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Teoria Ergódica (MATD31)

Transformações expansoras.

V. Araújo

Mestrado/Doutorado em Matemática, UFBA, 2015

Conteúdo
1 Transf. Expansoras 1
1.1 Expansão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1
1.2 Bacia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 2
1.3 Ramos inversos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3
1.4 Med. abs. cont. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5

2 Cobertura de Markov 13
2.1 Construção via pré-imagens . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
2.2 Diâmetro nova cobertura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14

1 Transf. Expansoras
Densidade invariante para transformação expansora
Vamos provar que toda transformação expansora de uma varie-
dade compacta M com jacobiano det Dƒ Hölder admite uma única
probabilidade invariante absolutamente contínua com relação a toda
medida de volume na variedade (medida de Lebesgue). Essa proba-
bilidade é positiva em todos os subconjuntos abertos de M, é ergó-
dica, e a sua bacia ergódica tem medida de Lebesgue total em M.
Recordamos que, dado ν > 0, dizemos que ϕ : M → R é ν-Hölder
na distância d em M se existe alguma constante C > 0 tal que |ϕ(1 )−
ϕ(2 )| ≤ Cd(1 , 2 )ν para todo par 1 , 2 em M.

1.1 Expansão
Transformação expansora em variedade

1
Dada uma variedade compacta (de dimensão finita) M e ƒ : M ‰
aplicação de classe C1 , dizemos que ƒ é expansora se existe σ > 1
e alguma métrica riemanniana k · k em M tais que

kDƒ ()k ≥ σkk para todo  ∈ M e  ∈ T M.

Exemplos que já conhecemos são os endomorfismos do toro Td indu-


zidos por uma aplicação linear A : Rn ‰ com A(Zd ) ⊂ Zd e espectro
fora do círculo unitário, isto é, todo autovalor λ de A satisfaz |λ| > 1.
Neste caso podemos tomar qualquer valor 1 < σ < inf{|λ| : λ ∈
sp(A)} para a taxa de expansão.

1.2 Bacia
Suporte e bacia de probabilidade invariante
O suporte de uma probabilidade μ é o conjunto spp(μ) dos pon-
tos tais que toda vizinhança tem medida positiva para μ.
Note que o suporte de μ é o espaço M se e somente se μ é positiva
em todo aberto de M.
Se μ é ƒ -invariante, então sua bacia (ergódica) é o conjunto B(μ)
dos pontos  ∈ M tais que

1 n−1
X Z
j
lim φ(ƒ ()) = φ dμ
n→∞ n j=0

para toda função contínua φ : M → R.


A bacia sempre é um conjunto invariante. Se μ é ergódica então
B(μ) tem μ-medida total.

Bacia pode ser maior do que o suporte


Observe que o suporte de μ sempre tem medida total.
Se p ∈ M é ponto fixo atrator para uma transformação diferenciá-
vel ƒ : M ‰, então existe vizinhança aberta U de p tal que ƒ n  −−−→ p
n→∞
para todo  ∈ U. Portanto todo ponto de U está na bacia da probabi-
lidade ƒ -invariante e ergódica μ = δp .
Porém temos spp(μ) = {p}.
Note também que o Teorema Ergódico nada afirma sobre o com-
portamento das órbitas em U \ {p}, pois apenas garante algo para
μ-quase todo ponto, ou seja, para o ponto p.

2
Única densidade invariante para transformação expansora
Teorema
Seja ƒ : M ‰ transformação expansora em variedade compacta co-
nexa M. Assuma que

M 3  7→ log | det Dƒ ()|

é ν-Hölder, para algum ν > 0.


Então ƒ admite única probabilidade invariante μ absolutamente
contínua com relação a toda medida de volume m em M.
Além disso, μ é ergódica, o seu suporte coincide com M e a sua
bacia tem volume total em M.

