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O LIVRO, LIVRE

Roberto Pontual

(publicado originalmente na Revista de Cultura Vozes, vol. 65, n. 3, abr. 1971, p.25-38)

Em qualquer setor, em qualquer momento, há sempre os que, embora minoria,


não se conformam em apenas usar a uso: contestando-o, criam.
Buscam assim novas estruturas e processos para fixar o que vêem e como vêem
o mundo, dê modo à que o registro da realidade não se reduza à ordem
estabelecida péla primeira conquista. O novo é o avanço de recomeçar, em nível
de transformação do existente. Sendo o ato de transformar um dado inevitável
na atividade humana, em que circunstâncias poderíamos detectá-lo nesse
campo já tão sedimentado —o do livro, e sua correspondente leitura — na
tradição chamada ocidental?

Quando dizemos livro, e quando acrescentamos leitura, a imagem que se forma em


nós cabe genericamente na mesma configuração: um objeto de dimensões e aspecto
distintos até certo limite, cujo cerne é constituído, de modo fundamental, pela
disposição das letras, números ou palavras (às vezes entremeadas com ilustrações)
segundo um método mais ou menos linear de linha sucedendo linha e página
sucedendo página. Um mesmo antigo encaminhamento de nosso olhar sobre essas
superfícies cobertas de convenções verbais e gráficas: descendo pelas camadas de
degraus que são as linhas (interrompidas de súbito no ponto inferior extremo), até
retomar o topo como reinicio dê idêntico movimento, avançando no acumulo de
tempo sem fundar verdadeiramente novos espaços.
Assim tem sido o livro — depósito da realidade e veiculo possível de sua reformuladora
transmissão — ao longo daquilo que, em cerca de cinco milênios, mereceria
denominar-se sua própria evolução. De origens orientais e aproveitando alguma
variedade de suportes — cascas de árvore, folhas de palmeira, módulos de argila,
superfícies de madeira polida, de seda, de papel ou papiro — manteve-se ele no
Ocidente, a partir do surgimento do pergaminho e da substituição do rolo de papiro
pelo códice pergamináceo, ao abrir-se a era cristã, com poucas modificações essenciais
na sua natureza e nos seus objetives, conhecendo apenas, como indicou Charles
Samaran, novos recursos de rapidez de execução, que lhe forneceram possibilidades
sempre maiores de multiplicar-se e de difundisse como objeto de uso comum. António
Houaiss, em seus Elementos de Bibliologia, registra a resistência dessa estrutura
(secularmente aperfeiçoada por requintes artesanais e técnicos) desde os primeiros
tempos da difusão do pergaminho: “Comportava o corte em formato igual, e as
folhas, reunirás por um lado, originavam cadernos, que, reunidos, davam o livro
quadrado ou oblongo de dimensões práticas, cômodo para o manuseio, folheável,
consultávél em passagens várias com o mínimo de esforço e fechável
instantaneamente, com proteção excelente. Estava achado o formato e a estrutura do
livro que subsiste até hoje”. Formato e estrutura a tal ponto resistentes como tradição
que, mesmo quando analisamos as ainda reduzidas tentativas de sua superação
através de novas fórmulas, terminamos geralmente percebendo a permanência mais
ou menos .intacta do que todos poderiam reconhecer como sendo o livro, na sua
velha (embora não por completo envelhecida) normalidade. Por enquanto, mais do
que o próprio livro é a leitura que está se transformando, em busca de absorver os
sistemas específicos da existência e da comunicação no mundo contemporâneo — e a
nossa leitura cotidiana desse mundo já se afastou enormemente da reduzida gama de
métodos tradicionais fixados pelos séculos de livro: basta ver como lemos, na rapidez
da passagem de um ônibus, os grandes cartazes -de imagem e texto multiplicados nos
muros da cidade, ou como lemos (e ao mesmo tempo ouvimos) um vídeo de televisão.
Semelhantemente a qualquer outro produto do fazer humano, o livro e a leitura são
dados culturais, correspondendo, assim, aos módulos de cada época; modificam-se,
também, entre vagarosa e aceleradamente. Bem resumiu Apollinaire as molas dessa
modificação em nossa época, no sentido da substituição da lógica do discurso pela
analogia da montagem:“É preciso que nossa inteligência se habitue a compreender
sintético-ideográficamente ao invés de analítico-discursivamente”.
Nos vários itens que agora irão aqui se sucedendo tentarei, como ponto de partida
para futuros aprofundamentos teóricos e de pesquisa, interligar alguns elos de uma
corrente pouco a pouco mais evidenciada, firme e múltipla na prospecção da
atualidade: aquela que procura a descoberta de novos elementos e processos, de toda
espécie, capazes de libertar o livro e a leitura de seus limites físicos, formais e técnicos
fixados há e durante tantos séculos. Serão anotações às vezes sumárias, simples
tópicos com o propósito de levantar e aguçar problemas: uma montagem de
multifacetados aspectos do que caberia chamar de “o livro livrando-se do livro”.

