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AS DIVISÕES DO ESTUDO

TEOLÓGICO

Reginaldo Cruz
O termo “teologia” é amplo em
sua abrangência. Em seu emprego
mais extenso, ele é aplicado a qualquer
tópico que esteja de alguma forma
relacionado com Deus e com as coisas
divinas. Ouvimos falar da “teologia da
educação cristã”, da “teologia do
ministério urbano” a até de uma
“teologia da arquitetura de igreja”.
Em cada caso, a disciplina em
questão tenta de algum modo aplicar
os princípios das Escrituras a áreas
específicas da vida. Num sentido mais
formal, referimo-nos a todas as áreas
do estudo que dizem respeito às
Escrituras, sua interpretação e sua
aplicação como domínio dos estudos
teológicos.
Divisões do estudo teológico

Teologia
Sistemática

Teologia Teologia
Bíblica Histórica

EXEGESE
Idiomas Bíblicos Contextos Arqueologia
Em vista de nossos propósitos,
presumimos que as disciplinas
teológicas formais (teologia bíblica,
teologia histórica e teologia
sistemática) constroem sobre o
fundamento lançado pelas disciplinas
dos idiomas bíblicos, contextos,
arqueologia e exegese.
O processo teológico começa com
a teologia bíblica, que sintetiza os
resultados mais amplos do processo
exegético num todo coerente. O passo
seguinte no processo, de uma
perspectiva lógica, é a teologia
histórica, que envolve o estudo do
desenvolvimento da compreensão
teológica ao longo da história da Igreja.
O último estágio do processo é a
teologia sistemática, que sintetiza os
resultados de todo o processo num
todo coerente e contextualiza a
verdade de Deus na língua, categorias
e formas de pensamento
compreensíveis aos contemporâneos.
TEOLOGIA BÍBLICA
A teologia bíblica é uma divisão dos
estudos teológicos que procura apresentar o
desdobramento progressivo do ensino das
várias eras e autores da Bíblia em suas
formas de pensamento, categorias e contexto
histórico, em vez de impor ao texto bíblico as
divisões da teologia sistemática. Como
disciplina, é descritiva e sintética, em vez de
analítica.
Teologia bíblica, no sentido
popular, é a que costuma ser utilizada
por pregadores, professores e cristãos
dedicados à exposição de uma
doutrina ou de um sistema de
doutrinas, apoiados apenas em textos
derivados das Escrituras.
TEOLOGIA HISTÓRICA

Teologia histórica é a disciplina


que investiga a compreensão
progressiva do cristianismo e da
verdade da revelação divina na vida, no
coração, na adoração e no pensamento
da humanidade.
Como no caso da teologia bíblica,
sua tarefa é descritiva, pois se
relaciona com o passado como
passado. A teologia histórica procura
responder à pergunta: “O que as
gerações passadas compreendiam e
ensinavam com referência à fé cristã e
por que entendiam e ensinavam dessa
forma?”.
A teologia histórica é uma
disciplina híbrida que deriva tanto da
teologia quanto da História. Esse
híbrido reconhece que forças históricas
e sociológicas estão envolvidas na
forma em que as questões são
elaboradas e as respostas são dadas,
mas a teologia histórica não faz que as
respostas seja absorvidas pelo aspecto
sociológico.
O historiador da teologia cristã
deve estar atento ao contexto cultural
dos teólogos e das proposições que
ele investiga e registra. Toda teologia é
formulada num contexto cultural.
Fatores culturais influenciaram a
teologia de teólogos no passado de
maneiras que os próprios teólogos nem
sempre percebiam.
TEOLOGIA SISTEMÁTICA
Teologia sistemática é “o ramo do
estudo teológico que segue um esquema
projetado pelo homem, ou uma ordem de
desenvolvimento/apresentação da
doutrina que tenta incorporar em seu
sistema toda a verdade acerca de Deus
e de seu Universo, de qualquer fonte” (B.
B. Warfield, grifos nossos).
A natureza abrangente da teologia
sistemática

História
Exegese

Teologia Sistemática

O misticismo do
Espírito Santo

Filosofia
Ciências
Parceria com a filosofia
Desde o século II, os teólogos
reconhecem que a teologia sistemática é
um empreendimento conjunto com a
filosofia. Até mesmo Charles Hodge, o
grande teólogo de Princeton, cuja
definição formal de teologia era a simples
organização e a exposição dos fatos das
Escrituras, reconheceu em sua teologia
sistemática que toda teologia era, de
certo modo, um projeto filosófico.
Na igreja antiga, Orígenes e
Agostinho usaram conscientemente
versões da filosofia platônica. Tomás
de Aquino e os escolásticos
empregaram Aristóteles, e o mesmo
fizeram os escolásticos protestantes. O
liberalismo do século XIX usou o
idealismo hegeliano e o fenomenalismo
Kantiano, enquanto Princeton adotou o
realismo do senso comum.
A neo-ortodoxia empregou, em
maior ou menor grau, o
existencialismo, como fez Paul Tillich.
Pannenberg empregou o neo-
hegelianismo. Enquanto as Escrituras
fornecem a informação primária da
teologia, a em seu labor. Não é
possível a uma teologia ficar
filosoficamente neutra, pois o teólogo
consciente ou inconscientemente,
enxerga o mundo através de um filtro
filosófico, em geral o filtro da cultura
em que ele cresceu.
Princípio organizador

