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“Poemas escolhidos”

Gregório de Matos Guerra


Prof. Adriana
Contexto histórico
Século XVII
Brasil - colônia
Cidade mais importante- Salvador
Sociedade fidalga, escravocrata e preconceituosa
Período da contrarreforma- tentativa da igreja, através dos jesuítas,
resgatar os fiéis para o catolicismo.
No final do século XVII, Portugal estava em decadência,
sendo que o sistema escravocrata não conseguia mais
sustentar a economia da Metrópole.
Linguagem – Cultismo ou gongorismo : jogo de palavras
Exagero no uso de figuras de linguagem
Gregório de Matos Guerra- biografia
Historicamente o primeiro grande poeta do Brasil, do período Barroco, Gregório de Matos
Guerra nasceu em 1633, na cidade de Salvador, na Bahia, e sua obra, principalmente a satírica,
faz alusão a duas de suas maiores referências: Brasil e Portugal. Filho de um fidalgo português
com uma brasileira, Gregório de Matos se formou em Direito na Universidade de Coimbra,
Portugal.
Em 1682, foi nomeado pelo rei português para ocupar um cargo eclesiástico em uma igreja de
Salvador, mas, ao descobrir que precisaria fazer voto de castidade, desistiu. Abriu uma banca de
advogado em Salvador e casou-se com Dona Maria dos Povos, com quem teve um filho,
Gonçalo.
Gregório de Matos não publicou nada em vida, de forma impressa. No século 17 muitos eram os
iletrados – e o livro circulava como um objeto raríssimo e caro, com folhas feitas de trapo
(pano). “Era comum o poema ser composto nessa folha, e na sátira, por exemplo, era
extremamente rotineiro alguém escrever à noite e, de madrugada, aquela folha ser pregada
com cola de farinha de mandioca na porta da igreja.
Gregório de matos Guerra
1- Poesia lírica
Amorosa: tematiza basicamente os choques entre ascetismo e sensualismo, espírito e matéria, fazendo os
contrários se fundirem, tornando-se inseparáveis.
A mulher, como anjo e flor, espírito e matéria, acaba sendo convertida, de antítese, em paradoxo.
Apresenta a reflexão sobre o amor, a mulher idealizada, a mulher anjo e demônio.
Apresenta-se sob o signo da dualidade barroca, oscilando entre a atitude contemplativa, o amor elevado, à
maneira dos sonetos de Camões, e a obscenidade, o carnalismo. É curioso que a postura platônica é
dominante, quando o poeta se refere a mulheres brancas, de condição social superior, e a libido agressiva, o
erotismo e o desbocamento são as tônicas, quando o poeta se inspira nas mulheres de condição social inferior,
especialmente as mulatas.

Religiosa/sacra: faz reflexões sobre o pecado e o perdão. Tematiza a culpa e o perdão.


Expressa a cosmovisão barroca: a insignificância do homem perante Deus, a consciência nítida do pecado e a
busca do perdão. Ao lado de momentos de verdadeiro arrependimento, muitas vezes o tema religioso é
utilizado como simples pretexto para o exercício poético, desenvolvendo engenhosos jogos de imagens e
conceitos. A respeito da sua poesia sacra, Gregório era tão religioso quanto libertino. Tal paradoxo representa o estilo
barroco
As ideias de Deus e do pecado, ao mesmo tempo que se opõem, são complementares. Embora Deus detenha o
poder da condenação da alma, está sempre disposto ao perdão, por sua misericórdia e bondade; daí deriva Sua
maior glória.
Poesia lírica encomiástica: Gregório de Matos escreveu também poemas laudatórios (de elogio), de
circunstância (festas, homenagens, fatos corriqueiros).

