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História, imagem e narrativas 

No 16,  abril/2013 ‐ ISSN 1808‐9895 ‐ http://www.historiaimagem.com.br 

A imagem na construção da identidade da TV brasileira

Sonia Wanderley
Doutora em História Social UERJ
soniamaiw@gmail.com

Resumo:
As imagens que forjaram as identidades visuais das primeiras emissoras de televisão no Brasil refletem não
apenas a procura pela fidelidade do telespectador em um momento de afirmação do novo veículo no país e no
mundo, mas, principalmente, a constituição de significados que, rapidamente, se afastaram daqueles da “época
do rádio”. Partindo do estudo acerca da construção das identidades visuais para as primeiras emissoras de TV do
país, este trabalho procura desvelar elementos constitutivos da relação entre os campos político e cultural
brasileiros entre as décadas de 1950 e 1970.

Palavras-chave: identidade televisiva, história da TV, cultura e televisão.

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Estética e ...

No início, dizem os pioneiros, a televisão era essencialmente o rádio com imagem, ou


melhor, o rádio televisionado. Mas os profissionais sofriam com inúmeras dificuldades
técnicas e muito desconhecimento de como trabalhar a imagem que, em última instância,
deveria diferenciar a televisão do rádio:

“Só tem um desenho com um índio como aqueles que a gente vê nos filmes de
faroeste. Também ficam tocando essas músicas sem letra que o rádio toca de
madrugada. Se isso é televisão, então acho que não vai tirar o lugar do rádio. É de dar
sono!1”. (FANUCCHI, 1996, p. 26)

Sendo assim, a televisão obrigou-se a buscar profissionais que pudessem, através de


alguma experiência no trabalho com a imagem, dar personalidade própria ao veículo. Quando
a concorrência ganhou vulto, criar uma imagem diferenciada junto aos telespectadores tornou-
se fundamental para as emissoras, que, a princípio, não conseguiam fazê-lo através da
programação.

Os pioneiros nesse setor foram essencialmente desenhistas, publicitários e cenógrafos


teatrais. Convocados por sua capacidade de desenhar ou produzir comunicação visual, esses
profissionais foram aproveitados pela tevê em diversas áreas, da produção à direção, e criaram
identidades visuais tanto para os programas televisivos, diferenciando-os dos radiofônicos,
como para as próprias emissoras.

O quadro abaixo indica os nomes mais citados por representantes do grupo televisivo,
sendo representativo daqueles que souberam utilizar a imagem como linguagem nas três
primeiras décadas de televisão no Brasil:

Produtores de imagem
Nomes Atividades Emissoras Outras atividades
Direção de criação TV Tupi Jornalismo impresso
Desenhista de quadrinhos
Álvaro de Moya Direção artística TV Paulista Cinema
TV Excelsior Publicidade
TV Bandeirantes Professor universitário

Direção de programa TV Rio Jornalismo impresso


Charge
Borjalo
Produção independente para
Direção geral de jornalismo TV Excelsior
a TV (Esquire)

1
Declaração de um técnico da Rádio Difusora de São Paulo, em outubro de 1950.

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Direção geral de TV Globo


programação
Direção de arte TV Excelsior
Direção cenografia
Cyro Del Nero Cenógrafo teatral

Direção de arte TV Globo


Hans Donner Produção visual TV Globo Designer
Cameraman
Helio Mugnaini TV Record ?
Cenografia
Produção visual TV Tupi
Rádio
Criação e produção
Mario Fanucchi Publicidade
Professor universitário
Direção artística TV Cultura
Desenhista e roteirista
Syllas Roberg Produção TV Paulista
quadrinhos

Tudo começou com Álvaro Moya, que, em 1950, na inauguração da TV Tupi/SP, era
um jovem artista, apaixonado por cinema e preocupado em desenhar quadrinhos, apesar da
campanha então existente contra esse produto cultural, diz ele (OLIVEIRA SOBRINHO,
2000, p. 28-32). Sua amizade com o pessoal da Rádio Tupi, como Cassiano Gabus Mendes,
Dermival Costalima e Walter George Durst, resultou em uma indicação para desenhar os
letreiros do show de inauguração, dia 18 de setembro de 1950. Eram cartazes em cartolina
cinza, colocados em estantes de partituras de músicos e reproduzidos pela câmera ao vivo. O
primeiro dizia: “PRF-3 TV apresenta”. Ele foi utilizado, segundo Moya, até 1960, quando a
TV Tupi de São Paulo trocou o 3 do dial pelo 4.

