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Sob a direção de
Phiiippe Ariès e Georges Duby
3 Da Renascença
ao Século das Luzes
organizado por Pliillipe Ariès (f)
e Roger Chartier
4 Da Revolução Francesa
à Primeira Guerra
organizado por iVtichelle Perrot ■
5 Da Primeira Guetra
a nossos dias
organizado por Atuoine Prost
e Gérard Vtncent
Bif otef11Partkukr
wmiIqOliveirQ
HISTÓRIA
I
DA VIDA PRIVADA
4
Da Devolução francesa
ã Primeira Guerra
Organização:
MICHELLE PERROT
Tradução:
DENISE BÜITM ANN (partes 1 e 2)
c BERNARDO JOFFtLY (partes 3 c 4)
10a. reimpressão
C o m p a n h ia D as L e t r a s
Copyright ©• 1987 by Éditions du Seuil
Título original:
Histoire de la vie privée, vol. 4:
De la Révolution à la Grande Guerre
Ilustração de capa:
Retrato campestre (1896), óleo-sobre tela
' de Gustave Caillebotte
Preparação: *
Stella Weiss *
1 . Revisão:
Isabel Gstry Saniatia -
Marcos Luiz Fcrmp&s
Cecília Ramof^S-
,
...
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- rC w l3 g 'o T L T S Íta p a - H w ó o i - 1789-1900 X*
Europa - História - Século 20 4. Europa - Usos co u tu m es 5.
Bimfiia - Europa - História I, Perrot. Michelle, It, Titulo: Oa
RevoluçSo Francesa à Primeira Guerra. - » t
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• ^ r . .íntÇc« para catálogo juteniátien:
2006
1. Ergue-se a cortina, 15
Outrora, em outro lugar {Michelle Perrot), 17
Revolução Francesa e vida privada {lynn Hunt), 21
Sweet home (Catherine Hall), 53
2. Os atores, 89
A família.triunfante {Michelle Perrot), 93
Funções da família [Michelle Perrot), 105
Figuras e papéis {Michelle Perrot), 121
À vida em família {Michelle Perrot), 187
Os ritos da vida privada burguesa {Anne Martin-Fugier), 193
Drainas e conflitos familiares {Michelle Perrot), 263
À margem:- solteiros e solitários {Michelle Perrot), 287" .
Bibliografia, 617
índice remissivo, 627
Ilustrações, 639
2
OS ATOR
Michelle Perrot
Anne Martin-Pngier
Principal teatro da vida privada, a fam ília no século XIX fornece-lhe Página 88:
seus personagens e papéis principais, suas práticas e rituais, suas intrigas Um dom ingo de verão num a
pequena cidade da província.
e conflitos, Mão invisível da sociedade civil, ela é ao mesmo tem po ninho
/I fam ília está reunida em volta do
e núcleo. casal m ais idoso, talvez para o seu
Triunfante nas doutrinas e nos discursos em que todos, dos conserva aniversário, registrado nesta fo to
dores aos liberais e até aos libertários, louvam-na como a célula da ordem conto lem brança. A m b ien te m odesto,
que se com prim e na beira da calçada,
viva, a família, na verdade, ê m uito mais caótica e heterogênea. A fam ília
no lim ite entre o espaço privado e
nuclear emergepenosamente de sistemas de parentescos mais amplos e per
um espaço público não de todo
sistentes, que apresentam múltiplas fornias de acordo com as cidades e as adequado. Mas a sala — ou salão? —
áreas rurais, as regiões e as tradições, os meios sociais e culturais. couta com várias camadas d e cortinas,
Totalitária, ela pretende im por suas finalidades a seus membros. Mas sinal de respeitabilidade, bancira de
intim idade. (Coleção Sirot-À ngel.)
estes frequentem ente, e cada vez mais, rebelam-se. -D aí que, entre gera
ções, entre os sexos, entre indivíduos dispostos a escolher seus destinos, sur Ao lado:
jam tensões que alimentam seus segredos, conflitos que levam ç sua eclo Ghâteauraux, c. 1900. Ele ê artesão
são. 0 que se acentua tanto mais na medida em queeela recorre com maior m arceneiro. Ela, filh a de vinhateiros,
freqüíwcia ãjustiça como árbitro de suas divergências, assim submetendo- alim enta sonhos de grandeza e
beleza, perceptíveis nesta fo to , tirada
se insidiosamente ao controle externo.
em estúdio com as três filh a s,
A fam ília, principalmente a fam ília pobre, também vê sita autono Ândrée, Madeleine e Thérèse.
mia ameaçada pela crescente intervenção do Estadqjo qual, não podendo Um instante de eternidade. (Coleção
agir constantemente em nome dela, vem a ocupar seq. lugar, especialmen particular.)