2- Poesia satírica
Gregório de Matos é amplamente conhecido por suas críticas à situação econômica da Bahia,
especialmente de Salvador chegando a fazer, inclusive, uma crítica ao então governador da Bahia Antônio
Luís da Câmara Coutinho. Além disso, faz duras críticas à Igreja e a religiosidade presente naquele
momento. Essa atitude de subversão por meio das palavras rendeu-lhe o apelido de "Boca do Inferno", por
satirizar seus desafetos.
Sua poesia pode ser considerada um exemplo muito peculiar de barroco brasileiro, visto que ele
abrasileirou esse estilo europeu, tropicalizando o léxico com termos indígenas, africanos, locuções
populares e gírias. ...
O “Boca do Inferno”, como era chamado, não perdoava ninguém: ricos e pobres, negros, brancos e
mulatos, padres, freiras, autoridades civis e religiosas, amigos e inimigos, todos, enfim, eram objeto de sua
“lira maldizente”.
O governador Câmara Coutinho, por exemplo, foi assim retratado:
“Nariz de embono
com tal sacada,
que entra na escada
duas horas primeiro
que seu dono.”
Análise principais poemas
1- Rompe o poeta com a primeira impaciência querendo declarar-se e temendo perder por ousado

Anjo no nome, Angélica na cara!


Isso é ser flor, e Anjo juntamente:
Ser Angélica flor, e Anjo florente,
Em quem, senão em vós, se uniformara:

Quem vira uma tal flor, que a não cortara,


De verde pé, da rama fluorescente;
E quem um Anjo vira tão luzente,
Que por seu Deus o não idolatrara?

Se pois como Anjo sois dos meus altares,


Fôreis o meu Custódio, e a minha guarda,
Livrara eu de diabólicos azares.

Mas vejo, que por bela, e por galharda,


Posto que os Anjos nunca dão pesares,
Sois Anjo, que me tenta, e não me guarda
Análise do poema 1
O soneto mostra-se paradoxal em uma contradição que organiza o poema todo com uma
figura feminina que é ao mesmo tempo anjo e flor, espírito e matéria.
Neste soneto Gregório mostra-se um poeta lírico falando de sua amada. Revela muito do
estilo cultista por meio do jogo de palavras usado: “Ângela” = “Angélica” = “Anjo”, “flor” =
“florente”, seguindo a tradição de Camões ao comparar a beleza da mulher à natureza.
O seu tema central é a contradição da mulher Ângela, que no poema é colocada no lugar
da flor (metáfora da beleza), o objeto do desejo e em ''anjo'' metáfora de pureza e símbolo
da elevação espiritual, no qual ocorre o uso de vários trocadilhos. Angélica (que é pura
como um anjo e ao mesmo tempo é o nome de uma flor que inspira sensualidade) trata-se
de uma mulher que tem uma feição angelical tão bela e amorosa que passa a ideia de uma
flor por ser muito delicada. Uma imagem de mulher construída a partir de duas palavras,
que é associada ao seu nome e ao seu rosto: flor “Angélica na cara” e anjo “Anjo no nome.
A contradição entre o amar e o querer desemboca no paradoxo dos versos finais: “Sois
anjos, que me tenta, e não me guarda”. Assim o louvor e a exaltação de uma beleza
angelical termina com uma tentação demoníaca e que gera a imagem angelical feminina, e
a tentação da carne que atormenta o espírito.
2- Aos afetos e lágrimas derramadas na ausência da dama a quem queria bem
Ardor em firme coração nascido!
Pranto por belos olhos derramado!
Incêndio em mares de água disfarçado!
Rio de neve em fogo convertido!

Tu, que um peito abrasas escondido,


Tu, que em um rosto corres desatado,
Quando fogo em cristais aprisionado,
Quando cristal em chamas derretido.

Se és fogo, como passas brandamente?


Se és neve, como queimas com porfia?
Mas ai! Que andou Amor em ti prudente.

Pois para temperar a tirania,


Como quis, que aqui fosse a neve ardente,
Permitiu, parecesse a chama fria.
Análise do poema 2
O eixo do poema é o jogo dos opostos representado pelo fogo/água, calor/frio
O sentimento( interno) que arde no coração da amada se derrama no pranto
(externo) que sai dos olhos.
No primeiro terceto verifica-se o questionamento: como esse sentimento é
possível?
No segundo terceto o amor conseguiu fundir os opostos – os adjetivos opostos são
exemplos claros dessa fusão.
Soneto no melhor estilo cultista: o poeta emprega figuras de linguagem,
especialmente aquelas usadas no Barroco: antítese e paradoxo.
Ex:
Incêndio em mares
Rio de neve em fogo
Neve ardente
Chama fria
3- A N. senhor Jesus Cristo com atos de arrependimento e suspiros de amor
Ofendi-vos, Meu Deus, bem é verdade,
É verdade, meu Deus, que hei delinquido,
Delinquido vos tenho, e ofendido,
Ofendido vos tem minha maldade.