Em 1955, Moya, acompanhando Costalima, seu antigo diretor, transferiu-se para a


recém-inaugurada TV Paulista, onde ocupou o cargo de assistente de direção e diretor de TV.
A experiência com os quadrinhos deu-lhe uma percepção diferenciada no corte das imagens e
habilidade na utilização de uma linguagem mais ágil, adequada à televisão:

“Para fazer histórias em quadrinhos, tinha que saber escrever e li muita literatura, de
autores como (...) Hamlet, Cervantes, Tolstoi, Balzac e os brasileiros. Vi muitos
filmes, pois achava parecida a forma dos quadrinhos e as imagens do cinema. Fui
orientado pelos críticos de cinema (...), sempre aprendendo (...)” (OLIVEIRA
SOBRINHO, 2000, p.29).

Sua atuação na TV Paulista garantiu-lhe uma bolsa de estudo, oferecida pelo governo
dos Estados Unidos, em 1958, para aprender sobre televisão e história em quadrinhos na CBS

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Television, de Nova Iorque. Esse aprendizado permitiu-lhe um contato essencial com o


mundo do show bussiness e a relação entre cinema, shows musicais e teatrais e o domínio da
network.

Em sua volta ao Brasil, ganhou o Prêmio Roquete Pinto como melhor diretor de TV2
(OLIVEIRA SOBRINHO, 2000, p.29), sendo convidado para a direção artística da recém-
inaugurada TV Excelsior, que pretendia ser a primeira rede nacional de televisão. Explorando
principalmente a linguagem teatral, faz dupla com o cenógrafo Cyro Del Nero na criação de
programas premiados, como Teatro 9, Teleteatro Brastemp e Teatro 63. Além disso, inova ao
criar, pela primeira vez no Brasil, a identidade visual de uma emissora de televisão.

Antes dessa dupla, um jornalista foi o primeiro brasileiro a utilizar o desenho para
diferenciar esteticamente uma emissora de TV no país. Mario Fanucchi é um dos pioneiros
mais respeitados e citados quando o assunto é programação visual na televisão (OLIVEIRA
SOBRINHO, 2000, p.170-175). Mas, essa atividade chegou à sua vida por acaso.

Fanucchi começou sua carreira no rádio paranaense, em 1945. Atuando na Rádio Tupi
paulista, já na década de 1950, como locutor, produtor e diretor de programas, era conhecido
por gostar de fazer caricaturas dos colegas3.

Foram essas caricaturas que o levaram para a tevê. Cassiano Gabus Mendes, então
diretor da TV Tupi, o convidou para ser responsável pela comunicação visual da emissora.
Junto com dezenas de cartazes com títulos de programas, elencos e nomes de músicas, o
jornalista criou o símbolo que se firmaria como a identificação das Emissoras Associadas, o
indiozinho da Tupi.

Além de Fanucchi, Mauro Borja Lopes, ou simplesmente Borjalo, foi mais um


jornalista que a partir de sua experiência com charges, agora na imprensa escrita, foi utilizado
na produção de programas para a televisão.

O jornalista e caricaturista4 iniciou a vida de jornalista, ainda muito jovem, como


chargista no jornal Folha de Minas e pouco tempo depois tinha seus desenhos publicados
diariamente no Diário de Minas. No Rio de Janeiro, trabalhou nas revistas Manchete, O
Cruzeiro e A Cigarra.

2
Prêmio outorgado pela TV Record a todos os profissionais da televisão. Moya garantiu o seu pela produção do
teleteatro “50 Mil Dólares”, baseado em trabalho de Hemingway.
3
Depoimentos dados por Mario Fanucchi. Disponível em: www.museudatv.com.br. Acesso: 17/06/2004.
4
Depoimentos de Borjalo. In: www.museudatv.com.br. Acesso: 17/06/2004.

