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Dilemas do Nacionalismo

Paulo César Nascimento

Introdução centemente, em fins da década de 1980, a


mesma previsão foi feita por políticos e cien-
É difícil encontrar um fenômeno políti- tistas sociais, que viram no colapso da União
co que tenha influenciado tão decisivamente Soviética e no advento de uma economia
a história mundial dos últimos séculos como globalizada o fim do Estado-nação e dos
o nacionalismo. Propulsor do moderno siste- particularismos nacionais. E novamente
ma de Estados-nações, o nacionalismo é as- uma onda de movimentos nacionalistas e
sociado à transição das ordens dinásticas para guerras étnicas alastrou-se pelos territórios
sociedades baseadas na doutrina de soberania
da ex-URSS, Europa Central e África, reafir-
popular. Catalisador de guerras mundiais e
mando a centralidade do fenômeno nacio-
inúmeros conflitos regionais, é visto por
nalista no mundo contemporâneo.
muitos como uma ideologia chauvinista, an-
Não é surpreendente, então, que histo-
tidemocrática e xenófoba. Mas, por outro
lado, como a história recente da África e ou- riadores, sociólogos, antropólogos e cientis-
tras regiões atesta, o nacionalismo também tas políticos tenham escrito tantas obras so-
está associado a lutas de libertação contra o bre nacionalismo nas últimas décadas.
domínio colonial, servindo de inspiração Embora o fenômeno tenha recebido pouca
ideológica ao desenvolvimento socioeconô- atenção dos grandes pensadores da moder-
mico das nações recém-independentes. nidade – como Marx, Nietzsche, Weber,
Freqüentemente avaliado como fenô- Durkheim e Freud, desde os anos de 1950,
meno atávico, o nacionalismo tem demons- a literatura a respeito tornou-se tão diversifi-
trado enorme persistência histórica, reapare- cada que desafia qualquer esforço de síntese.
cendo ao longo do tempo em ondas Além disso, não existe qualquer consenso
imprevisíveis. Em 1848, Karl Marx previu acadêmico ou definição paradigmática do
no Manifesto Comunista o fim das nações, que seja nacionalismo. Os que têm se dedi-
que se estariam tornando anacrônicas devi- cado ao tema debatem se o nacionalismo é
do ao crescente processo de internacionali- antigo ou moderno, onde se originou e qual
zação do capitalismo. Mas foi exatamente o seu futuro. Divergem sobre o modo mais
nesse período – conhecido como a “prima- adequado de classificá-lo, se sua essência é
vera das nações” – que o nacionalismo con- democrática ou autoritária, ou então se o
quistou corações e mentes no continente eu- nacionalismo é construção das elites ou ma-
ropeu, superando lealdades baseadas em nifestação de elementos primordiais das co-
identidades de classe e regionais. Mais re- munidades humanas.

BIB, São Paulo, nº 56, 2º semestre de 2003, pp. 33-53 33


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Este artigo analisa os principais debates interpretaram e definiram as ligações entre


existentes na literatura acadêmica sobre na- Estado, nação e nacionalismo, e a que expe-
cionalismo. Discute os diferentes argumen- riências históricas recorreram.
tos que se formaram em torno de cada polê- Uma das definições mais aceita é a de
mica, remetendo-os às obras e autores mais Ernest Gellner, cuja obra teve enorme im-
relevantes. A revisão dos debates foi dividida pacto tanto na academia como entre líderes
em três eixos principais: a confusão concei- políticos.1 Gellner (1983, p. 1) define nacio-
tual entre Estado e nação, a dicotomia pri- nalismo como o “princípio político que ad-
mordialismo versus modernidade, e a dife- voga a congruência entre Estado e Nação”.
rença entre nacionalismo étnico e cívico. A idéia que move o nacionalismo seria a
Como conclusão, o artigo aborda as idéias criação de um Estado que exercesse autori-
de alguns autores sobre como encaminhar os dade sobre a nação, entendida como um
estudos do nacionalismo. grupo humano que compartilha da mesma
cultura. Essa formulação é teoricamente cla-
ra e historicamente plausível, já que grande
A Confusão Conceitual parte dos movimentos nacionalistas reivin-
entre Estado e Nação dicou um Estado para suas nações. Esse foi
o caso, por exemplo, de muitos países da
Segundo Hannah Arendt (1972), cada Europa ocidental. Mesmo ali, contudo, cer-
conceito reflete uma experiência humana es- tos autores lembram que a definição de
pecífica. A democracia, por exemplo, é um Gellner deixa de fora outras manifestações
conceito derivado da experiência política da de nacionalismo, como a dos flamengos, es-
antiga pólis ateniense, mas que se materiali- coceses, catalães, bascos e outros, que não
zou em múltiplas variantes ao longo de seu buscam necessariamente um Estado inde-
desenvolvimento histórico. Através do estu- pendente, mas várias formas de autonomia
do dos conceitos é possível traçar a demo- política em relação ao poder central. Além
cracia até sua experiência de origem, apon- disso, manifestações nacionalistas conti-
tar diferenças e semelhanças com sua nuam ocorrendo em Estados-nações há
evolução posterior, bem como clarificar con- muito formados, por fatores tão diversos
fusões terminológicas advindas das diversas como guerras, desavenças econômicas e imi-
experiências. A mesma lógica pode ser em- gração (Snyder, 2000, p. xvii).2 Exemplos
pregada no caso do nacionalismo. A plurali- disso são o surto nacionalista ocorrido na
dade de conceitos que o envolve, fruto, em Argentina durante a guerra das Malvi-
larga medida, de experiências ocorridas em nas/Falklands e o neonacionalismo xenófo-
contextos históricos e políticos muito dife- bo e racista atualmente em ascensão em vá-
rentes, tem gerado contradições terminoló- rios países da Europa.
gicas que estão refletidas nas obras dos estu- Além de não cobrir todas as manifesta-
diosos do tema. Já em 1939, o Royal ções políticas que se abrigam sob o manto
Institute of International Affairs (p. xvi; cita- do nacionalismo, a definição de Gellner é
do em Connor, 1994, p. 91) assinalou que ainda criticada por confundir os próprios
uma das maiores dificuldades do estudo do conceitos de Estado e nação, tornando ter-
nacionalismo estava na linguagem emprega- mos como patriotismo (lealdade ao Estado)
da para definir o conceito. Daí a necessida- e nacionalismo (lealdade à nação) virtual-
de de examinar como os principais autores mente sinônimos. Contudo, alguns autores

