Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Resumo PEC 4 - Cap 1, 2,3, 16,17 PDF
Resumo PEC 4 - Cap 1, 2,3, 16,17 PDF
62 – 71
BIELSCHOWSKY, Pablo 1
1 INTRODUÇÃO
1
Segundo a teoria marginalista tradicional, a maximização dos lucros das firmas segundo a regra r/p = PMgK,
associada à hipótese de produtividade marginal decrescente do capital, resulta em uma curva de demanda por
capital (investimento) decrescente em relação à taxa de juros. De outro lado, a desutilidade marginal crescente da
espera resulta em uma curva de oferta de capital (poupança) crescente em relação à taxa de juros. Assim, a taxa
de juros real iguala a poupança e o investimento através do mercado de crédito.
63
Keynes argumenta que: (i) os trabalhadores não podem fixar o salário real (W/P), pois quando
decidem o salário nominal, não conhecem os preços ex-post que serão definidos pelos
empresários, e (ii) os trabalhadores não abandonam o emprego (não reduzem a oferta de
trabalho) quando o salário real cai em virtude de um aumento dos preços. Para reforçar seu
argumento, Keynes afirma que uma queda do salário nominal reduz o custo marginal,
reduzindo os preços sem afetar o salário real – refutando a tese neoclássica de que uma queda
do salário nominal resultaria em queda do salário real, equilibrando o mercado de trabalho.
Ao recusar a curva de oferta de trabalho, o equilíbrio do mercado de trabalho fica
indeterminado, o que resulta na indeterminação do produto no modelo neoclássico. Para
superar este problema, Keynes inverte o sentido da determinação emprego-produto,
afirmando que é o nível do produto que, por meio da função de oferta agregada Z(N),
determina o nível de emprego. Mas o que explica a determinação do produto?
Segundo Keynes, a Lei Say afirma que a oferta do produto Z cria uma demanda
correspondente, de modo que Z(N) = D para qualquer nível de emprego. Assim, a Lei de Say
confunde a identidade contábil entre o valor da produção e a renda nacional com o erro
teórico de que toda a renda é gasta na compra do valor da produção. Keynes responde que a
troca é uma transação bilateral (envolvendo de um lado um consumidor ou um comprador de
bens de capital e do outro lado uma firma) na qual o ato de gastar uma magnitude de dinheiro
realizado pelo comprador cria uma renda idêntica nas mãos do vendendor. Ademais, a lei de
Say confunde a identidade contábil entre investimento e poupança com o erro teórico de que a
poupança determina o investimento. Keynes responde que as decisões de compra (C+I)
determinam a renda Y=C+I. Esta renda Y é distribuida sob a forma de salários (F) e lucros
(L). A determinação da renda produz como resíduo uma poupança S = Y – C. Portanto, as
decisões de gasto em consumo e investimento determinam a renda Y, e este processo cria uma
poupança (igual ao investimento) como um resíduo.
A partir desta análise, Keynes formula o “Princípio da Demanda Efetiva”, afirmando
que a expectativa de demanda determina o produto, a oferta agregada que os empresários
decidem produzir. Mas o que determina a demanda esperada?
No plano estritamente teórico a demanda esperada é subjetiva e, portanto,
indeterminada. No plano empírico, dada a propensão consumir c, o multiplicador ∆Y = (1/1-
c)∆I mostra que a variação dos gastos em investimento determina a variação da demanda
agregada e, portanto, da demanda esperada. Mas o que determina o investimento? Para
Keynes o preço de oferta dos bens de capital e a quase-renda esperada destes ativos
determinam a Eficiência Marginal do Capital (EMK). De outro lado, a prefêrencia pela
64
liquides e a oferta de moeda são fatores que determinam a taxa de juros. A relação entre a
EMK e a taxa de juros determina o investimento que (por meio do multiplicador) determina a
demanda agregada. A expectativa quanto à demanda determina o produto esperado que, por
meio da curva de oferta agregada, determina o emprego e o salário real.
Os corolários da Lei de Say implicam que um aumento do investimento deve ser
acompanhado por uma redução do consumo e por um aumento da taxa de juros de modo a
ampliar a poupança. Keynes mostra através do multiplicador que um aumento do
investimento resulta em um aumento do consumo e da renda, produzindo como residuo um
aumento correspondente da poupança. Keynes incorpora (com modificiações importantes) a
curva de demanda por capital neoclássica I(r) no conceito de EMK. No entanto, substitui a
curva de oferta de capital S(r) neoclássica e a teoria quantitativa da moeda por sua teoria da
taxa de juros, mostrando que o juro, enquanto recompensa pela iliquidez, não esta relacionado
com a propensão a poupar. Conclui então que um aumento da taxa de juros, ao reduzir os
investimentos, resulta na queda da poupança e do consumo.