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Seus trabalhos já estavam sendo publicados também no exterior5, quando foi


convidado por Fernando Barbosa Lima para fazer parte de sua produtora independente, a
Esquire. Em seu primeiro contato com a televisão, Borjalo participou da equipe responsável
pela produção de um dos mais importantes e premiados telejornais brasileiros, o Jornal de
Vanguarda. Nele, desenhava caricaturas de personalidades nacionais de diversas áreas que
eram manipulados e recebiam as vozes dos locutores.

Outro personagem que com sua história demonstra que a televisão, apesar das
dificuldades iniciais e desconhecimento dos caminhos a seguir, desde os primeiros dias
preocupou-se com sua produção visual é Cyro Del Nero. Seu início na televisão deveu-se ao
amigo Manoel Carlos que, em 1956, pediu-lhe que preparasse “algo visual” capaz de vender a
idéia de um programa à TV Excelsior, que estava para ser inaugurada: “Eu deveria ilustrar,
fazer um book, um espelho do programa, para mostrá-lo ao diretor artístico da Excelsior,
Álvaro Moya” (OLIVEIRA SOBRINHO, 2000, p. 63). O diretor gostou tanto de seu trabalho
gráfico que o convidou para ser o diretor de arte da emissora. Três meses depois de
contratado, passou a acumular a direção do Departamento de Cenografia.

Na TV Excelsior, na década de 1960, Cyro fez dupla com Moya, criando o primeiro
programa de identidade visual para uma televisão brasileira. O telespectador passava a
reconhecer a emissora à qual estava assistindo por sua imagem: “Pelo design, tipologia e
estilo gráfico dos cartões identificadores dos intervalos”, afirma Del Nero. Os dois
profissionais eram responsáveis também pela cenografia diferenciada dos shows da emissora.

A experiência teatral levou-o a colocar no ar imagens do repertório das artes plásticas:

“Obras de Juan Miró, Dali e Magritte como cenografia para televisão; a reconstrução
tridimensional de uma favela no palco; os candelabros da Traviatta, às 8 da noite do
domingo, eram novidade absoluta em 1960. Além do prazer de cenografar para as
personalidades teatrais, diretores (Ziembinsky, entre eles) e atores que trabalhavam
também na Excelsior” (OLIVEIRA SOBRINHO, 2000, p. 64).

Os cenários realizados por Del Nero e os ambientes dos shows e programas marcaram
época e foram copiados posteriormente. Na TV Globo, tornou-se diretor de arte, tendo sido
responsável pela primeira abertura do Fantástico, além de diversas outras aberturas e vinhetas
de novelas.

5
Os desenhos de Borjalo de foram publicados nas páginas do Picture Post de Londres, do Paris Match de Paris
e de Epoca de Milão.

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Seu depoimento é extremamente ilustrativo de como a estética no campo televisivo foi


resultado da experiência de diversos setores artísticos, incluindo o teatro e as artes plásticas.
Apesar do preconceito inicial de profissionais dessa área, a televisão transformou-se em um
fecundo campo de trabalho para muitos jovens, artistas e técnicos, que vivenciaram a
experiência de pensar o trabalho desenvolvido no veículo como arte coletiva sempre em
movimento:

“Durante os últimos cinqüenta anos envolvi meus recursos artísticos com o livro, o
teatro, o cinema, a fotografia, a moda, e vivi, sobretudo, o vertiginoso trabalho de
equipe da televisão. A televisão me ensinou a trabalhar sem tempo hábil, sem os
recursos sonhados, com resultados efêmeros e como se a realização fosse apenas de
esboços. Nunca a satisfação de um trabalho completo” (OLIVEIRA SOBRINHO,
2000, p. 66).

Percebe-se o quanto a televisão, como expressão cultural de massa, concede um


significado positivo ao produto que é tido como efêmero. Numa época em que arte e indústria
se mesclam, o veículo reúne as artes industriais às plásticas para forjar sua identidade estética.