Estratégia da prova
É fácil ver que a pré-imagem por ƒ de um conjunto com volume
zero tem também volume zero. Portanto, ƒ∗ η é absolutamente contí-
nua com relação ao volume sempre que η seja absolutamente contí-
nua.
Em particular, a n-ésima imagem ƒ∗n m é absolutamente contínua

com relação a qualquer medida de volume m para todo n ≥ 1.


d(ƒ n m)

Provaremos que dm é limitada por alguma constante indepen-
dente de n ≥ 1 e mostramos que todo ponto de acumulação, na
Pn−1 j
topologia fraca∗ , de 1n j=0 ƒ∗ m é probabilidade invariante absolu-
tamente contínua com relação a m.
Um argumento adicional provará que tal ponto de acumu-
lação é único e satisfaz todas as propriedades no enunciado
do teorema.

1.3 Ramos inversos


Existência de ramos inversos contrativos
A hipótese de expansão serve para provar
Lema
Existe k ≥ 1 tal que todo ponto y ∈ M tem exatamente k pré-imagens
por ƒ . Além disso, existe ρ0 > 0 tal que, para qualquer pré-imagem 
de um ponto y ∈ M, existe uma aplicação h : B(y, ρ0 ) → M de classe
C1 tal que ƒ ◦ h = d, h(y) =  e

d(h(y1 ), h(y2 )) ≤ σ −1 d(y1 , y2 ) para todo y1 , y2 ∈ B(y, ρ0 ).

A condição de expansão implica que Dƒ é um isomorfismo em


todo ponto e portanto ƒ é localmente um difeomorfismo: dado  ∈ M,

3
existe ρ0 () > 0 tal que ƒ envia vizinhança V() de  difeomorfica-
mente sobre a bola de raio ρ0 () em torno de y = ƒ ().
O valor ρ0 () é uma função positiva e contínua do ponto  ∈ M,
já que ƒ é um difeomorfismo. Por compacidade, podemos tomar ρ0
independente de .
Então o número de pré-imagens de y ∈ M é limitado. Além disso, o
conjunto Cn dos pontos que têm exatamente n pré-imagens é aberto,
n ≥ 0; além disto, este conjunto é claramente fechado. Portanto, por
conexidade de M, o número de pré-imagens deve ser o mesmo para
todo y ∈ M.
Seja h = (ƒ | V())−1 . A condição de expansão garante

kDh(z)k = kDƒ (h(z))−1 k ≤ σ −1

para todo z no domínio de h. Agora para y1 , y2 ∈ B(y, ρ0 ) e γ :


[0, 1] → B(y, ρ0 ) curva C1 ligando y1 = γ(0) a y2 = γ(1), o com-
R1 R1
primento de h ◦ γ é ℓ(h ◦ γ) = 0 k(h ◦ γ)0 (t)k dt ≤ σ −1 0 kγ0 (t)k dt =
σ −1 ℓ(γ).
Portanto para a distância riemanniana numa variedade temos
C1
d(hy1 , hy2 ) = inf ℓ(η); η : ([0, 1], 0, 1) −→ (M, hy1 , hy2 )


C1
≤ inf ℓ(h ◦ γ); γ : ([0, 1], 0, 1) −→ (B(y0 , ρ0 ), y1 , y2 )


C1
≤ σ −1 inf ℓ(γ); γ : ([0, 1], 0, 1) −→ (B(y0 , ρ0 ), y1 , y2 )


= σ −1 d(y1 , y2 )

tal como foi enunciado.


Transformações h como acima são ramos inversos de ƒ . Po-
demos definir ramos inversos hn de ƒ n : dado y ∈ M e  ∈ ƒ −n (y),
sejam h1 , . . . , hn ramos inversos de ƒ com hj (ƒ n−j+1 ()) = ƒ n−j () para
1 ≤ j ≤ n. Como hj é contração, sua imagem está contida numa bola
de raio menor que ρ0 em torno de ƒ n−j (), logo hn = hn ◦ · · · ◦ h1 está
bem definida em B(y, ρ0 ) e ƒ n ◦ hn = d e hn (y) = .