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detectam as origens dessa confusão termino- damente. Um exemplo disso está na discipli-
lógica bem atrás, na história da Europa, na que estuda política mundial, chamada de
mais exatamente nas mudanças ocorridas Relações Internacionais, quando, na verda-
nos conceitos de Estado e nação que tiveram de, trata-se de relações interestatais, já que é
lugar na transição européia do Absolutismo o Estado, e não a nação, que formula e de-
à Era Moderna (Connor, 1994, cap. 4). senvolve a política exterior.
A origem latina da palavra nação – natio A confusão entre os conceitos de Estado
– sugere a idéia de territorialidade e laços de e nação não teria muita importância política
sangue em comum. Foi nesse sentido que o se a cada Estado correspondesse realmente
termo foi empregado por muito tempo, com uma nação. Nos casos em que essa coinci-
o intuito de designar elites estrangeiras vin- dência ocorre, patriotismo e nacionalismo
das de um lugar comum. Por exemplo, na são indistinguíveis, como no caso da Alema-
Universidade de Paris, durante a Idade Mé- nha hitlerista, em que os apelos nazistas se
dia, os estudantes eram reconhecidos por referenciavam indiferentemente ao Estado
suas “nações” de origem: “La vénérable Na- (Deutsches Reich), à nação (Volksdeutsch), ou
tion de France”, que incluía aqueles oriundos à pátria (Deutschland). Mas Estados-nações
não somente da França, mas também da Es- homogêneos como a Alemanha, o Japão ou
panha e Itália; “La Fidèle Nation de Picar- a Islândia são muito raros. A grande maioria
die”, reservada aos holandeses; e “La Cons- dos países contém várias etnias e nações,
tante Nation de Germanie”, que abarcava reais ou potenciais, que professam lealdades
tanto alemães como ingleses.3 A partir do sé- variadas ao Estado sob cuja jurisdição se en-
culo XVII, porém, o termo popularizou-se, contram. Mesmo a “nação” francesa à época
passando a significar simplesmente os habi- da Revolução de 1789, longe de possuir a
tantes de um dado país, independentemente homogeneidade que o conceito revolucioná-
de sua composição étnica e cultural. Ou seja, rio de cidadão parecia indicar, era na verda-
nação passou a ser quase sinônimo de povo. de composta de flamengos, catalães, nor-
A partir da Revolução Francesa, essa mandos, bretões e outros que nem falavam o
mesma noção de povo como nação passou a idioma da Île de France – de onde se origi-
ser associada ao Estado, a unidade política nou o francês moderno –, nem se considera-
que exerce autoridade (ou o monopólio da vam “franceses”. Foi somente a partir das
violência, na acepção weberiana) sobre um guerras napoleônicas, quando um exército
dado território. A doutrina de soberania po- popular foi formado sob uma só bandeira, e
pular colocou o povo como fonte de todo da posterior integração econômica das várias
poder político, tornando-o quase sinônimo regiões que a moderna identidade francesa
de Estado. Como observou Walker Connor pôde finalmente consolidar-se.4
(1994), “l’état c’est moi” tornou-se “l’état c’est A idéia convencional e popular de que
le peuple”. A própria Declaração sobre os Di- Estado e nação devem necessariamente con-
reitos do Homem e do Cidadão proclamou vergir também tem informado estudos e po-
que “a fonte de toda soberania reside essen- líticas sobre desenvolvimento no chamado
cialmente na nação; nenhum grupo ou indi- Terceiro Mundo. Tanto da parte de acadê-
víduo pode exercer autoridade que não ema- micos, como dos próprios líderes de ex-colô-
ne expressamente dela” (citada em Connor, nias na África e Ásia, tornou-se moeda cor-
1994, p. 95). Os termos Estado e nação tor- rente que um processo civilizatório exitoso –
naram-se sinônimos, sendo usados alterna- uma Bildung – só poderia ser alcançado se o

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Estado, por meio de uma ideologia naciona- líticas sobre territórios definidos exigiam
lista, promovesse o desenvolvimento de uma uma ideologia, uma cultura comum e uma
nação homogênea. Mas a grande dificuldade língua única, que somente o nacionalismo
com que a política de state-building sempre poderia proporcionar. O processo de forma-
se deparou em muitas ex-colônias foi justa- ção nacional é acelerado pela introdução de
mente conseguir que seus cidadãos transfe- um sistema educacional de massas e um có-
rissem suas lealdades tradicionais para o digo cultural popular disseminado pelos
novo Estado em construção. O modelo eu- meios de comunicação. Todo esse trabalho
ropeu idealizado de Estado-nação e o nacio- de engenharia social é necessário, segundo
nalismo a ele associado ou chocavam-se de Gellner (1964, p. 169), porque “o naciona-
frente com lealdades tribais e étnicas, geran- lismo não é o despertar das nações à auto-
do conflitos, ou adaptavam-se a estas, “dis- consciência; ele inventa nações onde elas
torcendo” o projeto original modernizador. não existem”. Eric Hobsbawm enfatiza jus-
Essa experiência acabou refletindo-se no tamente este ponto crucial da tese moder-
clássico debate acadêmico sobre o primor- nista: nações são construções, invenções hu-
dialismo e a modernidade das nações e do manas, que não existiram desde tempos
nacionalismo. imemoriais, como reivindicam os ideólogos
do nacionalismo, mas que surgiram em um
determinado contexto geográfico, socioeco-
Primordialismo e Modernidade nômico e político, que ele identifica como
sendo a Revolução Francesa, a ascensão da
A grande maioria dos estudiosos concor- burguesia e das classes médias, e o surgimen-
da que nacionalismo e nações são fenômenos to de mercados nacionais na Europa (Hobs-
modernos. Esses autores constituem a cha- bawm, 1990; Hobsbawm e Ranger, 1983).
mada escola “moderna” ou “construtivista”, O neonacionalismo surgido dos escombros
amplamente hegemônica no meio acadêmi- do socialismo real é criticado por Hobs-
co. Aqui encontramos novamente Ernest bawm justamente por não desempenhar esse
Gellner, mas também muitos outros autores papel histórico. Diferentemente do caráter
que influenciaram o desenvolvimento dos es- integrativo e emancipador do nacionalismo
tudos sobre nacionalidade, nação e identida- “clássico”, os novos nacionalismos do leste
de nacional.5 Apesar das muitas divergências europeu, segundo o historiador britânico,
existentes no seio dessa escola a respeito de são meras manifestações, divisionistas e rea-
diferentes aspectos do nacionalismo, todos o cionárias, surgidas em conseqüência do co-
associam com o advento da Era Moderna. lapso da ordem vigente (Hobsbawm, 1990).
Para modernistas e construtivistas, o surgi- Uma outra linha da escola moderna, os
mento das nações e do nacionalismo pode “instrumentalistas”, enfatiza de forma extre-
ser remetido às idéias e aos processos socioe- ma o caráter manipulador do nacionalismo,
conômicos e políticos desencadeados pelo bem como as supostas motivações econômi-
Iluminismo e a Revolução Industrial. cas que informam os movimentos nacionalis-
Gellner insiste que o nacionalismo está tas. Os instrumentalistas – em grande parte,
ligado à passagem da sociedade agrária para cientistas políticos positivistas e partidários
a industrial. A industrialização e a urbaniza- da metodologia da “escolha racional” – ale-
ção, a formação de uma burocracia nacional gam que elites empenhadas em defender seu
e a consolidação do poder de novas elites po- poder político e seus interesses econômicos

