o Juiz é a norma processual, apenas


para o desenvolvimento dos atos necessários á jurisdição, sendo que julgará o
caso de acordo com os mesmos julgamentos anteriormente efetuados. 5

Assim, o Juiz está submetido aos casos anteriores, porém, como


dito, a cada novo litígio fará um julgamento de valor, podendo rever a solução
adotada como precedente.

Semelhanças entre a família Romano-Germânica e a família


Common Law

Segundo a doutrina, o elo de ligação entre as duas grandes famílias


é a concepção de Direito ligada à descoberta e à realização da idéia de Justiça, ou
seja, os dois sistemas buscam a Justiça, porém de formas diferentes.

4
Observe-se que não é qualquer decisão que se deve entender como precedente vinculante, apenas as
decisões anteriores que mantenham semelhanças substanciais com o caso sub judice. No dizer Edward D., “O
precedente deve ser analisado cuidadosamente para determinar se existem similaridades de fato e de direito
e para determinar a posição atual da Corte em relação ao caso anterior” (RE, Edward D. Stare Decisis, p.
9).
5
Nemo.
6

Assim, seriam eles iguais na substância, restando apenas diferenças


técnicas, o que possibilitaria cogitar-se de uma grande Família Ocidental de
Direito. Ressalte-se ainda a aproximação histórica existente em suas formações,
afinal a tradição Romana do que hoje se entende como Direito Público é muito
obscura, sendo que, inicialmente, surgiu dos paradigmas firmados pelos
precedentes da Common Law.

Desta forma, entende-se que enquanto o Direito Privado embasou-se


no Direito Romano, o Direito Público desenvolveu-se sobre os lastros do Direito
inglês por volta dos séculos XVII e XVIII.

Temos então que para haver o Direito legislado de hoje houve uma
integração entre as duas famílias, unindo institutos de ambas para formação de
todo o sistema conhecido. Usou-se a legislação Romano-Germânica no caso do
Direito Privado e a normatização do precedente da família Common Law para
formação do Direito Público.

Vê-se claramente a integração havida entre as duas grandes famílias


e sua influência em nosso ordenamento pátrio.

Então, nota-se uma reaproximação dos dois sistemas, pois


encontram-se em ambos particularidades uns dos outros. Citamos a crescente
valorização dos princípios gerais dentro da Common Law, valorizando também a
norma geral estabelecida e a importância que vem ganhando os precedentes
(Jurisprudência) dentro dos sistemas da Família Romano-Germânica, pode-se
dizer que ambos os sistemas se completam.

Em suma: “A diferença reside unicamente no fato de, no âmbito da


família romano-germânica, se procurarem descobrir as soluções de justiça do
direito pelo recurso a uma técnica que tem como ponto de partida a lei, enquanto
7

que na família da common law se pretende o mesmo resultado, utilizando uma


técnica que toma prioritariamente em consideração as decisões judiciárias” 6

VINCULAÇÃO NA FAMÍLIA ROMANO-GERMÂNICA

Como dito acima, o cerne político-jurídico dos sistemas ligados à


família Romano-Germânica de Direito é a lei. Desta forma, o princípio da
legalidade apresenta-se como mecanismo primordial de sustentação desses
sistemas.

Daí decorre uma concentração de poder político no Legislativo, tendo


em vista que ele assume o papel de principal condutor social, pois edita as leis,
sendo que o Executivo, o legislativo e o Judiciário devem agir submetidos à ela.

É o Legislativo quem dá os contornos a serem seguidos e decide a


conduta a ser adotada pela sociedade, embora não apenas a lei possua poder
vinculante.7

Para que isto ocorra, não basta apenas que exista qualquer lei, e sim
uma lei justa e que preencha os requisitos de validade e legitimidade.

Desta forma, a legalidade, a submissão à lei é um dos limites da


independência judicial, ou seja, o juiz está submetido à lei, tendo que agir em
conformidade com esta, sendo que o princípio da independência da atividade
jurisdicional cede lugar ao princípio da legalidade.

6
David, René. Os Grandes Sistemas do Direito Contemporâneo. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
p. 123).
7
Os princípios gerais do direito também vinculam os entes públicos em geral e o legislador, inclusive
constituinte. Qualquer decisão do poder publico deve respeitar no mínimo os Direito Humanos Fundamentais.
8

Assim, a independência jurisdicional tem seu limite na estrita


legalidade, ou seja, o Juiz é independente até os limites da lei.

Entretanto, em vários países, como no Brasil, verifica-se a tendência


de ampliar a autoridade do precedente jurisdicional, admitindo-se a vinculação, em
graus variados, as decisões judiciais de natureza constitucional, que passam a ter
força de lei, com efeito erga omnes e retroativo ou diferido.

Nesse caso, trata-se de vinculação hierárquica, pois existe de


instância superior para instância inferior, traduzindo-se na autoridade de a
instância superior interferir na decisão da autoridade inferior.

A vinculação é exceção ao princípio da independência jurisdicional,


pois possibilita a interferência na decisão inferior, por parte do Tribunal Superior,
antes mesmo de ela ser objeto de recurso.

Em regra, a posição hierárquica não é condição suficiente a garantir


a vinculação, tendo em vista que nem toda decisão superior é dotada dessa
autoridade. Assim, serão vinculantes somente algumas decisões proferidas pela
instância superior.

Em nosso país, temos como exemplo as decisões em sede de Ação


Declaratória de Constitucionalidade, que possuem eficácia erga omnes e efeito
vinculante, porém apenas em relação ao judiciário e ao executivo.

Isto é uma atipicidade dentro do sistema Romano-Germânico, tendo


em vista que este se estrutura em torno da lei e erige esta a principal parâmetro
sistêmico, ou seja, é a lei o principal parâmetro para julgamento de um caso
concreto, embora a jurisprudência venha ganhando crescente autoridade nesses
sistemas.
9

VINCULAÇÃO NA FAMÍLIA COMMON LAW

Já o sistema jurídico da "Common Law" estrutura-se nas decisões


jurisdicionais de casos concretos, como já elucidado acima.

O princípio basilar desse sistema é o "stare decisis", que é a


necessária aplicação de uma decisão tomada em um caso precedente ao caso em
tela, desde que haja a analogia, a semelhança fática entre eles.

Ressalte-se que essa aplicação não é absoluta, pois se trata de


princípio e não de regra. Assim, a aplicação pode ser gradativa, em maior ou
menor grau, dependendo do caso. Já se fosse regra, sua aplicação deveria ser
total, pois a regra não admite gradações em sua aplicação.

Desta forma, dependendo do caso em análise, será decidido ou não


conforme o precedente, possibilitando ao juiz a revisão do mesmo a cada novo
caso levado para sua análise.

Deflui-se então que nos sistemas ligados à "Common Law" o Direito


desenvolve-se com base nas questões concretas suscitadas aleatoriamente na via
processual, dando razão a inúmeras críticas, inclusive por seus próprios
operadores.8

Então, como ensina Benjamin Cardozo, que na ausência de


precedentes, “nada há a fazer, exceto conseguir algum árbitro imparcial que declare o
que homens justos e razoáveis, conscientes dos hábitos de vida da comunidade e dos

8
Desta forma, a força vinculativa de um caso anterior está limitada à solução das questões já efetivamente
suscitadas; Ainda, se ninguém se interessar em questionar certos pontos, os mesmos permanecerão obscuros e
sem solução, entre outras críticas que são formuladas.
10

satandards de justiça e tratamento eqüitativo prevalente entre eles, fariam em tais


circunstâncias, guiando-se apenas pelas regras do costume e da consciência para
regulamentar a sua conduta” 9.

Pelo sistema que se apresenta não terá solução judicial o caso que
não possuir um precedente já suscitado forçando as partes à composição
particular como forma de dirimir seu litígio.

Esta sistemática é estranha às tradições romanistas afinal a lei


material ocupa um lugar secundário no sistema, sendo que a jurisprudência e os
costumes ganham primazia hierárquica sobre aquela, e o Direito processual
cresce em importância.

Isto, a valorização da decisão judicial e sua eleição como parâmetro


de conduta traz, implicitamente, um reconhecimento de maior idoneidade à
decisão judicial do que à lei, que, por sua generalidade e abstração, afasta-se do
caso concreto, sendo que o Direito criado pelo Juiz mantém estreitos vínculos com
a realidade, com o caso concreto, formando um conjunto mais justo.

Não se está dizendo que a decisão judicial não contém erros, mas
que no caso de os haver serão, mais fácil e rapidamente, corrigidos pelo
magistrado, na medida em que a aplicação do precedente não é absoluta. Desta
forma, na aplicação a cada caso, como já dito anteriormente, o Juiz reavaliará a
posição e poderá reconsiderar, decidindo diferentemente e de maneira mais
acertada, purificando desta forma o sistema.

Tal ocorre porque a vinculação é apenas de caráter hierárquico,


sendo que os Juizes superiores ou da mesma instância não estão submetidos ao
precedente, podendo usá-los apenas como meio de convencimento.

