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Acórdão do Tribunal

Constitucional Nº 468/2022
Sobre a inconstitucionalidade da norma do nº 5 do artigo 168.º-A da Lei nº
2/2020, de 31 de março, na redação dada pela Lei º 27-A/2020, de 24 de
julho

Disciplina de Direitos Fundamentais


Regência: Professor Doutor Jorge Reis Novais
Professora Assistente: Mestre Sara Neves Moreira de Azevedo

4.º Ano da Licenciatura de Direito


Rita Coelho Ferreira Palmeiro Cordeiro
Aluna nº 62932
Turma A Subturma 14
No presente comentário, pretende-se densificar a questão tratada no Acórdão do
Tribunal Constitucional nº 468/2022, Processo nº 1004/2020, cujo Relator foi o
Conselheiro Lino Rodrigues Ribeiro. Discutia-se se a inconstitucionalidade da norma do
nº 5 do artigo 168-A da Lei nº 2/20, de 31 de março, que aprovou o Orçamento de
Estado para 2020, na redação que lhe foi dada pela Lei nº 27-A/2020, de 24 de julho,
que aprovou o Orçamento de Estado Suplementar, por se apresentar como uma medida
restritiva da liberdade de iniciativa económica privada e do direito de propriedade, não
se tendo, no entendimento da requerente do pedido de fiscalização – Provedora de
Justiça - respeitado as exigências do princípio da igualdade e da proporcionalidade,
previstos, respetivamente, nos artigos 13.º/1 e 18.º/3, ambos da Constituição da
República Portuguesa (doravante, denominada por CRP).
Estava em causa a isenção do pagamento da remuneração fixa ou mínima,
devida pelos arrendatários de espaços comerciais, em centros comerciais, aos respetivos
proprietários. Os vulgos “lojistas”, por um período determinado de tempo, haviam de
beneficiar de um regime suspensivo de pagamento de uma componente da remuneração
a pagar aos proprietários dos centros comerciais, eliminando-se a parte fixa do valor
devido, mas mantendo-se a parte variável da renda (calculada sobre as vendas realizadas
na loja), bem como o contributo para todas as despesas contratualmente acordadas como
sendo comuns (por exemplo, despesas de manutenção do centro comercial). O
legislador, face à situação excecional da crise sanitária, optou por conferir
preponderância à posição dos lojistas instalados em centros comerciais, concedendo-
lhes um regime específico, e sem direito a grandes controvérsias quanto a este ponto,
mais favorável do que os regimes que vigoraram durante este período 1. Cumpre
acrescentar que, pelo contrário, os proprietários dos centros comerciais, senhorios neste
tipo de contrato “atípico”2 de utilização de loja em centro comercial, acabaram
colocados, de forma impercetível, numa posição mais gravosa, do que os restantes
senhorios, na medida em que não foram previstas, neste regime especial de suspensão
do pagamento, quaisquer compensações ou contrapartidas para o sacrifício imposto3.
1
Falamos, a título de exemplo, das moratórias conferidas, no âmbito dos contratos de arrendamento
urbano não habitacional e restantes formas contratuais de exploração de imóveis para fins comerciais.
2
A natureza dos contratos de instalação de lojista em centro comercial foi, amplamente, discutida na
doutrina e na jurisprudência constitucional, arguindo-se ou pela autonomização deste tipo de contratos ou
pela sua inclusão no âmbito do regime de arrendamento urbano não habitacional. Tal debate perdeu
atualidade, sendo pacífico o entendimento que estamos perante um contrato atípico. Para
desenvolvimentos sobre o tema, cf., COSTA AFONSO, Ana Isabel. (2003). Os contratos (…).
Publicações Universidade Católica – Porto.
3
De facto, os senhorios não habitacionais, tendo celebrado contratos de exploração de estabelecimento
comercial ou outras formas contratuais de exploração para fins comerciais, tiveram acesso a um
mecanismo de compensação, através da concessão de linhas de crédito, nos termos do nº 5 do artigo 8.º,
1
Deste modo, baseando a nossa análise no respeito pelo princípio da
proporcionalidade, o único no acórdão supramencionado, verdadeiramente, relevado
pelo Tribunal Constitucional (no seguimento do texto, mencionado como TC),
chegaremos à conclusão pela inconstitucionalidade da norma invocada. Como
fundamentaremos, não se vislumbra que a referida norma, considerada como medida
restritiva de direitos fundamentais, possa passar no crivo do controlo da
proporcionalidade.

Porém, mostra-se antes necessário explicitar, ainda que de forma sucinta, quais
foram, e em que medida, os direitos fundamentais atendidos na decisão do TC, que se
comenta.

