Você está na página 1de 19

EEEP RAIMUNDO CÉLIO RODRIGUES

LITERATURA - PROF. MATEUS

A obra de Augusto dos Anjos

1. A poética de Augusto dos Anjos

Augusto dos Anjos publicou seu primeiro poema intitulado Saudade em 1900.
A composição pertencia a uma fase inicial da sua poética, ainda bastante
influenciada pelo simbolismo que vigorava.

Embora os seus versos fossem influenciados pelas formas e os modelos


daquele tempo, as temáticas divergiam cada vez mais, subvertendo o que era
esperado da poesia.

A segunda fase da sua obra é aquela em que o autor começa a explorar e


apresentar a sua mundividência, através de poemas como Psicologia de um
Vencido. Aqui, a poesia era encarada como a tentativa (falhada) do sujeito se
expressar, comunicar com o mundo.
Já na sua fase final, o trabalho do poeta se consolida, com mais maturidade,
em composições como Ao Lunar. Nesta época, são notórios os sentimentos de
solidão e nostalgia do eu-lírico.

2. Principais temas da poesia de Augusto dos Anjos

A poesia de Augusto dos Anjos pode ser bastante densa e complexa,


levando o leitor a refletir sobre os mais diversos assuntos.

Repleto de dúvidas existenciais, este sujeito oscila entre o idealismo e o


materialismo e o seu tom é marcado por emoções disfóricas como a angústia, a
melancolia, o desamparo e a solidão. Aliás, não é por acaso que a morte é um dos
temas centrais da sua poética.

Entusiasmado pelos avanços da época, Augusto dos Anjos se servia do


pensamento científico para analisar várias matérias, através da poesia: a sociedade,
a filosofia, a religião, a política, etc.

3. Principais características da poesia de Augusto dos Anjos

Recriando muitas das formas clássicas, a poesia de Augusto dos Anjos se


destacava pelas temáticas subversivas que não ecoavam o simbolismo da época.

Na verdade, o autor assumia uma postura semelhante à dos naturalistas,


através da extrema valorização da ciência e dos seus discursos. Somado a isso,
apresentava temáticas relacionadas à produção poética simbolista no que diz
respeito às temáticas apresentadas por ele, diferindo-se, assim, dos poetas
parnasianos.

No uso da linguagem, o poeta também foi extremamente inovador,


combinando expressões eruditas com um vocabulário popular. Também por isso,
essa linguagem foi encarada como imprópria ou até "antipoética".

4. Recepção do público e da crítica

Naquele tempo, os escritos de Augusto dos Anjos chocaram os seus pares,


provocando espanto e estranheza no público. A crítica estava dividida mas, em
geral, o trabalho do autor não era muito popular.

Mais tarde, com a chegada dos modernistas, a sua obra poética foi bastante
divulgada e teve várias reedições, tornando-se tornando muito conhecida pelo
público.
EU (1912)

Apesar de ter lançado poemas em vários jornais, Augusto dos Anjos apenas
publicou um livro, EU, em 1912. Refletindo o contexto histórico da época, o autor
não esconde um tom sombrio, pessimista e trágico.

Nestas composições, combinava imaginários fúnebres com cenários alegres


e até festivos, mas inevitavelmente caía nas temáticas da miséria humana e a
decadência da matéria.

Um poeta melancólico e que não foi bem entendido, Augusto dos Anjos só
alcançou verdadeiramente o sucesso depois da morte. Em 1920, o amigo Órris
Soares resolveu fazer uma edição póstuma da obra, adicionando poemas que ainda
eram inéditos. Assim surgiu Eu e Outras Poesias, livro que já foi reeditado várias
vezes desde então.

5. Poesias

Psicologia de um vencido

Eu, filho do carbono e do amoníaco,


Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênese da infância,
A influência má dos signos do zodíaco.

Profundissimamente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância...
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.

Já o verme — este operário das ruínas —


Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,

Anda a espreitar meus olhos para roê-los,


E há-de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!

Soneto

Canta teu riso esplêndida sonata,


E há, no teu riso de anjos encantados,
Como que um doce tilintar de prata
E a vibração de mil cristais quebrados.

Bendito o riso assim que se desata


- Cítara suave dos apaixonados,
Sonorizando os sonhos já passados,
Cantando sempre em trínula volata!