Assim, nos anos 1970, o desenho industrial chega à televisão brasileira. O melhor
exemplo, do impacto produzido pela tecnologia e pela indústria na nova “arte popular”
(HOBSBAWM, 1995, p. 196), é o trabalho do designer Hans Donner. Nascido na Áustria,
chegou ao Brasil com 25 anos, formado por uma das melhores escolas de design da Europa6.
Em seu site, o artista destaca a importância da tecnologia para a criação, em 1976, do famoso
globo vítreo, símbolo que identifica a TV Globo e que desde então vem sendo apenas
modernizado:

“Para criar a primeira animação do logotipo da Globo, Hans e seu amigo Rudi Bohm
usaram a máquina Oxberry da emissora de televisão de Viena. Compreendendo o
potencial da máquina, ao ver as animações que haviam feito, a Globo comprou uma
igualzinha – que, naquela época, custava algo em torno de meio milhão de dólares”7.

Naquele momento, o mago da computação gráfica, como Hans Donner ficou


conhecido, teve de invadir a televisão austríaca, à noite, para poder filmar a trucagem que deu
origem ao primeiro trabalho que apresentou à TV Globo (ibidem, p.103). Com o sucesso da
novidade, a emissora começou um processo de incorporação dessa tecnologia e do estilo
futurista do designer austríaco ao seu parque industrial.

6
A secular escola Höhere Graphische Bundeslehr-und Versuchanstalt, em Viena.
7
Disponível em: www.hansdonner.com/portuguese/tvprojects/index.htm. Acesso: 26/06/2004.

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O sucesso de
d uma programação visual
v televiisiva baseadda na compputação gráffica e no
design foi
f copiado não apenass no Brasil. Nas duas últimas
ú décadas do sécculo XX, o trabalho
de Hanss Donner traansformou-se em referêência para televisões
t d diversas ppartes do mu
de undo, da
norte-am
mericana àss européias.

E síntese,, o conhecim
Em mento da coonjuntura na qual se coonsolidou a televisão no
n Brasil
é fundaamental parra a compreeensão dessa mídia, não
n apenas como emppresa, mas também
como caampo culturral que incoorporou proffissionais dee diversas origens.
o

C
Com raras exceções, os que deesempenharram cargos de direçãoo artística na tevê
brasileirra na décadda de 1950 tinham
t cercca vinte e po
oucos anos. Jovens e ooriginários da
d classe
média tiveram acessso e foram
m influenciaddos pelas novas
n artes da
d imagem,, tanto da fo
otografia
quanto do cinemaa, bem com
mo pelas mudanças na concepção estéticca que as técnicas
industriais impunhaam às ‘artess tradicionaais’, como ass artes plástticas e o teaatro.

... Identtidade corp


porativa
A imagem deveria darr singularidaade à tevê em
e relação ao rádio. M
Mas se profi
fissionais
que nelaa trabalhavaam não sabiiam, no iníccio, como fazer
fa isso, o público percebia: “A gente,
g lá
em casaa, vê televvisão desde que comeeça até ‘Im
magens do Dia’.
D O duuro é esperrar pelos
mas vendo a cara daqueele índio enffezado!”8 (F
program FANUCCH
HI, 1996, p. 773).

O impaciennte telespecttador referiia-se à prim


meira logom
marca do cannal 3 de Sãão Paulo,
feita a partir
p daqueela que idenntificava a em
missora de rádio, do mesmo
m grupoo empresariial: “Um
índio coom expresssão severa, tendo umaa das mãos em pala e a outra seegurando um
u arco”
(idem, p.
p 74).

Figura 1
8
Trecho de carta envviada à TV Tupi,
T em 17 de dezembro o de 1950. Quando cita “Imagens do o Dia”, o
telespectaador está se referindo ao primeiro proograma noticcioso apresenttado pela TV
V Tupi, que fechava a
programaação diária do canal 3.

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O austero símbolo,
s prooduzido denntro do conttexto da déccada de 19330, refletia a leitura
nacionaalista de Asssis Chateaubbriand diannte de um paaís marcadoo por lutas ppolíticas, reb
beliões e
ideologiias em dispputa9. Em 1950,
1 o sím
mbolo da naação – reprresentada siimbolicameente pelo
indígenaa, espreitanndo o seu devir – deslocado de seu contexxto temporral, não pro
oduzia o
mesmo efeito sociaal. Ilustranddo os longoos intervalo
os, necessáriios em tem
mpos da televisão ao
vivo, elee era apenas um “índioo enfezado”.