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fomentam movimentos étnicos e nacionalis- pertencer a uma entidade percebida como


tas, dirigindo-os contra seus oponentes. Se- eterna, o nacionalismo evoca nos indivíduos
gundo eles, a mobilização nacionalista de co- um sentido de imortalidade que anterior-
munidades é facilitada sempre que diferenças mente era monopólio das religiões.
étnicas ou religiosas coincidem com desigual- Os modernistas concordam que o início
dades econômicas e sociais, ou com disputas da Era das Nações e do nacionalismo pode
territoriais.6 Um caso freqüentemente analisa- ser datado em fins do século XVIII, mas dis-
do é o da antiga Iugoslávia, onde Slobodan putam o locus original do fenômeno. Embo-
Milosevic e a nomenklatura sérvia, obrigados ra a maioria aponte a Revolução Francesa
pelo processo de democratização a competir como fator decisivo para a expansão da idéia
no espaço público pelo apoio das massas, nacionalista, John Breuilly (1982) e Elie Ke-
adotaram um discurso nacionalista xenófobo dourie ([1960] 1994) identificam no ro-
contra outras nacionalidades, colocando-se mantismo alemão o primeiro momento de
como defensores do território e da herança formação de uma identidade nacional; a so-
cultural da Sérvia. cióloga Liah Greenfeld (1992) prefere esco-
Já Benedict Anderson, cujos trabalhos lher o momento que se seguiu à Guerra civil
têm influenciado decisivamente o curso dos das Rosas na Inglaterra; e Benedict Ander-
estudos sobre nacionalismo, apresenta uma son (1991) privilegia o movimento de inde-
interpretação muito particular da moderni- pendência na América Latina, detectando
dade das nações. Para Anderson, a interpre- nas elites criollas o primeiro sentimento de
tação de Gellner, exacerbada pelos instru- um nacionalismo moderno.
mentalistas, reduz o nacionalismo a uma Contudo, o nacionalismo não é um fe-
doutrina inventada e manipulada por elites nômeno puramente “interno” de um ou ou-
para mobilizar as massas. “Gellner está tão tro país, como também apontam vários au-
ansioso para mostrar que o nacionalismo se tores. As identidades nacionais se fortalecem
mascara sob falsas pretensões” – escreve An- no relacionamento, pacífico ou belicoso, en-
derson (1991, p. 6) – “que ele acaba asso- tre vários países. Immanuel Wallerstein
ciando invenção com fabricação e falsifica- (1974) situa o surgimento do nacionalismo
ção, ao invés de imaginação e criação”. Para no contexto de formação do sistema mun-
Anderson, a nação é uma comunidade “ima- dial mercantilista, a partir do século XVI.
ginada” porque se estende para além dos Ao incorporar as zonas periféricas da Améri-
contatos face a face reinantes nas pequenas ca e Europa Central, as principais potências
localidades, e nesse sentido só pode ser européias da época – Grã-Bretanha, França,
apreendida pela abstração da mente huma- Espanha e Portugal – acabaram por desenca-
na. Esse processo de imaginação nasce, por dear, entre as elites colonizadas, movimentos
sua vez, a partir do colapso da ordem dinás- nacionais de resistência à opressão européia.
tica e do desenvolvimento da tecnologia de Tom Nairn (1977) descreve processo seme-
impressão trazida pelas relações capitalistas. lhante no caso da Irlanda, Escócia e País de
Embora admitindo os imperativos econômi- Gales, submetidos ao poder inglês. Já Char-
cos que informam o surgimento das nações, les Tilly (1975) enfatiza a ligação entre as
Anderson enfatiza a dimensão psicológica guerras européias e o surgimento do nacio-
do nacionalismo, pois este aparece igual- nalismo. A contínua competição entre os
mente no rastro do declínio das religiões. Ao Estados europeus levou a uma corrida arma-
proporcionar aos cidadãos o sentimento de mentista em que os monarcas foram obriga-

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dos a extrair recursos cada vez maiores de clarou, “errar em sua história é fator essencial
suas “sociedades civis”, gerando sistemas na- da formação de qualquer nação”.
cionais de tributação, exércitos populares e Ainda assim, a tradição primordialista
burocracias nacionais. Sua conclusão é a de conta com algum lastro acadêmico, que
que guerras criam Estados nacionais, e estes, pode ser encontrado nos trabalhos do antro-
por sua vez, geram mais guerras. pólogo Clifford Geertz. Embora nunca te-
Apesar de sua hegemonia na comuni- nha empregado o termo “primordialismo”,
dade intelectual, a escola moderna/constru- Geertz (1963, pp. 107-113) escreve sobre
tivista permanece fustigada pelo espectro do “sentimentos primordiais” para descrever la-
primordialismo. Se as nações são uma in- ços psicológicos e étnicos, de caráter lingüís-
venção moderna, por que são percebidas tico, racial, religioso ou tribal, que algumas
popularmente como eternas e primordiais? vezes se confundem entre si, ou outras vezes
Como explicar o ressurgimento de movi- apresentam-se distintamente, mas que em
mentos políticos e culturais de cunho étni- todos os casos formam identidades básicas
co e nacional, aparentemente há muito es- que unem comunidades pré-nacionais.7 E
magados pelo rolo compressor das políticas são justamente esses laços primordiais que
nacionais homogeneizantes? Por que a cul- Geertz vê como obstáculos à unidade nacio-
tura e a psicologia coletiva das comunidades nal que as políticas de nation-building perse-
nacionais são invariavelmente compostas de guem. Os exemplos dessas dificuldades
elementos pré-modernos, cuja existência é abundam. Além da já citada perseverança
muito anterior à constituição dos Estados- histórica de etnias e nações na própria Euro-
nações modernos? Essas questões remetem pa, em muitos Estados da África, Ásia e
à tradição primordialista, que, apesar de América do Sul o processo de integração na-
muito desdenhada como irracional ou “fal- cional tem gerado inúmeros conflitos étni-
sa consciência”, tem mantido certo fôlego cos. Na Nigéria, ibos e iorubas, muçulma-
graças ao trabalho de resgate efetuado por nos do norte e cristãos do sul, desafiam o
alguns autores. poder do Estado central; em Ruanda e Bu-
O primordialismo das nações sempre foi rundi, tutsis e hutus se exterminaram aos
defendido pelos ideólogos e líderes dos mo- milhares; conflitos abertos ou velados entre
vimentos nacionalistas. Para estes, as nações malásios e chineses em Cingapura, hindus e
são as unidades “naturais” da história da hu- muçulmanos na Índia, continuam abalando
manidade, e, se algumas delas ainda não con- a estabilidade política desses países; na Amé-
seguiram despertar, isso decorre de injustiças rica Latina, o ressurgimento de identidades
históricas a que os movimentos nacionalistas indígenas parece indicar uma contestação
se propõem a corrigir. Contudo, e diferente- lenta, mas constante, da hegemonia da cul-
mente, por exemplo, do marxismo, os movi- tura hispânica. Essa lista de exemplos pode-
mentos nacionalistas nunca produziram teó- ria continuar indefinidamente.
ricos. Hobsbawm (1990, p. 12) chega Tanto os estudos dos chamados “pri-
mesmo a declarar que nenhum historiador mordialistas” como as tensões criadas pelas
sério das nações e do nacionalismo poderia políticas de nation-building colocam em xe-
tornar-se um político nacionalista militante, que o modelo eurocêntrico de formação na-
já que o nacionalismo exigiria demasiada cional e sua aplicação em outras regiões do
crença em fatos inexistentes. Como o histo- planeta. Se, na Europa, a formação das na-
riador Ernest Renan ([1882]1990, p. 8) de- ções pôde ser baseada em uma etnia princi-