Deste modo, o argumento dos capítulos 3 a 15 da “teoria geral” se organiza a partir da
controvérsia de Keynes com seus contemporâneos. Keynes substitui as curvas neoclássicas de
demanda e oferta de capital por sua teoria da EMK e da taxa de juros, para determinar o
investimento. Contrapondo-se à Lei de Say através do Princípio da Demanda Efetiva: (a)
formula o multiplicador para mostrar que o investimento determina a demanda agregada,
condicionando a demanda esperada, e (b) inverte o sentido da determinação demanda-produto
no plano teórico para mostrar que a demanda esperada determina o produto esperado.
Ademais, inverte o sentido da determinação produto-emprego na função de oferta agregada
para mostrar que o produto esperado determina o nível do emprego, e adota a teoria da
distribuição marginalista para mostrar que o emprego determina o salário real.
nível de emprego determina o salário real através da regra marginalista PMgL(N) = W/P.
2
No capítulo 4, Keynes explicita a relação entre a curva de oferta marginalista O(N) e sua curva de oferta Z(N),
como pO(N) = Z(N) + U(N); onde U(N) é o custo de uso associado a N. Cumpre destacar que a curva de oferta
de Keynes é uma curva de oferta ex-ante, esperada, que indica a relação entre a relação entre o nível de produção
que os empresários esperam produzir e o nível de emprego que deve ser contratado para esta tarefa.
3
No capitulo 3 da teoria geral, Keynes concebe o ponto de demanda efetiva como um equilíbrio onde as
expectativas se confirmam. Trata-se de uma falha expositiva do livro. O princípio da demanda efetiva analisa o
momento da decisão de produção, antes que esta se inicie. Após o periodo de produção, as expectativas serão
novamente formuladas para que seja tomada uma nova decisão de produção. No entanto “trata-se então, de
qualquer forma, de um novo período, e o equilíbrio já terá perdido sua oportunidade” (Possas, 1986, p 299).
Segundo Macedo e Silva (1995, p. 164), Keynes corrige esta definição no texto ex-ante e ex-post, onde “a
demanda efetiva é claramente a demanda esperada pelos empresários”.
66
D dada D(N) = I + C(N)
Z,D Z,D
Z(N) Z(N)
D(N)
D
N N
No capítulo 17 Keynes constroi uma teoria da precificação dos ativos a partir de seu
rendimento para reforçar sua análise da decisão de investimento. Opondo-se a teoria
quantitativa da moeda, Keynes retoma seu conceito de economia monetária de produção, onde
o ativo dinheiro funciona como um elo entre o presente e o futuro em condições de incerteza,
de modo que a política monetária e a decisão de gastar a renda com moeda afetam a demanda
68
e o emprego, sendo impossivel definir uma posição de equilíbrio sem levar em conta o
dinheiro – como fazem os economistas clássicos e neoclássicos.
Keynes classifica o rendimento dos ativos em quatro tipos: a quase-renda q, o custo de
conservação c, o prêmio de liquidez l e a variação no preço do ativo a. Admitindo por
simplificação que c=a=0, então os ativos de capital rendem quase-renda Q, a moeda rende um
premio de liquidez L, e os título rendem quase renda e premio de liquidez Q+L. A taxa de
rendimento esperada dos ativos determina a formação da carteira de ativos, que determina a
decisão de investimento.
Keynes argumenta que, se o rendimento esperado dos ativos de capital é superior ao
rendimento esperado dos demais ativos, o investimento em ativos de capital provoca uma
ampliação do estoque de bens de capital, reduzindo seu rendimento esperado. No entanto, não
existe nenhuma força que reduza automaticamente o prêmio de liquidez da moeda, quando
este se encontra em nível elevado. A moeda, justamente por possuir elasticidade-produção e
substituição zero, serve de medida de valor para contratos e salários, e por isso funciona como
um ativo que rende proteção contra a incerteza (tem alto prêmio de liquidez). Em momentos
de elevada incerteza, mesmo que o governo amplie a oferta de moeda, os aplicadores podem
preferir manter sua riqueza sob a forma de moeda do que aplicaá-la em ativos de capital,
impondo um patamar mínimo para o prêmio de liquidez da moeda6.