A solução foi
f dar suavvidade ao ícone, de form
ma que sugerisse maioor aproximação com
o públicco, obrigaddo àquelas longas espeeras. Surgiu
u o indiozinho antenaado da Tupi, dando
identidaade à prograamação por ele apresenntada ao teleespectador (Figuras.
( 2 e 3).

C
Como afirm
ma, Mário Fanucchi, além de attender a “ppreocupaçãoo da empreesa” em
“manterr a conotaçãão indigenista” na idenntidade da TV
T Tupi, accreditava-see que, “por se tratar
de umaa criança (...), desperttaria a tolerrância dos telespectaddores irritaddos com oss longos
intervalos”, além de
d atrair a siimpatia das crianças, neutralizand
n do a “rejeiçãão de seus pais
p pelo
índio addulto”(FAN
NUCCHI, 19996, p. 77-778).

Figura 2 Figura 3

A mudanças que o háábito de assiistir televisãão vinha proovocando nno cotidiano


As o privado
familiarr já transparreciam nas ações
a de prrofissionais e executivoos da televissão. Em ressposta ao
“pedidoo de ajuda dos
d pais de crianças hiipnotizadas pela televisão a pontoo de perder o sono”
(OLIVE
EIRA SOBR
RINHO, 20000:171), Fanucchi, em
m parceria com o maeestro Erlon Chaves,

9
A Rádioo Tupi do Rioo de Janeiro fooi inaugurada em 25 de seteembro de 19355 e a de São P Paulo, dois annos depois.
Elas deraam início a umma cadeia de emissoras radiofônicas, to odas denominadas por nom mes de tribos indígenas,
que ficaraam conhecidaas como “Tabaa Associada”. O caráter ufaanista do fundaador dos Diárrios Associado os refletiu-
se, inclusive, na inauuguração de sua emissoraa radiofônica carioca. Aléém do Hino Nacional, tocado pela
Orquestraa Sinfônica Brrasileira, foi executada
e pelaa primeira vezz a música Aquuarela do Braasil, de Ary Baarroso.

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compôss o jingle innstitucional “Já é horaa de dormirr10”, apresentado às noove horas da


d noite,
durante dez anos, junto
j com a imagem do
d indiozinh
ho da TV Tupi
Tu deitado em uma reede (Fig.
4).

Figura 4

Fonte: Fonte: http://ww


ww.telehistoria.com.br/noticcias/imprimir.asp?id=3780 (Figuras 1, 2,, 3 e 4)

D
Demonstran
ndo a cumpplicidade enntre as estraatégias de desenvolvim
d mento da tellevisão e
as da publicidade
p , depois de dez anoss, esse jing
gle foi incoorporado a um comeercial de
cobertorres produziddo por Bonii e permaneeceu no ar por mais um
ma década.

A
Apesar de sozinha
s no primeiro
p anno de existêência da teleevisão no país, a TV Tupi
Tu dava
os prim
meiros passoos no sentiido de gannhar a fidellidade do público
p para o entreteenimento
11
televisivvo, utilizanndo para issso a proxiimidade de seu símboolo com o universo infantil
i
(FANUCCHI, 19996, p. 77). A mesma estratégia foi
f desenvoolvida por ooutras emisssoras: o
tigre, daa TV Recordd paulista (nna década de
d 1970), a dupla
d de criianças, impoortada da Argentina
A
pela TV
V Excelsior, ou o coelhoo da TV Banndeirantes.

10
“Já é hoora de dormirr /não espere mamãe
m mandaar /um bom soono pra você / e um alegre ddespertar.”
11
O própprio Fanucchi afirma
a que o indiozinho
i da Tupi foi criad
do a partir doss personagenss de Walt Disn
ney,
grande innfluência para os desenhistaas na década de
d 1950.

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Figura 5

Figura 6

Figura 7

Fonte: http://www.tudosobretv.com.br/histortv/historbr.htm# - Figuras 5, 6, e 7.