Distorção limitada em ramos inversos


Este é o único ponto onde se usa a hipótese de que o jacobiano é
Hölder.
Proposição (lema de distorção)
Existe C1 > 0 tal que, dados quaisquer n ≥ 1, y ∈ M, e ramo inverso
hn : B(y, ρ0 ) → M de ƒ n , vale
| det Dhn (y1 )|
≤ exp(C1 d(y1 , y2 )ν ) ≤ exp(C1 (2ρ0 )ν )
| det Dhn (y2 )|

4
para todo y1 , y2 ∈ B(y, ρ0 ).
Vamos escrever hn = hn ◦ · · · ◦ h1 composição de ramos inversos de
ƒ e h = h ◦ · · · ◦ h1 para 1 ≤  < n, e ainda h0 = d.

Prova do lema da distorção


| det Dhn (y )|
Então pela regra da cadeia log | det Dhn (y1 )| =
2

n
X
= log | det Dh (h−1 (y1 ))| − log | det Dh (h−1 (y2 ))| .


=1

Mas log | det Dh | = − log | det Dƒ | ◦ h e log | det Dƒ | é (C0 , ν)-Hölder
para algum C0 > 0; e pelo lema anterior cada hj é σ −1 -contração,
logo

| det Dhn (y1 )| n


X n
X
log ≤ C0 d(h (y1 ), h (y2 )) ≤ C0 σ −ν d(y1 , y2 )ν .
  ν
| det Dhn (y2 )| =1 =1

Assim, para concluir a prova da proposição, basta fazer C1 = C0 −ν .


P
≥1 σ

1.4 Medidas Absolutamente Contínuas


Medidas absolutamente contínuas
Proposição
Existe C2 > 0 tal que (ƒ∗
n m)(B) ≤ C m(B) para todo mensurável B ⊂ M
2
e n ≥ 1, onde m é uma forma de volume na variedade M (ou seja,
n m)
d(ƒ∗
dm
≤ C2 , n ≥ 1).
Podemos supor que B está contido em alguma bola B0 = B(z, ρ0 )
para algum z ∈ M, pois caso contrário basta escrever B como união
enumerável de pedaços de diâmetro inferior a ρ0 / 2 e aplicar o argu-
mento seguinte a cada pedaço. Usando a proposição anterior, vem

m(hn (B)) | det Dhn | dm


R
m(B)
= RB ≤ exp(2C1 (2ρ0 )ν )
m(h (B0 ))
n
B
| det Dhn | dm m(B0 )
0

para todo ramo inverso hn de ƒ n no ponto z.


Além disso, também temos que (ƒ∗ n m)(B) = m(ƒ −n (B)) é a soma

de m(h (B)) sobre todos os ramos inversos, e analogamente para B0 ,


n

portanto
(ƒ∗
n m)(B)
m(B)
≤ exp(2C1 (2ρ0 )ν ) .
(ƒ∗
n m)(B )
0 m(B0 )

5
Naturalmente (ƒ∗n m)(B ) ≤ (ƒ n m)(M) = 1 e o volume das bolas com
0 ∗
um raio ρ0 está afastado de zero por alguma constante α0 > 0 que
só depende de ρ0 , pois  7→ m(B(, ρ0 )) é função contínua e positiva
no compacto M. Deduzimos então

n
exp(2C1 (2ρ0 )ν )
(ƒ∗ m)(B) ≤ m(B)
α0
para obter a conclusão da proposição basta fazer C2 = exp(2C1 (2ρ0 )ν )/ α0 .

