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Capítulo 12

Scripts de gênero, sexualidade e


infâncias: temas para a formação
docente

Jane Felipe

Todos os dias, ao olharmos os noticiários exibidos pelos veículos


de comunicação de massa, nos deparamos com estatísticas estarre-
cedoras sobre as violências cometidas contra segmentos sociais mais
vulneráveis como crianças, em especial meninas, mulheres, negras/os,
gays, transexuais, travestis, descendentes de povos originários, men-
digos, dentre outros. Ao longo dos últimos anos, inúmeras pesquisas
têm sido feitas sobre as temáticas de gênero, sexualidade e infâncias,
mostrando a importância de discutirmos essas questões, pois elas se
relacionam diretamente com direitos humanos, ética e cidadania. Tan-
to na formação docente quanto na formação das crianças e de suas
famílias, esse diálogo se faz necessário e urgente.

Escola e Direitos Humanos: para pensar as diferenças, desi-


gualdades e preconceitos

A partir de 2015 a sociedade brasileira se viu diante de uma acir-


rada discussão em torno da retirada do conceito de gênero do Plano
Nacional e dos Planos Estaduais e Municipais de Educação. Assistimos
a uma lamentável, retrógrada e equivocada argumentação, sedimen-

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tada em uma completa confusão conceitual entre identidades de gê-
nero e identidades sexuais, proferida por determinados setores da
sociedade. Mais precisamente segmentos religiosos e um grupo de
parlamentares se organizaram para retirar dos planos de educação
qualquer menção à equidade de gênero nas escolas. Tais episódios
mostraram o quanto a sociedade brasileira precisa avançar na compre-
ensão do papel da escola na construção da cidadania e na formação
de sujeitos críticos e comprometidos com os Direitos Humanos. Dis-
cutir gênero e as relações de poder entre os sexos, que desencadeiam
e justificam desigualdades e discriminações, é dever da escola, das
famílias e demais instituições. É preciso investir na formação docente
de modo qualificado e competente, para que os/as professores/as não
reproduzam confusões conceituais e façam uma interpretação equi-
vocada das teorias que discutem identidades de gênero, identidades
sexuais, relações étnico-raciais, dentre outros temas.
Cabe à escola refletir sobre desigualdades e preconceitos, mos-
trando o quando em muitas sociedades as diferenças acabam se trans-
formando em desigualdades, excluindo grupos e até mesmo matan-
do pessoas por causa da cor da pele ou pelo fato de serem mulheres,
crianças, gays, lésbicas, transexuais, intersex, pobres, ou ainda por per-
tencerem a determinada religião ou serem oriundos deste ou daquele
país ou região. A escola, em todos os níveis, deve ter como princípio
básico a ampliação do conhecimento de seus/suas alunos/as, profes-
sores/as e demais profissionais que nela atuam. Neste sentido, qual-
quer tema que as crianças tragam para o debate deve ser discutido e
problematizado.

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Para entender os conceitos

Em relação ao conceito de gênero, cabe lembrar que ele come-


çou a ser utilizado mais amplamente na década de 80 do século XX por
pesquisadoras feministas, para questionar a ideia de uma “essência” ou
“natureza” fundante para explicar e justificar determinados compor-
tamentos em função do sexo biológico. O conceito de gênero enfa-
tiza, portanto, as expectativas culturais, sociais e históricas em torno
da ideia de ser homem ou ser mulher. Isso significa dizer o seguinte:
ser mulher em um determinado tempo histórico ou em uma cultura
específica pode ser bem diferente do que significa ser mulher hoje no
século XXI, em um dado país, tendo um determinado pertencimento
de classe, de idade, de cor, de religião, etc. Tais expectativas direcio-
nam nossos modos de ser e estar no mundo, afetando nossas escolhas
– profissionais e pessoais. Já as identidades sexuais referem-se basica-
mente ao modo como direcionamos nossos desejos afetivo-sexuais,
ou seja, se sentimos desejo por pessoas do outro sexo diferente do
nosso (heterossexuais), se por pessoas do mesmo sexo (homossexu-
ais), se por ambos os sexos (bissexuais) ou se não sentimos nenhum
desejo por ninguém (assexuais).
Para melhor compreendermos de que modo essas expectativas
em torno dos comportamentos vão sendo delineadas, proponho a uti-
lização do conceito de scripts41 de gênero, para pensarmos criticamen-
te sobre todas as prescrições que nos são impostas desde o nascimen-