Aurora ideal dos dias meus risonhos,


Quando, úmido de beijos em ressábios
Teu riso esponta, despertando sonhos...

Ah! Num delíquio de ventura louca,


Vai-se minh'alma toda nos teus beijos,
Ri-se o meu coração na tua boca!

Solitário

Como um fantasma que se refugia


Na solidão da natureza morta,
Por trás dos ermos túmulos, um dia,
Eu fui refugiar-me à tua porta!

Fazia frio e o frio que fazia


Não era esse que a carne nos conforta...
Cortava assim como em carniçaria
O aço das facas incisivas corta!

Mas tu não vieste ver minha Desgraça!


E eu saí, como quem tudo repele,
- Velho caixão a carregar destroços -

Levando apenas na tumba carcaça


O pergaminho singular da pele
E o chocalho fatídico dos ossos!

Versos Íntimos

Vês! Ninguém assistiu ao formidável


Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão – esta pantera –
Foi tua companheira inseparável!
Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.

Toma um fósforo. Acende teu cigarro!


O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.

Se a alguém causa inda pena a tua chaga,


Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!

Vandalismo

Meu coração tem catedrais imensas,


Templos de priscas e longínquas datas,
Onde um nume de amor, em serenatas,
Canta a aleluia virginal das crenças.

Na ogiva fúlgida e nas colunatas


Vertem lustrais irradiações intensas
Cintilações de lâmpadas suspensas
E as ametistas e os florões e as pratas.

Como os velhos Templários medievais


Entrei um dia nessas catedrais
E nesses templos claros e risonhos …

E erguendo os gládios e brandindo as hastas,


No desespero dos iconoclastas
Quebrei a imagem dos meus próprios sonhos!

Vozes da morte

Agora, sim! Vamos morrer, reunidos,


Tamarindo de minha desventura,
Tu, com o envelhecimento da nervura,
Eu, com o envelhecimento dos tecidos!

Ah! Esta noite é a noite dos Vencidos!


E a podridão, meu velho! E essa futura
Ultrafatalidade de ossatura,
A que nos acharemos reduzidos!

Não morrerão, porém, tuas sementes!


E assim, para o Futuro, em diferentes
Florestas, vales, selvas, glebas, trilhos,

Na multiplicidade dos teus ramos,


Pelo muito que em vida nos amamos,
Depois da morte inda teremos filhos!

A Esperança

A Esperança não murcha, ela não cansa,


Também como ela não sucumbe a Crença,
Vão-se sonhos nas asas da Descrença,
Voltam sonhos nas asas da Esperança.

Muita gente infeliz assim não pensa;


No entanto o mundo é uma ilusão completa,
E não é a Esperança por sentença
Este laço que ao mundo nos manieta?

Mocidade, portanto, ergue o teu grito,


Sirva-te a Crença do fanal bendito,
Salve-te a glória no futuro -- avança!

E eu, que vivo atrelado ao desalento,


Também espero o fim do meu tormento,
Na voz da Morte a me bradar; descansa!

Amor e crença

Sabes que é Deus?! Esse infinito e santo


Ser que preside e rege os outros seres,
Que os encantos e a força dos poderes
Reúne tudo em si, num só encanto?

Esse mistério eterno e sacrossanto,


Essa sublime adoração do crente,
Esse manto de amor doce e clemente
Que lava as dores e que enxuga o pranto?!

Ah! Se queres saber a sua grandeza,


Estende o teu olhar à Natureza,
Fita a cúp’la do Céu santa e infinita!

Deus é o templo do Bem. Na altura Imensa,


O amor é a hóstia que bendiz a Crença,
ama, pois, crê em Deus, e... sê bendita!

O morcego

Meia-noite. Ao meu quarto me recolho.


Meu Deus! E este morcego! E, agora, vede:
Na bruta ardência orgânica da sede,
Morde-me a goela igneo e escaldante molho.

"Vou mandar levantar outra parede..."


— Digo. Ergo-me a tremer. Fecho o ferrolho
E olho o teto. E vejo-o ainda, igual a um olho,
Circularmente sobre a minha rede!

Pego de um pau. Esforços faço. Chego


A tocá-lo. Minh'alma se concentra.
Que ventre produziu tão feio parto?!

A Consciência Humana é este morcego!


