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Universidade de Brasília

Instituto de Ciências Sociais


Departamento de Sociologia

2022/02
SOL0042 – Introdução à Sociologia
(Turma 04)
 Prof. Edson Farias
 Terças e Quintas-feiras, das 19 às
20:45 
Parte II
A Sociologia e questões
contemporâneas
Os cenários multiculturais
TUDO É INTERSECCIONAL?
Sobre a relação entre racismo e
sexismo
(Ina Kerner)
Sobre a autora
• Professora de Ciência Política e Ciências Sociais da Universidade
Humboldt de Berlim, na Alemanha
• Projeto de pesquisa: Diversidade, Poder e Justiça. Perspectivas
transculturais
• Integrante de diversos Conselhos
• 04/2015: Professora visitante do Departamento de Sociologia,
UnB
• Autora de livros: (a) Diferenças e poder. Sobre a anatomia do
racismo e sexismo e Feminismo, Cooperação para o
Desenvolvimento e Crítica Pós-Colonial; (b) Uma análise dos
conceitos básicos da abordagem de gênero e desenvolvimento;
(c) Teorias pós-coloniais, dentre outros.
• Fonte: https://www.uni-koblenz-landau.de/de/koblenz/fb2/ik/institut/spw/kerner/inakerner
TUDO É INTERSECCIONAL?
• Racismo e sexismo: conceitos
• “A palavra alemã Sexismus tem origem no inglês
norte‑americano. O termo de origem sexism foi, por sua
vez, criado por analogia com o termo racism na segunda
metade dos anos 1960”. (p.45)
• A autora apresenta objeção à definição de que “o racista é
aquele que proclama, justifica ou pressupõe a supremacia
de uma raça sobre outra, da mesma forma, o sexista é
aquele que proclama, justifica ou pressupõe a supremacia
de um sexo (adivinha qual) sobre a outra”. (p. 46)
TUDO É INTERSECCIONAL?
• Visão da autora: semelhanças; diferenças;
acoplamentos entre racismo e sexismo;
cruzamentos/entrelaçamentos/intersecções
• Defende modelo crítico multidimensional (Ela
defende uma visão integrativa que entende o
racismo e o sexismo como relações de poder
multidimensionais e leva em consideração
semelhanças, diferenças, ligações e
intersecções )
Tudo é interseccional?
• Com base em Foucault a autora desenvolveu “um
modelo que diferencia uma dimensão epistêmica,
que abarca o conhecimento racista e sexista e seus
discursos correspondentes; uma dimensão
institucional referente a formas institucionalizadas
de racismo e de sexismo; e uma dimensão pessoal”
(p. 47, grifei)
• “Racismo e sexismo são fenômenos complexos e
não estáticos que diferem de acordo com o
contexto”. (p. 49, grifei)
Modelo Crítico Multidimensional
Mecanismos de Funcionamento

Semelhanças Legitimação de formas de estratificação e segregação

Lutas reivindicatórias

Padrões de estratificação e segregação

Diferenças

Racismo e Sexismo Valor da reprodução

Complexo demográfico
Acoplamentos
/ligações
“Etnicização do sexismo” ou othering do sexismo

Intersecções Dimensão epistêmica, dimensão institucional e dimensão pessoal


TUDO É INTERSECCIONAL?
• SEMELHANÇAS:
• Mecanismos de funcionamento: criação de
mitos que são naturalizados (eterno feminino,
sociedades africanas são sem história etc.)
• Atribuições categoriais de diferenças (lugar
social da pessoa marcado por características que
são naturalizadas; quem não se encaixa está fora
do padrão).
• Lutas reivindicatórias
TUDO É INTERESECCIONAL?
• DIFERENÇAS:
• (a) padrões de estratificação e segregação
• Gênero: literatura alemã – inclusão (família/doméstico) e subordinação
(trabalho/política)
• Raça: subordinação (trabalho/política); exclusão na área de atuação do
Estado
• Autora relativiza esses padrões. Na Alemanha o trabalho doméstico é
executado no âmbito de emprego, então seria em um ambiente
“externo”.
• (b) valor da reprodução (naturalização da ideia de dois únicos gêneros
com relação ao sexismo; com relação ao racismo, o discurso é no sentido
de homogeineizar e segregar. Impedir a mistura de raças e a
reprodução.)
TUDO É INTERSECCIONAL?
• “Enquanto o sexismo tem como objetivo
possibilitar formas específicas de reprodução,
o racismo busca impedir a miscigenação,
incluindo aqui o impedimento à reprodução
entre grupos diferentes, e a indistinção de
fronteiras que dela decorre”. (p. 52)
TUDO É INTERSECCIONAL?
• LIGAÇÕES/CONEXÕES
• Complexo demográfico (complexo biopolítico)
Correlação entre a política para mulheres nacionais x mulheres imigrantes.
“(...) em tempos em que a necessidade de crescimento populacional é
proclamada, medidas pró‑natalidade que afetam as habitantes do país —
incluindo desde a restrição a direitos reprodutivos até estruturas de incentivo
financeiro [relativos à reprodução] — se correlacionam com uma política
restritiva de imigração. Por meio dessa combinação, as mulheres nacionais são
principalmente tratadas como mães, enquanto potenciais imigrantes e seus
descendentes são excluídos e representados com menor valor.
• “Etnicização do sexismo” ou othering do sexismo
Outros grupos étnicos ou religiosos são considerados sexistas enquanto o
grupo a que pertence a pessoa é representando como justo ou mais justo, isto
se comparado com os outros.
TUDO É INTERSECCIONAL?
• INTERSECÇÕES
• Kimberlé Crenshaw (1989) introduziu o
conceito. Explicou que, nas experiências de
discriminação por qual passavam mulheres
negras nos Estados Unidos, os fatores de
discriminação sexista e de discriminação racista
nem sempre eram distinguíveis.
• Exemplo do cruzamento: pode ser atingido em
todas direções ou por qualquer direção
TUDO É INTERSECCIONAL?
• Crenshaw ampliou seu conceito de
interseccionalidade: interseccionalidade estrutural,
da interseccionalidade política e da
interseccionalidade nas ciências sociais
• Kerner critica essa ampliação de Crenshaw
argumentando que tais ampliações não seriam
suficientes para a compreensão da
intereseccionalidade entre racismo e sexismo como
fenômenos de poder multidimensionais e complexos
TUDO É INTERSECCIONAL?
Collins Kerner
(matriz de (diferenciação
dominação) dimensional)

