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RESUMO: Este artigo tem como objetivo mapear a presença da Literatura no livro didático “Para Viver Juntos:
Português, 9º ano” da editora SM, 3ª ed. 2012, além de ponderar as estratégias que orientam as atividades
posteriores aos textos literários e considerar a diversificação das obras e autores. Para realizar a análise,
utilizamos as teorias sobre livro didático, a partir de estudos de Freitag (1997); acerca dos gêneros literários,
através dos textos de Samuel (1984) e Castro (1999); enfatizamos a formação de leitores segundo Aguiar (1993);
e, juntamente, consultamos os programas governamentais sobre orientações curriculares, Programa Nacional do
Livro Didático (2014 e 2017), Parâmetros Curriculares Nacionais (1998) e Base Nacional Comum Curricular
(2017). Após analisar o livro-fonte da pesquisa, foi possível verificar a presença de textos literários, apesar de
não constar no currículo do Ensino Fundamental o estudo sistemático da Literatura, ela está presente através dos
gêneros literários. Entretanto, as atividades propostas após cada texto não têm a preocupação com a formação do
leitor, pois normalmente são perguntas que focam o conteúdo e a mensagem, sem apontar a forma e as
estratégias que facilitam a construção do sentido literário. Assim, cabe ao docente valo rizar a presença dos textos
literários no livro didático.
Tais estratégias de leitura estão sendo abordadas e ensinadas pelos livros didáticos?
Ou a literatura é estudada como pretexto para outros conhecimentos e não privilegia a
formação do leitor?
Sobre as autoras, foi constatado que elas têm experiência em sala de aula e em
publicações de materiais didáticos; duas são professoras de rede particular de ensino, e uma é
escritora e crítica literária; todas as três já participaram em publicação de outros livros
didáticos.
Britto (1997, p.3) afirma que os autores dos livros didáticos costumam “simplificar
absurdamente o conhecimento, tende[m] a falsear realidade e escamotear as disputas e
conflitos sociais [...]”, resultando em distância da realidade social do aluno, podendo gerar o
desgosto pelo estudo, desinteresse por leitura e, o que é mais grave, a evasão escolar. A partir
dessa afirmação, vale refletir ainda sobre a prática pedagógica do professor que adota somente
o LD como apoio para a formação literária de seus alunos.
“Art. 2º, § 1º - Compêndios são livros que exponham total ou parcialmente a matéria
das disciplinas constantes dos programas escolares; 2º - Livros de leitura de classe
são os livros usados para leitura dos alunos em aula; tais livros também são
chamados de livros de texto, livro-texto, compêndio escolar, livro escolar, livro de
classe, manual, livro-didático.” (FREITAG, ; MOTTE; COSTA, 1997, p. 12-13)
apud (OLIVEIRA, A.L., 1980, p.13).
Constatamos que o livro didático reúne e expõe „a matéria das disciplinas constantes
dos programas escolares‟, o material pode abranger todo o conteúdo ou de maneira parcial,
em vista disso, não deve utilizar o LD como única fonte pedagógica em sala de aula.
Desse modo, percebemos que a palavra “literatura” desde o seu surgimento foi
relacionada ao texto escrito. Porém, sabemos da tradição oral dos poemas cantados por aedos
(artistas que cantavam poesia) na Grécia Antiga e, só após séculos, foram transcritos. Os
textos “Ilíada” e “Odisséia” atribuídos a Homero são exemplos da tradição oral.
Assim, podemos destacar que um dos pontos relacionados com o estudo da Literatura
nos livros didáticos são os gêneros literários. A divisão clássica dos gêneros literários é assim
dividida: i. épico; ii. lírico; iii. dramático. Todavia, historicamente, eles foram se
desdobrando, existindo hoje a poesia que é originária da lírica; a narrativa oriunda do épico,
que por sua vez, desmembrou em conto, crônica, romance e fábula.
O gênero épico, segundo Samuel (1984), caracteriza-se por possuir “estilo narrativo”,
e por meio dele “o poeta narra, descreve e exalta fatos históricos e personagens heroicos”
(p.76) imitando o não ficcional para o ficcional por intermédio da métrica, medida dos versos.
Além disso, o autor afirma que a diferença do texto épico para outras narrativas é a sua
capacidade de estimular os leitores pelos detalhes.