Por mais que a gente faça, à noite, ele entra
Imperceptivelmente em nosso quarto!

Saudade

Hoje que a mágoa me apunhala o seio,


E o coração me rasga atroz, imensa,
Eu a bendigo da descrença, em meio,
Porque eu hoje só vivo da descrença.

À noute quando em funda soledade


Minh’alma se recolhe tristemente,
P’ra iluminar-me a alma descontente,
Se acende o círio triste da Saudade.
E assim afeito às mágoas e ao tormento,
E à dor e ao sofrimento eterno afeito,
Para dar vida à dor e ao sofrimento,

Da saudade na campa enegrecida


Guardo a lembrança que me sangra o peito,
Mas que no entanto me alimenta a vida.

Idealismo

Falas de amor, e eu ouço tudo e calo!


O amor da Humanidade é uma mentira.
É. E é por isso que na minha lira
De amores fúteis poucas vezes falo.

O amor! Quando virei por fim a amá-lo?!


Quando, se o amor que a Humanidade inspira
É o amor do sibarita e da hetaíra,
De Messalina e de Sardanapalo?!

Pois é mister que, para o amor sagrado,


O mundo fique imaterializado
— Alavanca desviada do seu fulcro —

E haja só amizade verdadeira


Duma caveira para outra caveira,
Do meu sepulcro para o teu sepulcro?!

Vozes de um túmulo

Morri! E a Terra — a mãe comum — o brilho


Destes meus olhos apagou!… Assim
Tântalo, aos reais convivas, num festim,
Serviu as carnes do seu próprio filho!

Por que para este cemitério vim?!


Por quê?! Antes da vida o angusto trilho
Palmilhasse, do que este que palmilho
E que me assombra, porque não tem fim!
No ardor do sonho que o fronema exalta
Construí de orgulho ênea pirâmide alta,
Hoje, porém, que se desmoronou

A pirâmide real do meu orgulho,


Hoje que apenas sou matéria e entulho
Tenho consciência de que nada sou!

Solilóquio de um visionário

Para desvirginar o labirinto


Do velho e metafísico Mistério,
Comi meus olhos crus no cemitério,
Numa antropofagia de faminto!

A digestão desse manjar funéreo


Tornado sangue transformou-me o instinto
De humanas impressões visuais que eu sinto,
Nas divinas visões do íncola etéreo!

Vestido de hidrogênio incandescente,


Vaguei um século, improficuamente,
Pelas monotonias siderais…

Subi talvez às máximas alturas,


Mas, se hoje volto assim, com a alma às escuras,
É necessário que inda eu suba mais!

Sofredora

Cobre-lhe a fria palidez do rosto


O sendal da tristeza que a desola;
Chora – o orvalho do pranto lhe perola
As faces maceradas de desgosto.

Quando o rosário de seu pranto rola,


Das brancas rosas do seu triste rosto
Que rolam murchas como um sol já posto
Um perfume de lágrimas se evola.

Tenta às vezes, porém, nervosa e louca


Esquecer por momento a mágoa intensa
Arrancando um sorriso à flor da boca.

Mas volta logo um negro desconforto,


Bela na Dor, sublime na Descrença.
Como Jesus a soluçar no Horto!

Eterna Mágoa

O homem por sobre quem caiu a praga

Da tristeza do Mundo, o homem que é triste


Para todos os séculos existe
E nunca mais o seu pesar se apaga!
Não crê em nada, pois, nada há que traga
Consolo à Mágoa, a que só ele assiste.
Quer resistir, e quanto mais resiste
Mais se lhe aumenta e se lhe afunda a chaga.
Sabe que sofre, mas o que não sabe
É que essa mágoa infinda assim, não cabe
Na sua vida, é que essa mágoa infinda

Transpõe a vida do seu corpo inerme;


E quando esse homem se transforma em verme
É essa mágoa que o acompanha ainda!

A lágrima

Faça-me o obséquio de trazer reunidos


Cloreto de sódio, água e albumina…
Ah! Basta isto, porque isto é que origina
A lágrima de todos os vencidos!

-“A farmacologia e a medicina


Com a relatividade dos sentidos
Desconhecem os mil desconhecidos
Segredos dessa secreção divina”

– O farmacêutico me obtemperou. –
Vem-me então à lembrança o pai Yoyô
Na ânsia física da última eficácia…

E logo a lágrima em meus olhos cai.