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pal e em longas tradições de convivência eco- nha afetado seu sentido de identidade nacio-
nômica e política entre diferentes comunida- nal. Similarmente, os judeus podem cortar
des – já que bem antes do surgimento do na- seus laços com muitos aspectos do judaísmo
cionalismo os monarcas absolutos haviam e ainda assim permanecerem consciente-
conseguido a união política dos territórios mente vinculados à nação judaica. Por esse
onde impuseram seu controle –, em outros motivo, muitos estudiosos do nacionalismo
continentes a transferência de lealdades pri- como Baker (1927), Emerson, (1964), Ha-
mordiais para o Estado central tem se mos- yes (1931), Kohn ([1929] 1967) e Connor
trado bem mais difícil. Dificuldade essa su- (1994) rejeitam definições baseadas em ele-
cintamente manifestada na famosa frase de mentos “objetivos” das nações, preferindo
Massimo D’Azeglio (citado em Hobsbawm, usar o termo “autoconsciência” para descre-
1990, p. 44) a respeito da unificação italiana: vê-las.8 Nessa perspectiva, a “essência” da na-
“Nós fizemos a Itália, agora temos que fazer ção seria a autopercepção de diferença que
italianos”. Para que a importância dos “senti- uma comunidade tem vis-à-vis outras comu-
mentos primordiais” no debate sobre nacio- nidades, bem como os laços de semelhança e
nalismo torne-se clara, a diferença entre Es- união que cada comunidade percebe como
tado e nação, já abordada acima, tem de ser intrinsecamente “seus”.
complementada por outra distinção, agora Mas esses laços de semelhança e união
entre nação e etnia. Só distinguindo analiti- são justamente os “sentimentos primordiais”
camente esses dois conceitos, acredita Geertz de caráter étnico. Etnia é a palavra de ori-
(1963), é possível compreendermos a força gem grega correspondente a nação, signifi-
dos elementos primordiais. cando, portanto, um grupo humano com
A grande maioria dos autores rejeita a descendência comum. É nesse sentido que o
idéia essencialista de nação. Se o Estado é fa- termo é usado por antropólogos e etnólogos.
cilmente conceituado em termos quantitati- Mas muitos autores diferenciam etnia de na-
vos, a essência da nação é intangível. Stálin ção pelo grau de autoconsciência implicado
([1914] 1976, p. 16), em uma obra que em cada um dos dois conceitos. Enquanto
muito influenciou a perspectiva do movi- nação sempre envolve autodefinição, um
mento comunista sobre nacionalismo, defi- grupo étnico é mais identificado por outsi-
niu nação como ders do que por seus próprios membros.
Como Charles Winick (1956, p. 193) ob-
uma comunidade histórica e estável, forma- servou, em um grupo étnico “os laços de so-
da com base em uma língua comum, terri- lidariedade são aceitos inconscientemente
tório, vida econômica e psicologia manifes- por seus membros, mas os forasteiros identi-
tadas em uma cultura comum. ficam facilmente a homogeneidade do gru-
po”. Tomotshu Shibutani e Kian Kwan
O problema é que o estudo comparati- (1965), especialistas em estudos étnicos, en-
vo de casos e a pesquisa histórica indicam fatizam igualmente que um grupo étnico é
que não há “características essenciais” da na- definido “a partir de fora”.
ção. A língua certamente é uma das caracte- Max Weber (1968) percebeu muito bem
rísticas mais enfatizadas pelos românticos essa diferença entre comunidade étnica e na-
alemães como elemento crucial da nação ção quando se referiu aos russos brancos da
alemã. Mas os irlandeses puderam perder Bielorússia.9 Segundo ele, apesar de a idéia de
sua língua original, o gálico, sem que isso te- nação incluir noções de descendência co-