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Parte deste texto foi publicado na revista Pátio (2016). A palavra Script tem sua origem na abreviatura
da palavra inglesa manuscript (manuscrito, em português) que significa aquilo que é escrito à mão.
De acordo com o dicionário de Português on line, script ou roteiro, refere-se ao “texto utilizado em filmes,
novelas, programas de rádio ou de TV etc., que possui as falas, direcionamentos, informações ou tudo
o que possa estar relacionado com o que será desenvolvido”. Disponível em: http://www.dicio.com.br/
script/. Capturado em 15/03/16.

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to (ou mesmo antes dele). Para desenvolver o conceito de scripts de
gênero, tomo de empréstimo seu significado a partir do teatro, cinema
e TV. Nesses veículos de arte e comunicação, os scripts (ou roteiros)
são elaborados pelo autor/produtor com uma série de instruções es-
critas que tem por objetivo nortear a atuação de atores/atrizes/apre-
sentadores/as na construção e no bom andamento da interpretação
de seus personagens ou programas42. Poderíamos então entender os
scripts de gênero como roteiros, definições, normas, apontamentos,
às vezes negociáveis, em outras circunstâncias nem tanto, que pres-
creveriam as condutas dos sujeitos. Quando os scripts são ignorados,
rompidos ou modificados, seus autores, neste caso, a sociedade que se
pretende hegemônica e que insiste em traçar determinados padrões
de comportamento, trabalha no sentido de impor sanções e promover
discriminações a todos os sujeitos ou grupos que ousam romper,
modificar ou mesmo (re) escrever seus próprios scripts. Tais expectati-
vas das mais diversas ordens vão sendo tecidas e muito bem tramadas
ao longo das nossas vidas por diversos discursos (religioso, médico,
psicológico, jurídico, midiático) e instituições (família, escola, igreja,
etc.), dizendo-nos como devemos ser e nos comportar pelo fato de ter-
mos nascido com determinada genitália. A partir de tal inscrição bioló-
gica somos descritos como meninos, meninas ou intersex (sujeitos que
possuem genitália considerada ambígua). Tanto os scripts de gênero
quanto os scripts sexuais vão sendo construídos, tramados, aceitos,
alterados ou rompidos desde a mais tenra infância, uma vez que há

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“No script estão todas as informações a respeito do que se vai apresentar, como atitudes,
comportamento, descrições técnicas, utilização de cenários, etc., para que seja montado um espetáculo
conforme o autor imaginou. A evolução do teatro e a sua aplicação no cinema e televisão obriga que
os textos tenham mais detalhes, aproveitando assim tanto a criatividade do autor quando dos
atores”. Disponível em: https://www.significadosbr.com.br/script. Capturado em 25/05/16.

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sempre a possibilidade de transgredir e reinventar os roteiros, por mais
engessados que possam parecer. Ao retomar a ideia de scripts, reafir-
mo que eles não devem ser confundidos com papéis de gênero, pois,
como refere Guacira Louro (2014, p. 24)

Discutir a aprendizagem de papéis masculinos e fe-


mininos parece remeter a análise para os indivíduos
e para as relações interpessoais. As desigualdades
entres os sujeitos tenderiam a ser consideradas no
âmbito das interações face a face. Ficariam sem exa-
me não apenas as múltiplas formas que podem as-
sumir as masculinidades e as feminilidades, como
também as complexas redes de poder que (através
das instituições, dos discursos, dos códigos, das prá-
ticas e dos símbolos ...) constituem hierarquias de
gênero.

Os scripts podem ser entendidos como composições, tramas su-


tis e ao mesmo tempo complexas, quase sempre negociáveis que inte-
gram, embasam e constituem as identidades de gênero e as identida-
des sexuais43. Estas, por sua vez, devem ser aqui entendidas como não
fixas, não permanentes, mas fluidas, dinâmicas, contraditórias. Além
disso, é sempre importante lembrar que os conceitos sempre escorre-
gam, são provisórios e não dão conta da complexidade dos sujeitos.

