O documento discute o símbolo do espelho como representando a contemplação espiritual e o conhecimento. O espelho reflete a união entre sujeito e objeto e também pode representar a mente que reflete o intelecto puro. Além disso, vários místicos usaram a metáfora do espelho para descrever a relação entre Deus e o homem, onde Deus é o espelho que reflete a alma e vice-versa.
Descrição original:
Livro, Titus Burckhardt, O Simbolismo Do Espelho, simbologia, tradicionalismo.
O documento discute o símbolo do espelho como representando a contemplação espiritual e o conhecimento. O espelho reflete a união entre sujeito e objeto e também pode representar a mente que reflete o intelecto puro. Além disso, vários místicos usaram a metáfora do espelho para descrever a relação entre Deus e o homem, onde Deus é o espelho que reflete a alma e vice-versa.
O documento discute o símbolo do espelho como representando a contemplação espiritual e o conhecimento. O espelho reflete a união entre sujeito e objeto e também pode representar a mente que reflete o intelecto puro. Além disso, vários místicos usaram a metáfora do espelho para descrever a relação entre Deus e o homem, onde Deus é o espelho que reflete a alma e vice-versa.
Do rico reservatrio de smbolos que so usados para expressar a mstica
das vrias religies do mundo, ns selecionamos aqui o smbolo do espelho, pois, melhor que qualquer outro, ele e adequado para expressar a essncia da mstica, e ao mesmo tempo seu carter essencialmente gnstico ou sapiente. O espelho o smbolo mais imediato da contemplao espiritual, e mesmo do conhecimento ('gnosis') em geral, porque ele retrata a unio de sujeito e objeto. Ao mesmo tempo este exemplo serve para demonstrar como os vrios significados de um smbolo, que se referem a muitos nveis diferentes da realidade e que podem parecer por vezes contraditrios, so internamente coerentes, e esto harmoniosamente, contidos no significado total da imagem, que puramente espiritual em si mesmo.
A multiplicidade de significados inerente prpria essncia de
um smbolo; e da advm sua vantagem sobre as definies racionais. Pois, enquanto a ltima organiza um conceito a partir de suas conexes racionais - assim fixando-o em um dado nvel - o smbolo, sem perder nada de sua preciso ou claridade, permanece "aberto ao superior"(1) . Ele acima de tudo uma "chave" de realidades supra-racionais.
Ao invs de "realidades supra-racionais" ns poderamos falar
igual, mente de "verdades supra-racionais", e enfatizamos este ponto, pois tem-se o costume de explicar o sirabolismo em termos puramente psicolgicos. No que uma interpretao psicolgica seja necessariamente errada era todos os casos, pois ela pode ser uma possibilidade. 0 que absolutamente falso e a viso que a origem do smbolo deve ser encontrada no assim chamado "inconsciente coletivo", em outros termos, em um substrato catico da alma humana. O contedo de um smbolo no e irracional, mas supra-racional, ou seja, puramente espiritual. Esta no e nenhuma tese no va, mas pertence cincia do simbolismo que est presente em toda tradio espiritual genuna.
Aqui nossa abordagem e puramente principiai : o simbolismo do
espelho to luminoso porque, em certo sentido, o espelho e o smbolo do smbolo. O simbolismo pode em verdade ser melhor descrito como reflexo de idias ou prottipos que no podem ser plenamente expressos em termos puramente conceituais. neste sentido que So Paulo diz: "Agora vemos em espelho e de maneira confusa, mas, depois, veremos face face. Agora o meu conhecimento limitado, mas, depois, conhecerei como sou conhecido." (I Cor. ,13, 12)
O que o espelho no qual o smbolo aparece como a imagem de um
prottipo eterno? Primeiro a imaginao, se estivermos pensando na natureza visual ou "plstica" do smbolo em contraste com os conceitos abstratos. Mas em um sentido mais amplo, a mente que, como faculdade de discriminao e conhecimento, reflete o Intelecto puro. Em uma abordagem ainda mais ampla, o Intelecto ele mesmo o espelho do divino Ser. Plotino diz do Intelecto ('Nous') que ele contempla o Um infinito, e dessa contemplao, que no pode jamais exaurir seu objeto, procede o mundo como uma imagem sempre imperfeita que pode ser comparada uma reflexo continuamente interrompida.