9
CARDOZO, Benjamin N. A Natureza do Processo e A Evolução do Direito. 3ª ediçao. Porto Alegre, 1978p.
90.
11

No entender daquela sistemática, tal fato possibilitaria chegar-se,


com o passar dos anos, ao julgamento perfeito da questão, ao Direito ideal.

A EVOLUÇÃO DO INSTITUTO ATÉ O DIREITO LUSITANO

Como fonte histórica do Direito brasileiro, temos o Direito Romano


como uma das fontes históricas mais antigas, em Roma que se manifesta uma
verdadeira vocação jurídica, quando se distingue o Direito da Moral e da Religião
em uma época que o Direito era basicamente fundado na religião, obviamente que
em seus primórdios Roma também possuía um direito semelhante ao dos outros
povos da época onde se destacava a jurisprudência (decisões de pontífices) e os
costumes.

A Lei das XII Tábuas foi a primeira codificação do Direito Romano e


apenas regulamentava o Direito do cidadão romano, mas abrangia, direito penal,
processual, público etc., embora não houvesse a previsão de instrumentos
processuais para garantir certos direitos. As penas eram extremamente duras e o
formalismo era severo, tão severo que apenas uma palavra mal colocada poderia
levar a sucumbência.
Mas a Lei das XII Tábuas tinha suas lacunas e obscuridades que fez
com que fosse criada a figura do pretor que em seus éditos indicava a ação
cabível bem como meio de provas e o que fosse necessário para ser feito o
julgamento por um arbitro.

Esses éditos eram apenas utilizados nos casos levados até o pretor,
mas depois adquiriram força de lei e não podiam mais serem modificados nem
mesmo por quem os baixou.
12

Com a expansão do império romano, outra figura teve que ser criada
para os litígios envolvendo cidadãos estrangeiros ou cidadãos estrangeiros e
romanos na mesma lide, essa figura foi a do pretor peregrino e logo após por volta
do século II e III se tornou de praxe a figura do jurista para dar um parecer em
casos não amparados pela lei.

A Lei das XII Tábuas aprimorada pelos pretores e pelos juristas foi
codificada no ¨Corpus Iuris¨ de Justiniano que foi um marco no direito Europeu.10
Com essa codificação não haviam mais os éditos, pois então todos tinha que se
submeter aos éditos já codificados, retirando a força criadora de jurisdição, mas
isso fez com que a jurisprudência ganhasse maior relevância 11.

A influencia que a codificação das normas causou na Europa


consequentemente influenciou o Brasil uma vez que somos fruto da influencia
lusitana.
Dando um salto considerável na historia, vamos para Portugal que se
tornou estado em 1140 e mesmo já politicamente reconhecido como estado, não
tinha uma legislação própria e utilizou-se das fontes leonesas por um longo
período de tempo, antes de desenvolver por suas próprias experiências sociais um
direito baseado na sociedade portuguesa.
O direito lusitano tem grandes passagens, mas nessa pesquisa o
ponto de maior importância histórica são os assentos

Depois do longo período de tempo que Portugal utilizou-se das


fontes leonesas, o direito consuetudinário e foraleiro foi a principal fonte do direito
utilizada.

10
Nemo.
11
MUSCARI.Marco Antonio Botto. Súmula Vinculante. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999. 10 e 11.
13

Assim o costume era a principal fonte e quando concedido o foral 12

era comum a remessa ao costume da terra.

Ainda nesse período não se observava as chamadas ¨façanhas¨ 13


como fonte do direito e sim apenas como mera decorrência da autorização do
costume, mas mesmo com essa visão, as sentenças vinculavam as decisões
futuras semelhantes.

Em 1446 os lusitanos tem a sua primeira codificação, chamada de


Ordenações Afonias. Essa codificação traz a previsão de três fontes a serem
utilizadas ao caso concreto quando este fosse levado a um tribunal, sendo elas: as
leis do reino, estilos da corte e costumes antigamente usados e na ausência ou
lacuna seria licito utilizar o direito romano e canônico, dando ai então origem ao
direito subsidiário. Ao referir-se ao estilo da corte o legislador entendia como tal a
jurisprudência uniforme e constante dos tribunais superiores.

Em 1521 as Ordenações Manuelinas estabelece um autentico


processo de interpretação prevendo:
“E assim havemos por bem, que quando os Desembargadores que forem
no despacho d`algum feito, todos, ou algum deles tiver alguma divida em alguma
Nossa Ordenação do entendimento dela, vão com a dita duvida ao Regedor, o
qual , o qual na Mesa grande com os Desembargadores que lhe bem um parecer
determinará, e segundo o qual aí for determinado se porá a sentença. E se na
Mesa forem isso em duvida, que ao Regedor pareça éque é bom No-lo fazer
saber, para Nós logo determinarmos, No-lo fará saber, para Nós nisso provermos.
E os que em outra maneira interpretarem Nossas Ordenações, ou derem
sentenças em algum feito, tendo algum deles duvida no entendimento da dita
Ordenação, sem irem ao Regedor como dito é, serão suspenso ate a Nossa
12
Carta de lei ou código em que se prescreviam as posturas municipais de uma cidade ou de uma vila, ou as
regras a serem adotadas por um concelho ou por um julgado, ora dada pelo próprio monarca ou dadas pelos
donatários da coroa (...) Mas o foral era lei particular, própria ou privativa `as terras a que se referia, pelo que
somente se obrigava os seus habitantes ou moradores. (...) era considerado lei e somente por outra lei poderia
ser revogado. SILVA. De Plácido e. Vocabulário Jurídico. p 629.
13
As sentenças vinculavam as decisões dos demais casos semelhantes, nas palavras de MARCO MUSCARI,
¨as sentenças que ficavam com força de lei¨ (Súmula Vinculante, p. 12).
14

Mercê. E a determinação que sobre o entendimento da dita Ordenação se tomar,


mandará o Regedor escrever no livrinho para depois não vir em dúvida”.

Essas interpretações fixadas foram denominadas de “assentos”


adquirindo valor normativo idêntico ao das próprias leis interpretadas, sendo o
livrinho mencionado o Livro dos Assentos. “Mesa grande” entendia-se a sessão
plenária convocada para assuntos de maior importância.

A interpretação autêntica era prerrogativa do rei, pois a justiça era


distribuída em nome do rei, posteriormente se constituiu o poder judiciário que era
tido como um órgão da realeza. Posteriormente devido a grande quantidade de
demandas o monarca deixou de presidir às sessões.

Em 1603 passa a vigorar as Ordenações Filipinas quem mantém o


mesmo método de interpretação. Embora nenhum texto de lei lhes outorgasse
poder para, a exemplo dos magistrados da Casa de Suplicação, emitirem
assentos normativos, os desembargadores da Casa do Porto arrogaram-se tal
direito, seguidos mais tarde pelos integrantes das relações ultramarinas.
Nesse período instalou-se um vicio de "julgar pelos arrestos e casos
julgados, sem examinar escrupulosamente a identidade de espécie, nem os
motivos legais a sentença, que se trazia para exemplo".

Logo no Direito Português as soluções dadas pelo Regedor às


dúvidas suscitadas pelos Desembargadores da Casa de Suplicação eram
chamadas de assentos, que visavam solucionar dúvidas e conflitos jurisprudências
manifestados em julgamentos divergentes.

Desta forma, editado um assento deveriam os juizes orientar-se por


meio dele nas suas decisões. O Juiz estava submetido ao assento editado pela
casa de Suplicação daquele país.
15

Tal instituto assemelha-se muito ao precedente da Common Law,


pois baseava-se no caso concreto já decidido para a tomada de novas decisões.

Quando de nossa colonização passou a coroa portuguesa a aplicar


esse mesmo sistema em nosso país, sendo que o judiciário local estava
subordinado aos assentos editados pela casa daquele país.

A SÚMULA VINCULANTE NO DIREITO BRASILEIRO

No Brasil, como dito acima, por ser uma colônia portuguesa,


vigoravam aqui as leis de lá, sendo que os assentos editados pela Casa de
Suplicação de Portugal tinham aplicação integral aqui.

Logo após a proclamação da Independência brasileira, no Brasil


Império, os assentos portugueses ainda tiveram força de lei reconhecida por um
Decreto Legislativo, sendo que também autorizava a edição de assentos pelo
Supremo Tribunal de Justiça brasileiro, com o mesmo fim dos assentos
portugueses. 14

Tal ocorria por causa da falta de jurisprudência nacional. Como na


época da colonização não haviam decisões tomadas integralmente no território
nacional, quando de sua independência, ficou o país desprovido de parâmetros
para as decisões.

14
Dirimir dúvidas e solucionar conflitos jurisprudências manifestados nos julgamentos, ou seja, uniformizar a
jurisprudência.
16

Por isso, por mais absurdo que seja a aplicação de uma decisão de
outro país ao nosso, foi esse o sistema adotado até que se formasse e
estabelecesse a jurisprudência nacional.