A medida que a disciplina da


teologia sistemática foi amadurecendo,
os teólogos começaram a usar um tema
ou conceito central como princípio
organizador e fator de integração
Assim, no luteranismo a doutrina
da justificação pela fé o princípio
abrangente e a doutrina central, e tudo
o mais é visto através de suas lentes.
Na tradição reformada, o princípio
organizador é a soberania
divina/predestinação. No arminianismo
clássico, o princípio é a liberdade
humana, e no arminianismo wesleyano,
é a santificação/consagração.
A questão das questões
O método teológico nesse ponto é
dialético: se move entre dois polos, o polo
da autoridade teológica (para o
evangelical, a Bíblia e a fé histórica da
Igreja) e o polo da cultura contemporânea
– a “situação”, que é a condição humana
experimentada e expressada pela
presente geração. Num certo sentido, a
condição humana nunca muda, mas o
“problema presente” muda.
O desenvolvimento da teologia
sistemática
a. A Igreja antiga
A disciplina da teologia sistemática tem
sua raízes na Igreja antiga e originou-se de
sua existência.

As obras teológicas escritas durante


esse período eram ocasionais e pastorais. A
ideia da teologia produzida nos círculos
acadêmicos como um exercício intelectual teria
sido incompreensível para a Igreja antiga.
Ireneu

Sua perspectiva é profundamente


bíblica, embora ele vá além das palavras
das Escrituras para explicar os conceitos
de pecadoo e redenção contra o cenário
do gnosticismo.
Orígenes

Orígenes tentou ser um filho fiel da


Igreja. Ele afirmava obstinadamente a
autoridade das Escrituras, a tradição
apostólica e a realidade da encarnação e
contribuiu significamente para o debate
trinitário.
Seu conceito de salvação refletia
a ideia oriental da theosis, ou
deificação, uma categoria que continua
sendo o tema salvífico dominante na
teologia oriental, mas o sistema
teológica que Orígenes produziu foi tão
exageradamente contextualizado que
comprometeu alguns aspectos da fé.
Agostinho

Agostinho foi, inquestionavelmente,


o maior teólogo da Igreja antiga e
tornou-se o pai da teologia ocidental,
católica romana, bem como da teologia
protestante.
À semelhança de Orígenes,
Agostinho era neoplatonista e usava a
filosofia como a ferramenta que
oferecia as categorias pelas quais
podia expressar e defender o
cristianismo. Contudo, diferentemente
de Orígenes, dava precedência à
autoridade bíblica sobre as
perspectivas filosóficas toda vez que
as perspectivas neoplatônicas
contradiziam as Escrituras.
Agostinho usa como princípio
organizador a tríade paulina da fé,
esperança e amor. Na primeira grande
divisão, ele discute os artigos principais
da doutrina cristã; na segunda, os
conceitos de oração, seguindo a ordem
estabelecida pela Oração Dominical;
sob a rubrica do amor, ele abrange
questões morais.
João Damasceno

João Damasceno representa a


forma final da teologia oriental. Sua obra
Exposição da fé ortodoxa é a forma
definitiva da teologia oriental.
Como tal, é tanto especulativa
quanto eclesiástica. João divide sua
obra em quatro partes : 1) Deus e a
Trindade; 2) a criação e a natureza do
homem; 3) a encarnação de Cristo, sua
mente e descida ao Hades; 4) a
ressurreição e o reinado de Cristo.
b. O período medieval
Durante a primeira parte do período
medieval, o conhecimento quase se
extinguiu na Europa, pós a Idade das Trevas
tentava apagar a luz intelectual do Império
Romano, na qual a igreja primitiva havia
nascido e florescido.

Durante esse período, a teologia


tornou-se mais conscientemente dependente
da filosofia, tanto em ser método dialético
quanto nas questões e problemas que
discutia.
Anselmo de Cantuária

Embora Anselmo não tenha


produzido uma teologia sistemática
abrangente, ele continua a ser uma
influência importante no
desenvolvimento do estudo teólogico.
Pedro Lombardo
A teologia sistemática mais
importante do período foi a obra de
Pedro Lombardo Sentenças, que cobria
todo o campo da teologia, Essa obra era
composta de quatro livros, que
abrangiam 1) a Trindade; 2) a Criação;
3) Cristo e a redenção; 4) os
sacramentos e as últimas coisas.
Aquino
Para compreender melhor a
contribuição de Aquino, devemos observar
que, desde o fim do período antigo, o
mundo teológico dependia de Agostinho e
da filosofia platônica subjacente. Contudo,
com as mudanças profundas que estavam
acontecendo no mundo nos dias de
Aquino, a síntese agostiniana entrou em
crise. Já não era capaz de responder aos
desafios que encontrava.
A Summa Theologia de Aquino
cobre em três volumes todo o campo
da sistemática e está assim dividida: 1)
Deus e suas obras; 2) o homem como
imagem de Deus; 3) Cristo e os meios
de graça.
c. A Reforma

