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A Vida Depois
da Morte
A Questão da Sobrevivência
à Morte Corpórea

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D. Scott Rogo

A Vida Depois
da Morte
A Questão da Sobrevivência
à Morte Corpórea

Tradução de:
David Gomes Jardim Júnior

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Título do Original:
“Life After Death”

© D. Rogo, 1986
© Da Tradução — Editora Tecnoprint S.A., 1987

As nossas edições reproduzem


integralmente os textos originais.

ISBN 85-00-81397-0

Grupo Ediouro
EDITORA TECNOPRINT S.A.

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Índice
Introdução 7

1 — Pesquisas Psíquicas e a Controvérsia Acerca da Sobrevivência 13


O Caso de James Kidd 13
As Bases das Investigações Sobre a Sobrevivência 15
Aparições e o Caso de Sobrevivência 19
Mediunidade e o Caso de Sobrevivência 24
Correspondência-Cruzada 34
Novas Circunstâncias nas Pesquisas Sobre a Mediunidade 39

2 — A Mente Fora do Corpo 49


Experiências Fora do Corpo 51
Estudos Sobre a Natureza da Visão Fora do Corpo 53
Experiências Para Localizar o Ego Fora do Corpo 57

3 — Documentação da Experiência Perto-da-Morte 65


Documentação da Experiência Perto-da-Morte 69
O Estudo dos Encontros Perto-da-Morte 71
Verificação da Experiência Perto-da-Morte 75
Mais Luz Sobre a Experiência Perto-da-Morte 79
O Problema das Experiências Perto-da-Morte 81

4 — Contato Espontâneo com os Mortos 85


Provas da Freqüência do Contato Subjetivo com os Mortos 89
Contatos Post-Mortem Espontâneos 93

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Contato com os Mortos Através dos Sonhos 96
Outras Formas de Contato Post-Mortem 99

5 — Vozes de Espíritos Gravadas: Ilusão ou Solução? 103


A História das Pesquisas da Voz Gravada 106
O Trabalho de Konstantine Raudive 109
As Pesquisas Sobre a Voz-Gravada Presentemente 112
O Fenômeno da Voz Gravada Como Prova da Sobrevivência 115

6 — Telefonemas dos Mortos? 119


Pesquisando Telefonemas dos Mortos 120
Informações Coligidas por Outros Pesquisadores 124
Estudando a Natureza dos Telefonemas 126
Problemas da Prova 129
Telefonemas dos Mortos e a Questão da Sobrevivência 131

7 — Reexame da Reencarnação 135


Memória Extracerebral 140
Casos que não Podem ser Explicados Como Simples Reencarnação 143
Prova Pela Regressão Hipnótica
A Xenoglossia e os casos de Reencarnação

8 — Algumas Idéias Pessoais 157

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Introdução
A idéia de que sobreviveremos ao choque da morte é antiga e perene. Todas as
culturas e religiões do mundo adotam essa doutrina. O prevalecimento de tal concepção
está de tal maneira espalhado, que Sir James G. Frazer, pioneiro no moderno estudo de
antropologia, se viu obrigado buscar uma explicação para tal fato em seu clássico The
Golden Bough. A sua teoria é a de que, quando o homem primitivo sonhava com os
mortos, interpretava erroneamente o fenômeno, tomando-o como experiências com o
contacto direto. Na verdade, contudo, a teoria protopsicológica de Frazer mostra-se
incapaz de explicar todos os aspectos da crença na imortalidade. Não explica por que
povos diferentes criaram várias concepções da vida após a morte. Algumas sociedades
primitivas adotaram, gradativamente, a idéia de um reino celeste semelhante à nossa
vida terrena. A reencarnação e a transmigração da alma tornaram-se crença na África e
no Oriente, ao passo que os primeiros cristãos se dividiam, encarniçadamente, entre as
crenças da ressurreição espiritual e a ressurreição física.
Provavelmente, a mais séria refutação à teoria de Frazer veio da obra The Making of
Religion, de Andrew Lang, também publicada em fins do século passado. Lang era um
folclorista escocês fascinado pelas histórias de fantasmas, assombrações, etc, tão
freqüentes no folclore de diferentes sociedades, que acabou chegando à conclusão de
que todas aquelas lendas representavam legítimas experiências psíquicas, o que o levou
ao postulado de que o homem primitivo passou a acreditar na imortalidade devido ao
contacto real, e não imaginário, com o mundo superfísico.
Neste livro, examinaremos se existe alguma base para a explicação sugerida por
Lang. Não pode haver dúvida de que a humanidade tem, de há muito, nutrido uma
crença sagrada na vida após a morte; não obstante,