Desta forma, tinha o instituto dos Assentos natureza jurídica


normativa, posto que tinha eficácia geral, vinculante e não era permitida a
modificação nem mesmo pelo órgão que a editou.

Uma vez editado um assento, era esse imperativo, com força


comparada à de lei, sendo que sua revogação só poderia ser feita por meio desta.
Enquanto não fosse editada uma lei que o revogasse ou ratificasse sua aplicação
permaneceria. Porém, não poderiam ficar submetidos ao alvitre do Judiciário,
mesmo porque a este cabia apenas gerá-las, e ao Legislativo cabia sua
manutenção ou revogação.

“À época imperial brasileira, não se podia contar, propriamente,


com uma jurisprudência nacional” 15.

Assim, o surgimento de uma lei posterior que tratasse do mesmo


assunto revogava os assentos, pois estes se encontravam submetidos às regras
de interpretação e de aplicação temporal que regem a legislação. 16

Apesar do caráter normativo os assentos não estavam submetidos à


"vacatio legis", sendo aplicáveis a partir do dia seguinte à sua publicação, fosse o
dia útil ou não. Então, uma vez editado e publicado um assento passaria a ter
aplicação imediata e geral, não se submetendo a um tempo para que as pessoas
pudessem adequar-se.

15
(Azevedo, Álvaro Villaça. Os Assentos no Direito Processual Civil, p. 121).
16
Hoje, LICC, art. 2°, § 1° - “A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja
com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior”.
17

Depois, com a desvinculação do Direito brasileiro do português e a


edição de jurisprudência nacional, embora com base nos assentos portugueses, o
Brasil passou a adotar o sistema das Súmulas, que consistia em método de
trabalho, cujo fim principal era agilizar o julgamento de causas nas quais o
Tribunal já houvesse se manifestado, ou seja, para servir de base para o Juiz
formar sua convicção e decidir o caso em análise.

A súmula aqui servia apenas de base para as decisões, não tendo o


caráter imperativo que possuía no direito português.

No Brasil, o centro do sistema jurisdicional é a lei, tendo a


Jurisprudência papel acanhado nesse sistema.

Assim, a Jurisprudência dá espaço à decisão legislativa embora seja


suplemento indispensável do sistema normativo positivado, ou seja, a lei é quem
fornece a decisão final e a jurisprudência apenas complementa sua aplicação.

A Jurisprudência não tem o poder normativo que era conferido aos


assentos, mas integra um sistema complementando-o e decidindo onde a lei se
faz inexistente. Desta forma serve a jurisprudência como meio de integração e
preenchimento de lacunas no Direito.

Por conta disto, nos últimos anos, vem ganhando crescente força,
onde a própria ordem legal vem reconhecendo o precedente jurisprudência como
importante parâmetro para as ações da sociedade.

Frise-se, porém, que para haver realmente uma força vinculante


necessária se faz a reforma de nossa Constituição, pois, a lei infraconstitucional a
ela está submetida, mas a vinculação não está disciplinada na mesma.
18

Como exemplo a essa crescente força vinculante podemos citar o


art. 557 17
do Código de Processo Civil, onde o relator está autorizado a negar
seguimento a recurso que esteja em confronto com súmula ou jurisprudência
dominante.

E também no parágrafo primeiro letra A18 do artigo acima


mencionado que autoriza o relator a dar provimento ao recurso quando a decisão
recorrida estiver em confronto com súmula ou jurisprudência dominante.

Desta forma, vê-se claramente uma crescente valorização da


súmula, atribuindo-lhe efeito vinculante, o que foi feito no Brasil com o advento da
Emenda Constitucional n° 45/2004.

A Emenda Constitucional n°45

Depois de mais de uma década em tramitação no Congresso


Nacional, restou aprovada a chamada Reforma do Judiciário, introduzida pela
Emenda Constitucional n° 45, de 08.12.2004.

Tal emenda trouxe ao nosso ordenamento a Súmula Vinculante (ou


de Efeito Vinculante, como a chamam alguns autores), através da introdução do
art. 103-A 19 na Constituição.

17
“Art. 557 – O relator negará seguimento ao recurso manifestamente inadmissível, improcedente,
prejudicado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do
Supremo Tribunal Federal ou de Tribunal Superior” (texto alterado pela lei 9756/98).
18
“§1°-A- Se a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com súmula ou com jurisprudência
dominante do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior, o relator poderá dar provimento ao
recurso”.
19
“Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois
terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a
partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder
Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como
proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.
§1°. A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das
quais haja controvérsia atual entre os órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que
acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica.
19

A súmula vinculante é um enunciado breve e sintético, com caráter


geral e abstrato, semelhante às súmulas comuns, cujo comando deverá ser
seguido pelos demais órgãos do Poder Judiciário e da Administração Pública
direta e indireta, ou seja, é uma súmula comum, à qual se atribui efeito vinculante
por deliberação de dois terços dos membros do Tribunal, fazendo com que as
demais instâncias sigam aquele entendimento em suas decisões.

Ao contrário do sistema da Common Law em que apenas uma


decisão já vinculava, a nossa súmula vinculante terá como base decisões
reiteradas sobre mesma matéria, todavia a simples decisão de um caso não
enseja a edição de uma súmula vinculante.

O efeito vinculante será concedido conforme decisão de dois terços


dos membros do Supremo Tribunal Federal, não sendo qualquer súmula a ter
efeito vinculante.

Desta forma, surgiu na época da reforma, um problema saber se as


súmulas já editadas automaticamente recebem o efeito vinculante ou não?

Parte da doutrina entendia que sim devendo apenas passar por


revisão ou cancelamento, mas recebendo automaticamente o efeito vinculante,
pois não faria o menor sentido exigir que o Tribunal realize diversas sessões para
analisar cada uma das súmulas e atribuir ou não o efeito vinculante.

Alegavam ainda que se há súmulas é porque já foram discutidas as


questões ali tratadas e concluem que aquela é a decisão acertada, não tendo
razão a sua não vinculação e necessidade de novos julgamentos para vincular.

§2°. Sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou cancelamento de súmula
poderá ser provocada por aqueles que podem propor a ação direta de inconstitucionalidade.
§3°. Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a
aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato
administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem
aplicação da súmula, conforme o caso”.
20

Em contrapartida, tínhamos o grupo que defendeu que o efeito deve


ser atribuído através da análise e voto de, pelo menos, dois terços de seus
Ministros, conforme dispõe o artigo 103-A da Constituição, acrescentado pela
Emenda Constitucional nº 45.

Desta forma, atribuir-se o efeito vinculante automaticamente a todas


as súmulas já existentes seria a retroatividade da lei, que não é aceita em nosso
Ordenamento jurídico.

Assim, concluem que não se estaria cumprindo o procedimento


preceituado pela nossa Constituição e que a retroatividade não deve ocorrer.

Preceituavam eles que a Súmula, para ser vinculante, devia ser


submetida à reapreciação por parte do pleno do Tribunal, que então decidirá se
terá ela efeito vinculante ou não.

Importante salientar que este último entendimento se coaduna com o


art. 8º da Emenda Constitucional nº 45, pois este diz que: “as atuais súmulas do
Supremo Tribunal Federal somente produzirão efeito vinculante após sua confirmação por
dois terços de seus integrantes e publicação na imprensa oficial”.

Então, concluímos que resta finalizada a discussão sobre o assunto,


tendo em vista estar expressamente disciplinado na Emenda, sendo que a
discussão doutrinária em torno do mesmo é apenas debate de opiniões.
21

CAPITULO II

CONCEITO E FINALIDADE

Como já vimos a súmula vinculante não é um instituto jurídico novo,


embora recente na previsão legal brasileira.

Antes de entrar e analisar mais profundamente o referido instituto,


será necessário conceituar, e para isso vamos desmembrar o substantivo, e
primeiramente vendo do que se trata a súmula.

De acordo com o vocabulário jurídico de Plácito e Silva :

“ Súmula, do latim ` summula` (resumo, epítome breve), tem o sentido de


sumário, ou de índice de alguma coisa . É o que de modo abreviadíssimo explica o
teor, ou o conteúdo integral de alguma coisa. Assim a súmula de uma sentença ,
de um acórdão, é o resuma ou a própria sentença ou do acórdão.
No âmbito da uniformização da jurisprudência, indica a condensação de
series de acórdãos, do mesmo tribunal, que adotem idêntica interpretação de
preceito jurídico em tese, sem caráter obrigatório, mas persuasivo, e que,
devidamente numerados, se estampem em relatórios”.20

20
SILVA, De Plácido e. vocabulário jurídico Página 21346
22

Marco Antônio Botto Muscari:

“É o resultado do julgamento tomado pelo voto da maioria absoluta


dos membros que integram o tribunal, condensando em enunciado que
constituirá procedente na uniformização da jurisprudência do próprio
órgão”.21

O vocábulo vinculante é um derivado de vinculo, no sentido de laço ,


ou de vincular, de amarrar, claro que estamos falando de palavras de classificação
gramatical distintas, pois , um é, um substantivo e o outro é um verbo, mas o que
nos interessa é o radical.

