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À LUZ DA INICIAÇÃO

É dito que a pessoa se desperta para a maçonaria, atende a um chamado


interior. Chamado interior, pois, o dito nos informa que a maçonaria está dentro da
pessoa. Ainda não tenho conhecimento suficiente para entender esses desígnios, mas há
determinados fatos que não são facilmente explicados. Atendi ao chamado, então, e dei
meu primeiro passo à Ordem, entregando-me à sindicância.

Estar em sindicância para mim não significava apenas estar sob o crivo
da irmandade maçônica. Estar em sindicância era abrir todas as janelas e portas de
minha vida privada, para que fosse devidamente investigada. A família é de suma
importância em uma situação dessas. A educação e cuidados intelectuais da família é a
base para que um homem possa trilhar seu caminho futuro sempre primando pela
ordem, pela honestidade e pelo progresso e sucesso. Tudo isso também foi crucial para
que eu não tivesse qualquer objeção a investigarem minha vida. Apesar de apreensivo,
por desejar que tudo desse certo, estava com meu coração e consciência tranquilos. Foi
um bom momento de reflexão, pois nesse lapso pude me preparar para os dois
resultados: positivo ou negativo. Se fosse positivo, já sentia a responsabilidade daquele
chamado, apesar de saber superficialmente sobre a importância, a tradição, a amplitude
de me tornar um maçom, não era ingênuo em achar que estaria me tornando parte de
apenas um “grupo”. Sentia como se, ao me deparar com o mar pela orla, e molhando o
dedo na água, traria em minha mão o que sabia da maçonaria, em comparação com o
que havia ficado no mar. Mas se fosse negativo o resultado, eu teria que me preparar
para a decepção e tristeza que me acometeriam.

Passada a fase da sindicância, começaram os preparativos para a


iniciação. No dia marcado, estava eu de terno aguardando a visita do meu padrinho em
casa. Queria estar impecável. Camisa devidamente passada, sapatos engraxados e
lustrados, terno com vincos e um nó duplo na gravata. Escolhi o melhor cinto e meu
melhor relógio. Não tinha qualquer ideia do que seria a iniciação, mas queria estar
impecável, da forma como a ocasião pedia. Ao chegar à Loja, não tive oportunidade
nem de ver a porta ser aberta para a minha recepção, e já fui privado de um de meus
fundamentais sentidos. Na sequência fui conduzido a um local onde me retiraram todos
os metais, despiram-me parcialmente, não estava nu, nem vestido. Um simples ato de
preparação, mas, vendado, a sensação era a de sofrer uma agressão. A sensação era de
estar à beira da morte, como se estivesse sendo preparado para minha execução. Ali,
naquela situação, nas trevas da minha vida, roto, desprovido das minhas riquezas,
sentia-me a mais desprezível das pessoas. É dito que, para pretender tornar-se Franco-
Maçom, é preciso desejar a luz. Ora, nós não desejamos senão aquilo que nos falta; é,
pois, necessário sentir-se nas trevas para experimentar a necessidade de sair delas.
Ainda não sabia exatamente o que era estar em trevas, mas logo iria saber.

Após um longo silêncio naquele meu estado execrado, fui conduzido a


um local úmido que cheirava a mofo. A cada degrau descido minha alma se inquietava.
Minha venda foi retirada, mas ainda assim me sentia nas trevas como se vendado
estivesse. Havia pouca claridade e muitos sinais. Tudo ali me lembrava da morte, com
exceção de alguns objetos que me faziam refletir na vida. Apesar de o local ser terrífico,
o nosso maior terror não é outro senão o mundo interior que trazemos em nós. É o
interior da terra, ao qual se reporta o preceito que me era apresentado naquele momento:
Visita Interioria Terrae, Rectificando Invenies Occultum Lapidem, frase cujas palavras
têm por inicial as sete letras de VITRIOL. Havia também alguns questionamentos que
me fizeram refletir realmente sobre a razão de estar ali. As frases que pude ler e os
objetos que me surpreenderam à luz de uma lâmpada funerária, levaram-me ao
recolhimento, esqueci-me do mundo exterior para voltar-me sobre mim mesmo.
Naquele momento fiz o meu testamento e respondi a alguns questionamentos.