No pedido de fiscalização da constitucionalidade, veio a Provedora de Justiça


pugnar que os direitos de livre iniciativa económica privada, previsto no artigo 61.º/1,
da CRP, e de propriedade, consagrado no artigo 62.º/1, também, da CRP, haviam sido
restringidos, de forma inconstitucional, pela atuação do legislador.

A originalidade da medida de supressão de pagamento de parte da remuneração,


devida pelos lojistas, foi acompanhada pela imposição de encargos patrimoniais “assaz”
severos4 aos proprietários dos centros comerciais, na medida em que é claro que a
componente variável da remuneração, que se determina que continue a ser paga, nem
sempre o será. Sendo esta remuneração variável auferida com base na faturação bruta
mensal de cada loja, para os estabelecimentos que, pela situação pandémica vivida,
tiveram que encerrar as suas atividades, a renda será de valor mínimo, para não dizer
mesmo inexistente. Não podemos pretender que os proprietários dos centros comerciais,
ainda que certas atividades tenham continuado a laborar, consigam suportar os custos,
inerentes à atividade na superfície comercial, apenas com as rendas recebidas a título
variável e com o eventual pagamento de encargos comuns. No caso, a medida restritiva
impede, deste modo, o acesso dos proprietários, enquanto senhorios, a parte das
contrapartidas do contrato de arrendamento celebrado com o lojista.

Os juízes do TC, entendendo a componente da remuneração abolida pela norma


sindicada como a “componente mais relevante para o proprietário” dada às suas
características – são valores certos e fixos, previsíveis para o interessado -,
consideraram que foram afetados os interesses patrimoniais dos promotores dos centros

Lei n.º 45/2020, de 20 de agosto.


4
Assim podemos ler na fundamentação da Provedora de Justiça, junta ao pedido de fiscalização.
2
comerciais, na medida em que existe uma clara quebra do equilíbrio contratual com a
introdução, por mão do Estado, de uma “profunda disrupção no vínculo
sinalagmático”5. Os senhorios, no âmbito destes contratos, ficaram sujeitos aos mesmo
sacrifícios do que os lojistas, na medida em que foram, igualmente, obrigados a fechar e
a diminuir atividades, perdendo clientela e receitas, mas continuando a ter que suportar
despesas, nomeadamente, de manutenção dos espaços. Com a diminuição abruta de
receitas, o legislador optou por acautelar, apenas, a posição dos lojistas, deixando os
proprietários, seriamente, afetados na sua atividade comercial, sem compensação para
os enormes prejuízos económicos que sofreram. A supressão de parte da remuneração
devida, coloca em causa o direito de crédito, titulado pelo proprietário, oriundo da
celebração do contrato de utilização de loja em centro comercial. O património do
proprietário do centro comercial acabou seriamente afetado pela norma sindicada, na
medida do crédito coartado pela supressão de um dos componentes da sua remuneração.

Neste sentido, analisando, de um ponto de vista patrimonial, a posição


contratual, em que a norma sindicada colocou os proprietários dos centros comerciais, e,
ainda que se admita que existia “uma ingerência no conteúdo de um contrato livremente
celebrado pelas partes”, o Tribunal foca a questão, somente, na proteção devida pela
Constituição à propriedade6, conforme o disposto no artigo 62.º, da Lei Fundamental,
desconsiderando-se a análise à luz do direito à livre iniciativa económica privada.

5
Admite-se que este tipo contratual não contém, por definição, um total equilíbrio contratual, ficando a
posição do lojista em posição menos vantajosa. À luz do princípio da autonomia contratual, tal não é
proibido, desde que acordado entre as partes. No entanto, no caso em apreço, estamos perante um
desequilíbrio imposto pelo poder público, uma ingerência exterior ao programa contratual sem qualquer
anuência pelas partes contratuais.
6
Cabe fazer referência, apesar de não ser alvo de análise autónoma no presente comentário, que a
garantia constitucional da propriedade abrange qualquer direito patrimonial, como os direitos de crédito.
Por se tratar de uma expressão do seu património, o direito do credor à satisfação do seu crédito é
garantido pelo direito de propriedade privada, constitucionalmente previsto. Atualmente, é este conceito
de propriedade aceite pela doutrina e jurisprudência; todavia, com exemplificação de antigas decisões do
TC, em sentido contrário, cf. SOUSA RIBEIRO, Joaquim (2009, outubro 8-10). O direito (…).
3
Bibliografia
Monografias

COSTA AFONSO, Ana Isabel da. (2003). Os contratos de instalação de lojistas em


centros comerciais: qualificação e regime jurídico. Publicações Universidade Católica
– Porto

SOUSA RIBEIRO, Joaquim (2009, outubro 8-10). O direito de propriedade na


jurisprudência do Tribunal Constitucional. Conferência Trilateral
Espanha/Itália/Portugal.
https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/conteudo/files/textos/textos0202_trilateral2009.
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