5 AS REFORMAS DO CAPITALISMO
Ao longo dos capítulos 3-15 Keynes argumenta que, nos momentos de crise aguda ou
estagnação prolongada, a ruptura das conveções obriga o empresário a encarar a incerteza
quanto ao rendimento dos ativos de capital, resultando na instabilidade da EMK. De outro
6 Após a públicação da teoria geral, os seguidores diretos de Keynes na Inglaterra concentram sua análise na
dinâmica econômica, como veremos mais adiante. A partir da crise da década de 1970 se consolida nos EUA
uma segunda corrente de economistas seguidores de Keynes. Os maiores representantes desta escola são
Davidson e Minsky. Davidson resgata a leitura do capítulo 17 a partir do conceito de economia monetária de
produção, apresentada acima. De outro lado, Minsky (1985) formula uma teoria de precificação dos ativos e de
formação da carteira semelhante a de Keynes, mas argumenta que a decisão de investimento em um ativo (que
gera um fluxo de rendimento) é simultânea a escolha de financiamento do passivo (que gera um fluxo de
obrigações). Deste modo, classifica as empresas conforme seu grau de vulnerabilidade (margem receita/juro-
amortização) em empresas Hedge quando os rendimentos cobrem os juros e amortizações, Especulativas quando
o rendimento paga os juros, mas não as amortizações, e Ponzi quando o rendimento não cobre sequer os juros.
Segundo Minsky, nos momentos de crescimento, o alto rendimento esperado induz o financiamento
especulativo, e os bancos aumentam o credito (ampliando o risco do ativo e a alavancagem do passivo bancário).
Quando ocorre uma reversão das expectativas, o corte dos investimentos gera queda das receitas e os bancos
racionam o crédito. O governo é obrigado a ampliar a liquidez para evitar uma desvalorização geral dos ativos e
a aumentar os gastos públicos para sustentar a receita das empresas. Amparadas pela ação do estado, as empresas
e bancos reduzem sua fragilidade, e a economia emerge mais robusta da crise.
69
lado, a elevada incerteza se reflete em um elevado prêmio de liquidez da moeda. A
combinação entre a estabilidade do elevado prêmio de liquidez da moeda e a instabilidade da
EMK impede a retomada dos investimentos. Keynes defende diversas vezes ao longo da
“teoria geral” uma política de redução da taxa de juros e aumento dos gastos públicos como
formas de melhorar o “estado das expectativas”, permitindo a saída da crise.
No capítulo 16, Keynes argumenta que o lucro decorre da escassez do capital,
atribuindo a crise da década de 1930 a onda de investimentos na década anterior. Isto significa
que, além de inerentemente instável, o capitalismo tem limites “estruturais”, pois a
necessidade de manter o capital escasso limita a expansão do sistema. No capítulo 24, Keynes
defende que o estado deveria atuar decididamente para garantir o nível dos investimentos
(públicos e privados), evitando que a queda do rendimento fornecida pela escassez do capital
resultasse em retração dos investimentos. Isto significa que a determinação do nível dos
investimentos deveria ser realizada pelo “estado” e não pelo “mercado”.
6- CONSIDERAÇÕES FINAIS
Segundo Keynes (1936), a relação entre o preço de oferta e a renda esperada dos bens
de capital determina a eficiência marginal do capital. A relação entre a preferência pela
liquidez e oferta de moeda determina a taxa de juros. A relação entre a eficiência marginal do
capital e a taxa de juros orienta a decisão de investimento. Supondo dados a propensão a
consumir e a função de oferta agregada, então o nível de investimento determina o produto e o
emprego. Deste modo, as expectativas de longo prazo orientam as decisões de investimento,
que determinam a demanda corrente, que serve de base para expectativas de demanda, que
determinam as decisões de produção, que determinam o nível do emprego e dos salários reais.
Keynes contribui com a teoria econômica ao mostrar que as expectativas de longo
prazo e curto prazo determinam as decisões de investimento e produção, que determinam o
nível de emprego em uma sociedade.
70
REFERÊNCIAS
KEYNES, J.M. A teoria geral do emprego, do juro e do dinheiro. São Paulo, abril cultural,
[1936] 1983.
MINSKY, H.P.. Stabilizing an unstable economy. Londres: Yale university press, 1985.
PIGOU, A.C. The classical stationary state. Economic journal, v.53, n.212, dez 1943.
71