Ah! Vale mais lembrar-me eu de meu Pai
Do que todas as drogas da farmácia!

O meu nirvana

No alheamento da obscura forma humana,


De que, pensando, me desencarcero,
Foi que eu, num grito de emoção, sincero
Encontrei, afinal, o meu Nirvana!

Nessa manumissão schopenhauereana,


Onde a Vida do humano aspeto fero
Se desarraiga, eu, feito força, impero
Na imanência da Idéia Soberana!

Destruída a sensação que oriunda fora


Do tato — ínfima antena aferidora
Destas tegumentárias mãos plebéias —

Gozo o prazer, que os anos não carcomem,


De haver trocado a minha forma de homem
Pela imortalidade das Idéias!

QUESTÕES DE REVISÃO

1) São características do Pré-Modernismo:

a) Riqueza em detalhes e pelo exagero.


b) Linguagem coloquial e a marginalidade dos personagens
c) Exaltação da natureza.
d) Culto ao Clássico .
e) Nacionalismo e Indianismo.

2) Indique a alternativa que contenha apenas autores pré-modernistas:

a) Euclides da Cunha, Graça Aranha, Monteiro Lobato.


b) Arianos Suassuna, Graciliano Ramos, Monteiro Lobato.
c) Lima Barreto, José de Anchieta, Euclides da Cunha.
d) José de Anchieta, Santa Rita Durão, Tomás Antônio Gonzaga.
e) Manuel Bandeira, Graciliano Ramos, Clarice Lispector.

3) Esse pré-modernista foi um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras e


rompeu com ela. São suas palavras: “Se a Academia se desvia desse movimento
regenerador, se a Academia não se renova, morra a Academia!”. De que escritor
estamos falando?

a) Monteiro Lobato
b) Aluísio de Azevedo
c) Machado de Assis
d) Graça Aranha
e) José Veríssimo

4) ________, autor de apenas um livro, Eu, morreu com apenas 30 anos, e foi um
incompreendido. Numa edição póstuma do seu livro, foram divulgados poemas
inéditos.

O nome do autor que completa a informação acima é:

a) Augusto dos Anjos


b) Sousândrade
c) Clarice Lispector
d) Aluísio de Azevedo
e) Jorge Amado

5) Indique a alternativa correta.

a) Para muitos estudiosos, o Pré-Modernismo não é uma escola literária.


b) O Pré-Modernismo teve início da Semana de Arte Moderna, em 1922.
c) Manuel Bandeira e Graciliano Ramos são autores Pré-Modernistas.
d) Os Sertões e Grande Sertão: Veredas são da autoria de Euclides da Cunha.
e) Dentre as principais características do Pré-Modernismo, podemos citar a
liberdade de expressão, a imprecisão e a espontaneidade.

6) (PUC-RS) Na figura de ________, Monteiro Lobato criou o símbolo do brasileiro


abandonado ao seu atraso e miséria pelos poderes públicos.
a) O Cabeleira
b) Jeca Tatu
c) João Miramar
d) Blau Nunes
e) Augusto Matraga

7) (Enem)

Psicologia de um vencido

Eu, filho do carbono e do amoníaco,


Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênese da infância,
A influência má dos signos do zodíaco.

Profundissimamente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância…
Sobe–me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.

Já o verme — este operário das ruínas —


Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,

Anda a espreitar meus olhos para roê–los,


E há de deixar–me apenas os cabelos,
Na frialdade ignorância da terra!

ANJOS, A. Obra completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994.

A poesia de Augusto dos Anjos revela aspectos de uma literatura de transição


designada como pré-modernista. Com relação à poética e à abordagem temática
presentes no soneto, identificam–se marcas dessa literatura de transição, como

a) a forma do soneto, os versos metrificados, a presença de rimas e o vocabulário


requintado, além do ceticismo, que antecipam conceitos estéticos vigentes no
Modernismo.
b) o empenho do eu lírico pelo resgate da poesia simbolista, manifesta em
metáforas como “Monstro de escuridão e relutância" e “influência má dos signos do
zodíaco".
c) a seleção lexical emprestada ao cientificismo, como se lê em “carbono e
amoníaco", “epigênese da infância" e “frialdade ignorância", que restitui a visão
naturalista do homem.
d) a manutenção de elementos formais vinculados à estética do Parnasianismo e do
Simbolismo, dimensionada pela inovação na expressividade poética, e o
desconcerto existencial.
e) a ênfase no processo de construção de uma poesia descritiva e ao mesmo tempo
filosófica, que incorpora valores morais e científicos mais tarde renovados pelos
modernistas.