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mum, como ocorre nas comunidades étni- certos modernistas apregoam, na passagem
cas, o sentimento de solidariedade étnica por de uma sociedade “tradicional” ou “agrária”
si mesmo não forma uma nação. Os russos para uma nação industrial moderna.
brancos, notou Weber (1968, p. 395), sem- Até aqui essa sugestão não representa
pre manifestaram um sentimento de solida- nenhuma novidade, se lembrarmos que Dur-
riedade étnica vis-à-vis seus vizinhos da Rús- kheim e, depois dele, os estudiosos da mo-
sia, mas não poderiam qualificar-se como dernização já haviam indicado a permanên-
uma nação separada. As observações de We- cia de elementos da estrutura social e cultural
ber revelaram-se proféticas, pois até hoje os tradicionais nas formas mais modernas de
russos brancos ainda não se constituíram em organização social.11 Mas Anthony Smith
uma nação. O colapso da União Soviética inova ao traçar um painel comparativo e em-
obrigou as elites da Bielorússia a declararem piricamente rico dos elementos étnicos, rela-
sua independência e formarem um Estado cionando sua formação a experiências huma-
próprio, mas pesquisas têm indicado que a nas sociais e identitárias cristalizadas por
maioria da população do país não se percebe gerações, e mostrando ainda sua influência
como essencialmente diferente dos russos, e na cultura das nações modernas. Smith
há forte respaldo popular para uma reunifi- (1986, cap. 2) detecta seis principais elemen-
cação com a Rússia (Urban e Zaprudnik, tos presentes em comunidades étnicas: um
1993). Nesse sentido, a Bielorússia, já um nome coletivo, um mito comum de descen-
Estado, é uma nação ainda em potencial. dência, uma história em comum, uma cultu-
Alguns autores, ainda que concordando ra distinta, uma associação com um territó-
com o grau diferente de conscientização entre rio específico e um sentido de solidariedade
etnias e nações, insistem que elementos pri- entre seus membros. Segundo ele, alguns
mordiais étnicos continuam presentes na cul- desses elementos podem estar presentes em
tura das nações modernas. Esses elementos algumas comunidades étnicas e ausentes em
são fortes e persistentes justamente porque outras, o que remete a definição de comuni-
tocam em sentimentos, identidades e laços de dade étnica aos mesmos problemas encontra-
solidariedade profundamente arraigados. Por dos na definição de nação. Mas Smith tam-
isso é comum que as elites de Estados recém- pouco está buscando uma “essência objetiva”
formados, em seu esforço para construir uma das comunidades étnicas, já que enfatiza que
nacionalidade homogênea, acabem por in- os elementos étnicos são símbolos, mitos e
corporar, ao invés de suprimir, os elementos experiências subjetivas comuns desenvolvi-
étnicos existentes em sua cultura. O sociólo- dos pelos grupos étnicos. Seus estudos facili-
go inglês Anthony Smith, um dos mais emi- tam a compreensão das particularidades cul-
nentes especialistas em origens étnicas das na- turais das nações modernas, como o sistema
ções, dedicou vários estudos ao tema, de castas na Índia, os rituais dos judeus Beta
colocando de volta ao debate acadêmico a Israel etíopes, a organização da produção
questão do primordialismo10. Não que Smith econômica e do comércio em bases étnicas
seja exatamente um “primordialista” à manei- existente em várias regiões da África e Ásia,
ra dos ideólogos nacionalistas. Ao contrário, ou ainda as instituições, valores morais, leis e
ele também concorda que as nações são um códigos de conduta que em vários países do
fenômeno moderno. Sua preocupação está mundo refletem as origens étnicas de suas
em mostrar que não há ruptura total, como culturas modernas.

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A dicotomia primordialismo versus mo- maior ou menor ênfase em outros tantos; em


dernidade, já abalada pelos estudos de An- todos os casos, porém, o nacionalismo é um
thony Smith, recebe outras críticas de auto- discurso que integra uma comunidade a par-
res interessados em superar o que vêem como tir do significado comum que seus membros
um impasse no debate sobre nacionalismo. atribuem a eventos, ações e tradições associa-
O sociólogo Craig Calhoun (1997) admite, das aos seus elementos étnicos. Para Ca-
com Smith, que nações não são criações ex- lhoun, a especificidade da identidade nacio-
nihilo, e que, portanto, sua compreensão nal, vis-à-vis outras identidades baseadas em
passa necessariamente pela identificação dos gênero, classe ou relações de parentesco, está
elementos étnicos pré-modernos que as in- em que ela abarca a nação como um todo,
formam. Ele admite ainda que esses elemen- impondo as prioridades da mesma sobre to-
tos são percebidos pelos membros dos gru- das as outras formas segmentárias de identi-
pos étnicos como primordiais, eternos ou ficação. Essa identidade coletiva promovida
fixos. Mas aponta para o fato de que, percep- pelo discurso nacionalista liga cada indiví-
ções à parte, os elementos étnicos sofrem duo diretamente à nação, para além da filia-
transformações e são reelaborados de forma ção deste a esta ou aquela identidade paren-
consciente ou inconsciente ao longo do tem- tal, tribal, étnica, religiosa ou de classe. E é
po.12 Os trabalhos de Paul Brass (1991), por essa ligação direta entre indivíduo e nação
exemplo, mostram que as identidades étnicas que revela a dimensão política do nacionalis-
estão sujeitas às mudanças impostas pela mo- mo, provocando outro debate recorrente na
dernidade, conservando alguns de seus as- literatura acadêmica, entre as dimensões cívi-
cas e étnicas do nacionalismo.
pectos e mudando outros. E há os casos de
“invenção” de tradições, como o famoso
exemplo da saia dos escoceses, símbolo na-
Nacionalismo Cívico e
cional da Escócia, mas que o historiador in-
Nacionalismo Étnico
glês Hugh Trevor-Roper demonstra que foi
um mero caso de reconstrução e invenção no Não há autor que deixe de enfatizar a di-
contexto da resistência dos escoceses à domi- mensão política do nacionalismo. Seja como
nação inglesa, e que só se tornou popular no discurso que informa a idéia de nação, como
século XVIII.13 Nesse sentido, o “primordial” alegam Rogers Brubaker (1996) e Craig Ca-
seria igualmente moderno. lhoun (1997), ou como movimento concreto
Calhoun (1997, pp. 41-50) associa o que aspira a alguma forma de autonomia para
nacionalismo ao conceito de “formação dis- uma comunidade nacional, o nacionalismo
cursiva” elaborado por Michel Foucault sempre envolve a instituição de um sistema po-
(1977). O nacionalismo como discurso é a lítico. A própria equação Estado-nação-povo,
produção de um entendimento cultural e analisada por Walker Connor (1994), indica a
uma retórica que molda a consciência das direção política do nacionalismo. Como Hobs-
pessoas, levando-as a enquadrar suas aspira- bawm (1990, pp. 18-19) escreveu,
ções em termos da idéia de nação e de iden-
tidade nacional. A ideologia nacional, de- a nação enquanto tal formou-se como um
pendendo do contexto específico em que corpo de cidadãos cuja soberania coletiva le-
surge, pode prescindir de alguns dos elemen- vou à constituição de um Estado que, por sua
tos étnicos apontados por Smith, ou colocar vez, é a expressão política de seus cidadãos.

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Essa é a experiência das revoluções ame- contrário, é o nacionalismo e a constituição