Convergência na topologia fraca∗


Lema
Sejam η probabilidade num espaço métrico compacto X, φ : X →
[0, +∞) função η-integrável e (μn )n≥1 sequência de probabilidades
em X convergindo para probabilidade μ na topologia fraca∗ . Se μn ≤
φη para todo n ≥ 1, então μ ≤ φη.
Toda medida boreliana finita num espaço métrico compacto é re-
gular. Para B mensurável e ϵ > 0, seja Kϵ compacto dentro de B e Uϵ
aberto contendo B tais que μ(B\Kϵ ), (φη)(B\KR ϵ ), μ(Uϵ \B), (φη)(Uϵ \B)
são todos inferiores a ϵ > 0 (onde (φη)(Y) = Y φ dη).
Seja Aϵ vizinhança aberta de Kϵ tal que (φη)(Aϵ \ Kϵ ) < ϵ e μ(Aϵ \
Kϵ ) < ϵ. Podemos assumir sem perda de generalidade que ∂Aϵ tem
μ-medida nula. Temos então μ(Aϵ 4 B) ≤ μ(Uϵ \ B) + μ(B \ Kϵ ) < 2ϵ e
analogamente para a medida φη.
∗
Então μn −−→ μ garante μ(Aϵ ) = lim μn (Aϵ ) ≤ (φη)(Aϵ ) e fazendo
ϵ → 0 obtemos μ(B) ≤ (φη)(B).
Como B era qualquer boreliano fixado, a prova do lema está com-
pleta.

Existência de medida invariante abs. contínua


Corolário Pn−1 j
Todo ponto de acumulação μ da sequência n−1 j=0 ƒ∗ m na topo-
logia fraca∗ é uma probabilidade invariante para ƒ , absolutamente
contínua em relação ao volume m.
Pn−1 j
Fazendo φ ≡ C2 e η = m no lema anterior com μn = n−1 j=0 ƒ∗ m,
basta aplicar o lema a qualquer subsequência convergente de μn na
topologia fraca∗ para obter um ponto de acumulação μ ≤ C2 m.
Como ƒ : X ‰ é transformação contínua num espaço métrico com-
pacto, já sabemos que o ponto de acumulação μ é também ƒ -invariante,
completando a prova do corolário.

6
Medida invariante abs. contínua e ergódica
Vamos mostrar que μ acabada de construir é a única probabilidade
invariante absolutamente contínua em relação ao volume e, além
disso, é ƒ -ergódica.
Fixamos uma partição P = {U1 , . . . , Us } de M em regiões com inte-
rior não vazio e diâmetro menor que ρ0 e refinamos Pn esta partição
via ƒ como na definição de entropia. Então, pelo lema da contração
nos ramos inversos, temos que dim Pn ≤ ρ0 σ −n+1 .
Lema (pontos de densidade)
Seja (Pn )n≥1 sequência de partições num espaço métrico compacto X
com dim Pn → 0, η probabilidade em X e B mensurável com η(B) >
η(B∩V )
0. Então existem Vn ∈ Pn , ∀n ≥ 1, tais que η(Vn ) > 0 e η(V )n −−−→ 1.
n n→∞

Prova do lema de pontos de densidade


Dado 0 < ϵ < η(B), seja Kϵ compacto ⊂ B com η(B \ Kϵ ) < ϵ.
Como dim Pn → 0 a medida da união Aϵ,n dos átomos de Pn que
intersectam Kϵ satisfaz η(Aϵ,n \Kϵ ) < ϵ para n suficientemente grande.
Se
η(B) − ϵ
η(Kϵ ∩ Vn ) ≤ η(Vn )
η(B) + ϵ
para todo Vn ∈ Pn que intersecta Kϵ , deduziríamos que
η(B) − ϵ η(B) − ϵ
η(Kϵ ) ≤ η(Aϵ,n ) ≤ (η(Kϵ ) + ϵ) ≤ η(B) − ϵ,
η(B) + ϵ η(B) + ϵ
Esta contradição mostra que deve existir Vn ∈ Pn tal que
η(B) − ϵ
η(B ∩ Vn ) ≥ η(Kϵ ∩ Vn ) > η(Vn )
η(B) + ϵ
implicando η(Vn ) > 0. Fazendo ϵ → 0 vem o enunciado do lema.

Coberturas de Markov para homeomorfismos expansores


Vamos agora imitar o argumento usado na prova da unicidade
da medida invariante absolutamente contínua para a transformação
de Gauss. Nesta transformação particular temos uma partição do
espaço muito especial, em que a imagem de qualquer elemento da
partição é o espaço inteiro.
No caso de transformações expansoras gerais em variedades, não
temos sempre esta propriedade, mas podemos obter uma proprie-
dade semelhante que é suficiente para levar a mesma linha de raci-
ocínio até à conclusão que procuramos: vamos mostrar que todo
homeomorfismo expansor de um espaço métrico admite uma
cobertura de Markov.