1. Se a célula do livro, como depósito e veiculo verbal, é a palavra, e se o


relacionamento desta com o espaço em branco da página ou com outras palavras em
proximidade relativa é subtraído dos antigos cânones da seqüência linear (palavra
sucedendo palavra numa linha, e linhas superpondo-se regularmente no âmbito
neutralizado da página r— o que serve a exigências da fórmula lógico-discursiva de
apreensão e transmissão do mundo), evidentemente a sistemática da leitura
experimentará mudanças. O caso da poesia figurada — imagens surgindo pelo
desenho com ou em palavras — é típico e, por sua incidência nas mais diferentes
épocas, vale também como demonstração dê que as pesquisas mais radicais da
atualidade conservam suas bases ou sementes nó passado. Exemplos de associação do
verbal com o visual, obtendo-se com isto um novo antigo instrumento de linguagem,
podem ser encontrados — como provou o italiano Renato Mucci em um ensaio
traduzido entre nós no início da década de 1960, ou como sistematizou Michel Butor,
sob ângulo diverso, no seu recente livro Les Mots dans la Peinture — desde tempos
anteriores à era cristã (a Flauta, as Asas e o Ovo, de Teócrito a primeira e de Símias de
Rodes as duas últimas) até os calligrames (ou “ideogramas líricos”) de Apollinaire, o
poema Visão e Prece (com seis“estrofes” em forma de losango e seis outras unindo
dois triângulos pelo vértice, a lembrar simbolicamente morte e ressurreição, sístole e
diástole) de Dylan Thomas e algumas pinturas integradas com palavras de Miro,
Magritte, Picabia, etc., para não referir ainda as pesquisas de maior atualidade. Dedo
Pignatari, em texto de 1960 a respeito, comentava: “ovo, de Símias, porém, é mais do
que um simples poema em forma de: sendo um dos primeiros poemas figurados
ocidentais que se conhecem, é também o primeiro poema simultaneísta, uma vez que
o 1º verso é a primeira linha; o 2º, a última linha; o 3º, a segunda linha; o 4º, a
antepenúltima — e assim por diante, até a linha final (central), que acelera as múltiplas
medidas do canto’ “. Portanto, aí também uma pequena, mas significativa mudança
no sistema convencional de leitura.
Voltando a Mucci, agrupava ele, em seu ensaio entre os limites do antigo e do atual,
numa seqüência do passado para o presente, poemas figurados do latino Pu-blilio
Ottaziano Porfirio, do gramático napolitano Eugênio Vulgario (a pirâmide encomiástica,
de difícil densidade simbólica e metafísica, como um cristal construído apenas de
letras), de Rabelais (o preciso poema em forma de garrafa apoiada sobre uma mesa, e
cujo reflexo é a repetição dos versos que constituem seu próprio gargalo no topo dá
imagem:“O Bouteille / Pleine toute / De mysteres, / D'une aureille / Je t´escoute / Ne
differes”), do francês Robert Angot de l´Espéronière (com seu espantoso Alaúde,
poema minuciosamente desenhado em conjuntos de letras e palavras), de Mallarmé,
de Corrado Govoni, de Marinetti, de Ardengo Soffici e de Iliazd, este último
interessado especialmente em abrir para a letra do alfabeto um conteúdo poético
através do aproveitamento de sua configuração gráfica e disposição tipográfica.
Ocorre um dado básico a salientar em toda a apresentada seqüência, no sentido da
fundação de uma leitura não-convencional e, portanto, da presença de uma semente
para a superação dos limites tradicionalmente fixados como sendo os do livro: é que
em cada um desses exemplos as relações de duas entidades físicas — as formas das
letras compondo palavras e a superfície bidimensional da página — se transferem para
um esquema integrador que prenuncia nova espaciotemporalidade. Seus autores
agiram com base na constatação de que existe um espaço sobre o qual (ou no qual)
são dispostas as letras e as palavras, e que esse espaço-página, antes apenas suporte
— uma passividade, neutra e silenciosamente receptiva — poderia também dizer e
significar alguma coisa, de modo muito direto. Como formularam os nossos poetas
concretos: “interpenetração orgânica de tempo e espaço”.