Dilemas docentes diante dos temas ligados a gênero e sexu-


alidade

O que podemos perceber em relação às escolas de educação in-


fantil quando o tema é gênero e sexualidade? Como as professoras

43
Em relação aos scripts sexuais, ver trabalhos de GAGNON e SIMON (1973), PARKER (1991; 1999) e
PARKER e GAGNON (1995).

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lidam com esses temas? Qual o preparo acadêmico que tiveram para
discutir tais questões?
Sabemos o quanto a escola pode se tornar um dos espaços mais
cruéis para os sujeitos, fomentando discriminações e maus-tratos
emocionais contra as crianças e jovens, pois é nela que se aprendem
inúmeros comportamentos de violência e preconceito das mais diver-
sas ordens, no convívio com outras crianças. Algumas vezes atitudes
preconceituosas e discriminatórias podem partir da própria direção
da escola ou do corpo docente, por desconhecerem a dinâmica e a
complexidade dos scripts de gênero e dos scripts sexuais. Uma parcela
significativa dos docentes alega ter dificuldades em manejar situações
que ocorrem no cotidiano da escola, diante da curiosidade infantil ou
diante de algum comportamento considerado fora dos padrões nor-
mativos de gênero. Perguntas ou situações relacionadas a nascimen-
to, concepção, práticas sexuais, autoerotismo, ainda provocam algum
desconforto nos adultos, que muitas vezes não se sentem à vontade
para responder com tranquilidade as questões que são colocadas pe-
las crianças, quando demonstram curiosidade sobre esses temas.
Outra questão que inquieta os profissionais das instituições esco-
lares, refere-se às crianças que ousam romper com os rígidos padrões
de gênero, estabelecidos pela cultura. É preciso entender que crianças
pequenas brincam de qualquer coisa, experimentam outros scripts,
não havendo uma “essência” ou uma “natureza” que as faça brincar de
boneca ou casinha pelo simples fato de serem meninas. Do mesmo
modo, meninos não nascem propensos a brincar de determinadas coi-
sas por serem do sexo masculino (ELIOT, 2013). Tais comportamentos
são aprendidos socialmente, a partir das expectativas impostas pela
cultura e pelo tempo histórico no qual estamos inseridos.

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Em relação às famílias oriundas de casais gays ou lésbicas, muitas
escolas ainda não estão preparadas para lidar com tal realidade. Quan-
do as crianças comentam que elas têm dois pais ou duas mães, aca-
bam sendo discriminadas, demonstrando assim que existe uma série
de dificuldades em lidar com novas configurações familiares (FERREI-
RA, 2016). Tal fato torna-se perceptível quando as escolas insistem em
trabalhar com esse modelo dicotômico e binário de datas comemora-
tivas do dia das mães e dia dos pais, por exemplo.
Um ponto importante refere-se à literatura infantil, pois algu-
mas escolas não olham atentamente para as discriminações que al-
guns acervos trazem. Ou ainda, tais espaços educacionais se recusam
a comprar livros de literatura infantil para o seu acervo que possam
apresentar o tema de famílias diferentes do modelo heterossexual.
Alegam que não querem ter problemas com as outras famílias ou qual-
quer outro tipo de reclamação por propor esse tipo de literatura.
Outro aspecto a observar é que os livros de sexualidade voltados
ao público infantil nem sempre conseguem abordar os temas de for-
ma transparente e objetiva. Além disso, muitos deles reiteram um mo-
delo heteronormativo (colocando a heterossexualidade como norma
inescapável e a única possível), ignorando assim outras manifestações
identitárias e outras possibilidades de configurações familiares. Além
disso, muitos desses livros não contemplam determinados temas e su-
jeitos: pessoas LGBTQI+ não são, na maioria das vezes, representadas.
Temas como homossexualidade, bissexualidade, transexualidade, in-
tersexualidade, são entendidos de forma equivocada ou simplesmente
são ignorados como aspectos relevantes da constituição possível dos
sujeitos. Além disso, a violência/abuso sexual, os maus-tratos emocio-
nais e demais formas de violência estão presentes em muitas famílias,