8) (UFR) "Crítico feroz do Modernismo, grande incentivador da disseminação da


cultura, defensor dos valores e riquezas nacionais; conhecido, particularmente, pela
sua grande obra infantil, em que se destacam os personagens do Sítio do Picapau
Amarelo."

O nome do autor a que se refere a afirmativa acima é:

a) Lima Barreto
b) José Lins do Rego
c) Monteiro Lobato
d) Mário de Andrade
e) Cassiano Ricardo

9) (PUC-SP)

"Iria morrer, quem sabe naquela noite mesmo? E que tinha ele feito de sua vida?
nada. Levara toda ela atrás da miragem de estudar a pátria, por amá-la e querê-la
muito bem, no intuito de contribuir para a sua felicidade e prosperidade. Gastara a
sua mocidade nisso, a sua virilidade também; e, agora que estava na velhice, como
ela o recompensava, como ela o premiava, como ela o condenava? matando-o. E o
que não deixara de ver, de gozar, de fruir, na sua vida? Tudo. Não brincara, não
pandegara, não amara – todo esse lado da existência que parece fugir um pouco à
sua tristeza necessária, ele não vira, ele não provara, ele não experimentara.

Desde dezoito anos que o tal patriotismo lhe absorvia e por ele fizera a tolice de
estudar inutilidades. Que lhe importavam os rios? Eram grandes? Pois se fossem...
Em que lhe contribuiria para a felicidade saber o nome dos heróis do Brasil? Em
nada... O importante é que ele tivesse sido feliz. Foi? Não. Lembrou-se das suas
causas de tupi, do folclore, das suas tentativas agrícolas... Restava disto tudo em
sua alma uma sofisticação? Nenhuma! Nenhuma!"

(Lima Barreto)
As obras do autor desse trecho integram o período literário chamado
Pré-Modernismo. Tal designação para este período se justifica, porque ele:

a) desenvolve temas do nacionalismo e se liga às vanguardas europeias.


b) engloba toda a produção literária que se fez antes do Modernismo.
c) antecipa temática e formalmente as manifestações modernistas.
d) se preocupa com o estudo das raças e das culturas formadoras do nordestino
brasileiro.
e) prepara pela irreverência de sua linguagem as conquistas estilísticas do
Modernismo.

10) (UEL) Assinale a alternativa incorreta sobre o Pré-Modernismo:

a) Não se caracterizou como uma escola literária com princípios estéticos bem
delimitados, mas como um período de prefiguração das inovações temáticas e
linguísticas do Modernismo.
b) Algumas correntes de vanguarda do início do século XX, como o Futurismo e o
Cubismo, exerceram grande influência sobre nossos escritores pré-modernistas,
sobretudo na poesia.
c) Tanto Lima Barreto quanto Monteiro Lobato são nomes significativos da literatura
pré-modernista produzida nos primeiros anos do século XX, pois problematizam a
realidade cultural e social do Brasil.
d) Euclides da Cunha, com a obra "Os Sertões", ultrapassa o relato meramente
documental da batalha de Canudos para fixar-se em problemas humanos e revelar
a face trágica da nação brasileira.
e) Nos romances de Lima Barreto observa-se, além da crítica social, a crítica ao
academicismo e à linguagem empolada e vazia dos parnasianos, traço que revela a
postura moderna do escritor.

11) (UFRGS) Lima Barreto é um autor que se caracteriza por criar tipos:

a) rústicos, ligados ao campo.


b) aristocratas, ligados ao campo.
c) aristocratas, ligados à cidade.
d) burgueses, ligados à cidade.
e) populares, ligados ao subúrbio.

12) (Enem)

O falecimento de uma criança é um dia de festa. Ressoam as violas na cabana dos


pobres pais, jubilosos entre as lágrimas; referve o samba turbulento; vibram nos
ares, fortes, as coplas dos desafios, enquanto, a uma banda, entre duas velas de
carnaúba, coroado de flores, o anjinho exposto espelha, no último sorriso
paralisado, a felicidade suprema da volta para os céus, para a felicidade eterna —
que é a preocupação dominadora daquelas almas ingênuas e primitivas.