2. Ao publicar, em 1897, o seu poema Un Coup de Dès, Stéphane Mallarmé


colocou-se como ponto-encruzilhada em todo o longo processo de desenvolvimento
da linguagem verbal, situando-se também como desafiador dos sistemas tradicionais
de ler e da concepção secularmente inamovível do livro. Tinha ele consciência dessa
situação-limite, pois indicava no prefácio da primeira versão do mesmo poema: “sem
presumir do futuro o que sairá daqui, nada ou quase urna arte”. Un Coup de Dès,
além dê aproveitar os recursos da diversidade tipográfica e da disposição de cada
unidade-linha no branco da página, rompe, mais importantemente, com o esquema da
leitura linha-a-linha ao incorporar como elemento de fundamental significação para a
totalidade do poema o próprio movimento de transpor e aglutinar suas páginas.
Assim, o tema básico (“um lance de dados jamais abolirá o acaso”) e seus temas
secundários e paralelos só se completam pelo recurso a diferentes tipos dê letras, pela
disposição relativa na página (ou folha, como soma de duas páginas abertas) e,
sobretudo, pela passagem sucessiva das páginas (o gesto de avançar fisicamente ao
longo do poema torna-se de súbito significativo). Quatro páginas combinam, em um
conjunto todo inter-relacionado de vinte-e-uma, as quatro unidades do tema central
(un coup de dès / jamais / n´ abolira le hasard), enquanto em apenas três outras (na
verdade, uma página de numeração ímpar e uma nova espécie de folha, formada pelas
páginas par e ímpar seguintes) se desenvolve o primeiro tema secundário (si / c'était /
le nombre / ce serait, sendo que o segundo e o último desses quatro elementos
pertencem a uma mesma página) a primeira da folha em questão), e assim por diante.
Observe-se, igualmente, a importância dada ao branco da página, como armazenagem
e dínamo de silêncio e duração no tempo emergindo do espaço: logo após a direta
abertura do poema, com a impressão exclusiva de un coup de dés no quase centro
vertical da página (e horizontalmente centralizada), o branco absoluto da página
seguinte e os dois-terços de branco da que a esta de imediato se segue atuam como
um espaço assim capaz de fala, retirado de sua isenta mudez de antes, preparando—
na densidade de uma área de silêncio visual, que deixa de ser silêncio ao fixar-se como
ponte necessária de passagem do tempo entre dois pontos em tensão, elos gêmeos de
uma corrente — a perfeita entrada, como em música, do segundo lance de seu
desdobramento: jamais, exato e agudo no seu espaço; e n´abolira será forma
novamente isolada em página vindoura, situando-se agora à feição de grave acorde no
seu extremo inferior esquerdo. No poema, com o avanço e á fusão de célula a célula,
funda-se um novo tempo, a ele apenas pertencente e não, como em geral, tomado de
empréstimo ao nosso ,tempo comum objetivo ou subjetivo; e esse tempo se constrói
pelo exercício de um espaço específico, ao qual, no dizer de Maurice Blanchot,
Mallarmé restituiu a profundidade: “Uma frase não se satisfaz com o desenvolver-se de
uma maneira linear; ela se abre, e através dessa abertura se sobrepõem, se desligam,
se afastam e se aproximam, em profundidades de diferentes níveis, outros movimentos
de frases, outros ritmos de palavras, que mantêm entre si ligações segundo firmes
elaborações estruturais, embora desconhecidas da lógica comum, lógica de
subordinação, que destrói o espaço e uniformiza o movimento. Mallarmé é o único
escritor que se pode considerar profundo”. Não metaforicamente, mas porque sua fala
pressupõe um espaço de inúmeras dimensões. Essas “subdivisões prismáticas da Idéia”
— nas palavras empregadas por Mallarmé para definir seu método de composição,
que o levou, com o poema de 1897, a romper o rígido sentido linear único da leitura
— conduzem inevitavelmente a uma ligação com a música, na tendência à síntese das
artes tão freqüente no século XX; Mallarmé mesmo o indicava, prefaciando-se: “Tudo
se passa, por resumo, em hipótese; evita-se o discurso. Acrescentar que desse
emprego a nu do pensamento, com retiradas, prolongamentos, fugas, ou seu próprio
desenho, resulta, para quem queira ler em voz alta, uma partitura”. (Vejo-me
associando a frase “ou seu próprio desenho” com as tentativas de fotografar fluxos
mentais —o espaço do pensamento se desenovelando — que marcaram os objetivos
básicos do Ulysses e do Finnegans Wake, de Joyce, retomados e aprofundados em
filmes como L'Année Dernière à Marienbad, de Resnais, entre alguns outros).
Cinqüenta e seis anos mais tarde, em 1953, Augusto de Campos produziria sua série
poetamenos, visando a uma “melodiadetimbres” com palavras, segundo um processo
weberniano: a composição se obtinha pelo uso de diferentes cores indicativas de vozes
na escritura de cada poema.