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afetando de algum modo as crianças. Por conta disso, seria importante
termos um olhar sensível sobre tal realidade, procurando avaliar muito
bem a qualidade dos livros, tanto os didáticos quanto os paradidáticos
e os de literatura infantil, observando se eles não veiculam algum tipo
de discriminação. Cabe ao corpo docente examinar a pertinência e a
qualidade literária dos mesmos.

Temas relevantes para a formação docente

A segunda edição do curso de Especialização em Docência na


Educação Infantil (2014-2016), uma parceria MEC/FACED/UFRGS de-
marcou um momento importante para a área de Educação infantil ao
propor a inclusão da disciplina Diversidade na Educação Infantil, inexis-
tente na primeira edição do curso (2012-2014). Por entendermos que
os temas de gênero, sexualidade, raça, etnia e infâncias se constituem
como eixos fundamentais na luta pela equidade e direitos humanos
fundamentais, resolvemos inserir no currículo a referida disciplina
(30 horas) dividindo-a em dois momentos de quinze horas, com dis-
cussões a respeito de gênero e sexualidade e questões étnico-raciais.
Desse modo, o eixo condutor da disciplina, como refere a ementa, se
pautou nas “Relações entre infância, cultura e diversidade na escola de
Educação Infantil. Produção dos corpos infantis, em especial as ques-
tões envolvendo raça, etnia, gênero e sexualidade nas culturas infantis
contemporâneas”.
Tínhamos como objetivos analisar de que forma os corpos infan-
tis são construídos na cultura, levando em conta aspectos históricos e
sociais nessa construção, para além dos aspectos biológicos; discutir
a construção das identidades de gênero e das identidades sexuais na

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infância; aprofundar o conceito de raça e etnia e analisar o conceito de
diversidade e suas implicações para a Educação Infantil. Em geral, as
professoras que atuam com crianças de zero a seis anos referem que
não tiveram formação para trabalhar com essas temáticas e vez por
outra são demandadas pelas próprias crianças, com suas perguntas
sobre concepção e nascimento, além das curiosidades naturais em
relação ao corpo. Muitas vezes o corpo docente se sente então des-
preparado (e desamparado) para que possa discutir essas questões de
forma tranquila, já que muitas famílias têm um pânico moral diante
de qualquer pergunta ou comportamento que tenha ligação com o
tema da sexualidade ou relações de gênero. Outro fator é que não raro,
muitas crianças vivenciam situações de violência de toda a sorte em
seus próprios lares. Daí a relevância de compreendermos e aprofun-
darmos determinados conceitos neste campo, discutindo como se
constroem os scripts de gênero e sexualidades na infância e de que
forma tais roteiros e expectativas vão compondo as identidades dos
sujeitos através dos inúmeros discursos presentes na cultura. Também
é importante conhecer a história do corpo e da sexualidade, enten-
der os processos históricos de constituição das famílias, olhar critica-
mente a idealização de amor romântico e sua estreita vinculação com
o tema da violência doméstica, discutir maternidade e paternidade
como processos históricos e sociais. Além disso, é interessante discutir
os reiterados processos de erotização dos corpos infantis, em especial
a pedofilização como prática social contemporânea, através da publi-
cidade, dos filmes, dos programas de entretenimento exibidos na TV,
dos brinquedos e dos jogos on line, dentre tantos outros artefatos cul-
turais (FELIPE, 2016).

