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A profissão de administrador
Segunda. parto da resposta <lo prof. Benedicto Silva ás questões formuladas
por esta revista sobre a forma ç ão da profissão de administrador
ii
Política está fadada a sobrepujar, em importância, tre as profissões novas, que emergem da comple
todas as demais ciências — pelo menos durante xidade da vida moderna, a de administrador, no-
os próximos 25 anos. Ainda que se possa consi tadamente a de administrador público, é a mais
derar exagerada essa opinião, é inegável que o eco- importante de todas, aquela para a qual o futu-
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ro se abre de par em par, carregado de responsa são elementos distintos, assim como em todo pro
bilidades, mas ao mesmo tempo cheio de promes cesso há uma técnica de direção e uma técnica de
sas e sefluções. execução, Spengler sustenta que a arte e ciência
Apresentada com esses ares de axioma, exal de dirigir pressupõe um “talento inato” . “Quer
tada por essa roupagem verbal superlativa, a afir se trate de caçar grandes animais — diz ele, tex
mação talvez pareça demasiado afoita. Cumpre tualmente, — de construir templos, de lançar uma
justificá-la. empresa guerreira ou agrícola, quer se cogite de
Respondendo às questões que me foram fundar um estabelecimento comercial ou de orga
submetidas pela “Revista do Serviço Público” , nizar a viagem de uma caravana, uma rebelião e
a propósito da profissão administrativa, declarei, até mesmo um crime — sempre o primeiro re
no fim do artigo anterior, que o advento do ad- quisito é uma cabeça empreendedora e inventiva
nistrador profissional, cuidadosamente treina para traçar a idéia e dirigir a execução, para co
do, cada vez mais indispensável — se é possivel mandar e para distribuir as tarefas. Numa pa
haver gradação em matéria de indispensabilida- lavra, alguem que tenha nascido para chefe de
de — em todas as organizações em que numero outros que não o são” .
sas pessoas se encontrem a serviço de um obje E ’ que, nas empresas “verbalmente dirigidas”
tivo comum, é uma conseqüência imperativa da não existem apenas duas espécies de técnicas mas
própria multiplicação e subdivisão das atividades tambem duas espécies de homens, diferenciados
humanas. pelo fato de seus talentos se moverem nesta ou na
Examinando-se, ainda que de relance, a cena quela direção: “homens nascidos para mandar e
mundial contemporânea, tanto nos domínios dos homens nascidos para obedecer, sujeitos e objetos
negócios públicos como no setor da economia par do processo político e econômico” .
ticular, não é dificil de se verificar que ao mes “Governar, decidir, guiar, comandar é uma
mo tempo em que a especialização intensiva e arte — conclue Spengler — uma técnica dificil e,
»
multiforme, aumentando a lista das profissões, como qualquer outra, pressupõe um talento inato” .
desdobrando os ofícios, seccionando as ocupações Ignorando ou talvez menosprezando a obra de
e estreitando os 'tipos de atividade individual, Taylor e de Fayol, Spengler insiste em revitalizar
opera no sentido de dividir e subdividir o tra a “idéia diretriz” das gerações passadas, para as
balho, a ação grupai, por outro lado, desenvol quais o administrador, como o poeta, não se forma
vida para ia realização de propósitos de larga — nasce. O verdadeiro chefe “já nasce feito” ,
envergadura, opera no sentido de reunir na em com o quem é bom.
presa os trabalhadores. Consoante essa teoria, que ainda agora en
A divisão do trabalho, assim extremada pela contra abonadores do estofo de Spengler, o pro
especialização, e a concentração dos trabalhadores, blema da chefia administrativa consiste em desco
imposta pela necessidade de fundir e coordenar o brir o chefe nato, o homem para o lugar. Uma
esforço, sem o que a maioria dos desígnios humanos vez desnichado esse indivíduo raro, “nascido para
jamais poderia ser realizada, tornaram indispensá chefiar” , todos os demais problemas relaciona
vel um sistema adequado de administração, dando dos com a função administrativa se resolvem au
ensejo ao aparecimento do administrador profis tomaticamente, a um aceno da sua varinha de
sional . condão. As relações humanas, fonte eterna de
perplexidades mesmo para os psicólogos, as ques
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tões complexas de planejamento, os métodos de
Depois de reconhecer e afirmar o fato óbvio trabalho, as regras de organização — tudo isso
de que em toda empresa o planejar e o executar carece de importância em face da habilidade con
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gênita do chefe predestinado. Ele administra, dústrias deverão ser formados na sua arte e de
isto é, planeja, organiza, dirige, coordena e con que nenhum administrador nato, por habil que
trola a golpes de talento inato, descobrindo, para seja, poderá lutar com um bom êxito contra ho
cada caso, a solução mais convinhavel. mens bem organizados — mesmo que se trate de
Essa teoria, a do “chefe nato” , foi desmora homens ordinários e até medíocres — cujos esfor
lizada há cerca de 40 anos pelo advento do cha ços se ajustem, somando-se, através da coorde
mado taylorismo. nação.