Em sentido mais restritivo, mais direcionado ao sentido de nosso


estudo, estamos falando de uma súmula , no sentido recém estudado, que
“amarra, laça, liga” as demais decisões que versem sobre o mesmo assunto.

Marco Antônio Botto Muscari explica nesse sentido:

“ A súmula vinculante é mais do que a jurisprudência e menos do


que a lei, situa-se a meio-caminho entre uma e outra .Com a jurisprudência
guarda similitude pelo fato de provir do judiciário e de estar sempre
relacionada a casos concretos que lhe dão origem”. 22

Mas a súmula vinculante foi introduzida em nosso Ordenamento,


basicamente com duas finalidades, a primeira a se destacar é a diminuição de
tempo de julgamento de uma ação, visto que haverá já um entendimento
direcionado a segunda é própria uniformização do judiciário.

Segundo os defensores do instituto, o sistema judiciário estava


necessitando de uma medida para ambos os casos acima citados como veremos

21
MUSCARI, Marco Antonio Botto. Súmula Vinculante. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999. p. 35
22
MUSCARI, Marco Antonio Botto. Súmula Vinculante. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999.p.53
23

mais adiante ao estudar mais profundamente o entendimento da doutrina sobre a


adoção da súmula vinculante no Brasil.

PROCEDIMENTO PARA A EDIÇÃO

Passemos agora ao procedimento a ser observado para edição da


Súmula Vinculante.

Conforme preceitua a Emenda, somente o Supremo Tribunal Federal


poderá editar Súmulas Vinculantes, sendo necessária aprovação de dois terços de
seus membros.

Assim, as decisões reiteradas sobre a mesma matéria (Súmulas)


serão submetidas ao pleno do Tribunal, que deliberará sobre a atribuição do efeito
vinculante às mesmas.

Vale ressaltar que as decisões, por ser o Supremo Tribunal Federal o


guardião da Lei Maior, deverão versar sobre matéria constitucional, isto porque a
edição de súmulas com conteúdo diverso não se coaduna com a Emenda em
debate.

Desta forma, o efeito vinculante está adstrito às matérias


constitucionais, não se tendo estabelecido de forma generalizada sua adoção, o
que servirá para amenizar os benefícios e prejuízos que podem advir de sua
adoção, tendo-se a clara idéia de seu sucesso ou fracasso.

Saliente-se que a edição das Súmulas Vinculantes também teve seu


procedimento disciplinado de acordo com outro ato normativo neste caso foi a Lei
24

11.417 de 12 de dezembro de 2006, sem desprezar o Regimento Interno do STF,


isso porque a Emenda traça apenas contornos de como deverá ser elaborada.

Continuando, para que a Súmula Vinculante tenha eficácia,


necessária sua publicação na imprensa oficial, ou seja, não basta a publicação
nas chamadas “publicações oficiais” reconhecidas pelo STF, e sim sua publicação
no Diário Oficial, que é a Imprensa Oficial.

Assim, terá validade e eficácia a Súmula Vinculante após sua


publicação no órgão oficial, eis que se feita a publicação em qualquer outro órgão
de imprensa será ineficaz.

Então, deverão submeter-se a elas todos os órgãos judiciários,


considerando que emanada da mais alta corte de nosso País, já que ela mesma
está obrigada à sua aplicação, ou seja, não podem suas frações decidir em
desacordo com a Súmula editada.

Nos termos do artigo 2o da Lei que regulamenta a estudada emenda,


“ O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, após
reiteradas decisões sobre matéria constitucional, editar enunciado de súmula que,
a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação
aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta,
nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou
cancelamento, na forma prevista nesta Lei.

Ainda sobre a edição das súmulas vinculante ressaltemos que elas


poderão ser revistas ou canceladas a qualquer tempo pelo Supremo Tribunal
Federal, ou seja, o Tribunal poderá rever seu entendimento ou revogá-lo a
qualquer tempo, sendo que deverá solucionar os problemas intertemporais criados
com tal ato.
25

A Lei 11.417 de 12 de dezembro de 2006 prevê ainda: “Art. 3o  São


legitimados a propor a edição, a revisão ou o cancelamento de enunciado de
súmula vinculante:I - o Presidente da República;II - a Mesa do Senado Federal;III
– a Mesa da Câmara dos Deputados;IV – o Procurador-Geral da República;V - o
Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;VI - o Defensor Público-
Geral da União;VII – partido político com representação no Congresso
Nacional;VIII – confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional; IX
– a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal;
X - o Governador de Estado ou do Distrito Federal;XI - os Tribunais Superiores, os
Tribunais de Justiça de Estados ou do Distrito Federal e Territórios, os Tribunais
Regionais Federais, os Tribunais Regionais do Trabalho, os Tribunais Regionais
Eleitorais e os Tribunais Militares.

§ 1o  O Município poderá propor, incidentalmente ao curso de processo em


que seja parte, a edição, a revisão ou o cancelamento de enunciado de súmula
vinculante, o que não autoriza a suspensão do processo.

§ 2o  No procedimento de edição, revisão ou cancelamento de enunciado da


súmula vinculante, o relator poderá admitir, por decisão irrecorrível, a
manifestação de terceiros na questão, nos termos do Regimento Interno do
Supremo Tribunal Federal.”

Esses são os lineamentos principais do procedimento de edição da


Súmula Vinculante.

A SÚMULA VINCULANTE COMO NORMA JURÍDICA


26

Com a adoção da Súmula Vinculante impõe-se ao judiciário que


todos os casos análogos sejam julgados em conformidade com os preceitos
ditados na súmula, ou seja, deverão os casos que guardem consonância com a
súmula ser julgados conforme aquele entendimento, sob pena de exigir-se o
cumprimento diretamente pelo Supremo Tribunal Federal, por meio de
reclamação.

Desta forma, a obediência por parte dos juizes inferiores à súmula


em muito se assemelha à mesma obediência que devem ter com relação à lei, daí
podermos atribuir a pecha de Norma Jurídica à Súmula Vinculante.

A sociedade é repleta de normas, sejam jurídicas, morais, religiosas,


sociais, etc., e cada uma dessas normas deve ser seguida pela sociedade.

Então, como a Súmula Vinculante é um preceito que faz com que os


juízes inferiores e a sociedade a cumpram, podemos enquadrá-la como uma
norma judiciária, ou seja, uma norma geral e abstrata, a ser seguida em casos
análogos, editada pelo Poder Judiciário.

Porém, muitos dirão que a súmula não pode constituir norma


judiciária, posto que decorre da interpretação legal, sendo submetida à norma
legal. Inconsistente tal afirmação na medida em que para ocorrer uma
interpretação, necessária a criação.

A interpretação de uma norma não surge do acaso, mas da criação


intelectual dos juizes.

Desta forma, não podemos dizer que a súmula guarda conteúdo


meramente legal, mesmo por que existem súmulas que corrigem as lacunas
deixadas pela lei, fazendo-se presente onde a lei é omissa.
27

A súmula decorre sim da criação jurisdicional e da análise feita pelos


juizes do caso sub judice, não se tratando apenas de aplicação literal da letra da
lei e sim integração feita pelo juiz.

A LEI INFRACONSTITUCIONAL FRENTE À SÚMULA


VINCULANTE

A Súmula Vinculante, embora não entendida dessa forma, já estava


inserida em nosso Código de Processo Civil, pelas alterações das Leis 11.276/06
e 11.277/06.23

Isso ocorre com a introdução, pela Lei 11.276/06, de um parágrafo


primeiro ao artigo 518 do Código de Processo Civil, que estabelece: “§1º. O juiz não
receberá o recurso de apelação quando a sentença estiver em conformidade com súmula
do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal”.

Assim, vemos claramente que esse artigo já adota o instituto da


Súmula Vinculante, barrando o recurso na Vara de origem por estar a decisão em
conformidade com a Súmula dos Tribunais Superiores, sendo que evita o reexame
de matéria decidida conforme seu entendimento.

Tal dispositivo nada mais é do que a pura introdução da alteração


constitucional ao ordenamento infraconstitucional.

Na mesma linha estabelece a Lei 11.277/06 pela introdução do art.


285-A ao Código de Processo Civil que: “Art. 285-A. Quando a matéria controvertida

23
FUERTES, Ana Paula Thabata Marques. Monografia o Duplo Grau de Jurisdição. UniFMU, 2006.
28

for unicamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total


improcedência em outros casos idênticos, poderá ser dispensada a citação e proferida
sentença, reproduzindo-se o teor da anteriormente prolatada”.

Estabelece aquele artigo a aplicação da mesma decisão em casos


que versem exclusivamente sobre matéria de direito aos casos idênticos, ou seja,
se já houve naquele juízo uma decisão de um caso idêntico, está o juiz autorizado
a proferir a mesma sentença.

Assim, evita-se o reexame da mesma questão, diminuindo desde


logo o número de demandas no Judiciário.