A lírica é considerada a “irmã gêmea da epopéia por suas origens” (SAMUEL, 1984,
p. 73), ambas surgiram a partir de tradição popular. De acordo com o autor, a palavra é
proveniente do “grego lyrikós”, que significa “algo que concerne à lira, ou o som proveniente
da lira” (SAMUEL, 1984, p.73), marcando, dessa forma, características do gênero, que são:
ritmo, metro e rimas. Esses aspectos proporcionam musicalidade aos poemas, que
incapacitam a troca de palavras nos versos, uma vez que a mudança, consequentemente,
mudaria a harmonia particular dos poemas líricos. Logo, o gênero ignora “ocorrência
gramatical, lógica e formal, pois necessita se libertar para poder ser mais autêntica e
momentânea” (SAMUEL, 1984, p.75). Todavia, existe a “nova lírica” que utiliza linguagem
popular e trata de temas do cotidiano.
O último gênero clássico citado, o dramático, remete a “ação”, palavra utilizada para
iniciar uma gravação de roteiros de filme ou apresentação de teatro. Sendo assim, o drama
refere-se à atuação dos personagens em um determinado espaço de tempo; dito de outra
forma: o gênero drama é o roteiro de encenação dos personagens. A atuação utiliza de
recursos para que o público chegue o mais próximo da mensagem da obra, de acordo com
Samuel (1984, p. 80) esses recursos são: a) “ritmo cênico” – “ritmo próprio que tem por
objetivo chegar ao desfecho da história”; b) “o palco”; c) “estilo de tensão”, subdivide-se em:
“páthos” – sentimentos dos leitores/espectadores ocasionados pela escrita/fala - e “problema”
– solução da história, o final. O drama ainda pode ser trágico ou cômico, dependendo do tema
reproduzido; o primeiro expõe o “choque entre o caráter do herói e o seu destino.”
(SAMUEL, 1984, p.82), o segundo aborda assuntos que criticam a sociedade e os seus
comportamentos.
Os noves capítulos do livro são constituídos de dois textos cada, às vezes estes textos
são de cunho literário, outras vezes são informativos, tais como artigo de opinião, artigo de
divulgação científica e anúncio publicitário.
(tabela 1)
(tabela 2)
A partir das tabelas, podemos destacar a presença dos gêneros literários clássicos e
modernos. Não encontramos o gênero clássico épico no livro didático, porém o gênero
moderno narrativo, que é originário do épico, é representado treze vezes através de oito
contos, quatro crônicas e uma fábula.
O gênero clássico lírico é representado por quatro poemas, seis letras de música, uma
letra de canção popular e uma letra de cantiga de roda. Os poemas são: “Ispinho e fulô”, de
Patativa do Assaré; “O sempre amor”, de Adélia Prado; “Morte e Vida Severina”, de Joao
Cabral de Melo Neto; e “Poeminho do contra”, de Mario Quintana. Como podemos perceber,
são textos canônicos da literatura brasileira, importantes para a formação literária do aluno.
Vale observar que a presença de letras de música no livro didático parece ter o objetivo de
propagação da cultura de massa e todas fazem uso de recursos linguísticos e estéticos. Esta
estratégia aproxima o aluno da estética literária.
Após a análise, em que o objetivo era avaliar a presença dos gêneros literários,
clássicos e modernos no livro didático, podemos concluir que o livro em estudo apresenta ao
aluno uma diversidade de gêneros literários, totalizando cinco gêneros distintos, são eles:
conto, crônica, poema, drama e fábula.
Existe, ainda, no livro didático, uma resenha crítica que discorre sobre o livro de
contos literários “Contos da Selva”, de Horacio Quiroga, apresentando, no decorrer do
capítulo, o autor uruguaio no boxe bibliográfico (anexo 2) e incentivando a leitura de seu
livro. As atividades de interpretação posteriores ao texto apresentam perguntas de
interpretação da resenha, de características do gênero resenha. Porém, voltado a questões
literárias, há uma pergunta que enfatiza a crítica da classificação da obra literária como ficção
infanto-juvenil. Segundo Michel Laub (2008), ela é “mais comprometida com a formação do
cidadão do que com a do leitor” (MARCHETTI; STRECKER; CLETO, 2012, p.212 apud
LAUB, 2008), além de haver questões que abrem espaço à caracterização estética de ficção
infanto-juvenil. Ainda ocorrem perguntas que criam debates sobre o que é livro clássico
(anexo 3) e contextualiza o processo de produção do livro de contos resenhado. Concluímos
que, apesar de o texto ser uma resenha, existem questões literárias que ampliam o
conhecimento a respeito da Literatura.