Maldade, que encaminha à vaidade,


Vaidade, que todo me há vencido;
Vencido quero ver-me, e arrependido,
Arrependido a tanta enormidade.

Arrependido estou de coração,


De coração vos busco, dai-me os braços,
Abraços, que me rendem vossa luz.

Luz, que claro me mostra a salvação,


A salvação pretendo em tais abraços,
Misericórdia, Amor, Jesus, Jesus.
Análise do poema 3
O título deste soneto, bem extenso, é uma característica do período literário em que esse
texto foi escrito ,o barroco, de temática religiosa.
O eu-lírico se coloca como alguém inferior e submisso. No título podemos ver como é
invocada a figura de Jesus, como se o eu-lírico o buscasse, a procura de perdão para seus
pecados, demonstra estar arrependido, no decorrer do texto pois admite seus erros em um
diálogo com Deus.
Na segunda estrofe o eu-lírico fala sobre a vaidade que, sendo considerado um dos pecados
capitais e por isso declara-se pecador e digno de perdão. Vemos o contraste, "pecado X
arrependimento", que é típica do Barroco e do poeta. O eu-lírico parecia realmente
arrependido pelos seus erros, tanto que podemos observar na última estrofe o pedido
fortíssimo que ele faz por misericórdia a Deus, o que parece também que ele estava prestes
a morrer e clamava desesperadamente pelo perdão divino. É importante registrar que
Gregório de Matos usou no poema uma figura de linguagem conhecida como anadiplose,
que consiste em retomar o último termo de cada verso no início do verso seguinte, em um
estimulante jogo de palavras – acentuando o cultismo.
4- BUSCANDO A CRISTO CRUCIFICADO
A vós correndo vou, braços sagrados,
Nessa cruz sacrossanta descobertos,
Que, para receber-me, estais abertos,
E, por não castigar-me, estais cravados.

A vós, divinos olhos, eclipsados


De tanto sangue e lágrimas cobertos,
Pois, para perdoar-me, estais despertos,
E, por não condenar-me, estais fechados.

A vós, pregados pés, por não deixar-me,


A vós, sangue vertido, para ungir-me,
A vós, cabeça baixa, pra chamar-me.

A vós, lado patente, quero unir-me,


A vós, cravos preciosos, quero atar-me,
Para ficar unido, atado e firme.
Análise do poema 4
O soneto ilustra uma característica típica do Barroco: o uso de situações ambivalentes, que possibilitam dupla
interpretação. Assim, os braços de Cristo são apresentados como abertos e cravados (presos); seus olhos estão
despertos e fechados, cada um desses estados permite ao poeta fazer uma interpretação sempre positiva do
gesto divino. Os braços estão abertos para acolher o fiel que se dirige a Deus e cravados para não castiga-lo
pelos pecados que ele cometeu.
O soneto desenvolve uma argumentação que busca convencer o leitor de uma verdade religiosa: o perdão
de Deus é absoluto. A imagem de Cristo crucificado dá origem às metonímias ( utilização da parte para
referir-se ao todo) que constituirão os argumentos apresentados por Gregório de Matos Guerra. Cada uma das
partes do corpo de Cristo representa uma atitude acolhedora, magnânima, uma manifestação de bondade e
comiseração.
Os versos 5, 9, 10, 11, 12 e 13 constroem-se com a omissão do verbo, já referido no 1º verso – correndo
vou. Em todos eles ocorre o procedimento estilístico denominado zeugma. Assim nos versos mencionados
você deve ler:
•A vós (correndo vou) divinos olhos, eclipsados.
•A vós (correndo vou) pregados pés, por não deixar-me,
•A vós (correndo vou) pregados pés, por não deixar-me,
Outro recurso estilístico utilizado pelo autor é a anáfora – repetição de palavras no início dos versos.
Observe o poema a repetição da expressão “ A VÓS”
Na última estrofe, podemos identificar o tema do FUSIONISMO: o fiel, reconhecendo os sinais de que será
acolhido por Deus, manifesta o seu desejo de “ficar unido, atado e firme” ao Cristo crucificado
5- Moraliza o poeta. Nos Ocidentes do Sol a inconstância dos bens do mundo
“Nasce o Sol, e não dura mais que um dia,
Depois da Luz se segue a noite escura,
Em tristes sombras morre a formosura,
Em contínuas tristezas a alegria.