O scientific management, com que o genial O criador da organização científica do traba
engenheiro americano revolucionou a arte de ad lho ridiculariza a teoria da capacidade adminis
ministrar, elevando-a à dignidade de ciência, tem trativa trazida do berço, sustentando na sua obra
por base o princípio fecundo de que sempre há teórica e demonstrando pelas suas espetaculares
um melhor meio de realizar qualquer operação. realizações práticas, não somente que é possivel
Preliminarmente, não parece verossímil que mas tambem vantajoso formar administradores, as
um administrador impreperado, por assombrosa sim como se formam engenheiros, médicos, den
que seja a sua capacidade inata, possa escolher tistas, advogados.
sempre, intuitivamente, entre milhares, o melhor Fayol, por sua vez, acredita e apregoa que
método de realizar cada uma das numerosas e o ensino administrativo, “necessário a todo mun
diversas operações em que se desdobra o traba do”, é susceptível de formar bons administrado
lho proteiforme de um ministério, ou mesmo o res, exatamente como o ensino da engenharia tem
trabalho uniforme, mono-produtor, de uma fabri formado milhares de bons engenheiros.
ca. Objetar-se-á que a escolha de normas e mé Profundamente convencido de que se pode
todos pode e deve ficar a cargo dos especialistas, ensinar e aprender a administrar, Fayol chega
incumbindo-se o adminiistrador exclusivamente ao extremo de preconizar a instituição do en
das operações descritas por F ayol. Sim, mas é sino administrativo em todos os niveis, da esco
preciso não esquecer que a responsabilidade final la primária à superior.
da decisão cabe intransferivelmente ao adminis Conta-se que, certa vez, alguem perguntou
trador. Que ele se forre ao trabalho de exami a Edison onde conseguia ele inspiração para in
nar detalhes técnicos, delegando essa e outras ta ventar tantas coisas. “Inspirando-se” na conheci
refas similares aos especialistas, está certo e e da definição de Buffon, Edison respondeu espiri
vantajoso. A parte que lhe fica, porem, requer tuosamente: As minhas invenções representam
igualmente alta especialiazção e não apenas cul 1% de inspiração e 99 de transpiração. Com
tura geral, antecedentes de competência e não binando esse dito atribuído a Edison com a famo
apenas qualidades inatas. Alguns dos amplos sa frase de Buffon — Le Génie n’est autre chose
problemas naturalmente afetos ao orgão de che qu’une grande aptitude à la patience — a sabedo
fia, com o o da previsão e o do planejamento, já ria popular cunhou uma versão mais sintética, mui
envolvem tal complexidade nas grandes empresas, to correntia nos Estados Unidos — N ove décimos
que bastam, só por si, para exaurir ou desmora do gênio é suor (Nine tenths of genius is sweat) .
lizar a capacidade de qualquer administrador im Hasley, autor bem conhecido por parte dos
provisado, ainda que possuidor de acentuadas apti que estudam administração de pessoal, responde
dões para os misteres do mando e da coordenação. ao postulado da ciência popular — O administra
No prefácio que escreveu, em 1911, para seu dor nasce, não se faz, com esse outro postulado,
livro Principies of Scientific Management, disse oriundo da mesma fonte — N ove décimos do g ê
Taylor que daqui por diante é necessário que nos nio é suor. E sem mais preâmbulos, Hasley ar
habituemos à idéia de que os nossos chefes de in gumenta que tem sido demonstrado à saciedade
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que qualquer pessoa de inteligência normal, dis rais que sabem lutar e generais que sabem apenas
posta a servir aos outros, pode adquirir considerá fugir. A enumeração não teria fim.
vel maestria para administrar, desde que estude Apesar das opiniões de Taylor, Fayol, Halsey
os princípios e métodos pertinentes e os aplique e Schell, o ponto de vista de Spengler contem cer
ccncienciosa e persistentemente. ta aparência de verdade, que demanda comentá
Schell, outro autor familiar aos estudiosos de rio.
questões administrativas, constata (é propositado Cem efeito, quando visita uma grande orga
o galicismo, ouviu?) que a idéia de que a facul nização moderna, seja uma fábrica de automóveis
dade de dirigir constitue uma dádiva divina, anda ou um ministério, surpreendendo na intimidade a
muito disseminada. A arte de administrar é um sucessão e a simultaneidade das operações necessá
dom, alguma coisa que se traz do berço. Conse rias à produção de uma simples peça de traba
quentemente, o êxito dos bons administradores é lho, o observador se sente fortemente inclinado a
pura verificação do que “estava escrito” no livro concordar com o sombrio pensador alemão.
do destino.