Sabemos que o início da prática de leitura de textos literários deve ser estabelecida já
na infância, com incentivo dos pais, ou seja, na família. Entretanto, muitas vezes, o estímulo
só acontece nas escolas, cabendo aos professores de Língua Portuguesa e Literatura, os
tornando componente importante e, às vezes, único na formação de leitores. Antes de abordar
sobre a formação de leitores, devemos definir o que é ser leitor, segundo Lajolo (1993):
A autora reconhece, dessa forma, que os leitores devem ter livre arbítrio para gostar
ou não da leitura. Ela ainda afirma que, para a formação de leitores, é primordial “que o
mestre não seja um mau leitor. Que goste de ler e pratique a leitura.” (LAJOLO, 1993, p.54),
e através do exemplo e demonstração de afeição com textos possa incentivar os alunos à
leitura.
“4ª fase: idade da história de aventura ou a fase de leitura psicológica, orientada para
as sensações (12 a 14 anos). É o período da pré-adolescência, em que a criança toma
consciência da própria personalidade. É a etapa do desenvolvimento dos processos
agressivos e da formação de grupos. Os interesses de leitura dirigem-se a enredos
diabólicos, histórias sentimentais.” (AGUIAR, 1993, p.94) apud (BOMBERGER,
1977, p. 36-83).
“Um texto de dramaturgia não é uma peça de teatro até ser encenado, assim como
um roteiro não é um produto audiovisual até ser gravado. Quais são as diferenças
que os dois diretores distintos podem trazer para a realização de um mesmo texto?”
(MARCHETTI; STRECKER; CLETO, 2012, p. 163).
A citação acima apresenta a atividade que tem o objetivo de provocar os alunos para
que reconheçam as diferenças dos textos de dramaturgia trabalhados no capítulo, o roteiro de
filme “Meu tio matou um cara”, de direção de Jorge Furtado e Guel Arraes e o texto
dramático “O Judas em sábado de aleluia”, de Luís Carlos Martins Pena, tratando, assim, de
questões referentes ao gênero literário “dramático clássico” e “moderno”.
4. Diversidade de autores
Vale ressaltar ainda que existem boxes trazendo indicações de outros autores e obras,
ampliando e incentivando a leitura. O boxe “Para Saber Mais” (anexo 5) é um exemplo de
indicação de produções culturais e sites relacionados aos textos lidos no capítulo. No decorrer
do livro, há também trechos e entrevistas que fazem referências a autores estrangeiros, de
cinco nacionalidades: o moçambicano Mia Couto; o uruguaio Horácio Quiroga; o francês
Antoine de Saint-Exupéry; o espanhol Miguel Cervantes e o inglês William Shakespeare.
Uma vez que o documento BNCC afirma que deve utilizar a Literatura para
“compreender as linguagens humanas, históricas, social e cultural” e das “manifestações
artísticas e culturais”, o estudo literário teórico e metalinguístico não deve ser estudado de
forma isolada, e sim ser acompanhado de “práticas de reflexão que permitam aos estudantes
ampliarem suas capacidades de uso da língua/linguagens [...]” (BRASIL, 2017, p.69),
aumentando o nível de leitura cognitiva do estudante “[...] de forma a garantir ampliação do
repertório, além de interação e trato com o diferente.” (BRASIL, 2017, p.73). Podemos
destacar que o livro analisado apresenta diversos gêneros literários e autores e, se trabalhados
de forma consistente, incentiva o contato com a Literatura, atingindo o objetivo presente no
BNCC de aumentar o repertório literário, o nível de leitura cognitiva e o „uso da
língua/linguagem‟.
Além disso, ainda existe no documento a abordagem que o ensino de literatura nos
anos finais do ensino fundamental deve ser trabalhado para o desenvolvimento de distinção da
forma estética, linguística, semiótica e diversidade cultural; compete ao professor trabalhar
“[...] o cânone, a literatura universal, a literatura juvenil, a tradição oral, o multissemiótico, a
cultura digital e as culturas juvenis, dentre outras diversidades, [...]” (BRASIL, 2017, p. 155).
Sabemos que não é possível abordar todos em apenas um ano e, por essa razão, o
trabalho de apresentar a Literatura deve ser introduzido desde o início do ensino fundamental,
e devem ser trabalhados textos além dos existentes no LD.
O campo artístico-literário definido pela BNCC tem o seu êxito quando o estudante
cria hábitos de leitura, tem preferência por autores e gêneros literários e consegue argumentar
criticamente sobre os livros que lê. Após a análise, percebemos que, se trabalhados os textos,
os alunos conseguem adquirir preferências e debater sobre as obras lidas.