ricana e francesa, e também da formação na- de nações que colocaram países como a In-
cional da Inglaterra. A socióloga Liah Green- glaterra, a França e os Estados Unidos no ca-
feld (1992) enfatiza especialmente o caso minho da modernidade.15 Esse nacionalismo
inglês como tipo ideal da associação original de caráter cívico é baseado na concepção po-
do nacionalismo com democracia, o que ela lítica de cidadania, independentemente de
chamou de nacionalismo de tipo cívico. Se- raça, religião, língua, etnia e até local de ori-
gundo Greenfeld, a idéia de soberania popu- gem. Por isso ela insiste que o nacionalismo
lar e as instituições democráticas que refletem cívico é inclusivo e democrático. Apesar de
essa soberania surgiram gradualmente na In- algumas ressalvas a respeito da presença de
glaterra, a partir do século XVI, quando o ter- elementos étnicos nas nações revolucioná-
mo nação deixou de denominar uma elite e rias, Eric Hobsbawm (1990) concorda que a
passou a ser aplicado a toda a população da novidade originária da nação estava justa-
Inglaterra. “Esta transformação semântica”, mente em seu caráter inclusivo. O que dis-
enfatiza Greenfeld (1992, p. 6), “sinalizou a tinguia os colonos da revolução americana
emergência da primeira nação tal como en- de 1776 do rei George e seus súditos não era
tendemos essa palavra hoje, inaugurando a a língua ou etnia, mas a aspiração à autode-
era do nacionalismo”. terminação dos primeiros. E a república
Esse novo significado da palavra nação, francesa, lembra Hobsbawm, não teve difi-
que elevou o povo à categoria de elite, teve lu- culdades em eleger o anglo-americano Tho-
gar em um contexto de mudanças radicais na mas Paine para sua Convenção Nacional.
estrutura das sociedades dinásticas, e de ero- Nessa concepção de nação, o que torna um
são das hierarquias e dos status sociais tradi- indivíduo cidadão não é a língua que ele fala
cionais após a Guerra das Rosas. Novas elites, nem o lugar de onde é proveniente, mas a
insatisfeitas com a impossibilidade de ascen- adesão aos princípios políticos da soberania
são na hierarquia da sociedade das ordens, co- popular e do governo representativo (Hobs-
mandaram o processo de asserção da sobera- bawm, 1990, cap. 1).
nia popular, manifesto na longa luta política Segundo Greenfeld, o nacionalismo cí-
do parlamento, que representava a nova aris- vico mudou os critérios de dignidade huma-
tocracia, os burgueses e commoners, contra a na e, junto com a reforma protestante, tor-
nobreza associada à coroa inglesa. O governo nou a atividade econômica respeitável. O
representativo que resultou da vitória da idéia fantástico desenvolvimento e expansão
de soberania popular significou, como notou mundial dos países que inicialmente experi-
John Stuart Mill (1873), a aspiração da popu- mentaram o nacionalismo tiveram como
lação por um governo constituído por ela conseqüência a exportação da idéia de nação
própria ou parte dela. As revoluções francesa para outras regiões com condições socioeco-
e americana igualmente associaram nação e nômicas e políticas muito diferentes da In-
povo à democracia, ao reiterarem, cada uma a glaterra ou França.16 Como na Inglaterra,
seu modo, a independência e soberania de em outros lugares o nacionalismo foi sempre
seus cidadãos e o princípio do governo “pelo adotado por elites insatisfeitas com seu status
povo e para o povo”.14 social. Por exemplo, na Rússia, os primeiros
Liah Greenfeld inverte a equação dos nacionalistas eram aristocratas cujo status so-
modernistas ao defender que não foi a lógi- cial dependia inteiramente da qualidade dos
ca da indústria que gerou as nações, mas, ao serviços prestados ao czarismo absolutista.

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Na Alemanha foram os intelectuais român- onde a noção ocidental de autodetermina-


ticos de classe média, cuja educação era in- ção dos povos encontrou um mundo de
suficiente para garantir-lhes proeminência Kulturnationen, onde os apelos às raízes cul-
na sociedade, os primeiros a abraçarem a turais, lingüísticas e étnicas formaram a
causa nacional. Nesses e outros casos, o na- consciência nacional dos países daquela re-
cionalismo foi sempre a opção escolhida por gião.
elites sem estabilidade social definida O nacionalismo, nesses casos, enraíza-se
(Greenfeld e Chirot, 1996, pp. 3-40). em componentes étnicos primordiais. Ele
A idéia de nação desenvolveu-se em não expressa a transcendência das raízes par-
muitos países sem a dimensão cívica origina- ticulares através da cidadania, mas sim atri-
da na França e Inglaterra. Por exemplo, a butos específicos, únicos e particulares das
comparação entre o atraso da Alemanha e culturas. Por isso, Greenfeld ressalta que
Rússia e o desenvolvimento da França e In- todo nacionalismo étnico é por natureza ex-
glaterra gerou ressentimentos e levou ao que cludente e coletivista, e sua origem ressenti-
Greenfeld chama de “transvalorização de va- da o faz desenvolver tendências à xenofobia
lores”, uma atitude psicológica em que se e ao autoritarismo. Essa visão é compartilha-
atribui caráter negativo aos valores da nação da por muitos autores importantes, como
que é objeto de comparação e imitação, ao Kohn ([1929] 1967) e Hayes (1931). A di-
mesmo tempo em que valores autóctones re- cotomia nacionalismo cívico versus naciona-
cebem avaliação positiva.17 Para os românti- lismo étnico tem sido muito criticada por
cos nacionalistas alemães e a escola panesla-
seu eurocentrismo e conservadorismo. Mas
vista nacionalista russa do século XIX, a
a interpretação de Liah Greenfeld pode ser
organização social e os valores do “Ociden-
útil para iluminar a formação de identidades
te” – que a França e a Inglaterra por muito
nacionais em países como o Brasil.
tempo representaram – tornaram-se a incor-
A construção da identidade nacional
poração do mal. As sociedades industriais
brasileira pode ser analisada através dos con-
desenvolvidas foram criticadas por seu indi-
vidualismo, materialismo e consumismo. O ceitos de ressentimento e transvalorização de
indivíduo ocidental era percebido como valores, se aplicados à questão racial no Bra-
egoísta, alienado e anti-social. Razão e racio- sil. Um dos grandes dilemas que historica-
nalidade foram reduzidas a “cálculo” e “con- mente os intelectuais brasileiros tiveram de
tabilidade” (Greenfeld, 1985, pp. 153-174). enfrentar foi a visão negativa sobre os negros
Por outro lado, os românticos alemães predominante nas elites do país. Estas abra-
idealizavam as atividades agrícolas, vendo o çavam teorias racistas européias, especial-
camponês como a encarnação do Volk mente o “racismo científico” do conde Gobi-
(povo). A vontade foi avaliada como supe- neau, que, após morar no Brasil como
rior ao racionalismo, e o coletivo, mais im- embaixador da França em meados do século
portante que o indivíduo. Raça e língua ger- XIX, sugeriu que a população brasileira iria
mânicas tornaram-se os atributos principais desaparecer em poucos séculos, já que mula-
da nação alemã. Na Rússia, a fé ortodoxa e a tos não conseguiriam reproduzir-se para
espiritualidade do muzhik russo foram esco- além de algumas gerações. Mesmo em fins
lhidas como os elementos decisivos da cons- do século XIX e início do XX, muitos inte-
ciência nacional. André Van De Putte lectuais pregavam que o Brasil nunca poderia
(1996, pp. 161-195) faz a mesma análise tornar-se “moderno” mantendo uma popula-
para os nacionalismos da Europa Central, ção predominantemente miscigenada, e daí a