Porém se acaba o Sol, por que nascia?


Se é tão formosa a Luz, por que não dura?
Como a beleza assim se transfigura?
Como o gosto da pena assim se fia?

Mas no Sol, e na Luz falte a firmeza,


Na formosura não se dê constância,
E na alegria sinta-se tristeza.

Começa o mundo enfim pela ignorância,


E tem qualquer dos bens por natureza
A firmeza somente na inconstância.”
Análise do poema 5
Poesia lírico-filosófica que analisa a efemeridade da existência.
Devido a nossa ignorância, não damos o devido valor ao nascer e ao pôr do
sol. O poeta utiliza o sol como metáfora da vida e utiliza a temática da
passagem do tempo, a instabilidade das coisas, a inconstância da natureza,
da condição humana, as incertezas da vida e a transitoriedade dos fatos
cotidianos. Há a presença de figuras de linguagem como metáforas, antítese
e paradoxo, sempre ligadas à questão de ideias contrárias como a questão
Claro X Escuro, características do período barroco.
O poema acima, quanto à sua forma é classificado como soneto, cuja
característica é conter dois quartetos e dois tercetos. Os versos são
decassílabos, ou seja, os versos possuem 10 sílabas poéticas cada um e os
quartetos rimam entre si, bem como os tercetos também rimam entre si
porém há um verso branco. Segue o esquema de rimas do poema: (ABBA,
ABBA, CDE, DCD).
6- A certa personagem desvanecida- Ao conde de Eryceia

Um soneto começo em vosso gabo:


Contemos esta regra por primeira;
Já lá vão duas, e esta é a terceira,
Já este quartetinho está no cabo,

Na quinta torce agora a porca o rabo;


A sexta vá também d'esta maneira:
Na sétima entro já com grã canseira,
E saio dos quartetos muito brabo.

Agora nos tercetos que direi:


Direi que vós, Senhor, a mim me honrais
Gabando-vos a vós, e eu fico um rei.

N'esta vida um soneto já ditei;


Se d'esta agora escapo, nunca mais:
Louvado seja Deus, que o acabei.
Análise do poema 6-

Nesse soneto o poeta utiliza-se de uma ironia metalinguística. Ao compor


esse poema, Gregório de Matos vai ao mesmo tempo descrevendo a
elaboração do poema, e o faz com muita graça e, de sobra, zomba de
alguma pessoa afetada que, presumidamente, queria ser elogiada
(“gabada”) em sua poesia. “Regra”, no segundo verso, além de seu sentido
normal, significa “linha, verso”.
O poeta frustra as expectativas do mandante ( Conde de Eryceira) já que
dele nada de positivo tem a dizer.
Poema rico em musicalidade e de cultismo.
No último terceto o poeta agradece a Deus por ter finalizado a árdua
tarefa.
O uso do hipérbato é visto no 1º verso da segunda estrofe cuja ordem
seria: A porca torce o rabo agora na quinta
7- À cidade da Bahia
Triste Bahia! Ó quão dessemelhante
Estás e estou do nosso antigo estado!
Pobre te vejo a ti, tu a mi empenhado,
Rica te vi eu já, tu a mi abundante.

A ti trocou-te a máquina mercante,


Que em tua larga barra tem entrado,
A mim foi-me trocando, e tem trocado,
Tanto negócio e tanto negociante.

Deste em dar tanto açúcar excelente


Pelas drogas inúteis, que abelhuda
Simples aceitas do sagaz Brichote.