7
Homeomorfismos expansores
Um homeomorfismo local ƒ : X ‰ de um espaço métrico compacto
admite ρ0 = ρ0 (ƒ ) > 0 tal que para todo aberto conexo U com
dim(U) < ρ0 , vale que ƒ −1 U = V1 ∪ · · · ∪ Vk tem número finito de
componentes conexas abertas V , cada uma homeomorfa a U,
isto é ƒ | V : V → U é um homeomorfismo, para todo  = 1, . . . , k.
Um homeomofismo local é expansor se existem constantes  ≥
b > 1 e ρ1 > 0 para as quais
B(ƒ (), br) ⊂ ƒ B(, r) ⊂ B(ƒ (), r)


para todo  ∈ X e qualquer 0 < r < ρ1 .


Note que todos os homeomorfismos expansores são au-
tomaticamente transformações localmente (bi)lipschitzianas
(exercício).

Existência de ramos inversos contrativos


Pelo que já vimos, todos os difeomorfismos expansores de
uma variedade compacta são homeomorfismos expansores.
Como podemos assumir sem perda de generalidade que ρ1 <
ρ0 , segue das definições que, se ƒ é homeomorfismo expansor,
então existe 0 < λ < 1 tal que, sempre que U é aberto conexo
com dim(U) < ρ0 , temos ƒ −1 U = V1 ∪ · · · ∪ Vk com of V abertos
conexos, homeomorfos a U via ƒ | V e dim V ≤ λ dim U. (Basta
tomar λ = b−1 . Verifique!)
Isto é o mesmo que dizer que todo homeomorfismo expansor de
um espaço métrico compacto admite ramos inversos contrativos, tal
como já obtivemos para difeomorfismos expansores de variedade
compacta. Porém não podemos garantir que valha a propriedade
de distorção limitada!

Existência de Coberturas de Markov


Dizemos que uma cobertura aberta U de X é uma cobertura de
Markov se satisfaz
U, V ∈ U e ƒ (U) ∩ V 6= ∅ =⇒ ƒ (U) ⊃ V.

Lema
Todo homeomorfismo expansor ƒ : X ‰ de um espaço compacto X ad-
mite uma cobertura de Markov finita P com diâmetro arbitrariamente
pequeno. Além disto, se P ∈ P, então P = int P e X \ P = int (X \ P).
Estas coberturas permitem uma construção simples de uma parti-
ção de Markov para homeomorfismos expansores.
(Prova do Lema)

8
Partições de Markov
Uma partição de Markov para uma transformação ƒ : X ‰ num
espaço compacto é uma família P enumerável (pode ser finita) que
satisfaz
1. ∪P∈P P = X;

2. P = int P para cada P ∈ P;


3. se P 6= Q com P, Q ∈ P, então int P ∩ int Q = ∅;
4. para P, Q ∈ P com ƒ (int P) ∩ int Q 6= ∅, então ƒ (P) ⊃ Q.
Como consequência da existência de coberturas de Markov finitas
com diâmetro arbitrariamente pequeno, obtemos
Proposição
Todo homeomorfismo expansor ƒ : X ‰ de um espaço compacto X
admite partição de Markov finita com diâmetro arbitrariamente pe-
queno.

Construção de partição de Markov


Seja ϵ > 0 e U = {U1 , . . . , Up } cobertura de Markov finita de X para
ƒ com dim U < ϵ.
Defina P = {U1 , X \ U1 } ∨ · · · ∨ {Up , X \ Up }, isto é, a coleção de
todas as interseções não vazias

P[1] P[p]
P = U1 ∩ · · · ∩ Up ,

onde P[j] = ± e para qualquer A ⊂ X escrevemos

A+ = A e A− = int (X \ A).

Então P é uma partição de Markov para ƒ com dim P < ϵ (exer-


cício).