Já sem noção de tempo e espaço bati profanamente à porta do Templo no


desejo de receber a Luz. Estava eu ali caminhando nas trevas, despojado de todas as
minhas riquezas, todas as minhas vaidades. Apesar de minha profana indiscrição em
estar à porta do Templo, pretendia ali, de todo meu coração, ser admitido nos Augustos
Mistérios da Maçonaria. Tinha essa esperança pois era livre e de bons costumes. Livre,
pois, não me achava atado aos grilhões da ignorância e do preconceito, livre da
escravidão intelectual e moral; e de bons costumes pela educação pautada na
importância da conduta irrepreensível. Tinha meu coração sensível ao bem. Então foi
me dado permissão de entrada. Fui preparado para uma "obrigação solene e terrível já
cumprida por muitos grandes homens e benfeitores da Humanidade". Já havia cumprido
a minha primeira grande prova no seio da Terra, mas meus deveres para com a Ordem
ainda seriam explicados: silêncio sobre o que ouvir, vencer as paixões ignóbeis e me
submeter às determinações e leis em nome da Ordem. Conduzido à Taça Sagrada, fiz
meu juramento, "esgotando o amargo dos seus restos". Aquele doce néctar, o qual se
tornou beberagem amarga, fez-me lembrar de aproveitar dos prazeres da vida, mas
sempre com moderação.

Fui questionado sobre perjúrio e retirado abruptamente do Templo.


Reconduzido ao Templo e sentado sob reflexão, tive como únicos companheiros as
trevas que me cobriam os olhos e o vazio da solidão. É certo que a Iniciação Maçônica
nos põe em constante reflexão, mas o que realmente me acompanhava naqueles
momentos eram sensações e sentimentos nunca antes experimentados. Estava sendo
preparado para minhas viagens. Conduzido por alguém chamado de terrível, mas que
era meus passos e meu guia naqueles momentos, entreguei-me à confiança e me pus à
Primeira Viagem. Após cruzar obstáculos sob estrondos de trovões, bati à primeira
porta desejando ser recebido Maçom. Aquela primeira viagem representaria o segundo
elemento, o AR, símbolo da vida sujeita a contraditórias variações, mas também
símbolo do progresso de um povo. Entreguei-me novamente à confiança e me pus à
Segunda Viagem. Após cruzar obstáculos sob o tinir de espadas, bati à segunda porta
desejando ser recebido Maçom e, então, fui conduzido ao Mar de Bronze para ser
purificado pela água. Aquela segunda viagem representaria a terceira prova, a da Água,
simbolizando o oceano e, este, significando o povo, a quem devemos sempre servir
como verdadeiros Maçons. Entreguei-me finalmente à confiança e me pus à Terceira e
última Viagem. Após cruzar obstáculos sob absoluto silêncio, bati à terceira porta
desejando ser recebido Maçom e, então, fui conduzido à purificação pelo fogo, cujas
chamas simbolizam aspiração, fervor e zelo. Purificado pela água e pelo fogo, estava
simbolicamente limpo de qualquer nódoa do vício.

Cumpridas as provas, a mim foi concedido o prêmio pela firmeza e


constância. Conduzido ao Altar dos Juramentos, local onde estavam o Livro da Lei, o
Esquadro e o Compasso, fiz o solene juramento. Uma vez recomposto e devidamente
trajado, retornei ao Templo desejoso de receber a Luz. Naquele momento, o meu
sentimento era o de ser retirado de um pântano, sendo então purificado e perfumado, e
ser apresentado ao Sagrado. Na retórica sacro-religiosa das Revelações Celestiais, é dito
que, quando todos estiverem acomodados no Paraíso, o Supremo Eterno questionará se
todos estão satisfeitos e então deixará cair o véu que nos separa para que vejamos
pessoalmente Seu rosto. Pude experimentar tal sensação quando minhas vendas da
ignorância caíram e pude contemplar a Luz. Firmei minhas vistas ainda fracas no
Oriente iluminado, bem como na silhueta de nobres Mestres em posição de guarda com
suas espadas em riste. Pude notar a organização do Templo com suas Joias, seus
Paramentos e seus Ornamentos. O Templo "falava" comigo, mas só pude compreender
seu idioma aos poucos, galgando os degraus do conhecimento, absorvendo lentamente o
aprendizado que me era permitido.