Foi a TV Excelsior, todavia, a primeira a dar um salto profissional na utilização de


marcas que compusessem, verdadeiramente, uma identificação empresarial das emissoras
associadas ao seu nome. Em 1963, como parte de uma reestruturação administrativa que

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caracterizaria o rompimento com o que denominamos primeira geração do campo televisivo12,


o canal 9 paulista contratou a dupla de administradores profissionais da Rádio Bandeirantes,
Edson Leite e Alberto Saad, que deram início a mudanças significativas na programação e na
imagem da emissora junto ao público.

A nova administração, além de contratar, a peso de ouro, os mais significativos artistas


e técnicos de outras emissoras de São Paulo e Rio de Janeiro, promoveu campanhas de caráter
publicitário tendo em vista sua popularização junto ao público. Essas campanhas foram
iniciadas pelo publicitário Mario Régis Vita e contaram com a participação do cenógrafo
teatral Cyro Del Nero. Elas apresentavam ao público os artistas incorporados à Excelsior,
através do slogan “Eu também estou no 9”.

A estratégia mostra a profissionalização do campo televisivo que se torna cada vez


mais necessária a partir do aparecimento de novas emissoras, concorrentes da fidelidade de
uma audiência ainda bastante pequena comparada aos custos para implantação das estações de
televisão.

Em 1963, a concorrência resumia-se a existente entre a Tupi e Record, em São Paulo,


e, no caso do Rio de Janeiro, entre a Tupi e TV Rio. O projeto da Excelsior modificou essa
relação de forças. Em adição à publicidade de uma programação renovada, a emissora passou
a se preocupar com um projeto de personalização de sua imagem no vídeo.

O início se assemelhou às estratégias já utilizadas por outras emissoras. A dupla de


crianças, Ritinha e Paulinho, foi apresentada ao público durante o anúncio da nova
programação de 1963, passando a freqüentar os intervalos comerciais da emissora em
diversas situações, como as que anunciavam os novos programas da emissora (Figuras 8 e 9).

Figura 8

12
A construção dessa noção baseia-se no conceito de campus de Bourdieu e integra a idéia de geração,
apresentada por Jean-François Sirinelli, no artigo “Os intelectuais”, que compõe a obra “Por uma História
Política”, organizada por René Rémond.

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Figura 9

Fonte:: http://www.ccentrocultural.sp.gov.br/tvaano50/excelsioor.htm - Figurras 8 e 9

M a TV
Mas V Excelsior foi mais longe. Esttabeleceu a logomarcca como definição
d
empresaarial (Fig. 10)
1 e utilizoou-se do deesign gráficco para vinnhetas para além de ap
presentar
program
mas, elucidaar problemaas técnicoss, bastante comuns naaqueles diass, bem com
mo fazer
avisos de
d utilidadee pública. Com
C isso a emissora estabelecia-
e -se como um
m divisor de
d águas
entre duuas geraçõees do campoo televisivoo também no
n estabeleccimento do primeiro programa
p
visual de
d identidadde corporativva.

Figura 10

Fonte: http://www.cen
h ntrocultural.spp.gov.br/tvano
o50/imagens/eexcelsior/exceelsior3.jpg

A programaação visual da Excelsioor refletia a mentalidadde coletiva da época de


d que se
estava construindo
c o uma novaa nação, moderna
m e integrada,
i p meio ddo desenvollvimento
por
tecnológgico. Além
m do destaquue que a Excelsior paassou a dar a temáticas nacionaiss em sua
mação, a iddentidade visual da em
program missora foi talhada coom o mesm
mo objetivo
o: trilhas
sonoras e vinhetas utilizavam quase que exclusivame
e ente músicaa brasileira.

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Embora trabalhando com pressupostos diferentes da Tupi, buscou estabelecer sua


identificação junto ao telespectador de forma nacionalista. Mesmo na década de 1960, a idéia
de uma ‘programação nacional’ já se constituía através dos primeiros links Rio - São Paulo,
realizados pela emissora13. Na memória daqueles que participaram desse processo, o fato é
visto, emblematicamente, como “o primeiro salto para a futura integração nacional”
(OLIVEIRA SOBRINHO, 2000, p. 253).

A transferência simbólica entre o advento da televisão no país e a sua inclusão no rol


das nações desenvolvidas seria levada ao extremo pelo regime militar. Principalmente nos
períodos Médici e Geisel, a participação dos empresários do campo televisivo na
consolidação do nacionalismo autoritário do regime é efetiva, com destaque para a TV Globo,
que se constituiu em um espaço privilegiado na defesa dos valores da Doutrina de Segurança
Nacional (DSN).