3 • Hugh Kenner enfatiza, em The Poetry of Ezra Pound, que “a fragmentação da


idéia estética em imagens alotrópicas, tal como teorizada pela primeira vez por
Mallarmé, foi uma descoberta cuja importância para o artista corresponde à da fissão
nuclear para o físico”. Mas a encruzilhada assumida pelo poeta francês prolonga-se
ainda em outro nível, de difícil penetração em vista de suas tinturas esotéricas e do
pouco estudo que até hoje tem merecido: o da busca essencial do Livro também
essencial. Busca . apenas esboçada (embora fonte dê meditar prolongado, que Un
Coup de Dès em parte concretiza) em notas e fragmentos reunidos numa publicação
póstuma, ao final da década de 1950. O que seria esse ainda misterioso Livro?
Sobretudo, uma tentativa de eliminar intermediários entre o viver e o registrar a vida,
exatamente por registrá-la de modo ininterrupto e integral, como se no seu corpo
infinito se procurasse dominar e abolir o acaso no momento em que a linguagem, pelo
emprego de todas as. suas potencialidades e pela redução de todas as coisas reais a
ela própria, alcança estabelecer o exclusivo“conjunto de relações existente no todo”.
Obra na qual, ao longo de sua realização, o autor se subtrai, desaparecendo: “Creio
tudo isso escrito na natureza, de tal modo que não o vêem apenas os que estão
interessados em nada ver. Essa obra existe, todos já a experimentaram sem o saber”. E
o leitor, nela, passaria a atuar como “operador”, tomando-se esta ultima palavra
inclusive em sua acepção clínica, de ato cirúrgico.
(Como deixar de descobrir liames entre essa busca do Livro mallarmaico — integral,
essencial e infinitamente aberto ao acúmulo de camadas de novos significados — com
certas pesquisas atuais no campo que recebeu o rótulo muito genérico de “arte
conceitual”? Lá estão, em catálogos-documentos como Information, de 1970, os
diversos exemplos em que a vida, por seu direto registro ou por sua simples própria
prática, constitui a arte: Carl Andre reúne palavras em sistemas sempre acrescentáveis,
Siah Armajani busca um número entre zero e um preenchendo com zeros 25974
páginas, Victor Burgin emaranha ao infinito fatos e idéias com outras idéias e fatos, On
Kawara quer um milhão de anos para conter toda a informação da humanidade sobre
a Terra, Stephen Kaltenbach lança a palavra-de-ordem “expose your self”. Ou, em
número recente da revista Studio International, o ponto marcado sobre a página por
Douglas Huebler com a legenda abaixo dinamizadora: “O ponto representado acima,
exatamente no instante em que é percebido começa a expandir-se em todas as
direções, no sentido da infinidade: continua a expandir-se, à velocidade da luz, ao
longo de todo o tempo em que estas palavras estiverem sendo lidas, mas retorna à sua
essência original instantaneamente após a leitura da última palavra”. Ou, ainda e sem
fim, o livro dê folhas metálicas proposto por Thereza Simões, como um who's who de
nossos reflexos substituíveis folheando aquelas páginas).
Blanchot indica que o Livro tem por cerne o acordo entre os contrários da quase
superposição “da leitura como visão e da visão como transparência lisível”, enquanto
Mallarmé chamava atenção para o caráter “arquitetural e premeditado” desse projeto
de obra essencial, sempre se fazendo, sempre não completada. Constituído —
segundo as notas e fragmentos publicados postumamente — de folhas em absoluta
mobilidade, sem posição relativa definida e definitiva no conjunto, o Livro permanece
(ou permaneceria) de uma vez por todas re-factível, permutatóriamente re-componivel
ao livre exercício de vontade e imaginação de cada um que o viesse a operar. Nele,
começo e fim ocupariam ao mesmo tempo situação de fim e começo, por um
movimento circular ao longo do qual todo ponto tornar-se sempre posicionalmente
relativo.
(A leitura do romance Finnegans Wake, publicado por Joyce em 1939, pôde ser
iniciada a partir de qualquer elemento de qualquer uma de suas páginas, numa
estrutura que se traduz em circulo, confirmada aliás pelo fato de que o livro começa
no meio de uma frase e se encerra em meio a outra, relacionável à primeira. E Júlio
Cortázar, no seu Rayuela, de 1968, fornece um “tabuleiro de direção” que transforma
o livro fundamentalmente em dois outros nele contidos: “O primeiro livro deixa-se ler
na forma corrente e termina no capítulo 56, ao término do qual aparecem três vistosas
estrelinhas que equivalem à palavra Fim. Assim, o leitor prescindirá sem remorsos do
que virá depois. O segundo livro deixa-se ler começando pelo capítulo 73 e continua,
depois, de acordo com a ordem indicada no final de cada capítulo”. Na verdade, por
essa aparente irreverência em relação ao sentido obrigatório da leitura, não apenas
dois, porém incontáveis livros pulsam no corpo daquele que surge como inicialmente
único).
Esse projeto de livro essencial foi estudado longamente por Maurice Blanchot no texto
traduzido entre nós sob o título de “O Livro e O Livro de Mallarmé”. Ali, Un Coup de
Dés é situado, não como a própria concretização do Livro, mas como “sua reserva e
presença sempre dissimulada, o risco de sua aposta”. E Blanchot concluía: “Un Coup
de Dés prenuncia um livro bem diverso do livro que ainda é o nosso: deixa entrever
que aquilo por nós denominado de livro, segundo a fórmula da tradição ocidental,
onde o olhar identifica o processo de compreensão com o repetitivo vaivém linear,
justifica-se apenas pela facilidade da apreensão analítica. No fundo, precisamos nos
certificar de que possuímos os livros mais pobres que se podem conceber;
continuamos a ler, após alguns milênios, como se estivéssemos permanentemente
aprendendo a ler”.