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necessidade de políticas de imigração que É importante, igualmente, assinalar que


atraíssem europeus, como forma de “em- as identidades nacionais mudam ao longo do
branquecer” o país. Oliveira Vianna (1934), tempo, podendo assumir um caráter étnico
por exemplo, ligava o desenvolvimento social ou cívico, ou uma mistura dos dois. O nacio-
do Brasil à gradual eliminação dos traços fí- nalismo francês, por exemplo, se em sua ori-
sicos e culturais de índios e negros. gem foi predominantemente cívico, desen-
Nesse contexto de ressentimento em re- volveu posteriormente uma dimensão étnica,
lação às nações brancas da Europa, intelec- adotando a língua de uma de suas etnias e fa-
tuais brasileiros desenvolveram uma resposta zendo dela um aspecto central de sua identi-
criativa à suposta inferioridade racial do país, dade nacional. A Alemanha seguiu o cami-
transformando a miscigenação em fator po- nho inverso, tornando-se uma democracia
sitivo e motivo de orgulho nacional. Gilber- após a Segunda Guerra Mundial, mas man-
to Freyre foi um dos intelectuais mais impor- tendo uma concepção étnica de cidadania.
tantes na realização dessa “transvalorização Os alemães nascidos na comunidade germâ-
de valores”, que se desenvolveu posterior- nica do Volga, na Rússia, recebem cidadania
mente na consagração da miscigenação por imediata ao imigrarem para a Alemanha, ao
Darcy Ribeiro. A miscigenação e o “mito da passo que um imigrante turco que tenha pas-
democracia racial” tornaram-se parte inte- sado toda a sua vida na Alemanha raramente
grante da identidade nacional brasileira, ape- conseguirá obter cidadania alemã. Mesmo
sar da evidente discriminação racial existente nos Estados Unidos, a nação cívica par excel-
no país (Sousa e Nascimento, 2003). lence, Benedict Anderson (1992) assinala
O caso do Brasil parece indicar que uma crescente “etnização” de sua população.
uma identidade nacional enraizada em uma A idéia tradicional da América como melting
elaboração particular de seus elementos au- pot, em que os cidadãos dissolveriam suas
tóctones não tem de ser necessariamente re- origens étnicas e raciais na “panela” nacional
trógrada e antimoderna. Nesse sentido, a comum, está sendo substituída por um mul-
avaliação negativa do nacionalismo étnico ticulturalismo que enfatiza a “hifenização”
das regiões periféricas feita por Liah Green- dos indivíduos, tornando-os African-Ameri-
feld revela um viés eurocêntrico e conserva- can, Irish-American, Native-American e assim
dor que não passou desapercebido por al- por diante. E, segundo Anderson, a ênfase
guns cientistas sociais (Yack, 1995, pp. cada vez mais se desloca de Irish-American
166-182). Claro está que em várias regiões para Irish-American.
do mundo o nacionalismo étnico está asso- A idéia de uma identidade nacional e
ciado a autoritarismo e guerras. Mas existem uma cidadania completamente despidas de
nacionalismos como o da província cana- componentes étnicos e baseadas exclusiva-
dense de Quebec, cujos aspectos étnicos não mente em lealdades aos princípios cívicos e
o tornam xenofóbico ou autoritário. Ainda democráticos é, assim, irreal. Além disso,
que lutando pela preservação da cultura como lembra Kai Nielsen (1996/97), tal
francesa de Quebec e mesmo pela indepen- princípio cívico acabaria por contradizer a
dência da província, os movimentos nacio- própria idéia da soberania política de cada
nalistas de Quebec defendem um conceito cidadão. Alguns cidadãos de países demo-
inclusivo de cidadania e querem preservar as cráticos podem rejeitar os princípios da de-
instituições democráticas do Canadá (Niel- mocracia, como os grupos neonazistas, e
sen, 1996/97, pp. 42-52). ainda assim manter sua cidadania, já que

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esta não pode estar baseada nas possíveis impostos. Habermas (1996, pp. 491-515)
orientações políticas dos cidadãos. Nielsen propõe uma cidadania participativa na qual
adverte ainda para a existência de elementos
étnicos até mesmo nas leis de imigração de a autonomia política é um fim em si mesma,
países cívicos como o Canadá. Um finlandês que não vai realizar-se por indivíduos priva-
que queira imigrar para o Canadá, lembra dos perseguindo seus próprios interesses,
ela, não irá ganhar cidadania pela simples mas em práticas intersubjetivas comparti-
adesão aos princípios democráticos de seu lhadas pelos cidadãos.
novo país. Para tornar-se canadense, ele terá
de aprender pelo menos um dos dois idio- Aqui, a sugestão de Habermas é clara: o
mas do país e aprender algo da história e cul- desenvolvimento democrático da União Eu-
tura canadenses (Nielsen, 1996/97, p. 48). ropéia exige uma cidadania mais comunitá-
ria e participante, que supere o modelo loc-
Esses fatos parecem demonstrar que a dico-
keano. Pois são as limitações desse tipo de
tomia entre nacionalismo étnico e cívico é
nacionalismo cívico que criam o solo fértil
reducionista, e que sociedades baseadas pu-
para o florescimento do nacionalismo xenó-
ramente em um dos dois critérios simples-
fobo de um Le Pen e para a popularidade do
mente não existem.
sentimento antiimigrante na Europa, além
Os especialistas que rejeitam a oposição
de permitir que os negócios da União Euro-
entre nacionalismo cívico e étnico, como Kai
péia sejam dominados pela burocracia e pelo
Nielsen (1996/97) e Will Kymlicka (1995,
big business.
pp. 130-137), entendem a nação como uma
As limitações dos modelos étnico e cívi-
entidade cultural. Para eles, uma nação só co levaram cientistas sociais como John Hall
pode ser qualificada como tal se possui uma a pregar o abandono de qualquer teoria geral
cultura pública e societária, compartilhada sobre nacionalismo. Para ele, o estudo do na-
por seus cidadãos, e capaz de dar sentido às cionalismo só poderá progredir se se produzi-
atividades individuais e coletivas dos mem- rem teorias menos abrangentes, que não se
bros da sociedade. Não existiria, nesse senti- reduzam a casos históricos específicos, mas
do, um nacionalismo “cívico” que fosse pura- que conduzam a tipologias mais adequadas à
mente político e que pudesse refletir uma fenomenologia nacionalista. Trata-se então,
adesão a princípios democráticos, indepen- para John Hall (1993, pp. 1-28), de encon-
dentemente da cultura em que esteja inseri- trar melhor classificação dos tipos de nacio-
do. Segundo esses autores, o nacionalismo cí- nalismo. Para Craig Calhoun, basear-se em
vico é também cultural, e tem de ser estudado um fator ou causa única que possa explicar o
como tal. fenômeno nacionalista leva ao reducionismo.
Ainda assim, um filósofo importante Divisões rígidas entre primordialismo e cons-
como Jürgen Habermas (1996) insiste na trutivismo, ou entre étnico e cívico, não são
validade da concepção cívica de identidade analiticamente frutíferas. Segundo ele, o na-
nacional, e tenta até desenvolvê-la à luz da cionalismo em suas múltiplas variantes só
realidade da União Européia. Para Haber- pode ser apreendido como formação discursi-
mas, a União Européia ainda está baseada va. O denominador comum entre o protecio-
em uma concepção lockeana de nacionalis- nismo econômico japonês, a “limpeza étnica”
mo cívico, segundo a qual os cidadãos de- promovida pelos sérvios e a execução do hino
vem trocar serviços e benefícios por votos e norte-americano em jogos de beisebol, diz

