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À PROCURA DE UM MODELO DE FORMAÇÃO HOQUISTA NO CLUBE

DESPORTIVO DE PAÇO DE ARCOS

1. A necessidade de optimizar a formação no CDPA


II. A etapa inicial do que pretendemos ser um modelo de formação
hoquista
III. A Estrutura organizativa e técnica necessária para o suporte
IV. Dificuldades sentidas

Paulo Batista
Treinador Principal Hóquei em Patins - CDPA
I. A necessidade de optimizar a formação no CDPA

O CDPA, Clube cuja formação remonta a Agosto de 1944, notabilizou-se nos


primórdios do HP em Portugal, tendo-se a partir do entusiasmo decorrente, formado
um núcleo que privilegiava a prática do Hóquei em Patins (HP), cativando os
entusiasmados miúdos ao longo do tempo. Dentro das suas possibilidades e
capacidades o CDPA, após o período áureo de conquista de títulos nacionais Seniores,
consolidou um núcleo de formação Hoquista.
A falta de adaptação à evolução da modalidade em conjugação com a própria
evolução de Desporto Nacional, relegou o CDPA para um plano médio no panorama da
própria modalidade, caracterizando o CDPA (HP), das últimas três décadas, por um
núcleo de formação hoquista de relevo mas com uma equipa Sénior de plano mediano
e algumas vezes com uma prestação medíocre, pelo menos considerando todas as
expectativas que um passado de glória acalentavam.
Facilmente se compreende que face à realidade de um plano secundário,
confrontada com as lembranças de um passado de relevo, a vivência do Clube
caracterizava-se por uma nostalgia constante, que conjugada com a mentalidade
orientadora do Desporto Nacional, logo também da própria modalidade, de procura de
resultados imediatos, levava a sucessivas épocas onde a principal preocupação era
manter um nível mínimo de competição sem se criarem bases para um futuro
desportivo melhor.
Após um período sem relevo significativo (3 décadas) do HP no CDPA – caracterizado
por medianas prestações da sua 1ª Equipa, onde não se aproveitavam jogadores que
provinham da sua formação (ou saíam do Clube ou abandonavam a modalidade),
formação essa que também só a espaços se notabilizava a nível nacional –, houve que
inflectir na política do próprio HP face a um raciocínio fácil de sabor amargo:
“Tendo o CDPA um núcleo de formação hoquista de relevo onde os jogadores não são
aproveitados pela 1ª Equipa, cuja prestação não constitui motivo aglutinador e
dinamizante do Clube, recorrendo sistematicamente a jogadores de outros clubes, o
que conforme se constatava não justificava a aplicação de recursos feitos na 1ª
equipa, havia que apostar claramente no reforço da qualidade do processo de
formação hoquista, rendibilizando muito mais a prestação da 1ª equipa, e acima de
tudo consolidar a perspectiva de futuro que o CDPA precisava para sobreviver no difícil
meio da alta competição desportiva, neste caso hoquista”.
II. A etapa inicial do que pretendemos ser um modelo de formação
hoquista

Necessidade de pensar o processo de ensino do HP a partir das carências da


1ª Equipa
Com vista a optimizar e dinamizar o HP do Paço de Arcos, surge a tentativa de pensar
a interligação total da modalidade no Clube numa perspectiva de base técnica.
Tem de ser referido que não houve a intenção de aplicar um modelo organizativo e
de formação previamente definido, porque havia a consciência que uma alteração de
choque (em termos organizativos, de definição de objectivos técnicos a atingir e
fundamentalmente de mentalidade), estaria condenada ao insucesso.
Havíamos nós próprios de progressivamente construir um modelo de formação, e
acima de tudo, também progressivamente, demonstrar que valeria com certeza mais,
trabalhar segundo princípios minimamente sistematizados, porque assim, pelo menos
melhoraríamos qualitativamente aquela que pretendia ser a principal fonte de
recrutamento da 1ª equipa.
Tínhamos então um ponto de partida, que era a nossa equipa sénior mediana, com
muitas equipas jovens que revelavam grande potencial, constatado no confronto
directo com os adversários a nível regional. Havia que suportar a evolução dos mais
novos para aumentar a competitividade da 1ª equipa sénior e, mais importante,
solidificar o processo tornando-o contínuo e infindável.
Partiu-se da verificação das necessidades da equipa sénior, para nos orientarmos na
definição dos conteúdos técnicos que se transmitiriam para as camadas inferiores.
Exemplo, que ilustra este transfer e que esteve marcadamente subjacente na
actividade no início desta nova fase foi a necessidade de estabelecer princípios
defensivos individuais e colectivos na equipa sénior e que levou a aprofundar quer as
capacidades requeridas quer a metodologia de ensino.
À medida que o tempo decorreu este processo alargou-se a outras questões técnicas e
estaremos já numa fase em que as metodologias são outras, com inclusivamente
outras ideias que se formaram na experiência entretanto obtida, além de que o
processo de transferência já não é só no sentido descendente uma vez que face à
dinâmica do processo de treino muitas situações surgem nas categorias inferiores que
podem ser transportadas para a 1ª equipa, assegurando essa transferência a
interligação entre os treinadores.