Aplicações das partições de Markov


A existência de uma partição de Markov permite relacionar a di-
nâmica de ƒ : X → X com a dinâmica de um deslocamento de Markov
σ : + +
A → A via a codificação natural

θ :  7→  ⇐⇒  ∈ int P

e  7→ h() := θ(ƒ j ))j≥0 ∈ + A , onde A é a matriz de transição dada


por  = 1 ⇐⇒ ƒ (int P ) ∩ int P 6= ∅.
É um exercício importante verificar que h : X → +
A é uma semi-
conjugação entre ƒ e σ. Além disto, restrita às órbitas que nunca

9
intersectam o bordo ∂P = ∪ ∂P , esta transformação é uma conjuga-
ção com sua imagem!
Isto permite desenvolver a “Teoria Ergódica das Transforma-
ções Expansoras”, título da dissertação de Mestrado de Marcos
Craizer, IMPA, 1985.

Ergodicidade de prob. inv. abs. cont. para transformações


expansoras
Outra aplicação é na prova da ergodicidade e unicidade da pro-
babilidade invariante absolutamente contínua para transformações
expansoras.
Uma partição de Markov tem uma propriedade muito especial
quando refinada (análoga ao que ocorre com a transformação de
Gauss): se P ∈ Pn , então ƒ n−1 P é um elemento de P.
De fato, P ∈ P2 é tal que para alguns P0 , P1 ∈ P vale int P =
int (P0 ∩ ƒ −1 P1 ) = int (ƒ −1 (P1 )) ∩ int P0 6= ∅. Então int ƒ (P0 ) ∩ int P1 6= ∅
e portanto ƒ (P0 ) ⊃ P1 . Segue que alguma componente conexa de
int (ƒ −1 P1 ) está contida no interior P0 .
Assim cada P ∈ P é união de componentes conexas de ƒ −1 P.

Consequência das propriedades de partição de Markov


Mais ainda, cada elemento P ∈ P2 é precisamente uma destas
componentes conexas, ou seja, se tivermos P = P0 ∩ ƒ −1 P1 , então
deduzimos que ƒ (P) = P1 .
Resulta assim que para P ∈ Pn temos

P = P0 ∩ ƒ −1 P1 ∩ · · · ∩ ƒ −n+1 Pn−1

para alguns P0 , . . . , Pn−1 ∈ P e também que

ƒ n−1 P = Pn−1 ∈ P

para qualquer n ≥ 2.

Medida invariante abs. contínua e ergódica


Lema (ƒ é quase topologicamente exata)
Se A ⊂ M é positivamente invariante para ƒ com m(A) > 0, então A
tem volume total em algum U ∈ P, ou seja, existe 1 ≤  ≤ s tal que
m(U \ A) = 0.
Seja P uma partição de Markov para ƒ . Então, pelo lema dos pon-
m(V \A)
tos de densidade, dado ϵ > 0 existe Vn ∈ Pn tal que m(Vn ) ≤ ϵ para
n

10
n ≥ Nϵ , e seja U(n) = ƒ n−1 (Vn ). A distorção limitada aplicada ao ramo
inverso de ƒ n−1 que envia U(n) em Vn dá

m(U(n) \ A) m(ƒ n−1 (Vn \ A)) m(Vn \ A)


≤ ≤ α0 C2 < α0 C2 ϵ.
m(U(n) ) m(ƒ n−1 (Vn )) m(Vn )

Como P é finito, existe 1 ≤  ≤ s tal que (n) =  para infinitos valores


de n e então obtemos m(U \ A) = 0.