Esfera Dimensão
Estrutural epistêmica

Esfera Dimensão
Disciplinar Institucional

Esfera Dimensão
hegemônica Pessoal

Esfera
interpessoal
TUDO É INTERSECCIONAL?
• “A dimensão epistêmica do racismo e do sexismo está
relacionada a discursos e saberes, mas também contém
símbolos e imagens. A dimensão institucional diz respeito a
arranjos institucionais que produzem formas estruturais de
hierarquização e de discriminação. Por fim, a dimensão
pessoal diz respeito a atitudes, mas também à identidade e à
subjetividade de pessoas — tanto daquelas que pertencem a
grupos sociais com status de maioria no que se refere ao
racismo e ao sexismo, quanto daquelas que podemos atribuir
a grupos minoritários. Além disso, a dimensão pessoal
também se refere a ações individuais e a interações pessoais.”
(p. 56, grifei)
TUDO É INTERESECCIONAL?
• “Defendo a tese de que um modelo que
abarque semelhanças, diferenças, ligações e
intersecções tem efeitos muito mais benéficos
para a compreensão das relações entre
racismo e sexismo do que a tentativa de
formular a relação em apenas uma dimensão
e reduzi‑la a um único termo como o da
interseccionalidade ou da interdependência”
(p. 48, grifei)
TUDO É INTERESECCIONAL?
• “Dimensão epistêmica, temos então que lidar com
normas de gênero “racializadas” e com representações e
atribuições “raciais” sexualizadas — e aqui a
interseccionalidade também implica uma pluralização ou
uma diferenciação interna de categorias usuais da
diversidade. Estereótipos e atributos da feminilidade
negra se diferenciam, por exemplo, de normas de gênero
concernentes a mulheres brancas ou asiáticas.
Estereótipos e atributos da feminilidade negra e da
masculinidade negra também se diferenciam entre si.”
(p. 57)
TUDO É INTERESECCIONAL?
• “Em relação à dimensão institucional, a
interseccionalidade de racismo e sexismo resulta em
complexo entrelaçamento entre diferentes estruturas
institucionais — um entrelaçamento entre, por exemplo,
condições de acesso e permanência no mercado de
trabalho, estruturas familiares e a concreta situação da
política educacional. Seu efeito é, entre outros, o fato de
que o papel tradicional da mulher identificado pelo
feminismo burguês e “branco” — a saber, a existência
como dona de casa e mãe — nunca se constituiu de fato
para as mulheres afro‑americanas”(p. 57)
TUDO É INTERESECCIONAL?
• “Quanto à dimensão pessoal, a
interseccionalidade aponta, entre outros, a
processos de subjetivação ou de formação de
identidades com diferentes pontos de
referência.”(p. 57)
Relatório de Desigualdades Sociais Por Cor ou
Raça no Brasil (IBGE, 2019)

https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101681_informativo.pdf
Relatório de Desigualdades Sociais Por Cor ou Raça no Brasil (IBGE,
2019)

https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101681_informativo.pdf
Relatório de Desigualdades Sociais Por Cor ou Raça no
Brasil (IBGE, 2019)

https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101681_informativo.pdf
Brasil

• A CF/88, em suas relações internacionais coloca como


princípio repudiar o terrorismo e o racismo, conforme art. 4,
inciso VIII . E nos direitos e deveres individuais e coletivos
previstos no art. 5, inciso XLII - a prática do racismo constitui
crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de
reclusão, nos termos da lei;
• Lei 7716/1989 - Define os crimes resultantes de preconceito
de raça ou de cor
(pena máxima reclusão de até 5 anos + multa)
• Florestan Fernandes: livro “O Negro no Mundo dos Brancos”

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