te na gestão da criança, o ser social e o capital mais precioso. '
A fam ília certamente não esgota todas as potencialidades da vida p ri
vada, que conhece muitas outras formas e outros cénários. Mesmo assim,
p o r razões em parte políticas, ela tende, no século-XIX, a absorver todas
as funções, entre as quais se inclui a sexualidade - r "o cristal' ’ (M. Fou
cault) fam iliar —, e a definir as regras e as normas. As instituições e as
pessoas solteiras — prisões e internatos, quartéis e conventos, vagabundos
e dândis, religiosas e viragos, boêmios e bandidos — são amiúde obrigadas
a se definir em função dela ou em relação a suas margens. A fam ília é o
centro do qual elas constituetn a periferia,
M. P.
A FAMÍLIA tr
Michelle Verroh
Q uantas jo ven s casadouras nessa Os liberais, de Germaine de Scaêl a Alexis de Tocqueville, estão
fa m ília de castelãos da provincial
fundaniencalmente interessados na defesa de uma fronteira que garanta
C ordialidade do pat. am abilidade
curiosa da mãe, cochichos das m ais a liberdade dos “ interesses privados’\ que compõem a força da nação.
jo v e n s conciliábulo das criadas “ E somente o respeito à existência particular da fortuna privada que
saúdam a chegada do pretendente pode levar ao amor pela República”, escreve Madame de Scaêl, que
ridiculam ente fesliionablc. A lhe pede essencialmente duas coisas: “ não exigir, não pesar”. “A li
preten d id a de branco abaixa os olhos,
berdade nos será tanto mais preciosa quanto mais o exercício de nossos
com o de rigor, sobre seu bordado.
Q ual será o dote desse belo rostinho? direitos políticos nos deixar tempo para dedicar a nosSòs interesses pri
/I apresentação, ritu a l de corte que se vados”, diz Benjamín Constanc. Ambos opõem os Antigos, que viviam
transform ou em ritu a l m atrim onial, para a Agora ou para a guerra, ao mundo moderno, universo do comercio
é um terna da p in tu ra satírica. e da atividade laboriosa dos indivíduos, que devem ser tratados princi
(Francisque G rem er de Saint-M artin,
palmente pelo latsser faire. Essa concentração sobre o privado supõe
Apresentação de um futuro vindo dc
Paris. c. 1830-1840. Paris, B iblioteca
que se confie em representantes para os assuntos públicos. A distinção
das A rtes D ecorativas.) entre duas esferas complementares implica o regime representativo e,
em certa medida, a especificidade da política, dos políticos práticos e,
ao cabo, sua profissionalização.
Isso foi eluramente visto por Guizot, objeto de um recente estudo
de Pierre Rosanvallon. Numa reflexão que não deixa de lembrar a de Hc-
gel, ele analisa o funcionamento do poder, que lhe parece múltiplo. A
ordem e a liberdade dependem da articulação do “ poder social” , respon
sável pela sociedade civil e pelo poder político, encarregado das orienta
ções globais e reservado aos “ capacitados”, à elite dos organizadores: um
assunto de homens, c não de salões, mistos e frívolos. 0 poder social, em
larga medida domestico, nem por isso é feminino. A posição fotte, não
arbitrária, é ocupada pelo pai de família, pois ele é “ a expressão de uma
A FAMÍLIA mUNFANTE 97
0 projeto fourierista de falanstério Por fim, uma corrente tradicionalista, reunindo Buchez, os socialis
inspirou representações m ais ou
tas cristãos de LAtelier.; os discípulos de Lamennais e Proudhon, defendia
m enos favoráveis. N ote-se aqui o
sincretism o religioso. (L’Illustration,
a desigualdade irredutível dos sexos, fundada na natureza, a submissão
1846.) necessária das mulheres, que encontram sua liberdade na obediência, e
o casamento indissolúvel e patriarcal, garantia da ordem e da moral. Prou
dhon, em particular, proclama constantemente a superioridade criativa
do princípio viril, da castidade sobre a sensualidade, do trabalho sobre
o prazer. Para o teórico da anarquia, a família conjugal é a célula viva
de um privado que devia absorver o público e extinguir o Estado.
Assim, de Fòurier a Proudhon, a evolução não se encaminha para a
liberdade dos costumes. Não há dúvida de que os socialistas enfrentam uma
dupla exigência: a do moralismo circundante, das críticas do pensamento
burguês à animalidade proletária, levando-os a se obstinar numa postura
de respeitabilidade, e a de sua “ clientela” operária e popular, para a qual
a economia e a moral familiar eram constitutivas da consciência de classe.
Mas há também uma evolução própria no socialismo e em sua vi
são da transformação social. Os socialistas da primeira metade do século
acreditam numa revolução pela base e pela prática. Concebem-na como
a expansão por contágio da virtude de algumas comunidades exempla
res: comunas e associações profissionais de base familiar, versão altruís
ta da pequena empresa. Daí a vontade de uma transparência, tam
bém postulada por Rousseau, e que alimenta uma disputa sobre a “ pu-
A FAMÍLIA TRIUNFANTE 103