4. A inquietude de E. E. Cummings, em poemas escritos desde a década de 1920,


situa-o igualmente como um dos pesquisadores da nova leitura. Suas desintegrações
da palavra, seus jogos funcionais com as letras (sempre capazes de significar alguma
coisa), seu aproveitamento orgânico do espaço em branco da página e toda uma
variedade de outros recursos para quebrar a linearidade da tradição, terminam por
levá-lo a criar novos níveis de percepção no interior è através do poema, inclusive uma
constante simultaneidade de camadas de tempo emergindo do espaço reativado da
página.

5. Salto à frente: estamos agora na segunda metade dá década de 1950. Cumpridas


as previsões de Apollinaire, em L'Esprit Nouveau et les Poetes (1918) — “Os artifícios
tipográficos levados muito longe com uma grande audácia têm a vantagem de gerar
um lirismo visual quase desconhecido antes de nossa época. Esses artifícios podem ir
muito mais longe ainda e consumar a síntese das artes, da música, da pintura e da
literatura. Há nisto apenas uma pesquisa para alcançar novas expressões perfeitamente
legítimas” encontramos então, entre nós, os poetas do movimento concreta buscando
aprofundar suas primeiras formulações. As próprias exigências evolutivas do poema
concreto indicavam o encaminhamento no sentido de absorver a dose integral de
possibilidades abertas pelo manuseio significante das páginas (várias páginas já
estavam muitas vezes concentradas na página única desses poemas, por sua precisa
condensação de linguagem verbovisual), bastante além do puro emprego preliminar
dos artifícios tipográficos. Alguma coisa de um novo livro passara a integrar desde
cedo o poema concreto, .porque neste a leitura se fazia rompendo os antigos limites
unidirecionais — linha a linha, vaivém, sempre em frente — é a impotência imposta ao
suporte — a página calada.
É de 1958 o LIFE de Décio Pignatari. Um poema em fluxo: já a necessidade,
organicamente associada à composição do conjunto, de contar com a passagem e a
superposição das páginas. Aproveitando uma propriedade física comum às letras
daquela palavra (a mondrianesca redução a módulos de verticalidade e horizontalidade
è o acréscimo sucessivo de uni módulo na seqüência subvertida de uma para a outra
— ILFE), Pignatari monta o poema em busca de dois movimentos-ritmos fundamentais
à vida (è ao próprio poema): o de sístole/diástole e o de infinita continuidade no tempo
somado ao espaço. Dois anos mais tarde ele publica Organismo, onde o dispositivo
verbal torna-se pouco a pouco visual pelo mergulho do macro ao microscópico, como
se a potência crescente dó olhar através de lentes fosse ampliando um ponto na
palavra “organismo”, inicialmente na frase, depois reduzida a si própria, em seguida
desferindo nova possibilidade de sua estrutura (“orgasm”), até restringir-se ao
fundamental: o, e o branco que subsiste no interior dessa letra-imagem. Menos livro
do que os dois poemas antes focalizados, a stèle pour vivre n. 3 (estrela cubana), que
Pignatari criou em 1962, participa ainda assim da leitura fundada em simultaneidade
de níveis, aqui com um retorno ao emprego de recursos tipográficos como fórmula
básica de montagem do poema, para manter e dinamizar a violência de seus
propósitos satírico-críticos. (Nele, a interrupção sincopada das linhas de significado, de
modo a que se somem outras linhas interrompidas de significados adjetivantes, me
conduz a uma associação, embora distanciada, com os parêntesis utilizados por
Faulkner (v.g., A Fable) para mergulhar nas camadas da realidade através de sua
narrativa de respiração ofegante).
A antologia do verso à poesia .concreta, que constitui O nº 5 da revista Noigandres,
mostra como os outros componentes do grupo, concreto também se preocuparam em
pesquisar um novo âmbito de liberdade para o livro aqui definido pelo sistema de
página acrescentando-se á página. Augusto de Campos (de quem já referimos a série
poetamenos, de 1953) aproveita a transparência do papel de seda para montar
conceitos intensificadores do bloco maciço formado só da palavra greve, na página
opaca seguinte (e é preciso não esquecer o seu poema-cartaz Cubagramma, de 1960-
2, como uma história de quadrinhos umbilicalmente interligados). Da mesma forma,
José Lino Grünewald (com Revolução, 1961) e Ronaldo Azeredo (com Choque, 1956,
e Portões Abrem, 1961).