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existe uma grande brecha entre a crença e a prova. É aí, como Lang salienta com tanta
justeza, que entra em jogo o estudo dos fenômenos psíquicos. Tais fenômenos, como
aparições e fantasmas, mensagens recebi das através de médiuns em transe, visões de
moribundos e outras manifestações semelhantes, dizem respeito, categoricamente, à
questão da sobre vivência. Se a experiência humana do dia-a-dia inclui o contacto direto
com o mundo dos mortos, parece pouco razoável explorar hipotéticas raízes
psicológicas para a crença.
A despeito dessa evidência, a ciência convencional tem, de há muito, se afastado do
estudo dos fenômenos da morte e do que há depois da morte. Somente nas duas últimas
décadas, surgiu o estudo científico da experiência da morte, a tanatologia, como um
campo distinto de estudo, em face do corpo principal da psicologia convencional. A
ciência e a psicologia, até então, tinham encarado a experiência da morte como um
sombrio inimigo, e não como um setor válido para a pesquisa. A única disciplina
científica que até hoje se preocupou com o estudo da imortalidade humana foi a
pesquisa psíquica, ou parapsicologia, e provavelmente a maioria dos cientistas se oporá
ao fato de considerá-la científica. Esse interesse data do século XIX, e será exposta no
Capítulo 1 a história de como se chegou ao estudo da sobrevivência. Como a
parapsicologia somente alcançou uma precária posição na comunidade científica nos
últimos vinte e cinco anos, é suficiente dizer que as descobertas acerca da vida após a
morte jamais causaram grande impacto sobre a ciência e a cultura em geral. Isso, porém,
de modo algum diminui a importância dos fatos descobertos pelos primeiros
parapsicólogos cientistas. Eles iniciaram os seus trabalhos estudando as experiências de
aparições, assombrações e visões dos moribundos, e depois se voltaram para o estudo
dos médiuns em transe, que conseguiram se comunicar diretamente com inteligências
desencarnadas. Esses esforços foram desafiadores e frustradores, uma vez que os
primeiros pesquisadores não sabiam claramente que critérios poderiam ser usados para
provarem a vida após a morte.
Hoje, já se passaram cem anos desde que os primeiros pesquisadores psíquicos
tentaram explorar a questão da vida depois da morte. As pesquisas nesse sentido se
espalharam hoje para a psicologia, a física e mesmo a biologia. Surgem novas
modalidades de provas na vanguarda das pesquisas, inclusive experiências de saída do
corpo, informações de pessoas que morreram, mas voltaram, e lembranças de crianças
que afirmam que se lembram de encarnações anteriores. Todos esses fenômenos serão
examinados neste livro.
Este curto volume tratará primordialmente das provas da sobrevivência, tanto no
sentido de se saber se o homem tem a capacidade de viver

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além da morte, como de se saber se os contactos post-mortem têm sido alcançados de
maneira convincente. Esse critério foi adotado com exclusão de outras questões
relacionadas com o estudo da sobrevivência humana. Entre elas está, por exemplo, a
questão de se conceituar o que é, ou poderia ser, o outro mundo. Na minha opinião, não
estamos em condições de especular sobre esse assunto sem nos deixarmos influenciar
pela nossa simples vontade. As provas a respeito da vida após a morte são muito
contraditórias e acarretam muitos problemas para permitirem que tais estudos sejam
corretos.

No decorrer de toda a sua história, a humanidade tem acalentado a idéia de que sobrevivíamos à morte
de alguma forma. Esta gravura italiana do século XVII mostra o fantasma de um marinheiro afogado
visitando sua espantadíssima esposa. (Biblioteca Mary Evans)

Para os leitores que se mostrem particularmente interessados no problema de se


conhecer a natureza do outro mundo, é justo salientar que foram feitas duas notáveis
tentativas de descrever esse mundo do além-túmulo. A primeira ocorreu em 1961,
quando o falecido Dr. Robert Crookall, um cientista britânico então afastado de suas
atividades, apresentou, em seu livro The Supreme Adventure, descrições da vida no
além oferecida por projetores astrais, sobreviventes da quase morte e comunicadores
mediúnicos, compatíveis entre si. Essa idéia foi reforçada, em 1981, quando Paul Beard,
um dirigente espírita britânico, mostrou semelhante concordância em comunicações de
alguns médiuns dignos de confiança. (Esses dados apresentados em seu livro Living On,
de leitura muito agradável.)

