Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Unidade Iii
Unidade Iii
Objetivos da Unidade:
ʪ Material Teórico
ʪ Material Complementar
ʪ Referências
1/3
ʪ Material Teórico
Caminhos Literários
Continuando nosso percurso, por hora estudaremos as Linguagens Literárias, suas questões,
especi cidades, seus contornos, suas dinâmicas de funcionamento e suas conexões com as
formas de ler e produzir a vida.
Para nos acompanhar nessa estrada cheia de curvas sinuosas, vistas deleitantes, atalhos,
alguns buracos e percalços, teremos a companhia preciosa de Antonio Candido, um dos
maiores críticos literários brasileiros e importante pensador da Literatura em suas diversas
formas, especialmente, na Sociedade brasileira.
Começos, então, com uma possibilidade de de nição sobre a Linguagem que Candido
anuncia:
Notemos que Candido tenta classi car a Literatura a partir de um espectro amplo de
referências, dando-nos, assim, um chão literário diverso, sedimentado por experiências muito
distintas entre si, mas que, no entanto, guardam relação entre si, a ponto de serem
designadas como Literatura.
Esse aspecto é interessante porque explicita que a conceituação de alguma coisa tão complexa
como a Linguagem Literária passa por um esforço de juntar diferentes num universo comum.
É como se o comum fosse povoado pela diferença, ou seja, a de nição não se dá por aquilo
que distancia uma experiência da outra, mas, ao contrário, por aquilo que as aproxima.
Sua capilaridade, sua disseminação histórica se deu, portanto, graças à sua diversidade e à sua
importância.
A importância da Literatura, para Candido, se dá por uma razão muito simples: ela é
necessária.
O autor nos coloca diante de uma questão fundamental: a Linguagem Literária, em suas
múltiplas determinações e desenvolvimentos, deu-se e segue se dando porque não há
organizações sociais que vivam sem ela. E tal necessidade tem um parâmetro que Candido
chama de fabulação.
Vamos esmiuçar um pouco mais o sentido dessa palavra, a partir do próprio autor:
“Assim como todos sonham todas as noites, ninguém é capaz de passar as vinte
Ora, se ninguém pode passar vinte e quatro horas sem mergulhar no universo da
cção e da poesia, a literatura concebida no sentido amplo a que me referi parece
corresponder a uma necessidade universal, que precisa ser satisfeita e cuja
satisfação constitui um direito.
Fabular é o verbo que Antonio Candido escolhe para designar a atividade literária. Mas não é
qualquer fabulação a que Candido se refere. O autor ressalta que o conceito que reúne a
Linguagem Literária opera na vigília, tendo o sono como sua justa metade.
Ao mesmo tempo em que se constitui como um direito, a Literatura para Candido tem um
aspecto de equilíbrio social, que o autor metaforiza como o “sonho acordado das civilizações”,
como alguma coisa que dá sentido a matéria social:
Logo, para uma análise mais acurada do fenômeno literário, é preciso levar em conta pelo
menos essas três características. É preciso observar, por exemplo, de que forma determinada
Obra Literária constrói as suas estruturas e seus signi cados e como isso se relaciona com
outras estruturas e signi cados literários e sociais.
É preciso observar quem são os produtores das Obras, quais os seus contextos históricos,
quais as dinâmicas sociais nas quais essas obras estão inseridas, e também como a Literatura
é uma forma de conhecimento, um modo de estabelecer interpretações sobre a realidade,
sobre o mundo, e nesse sentido como ela própria produz a própria realidade e o próprio
mundo.
Sobre essa relação dialética com a realidade, a partir de uma dinâmica relacional e de
interferência mútua, Candido escreve:
- CANDIDO, 1999, p. 86
Ao falar da relação da Literatura com o real, Candido nos chama a atenção para como a
Literatura pode atuar sobre esse real, ou seja, como ela também funciona como interventora
da vida.