6. No entanto, é com o movimento neo-concreto, oriundo da cisão do concretismo


em fins da década de 1950, que se intensificam as pesquisas de ruptura relativamente
ao livro tradicional. Ferreira Gullar logo criaria e definiria o termo livro-poema: “Chamo
de livro-poema (ou poema-livro) à tentativa de usar a página (o livro) como um
elemento interior ao poema. Nesta experiência, poema e livro não mantêm entre si
uma relação meramente circunstancial, mas estão de tal modo integrados que é
impossível distingui-los: poema e livro nascem num só e mesmo ato, uma vez que o
impulso que determina as palavras e sua posição na página determina também o
formato da página e os cortes (...) Essa participação tão íntima da página material na
expressão poderia induzir o leitor a pensar que nossa intenção é transformar o poema
em algo material, intranscendente, em objeto. Na verdade, segundo cremos, a palavra,
com seu peso, obriga a página a vencer o limite tátil, submerge-a na dimensão
temporal da linguagem. A página é pausa, duração, silêncio. Um silêncio verbal.
Cortando-a, justapondo-a, procuro tornar audível o lado mudo da linguagem, o seu
avesso”. E a Teoria do Não-Objeto — publicada pelo mesmo Gullar, em 1960, como
uma súmula das intenções comuns aos artistas plásticos e aos poetas do grupo
neoconcreto — viria completar e expandir a série de instrumentos de que muitos se
valeram (e permanecem valendo-se hoje em dia, na profundidade de um novo nível)
nessa busca de falar de acordo com a época e de assim compreender as estruturas
específicas dessa época.
Da I Exposição Neoconcreta (Rio, março de 1959) já participavam alguns livros
poemas, e nela Reynaldo Jardim apresentava a sua prosa com 96 páginas de um
science-fiction de palavras reduzidas à quantidade mínima e intensificadas, em
linguagem verbal e de visualidade, nos grandes brancos envolventes de cada unidade
de página ou folha. Na exposição seguinte (Rio, novembro-dezembro de 1960)
ampliavam-se as experiências nesse sentido; Reynaldo Jardim trazia o Livro Infinito,
procurando — em moldes muito próximos às intenções do Livro mallarmaico —
fundar uma estrutura sem começo nem fim, circularidade incessante, de modo a que a
leitura por ali se processasse como uma descoberta permanente de si própria,
integrando experiências de caráter verbal, óptico, cromático e rítmico — um “ballet
manual e abismal”, segundo o definiu Ferreira Gullar; este e Osmar Dilllon, por sua vez,
estavam presentes com diversos livros-poemas e não-objetos verbais — de Gullar,
entre outros, um cubo branco de madeira, em que se eliminou uma das faces,
permitindo ver que no seu interior foram encaixadas duas finas placas móveis em
sulcos laterais, igualmente brancas; retiradas ao mesmo tempo do cubo as duas placas,
e separando-se uma da outra, descobre-se numa delas escrita a palavra “pássaro”
nesse exato instante de deflagração da palavra como elemento verbal propriamente
dito, o cubo, as duas placas, todos os elementos plásticos associados ao gesto de
operá-los, adquirem uma significação nova, neles para sempre entranhada e deles
sempre dependente: cubo-gaiola, placas-asas, gesto de libertação ou de
aprisionamento.
Dillon intensificava o ludismo da participação do espectador-operador. Partindo de
livros-poemas como Murobranco — onde a manipulação, ao longo de seis páginas
transparentes, vai provocando sua perda, unidade por unidade, até que ao fim nada
mais resta dele a não ser o seu avesso — chegou a uma série de objetos constituídos
basicamente de palavra-visualidade-movimento: uma nova leitura do mundo, através
de uma nova linguagem, em balbucio. No objeto Ato, por exemplo, duas lâminas de
vidro, superpostas e móveis, e uma placa-suporte de madeira, continham cada qual
uma das três letras daquela palavra: o ato era do operador, quando girava as lâminas e
descobria formar-se a palavra do que ele próprio acabava de realizar.
Nova leitura do mundo era também o que propunha Lygia Pape, com seu Livro da
Criação. Aqui, aboliam-se as palavras: restavam apenas formas abertas à conjugação
nunca unidimensional de significados, a partir do olhar, do manuseio e da descoberta
de correspondências entre elas e os elementos da natureza (a água, o fogo) e da
história humana. Uma daquelas placas de formas móveis coloridas possibilitava
reconhecer a Terra no seu lugar do universo, como órbita junto a outras órbitas
girando em torno do grande Sol central. A criação do mundo e as invenções do
homem em seu percurso com e nele, latentes naquela seqüência sem ordem de placas,
éramos nós mesmos que de repente nos lançávamos a repeti-las, como se fôssemos os
primeiros a fazê-lo, com os materiais extremamente simples, mas infinitamente
capazes de aludir, que Lygia nos entregava. Ela própria assegurava: “A possibilidade de
anexar significados ao livro, pela contribuição do espectador, não lhe modifica o
sentido, pois o livro revela-se a cada pessoa único e primeiro”.
7. Lembro-me de haver apresentado dois trabalhos, integrando palavra, espaço e
movimento, na II Exposição Neoconcreta. Ambos pretendiam conduzir a uma nova
sistemática de leitura. Como suporte de um deles conseguira montar uma estrutura de
quatro placas de madeira, ligadas entre si por uma das arestas, formando portanto o
conjunto quatro ângulos retos; em cada placa, sobre um de seus lados, de modo a
manter-se a alternância de áreas verbalizadas e áreas de silêncio (o lado pintado de
preto), estava colado o papel branco contendo uma das quatro variações de um
poema com os elementos a e flor. Não havia, assim, ponto de começo ou ponto de
fim para a leitura, que se completava (mas nunca se encerrava) pela circulação do
espectador em torno do conjunto.
(Há poucos meses passados, voltei a tentar essa síntese do verbal com o visual,
aproveitando agora os recursos técnicos comuns à nossa época. A uma série de
quarenta slides, tirados durante o dia e a noite de uma viagem, acrescentei outros oito
em que, sobre fundo preto, as letras vão pouco a pouco formando, em paralelismo, as
palavras passagem/pensagem, à medida que, intercaladas às imagens, ambas as coisas
caminham para realizar-se. Todas as quarenta imagens estão paradas, só as palavras se
movimentam, em busca de sua conclusão imersa nas mesmas imagens).