Neste primeiro contato visual, fui constituído Aprendiz Maçom aos três
toques do malhete na espada, diante das três grandes Luzes da Maçonaria, a saber o
Livro da Lei, que regula nossas condutas, o Esquadro, símbolo da retidão, da fidelidade
perante nossos semelhantes, e o Compasso, símbolo da justiça, dos limites dos nossos
direitos. Fui revestido de meu Avental, simbolizando o trabalho, herança da Maçonaria
Operativa, usando-o com a abeta levantada, pois, na crença antiga as emoções humanas
advinham da região do epigástrio e, para o Aprendiz Maçom, que ainda não controla
suas emoções, a abeta levantada simboliza a matéria dominando o espírito. Recebi,
então, de todos os meus Irmãos da Loja, na pessoa do Venerável Mestre, um Tríplice e
Fraternal Abraço, que é a máxima da verdadeira fraternidade maçônica, e fui conduzido
ao Primeiro Vigilante para receber a lição de como se trabalhar na Pedra Bruta. Em
poder do Maço e do Cinzel, dei os três golpes na Pedra Bruta. Este seria o trabalho mais
constante durante minha vida maçônica. Em poder das três ferramentas do Aprendiz, a
Régua de 24 polegadas, o Maço e o Cinzel, pude receber a primeira lição de que
passaria meus tempos de silêncio retirando as arestas de minha Pedra Bruta. Neste Grau
de Aprendiz, pude desenvolver meus trabalhos medindo e planeando minha vida com a
Régua de 24 polegadas, uma ferramenta correspondente à Sabedoria do Venerável
Mestre, sabedoria que inventa, que dirige os trabalhos da Loja. Lançando mão do Maço,
aprendi utilizar-me da força, da ação, do vigor da minha atividade laboral, uma
ferramenta atribuída ao Primeiro Vigilante, de cuja força depende o futuro da
Maçonaria, força que sustenta. Utilizando-me do Cinzel, dei linhas e contornos à minha
vida, modelando o espírito e a alma, uma ferramenta correspondente ao Segundo
Vigilante, representante da Beleza, que é a estabilidade dos trabalhos da Loja. Assim, o
Venerável Mestre, o Primeiro Vigilante e o Segundo Vigilante compõem as Três
Grandes Colunas que sustentam a Loja, respectivamente a coluna Jônica, a coluna
Dórica e a coluna Coríntia, formando a tríplice argamassa responsável pela firmeza e
equilíbrio do Templo.

Neste interstício de doze meses, apesar de o Aprendiz Maçom assíduo e


pontual garantir o requisito objetivo para Colação de Grau, há que se observar o
requisito subjetivo, qual seja o verdadeiro espírito maçônico. Neste período, o Aprendiz
Maçom recebe valiosas instruções das Luzes da Loja, bem como ganha importantes
conhecimentos de seus Mestres Maçons. O Primeiro Grau do Simbolismo Maçônico é
consagrado à Fraternidade Universal, objetivando, principalmente, a união de toda a
humanidade. É o período em que o Maçom, recém iniciado, dedica-se ao
desenvolvimento dos princípios fundamentais da Maçonaria, ao fortalecimento dos
laços que unem os irmãos, assim como a corda de 81 nós, um dos três ornamentos de
uma Loja. O Aprendiz de Maçom passará seus dias trabalhando do meio-dia à meia-
noite, desbastando a sua Pedra Bruta, retirando as arestas da ignorância, do preconceito,
dos erros, buscando vencer suas paixões e submeter a sua vontade, fazendo, sempre,
novos progressos na Maçonaria. Deverá sempre levar aos seus irmãos amizade, paz e
prosperidade. Deverá inteirar-se dos símbolos no interior do Templo, reconhecendo
seus Paramentos, Ornamentos e Joias, aplicando seus significados a sua vida. Deverá
transformar a sua Pedra Bruta em Pedra Polida, recebendo, durante seu labor na Coluna
do Norte, os Ventos que chegam ao Ocidente, soprados do Oriente, de onde se originou
a vida, orientação da marcha da civilização Humana pelas Eras. Cumprindo
precipuamente o seu trabalho, munido de suas ferramentas e verdadeiro Espírito
Maçônico, o Aprendiz Maçom integrará os sustentáculos da Fraternidade, da Justiça e
do Progresso, erguendo Templos à Virtude e cavando Masmorras ao vício. Estará
sempre em pé e à ordem, inspirado e conduzido pelo Grande Arquiteto do Universo.

Roberto Sávio Bertelli Alves


A∴ M∴ (05/06/2015)
A∴ R∴ L∴ S∴ Tupy 955
Or∴ Araçatuba/SP

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