Transformação expansora em variedade conexa é topologica-


mente exata
Lema (topologicamente exata)
Dado qualquer aberto não vazio U ⊂ M, existe N ≥ 1 tal que ƒ N (U) =
M.
Seja  ∈ U e r > 0 com B(, r) ⊂ U. Dado n ≥ 1, suponha que
ƒ n (U) não cobre M. Então existe curva γ ligando ƒ n () a um ponto
y ∈ M \ ƒ n (U) com comprimento menor que dim M + 1.
Pelas inversas locais de ƒ n obtemos γn tal que ƒ n ◦ γn = γ ligando
 a um ponto yn ∈ M \ U (se yn ∈ U, então ƒ n yn = y ∈ ƒ n U, uma
contradição).
dim M+1
log
Mas r ≤ dist(, M\U) ≤ ℓ(γn ) ≤ σ −n (dim M+ 1), logo n ≤ r
log σ
e ƒ (U) = M para n suficientemente grande.
n

Invariantes têm medida nula ou total


Corolário
Se A ⊂ M é um conjunto positivamente invariante com volume posi-
tivo, então m(M \ A) = 0.
Já sabemos que A ⊃ U , m mod 0 para algum U ∈ P e seja U interior
de U e N > 1 tal que ƒ N U = M. Então M \ A = ƒ N (U) \ ƒ N (A) ⊂ ƒ N (U \ A)
tem volume zero, pois m(U \ A) = 0 e ƒ N é transformação de classe
C1 .
Para completar a prova do Teorema usamos
Corolário
Seja μ probabilidade ƒ -invariante absolutamente contínua. Então μ é
ergódica e a sua bacia B(μ) tem volume total em M e spp μ = M.

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Ergodicidade e unicidade de probabilidade invariante absolu-
tamente contínua
Se A é um subconjunto invariante qualquer então, pelo corolário
anterior, A tem volume zero ou M \ A tem volume zero.
Uma vez que μ  m, segue que μ(A) = 0 ou μ(M\A) = 0, provando
que μ é ƒ -ergódica.
Mas B(μ) é um conjunto invariante com μ(B(μ)) = 1 pelo Teorema
Ergódico. Logo m(B(μ)) > 0 e, consequentemente, deve ter volume
total:

m B(μ) = 1.


Final da prova do teorema


Isto garante que μ é a única probabilidade ƒ -invariante absoluta-
mente contínua, pois sua bacia é total: se houvesse outra μ1 pro-
babilidade ƒ -invariante, ergódica e absolutamente contínua, R então
m(B(μ1 )) > 0 e portanto B(μ) ∩ B(μ1 ) 6= ∅. Logo teríamos φ dμ =
φ dμ1 , ∀φ ∈ C0 (M, R) e deduzimos μ = μ1 pelo Teorema de Repre-
R

sentação de Riesz-Markov.

Finalmente, tal como acima, como spp μ é um conjunto compacto


positivamente invariante, ele tem que coincidir com M:

spp μ = M

tal como no enunciado do teorema.

Observação
É possível mostrar que a densidade dμ/ dm é Hölder e limi-
tada de zero.
Em particular, a probabilidade μ é equivalente ao volume
m, no sentido de que elas têm os mesmos conjuntos com me-
dida nula.
Para mais pormenores: “Stochastic Dynamics of Deterministic Sys-
tems”, Marcelo Viana, XXI Colóquio Brasileiro de Matemática, IMPA,
1997.
A conclusão do Teorema é falsa, em geral, se omitirmos
a hipótese de que o jacobiano é Hölder: a distorção limita
é crucial neste argumento e quando falha não vale em geral
n m tem densidade uniformemente limitada independen-
que ƒ∗
temente de n ≥ 1.

12
Inexistência genérica de medida invariante absolutamente
contínua
De fato, resultados recentes
ˆ Avila, A; Bochi, J. A generic C1 map has no absolutely conti-
nuous invariant probability measure, Nonlinearity 19 (2006)
2717–2725.
ˆ Avila, A; Bochi, J. Generic expanding maps without absolu-
tely continuous invariant σ-finite measure. Mathematical
Research Letters 14 (2007), 721–730.

mostram que se não temos as condições suficientes para obter dis-


torção limitada, então genericamente não se tem sequer uma me-
dida invariante absolutamente contínua σ-finita (possivelmente com
massa infinita).