5. Considerações finais
Este trabalho teve como objetivo mapear a presença de textos literários no livro
didático “Para viver juntos – Português”, Eitora SM, 3ª ed. 2012, de Greta Marchetti; Heidi
Strecker; Mirella L. Cleto do 9º ano do ensino fundamental – anos finais. A partir dos três
critérios estipulados para a análise, quais sejam: a) a presença dos gêneros literários; b) as
atividades propostas e c) a diversidade de autores literários, percebe-se que a Literatura está
presente no livro didático em estudo. Esta presença se deu através de vários e diferentes
gêneros, como narrativas (contos, crônica, fábula), roteiros e poemas. Vale ressaltar que existe
a influência de gêneros literários clássicos e modernos, ocasionando, dessa forma, maior
abrangência da Literatura.
Quanto às atividades propostas para cada leitura de textos literários, concluímos que
há uma gama de exercícios que valorizam a interpretação e compreensão do texto, embora
muitas vezes, a ênfase recaia apenas para o entendimento das questões gramaticais e
linguísticas. Neste sentido, ressaltamos que o papel do professor no uso do livro didático é
essencial, pois cabe a ele entender que estudar literatura é acima de tudo, ensinar as
estratégias de leitura, objetivando a formação de um aluno autônomo e crítico.
ABSTRACT: This article aims to map the presence of Literature in the textbook "Para Viver Juntos : Português,
9º ano" of the published by SM, 3rd ed. 2012, besides pondering the strategies that guide the activities after the
literary texts and consider the diversification of works and authors. To carry out the analysis, we use the theories
on didactic book, from studies of Freitag (1997); about literary genres, through the texts of Samuel (1984) and
Castro (1999); we emphasize the formation of readers according to Aguiar (1993); and, along, we consulted the
governmental programs on curriculum guidelines, Programa Nacional do Livro Didático (2014 and 2017),
Parâmetros Curriculares Nacionais (1998) and Base Nacional Comum Curricular (2017). After analyzing the
source book of the research, it was possible to verify the presence of literary texts, although the systematic study
of Literature is not included in the curriculum of Elementary School, it is present through literary genres.
However, the activities proposed after each text are not concerned wit h the formation of the reader, because are
usually questions that focus on the content and the message, without pointing out the form and the strategies that
facilitate the construction of the literary meaning. Thus, it is up to the teacher to value the presence of literary
texts in the textbook.
AGUIAR, Vera Teixeira de. Leituras para o 1º grau: critérios de seleção e sugestões. In:
ZILBERMAN, Regina (org.). Leitura em crise na escola Porto Alegra: Mercado Aberto.
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Disponível em: <http://www.fnde.gov.br/programas/programas-do-livro/livro-didatico/guia-
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CASTRO, Manuel Antônio de. Natureza do fenômeno literário. In: SAMUEL, Rogel (org.).
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DUARTE, João Ferreira. Cânone. In: CEIA, Carlos. E-Dicionários de Termos Literários.
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LAJOLO, Marisa. O texto não é pretexto. In: ZILBERMAN, Regina (org.). Leitura em crise
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SANTOS, Reginaldo Clecio dos. Ensino de Literatura: a hora e a vez do leitor. Leitura:
teoria & prática, Campinas> ALB, n 53, p. 24-30, nov. 2009. Semestral.
Anexos
Anexo 1
(MARCHETTI, Greta; STRECKER, Heidi; CLETO, Mirella L. Para Viver Juntos: Português, 9º ano. 3ª ed.
São Paulo: Edições SM, 2012.)
Anexo 2
(MARCHETTI, Greta; STRECKER, Heidi; CLETO, Mirella L. Para Viver Juntos: Português, 9º ano. 3ª ed.
São Paulo: Edições SM, 2012. p. 215)
Anexo 3
(MARCHETTI, Greta; STRECKER, Heidi; CLETO, Mirella L. Para Viver Juntos: Português, 9º ano. 3ª ed.
São Paulo: Edições SM, 2012. p. 214)
Anexo 4
(MARCHETTI, Greta; STRECKER, Heidi; CLETO, Mirella L. Para Viver Juntos: Português, 9º ano. 3ª ed.
São Paulo: Edições SM, 2012. p. 16.)
Anexo 5
(MARCHETTI, Greta; STRECKER, Heidi; CLETO, Mirella L. Para Viver Juntos: Português, 9º ano. 3ª ed.
São Paulo: Edições SM, 2012. p. 39.)
Anexo 6
(MARCHETTI, Greta; STRECKER, Heidi; CLETO, Mirella L. Para Viver Juntos: Português, 9º ano. 3ª ed.
São Paulo: Edições SM, 2012. p. 208)
Anexo 7
(MARCHETTI, Greta; STRECKER, Heidi; CLETO, Mirella L. Para Viver Juntos: Português, 9º ano. 3ª ed.
São Paulo: Edições SM, 2012. p. 218)