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O Dr. Robert Crookall
reuniu centenas de
depoimentos de pessoa
que afirmavam ter tido
experiência de vida em
outros planos.
(Biblioteca Mary Evans)

Ambos os pesquisadores apresentaram um mundo post mortem composto de várias


esferas, de acordo com o nível espiritual, e terminando em uma misteriosa segunda
morte.
O problema dessa concepção é que ambos os pesquisadores basearam as suas
conclusões na seleção de dados ad hoc e post hoc, e colheram os dados primordialmente
espíritas, ou fontes pelo menos inspirada no espiritismo popular. Foi um sério erro de
cálculo, pois, no começo deste século, a filosofia espiritualista já havia criado uma
teologia bem estruturada sobre a natureza do mundo de além-túmulo. Essa concepção
foi, em grande parte, inspirada pelos escritos de Emmanuel Swedenborg, um místico
sueco do século XVIII, e de acordo com eles modelada. A sua concepção se baseava em
suas experiências visionárias particulares, e foi ativamente incorporada ao espiritismo
por muitos dos primeiros dirigentes do movimento nos Estados Unidos. A razão de
serem as comunicações recebidas

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através de tantos espíritas subseqüentes proveio das fontes comuns de informação,
inclinação e cultura.
Como a questão da sobrevivência é tão confusa e complicada, neste livro iremos nos
limitar a focalizar a nossa atenção nos problemas fundamentais de se saber se a crença
na imortalidade é lógica, e se pode-se colher qualquer prova direta em apoio da idéia.
Começaremos com um breve resumo da história das pesquisas acerca da sobrevivência
e passaremos a examinar os mais recentes enfoques da controvérsia. O capítulo final
mostra como o autor, pessoalmente, chegou a uma conclusão sobre o assunto e descreve
casos mais diretamente relacionados com a sobrevivência.

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*
* *

12
1
Pesquisas Psíquicas
e a Controvérsia Acerca da Sobrevivência
O Caso de James Kidd

Um dos capítulos mais curiosos da história da jurisprudência norte-americana data de


1967, quando um excêntrico garimpeiro do Arizona, chamado James Kidd, foi
declarado legalmente morto. Kidd desaparecera no deserto, perto de Phoenix, em 1949.
Tal ocorrência provavelmente passaria despercebida pelos jornais e pelo público, se não
fosse um estranho aspecto do caso. Quando desapareceu, o garimpeiro deixou 175.000
dólares em dinheiro e ações, depositados em um banco. Também deixou um testamento
particular, datado de 2 de janeiro de 1946, no qual declarava, entre outras coisas, que
deixava seus bens para “...a procura de alguma prova científica de uma alma que o
corpo humano deixa com a morte...”.
Quando foi divulgada a notícia do testamento, a agitação foi grande. Dentro em
pouco a justiça de Phoenix se viu às voltas com uma multidão de pessoas que se
consideravam contempladas pelo testamento. Havia espíritas, igrejas, filósofos,
institutos de pesquisa e uma multidão de excêntricos, todos querendo abiscoitar a
herança. As audiências judiciais que tiveram lugar nos meses seguintes estiveram
repletas de profundas discussões filosóficas e de tiradas francamente humorísticas. Uma
espírita de Los Angeles demonstrou perante o juiz que seu espírito guia podia
responder a perguntas, por seu intermédio, enquanto seu secador de cabeça funcionava,
de maneira que ela não pudesse ouvir as perguntas que lhe eram feitas! Um professor de
filosofia de um colégio secundário da Califórnia afirmou que era capaz de provar a
existência da alma pela lógica, ao passo que o Instituto de Neurologia Barrow, do
Arizona, queria receber a herança para custear pesquisas sobre o cérebro. Também os
parapsicólogos ficaram interessados no testamento, e tanto a Sociedade America-

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na de Pesquisas Psíquicas (de Nova York), como a Fundação de Pesquisas Psíquicas (de
Durham, Califórnia) mandaram representantes, que depuseram perante a justiça.
O processo acabou ficando conhecido por O Grande Julgamento da Alma, e a
decisão da justiça foi decepcionante. O Juiz Robert J. Myers atribuiu a herança ao
Instituto de Barrow, argumentando que o dinheiro seria melhor empregado para
financiar uma pesquisa útil.
A decisão enfureceu vários dos pretendentes, que argumentavam que o Instituto se
desqualificara previamente, pela própria argumentação que empregara, admitindo que
não faria pesquisas sobre a alma, de maneira que as críticas se justificavam.
Posteriormente, tanto a Sociedade Americana de Pesquisas Psíquicas como a Fundação
de Pesquisas Psíquicas, que tinha sido fundada em 1960, expressamente para investigar
os problemas da sobrevivência, apelaram da sentença. O tribunal de justiça do Estado
foi mais compreensível, e deu provimento ao recurso, mandando que o juiz de primeira
instância reformasse a decisão. O juiz não teve alternativa, senão atribuir a herança à
Sociedade de Pesquisas Psíquicas que demonstrara, perante a justiça, estar há muito
tempo empenhada em descobrir provas da vida após a morte. A Sociedade, por sua vez,
resolveu dividir o legado com a Fundação.
O estranho caso de James Kidd e seu testamento ofereceram aos parapsicólogos um
interessante precedente. Pública e (de certa maneira) juridicamente, foi reconhecido que
a questão da vida depois da morte pode ser estudada cientificamente. Também ficou
estabelecido que a ciência da parapsicologia é a melhor indicada para empreender a
tarefa. A decisão da justiça foi provavelmente influenciada pelo depoimento do Dr.
Gardner Murphy, que era presidente da Associação de Pesquisas Psíquicas e também
um eminente psicólogo. Murphy não mediu esforços para explicar que a entidade se
dedicava há muito tempo a estudar as aparições, visões no leito de morte, mediunidade e
outros fenômenos psíquicos. São ocorrências raras, que sugerem que, ocasionalmente,
nós, os vivos, podemos ver de relance o mundo invisível. O tribunal concordou com
esse ponto de vista.
Se, porém, a parapsicologia vem explorando a questão da sobrevivência há tanto
tempo, por que será que o problema da vida após a morte continua sem solução?
Realmente, embora exista uma rica literatura histórica sobre o assunto, a prova decisiva
da vida após a morte ainda não encontrada.