CUNHA, Euclides da. Os sertões: campanha de Canudos. Edição comemorativa do


90.º ano do lançamento. Rio de Janeiro: Ediouro, 1992, p. 78.

Nessa descrição de costume regional, é empregada

a) variante linguística que retrata a fala típica do povo sertanejo.


b) a linguagem científica, por meio da qual o autor denuncia a realidade brasileira.
c) a modalidade coloquial da linguagem, ressaltando–se expressões que traduzem o
falar de tipos humanos marginalizados.
d) linguagem literária, na modalidade padrão da língua, por meio da qual é mostrado
o Brasil não–oficial dos caboclos e do sertão.
e) variedade linguística típica da fala doméstica, por meio de palavras e expressões
que recriam, com realismo, a atmosfera familiar.

13) "Só ele não fala, não canta, não ri, não ama. Só ele, no meio de tanta vida, não
vive."

Os comentários acima são endereçados por Monteiro Lobato:

a) ao nordestino.
b) ao menor.
c) ao sertão.
d) ao caboclo.
e) ao paulistano.

14) (Cesmac) Engenheiro e ensaísta social, Euclides da Cunha (1866-1909) é autor


de uma das obras clássicas da interpretação social do Brasil: Os sertões (1902).
Sobre essa obra é correto afirmar o que segue.

a) Os sertões encerra uma prosa coloquial, clara e denotativa.


b) Os sertões aborda a Guerra de Canudos, na Bahia.
c) Os sertões trata da Guerra do Contestado, em Alagoas.
d) Os sertões narra a vida do Conselheiro e de Lampião.
e) Os sertões é um livro que faz a defesa veemente da Monarquia.

15) (Enem)

Negrinha
Negrinha era uma pobre órfã de sete anos. Preta? Não; fusca, mulatinha escura, de
cabelos ruços e olhos assustados.

Nascera na senzala, de mãe escrava, e seus primeiros anos vivera-os pelos cantos
escuros da cozinha, sobre velha esteira e trapos imundos. Sempre escondida, que a
patroa não gostava de crianças.

Excelente senhora, a patroa. Gorda, rica, dona do mundo, amimada dos padres,
com lugar certo na igreja e camarote de luxo reservado no céu.

Entaladas as banhas no trono (uma cadeira de balanço na sala de jantar), ali


bordava, recebia as amigas e o vigário, dando audiências, discutindo o tempo. Uma
virtuosa senhora em suma “dama de grandes virtudes apostólicas, esteio da religião
e da moral”, dizia o reverendo.

Ótima, a dona Inácia.

Mas não admitia choro de criança. Ai! Punha-lhe os nervos em carne viva.

[...]

A excelente dona Inácia era mestra na arte de judiar de crianças. Vinha da


escravidão, fora senhora de escravos e daquelas ferozes, amigas de ouvir cantar o
bolo e estalar o bacalhau. Nunca se afizera ao regime novo essa indecência de
negro igual.

LOBATO, M. Negrinha. In: MORICONE, I. Os cem melhores contos brasileiros do


século. Rio de Janeiro: Objetiva, 2000 (fragmento).

A narrativa focaliza um momento histórico-social de valores contraditórios. Essa


contradição infere-se, no contexto, pela

a) falta de aproximação entre a menina e a senhora, preocupada com as amigas.


b) receptividade da senhora para com os padres, mas deselegante para com as
beatas.
c) ironia do padre a respeito da senhora, que era perversa com as crianças.
d) resistência da senhora em aceitar a liberdade dos negros, evidenciada no final do
texto.
e) rejeição aos criados por parte da senhora, que preferia tratá-los com castigos.

16) (Enem)
Desde dezoito anos que o tal patriotismo lhe absorvia e por ele fizera a tolice de
estudar inutilidades. Oue lhe importavam os rios? Eram grandes? Pois que fossem...
Em que lhe contribuía para a felicidade saber o nome dos heróis do Brasil? Em
nada... O importante e que ele tivesse sido feliz. Foi? Não. Lembrou-se das coisas
do tupi, do folk-lore, das suas tentativas agrícolas... Restava disso tudo em sua alma
uma satisfação? Nenhuma! Nenhuma!