A definição do jogador que queremos


Partimos então das carências que quisemos colmatar na 1ª equipa para chegarmos ao
modelo de jogo que fomos sentindo ser necessário implementar e que pode ser
definido, por:
- Capacidade defensiva caracterizada por um sistema coeso e disciplinado,
com grande capacidade de adaptação aos sistemas ofensivos
adversários e às suas particularidades, sobressaindo também uma
grande agressividade individual e colectiva com vista à obtenção da
posse da bola e que terá de ter como suporte a capacidade individual
defensiva assim como o espírito de cooperação entre os seus jogadores.
- Capacidade ofensiva caracterizada por uma grande versatilidade face
aos sistemas defensivos dos adversários e suas particularidades, que
dependerá da capacidade técnica dos jogadores, onde impera a
velocidade de execução quer de stick quer da patinagem hoquista.
- Domínio das várias situações de transição ofensiva e defensiva onde a
relação numérica de jogadores é importante na aplicação das
respectivas acções individuais e colectivas.
Desta descrição do modelo de jogo pretendido verifica-se que lhe está subjacente uma
grande dependência da capacidade de individual dos atletas nas suas várias
vertentes, nomeadamente a cognitiva – a sua capacidade de interpretar os diferentes
momentos do jogo e de reagir adequadamente e atempadamente à situação –
suportada na sua capacidade técnica.
O Jogador – dotá-lo das várias capacidades – assume o papel fulcral na orientação
técnica do processo de ensino/aprendizagem.
Daí que o modelo de jogador que pretendemos terá como linha orientadora dois
factores extremamente importantes: O desenvolvimento da técnica individual e o
desenvolvimento da táctica individual do jogador.
Cada vez mais pensamos que estes dois factores serão a base para uma evolução
sustentada de cada jogador.
Concretizando, definiremos as características comuns daqueles que queremos como
jogadores:
- Grande domínio da patinagem hoquista: Execução de todos os seus
elementos e noção das várias vantagens que poderão ser criadas com os
diferentes tipos de execução desses elementos.
- Grande domínio da táctica individual defensiva e ofensiva
nomeadamente a autonomia na resolução de situações a seu favor com
diferentes relações numéricas e em diferentes espaços.
- Domínio de princípios de táctica colectiva subjacentes ao modelo de jogo
preconizado
III. A Estrutura organizativa e técnica necessária para o suporte
Nos Clubes de Hóquei em Patins tem vindo a implementar-se um modelo de
organização baseada em pequenos núcleos, coincidentes com as várias equipas das
categorias existentes; núcleos esses que ao disputarem os poucos recursos que o
Clube põe à sua disposição agravam a vivência quotidiana impossibilitando a troca e
partilha de informações que enriquecem o processo de ensino desportivo.
O Clube organiza-se então em pequenos clubes que criam rivalidades entre os seus
responsáveis transmitindo-se essas rivalidades inclusivamente aos miúdos, passando
por pais/seccionistas e por treinadores.
Neste enquadramento é evidente que a comunicabilidade necessária a processo de
ensino desportivo evolutivo não existia, potenciando ainda mais a perspectiva redutora
do campeão a todo o custo (nas camadas jovens), uma vez que é importante ganhar
para mostrarmos que somos melhores que a outra equipa, que por acaso é do mesmo
Clube.
Uma perspectiva de evolução técnica sustentada ao longo do tempo de formação de
um atleta, não encontra neste enquadramento o seu sustentáculo.
No CDPA o HP era gerido com base neste modelo pelo que era fundamental mudar o
esquema organizacional do departamento de HP.
A forma que se encontrou foi a de encontrar um mecanismo organizacional segundo
uma visão unitária do Clube e que assentava em princípios para a formação que tinha
como objectivo principal a alimentação da 1ª equipa.
Esse mecanismo teria de assentar numa perspectiva essencialmente técnica, daí que a
figura do coordenador técnico por si só e com uma acção de conjugação de actividades
entre as equipas seria o ponto de partida para uma mudança que levaria o Clube a
rendibilizar toda a sua actividade na formação.
É evidente que as funções e as formas de exercício da actividade do coordenador
foram evoluindo ao longo do tempo, numa perspectiva de melhoria de processos.
Tendo este ponto de partida reformulou-se o esquema organizativo do departamento
de Hóquei em Patins e partiu-se para os seguintes princípios:

Divisão do departamento de HP em dois níveis distintos nos objectivos


1ª – Iniciação/Formação (conceito mais restrito)
Onde o objectivo principal é a iniciação à patinagem e o ensino das técnicas
fundamentais do jogo.
Apontamos para 2 equipas em cada escalão dos Infantis tentando manter um
equilíbrio de aproximadamente 10 crianças por equipa.
Na transição para os iniciados, onde fazemos só uma equipa é feita a primeira
selecção.
2ª – Especialização – Juvenis/Juniores/Seniores
Na transição para os juvenis é feita uma segunda selecção que pretende ser mais
rigorosa. Nesta fase já teremos de ter elementos que nos garantam, que se houver
uma evolução normal, os jogadores terão potencial para integrarem a equipa sénior.
Tentamos aqui manter um equilíbrio de 10 jogadores por equipa.
Neste grupo de jogadores a selecção é constante e é neste grupo que tentamos
fazer recrutamentos exteriores, para equilibrar as equipas e assim corrigir os desvios
que o processo em si acarreta.

Figura 1

Seniores

Especialização Juniores Selecção constante


10 Jogadores 17 a 20 anos
Juvenis
15 e 16 anos
10 jogadores
2ª Selecção

Iniciados 1 equipa 13 e 14 anos


10 a 15 miúdos
1ª Selecção
Infantis A – 2 Equipas 20 a 25 11 e 12 anos
Iniciação / Formação crianças

Infantis B – 2 Equipas aprox. 20 9 e 10 anos


crianças

Iniciação à patinagem e Infantis C (2/3 Até aos 8 anos


equipas) – Aprox. 20 a 30 crianças
No que diz respeito a treinadores e horas médias de prática em treino, sempre
condicionadas pela nossa exiguidade de espaço – são feitas semanalmente
distribuições de horas –, o esquema apresenta-se assim:

Figura 2

Seniores 1 treinador – Coordenador técnico

1 treinador
Juniores 1 Treinador – 4 a 6 horas de prática cap. condicionais
Juvenis

Iniciados
1 Treinador – 3 a 4 horas semanais
Infantis A1

Infantis A2
Infantis B1 2 treinadores – 3 a 4 horas semanais

Infantis B2

Iniciação/ Infantis C 1 treinador – actividade Sábado e Domingo (variável)

