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O Dicionário da Razão
Denis Diderot
Os livreiros estavam certos, só Diderot era capaz de pôr aquela catedral da razão em pé. Não só
em função das suas múltiplas habilidades e ciências, mas também por seu temperamento. Ele
era um dos raros homens de letras de Paris com quem todos se davam bem, inclusive o
mercurial Jean-Jacques Rousseau, que, conforme a idade avançava, mais paranóico ficava.
Afável, sincero, confiável, Diderot circulava com desenvoltura nos salões onde se criticava
abertamente o despotismo ao tempo em que mantinha uma assídua correspondência com
Catarina II da Rússia. Ingênuo, chegou a supor ganhar a musa do despotismo para a causa dos
filósofos. Quando em 1758 seu parceiro D'Alembert, um talentoso matemático e homem de
ciências, desistiu de continuar como co-responsável editorial, ele seguiu adiante sozinho até o
final. Não houve trovoada que o assustasse, nem ofensa que não respondesse, não existiu
ameaça que o encolhesse. A sua pena não tremia em dar o troco aos intermináveis inimigos da
publicação.
A Tempestade
Reunião dos colaboradores da Encyclopédie
Um Apoio Inesperado
Madame Pompadour, protetora dos filósofos
O partido dos filósofos, dos enciclopedistas, como eles passaram a ser chamados, contou com
um apoio inesperado. Madame Pompadour, a amante do rei, talvez por identificar-se com a
situação dos perseguidos, teceu os fios da sua apreciada proteção nos bastidores da câmara real
tolhendo as iniciativas dos fanáticos. Foi, dentro dos seus limites, a fada madrinha deles. O fato
do Parlamento de Paris ter aprovado a pena de morte, em certas circunstâncias, para os
escritores e livreiros era revelador da tensão a que o país e os seus homens de letras estavam
submetidos. Os tempos porém eram outros, os mecanismos da opressão não eram mais
eficazes. Além disso, Diderot juntara a nata da inteligência francesa para colaborar na
Encyclopédie. Era como se o melhor do espírito nacional em peso se sentasse à escrivaninha,
pegasse pena, tinta e papel, e começasse a completar os verbetes do dicionário. Portanto, não
era nada fácil reprimir os colaboradores ou hostilizá-los além da conta.
Não era apenas o partido dos devotos quem a injuriava. Na Academia Francesa, discursos
candentes jogaram a Encyclopédie às feras. Até o teatro, de resto tão liberal, se manifestou
contra. Na Commédie-Française, o comediógrafo Palissot, numa peça intitulada Philosophes, faz
Jean-Jacques Rousseau aparecer andando de quatro no chão. Voltaire, aquela altura quase um
sexagenário auto-exilado em Genebra, não deixava nada sem resposta. A cada asneira que os
devotos e os fanáticos publicavam, ele forrava a França com panfletos devastadores, mordazes,
na defesa de Diderot e dos militantes da razão. Na verdade, os livre pensadores, que formavam
o partido dos filósofos daquela época, viram no dicionário uma tribuna excepcional, pois graças
às subscrições numerosas eles atingiriam a elite pensante e governante do reino e também a
crescente classe burguesa ávida por informação técnica e científica.
Popularizar o conhecimento
Os Colaboradores
Barão de Montesquieu
Já se disse que o verdadeiro gênio de Diderot não foi conseguir publicar todos os 28 volumes da
Encyclopédie, mas congregar os estranhíssimos seres bizarros e esquisitos que são os homens
de letras e de ciências. Suportar-lhes durante mais de vinte anos as esquisitices, os atrasos, as
inconstâncias, as indecisões, as vaidades feridas e os melindres sem perder as estribeiras ou
enlouquecer. Feito digno de ensombrecer os trabalhos de Hércules. Além dos já citados Voltaire
e Rousseau, enriqueceram os verbetes os barões de Montesquieu e D'Holbach, o grande Buffon,
o cientista Helvetius, o gravador Papillon,
O naturalista Buffon
Dados Finais
Responsável-geral Denis Diderot e D'Alembert (até 1758)
Editor Le Breton
Anos de edição De 1751 até 1772
Número de volumes, artigos, páginas e palavras 17 de textos e 11 de ilustrações: 28 no
total/ 72 mil artigos/ 16.500 páginas/ 17 milhões de palavras
Total de colaboradores 140
Oposição Colocada no índex e proibida (1759)
Discurso Preliminar
Apesar da sua apreciável influência nas coisas do saber no Brasil e em Portugal, nunca houve
uma tradução da Encyclopédie para o português. Em parte isso se explica não só pela carência
de recursos e pela ativa censura dos padres e dos funcionários, mas também pelo fato da elite
intelectual luso-brasileira dominar o francês, em geral, com fluência. Só recentemente, isto é em
1989, a Editora Unesp (Universidade do Estado de São Paulo) providenciou a publicação bilingüe
do Discurso Preliminar e mais alguns outros textos encerrados numa obra de um só volume, no
qual Diderot e seu colega D'Alembert expõem nas cem páginas iniciais as diretrizes gerais da
magnífica obra.
3. Chegará por fim o tempo em que teremos livros de história descomprometidos com o
maravilhoso, o que sempre entreteve a nação numa feliz estupidez: haverá nesses livros a
imprudência de fazer justiça às boas e às más ações e de recomendar a equidade e o amor à
pátria, o que é visivelmente contrário aos nosso direitos locais.
4. Logo chegará a vez dos miseráveis filósofos que, sob pretextos especiosos, mas puníveis, irão
querer esclarecer o homem comum e tentar fazê-los melhores, ensinando-lhes virtudes
perigosas as quais o povo jamais deve tomar conhecimento.