Ainda uma outra caracterstica da reflexo que, dependendo da
forma ou posio do espelho, o objeto aparece mais ou menos claramente. Isso tambm pode ser aplicado reflexo espiritual, e foi neste sentido que os mestres sufis disseram que Deus revela a Si mesmo ao Seu servo de acordo com a prontido ou capacidade de seu corao; Ele toma, por assim dizer, a forma do corao do Seu servo, assim como a gua toma a cor do copo que a contm.
Nessa correlao, o espelho do corao comparado lua, que,
dependendo de sua posio no espao, reflete de modo mais ou menos perfeito a luz do sol. A lua e a alma ('nafs'), que e iluminada pelo puro Esprito ('rh'), mas, estando ainda atrelada ao tempo, sua receptividade tem de sofrer mudanas ('talwn'). O processo de reflexo talvez a imagem mais perfeita do "processo" de conhecer, que no se limita ao nvel racional. 0 espelho o que ele reflete, na medida em que o reflete. Enquanto o corao - i.e, o Intelecto cognitivo - reflete a multiplicidade do mundo, ele o mundo, estando de acordo com o modo do mundo, especificamente com a ciso entre objeto e sujeito, entre exterior e interior. No entanto, medida que o espelho do corao reflete o Ser divino, ele precisamente o Ser, estando de acordo com o modo indiviso do puro Ser. Nesse mesmo sentido o Apstolo Paulo disse: "E ns todos que, com a face descoberta, refletimos como num espelho a Glria do Senhor, somos transformados nessa mesma imagem..." (II Cor.,3.18) Gostaramos agora de considerar o smbolo do espelho a partir de um outro ngulo. Rasar. al-Basr, um dos primeiros msticos do Isl, compara o mundo em sua relao com Deus imagem refletida do sol que produzida pela superfcie lisa da gua. Tudo que ns podemos conhecer da imagem refletida provm do objeto original mas este e completamente independente de seu reflexo, e est infinitamente acima e alm dele.
Para procurarmos entender essa comparao a partir da
"unicidade da existncia" ('vahdat al-wujud') - o conceito fundamental do mistiscismo islmico - preciso saber que a luz simboliza o Ser e conseqente mente a escurido simboliza o nada; visibilidade existncia e invisibilidade ausncia. Somente o que est refletido no espelho visvel. A presena do espelho s revelada pela natureza do reflexo e pela sua pura possibilidade. Em si mesmo, na ausncia de luz, o espelho invisvel, e isso significa, em concordncia com o significado da comparao, que em si mesmo ele no existe.
Disso para a doutrina hindu de maya apenas um passo; maya, o
poder divino em virtude do qual o Infinito manifesta a si mesmo no finito, cobrindo-se com o vu da iluso. A iluso consiste no fato da manifestao (i.e, reflexo) aparecer como algo existente fora da Unicidade Infinita, maya que d nascimento a isso; e maya, parte os reflexos que vm sobre ela, pura possibilidade ou funo do Infinito. Se o universo como um todo e o espelho de Deus, o homem, tambm o na sua natureza original, pois contm qualitativamente o universo inteiro, o espelho do Um. Nesse sentido, Mahyi'd-Dn ibn'Arabi (sec.XIII) escreve: "Por causa de suas inumerveis perfeies, Deus quis contemplar Sua prpria essncia em um objeto que abrangesse toda a realidade, para assim manifestar Seu prprio mistrio a Si mesmo...Pois o conhecimento que um ser tem dele prprio, em si mesmo, no e igual a conhecer-se atravs de outro, que lhe serve como espelho. Tal espelho mostra a ele mesmo na forma que corresponde ao 'plano de reflexo' no qual pousa seu olhar, uma forma que no existiria sem esse 'plano de reflexo' e o reflexo que dele resulta..."0 que o Ibn'Arabi tinha em mente e, por um lado, o "puro receptculo" da 'matria prima' ('al-gabil') e, por outro lado, Ado; 'matria prima' no sentido do espelho que ainda e escuro e no qual a luz no brilhou, enquanto que o Ado e "o verdadeiro brilho desse espelho e o esprito dessa forma" (Pusus al-Hikam, captulo sobre Ado).