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Calhoun (1997, pp. 23-24), é uma formação bermas, não encontra subsídios empíricos
discursiva que informa e conecta todos esses sólidos. Mesmo as manifestações mais “mo-
eventos, mas que não pode oferecer uma ex- dernas” e “cívicas” de nacionalismo reme-
plicação causal para nenhum deles. tem-se a elementos étnicos “primordiais” e
Como, então, definir um fenômeno mitos de origem nacional, extraindo daí a
que se manifesta nas mais diversas circuns- força de seu apelo. Os movimentos naciona-
tâncias históricas, geográficas e culturais, to- listas são ao mesmo tempo teleológicos e tra-
mando formas tão variadas? A teoria do na- dicionais. Perseguem um destino comum,
cionalismo “clássico” desenvolvida por mas sempre reivindicam um passado. Pri-
Gellner (1983), Hobsbawm (1990) e Hobs- mordialismo e modernidade, política e cul-
bawm e Ranger (1983), além de outros, que tura, etnia e cidadania, passado e presente,
associa nação a modernidade, industrializa- aparecem nas manifestações nacionalistas de
ção e formação dos Estados-nações euro- forma combinada, em graus e associações
peus, revela-se insuficiente para explicar tan- tão diversos que desafiam sua captura por
to as dificuldades de construção de nações uma teoria singular. E é esse o dilema que se
em outras regiões do planeta como o ressur- impõe aos estudos acadêmicos: encontrar
gimento de movimentos nacionalistas na uma interpretação coerente, empiricamente
própria Europa contemporânea. A divisão sólida, com metodologia abrangente, capaz
entre nacionalismo cívico e étnico, seja nas de unir sob um mesmo conceito as variadas
versões de Liah Greenfeld ou de Jürgen Ha- manifestações de nacionalismo.

Notas

1. Um exemplo disso é Alexander Iakovlev, membro do politburo durante a Era Gorbachev


e um dos principais formuladores da Perestroika, que reconheceu ter mudado sua opinião
sobre a questão nacional após ler Gellner. Ver a esse respeito Staniszkis (1991, p. 294).
2. A esse respeito, ver também Ignatieff (1993).
3. As origens do termo nação foram traçadas pelo sociólogo italiano Guido Zernatto (1944,
pp. 351-366), citado em Greenfeld (1992, p. 4).
4. Segundo Eugene Weber (1976), até a modernização da França rural, e mesmo após as guer-
ras napoleônicas, quando se criou um exército popular sob uma bandeira e um idioma, a
vasta maioria da população não tinha consciência de pertencer a uma nação francesa.
5. Uma lista mínima da escola moderna teria de incluir os seguintes nomes e obras: Ander-
son (1991); Breuilly (1982); Connor (1994); Gellner (1983); Giddens (1987); Hayes
(1931); Hobsbawm (1990); Kohn ([1929] 1967); Tilly (1975); Seton-Watson (1977).
6. Uma boa resenha da escola instrumentalista encontra-se em François Nielsen (1985, pp.
133-149).
7. Geertz, por sua vez, reconhece seu débito intelectual para com Edward Shils. Ver a esse
respeito Shils (1957, pp. 130-145).
8. Ver a esse respeito Connor (1994, pp. 90-106).

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9. O nome do país foi mudado de Bielorússia para Belarus, ou seja, da língua russa para o
idioma bielorusso, após sua independência. Uso o nome antigo porque ainda é mais co-
nhecido. Os habitantes da Bielorússia chamam-se “russos brancos”, em contraposição aos
russos (ou grã-russos) que habitam a República Federativa da Rússia.
10. As principais obras de Smith são: Theories of nationalism (1983); The ethnic origins of na-
tions (1986); National identity (1991), Nationalism in the Twentieth Century (1979).
11. Ver a esse respeito Durkheim (1964, especialmente pp. 277-278), Eisenstadt (1973) e
Nisbet (1965).
12. Em Calhoun (1997), ver especialmente caps. 1 e 2.
13. Citado em Hobsbawm e Ranger (1983, p. 18).
14. Os processos de formação nacional na Inglaterra, França e Estados Unidos são analisados
e interpretados detalhadamente em Liah Greenfeld (1992). No caso da França, Greenfeld
coloca restrições ao conceito de “vontade geral” de Jean Jacques Rousseau, que, segundo
ela, carrega uma noção coletivista e antiindividualista, mas concorda com outros autores
em que o nacionalismo francês era originariamente de caráter cívico.
15. Essa tese é retomada por Liah Greenfeld em sua obra mais recente, The spirit of Capita-
lism (Greenfeld e Chirot, 2001).
16. Por exemplo, mesmo na Europa, a Alemanha e a Itália não se unificaram até a segunda
metade do século XIX. Tradicionalmente, suas elites aristocráticas se adequavam melhor
às ordens dinásticas. A Rússia desenvolveu-se como império, sem sequer passar pela fase
pré-nacional das monarquias absolutas da Europa ocidental. As regiões da Europa Cen-
tral, predominantemente rurais, não adquiriram independência nacional nem se consti-
tuíram como países até a Primeira Guerra Mundial. Na África, os territórios dos países
que adquiriram independência após a Segunda Guerra Mundial cortavam comunidades
tribais e étnicas, e não existia mercado e economia nacionais.
17. Os conceitos de ressentimento e transvalorização de valores foram definidos por Max Sche-
ler ([1912] 1961) e retomados por Liah Greenfeld (1985).

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Resumo

Dilemas do Nacionalismo

Este artigo é uma resenha dos principais enfoques teóricos sobre nacionalismo. Para tanto,
mostra os debates mais importantes ocorridos entre os estudiosos do tema. Discute a classifi-
cação de nacionalismos predominante nos estudos acadêmicos, apontando para trabalhos re-
centes que tentam superar dicotomias tais como nacionalismo cívico versus nacionalismo ét-
nico, ou primordialismo versus modernidade.

Palavras-chave: Estado-nação; Etnia; Nacionalismo; Democracia; Xenofobia.

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