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Psicologia Jurídica

As Faces da
Violência
Professoras Rosane Pinheiro
Krüger Feijó
1-Agressividade e Violência: fenômenos
diferentes

• A agressividade constitui a vida psíquica do sujeito, fazendo


parte do binômio amor/ódio, pulsão de vida/pulsão de morte.
O ser humano é agressivo.
• A agressividade é um impulso que pode se voltar para fora do
indivíduo = heteroagressão

• A agressividade é um impulso que pode se voltar para dentro


do indivíduo = autoagressão
• A agressividade está relacionada com as
atividades de pensamento, de
1- imaginação ou de ação verbal e não
verbal.
Agressividade • Existe o controle e a subordinação da
e Violência: agressividade pela educação e pelos
mecanismos sociais da lei e da tradição.
fenômenos “Desde criança aprendemos a reprimi-
la e não expressá-la de modo
diferentes descontrolado, ao mesmo tempo que o
mundo da cultura cria condições para
que o indivíduo possa conter, canalizar,
levar esses impulsos para produções
consideradas positivas, como produção
intelectual, a artística, o desempenho
esportivo”.
• A função controladora da agressividade
que ocorre no processo de socialização,
no qual, espera-se que a partir de
vínculos significativos que o indivíduo
estabelece com os outros ele passa a
internalizar os controles.
• A partir disso deixa de ser necessário o
controle externo. Mas mesmo assim, em
todos os grupos sociais, existem
mecanismos de controle e/ou punição
dos comportamentos agressivos não
valorizados/aceitos.
• As sociedades também tem seus
mecanismos, que se concretizam na
ordem jurídica: as leis.
• “Esse modo de compreender a agressividade salienta que ela
é também um aspecto positivo da constituição sujeito, pois
responsável, por exemplo, pela capacidade de enfrentar
situações novas, desconhecidas, está associada com a
ousadia e com a capacidade de autodefesa; portanto a
autodestrutividade é um dos seus aspectos”.
• Será que a sociedade está
conseguindo criar condições
adequadas para canalização desses
impulsos destrutivos?
• A violência é o uso desejado da
agressividade, com fins destrutivos.
Esse desejo pode ser:
• Voluntário (intencional), racional
(premeditado e com objeto
“adequado“ da agressividade) e
consciente;
• Involuntário, irracional ( a violência
destina-se a um objeto substituto) e
inconsciente.
• A violência é um fenômeno social
cuja produção é codeterminada por
2-A violência : um fatores históricos, econômicos,
fenômeno sociais, culturais, demográficos,
multideterminado psicológicos e outros.
• Desigualdade social. A
desigualdade social que produz um
ambiente propiciador da violência
não se confunde com pobreza. A
violência existe em países ricos e
pobres.
• Deterioração de valores éticos
agregadores da vida coletiva, como
dignidade, justiça, solidariedade.
• Salienta-se que embora a violência
2-A violência : um
fenômeno tenha um aliado no psiquismo humano
multideterminado (o impulso destrutivo), isso por si só não
é suficiente para fazer eclodir esse
fenômeno social que o próprio homem
produz e cujas consequências se voltam
contra ele.
• Na organização social – ou nos
grupos mais íntimos, no bairro,
na cidade, no país, no mundo-
estimula legitima e mantém
diferentes modalidades de
violência, principalmente
2-A violência : um
quando os adultos, formadores
fenômeno de opinião das novas gerações,-
multideterminado não incentivam valores de
solidariedade e de tolerância
com o outro e incentivam a
representação do outro -
particularmente os diferentes-
como rival, inferior, perigoso.
2-A violência : um fenômeno
multideterminado

• A legitimação da violência ocorre quando ela é apresentada como necessária:


• nas guerras;
• no combate ao inimigo político ou religioso; na pena de morte como uma forma de reduzir a
criminalidade;
• na diminuição da idade penal como solução para o envolvimento dos adolescentes no crime;
• e quando conservamos uma parcela significativa da população em condições sub-humanas de
existência e sem perspectivas de superação, destas perspectivas pela ausência de políticas
públicas;
• e quando o Estado delega aos cidadãos a função de cuidar da própria segurança pessoal;
• quando os modelos de conduta e de identificação das novas gerações são acusadas de
corrupção, nepotismo, outros crimes e buscam burlar os mecanismos punitivos contribuindo
para manter a impunidade.
3- A violência e as suas
novas expressões
• É comum associarmos a violência exclusivamente ao
crime, à criminalidade. Os meios de comunicação
contribuem bastante para isso. As agências de
comunicação não inventam os crimes, elas dramatizam
os acontecimentos criando um clima social em que nos
identificamos todos como vítimas em potencial. Ao
mesmo tempo, não há como negar o aumento dos
índices de criminalidade - todos nós conhecemos
alguém que foi vítima de alguma violência ou nós
mesmos já o fomos. Já é possível dizer que vivemos com
medo ou “já é um luxo não temer os demais seres
humanos”.
3- A violência e as suas novas
expressões
• Outras expressões da violência: a guerra, o preconceito, a destruição do meio
ambiente, a corrupção, a fome. Essas práticas de violência estão diluídas em nosso
cotidiano e já nos acostumamos a muitas delas – ver na TV ou na internet crianças
famintas na África ou trabalhadoras na produção de carvão em algum lugar do Brasil;
saber de idosos maltratados em instituições destinadas a cuidá-las; a contaminação
das águas. Ou então, muitos de nós sabemos (ou vivemos) situações de humilhação,
omissão de ajuda e atos de violência, mesmo nos lugares considerados os mais
protetores de seus membros, como na escola, a família, o grupo de amigos. Além
disso, conhecemos denúncias de práticas de violência nas instituições que existem
para erradicá-las, como a polícia, as prisões.
• Formas sutis e difíceis de reconhecer como
3- A práticas de violência: ausência de vagas nas
escolas, atendimento precário de saúde, condições
violência e de habitação desumanas, indicadores de
mortalidade infantil e estatísticas de mortalidade
as suas de jovens – em 2007, o Brasil foi o terceiro país do
mundo em monte de adolescentes e jovens por
novas homicídio. “A indiferença ao sofrimento do outro é
a pior forma de violência porque retira do outro
expressões •
seu estatuto de humanidade”
O desafio é reconhecer essas outras práticas de
violência diluídas no cotidiano. Nesse sentido, é
necessário também considerar que quando as
condições de vida social são pouco propícias ao
desenvolvimento e à realização pessoal ou quando
experiências intensas de violência ocorrem na
história de vida do indivíduo, o processo destrutivo
pode se voltar contra ele mesmo, através do uso
de drogas, de distúrbios alimentares graves e em
sua forma mais radical: o suicídio.
• Essas múltiplas e variadas expressões da violência
compõe o cotidiano de todos os cidadãos e criam
um ambiente social em que ela vai se tornando
invisível para os que ali nascem, crescem, se
desenvolvem – é o fenômeno da naturalização ou

3- A banalização da violência. Quando isso ocorre, já


não há nenhuma indignação com o cadáver
exposto por horas na avenida, com os relatos de
violência e tortura das milícias nos morros do Rio de Janeiro
ou com o esgoto e os detritos químicos jogados
as suas nas águas do rio que já não tem peixes. Há uma
tolerância com diferentes formas de crueldade,
novas com a impunidade e uma descrença no
mecanismo regular da convivência coletiva – o
sistema de justiça -, porque se constata o fracasso
expressões do Estado em garantir a segurança dos cidadãos e
a paz pública. A importância de discriminar as
diferentes expressões ou faces da violência é para
podermos enxergá-la com “v” minúsculo e aí nos
sentirmos mais potentes para compreendê-la e
enfrentá-la, como pessoas-cidadãos.
a) O transgressor:

O homem vive em grupos sociais. Em todos


os grupos existem normas e regras que
regulam das pessoas no seu interior e,
conseqüentemente, todas as pessoas,
alguma vez, transgrediram essas normas.
Por exemplo, chegar depois do horário
estipulado, deixar de cumprir uma parte da
tarefa, não aceitar determinada ordem ou
4- As faces da orientação de conduta.
Sempre que ocorre uma transgressão, existe
uma conseqüência para o transgressor: ser
agressividade advertido, ser exposto a uma comunicação
mais intensa do grupo, no sentido de
reconhecer a importância na norma, ou,
mesmo, ser expulso do grupo por ter
transgredido uma norma muito importante.
É sempre mais fácil o conformismo às
normas quando se conhece seu significado,
sua utilidade e concorda-se com elas. Em
todo o caso, quando o indivíduo transgride
uma norma, não significa que ele se
caracterize como infrator ou delinqüente.
b) O infrator:

O infrator é aquele que transgrediu alguma


norma ou alguma lei tipificada no código penal
ou no sistema de leis de uma determinada
sociedade. O infrator é aquele que cometeu
um ato – a infração – e será punido por isso,
isto é, terá uma pena também prevista em lei e
aplicada pelo juiz ou seu representante.
Essa pena pode assumir a forma de multa,
ressarcimento de prejuízos, cassação de
4- As faces da direitos (por exemplo, a carteira de habilitação
para dirigir) ou uma pena de reclusão,
agressividade dependendo da gravidade do delito cometido.
Para determinar a pena, é julgado o ato e suas
circunstâncias.
Muitos de nós, também, podemos já ter
cometido infrações. Por exemplo, estacionar o
carro em local proibido, avançar um sinal
vermelho, não respeitar a lei de não fumar em
ônibus ou em escolas. E nem por isso
estivemos envolvidos com a polícia, com o
poder judiciário, ou fomos tachados de
delinqüentes. A origem social pode proteger
ou não o indivíduo que comete uma infração.
c) O delinqüente:

A delinqüência é uma identidade e


internalizada pelo indivíduo a partir da prática
de um ou vários delitos (crimes). M. Foucault,
em seu livro Vigiar e Punir, coloca que essa
identidade começa a se formar/forjar a partir
do momento em que o infrator (aquele que
cometeu um ato) entra no sistema carcerário –
seja de maiores ou de menores –, e a equipe de
4- As faces da profissionais que administra a pena, isto é, que
o acompanha durante todo o período de sua
agressividadeViolênci reclusão, começa a procurar na sua história de
vida características que indicam sua propensão
a para a prática de delitos.
A investigação de sua história de vida, baseada
nas técnicas científicas e, principalmente, na
ciência PSI (Psicologia e Psiquiatria), deverá
levar à descoberta de impulsos, tendências,
sentimentos e vivências anteriores que
indiquem a afinidade do indivíduo com o delito.
Foucault denuncia que se acaba descobrindo o
delinqüente, apesar e independente do delito
cometido, isto é, descobre-se que, bem antes
da prática desse delito, ele já era “delinqüente”.
c) O delinqüente:

A instituição na qual o indivíduo é isolado do convívio


social e que tem a função social de regeneração e
recuperação é aquela que, contraditoriamente, acaba
por atribuir-lhe esta identidade, que passa a
“funcionar” como marca, rótulo. Uma marca que irá
carregar, posteriormente à sua saída do cárcere e que
irá dificultar sua integração social.
Atualmente, não é necessário o internamento ou a
reclusão no sistema carcerário para que se inicie a
construção da identidade delinqüente. Começa a
ocorrer um fato grave e de conseqüências
4- As faces da imprevisíveis. Milhões de crianças e jovens, cuja
condição fundamental de vida é a pobreza, passam a
agressividade(Violência) ser vistos não como crianças ou jovens, mas como
perigosos ou potencialmente perigosos.
Essa representação social das crianças e jovens das
camadas populares fundamenta-se numa visão
falseada da realidade e é alimentada pelos meios de
comunicação de massa, em que a pobreza é associada
pela criminalidade. Isto visa esconder que tanto a
criminalidade como a pobreza têm origem em um
modo de organização econômica e política que se
caracteriza pela distribuição desigual da renda e por
um processo de pauperização crescente de amplas
camadas da população, mantendo alguns setores, os
mais miseráveis, no limiar da sobrevivência.
Essa visão cumpre, também, a função de desviar a atenção
da opinião pública de outros tipos de crimes cometidos
pelas classes média e alta, dos crimes contra a economia
popular e dos chamados crimes de “colarinho branco”.
Esta compreensão do fenômeno da criminalidade
envolvendo crianças e adolescentes não significa negar que,
infelizmente, um número crescente de jovens encontra-se
4- As faces da envolvido com a prática de atos infracionais graves e,
mesmo, reincidente. Esse fenômeno atravessa todas as
agressividade( classes sociais, isto é, crianças e adolescentes de diferentes
origens sociais, e não exclusivamente os pobres, acabam
Violência) por se transformar em agentes da violência. Portanto, as
determinações da prática de ato infracional não são
exclusivamente de ordem econômica. Os jovens repetem,
como agressores, as experiências de violência que os
vitimaram. Eles carregam prejuízos, vivem em condições de
risco pessoal e social e, além da garantia de direitos básicos
de cidadania, precisam de tratamento, porque o delito
denuncia um sofrimento.
O delito tem esta dupla face: fala do social e do psicológico.
• Referências bibliográficas
• BOCK, Ana Merces. Psicologias: uma
introdução ao estudo da Psicologia. São
Paulo: Saraiva, 2008.

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