O homem assim o espelho de Deus. A partir de um ponto de vista
mais esotrico, Deus o espelho do homem. A esse respeito, Ibn'Arabi escreve no mesmo trabalho: "O homem, para o qual a Essncia de Deus se oferece ao conhecimento, no v a Deus; ele apenas v sua prpria forma no espelho de Deus. No possvel que ele veja a Deus mesmo, apesar dele poder saber que s pode observar sua prpria forma n'Ele. Esse processo se d maneira de algum olhando em um espelho, vs olhais no o espelho em si, mesmo que saibas que s podeis olhar vossa prpria forma por causa do espelho. Deus mesmo proporcionou esse fenmeno como o melhor smbolo de Sua Auto-revelao, para que quem quer que receba tal revelao saiba que no pode ver Deus... Tentai por vs prprios, quando olhardes o reflexo em um espelho, e no poders ver o espelho em si; vs nunca o vers. Tanto isso verdade que algumas pessoas, observando essa lei da reflexo em espelhos [fsicos e espirituais] , tm afirmado que a forma refletida se interpe entre o espelho e o observador. E claro que tal no ocorre; na realidade e como acabamos de dizer [ou seja, que a forma refletida no se coloca entre ns e o espelho, no o esconde de ns; na verdade apenas graas ao espelho que nos podemos ver a forma nele refletida),.. Se vos apreendes isto [que a criatura em contemplao nunca v a Essncia mesma, mas apenas sua prpria forma no espelho da Essncia , apreendestes o limite extremo que a criatura pode alcanar; portanto no aspires por menos e no canses vossa alma buscando ultrapassar esse grau de modo 'objetivo') , pois em princpio e de fato no h nada alm, seno a pura nao-existncia a Essncia mesma sendo no-manifestada)". (Fusus al-Hikam, capitulo sobre Seth).
Na mesma linha, Meister Eckhart escreve: "A alma contempla a si
mesma no espelho da Divindade. Deus Ele mesmo o espelho, o qual Ele oculta de quem Ele quiser, e descobre para quem Ele quiser. Quanto mais a alma capaz de transcender todas as palavras, mais ela se aproxima do espelho. Nesse espelho a unio ocorre como pura e indivisa similitude.
O Sufi Suhrawardi de Aleppo (sc.XIII) escreve que o homem no
caminho para o Si primeiro descobre que o mundo inteiro est contido dentro dele, o sujeito cognitivo; ele v a si mesmo como o espelho no qual todos os prottipos aparecera como formas efmeras. Ento ele torna- se consciente de que ele mesmo no tem existncia; seu "Eu" desaparece como sujeito, e apenas Deus permanece como Sujeito de todo conhecimento. Muhyi'd-Din ibn'Arabi escreve adiante : "Deus e o espelho no qual olhais a vs mesmos e vs sois o espelho d'Ele no qual Ele contempla Seus Nomes. Estes no entanto so Ele, e e meramente uma questo de inverter a analogia das relaes.(Fusus al-Hikam, capitulo sobre Seth).
Seja Deus o espelho do homem ou seja o homem espelho de Deus,
em ambos os casos o espelho significa o sujeito cogniscente, que como tal no pode tambm ser o objeto do conhecimento. Isso s e verdade de modo absoluto quanto ao Sujeito Divino, a "Testemunha" ('Shahid') de todas as criaturas manifestadas; esse e o espelho infinito cuja "substncia" no pode ser apreendida de modo algum, mas no entanto pode ser dada a conhecer num certo sentido, porque e possvel ter-se o conhecimento de que apenas nela todas as criaturas podem ser conhecidas. Isso lana luz nas palavras, de outro modo obscuras, que Dante pe na boca de Ado. Referindo-se aos anseios de Dante, Ado fala:
"Perch'io la veggio nel verace speglio
Che fa di s pareglio all'altre cose, E nulla face lui di s pareglio."
(Eu a vejo no espelho verdadeiro
Que se torna o refletor de todas as coisas, E do qual nada pode tornar-se refletor.)
Paradise, XXVI, 106
Farid ad-Din'Attar diz:
"Venham, partculas errantes, voltem ao seu centro, e