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As Bases das Investigações Sobre a Sobrevivência

A fim de compreender a complexidade da questão da sobrevivência, é mister


conhecer primeiro algo sobre a história das investigações psíquicas. A parapsicologia é
hoje uma ciência experimental, e a maioria dos pesquisadores profissionais se dedicam
ao trabalho de laboratório, examinando pessoas, sobre questões relacionadas com a
telepatia, clarividência, precognição e domínio da mente sobre a matéria. Essa é,
realmente, apenas o mais recente aspecto que a parapsicologia adotou durante a sua
curta história, em busca da respeitabilidade científica. A ciência da parapsicologia data,
realmente, da década de 1880, antes do advento de estatísticas complicadas,
psicofisiologia e outros instrumentos utilizados pelos parapsicólogos de hoje. As
pesquisas psíquicas daquele tempo consistiam mais em uma busca filosófica e
existencial, uma vez que apareceram em uma sociedade muito diferente da de hoje.
Vários fatores contribuíram para a maneira com que a cultura foi forçada a mudar
durante a era vitoriana, e esses fatores naturalmente influenciaram a maneira com que as
pesquisas psíquicas se desenvolveram a princípio. Foi uma época em que a ciência e as
realizações científicas desafiaram a autoridade religiosa, que dirigira o pensamento
europeu nos quinhentos anos anteriores. O século XIX foi uma época de grande
progresso industrial e muitas invenções, e muita gente passou a acreditar que a ciência,
e não a religião, poderia salvar a humanidade e torná-la senhora do universo. Essa
mentalidade não foi alterada nem quando o brilhante cientista e pensador britânico
Charles Darwin publicou A Origem das Espécies por Meio da Seleção Natural e (mais
tarde) A Descendência do Homem. A concepção darwiniana implicava ser o homem
meramente uma parte do mundo existente, e não distinto dele. As descobertas de
Darwin mostraram que o homem não sofreu uma queda espiritual da graça Divina,
quando veio habitar a Terra, mas simplesmente evoluiu de formas de vida inferiores.
Isso constituiu um desafio à autoridade cristã, que ensinava que o homem deve lutar
para reconquistar a condição espiritual que perdeu no começo dos tempos. Durante
aqueles anos, sábios, na Alemanha, também estavam mostrando que a própria Bíblia
não era um documento infalível, mas podia ser analisado criticamente, como qualquer
obra literária. E o que descobriram afetava seriamente a crença religiosa.
Disso resultou uma sociedade que, pela primeira vez há muito tempo, não adotava
uma concepção do mundo simplesmente na base do dogma religioso. A ciência estava
erguendo a humanidade acima dos deuses, e