Então, vemos aqui também a clara introdução de um efeito


vinculante no ordenamento jurídico pátrio, não apenas no âmbito das decisões
proferidas por Tribunal Superior, mas nas decisões inclusive de instâncias
inferiores.

Tais alterações demonstram realmente que a Vinculação acena


como um forte instituto que nasce com a promessa de resolver os problemas do
nosso Judiciário, sendo que a incorporação e disciplina pelo Código de Processo
Civil é exemplo que provavelmente será seguido por outros ramos do direito.
29

CAPITULO III

A SÚMULA VINCULANTE E O PRINCÍPIO DO DUPLO


GRAU DE JURISDIÇÃO

O tema foco da pesquisa é a súmula vinculante em si mesma, mas


não é de se desprezar que tal instituto constitucional, pode mexer com princípios
já consolidados no Direito, como por exemplo, a livre convicção motivada, o
Devido Processo Legal, pois, se existe a possibilidade dentro do processo legal de
ter sua decisão sujeita ao duplo grau de jurisdição por que limita-lo?

Note que o que mais visualizamos diretamente é a possível afronta


ao duplo grau de jurisdição, embora seja possível afrontar o instituto com todos os
princípios do Ordenamento, o que seria quase impossível em um trabalho
acadêmico.

Por isso um capitulo dedicado somente a esse assunto.

CONCEITO E JUSTIFICATIVA DA ADOÇÃO DO PRINCÍPIO

"Esse princípio indica a possibilidade de revisão, por dia de recurso,


das causas já julgadas pelo órgão "a quo", que corresponde a denominada
30

jurisdição inferior, garante assim, um novo julgamento, por parte dos órgãos
da jurisdição superior".24

O duplo grau de jurisdição, ou instituto da recursividade, como


preferem chamar alguns doutrinadores, surgiu nos ordenamentos jurídicos
primitivos, permanecendo nos sistemas hodiernos, inclusive no nosso, em
decorrência de três fatores, quais sejam: a falibilidade do juiz, o inconformismo da
parte vencida e a constante preocupação em se evitar a existência do despotismo
por parte dos membros do magistrado.

Quanto à falibilidade do juiz, temos que, pelo simples fato de se tratar


de um ser humano, o juiz não está imune a eventuais falhas, sejam "errores in
procedendo" ou "errores in judicando", ou seja, erros cometidos no procedimento
utilizado ou na fundamentação descabida de sua decisão, permitindo, assim,
futuras discussões quanto a seus atos e decisões.

No tocante ao inconformismo da parte sucumbida, esclarece


pontualmente Nelson Nery Júnior que:

"De outra parte, nosso subjetivismo nos coloca naturalmente contra


decisão desfavorável, de sorte que o sentimento psicológico do ser humano
faz com que tenha reação imediata à sentença desfavorável, impelindo-o a
25
pretender, no mínimo, novo julgamento sobre a mesma questão."

Finalmente, ao prever a revisão de decisões judiciais, pretenderam


os legisladores afastarem a possibilidade de o autoritarismo acometer os juizes,
pois sem a referida garantia, estes ficariam imbuídos da certeza de que suas
decisões seriam imutáveis, o que desviaria o principal escopo da jurisdição, que é
promover a pacificação social, a justiça e a ordem pública de maneira imparcial.

24
GRINOVER, Ada Peregrini; CINTRA, Antonio Carlos de Araujo: DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria
Geral do Processo. 22 ed. São Paulo: Malheiros. 2006. p. 80.
25
NERY JR, Nelson. Princípios do Processo Civil na Constituição Federal. 3 ediçao. São Paulo: RT. 1997
p.37)
31

Embora seja comum o pensamento de que tal princípio esta na


expresso na Constituição Federal, ele não está, mas há quem defenda que ele
esta na Magna Carta, mas de forma implícita, quando a Lei Maior prevê órgãos
jurisdicionais distintos e hierárquicos, ao prever a possibilidade de recursos, entre
outras previsões relacionadas. 26

A SÚMULA VINCULANTE E O DUPLO GRAU DE


JURISDIÇÃO

É certo recordarmos, que como já citado, já há uma legislação


infraconstitucional prevendo a aplicação de súmulas vinculantes, leia-se aqui em
sentido "latu", pois trata-se de súmulas que também geram o efeito da vinculação,
mas não são as referidas súmulas inseridas pela EC 45/04 e sim as inseridas
pelas leis ordinárias já mencionadas.27

Vimos também, ainda que sucintamente, que o duplo grau de


jurisdição garante o direito de reexame das decisões, como regra, por um órgão
de instância superior.

O que vamos afrontar agora é a limitação do princípio do duplo grau


de jurisdição com a adoção da súmula vinculante, e agora tanto faz falarmos nela
em sentido "stritu" ou "lato", pois, seja qual for o sentido, há, e não há como negar,
uma limitação no referido princípio. 28

Esse e outros motivos fazem com que a doutrina se divida com


relação a constitucionalidade do instituto.

26
NERY JR, Nelson. Princípios do Processo Civil na Constituição Federal. 3 ediçao. São Paulo: RT. 1997,
p.39.
27
FUERTES, Ana Paula Thabata Marques. Monografia o Duplo Grau de Jurisdição. UniFMU, 2006
28
Idem.
32

Formando, como veremos a seguir, diversas posições.

ARGUMENTOS FAVORÁVEIS

O argumento mais forte encontrado entre os defensores da


vinculação é o de que, sem esta, não haverá como o Judiciário, principalmente os
Tribunais Superiores, fazer frente à enorme demanda que lhes é submetida todos
os dias.

Essa corrente entende a vinculação como a solução para o problema


decorrente da crescente demanda processual levada aos Tribunais, chegando
inclusive a classificar de ridículo o número de juízes por habitante em nosso país,
o que impossibilita o bom andamento do Judiciário.

Vincular o juízo inferior à decisão do Tribunal confere mais agilidade


à ação do judiciário, possibilitando que os Tribunais Superiores julguem os casos
que lhes são submetidos mais rapidamente.

Assim, no dizer de Silvio Nazareno Costa: “seria a Súmula Vinculante


um instrumento de otimização dos procedimentos jurisdicionais nas cortes superiores”. 29

Seus defensores pregam que a Súmula Vinculante teria como


principal efeito a celeridade e eficácia do provimento jurisdicional.

Outro argumento sustentado é o de que a vinculação racionalizaria o


sistema, pois não se pode admitir que juízos inferiores ignorem e desrespeitem os
julgamentos das mais altas cortes, afinal, entendem esses, as Cortes Superiores,
ao sumular suas decisões, o fazem com base na experiência e melhor juízo.
29
COSTA, Silvio Nazareno. Súmula Vinculante e Reforma do Judiciário. Rio de Janeiro: Forense 2002.
33

Entendem ainda, os defensores desse argumento não ser


admissível, que o Juiz inferior desrespeite o entendimento do superior, pois este,
como Corte máxima, é quem pode dizer o que está mais correto, pois como
superior, tem mais experiência e melhores condições técnicas para julgar, mesmo
porque os Tribunais Superiores decidem através de órgãos colegiados.

Tais defensores entendem como insubordinação, desobediência ou


rebeldia o fato de os juízos inferiores julgarem contra o entendimento Superior,
ensejando a reforma da decisão.30

Chegou-se inclusive a propor um projeto em que a não obediência à


Súmula Superior ensejaria o crime de desobediência por parte do Magistrado,
ocasionando sua suspensão e até sua expulsão dos quadros do Judiciário. Atitude
demasiadamente absurda e com caráter autoritário.

Tal argumento baseia-se no fato de que a liberdade de convicção


dos magistrados jamais deve ser considerada de forma absoluta, devendo ceder a
outros princípios existentes no ordenamento jurídico, sobretudo quando se tratar
de julgamentos proferidos por órgãos colegiados.

Desta forma, entendem que a liberdade de convicção está submetida


ao autoritarismo que os órgãos superiores tentam impor às suas decisões. Porém,
tal argumento não pode persistir, afinal, segundo prescreve nossa Constituição

30
“Houve uma época – membros mais antigos deste Tribunal o recordam – em que determinado Tribunal de
Justiça, numa prestigiosa unidade da Federação, dava-se crônica e assumidamente a desafiar a jurisprudência
do Supremo a respeito de um tema sumulado. (...) Resultado: todas as decisões eram, mediante recurso,
derrubadas por esta Casa. Aquilo que deveria acabar na origem, à luz da jurisprudência do Supremo, só
acabava aqui, depois de um lamentável dispêndio de recursos financeiros, de tempo e de energia, num
Judiciário já congestionado e com tempo mínimo para cuidar de coisas novas. E quando acontecia de a
jurisprudência do Supremo acabar não prevalecendo, e de a decisão do tribunal rebelde encontrar seu
momento de glória? (...) Com todo o respeito pelo que pensam alguns processualistas, não vejo beleza alguma
nisso. Pelo contrário, parece uma situação imoral, com que a consciência jurídica não deveria, em hipótese
alguma, contemporizar. De modo que me pergunto: faz sentido não ser vinculante uma decisão da Suprema
Corte do país? (...) Tem alguma seriedade a idéia de que se devam fomentar decisões expressivas de
rebeldia?” (Rezek, Francisco. In RTJ nº 157, p. 393).
34

Federal, ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em


virtude de lei.