8. Por volta de 1960, atuavam entre nós, além dos grupos concreto e neoconcreto,
outros grupos e pessoas mais ou menos ligados ao trabalho de romper com os
sistemas tradicionalmente seculares do livro e da leitura. Deles, os poegoespacialistas
sempre me pareceram os mais inventivos e radicais na criação de novas zonas de
pesquisa, apesar de hoje estarem encerrados em completo esquecimento. Tratava-se
de um grupo estranho, a ponto de eu acreditar, atualmente que muitos de seus
participantes (a quase totalidade dos que constavam como nomes nos catálogos), não
passavam de heterônimos de António Miranda (que, por sua vez, se assinava da,
nirham: eRos) e Carlos Alberto. Mas pelo menos eRos não era fantasma; ao contrário,
conheci-o bem como capaz da mais ininterrupta, exigente e múltipla criatividade.
Disponho de toda uma série de seus textos teóricos e projetos verbovisuais, entre os
últimos inclusive o Vate-mago (1961): conjunto de interessantíssimas pesquisas de
ludismo com a palavra ou a letra no espaço, acionadas pelo caráter simbolicamente
alusivo do movimento proposto em cada uma delas, com suas respectivas
conseqüências de linguagem. Há muita coisa ali oriunda do Livro Infinito de Reynaldo
Jardim, do Livro da Criação, de Lygia Pape, ou dos não-objetos verbais de Ferreira
Gullar e Osmar Dillon; no entanto, eRos levava o ludismo de seus processos em projeto
— acrescido do uso de variados materiais: papéis brancos, em cores, transparentes,
enrugados; papelões, metais, filmes velados ou cortiças — a um ponto de
inventividade tal que sua fala terminava bastante personalizada. Era, sobretudo, um
mágico (o não muito agradável título Vatemago revela sua consciência disto), tirando
de suas caixas da imaginação as surpresas quase infantis dó prazer de recriar as
palavras no mecanismo de novos espaços expressivos. Partindo da palavra inicialmente
percebida no seu todo — paginação, sobre a placa branca e ainda muda — a ação do
operador fazia nascer, de um lado a página, ao centro o objeto paginado (como um
foguete na sua plataforma de lançamento, pronto para o voo) e do outro lado à fonte
e resíduo de tudo: ação. Calendário abria-se subitamente em lendário palácio oriental
de papel de seda vermelho. Coberta passava a descoberta no momento em que se
puxava a área quadrada de filme velado cobrindo esta última. E tantos outros
ludopoemas visuais: campo intenso de ler diferente.
Daí meu assombro quando pude conhecer o Index, de Andy Warhol (que,
significativamente, coloca entre parêntesis o rótulo book, no frontispício dessa obra
publicada em 1967, nos EUA). Ali, algumas das soluções desenvolvidas por Warhol,
como exemplo excepcional de arte gráfica, aproximavam-se dos projetos esboçados
por eRos seis ou sete anos antes, no mesmo sentido de uma página-superfície que de
repente, por um passe de prestidigitação, se transforma em tridimensionalidade. Das
sucessivas páginas ou unidades do Index brotam (não mais de modo apenas figurado,
porém como surgimento real e concreto) pequenos aviões, castelos e cavaleiros
medievais, incômodos saltos de sólidos, latas (em papel) de suco de tomate, balões
infláveis de plástico, sanfonas vermelhas de som. O paralelismo de processos não
significa, evidentemente, que Warhol tenha conhecido e se apropriado das invenções
precedentes de eRos; significa, isto sim, que eRos, em um país subsidiário como o
nosso, inventou antes que o mesmo ocorresse, alguns anos mais tarde, no país de
cultura dominante. Assim, era como se em determinado momento tivéssemos deixado
de importar fórmulas fora fabricadas.