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Em tempos de inúmeras violências, torna-se imprescindível ter-
mos uma formação docente inicial e continuada de qualidade, com-
prometida com os Diretos Humanos e com a formação de sujeitos crí-
ticos e éticos.
Cabe salientar que ao longo das duas edições do curso de es-
pecialização tivemos alguns trabalhos de conclusão de curso voltados
para essas temáticas no campo da diversidade. Destacaria aqui três tra-
balhos com esse viés. O primeiro deles foi desenvolvido pela professo-
ra Giorgia Santos (2014), que buscou discutir a participação da escola
infantil na Rede de Proteção aos Direitos das Crianças, lembrando que
esta é uma das dimensões analisadas nos Indicadores de Qualidade na
Educação Infantil. O referido trabalho analisou a legislação e a articu-
lação da Educação Infantil pública com outros setores integrantes da
Rede de Proteção no município onde a aluna atuava, pautada pelas
Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil.
Outra pesquisa realizada por Eduardo Zanette (2016) buscou dis-
cutir e tencionar a construção dos scripts de gênero nas infâncias, em
especial no que se refere à transexualidade, reiterando assim a impor-
tância de aprofundarmos os temas que dizem respeito à construção
das identidades no âmbito da formação docente em Educação Infantil.
Amparado pelo aporte teórico dos Estudos de Gênero, de inspiração
pós-estruturalista, dos Estudos Queer e demais estudos que abordam
as questões do universo “trans”, o trabalho de Zanette teve por objetivo
perceber as situações que estão em jogo na Educação Infantil quando
o assunto se refere à constituição de gênero e sexualidade das crian-
ças, especialmente em relação ao tema da transexualidade. O autor
chama atenção para um importante aspecto: em que medida os com-
portamentos infantis podem ser interpretados como possíveis mani-

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festações de transexualidade nesse período ou apenas são confundi-
dos com as experimentações que as crianças fazem ao brincarem com
objetos que tradicionalmente são voltados para o sexo feminino ou
masculino? A partir desse movimento analítico, foram levantadas três
categorias que emergiram das narrativas: “Por que eu era um assun-
to a não ser tocado”: discutindo crianças, infâncias e transexualidade;
as hipóteses sobre o corpo e o desejo de apagamento das marcas do
biológico; e “Todos os dias tem aula de gênero”: das (im)possibilidades
na escola à construção de uma rede (in)formativa. Através da análise,
pode-se perceber que a transexualidade é uma expressão identitária
de caráter contingente que sofre constantemente regulações hetero-
normativas de ordem social e familiar. Também foi possível constatar o
quanto a escola de Educação Infantil é um ambiente generificado, em
que a norma de gênero em uma vertente binária se instala, vigiando
e regulando os corpos infantis (LOURO, 2014). Assim, as redes de (in)
formação aparecem como uma proposta que envolve a ampliação de
conhecimento das famílias e educadores que atuam diretamente com
as crianças, possibilitando práticas de valorização da diversidade e de
liberdade de expressão para as infâncias.
Por último, o trabalho desenvolvido por Fernanda Bittencout Oli-
veira (2016), intitulado “Literatura infantil e scripts de gênero: com a pa-
lavra as crianças”, que teve por objetivo discutir investigar as manifes-
tações de crianças na faixa etária 3-4 anos de uma escola municipal de
educação infantil de Porto Alegre sobre gênero através da leitura de
quatro livros infantis que trazem em seu enredo questões referentes a
este tema. Além disso, foi considerada também a observação de situ-
ações que pudessem surgir em diferentes momentos da rotina após a
realização da proposta. Os resultados apontaram para um cruzamen-

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to entre o que as crianças observam enquanto constituintes de uma
cultura que ainda hoje legitima, demarca e estabelece modos de ser,
a partir de endereçamentos para homens e mulheres - determinando
a constituição de suas masculinidades e feminilidades – e o que elas
estabelecem espontaneamente a partir de seus próprios conceitos e
representações. Assim, foi possível perceber que as crianças apresen-
tavam em alguns momentos posturas e visões adultocêntricas sobre
as questões de gênero - surgindo a partir daí alguns estranhamentos
pelas situações com as quais foram confrontadas através das histórias.
Já em outros momentos foi possível identificar manifestações singu-
lares que rompiam com tais discursos, vivenciando, neste processo, as
questões de gênero na escola infantil sob um viés mais igualitário.
Deste modo, foi possível observar o quanto a disciplina sobre o
tema da diversidade produziu significativas reflexões a ponto de se
tornarem pesquisas no campo da educação de crianças pequenas.

Referências
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