Para os não adeptos, isso significa, considerar que dentro do Poder


Judiciário possa uma decisão superior obrigar os juízos inferiores, de forma que se
estaria conferindo demasiado poder àquelas decisões.

Sustentam alguns que a força vinculante é uma imposição lógica do


sistema, pois não se pode conceber que um entendimento esposado pela maioria
dos membros de um Tribunal Superior seja sufragado, sendo que deveria mesmo
causar a produção normativa por parte do Poder Legislativo no sentido do
entendimento sumulado.

Assim, para que as decisões proferidas e sumuladas tenham efeito


contra todos, será necessária sua posterior conversão em lei. Não há como admitir
simplesmente que a edição da súmula vincule a sociedade.

Lembram ainda que diversos dispositivos, preexistentes à Reforma,


conferem caráter vinculante a determinadas decisões, tais como o caso da
eficácia concedida ao julgamento de Ações Declaratórias de Constitucionalidade.

As decisões dessas ações têm caráter vinculativo com relação aos


órgãos administrativos e às instâncias inferiores do Judiciário, sendo que seu
efeito é "erga omnes".

Desta forma, sustentam que a vinculação não é uma novidade total


em nosso ordenamento jurídico, pois já estava prevista para decisões específicas.

Outro argumento utilizado é o de que o pluralismo de decisões é


maléfico, criando a insatisfação e insegurança nas pessoas. Assim, para resolver
35

essa questão, devem os Tribunais determinar qual o entendimento a ser seguido


para que haja a igualdade na aplicação do direito.

Não se pode admitir que uma mesma norma seja interpretada de


diversas maneiras por juízes ou tribunais diferentes. Se o caso é semelhante deve
a norma ser interpretada da mesma maneira que o foi anteriormente.

No dizer de Marcelo Lamy e Luiz Guilherme Arcaro Conci, “A lei tem


que valer de maneira isonômica e não variada diante de diversos demandantes”.31

Entendem então que seria uma afronta ter casos semelhantes


tratados de forma desigual, causando insegurança às pessoas, pois nunca
saberiam o que poderia acontecer ao levarem seus casos a um Tribunal.

A pessoa teria dúvidas sobre a eficácia do provimento jurisdicional a


ser editado.

Desta forma, argumentam que a vinculação conferiria maior


segurança jurídica, em decorrência da homogeneidade e previsibilidade do
sistema, deixando de existir decisões conflitantes nas mesmas situações.

Tal entendimento foi expresso por Arnoldo Wald, em entrevista


concedida ao Jornal do Advogado, da Ordem dos Advogados do Brasil, secção de
São Paulo: “Acho que a segurança é importante. O Poder Judiciário está fazendo
progressos imensos, não só com relação aos contratos, mas a reforma do Judiciário está
aí e algumas técnicas podem não parecer ideais, como a súmula vinculante, mas vão
permitir que tenhamos mais garantias em matéria de direito. Uma das razões pelas quais
o Judiciário está congestionado é a insegurança e a incerteza no Direito, o que faz com
que muita gente vá à Justiça para ganhar ou para perder. Se esses processos todos
pudessem ser julgados mais rapidamente, haveria menos discussão, menos processos e

31
Lamy e Conci, Marcelo e Luiz Guilherme Arcaro. Reforma do Judiciário analisada e comentada, p. 307.
36

poderíamos substituir o ciclo vicioso pelo ciclo virtuoso. Ciclo virtuoso porque sabendo
qual é a decisão definitiva quem não tem esse direito não vai discutir em juízo”.32

De tal entendimento também comunga José Marcelo Menezes Vigliar


quando ensina: “O valor jurídico preservado, indiscutivelmente, é o da segurança
jurídica, importantíssimo num Estado de Direito”.33

Diz ainda referido autor que a segurança nas relações jurídicas é o


fim principal almejado pela vinculação e não apenas tornar mais céleres os
julgamentos, sendo este apenas um efeito ocasionado.

Argumenta também que a regra da vinculação é extremamente clara,


tendo força que chega a superar a força de lei, pois a lei pode ser interpretada e
levada aos Tribunais, mas a Súmula Vinculante, por que emanada dos Tribunais
Superiores, está em sua instância máxima, não havendo possibilidade de ser
discutida.

ARGUMENTOS DESFAVORÁVEIS

Opondo-se à vinculação, temos entidades como OAB, AJURIS,


ANAMATRA, AMB, ANPR34, dentre outras e também um grande número de
magistrados, ministros, parlamentares e pela doutrina em geral.

Como primeiro argumento defendem que a vinculação compromete o


princípio da separação dos Poderes, pois atribuindo a prerrogativa de expedir

32
Wald, Arnoldo. Entrevista concedida ao Jornal do Advogado nº 290 - Janeiro de 2005, da Ordem dos
Advogados do Brasil, secção de São Paulo, pp. 10/11.
33
Vigliar, José Marcelo Menezes. Reforma do Judiciário analisada e comentada, p. 288.
34
Ordem dos Advogados do Brasil; Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul; Associação Nacional dos
Magistrados Trabalhistas; Associação dos Magistrados Brasileiros; Associação Nacional dos Procuradores da
República, nesta ordem.
37

súmulas com poder vinculante (norma prospectiva com eficácia erga omnes),
atribuir-se-ia a capacidade de edição ao Poder Judiciário de normas que devem
ser seguidas por todos, função que compete ao Poder Legislativo.

Desta forma, estar-se-ia atribuindo ao Judiciário competência fora de


suas funções.

Embora o poder normativo do Judiciário seja admitido, trata-se


apenas de integração de lacunas do Direito positivo, elaborando-se norma
concreta derivada, resultante de uma discrição vinculada à lei 35, ou seja, o Juiz
utiliza sua discrição para completar as lacunas encontradas e para interpretar a lei,
seja criando ou recriando o direito, porém sempre na medida da lei dentro do caso
"sub judice".

Assim, não se admite que se atribua ao Juiz uma atividade própria do


Legislativo, afinal uma coisa é o Juiz expedir sentença normativa entre as partes,
e outra um Tribunal expedindo norma com efeito "erga omnes".

O cerne da questão é o efeito "erga omnes" que não poderia, em


tese, ser atribuído ao Poder Judiciário, pois na tripartição dos poderes, sua função
precípua é a de julgar os litígios que lhe são submetidos, não lhe cabendo editar
norma que atinja toda população.

Entendem que a Súmula Vinculante contraria o princípio da


separação dos poderes, criando uma confusão entre Judiciário e Legislativo.

Outro argumento muito forte dos opositores da vinculação é a


infração ao princípio da independência jurisdicional.

35
O Juiz tem discrição no julgamento, até os limites da lei.
38

Isto pois, a independência é a garantia constitucional de que o


Magistrado não sofrerá ingerências, de qualquer origem e natureza, sobre sua
atividade judicante, conferindo-lhe a segurança de que necessita para manter sua
imparcialidade frente ao caso concreto em análise.

Não importa qual a origem dessa ingerência (externa ou interna), ela


sempre será uma interferência de terceiro em um Poder independente por sua
própria origem. Essa interferência não encontra amparo na Constituição e nem
pode ser admitida.

Desta forma, argumentam que a própria Emenda Constitucional que


cria a Súmula Vinculante seria inconstitucional, pois fere outro princípio, qual seja
o princípio da independência funcional dos poderes, que não pode ser violado a
pretenso pretexto de desafogar o Judiciário, tornando-o mais célere e eficaz.

Existem sim outros meios de tornar o Judiciário mais célere e eficaz


sem ferir princípios já consagrados e que são as bases de nossa Democracia.

Argumentam também que sem independência, não há


imparcialidade, sendo que o Juiz não pode ser hierarquizado, subordinado a
decisões superiores que interfiram em seu julgamento e convicção.

Não há que se falar imparcialidade de um Juiz que terá que decidir


daquela forma já expressa e sumulada pelo Tribunal. Antes mesmo do contato
com o caso "sub judice" estará ele inclinado àquela decisão proclamada pela
Súmula.

É o Juiz que, através do contato com os fatos, expressa seu


julgamento. É com base no Juízo de valor feito com fundamento nas provas
39

produzidas que o Juiz julga. Se o Juiz estiver obrigado à aplicação de uma súmula
superior perde-se a individualidade de cada caso, que é imanente ao ser humano.

Assim, concluem, não pode o princípio da independência ser


desrespeitado, sob pena de engessar o Judiciário e condicioná-lo a uma decisão
sempre igual, antes mesmo da análise caso a caso.

Argumenta-se também, em contrapartida ao argumento dos que


defendem a vinculação (diminuição da carga de processos no Judiciário, pois a
pessoa já sabendo da decisão, não o procurará), que a vinculação afastaria as
pessoas do Judiciário, sendo que estaríamos diante de uma negativa de
Jurisdição.