9. O movimento do poema-processo constitui outro vetor de interesse ao longo do


desdobramento desse tema. Surgido em fins de 1967, seu objetivo básico é o de
conduzir à “consciência exata de que o valor e o núcleo da invenção situam-se na
criação de novos processos (...) só é novo o que inaugura processos novos”. Suas
propostas teóricas e resultados práticos, especialmente no que se refere à síntese do
verbal com o visual e ao caráter de seriação muito comum em seus poemas, situam
este movimento na linhagem das pesquisas do concretismo e do neoconcretismo,
como uma tentativa de desenvolvê-las em nível agora correspondente às circunstâncias
de uma nova época. Cito, entre inúmeros outros, o poema branco X branco x branco
(1969), de Moacy Cirne, onde tudo pode ocorrer, pelo exercício de imaginar além da
presença da tridimensionalidade de efeitos escultóricos com as“dobraduras no espaço”
do papel absolutamente expressivo na isenção ativa de sua brancura.

10. Seria possível alinhar ainda uma multiplicidade de exemplos, suficientemente


atuais, aqui e no estrangeiro, nesse campo de busca de um novo livro como
conseqüência da disposição para uma nova leitura. Citando apenas ao acaso da
lembrança: em 1962 Allan Kaprow construiu, em uma galeria de New York, o
ambiente Words, formado de palavras, luzes e sons; vimos na última Bienal de São
Paulo, em 1969, ás superfícies cobertas de letras e textos do canadense Greg Curnoe;
na Bienal de Veneza de 1970 podia-se ler a morte em um ambiente todo montado
(paredes e teto de palavras morte, em várias línguas, cercando o espectador, e sons
para lembrá-la permanentemente:“John is dead, Mary is dead, Bill is dead”, sem
cessar) com o propósito de intensificar a presença e o sentido desta; o próprio Marshall
McLuhan importa muito na seqüência de tentativas para reformular leitura/livro: o seu
The Medium is the Massage (1967) e o mais recente Counterblast (no qual José Lino
Grünewald discerniu ligações com o Livro de Mallarmé) bem o provam.
Entre nós, haveria que registrar o livro de pura visualidade — formas nascendo e se
desdobrando no espaço, sem ò recurso às palavras, porém distante do caráter alusivo
do Livro da Criação de Lygia Pape — imaginado por Júlio Plaza e editado, com
requintes gráficos por Júlio Pacello; os objetos verbais de Márcio Sampaio e de José de
Arimatéia, em Minas Gerais; os exercícios tipográficos do também mineiro Sebastião G.
Nunes, especialmente no seu livro A Cidade de Deus (1970); o Mercado (1970), de
Eliane Zagury, como um poema de mobilidade incessante através da leitura
combinatória; o breve, mas inventivo livro de folhas soltas da pernambucana Katia
Mesel (um livroaberto: “pense dele o que quiser, faça com ele o que quiser”,
aleatoriamente); e os gibis também de pura visualidade, de Raimundo Collares. Nestes
últimos, os contrastes de cores e cortes estabelecem uma substância de harmônico
ludismo, como nos polivolumes de Mary Vieira. Virar uma a uma — gesto integrador
de tempo e espaço — suas páginas de apenas cor e distribuir todas as possibilidades
de novos conjuntos de planos, que os cortes oferecem em sucessivas surpresas de
muito mudar, é como retornar à essência de alguns brinquedos de infância é
aperfeiçoá-los pela procura do melhor equilíbrio de formas e cores. Se no Flicts, o livro-
poema de Ziraldo, cor e palavra se desdobravam unidas e mutuamente significantes,
os planos de papel em cor, emergindo e se sucedendo corte após corte na
espaciotemporalidade, constituem toda a mínima/múltipla linguagem desses livros de
Collares.

11. Cinco milênios de livro não bastam para que dele, enquanto suporte da leitura
e entidade física específica, quantitativamente nos afastássemos, de modo claro e
substancial. Salvo alguns exemplos de ruptura, mais ou menos drásticas, que a
contemporaneidade vai se encarregando de diversificar, o livro permanece hoje
fundamentalmente o mesmo; e é possível constatar que inclusive essas rupturas não
foram até aqui a permanente conseqüência extrema de negá-lo por completo,
instaurando um novo rumo de ver, anotar e transmitir o mundo. Tem-se a impressão
que o livro, preso a si próprio, está ficando para trás em relação à realidade que é a
nossa, de agora. Livrá-lo pode ser também tarefa.

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