O tupi encontrou a incredulidade geral, o riso, a mofa, o escárnio; e levou-o à


loucura. Uma decepção. E a agricultura? Nada. As terras não eram ferazes e ela
não era fácil como diziam os livros. Outra decepção. E, quando o seu patriotismo se
fizera combatente, o que achara? Decepções. Onde estava a doçura de nossa
gente? Pois ele a viu combater como feras? Pois não a via matar prisioneiros,
inúmeros? Outra decepção. A sua vida era uma decepção, uma série, melhor, um
encadeamento de decepções.

A pátria que quisera ter era um mito; um fantasma criado por ele no silêncio de seu
gabinete.

BARRETO, L. Triste fim de Policarpo Quaresma. Disponível em:


www.dominiopubIico.gov.br. Acesso em: 8 nov. 2011.

O romance Triste fim de Policarpo Quaresma, de Lima Barreto, foi publicado em


1911. No fragmento destacado, a reação do personagem aos desdobramentos de
suas iniciativas patrióticas evidencia que

a) A dedicação de Policarpo Quaresma ao conhecimento da natureza brasileira


levou-o a estudar inutilidades, mas possibilitou-lhe uma visão mais ampla do país.
b) A curiosidade em relação aos heróis da pátria levou-o ao ideal de prosperidade e
democracia que o personagem encontra no contexto republicano.
c) A construção de uma pátria a partir de elementos míticos, como a cordialidade do
povo, a riqueza do solo e a pureza linguística, conduz à frustração ideológica.
d) A propensão do brasileiro ao riso, ao escárnio, justifica a reação de decepção e
desistência de Policarpo Quaresma, que prefere resguardar-se em seu gabinete.
e) A certeza da fertilidade da terra e da produção agrícola incondicional faz parte de
um projeto ideológico salvacionista, tal como foi difundido na época do autor.

17) (Mackenzie)

O planalto central do Brasil desce, nos litorais do Sul, em escarpas inteiriças, altas e
abruptas. Assoberba os mares; e desata-se em chapadões nivelados pelos visos
das cordilheiras marítimas, distendidas do Rio Grande a Minas. Mas ao derivar para
as terras setentrionais diminui gradualmente de altitude, ao mesmo tempo que
descamba para a costa oriental em andares, ou repetidos socalcos, que o despem
da primitiva grandeza afastando-o consideravelmente para o interior.

De sorte que quem o contorna, seguindo para o norte, observa notáveis mudanças
de relevos: a princípio o traço contínuo e dominante das montanhas, precintando-o,
com destaque saliente, sobre a linha projetante das praias, depois, no segmento de
orla marítima entre o Rio de Janeiro e o Espírito Santo, um aparelho litoral revolto,
feito da envergadura desarticulada das serras, riçado de cumeadas e corroído de
angras, e escancelando-se em baías, e repartindo-se em ilhas, e desagregando-se
em recifes desnudos, à maneira de escombros do conflito secular que ali se trava
entre os mares e a terra; em seguida, transposto o 15º paralelo, a atenuação de
todos os acidentes — serranias que se arredondam e suavizam as linhas dos
taludes, fracionadas em morros de encostas indistintas no horizonte que se amplia;
até que em plena faixa costeira da Bahia, o olhar, livre dos anteparos de serras que
até lá o repulsam e abreviam, se dilata em cheio para o ocidente, mergulhando no
âmago da terra amplíssima lentamente emergindo num ondear longínquo de
chapadas...

Este facies geográfico resume a morfogenia do grande maciço continental.

Euclides da Cunha, Os Sertões.

Assinale a alternativa INCORRETA sobre o contexto histórico e literário da prosa


pré-modernista a que pertence o fragmento de Os Sertões.

a) Os prosadores pré-modernistas produziram uma literatura problematizadora da


realidade brasileira de sua época.
b) Entre os temas pré-modernistas, está o subdesenvolvimento do sertão
nordestino.
c) A investigação social presente na prosa pré-modernista colabora para o
aprofundamento do sentimento ufanista nacional.
d) A prosa da época é marcada por obras de análise e interpretação social
significativas para a literatura brasileira.
e) O pré-modernismo antecipou formal ou tematicamente práticas e ideias que
foram desenvolvidas pelos modernistas.

Você também pode gostar