A negativa de Jurisdição é vedada pelo ordenamento pátrio, já que é


garantia constitucional o acesso ao Judiciário e o direito à ação.

Desta forma, não pode o Poder Judiciário, sob o pretexto de que está
com muito serviço e de que as causas são repetitivas, impedir que o cidadão
tenha seu caso analisado por um Juiz.

Ora, deve o Judiciário adequar sua estrutura, expandindo o número


de juizes e funcionários, até chegar a um número compatível com a realidade
encontrada em nosso país.

Não podemos condenar o cidadão à não apreciação de seu


problema simplesmente para desafogar a máquina do Judiciário. O cidadão tem a
prerrogativa de ter seu caso submetido à Justiça sendo que esta é uma garantia
que não deve ser afastada de forma alguma.
40

Estes são os principais argumentos encontrados para a não


utilização da vinculação.

O “PROBLEMA” DO CASO ANÁLOGO

Conforme dito acima, a aplicação das Súmulas Vinculantes ocorreria


aos casos análogos, submetidos ao Judiciário.

Discute-se então o que vem a ser caso análogo.

Caso análogo, no entender da maioria, seria o caso que guarde


consonância com o já decidido, apresentando acontecimentos fáticos e pedido
muito parecidos.

A identificação desses casos dependerá da análise subjetiva do


magistrado, quando de seu contato com a causa. Assim, o que para um pode ser
um caso análogo, para outro, por uma peculiaridade, pode não ser, ensejando
decisão diferente.

Se no entender do Juiz de primeiro grau não coubesse a aplicação


da súmula editada, teria ele que decidir contra a súmula ou ir contra seu
entendimento e aplicar a súmula?

A resposta a essa pergunta não é clara e só poderá ser dada na


medida que acontecerem os casos práticos. Não podemos prever qual será o
comportamento dos magistrados diante de tal problema e qual seria a reação das
partes diante disso.
41

Em decorrência disso, entendem alguns que por tratar-se de análise


subjetiva ensejaria a impetração de mandado de segurança cada vez que o juiz
aplicasse a Súmula, argumentando a diferença do caso "sub judice", pois não
haveria como aplicar a súmula, por não ser o caso análogo.

Pondere-se aqui que tal entendimento é um tanto exagerado, pois a


analogia entre os casos decorre da própria análise do mesmo, não havendo se
falar em diferenças específicas que não ensejam a mesma.

O preceito formulado na súmula deverá ter caráter geral sendo difícil


vislumbrar-se um caso fático que não pudesse ser enquadrado na disposição da
mesma. É utópico falar-se em impetração de mandado de segurança para discutir-
se a analogia.

“EMPERRAMENTO” DA MÁQUINA JUDICIÁRIA

Hoje o Judiciário caiu em descrédito perante a população devido a


sua grande lentidão. Uma pessoa, quando provoca a jurisdição, o faz para ter
atendida uma pretensão resistida pela outra parte, buscando-a de forma (não
imediata, pois impossível) célere, para que possa gozar daquele direito que está
sendo violado.

Porém não é essa a realidade de nosso judiciário. Por muitos fatores


internos e externos o processo arrasta-se por muitos anos, demandando do autor
muita paciência e por muitas vezes tornando o provimento judicial inócuo.

Isto se deve ao grande número de recursos que fazem com que o


processo demande anos para que transite em julgado a decisão final. Após a
42

decisão inicia-se ainda uma nova fase dentro do processo de conhecimento que é
a fase de execução.

Outro fator muito importante que contribui para a demora do


processo é o número insuficiente de Juízes perante a demanda, bem como o
excesso de normas com pouco ou nenhuma aplicação efetiva.

Afora essas, no ensinamento de Sílvio Nazareno Costa, podemos


ainda apontar várias concausas muito conhecidas no cenário nacional:

1) “As excessivas possibilidades recursais no nosso sistema processual;

2) O uso abusivo do recurso por dever de ofício como técnica para postergar o
pronto atendimento de determinações judiciais por parte do Poder Público;

3) O Baixo número de Juízes, frente ao esmagador e crescente volume de


demandas;

4) O insuficiente quadro funcional do Judiciário, dificultando o célere cumprimento


das ordens judiciais;

5) A repetitividade de ações, muitas das quais versando sobre matéria de


jurisprudência já consolidada.”36

Dentre outros.

Passando agora a outro problema, vislumbramos uma enormidade


de recursos cabíveis de cada decisão, fazendo com que o processo demore por

36
Costa, Silvio Nazareno. Súmula Vinculante e Reforma do Judiciário, p. 42/43.
43

muito tempo, afinal a cada recurso, em média, acrescem-se de quatro a cinco


anos ao processo.37

Isso também por que das decisões de recursos cabem novos


recursos, arrastando-os por muito mais tempo. Assim, um recurso é pretexto para
outro e outro, etc.

Temos ainda as situações de reexame necessário, nos casos em


que o poder público é sucumbente, desta forma, a cada decisão envolvendo o
Poder Público como vencido cresce o número de processos nos Tribunais.

Ainda, registre-se a incongruência entre o volume de processos


existentes e que ingressam todos os dias no Poder Judiciário e o tamanho da
máquina processual, sendo que esta não cresce na mesma proporção daquela.

AUMENTO ACELERADO DA DEMANDA

O Judiciário enfrenta o problema do aumento da demanda sem que o


mesmo ocorra com a máquina judiciária.

Se, a estrutura do Poder Judiciário não acompanhar o crescimento


da demanda na mesma proporção, inevitavelmente, teremos um colapso. Desta
forma, deve o Judiciário adequar-se às dimensões do país 38, que cresce
vertiginosamente a cada dia que passa.

37
FUERTES, Ana Paula Thabata Marques. Monografia o Duplo Grau de Jurisdição. UniFMU, 2006
38
...”tudo se resume em saber se o Brasil deve adequar-se às dimensões do seu judiciário, ou se o judiciário
deve adequar-se às dimensões do seu judiciário, ou se o judiciário deve adequar-se às dimensões do Brasil”.
(Cunha, Sérgio Sérvula da. Ainda sobre o Efeito Vinculante, p. 164.
44

Com o crescimento da população e constante ingresso de novas


empresas no mercado logicamente há o aumento da demanda jurisdicional.

Segundo o Estado, não há o provimento dos cargos vagos por falta


de verba suficiente para fazer frente ao salário e dispêndios necessários à
implantação e aparelhamento do Judiciário.

Desta forma, temos em nosso país, quando comparado com outros


países, principalmente os mais desenvolvidos, um número de juízes por habitante
que chega a ser vergonhoso.

Apesar desses problemas devemos considerar, também, a


possibilidade do controle da demanda, ou seja, ações efetivas sobre a parcela da
demanda que pode ser evitada. Porém, neste caso, nos deparamos com um grave
problema, o controle da demanda pode significar uma negativa de jurisdição,
vedada por nossa Constituição.

Uma solução indicada por alguns processualistas é difundir mais o


instituto da arbitragem no Brasil, que está regulamentado em nosso ordenamento
pela Lei 9.307/96 e, ainda hoje, muito pouco usado pela população.

Hoje, o juízo arbitral mostra-se como alternativa bastante eficiente à


lentidão do judiciário, sendo que muitas causas podem ser decididas por meio
desse instituto.

Outro agente que faz crescer o número de demandas levadas ao


Judiciário, e já citado anteriormente, é o próprio Poder Público.

O Poder Público tenta ao máximo postergar o pagamento em


demandas nas quais foi sucumbente, sendo que para isso criou no nosso
45

ordenamento a obrigatoriedade do duplo grau de Jurisdição quando o Estado for


parte, devendo o Juiz recorrer de ofício de sua decisão, encaminhando-a a
Instância Superior. Claro que quando se trata do Poder Público, há a supremacia
do interesse público, mas também há interesse público na eficiência do judiciário.

REPETITIVIDADE DO TRABALHO NOS TRIBUNAIS SUPERIORES

Nos dias de hoje, talvez o que mais tenha chamado a atenção dos
operadores do Direito para a admissão da Súmula Vinculante seja o fato de a
maioria dos casos levados ao judiciário serem a repetição fática e jurídica idêntica
de causas já decididas.

Esta é uma das principais teses esposadas pelos magistrados para a


necessidade urgente da Súmula Vinculante. Alegam os Tribunais Superiores que
não têm condições de realizar um trabalho célere e eficaz por terem que discutir,
por diversas vezes, causas que versam sobre o mesmo assunto.

Os mesmos problemas são levados por diversas pessoas diferentes,


forçando o Judiciário a analisar sempre casos muito parecidos.

Assim, no dizer do Ministro Sepúlveda Pertence do Supremo Tribunal


Federal, teremos uma “Guerra de Computadores” 39 onde o Juiz aperta uma tecla
para decidir o processo, e o Tribunal "ad quem" decide da mesma forma.