As diversas tarefas que cumpre organizar e
Situando-se equidistantemente dos extremos, coordenar, de modo que os diferentes materiais,
Schell concorda, até certo ponto, com essa idéia. instrumentos, ferramentas, máquinas e homens,
Segundo ele, há um número limitado de qualida desde o cientista até o mais modesto trabalhador,
des essenciais que, sem dúvida, veem do berço. se encontrem, em número suficiente, no momento
Sem elas, ninguém conseguirá desempenhar satis próprio e no lugar adequado, e entrem em funcio
fatoriamente o papel de chefe. Com elas, o su namento sem atritos, desperdícios e interrupões in
cesso vem naturalmente. desejáveis — exigem do administrador qualidades
Os argumentos de Schell são reversíveis, po Para o objetivo que temos em vista, basta-
dem ser usados em relação a qualquer técnica ou nos uma ligeira indagação sobre o que fazem os
arte. Todos sabemos que há certos indivíduos administradores. Atentemos para esta questão:
mais bem dotados do que outros para aprender e que faz um administrador, aquele que, seja na qua
em alto grau as qualidades essenciais ao exercício Estado, diretor de repartição ou chefe de secção,
de uma ou de outra dessas profissões. E ’ por tem sob sua responsabilidade o comando de su
isso que há bons médicos e médicos ruins, exce bordinados e a execução de um trabalho?
lentes engenheiros e engenheiros fracassados, ad Segundo a análise funcional de Fayol, a té
vogados eficientes e advogados a quem ninguém cnica administrativa se desdobra em prever, or
confia o patrocínio da causa maj^ simples, gene ganizar, dirigir, coordenar e controlar.
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Prever, na linguagem faioliana, tem signifi sempre vigilante para que o plano de ação seja
cado mais amplo do que aquele que usualmente posto em prática e levado avante exatamente como
se atribue a esse verbo — significa perscrutar o foi traçado.
futuro, à luz dos melhores elementos informativos Se tivèrmos presente que “organização é a
disponíveis sobre o passado e o presente, e prepa forma de toda associação humana que se consti
rar o programa de ação. Em outras palavras, si tua para realizar um propósito comum” ; se, alem
gnifica preparar-se para o futuro, tendo em vista, disso, convirmos em que coordenação é, no sen
segundo o critério da máxima conveniência, cs tido lato, “o ajustamento harmônico do esforço
propósitos da empresa. grupai para o fim de lhe imprimir unidade de
Organizar é constituir o duplo organismo — ação na busca de um propósito comum ao grupo”
social e material — da empresa. E ’ estabelecer — já teremos os elementos teóricos hoje mais
a estrutura formal de autoridade, através da qual aceitos, sobre o trabalho que deve competir a um
todas as unidades de trabalho são integradas na administrador, público ou particular .
empresa, definidas no conjunto e coordenadas no
sentido do propósito em vista.
Dirigir é a tarefa contínua — relevantíssi-
ma por todos os títulos — de tomar decisões cla Depois do que ficou dito até aqui, impõe-se
ras, incorporá-las em ordens e instruções gerais o reconhecimento de que a administração já cons-
ou específicas, conforme o caso, e fazê-las chegar titue, só por si, com o a medicina e a engenharia,
ao conhecimento dos subordinados no momento uma profissão distinta. A sua ética, as suas exi
oportuno. gências de formação e trenamento, o seu espírito
Coordenar é unir, ligar, harmonizar todos os de grupo social, as suas peculiaridades — tudo
esforços e todos os atos. E ’, em outras palavras, isso tende a assumir formas nítidas no decurso dos
a função de estabelecer e manter relações adequa próximos anos.
das entre as várias partes em que o trabalho es Não cometeria o atrevimento de aprofundar
teja dividido. mais o assunto. Deixo-o aqui, maltratado, em
Controlar é verificar, a posteriori, se o pro suspenso, à disposição dos que podem tratá-lo bem,
grama está sendo executado de acordo com as nor com sabedoria e agudeza, isto é, à disposição das
mas estabelecidas e as ordens dadas. E ’ estai competências especializadas na matéria.