Melânctona.
Filipe Melâncton, companheiro
mais jovem de Lutero, produziu o
primeiro manual de dogmática da
Reforma, Loci Communes. (O
próprio Lutero, ao contrário de seu
colega de Reforma Calvino, não era
teólogo sistemático.) O princípio
organizador é a carta de Paulo aos
Romanos.
Calvino

As institutas apresentam uma


organização basicamente trinitária, pois
os três primeiros livros se referem aos
membros da Trindade, enquanto o livro
final se concentra na igreja.
Livro 1: O conhecimento de Deus, o
Criador

Livro 2: O conhecimento de Deus, o


Redentor

Livro 3: O meio em que recebemos a


graça de Cristo

Livro 4: Os meios de graça: a santa


Igreja católica
d. O escolasticismo protestante pós-
Reforma

Luteranos
Depois da morte de Lutero, o
luteranismo e a teologia luterana
dividiram-se em dois campos: os
luteranos, que seguiam Martinho
Lutero rigorosamente, e os filipistas,
que seguiam a tradição mais
moderada de Filipe Melâncton.
Depois de um período de conflito
teológico interno, a facção luterana
emergiu vitoriosa. Várias outras
controvérsias teológicas ocorreram
durante esse período, mas a teologia
reinante era aquela baseada no
conteúdo da luterana Fórmula de
concórdia.
A tradição reformada
Teodoro Beza, embora não tenha ele
mesmo produzido uma grande teologia
sistemática, exerceu influência no
desenvolvimento da teologia reformada mais
que qualquer outro. Com a morte de Calvino,
o manto da liderança da Igreja reformada
suíça foi passado a Teodoro. Embora
preservasse a substância da teologia de
Calvino, Beza introduziu mudanças sutis que
tiveram profundas consequências.
TEOLOGIA MODERNA
O impulso liberal
Das cinzas do Iluminismo, ergueu-
se uma nova tradição teológica, cuja
intenção era ser moderna e ao mesmo
tempo cristã. Essa tradição foi fundada
por Friedrich Schleiermacher, tendo em
Albrecht Ritschl sua segunda maior
inspiração.
Schleiermacher assinala um abandono
radical da teologia tradicional. Antes dele,
toda a teologia tinha a Palavra de Deus como
a fundamento e fonte principal de autoridade.
Schleiermacher pôs a teologia de cabeça para
baixo e substituiu a revelação objetiva pela
experiência subjetiva.

Adolf von Harnack e sua História do


dogma, em sete volumes. Mais conciso é seu
livro O que é o cristianismo?, uma transcrição
de preleções feitas em Berlim no ano de
1900.
A teologia reformada

No final do século XIX, ocorreu um


“florescimento tardio” do calvinismo na
Holanda, que também afetou os Estados
Unidos. Entre os que merecem destaque,
estão Abraham Kuyper, Hermam Bavinck
e G.C. Berkouwer.
Entre os teólogos norte-
americanos que surgiram dessa
tradição, temos Louis Berkhof e
Cornelius Van Til.

Entre os teólogos norte-


americanos do século XIX, destacam-
se os princetonianos Charles Hodge,
A. A. Hodge e B. B. Warfield.
Os presbiterianos do Sul James
Henley Thornwell e R. L. Dabney
também são importantes. Henry
Boynton Smith, do Seminário União, de
Nova York, e seu colega mais famoso,
William G. T. Shedd, também
produziram obras importantes. Além
desses, o teólogo batista calvinista A. H.
Strong também contribuiu de modo
significativo.
A neo-ortodoxia

O século XX testemunhou o
declínio do liberalismo clássico do século
XIX, especialmente por causa de Karl
Barth, o pai da neo-ortodoxia. Barth
produziu um volume imenso de estudos
acadêmicos na área da teologia, sendo o
mais importante a Dogmática da Igreja.
Na linha de frente da neo-
ortodoxia, com Barth, está o também
suíço Emil Brunner.

Sua Dogmática, em três volumes,


é bem mais acessível que a de Barth, e
Brunner teve influência maior e anterior
a Barth no mundo de fala inglesa.
Outros teólogos do século XX

Os três volumes da Teologia


sistemática de Tillich foram escritos da
perspectiva da filosofia existencialista e
se assemelham mais a uma filosofia que
a uma teologia tradicional.
Durante a segunda metade do
século XX, dois homens emergiram
como teólogos importantes: Wolfhart
Pannenberg e Jürgen Moltmann. A
teologia sistemática de Pannenberg foi
traduzida para o inglês. Seu tema
fundamental é a “revelação como
história”. A perspectiva de Moltmann foi
denominada “teologia da esperança”, e
ele é considerado o pai teológico e
intelectual da teologia da libertação, da
teologia negra e da teologia feminista.

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