39
“(...) Os advogados apertam um botão e sai uma petição inicial em que se muda o nome da parte. Isso vai
para a Advocacia da União, que também tem seu computador. E o Juiz, que se quer apresentar como a
grande vítima da proposta de efeito vinculante, vai repensar os argumentos, vai pensar de novo a cada
problema? É claro que não, porque tem seis, sete mil processos a resolver. Ele também aperta o seu
computador. E aí, de computador em computador, chega-se até o computador excelso, o Supremo Tribunal
Federal. É essa guerra que estamos vivendo.(...)” (Ministro Sepúlveda Pertence, in notas taquigráficas de
debate promovido pela CCJ do Senado Federal, em 2.4.97).
46

Pode-se dizer então que a atividade jurisdicional tornou-se mera


atividade mecânica, onde a sentença já se encontra pronta, é padronizada,
perdendo seu caráter intelectual e persuasivo.

Não são mais as partes quem convencem o Juiz, mas o caso anterior
parecido que serve como parâmetro para proferir novo julgamento igual ao
anterior.

Porém, discute-se não apenas no Judiciário, mas em todas as


esferas do direito se a repetitividade é argumento suficiente para a vinculação dos
juízos inferiores e a conseqüente perda parcial da independência jurisdicional.

Argumentam esses que o impedimento de a parte ter sua demanda


apreciada, aplicando-se apenas uma cópia de casos já decididos, seria negativa
de jurisdição, pois afastaria a parte do Judiciário.

A parte ver-se-ia sem um amparo no Judiciário, impedindo-a de ter


sua demanda, sua lide apreciada nas suas particularidades. Assim sendo, haveria
a tendência em buscar a autotutela e a justiça de mão própria, ou seja, como a
parte não poderá socorrer-se do judiciário, ela fará sua justiça. Lembramos que
tais institutos são proibidos em nosso ordenamento.

Desta forma, regrediríamos a um estado em que a vingança e a


justiça pessoal tomavam conta da sociedade, lembrando que cada parte está em
busca da satisfação de sua necessidade, não lhe importando se é ou não justo.

Ante a impossibilidade de negar-se a tutela jurisdicional e a


repetitividade das decisões, temos que a primeira deve prevalecer. A tutela
jurisdicional, mesmo repetitiva, deve ser prestada em cada caso concreto, a fim de
evitar um mal maior.
47

Não pode o Poder Judiciário negar o exame do caso que lhe é


levado, pois se a parte o procurou é por que necessita de um provimento
jurisdicional. As pessoas não procuram o Judiciário por mero capricho e sim por
que necessitam de uma decisão compatível com sua necessidade. Buscam a
Justiça de acordo com a análise de um sujeito imparcial, conhecedor do Direito e
que pode analisar o caso concreto.

Se há uma repetitividade, não é o Judiciário quem tem de evitá-la


impedindo o acesso do cidadão, e sim buscar o Estado uma solução geral que
impeça a ocorrência de tais situações, através mesmo da edição de novas leis.

Então, o problema da repetitividade no Poder Judiciário cria um


problema para o Estado que deverá ser enfrentado pelo Legislativo a fim de evitar
a ocorrência de novos conflitos iguais ao anterior.

A IMPORTÂNCIA DA CELERIDADE NO PROCESSO

O Estado veda a autotutela privada, e avoca para si a função de


prestar uma jurisdição satisfatória que atenda aos anseios da sociedade, não
podendo ser lenta e ineficaz.

Como ensina Antônio Pádua Ribeiro, “O Estado proibiu a


autotutela, punindo como crime fazer justiça pelas próprias mãos.
Assumiu, pois, o compromisso de solucionar, de forma adequada,
efetiva e em tempo hábil, os litígios ou lides que ocorrem no seio da
sociedade. O processo, mediante o qual atua a sua função jurisdicional,
deve ensejar resultado semelhante ao que se verificaria se a ação
privada não estivesse proibida.” 40

40
RIBEIRO, Antônio Pádua. O Judiciário Como Poder Político no Século XXI, p. 24.
48

Desta forma, não podemos admitir que ainda hoje se pense em


Justiça lerda para a solução dos conflitos suscitados na sociedade.

Sabe-se muito bem que a lentidão do Judiciário anda de mãos


dadas com a impunidade, quanto mais lenta a prestação jurisdicional, menor será
sua eficácia. No dizer de Silvio Nazareno Costa: “Dependendo do tempo
despendido, demorar para dizer o direito pode eqüivaler a deixar de dizê-lo.
Demorar para punir pode significar conivência”. 41

Desta forma, forçoso concluir que a demora na prestação


jurisdicional equivale a não prestá-la, a não tutelar os conflitos dentro da
sociedade. A demora implica em repercussões negativas dentro da sociedade,
tendo em vista o caráter educador geral da punição.

Ora, o fim último da aplicação da punição pelo Poder Judiciário é


servir de exemplo para a sociedade, evitando-se que a conduta seja repetida, o
que não ocorrerá se a punição for tardia e ineficaz.

Sendo rápida e eficaz, a jurisdição será vista com respeito e


receio, fazendo com que o cidadão repense sua conduta, com medo do que pode
lhe acontecer.

A jurisdição rápida e eficaz dá as pessoas uma sensação de


igualdade perante a lei, ou seja, mostra ao povo que todos podem e serão punidos
pelos atos que cometeram, independentemente da classe social a que pertençam.

Assim, se não prestada no momento oportuno, a jurisdição perde


seu caráter educativo e sua idéia de satisfação da pretensão resistida de nada
serve ao aparelhamento estatal.

41
COSTA, Silvio Nazareno. Súmula Vinculante e a Reforma do Judiciário, p. 99.
49

Conclui-se então que para ocorrer a Justiça patente a


necessidade de ser rápida e eficaz a prestação jurisdicional, sob pena de não
produzir os efeitos almejados ou não mais se prestar ao fim a que foi provocada.

CONCLUSÃO
A súmula vinculante é um instituto antigo no mundo jurídico, porém
recente na legislação brasileira.

Não se pode dizer ainda se a implantação do novo instituto no


Ordenamento Jurídico brasileiro é benéfica ou não, as expectativas dos adeptos
50

dessa adoção são as melhores, até o presente momento, apenas 14 (quatorze)


súmulas vinculantes foram editadas.

Porém há os que acreditam que vincular o Juízo inferior a uma


decisão superior é impedir que o Juiz estude o caso e tenha a discricionariedade
de decidir conforme sua convicção fundado nas provas produzidas. É impedir a
produção jurisdicional e o debate imanente ao Direito.

É certo que ao iniciar essa pesquisa a idéia inicial era analisar a


súmula vinculante com relação a sua aplicabilidade, mas os aspectos pertinentes
a essa afronta foram se expandindo durante a pesquisa para outros aspectos.

O duplo grau de jurisdição, ou instituto da recursividade, como


preferem chamar alguns doutrinadores, surgiu nos ordenamentos jurídicos
primitivos, permanecendo nos sistemas hodiernos, inclusive no nosso, em
decorrência de três fatores, quais sejam: a falibilidade do juiz, o inconformismo da
parte vencida e a constante preocupação em se evitar a existência do despotismo
por parte dos membros do magistrado.

Mas é certo que o princípio constitucional implícito referido foi


limitado com a inclusão do novo instituto introduzido, o que não significa ter
afrontado a Magna Carta uma vez que o duplo grau de jurisdição ainda existe, ou
seja, não foi abolido do sistema.

Hoje a maior preocupação dos operadores do Direito não é a


limitação do duplo grau de jurisdição, mas sim a possibilidade de aplicação da
súmula editada em caso análogo, quando o caso não for exatamente análogo. Na
pratica isso dará ensejo a outros recursos, com outros objetos.
51

Não foi também ferido o princípio do livre convencimento do juiz, uma


vez que o magistrado ainda terá a subjetividade de decidir aplicar ou não a súmula
se entender ou não que o caso concreto é análogo ou não.

A súmula vinculante introduzida pela Emenda Constitucional nº 45/04


é de prerrogativa exclusiva do Supremo Tribunal Federal, mas a legislação
infraconstitucional trouxe a súmula de prerrogativa do Superior Tribunal de Justiça.

Além disso a legislação infraconstitucional, introduziu a possibilidade


de negativa de seguimento de recurso de apelação, pelo juiz, se a decisão
proferida estiver de acordo com súmula editada pelo STJ ou STF, essa previsão
foi denominada pela doutrina de súmula impeditiva de recurso, o que não deixa de
ser uma espécie de súmula vinculante uma vez que o efeito principal dessa
previsão é vincular o magistrado de primeira instância a decidir contra o
seguimento do recurso de apelação.

São ate o presente momento quatorze súmulas editadas e


publicadas, não se tem noticia de nenhuma que tenha tido repercussão negativa,
pois, é fato que a Suprema Corte, detentora de tal competência, tem sido bastante
cautelosa ao tratar dos assuntos constitucionais em suas súmulas editadas.

É certo que o assunto ainda tem muito que amadurecer, muito se


falou não época a introdução da súmula vinculante na Constituição Federal, hoje a
doutrina, após a regulamentação do instituto, está mais calma e pacifica.

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