Oh se quisera Deus que de repente


Um dia amanheceras tão sisuda
Que fora de algodão o teu capote!
Análise do poema 7
Gregório de Matos ficou conhecido como "Boca do Inferno" por seus poemas satíricos que, entre
outras coisas, criticavam a situação econômica da Bahia (local de origem do autor). Nesse poema
ele lamenta a situação da Bahia (outrora rica) que é devastada pela exploração, principalmente na
época açucareira em que os recursos naturais eram prejudicados para levar riqueza à metrópole.
O poema termina com "Oh se quisera Deus que de repente/Um dia amanheceras tão sisuda/Que
fora de algodão o teu capote!" que deseja que um dia a Bahia se torne livre com a humildade de um
tecido de algodão, longe dos tecidos finos da Europa.
“Boca do Inferno” retrata uma Bahia devastada pela exploração de seus recursos naturais,
especialmente no período açucareiro, como elucidam os versos: “Deste em dar tanto açúcar
excelente /Pelas drogas inúteis, que abelhuda/Simples aceitas do sagaz Brichote.” E a voz lírica,
imersa em nostalgia, embargada em suspiros de entardecer por um local de outrora, assiste
passível aos destroços deixados pelo sistema mercantil sanguessuga. As litorâneas terras que já
toaram de berço para tantas belezas e riquezas naturais, servindo de fartura a seu povo, vive o
papel de mercado em prol de manter o status quo de uns em detrimento do jugo de outros.
O eu-lírico critica os governantes da cidade baiana, tanto o homem como a cidade estão se
vendendo como mercadorias.
O poeta personifica a cidade baiana, faz uma crítica à degradação moral e econômica na qual a
Bahia se encontrava naquela época.
Enquanto os ladrões e comerciantes eram os detentores do poder político e econômico, os
trabalhadores encontravam-se na intensa pobreza.
08- AS COUSAS DO MUNDO
Neste mundo é mais rico o que mais rapa(rouba)
Quem mais limpo se faz, tem mais carepa;(casca)
Com sua língua, ao nobre o vil decepa:
O velhaco maior sempre tem capa.(posses)

Mostra o patife da nobreza o mapa:


Quem tem mão de agarrar, ligeiro trepa;(enriquece)
Quem menos falar pode, mais increpa:
Quem dinheiro tiver, pode ser Papa. (corrupção)

A flor baixa se inculca por tulipa;(mestiços)


Bengala hoje na mão, ontem garlopa, (ricos)
Mais isento se mostra o que mais chupa.(rouba)

Para a tropa do trapo vazo a tripa


E mais não digo, porque a Musa topa
Em apa, epa, ipa, opa, upa.(sons dos excretos)
Análise do poema 08-

No Poema Gregório fala sobre as diferenças sociais no mundo.” Neste Mundo é mais rico o que mais
rapa”, pensava o autor indignado com as diferenças que o mundo apresenta, e com as injustiças que o
mundo apresenta.
“Quem dinheiro tiver, pode ser Papa”, o autor critica que quem tem mais dinheiro pode ser o que quiser,
até mesmo um Papa, isto mostra o quão crítico o poeta se apresenta, contrário a esses tipos de injustiças.
O autor mostra que as diferenças fazem bem para um, mas ao mesmo tempo fazem mal para o outro.
O poeta faz uso de aliterações, principalmente da última estrofe.
O primeiro verso da última estrofe sugere que o poeta, ao utilizar ...vazo a tripa, significa não se importar,
ou seja, numa linguagem chula e atual “estava cagando” para os corruptos, pois vazar a tripa é defecar.
Há a presença de hipérbatos – “Com sua língua, ao nobre o vil decepa”- O vil decepa, com sua língua, o
nobre.
O poeta faz uso do cultismo pois explora, de modo excessivo, a linguagem abstrata e metafórica.
O último verso do soneto temos a aplicação cômico do processo da disseminação e recolha: o poeta
reagrupa as rimas usadas ao longo das estrofes. Pode-se pensar, também, no caráter onomatopaico
desses sufixos, que sugerem o som dos excretos caindo.
A linguagem adotada pelo poeta é satírica, portanto, também agressiva. Com um vocabulário chulo
–no qual são encontrados termos como “chupa”, “tripa” e “patife” que contém somente artigos definidos, tudo é bem
claro e determinado, não ficando nas entrelinhas a quem o ataque dirige-se, fazendo com que o poemaseja curto e
grosso, sem cuidados ou delicadezas.
09- Desenganos da vida humana metaforicamente

É a vaidade, Fábio, nesta vida,


Rosa, que da manhã lisonjeada,
Púrpuras mil, com ambição dourada,
Airosa rompe, arrasta presumida.

É planta, que de abril favorecida,


Por mares de soberba desatada,
Florida galeota empavesada,
Sulca ufana, navega destemida.