Um exemplo disso foi a campanha institucional realizada pela TV Globo, através de


seu Boletim de Divulgação, no ano de 1973, início das mudanças em sua programação,
originando o “padrão globo de qualidade” 14.

Na verdade, a mentalidade que fundamenta esse projeto já está presente na escolha do


símbolo que passaria a identificar a TV Globo, tornado público em novembro de 1972:

A IMAGEM
DA
COMUNICAÇÂO

Figura 11

Fonte: Boletim de Divulgação da Rede Globo – TV Globo

As ideias básicas para a elaboração da logomarca, encomendada a Ciro Del Nero,


como síntese do conceito “É para você que a Rede Globo trabalha”, são apresentadas no

13
A firma inglesa Marconi, que havia feito a primeira rede nacional de TV no país, unindo São Paulo- Rio de
Janeiro-Belo Horizonte-Brasília, durante a inauguração da nova capital brasileira, era representada no país por
Mario Wallace Simonsen, proprietário da Excelsior. Cf. declaração de Álvaro Moya a Oliveira Sobrinho, José
Bonifácio (Boni). op. cit. p. 29.
14
Um estudo detalhado dessa campanha pode ser visto na tese de doutoramento da autora. Cultura política e
televisão: entre a massa e o popular (1964-1979), defendida no ICHF, UFF, em 2005.

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próprio Boletim: “[O logotipo levou] em conta, basicamente, o losango da Bandeira Brasileira
emoldurado por linhas paralelas que o cercam por três lados. No lado livre a presença da Rede
Globo, e, no centro, a frase síntese: a imagem da comunicação” (BOLETIM DE
DIVULGAÇÃO, 1972, p.1).

Considerando-se que a utilização da bandeira nacional como símbolo era, naquele


momento, interpretada como uma adesão ao regime militar fica explícita a incorporação da
emissora na campanha estatal nacionalista. Da mesma forma, a frase A imagem da
comunicação - uma auto-referência à emissora – inserida no espaço onde originariamente
estaria a máxima Ordem e Progresso, provoca a transferência de todo o seu significado para a
logomarca da TV Globo.

Emblematicamente, a campanha criada para divulgar e dar identidade à nova


programação deixa transparecer os princípios que norteavam a afirmação da emissora no
campo televisivo. A ‘ordem’ significando a centralização administrativa, fundamento do seu
processo de profissionalização, que a faria conquistar o ‘progresso’ – um quase monopólio de
audiência a partir de meados da década de 1970. É o próprio Roberto Marinho quem afirma:

“(...) Sabemos que todo e qualquer empreendimento, seja em que área for, só se
sustenta, no regime da iniciativa privada, se tiver rentabilidade. As empresas de
comunicação não podem fugir a essa fatalidade (...) Já se vê, pois, que, da mesma
forma, a TV Globo, ao procurar, como procura, a sua independência econômica, trata
de fazer face às grandes despesas com que tem de arcar, mantendo em dia todos os
seus compromissos financeiros (...)”15.

O certo é que, através do estudo dessas campanhas que auxiliaram a forjar as


identidades corporativas da televisão brasileira, o historiador atento pode perceber a
importância adquirida pelo veículo na significação de conceitos, valores e práticas que deram
coerência a uma cultura política nacionalista que, nas décadas de 1950-60, mudava sua
tonalidade política, mas permanecia forte no imaginário de diferentes segmentos sociais,
sendo incentivada pelo grupo de poder como forma de legitimação das relações sociais
estabelecidas.

Percebe-se o quanto a televisão, como expressão cultural de massa, em suas primeiras


décadas, concede um significado positivo ao produto que é tido como efêmero. Numa época
em que arte e indústria se mesclam, o veículo reúne as artes industriais às plásticas para forjar
sua identidade estética.

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Trecho de carta de Roberto Marinho ao Jornal do Brasil, publicada em 04/02/1979.

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História, imagem e narrativas 
No 16,  abril/2013 ‐ ISSN 1808‐9895 ‐ http://www.historiaimagem.com.br 

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