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afigurou-se a necessidade de ter a religião de adotar métodos científico a fim de provar
doutrinas tais como a alma e sua imortalidade.
Foi durante aqueles anos críticos que surgiu, nos Estados Unidos, um pequena seita.
O espiritismo era um pequeno movimento religioso, que se enraizou profundamente na
cultura norte-americana nas décadas de 1840 e 1850. A expansão do movimento data de
1848, quando várias testemunhas oculares puderam observar algumas estranhas
manifestações espíritas, em uma pequena casa de campo em Hydesville, no Estado de
Nova York. Tais manifestações consistiam principalmente de sinais recebidos por duas
adolescentes que moravam na casa, Margaret e Kate Fox, cujo pai, um pequeno
fazendeiro, em breve começou a viajar pela região oriental dos Estados Unidos
mostrando o poder das filhas de trazer sinais do mundo espiritual. Aquelas
demonstrações despertaram o interesse da comunidade científica, assim como do
público em geral, que viu na paranormalidade a base de uma nova religião, uma religião
ensinando que a comunicação com os mortos era uma realidade comum. Saber se
aquelas duas primeiras médiuns eram legítimas ou falsas tornou-se na realidade
desnecessário, pois o espiritismo estava em ascensão.
O que atraiu o público norte-americano foi o fato de parecer o espiritismo uma
religião científica. Não baseava a sua teologia no dogma ou na autoridade, mas ensinava
que cada interessado poderia provar por si mesmo os seus princípios fundamentais. O
cético tinha simplesmente de procurar a ajuda de um espírita ou médium.
O crescimento e a expansão do movimento espírita não somente influenciaram a
cultura popular, como também despertaram a atenção da intelectualidade britânica. O
progresso do espiritismo na Inglaterra ocorreu mais ou menos na mesma ocasião em que
um certo número de filósofos britânicos, frouxamente relacionados, em vista de sua
ligação com a Universidade de Cambridge, se encontravam às voltas com dúvidas
religiosas próprias. O mais destacado daqueles pensadores era o Professor Henry
Sidgwick, conhecido filósofo e professor daquela universidade. Entre os seus colegas
estavam o seu discípulo F.W.H. Myers e Edmund Gurney, formado em Cambridge e
musicólogo de mérito.
Aqueles intelectuais estavam seriamente preocupados com as mudanças que
ocorriam na cultura e nas tendências intelectuais da Grã-Bretanha. Eram filhos de
ministros religiosos, educados para cultuarem as crenças e valores cristãos. Ficavam
perturbados ao verem a sociedade se afastando das velhas doutrinas, mas, ao mesmo
tempo, compreendiam que tais mudanças eram lógicas em um mundo que se modificava
radicalmente. Sentiam que a sociedade estava na iminência de ser inundada por uma
onda de ateísmo e materialismo, que, achavam, acarretaria o seu declínio. As-

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sim, procuraram encontrar um meio de restabelecer a ordem cristã. Como não podiam
mais confiar em polêmicas ou raciocínios filosóficos, viram-se tomados de
perplexidade. E foi nessa ocasião que lançaram um olhar, ainda desconfiado, para o
movimento espírita, que emigrara para a Inglaterra em 1852. O grupo de Cambridge
decidiu afinal que naquele campo é que poderiam conquistar as suas mais importantes
vitórias. De fato, acreditavam, se o supernatural podia ser cientificamente demonstrado,
as conclusões a que se chegasse poderiam ser utilizadas para rejeitar o materialismo
vitoriano.

As irmãs Fox
fazem uma mesa
levitar, em 1850;
supunha-se que
tais façanhas
eram causadas
pelos espíritos,
constituindo,
assim, uma prova
da sobrevivência.
(Biblioteca Mary
Evans.)

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Deve se salientar, no entanto, que o grupo de Cambridge não tinha o propósito de
provar o espiritismo. Seus membros simplesmente argumentavam que, se os fenômenos
do espiritismo fossem verdadeiros, aqueles estranhos eventos voltariam a confirmar a
natureza espiritual do homem. Alguns críticos do trabalho do grupo também acusavam
aqueles pensadores de estarem emocionalmente determinados a descobrir a prova da
vida após a morte. Não era esse o caso, todavia. O Professor Sidwick e seus colegas
desejavam encontrar uma prova científica com a qual pudessem refutar a onda de
materialismo que prevalecia em sua época. Sabiam, porém, por outro lado, que tal prova
teria de ser bastante forte para influenciar qualquer crítica objetiva, assim como para
satisfazer as suas próprias dúvidas.
Essa é, de fato, uma das razões pelas quais a controvérsia da sobrevivência jamais foi
resolvida dentro da parapsicologia. Os fundadores da ciência em breve verificaram que
encontrar a prova da vida após a morte, o problema que lhes parecia fundamental, não
era tão fácil como um problema de lógica ou encontrar a solução de uma equação
algébrica.
O acontecimento mais importante resultante daqueles anos de busca e
questionamento ocorreu em 1882, quando o grupo de Cambridge se juntou a vários dos
membros mais críticos do movimento espírita. Juntos, fundaram a Sociedade de
Pesquisas Psíquicas, que se tornou o primeiro corpo científico destinado ao estudo da
paranormalidade. O objetivo da Sociedade consistia em investigar os relatos dos
fenômenos psíquicos, estabelecer os critérios a respeito do que deveria ser considerado
como prova e, em seguida, determinar a natureza dos acontecimentos. A Sociedade
empreendeu tais estudos com espírito crítico, e muitas figuras destacadas da Grã-
Bretanha participaram de seus trabalhos. Entre elas se encontravam vários eminentes
cientistas e alguns poucos políticos.
A ciência da moderna parapsicologia surgiu em conseqüência das atividades daquela
instituição. Com o tempo, aconteceu mesmo que os elementos espíritas se afastaram da
Sociedade, quando o grupo original de Cambridge começou a aplicar métodos cada vez
mais críticos aos seus estudos. Para o que desse e viesse, a Sociedade acabou se
libertando de seus antigos laços religiosos. Tornou-se essencialmente uma instituição
dedicada a distinguir os fatos da ficção e da fraude, no estudo dos fenômenos psíquicos.
Os fundadores da Sociedade trataram de estudar uma rica variedade fenômenos de
modo algum diretamente relacionados com o problema da sobrevivência. Investigaram
casos de telepatia ocorridos na vida quotidiana, iniciaram pesquisas experimentais sobre
a transmissão de pensamento, examinaram os casos de supostas comunicações de
espíritos por