É nau enfim, que em breve ligeireza,


Com presunção de Fênix generosa,
Galhardias apresta, alentos preza:

Mas ser planta, ser rosa, nau vistosa


De que importa, se aguarda sem defesa
Penha a nau, ferro a planta, tarde a rosa?
Análise do poema 09-

O soneto filosófico/reflexivo em metáforas. O que quer dizer com desenganos da vida humana? Desengano significa
desilusão, a vaidade é um desses desenganos, esse desejo de ser admirado, mas com a mesma rapidez que surge,
esvai-se como a vida com sua finitude. A efemeridade e a finitude da vida permeiam o soneto e levam a um
questionamento, de que vale ser vaidoso, se a morte é inexorável ?
É no trinômio efêmero: rosa, planta e nau (metáforas da vaidade) que o poema se desenvolve. E também que o
poeta explica a Fábio o que é a vaidade. Afirma que ela é rosa (primeiro quarteto), que é planta (segundo quarteto) e
que é nau (primeiro terceto).
Mas vejam o ambiente dessa rosa, está desabrochando, é real, enquanto que a vaidade é a beleza aparente que
seduz, brilha como púrpura, mas tem um efeito passageiro.
A vaidade é planta, e por ser primavera sua aparência é mais viçosa. Assim, a vaidade é esplendor que se exibe pela
vida com orgulho, mas que sempre tem um fim próximo.
Mas quando ele afirma que ela é nau, quer mostrar que o ser humano vaidoso embora tenha a presunção da
perpetuidade, valoriza os brilhos exteriores, porém efêmeros.
(Penha a nau, ferro a planta, tarde a rosa?) Vejam que há uma inversão na ordem dos termos que eram rosa, planta e
nau, o que pode indicar um desejo de renascimento. O soneto acaba com um ponto de interrogação levando o leitor
a buscar a compreensão do poema. Entretanto, resume os acontecimentos: penha indicando o naufrágio do navio,
ferro o corte da planta, e tarde o murchar da rosa (durante o dia está em todo o seu esplendor, brilhando como o sol)
ratificando a efemeridade da vida dos seres.
Esse soneto permeado de metáforas deixa um questionamento real. O que quero para minha vida? O que de fato
preencherá minha alma e alimentará meu espírito?
10- Ao casamento de Pedro Álvares da Neiva
Sete anos a nobreza da Bahia
Servia a uma pastora indiana e bela,
Porém servia a Índia, e não a ela,
Que a Índia só por prémio pretendia.

Mil dias na esperança de um só dia


Passava, contentando-se com vê-la:
Mas frei Tomás, usando de cautela,
Deu-lhe o vilão, quitou-lhe a fidalguia.

Vendo o Brasil que por tão sujos modos


Se lhe usurpara a sua Dona Elvira
Quase a golpes de um maço e de uma goiva:

Logo se arrependeram de amar todos,


Mas qualquer mais amara se não vira
Para tão limpo amor tão suja noiva.
Análise poema 10-

O poeta mais uma vez está exibindo seus preconceitos, irá ridicularizar a mulher indiana,
fazendo paródia do famoso soneto de Camões, inspirado na Bíblia, que se inicia assim: “Sete
anos de pastor de Jacó servia/Labão, pai de Rachel, serrana bela...” O conhecimento de
Camões é determinante para entender a paródia da forma lírica, não a agressão satírica. O
tema do poema versa sobre a “limpeza do sangue” e boatos sobre o Frei Tomás e o noivo,
Pedro Álvares de Neiva; e a degradação da noiva, de “sujo sangue”
No primeiro terceiro, Dona Elvira é provável alusão a uma senhora fidalga da época. O nome
feminino contrastará com o de Rachel e de Lia, nomes bíblicos, presentes em Camões,
distante da realidade social baiana. Ainda nesse terceto, encontramos o verso “quase a
golpes de um maço e de uma goiva”, onde maço é uma espécie de martelo e goiva uma
espécie de formão, instrumentos usados por carpinteiros e escultores
SETE ANOS DE PASTOR JACÓ SERVIA

Labão, pai de Raquel, serrana bela;


Mas não servia ao pai, servia a ela,
Que a ela só por prêmio pretendia.

Os dias, na esperança de um só dia,


Passava, contentando-se com vê-la:
Porém o pai, usando de cautela,
Em lugar de Raquel lhe deu a Lia.

Vendo o triste pastor que com enganos


Assi lhe era negada a sua pastora,
Como se a não tivera merecida,

Começou a servir outros sete anos,


Dizendo: - Mais servira, se não fora
Pera tão longo amor tão curta vida!
Luís Vaz de Camões

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