É evidente que ressalta que para se cumprir os objectivos de formação hoquista, a que
nos propomos, a interligação entre os treinadores das diferentes equipas tem de ser
total o que como facilmente se prevê, face à dimensão do departamento de HP, é algo
difícil.
Essa interligação será tanto mais facilitada quanto mais se cultivar o trabalho em
conjunto de escalões seguidos.
Paradoxalmente a exiguidade do espaço obriga a esse trabalho em conjunto e
seguido, assim como o facto de um treinador ser responsável por duas equipas de
escalões seguidos.
Como a figura 2 indica, recentemente entendemos complementar o treino das
equipas do nível de especialização com a intervenção de um responsável pelo treino
das capacidades condicionais – intervenção essa que pretendemos num futuro
próximo alargar ao nível da formação.
Face ao objectivo último – integração de atletas na equipa sénior- cada vez mais
necessitamos de atingir níveis de capacidades físicas superiores relativamente à
respectiva categoria do nível de especialização
É uma área do treino do Hóquei em Patins que pretendemos aprofundar.
A coordenação técnica resume-se assim a implementar a operacionalidade dos treinos,
distribuindo horas semanalmente e fomentando a discussão e a colaboração entre os
diferentes treinadores que sabem que têm como objectivo o aperfeiçoamento e
evolução dos seus jogadores para um fim que é alimentação da 1ª equipa, e que para
tal têm a autoridade para nos momentos de selecção decidirem quem deve passar à
fase seguinte.
De referir que chegámos à conclusão que o treinador da equipa sénior face já à
complexidade da estrutura e face às suas responsabilidades directas na equipa sénior,
não pode assumir a coordenação total, pelo que vamos adoptar um modelo de dois
coordenadores um para o nível da especialização, que será o treinador principal, e o
outro para o nível da formação que será o treinador dos iniciados.
A operacionalidade diária será definida por estas duas figuras.
Um aspecto importante desta estrutura e que resulta desta proximidade entre
treinadores é a possibilidade de os jogadores circularem pelo escalão imediatamente
superior (capacidade permitida pelos regulamentos da modalidade) o que tem como
consequência directa uma motivação especial para os jovens que vão jogar no escalão
etário superior.
No entanto esta prática não pode ser feita sem critério uma vez que o
jogador/criança em causa não deverá ser afastado da sua equipa original assim como
deverá participar em jogos onde realmente possa jogar, visto que isso poderá provocar
desmotivação se o jogador/criança sentir que só precisam dele para “tapar buracos”.
Resultam na nossa perspectiva, duas consequências indirectas desta prática
importantes para o Clube:
1ª – Identificação dos jogadores com os companheiros mais velhos e mais
novos, seus hábitos e o seu enquadramento específico, não resumindo o seu
leque de amigos no Clube à equipa, o que facilitará toda a actividade futura
dos jogadores ao serviço do Clube nas suas variadas formas.
2ª – Fomento e consolidação da identidade e cultura do Clube nos seus
jogadores que sentem que o principal objectivo da actividade do Clube é
potenciar as suas capacidades.
IV. Dificuldades sentidas

Pretende-se nesta parte final, transmitir as dificuldades sentidas no quotidiano


subjacentes à organização atrás descrita.
Dificuldades que se traduzem em algumas falhas decorrentes de adaptações
horárias no que aos treinos diz respeito, assim como em virtude do grande volume de
jogos e havendo em média 1 treinador para duas equipas, muitas situações de conflito
de jogos surgem, tanto mais que os jogos também são alterados, o que implica o
acompanhamento diário destas situações.
Nestas situações muitas vezes outro treinador do Clube vai orientar o jogo de outra
equipa que não a sua, uma vez que o respectivo treinador está ocupado com o jogo da
outra sua equipa.
Se por um lado isso não é negativo, pois a equipa tem a experiência de ser
orientada por outro treinador que até participa ocasionalmente nos seus treinos, se o
processo se torna constante passa a verificar-se o perigo de a equipa se desligar do
seu treinador e de os miúdos se sentirem desacompanhados, pelo que terá de haver
equilíbrio na gestão dessas situações.
Como facilmente se depreende ao coordenador técnico que também é o responsável
pela 1ª equipa torna-se impossível gerir estas situações que diariamente ocorrem. Daí
a nossa opção atrás referida, de criarmos a figura do coordenador da actividade para
área da iniciação/formação, face à incapacidade de resposta verificada, o que originou
constantes adaptações de última hora com os consequentes gastos de recursos.
Por último não queria deixar de referir o conflito que a filosofia que suporta esta
organização origina na nossa vivência diária uma vez que a nossa modalidade de
Hóquei em Patins está agarrada a um conceito que consideramos já ultrapassado, onde
só se reconhece os agentes que ganham. Esta forma de pensar e analisar na nossa
modalidade condiciona o trabalho técnico uma vez que num enquadramento onde o
ganhar ou não no fim-de-semana, avalia positivamente ou negativamente o treinador,
o que leva a que se privilegie a táctica colectiva em categorias inferiores em
detrimento da valorização do conteúdo técnico – técnica individual e táctica individual
– que demora o seu tempo adquirir mas que suportará prestações de alto nível no
futuro.

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