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meio de pancadas e se mostraram fascinados pelo estudo do hipnotismo. A preocupação
central da Sociedade, porém, continuou a ser a questão da sobrevivência.

Aparições e o Caso de Sobrevivência

Uma vez que os primeiros investigadores psíquicos realizaram grande quantidade de


pesquisas práticas, não é de se admirar que a primeira prova da sobrevivência tenha
procedido de experiências quotidianas do público britânico. Os fundadores da
Sociedade estavam interessados em coletar e estudar casos de experiências psíquicas
espontâneas (da vida real), e, em 1886, tinham reunido um número considerável de
casos de telepatia, experiências de aparições e outros episódios espíritas. O que
impressionou aqueles grandes pensadores foi o número de aparições em momentos
decisivos incluídos em seus dados. Eram casos em que a aparição era vista no mesmo
momento em que a pessoa que a projetava realmente morria. Foram incluídos em seus
apontamentos trinta e dois desses casos, e os dirigentes da Sociedade chegaram à
conclusão de que uma profunda investigação daquelas informações concorreria para a
solução do problema da sobrevivência.
O relato seguinte é típico daqueles primeiros casos. O relatório está datado de 20 de
maio de 1884.

Eu estava lendo, certa noite, quando, levantando os olhos do livro, vi distintamente


uma colega de estudos, à qual eu era muito afeiçoado, de pé junto da porta. Eu ia
manifestar a minha estranheza por sua visita, quando, horrorizado, constatei que não
havia ninguém no aposento, além de minha mãe. Contei-lhe o que vira, sabendo que ela
não podia ter visto, pois estava sentada de costas para a porta, nem ouvira coisa
alguma de anormal, e ela achou graça em meu susto, dizendo que eu devia ter lido
demais ou ter sonhado.
Um dia ou dois depois do estranho acontecimento, recebi notícia da morte de minha
amiga. O estranho é que nem sequer sabia que ela estava doente, muito menos
correndo perigo de vida, de modo que não podia estar preocupado quando aquilo
aconteceu, mas podia estar pensando nela; isto não posso jurar. A sua doença foi curta
e a morte de todo inesperada. Sua mãe me disse que ela falou a meu respeito pouco
antes de morrer... Morreu na mesma noite, e mais ou menos na mesma hora em que tive
a visão, no fim de outubro de 1874.

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Coube a Edmund Gurney investigar aquele caso pessoalmente. Meticulosa e
cuidadosamente, ele procurou determinar se a testemunha era sujeita a alucinações ou se
poderia ter se enganado acerca do dia em que viu a aparição. As constatações feitas in
loco confirmaram a declaração da moça.
A maior parte daqueles primeiros relatos de aparições no momento da morte nada
tinha de espetacular. Essa típica banalidade impressionou os pesquisadores da
Sociedade, uma vez que não coincidia com a intensa dramaticidade de que se revestem
as histórias fictícias de assombrações. De fato, um dos pesquisadores chegou a observar
que tais casos eram mais capazes de fazer dormir do que de tirar o sono! O caso
seguinte, por exemplo, foi mencionado por um perplexo professor.

Há cerca de 14 anos, cerca de três horas de uma tarde de verão, eu estava passando
diante da igreja da Trindade, em Upper King Street, em Leicester, quando vi, do lado
oposto da rua, um velho amigo, que eu perdera de vista havia algum tempo, porque ele
saíra da cidade para seguir um curso fora. Achei esquisito ele não ter me notado, e,
enquanto o seguia com os olhos, resolvendo se iria ou não me aproximar dele, chamei-
o em voz alta, e fiquei um tanto surpreso, por não ter visto em que casa ele entrou, pois
estava convencido de que entrara em alguma. Na semana seguinte, fui informado de
sua morte, quase repentina, em Burton-on-Trent, mais ou menos à mesma hora em que
eu tivera certeza de que ele estava passando diante de mim. O que mais me
impressionara naquela ocasião foi não ter ele me notado, caminhar sem fazer o menor
barulho e ter desaparecido tão subitamente. Mas que era E.P.I. eu nunca duvidei.
Sempre achei que se tratou de uma alucinação, mas o que me intriga é o fato de ter
ocorrido justamente naquela ocasião.