2 Cobertura de Markov para homeomor-


fismos expansores
2.1 Construção via pré-imagens
Prova da existência de cobertura de Markov
Lema
Todo homeomorfismo expansor ƒ : X ‰ de um espaço compacto X ad-
mite uma cobertura de Markov finita P com diâmetro arbitrariamente
pequeno. Além disto, se P ∈ P, então P = int P e M \ P = int (M \ P).
Tome uma cobertura aberta finita U0 de X por bolas com diâmetro
inferior a ρ, onde 0 < ρ ≤ (1 − λ)ρ̃/ 2 para algum 0 < ρ̃ < ρ0 , e
defina V1 como a cobertura aberta finita formada pelas componentes
conexas de ƒ −1 U para cada U ∈ U0 :

V1 = {CC(ƒ −1 U) : U ∈ U0 }.

Agora para cada U ∈ U0 seja

U(1) = {V ∈ V1 : V ∩ U 6= ∅}.
[

É claro que U1 = {U(1) : U ∈ U0 } é uma cobertura aberta finita de


X, pois vale U(1) ⊃ U para todo U ∈ U0 .
Agora repetimos indutivamente a construção: para j ≥ 1 seja

Vj+1 = {CC(ƒ −1 V) : V ∈ Vj }

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U(1)
U U
−1
f (U)

Figura 1: Pré-imagens e construção de U(1) .

a família das componentes conexas de ƒ −1 V para cada V ∈ Vj . Temos

V ∈ Vj =⇒ dim V ≤ λj dim U0 , ∀j ≥ 1.

Para cada U(j) ∈ Uj defina

U(j+1) = U(j) ∪ {V ∈ Vj+1 : V ∩ U(j) 6= ∅}.


[

Isto fornece uma nova cobertura aberta finita Uj+1 de X.


Vamos estimar o diâmetro destas coberturas.

2.2 Diâmetro nova cobertura


Diâmetro das novas coberturas
Uma vez que V ∈ Vj =⇒ dim V ≤ λ−j dim U0 , ∀j ≥ 1, é claro que

dim U(1) ≤ dim U + 2λ dim U0

e por indução

dim U(j+1) ≤ dim U(j) + 2λj+1 dim U0 .

Portanto, para todos os j ≥ 1


j+2
1 − λj+3
dim U(j+1) ≤
X
2λk dim U0 ≤ 2ρ < ρ̃ < ρ0 ,
k=0
1−λ

pela escolha inicial de ρ ≤ (1 − λ)ρ̃/ 2.


Isto mostra que o passo indutivo pode ser sempre realizado.

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A cobertura final
Para cada U ∈ U0 defina

U(∞) = U(j) .
[

j=1

Estes conjuntos formam outra cobertura aberta finita U∞ de X. Pela


estimativa anterior dim U(∞) ≤ ρ̃, ∀U ∈ U0 , e podemos assim obter
U∞ com diâmetro arbitrariamente pequeno.
Esta é uma cobertura de Markov (note: o bordo destes abertos
pode ser fractal!) pelos lemas seguintes.
Lema dinâmico
Se U, V ∈ U∞ e ƒ (U) ∩ V 6= ∅, então ƒ (U) ⊃ V.

Lema topológico
Todo U ∈ U∞ satisfaz U = int U e M \ U = int (M \ U).

Prova do Lema Dinâmico


Sendo U(∞) , V (∞) ∈ U∞ uniões crescentes, para U, V ∈ U0 temos

ƒ (U(∞) ) ∩ V (∞) 6= ∅ =⇒ ∃j0 ≥ 1, ƒ −1 V (j0 ) ∩ U(j0 ) 6= ∅.

Por construção isto significa que

U(j+1) ⊃ CC(ƒ −1 V (j) ), ∀j ≥ j0 .

Portanto

U(∞) = U(j+1) ⊃ CC ƒ −1 V (j) = CC(ƒ −1 V (∞) ).


[ [ 

j≥j0 j≥j0

Isto termina a prova do Lema Dinâmico.


A prova do Lema Topológico é baseada em argumentos padrão da
Topologia Geral e fica como exercício.
(Retorno ao enunciado do lema)

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