Logo sua autonomia é relativa, estabelece-se como Linguagem e formulação com instâncias
abstratas e particulares, mas, no entanto, opera em contato constante com o assim chamado
real, inclusive a ponto de interferir em seu funcionamento.
O processo se dá, portanto, num vai e vem: a Linguagem Literária elabora questões do real,
destacando-se dele, mas, ao mesmo tempo, a Linguagem Literária se embrenha nesse mesmo
real, dando-lhe mais inteligibilidade e, tendo como horizonte, portanto, a sua própria
transformação.
Mais uma vez viajaremos com Antônio Candido para tentar especular alguns caminhos
possíveis, que podem não ser respostas, mas talvez outras perguntas.
“A literatura pode formar; mas não segundo a pedagogia o cial, que costuma vê-
Dado que a literatura, como a vida, ensina na medida em que atua com toda a
sua gama, é arti cial querer que ela funcione como os manuais de virtude e boa
conduta. E a sociedade não pode senão escolher o que em cada momento lhe
parece adaptado aos seus ns, enfrentando ainda assim os mais curiosos
paradoxos, – pois mesmo as obras consideradas indispensáveis para a formação
do moço trazem frequentemente o que as convenções desejariam banir.”
Candido ilumina a relação entre Literatura e Educação a partir de uma dinâmica vívida,
pulsante e contraditória, como a própria vida, ou seja, para o autor, a Linguagem Literária
a rma-se como possibilidade pedagógica na medida em que não se furta a ser ela mesma,
impura, não linear e, sobretudo, insubmissa aos tipos de moralismos e o cialidades.
Desse modo, Candido aposta na potência da autonomia relativa da Linguagem Literária. É por
meio desse distanciamento (que pode variar) que a Literatura educa, e seu horizonte se forja
no chão da possibilidade de liberdade.
Além desse caráter que conjuga autonomia e perspectiva libertária, a Literatura, Candido
chama a atenção para o modo como a Linguagem se organiza e como podemos, então,
investigá-la:
“Mas as palavras organizadas são mais do que a presença de um código: elas
comunicam sempre alguma coisa, que nos toca porque obedece a certa ordem.
Quando recebemos o impacto de uma produção literária, oral ou escrita, ele é
devido à fusão inextricável da mensagem com a sua organização. Quando digo
que um texto me impressiona, quero dizer que ele impressiona porque a sua
possibilidade de impressionar foi determinada pela ordenação recebida de quem o
produziu. Em palavras usuais: o conteúdo só atua por causa da forma, e a forma
traz em si, virtualmente, uma capacidade de humanizar devido à coerência
mental que pressupõe e que sugere. O caos originário, isto é, o material bruto a
partir do qual o produtor escolheu uma forma, se torna ordem; por isso, o meu
caos interior também se ordena e a mensagem pode atuar. Toda obra literária
pressupõe esta superação do caos, determinada por um arranjo especial das
palavras e fazendo uma proposta de sentido.”
Tal dinâmica tem a própria natureza da Linguagem Literária e, portanto, diante de uma
perspectiva pedagógica, é importante que forma e conteúdo não sejam dissociados para a
re exão das obras.
Esse tópico é fundamental porque é muito comum que as análises de Obras se reduzam a sua
instância conteudista, desprezando, assim, a força de sua forma que, justamente, é o corpo
que sustenta tal conteúdo.
Para nalizar nosso percurso nesta unidade, vale lembrar que tais características formais e
conteudistas não se destituem das estruturas sociais, como destacamos.
Desse modo, a Linguagem Literária, dentro de uma perspectiva analítica e pedagógica, deve
ser encarada em sua própria constituição, a partir de sua autonomia relativa, e em sua relação
com o todo, com a Sociedade, com as organizações e as manifestações histórico-culturais.
2/3
ʪ Material Complementar
Vídeos
Antônio Candido
Antônio Candido
Conceição Evaristo | Escrevivência
ʪ Referências
________. Vários Escritos. São Paulo/Rio de Janeiro: Ouro Sobre Azul, 2004.