Cuidadosas averiguações comprovaram que a testemunha jamais tivera alucinações


antes. Os investigadores apuraram também que a testemunha contara o caso à sua mãe,
antes de saber da morte do amigo. Infelizmente, a mãe da testemunha morrera antes de
ser feita a investigação, d sorte que se perdeu uma importante testemunha. No entanto,
os investigadores da Sociedade puderam revelar vários casos em que as testemunhas
ainda estavam disponíveis. Em alguns casos, a aparição foi vista por mais de uma
pessoa, como no seguinte exemplo:

Há alguns anos, quando morava em Woolstone Lodge, Woolstone Berks, de cuja


igreja e paróquia, etc., etc., meu marido era clérigo, certa noite, após o chá, deixei a
reunião de família junto da lareira, a fim de

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ver se a nossa criada alemã conseguiria fazer com que uma mocinha que trabalhava
conosco fizesse uma arrumação para a manhã seguinte. Quando cheguei ao alto da
escada, passou por mim uma senhora que saíra de nossa casa havia algum tempo.
Estava vestida de preto, de seda, com um véu de musselina na cabeça, até os ombros, e
a seda farfalhava. Apenas pude ver o seu rosto de relance. Ela passou por mim,
deslizando rapidamente e sem fazer o menor ruído (a não ser o da seda), e sumiu
depois de dar dois passos no comprido corredor que ia até ao meu quarto de toalete e
não tinha outra saída. Mal pude exclamar: “Oh Caroline!”, quando senti que havia
algo de inatural, e desci a escada correndo, e voltei à sala, onde caí ajoelhada junto de
meu marido, custando a me refazer. Na manhã seguinte, o pessoal de casa começou a
brincar comigo por causa da visão, mas depois apareceu a criadinha que tomava conta
das crianças, contando que, quando estava limpando a sua lareira, ficara tão
apavorada com o aparecimento de uma mulher sentada perto dela, vestida de preto e
com um véu branco cobrindo a cabeça e os ombros, que nada poderia induzi-la a voltar
ao quarto. Os outros tinham ficado com medo de me contar essa confirmação da
aparição, achando que os meus nervos iam ficar ainda mais abalados do que estavam.
Como por acaso, muitos de nossos vizinhos apareceram em nossa casa na manhã
seguinte: Mr. Tufnell, de Uffington, perto de Faringdon, o Arquidiácono Breus, Mr.
Atkins e outros. Todos se mostraram interessados, e Mr. Tufneel fez questão de anotar
vários pormenores em seu próprio caderno de notas, e me fez prometer que naquela
noite mesmo escreveria para minha prima, Sra. Henry Gibbs, que estivera hospedada
em nossa casa durante alguns dias, e eu já começara a escrever uma carta para ela.
Escrevi imediatamente para meu tio (o Reverendo C. Crawley, de Hartpury, perto de
Gloucester) e minha tia, contando tudo que acontecera. Pelo correio de volta, fiquei
sabendo: “Caroline está passando muito mal em Belmont” (para onde sua família a
mandou). “Está em estado desesperador.” E ela morreu, no mesmo dia ou noite em que
me fez aquela visita. O choque foi grande demais para uma pessoa que não é das mais
fortes, e fui um dos poucos membros da família Drawley ou Gibbs que não acompanhou
o enterro.

Felizmente, uma das testemunhas independentes ainda estava viva e pôde confirmar
aos investigadores da Sociedade toda a série de acontecimentos.
O fato de tais aparições parecerem ser legítimos fenômenos paranormais intrigou os
fundadores da Sociedade. Constituiriam aquelas apari-

21
ções, pensavam eles, uma prova de que o homem possui uma alma que é libertada do
corpo pela morte? A princípio, isso se afigura uma hipótese aceitável quando, porém,
passaram a examinar os dados de que dispunham mais atentamente, eles foram, pouco a
pouco, se tornando menos seguros.

Edmund Gurney, da
Sociedade de
Pesquisas
Psíquicas,
desempenhou papel
de destaque na
coleta de provas das
aparições.
(Biblioteca Mary
Evans)

Travou-se um prolongado debate sobre a natureza daquelas aparições quando


Edmund Hurney, R.W.H. Myers e seu colega Frank Podmore se juntaram para
escreverem o estudo, em dois volumes, Phantasmas of Living. Essa publicação foi o
primeiro empreendimento de grande porte da Sociedade de Pesquisas Psíquicas e ficou
claro que aqueles brilhantes pesquisa-

22
dores não concordavam sobre a natureza dos fantasmas... e muito menos se eles
significavam a libertação da alma pelo corpo.
Edmund Gurney escreveu o grosso Phantasms. Como estava fascinado pelo estudo
da telepatia, não pôde deixar de sustentar a idéia de que a aparição resultava realmente
de uma forma de transmissão de pensamento. Salientou que aquelas aparições se
mostravam pouco diferentes, essencialmente, das imagens visuais que algumas pessoas
viam durante a recepção de mensagens telepáticas. Isso o levou a sugerir que as
aparições eram meramente uma forma exteriorizada mais perfeita da imagem mental.
Era um ponto de vista radical para ser sustentado, mas Gurney apoiou a sua opinião
tanto em argumentos empíricos como teóricos. Salientou que as aparições não pareciam
ser objetivas, ocupando o espaço. Os dados colhidos mostravam que elas jamais
deixavam coisa alguma para trás, apareciam e desapareciam sem um traço, caminhavam
através das paredes e, em via de regra, apareciam trajando vestes comuns. Isso lhe
parecia sinais gritantes da imaterialidade. Algumas vezes, continuava Gurney a
argumentar, as aparições se apresentavam vestidas como a testemunha esperava que
estivessem. Isso indicava que as figuras eram em parte construídas na própria mente da
testemunha.
Essa não era, porém, a palavra final sobre o assunto, uma vez que F.W.H. Myers
refutou prontamente o seu colega. Salientou que a existência de aparições observadas
por mais de uma pessoa demonstrava a sua parcial realidade objetiva. A sua explicação
era que a aparição resulta de algum aspecto do organismo do moribundo que se projeta
no espaço e se exterioriza em um ponto distante. Tais manifestações podem, portanto,
não ser puramente físicas no sentido objetivo, mas podem representar uma parcial
invasão psíquica do lugar em que se concretizam.
Edmund Gurney não pôde concordar com a complicada reabilitação feita por Myers
da idéia de que as aparições eram fenômenos objetivos. Assim, contra-atacou, sugerindo
que as aparições coletivas ocorrem sob a forma de um contágio telepático entre as
testemunhas.
Enquanto se travavam esses debates, outros pesquisadores da Sociedade organizaram
uma tentativa de repetir o estudo de Phantasms. Isso ocorreu em 1889, com uma
pesquisa entre o público britânico acerca de experiências psíquicas, e os resultados
foram publicados em 1894, sob o título Censo de Alucinações. Os relatos sobre
aparições no momento decisivo foram de novo notáveis pela sua presença. As provas
em alguns desses casos foram ainda melhores do que as apresentadas em Phantasms.
A despeito da descoberta de tantos casos novos, o debate sobre a natureza das
aparições caminhava, visivelmente, para um impasse. Essa situação levou alguns dos
pesquisadores da Sociedade ao estudo das apari-

23
ções post mortem, isto é, dos fantasmas vistos muito depois da morte do agente. Graças
a tais estudos, foram revelados casos em que as aparições transmitiam informações
corretas às testemunhas. Em outros casos, o fantasma se mostrava interessado em
alcançar algum objetivo ou intenção que o preocupava em vida. Alguns poucos casos de
casas mal-assombradas também mereceram a atenção da Sociedade. Esses casos eram
muito mais raros do que as aparições no momento crítico, e alguns dirigentes da
Sociedade não confiavam muito em seu valor. F.W.H. Myers estudou-as mais
intensamente, e concluiu que elas representavam “... manifestações de persistente
energia pessoal”, mas foi severamente criticado por Frank Podmore, que salientou que
a maior parte das aparições post mortem raramente revelava qualquer sinal verdadeiro
de personalidade. Ele preferia acreditar que os relatos não passavam de embustes, ou
que as aparições eram criadas na própria mente das testemunhas, embora, talvez, em
decorrência da recepção de informação mediúnica.

Mediunidade e o Caso de Sobrevivência

O grande debate da Sociedade de Pesquisas Psíquicas sobre a natureza das aparições


ocupou a atenção do grupo de Cambridge da década de 1880 até a 1890. Conquanto um
caso a priori de sobrevivência pudesse ser reconstituído com os dados colhidos,
certamente tais estudos não constituíam o tipo de prova satisfatória da imortalidade, que
se buscava. Assim, o grupo passou a procurar tal prova em outras direções. Foi graças a
isso que os fundadores da Sociedade voltaram ao movimento espírita, apesar da sua
repulsa pelas fraudes que, sabiam, ali não faltavam. Os fundadores da Sociedade tinham
todos investigado médiuns espíritas durante os seus primeiros estudos e se mostravam
ambivalentes quanto aos resultados obtidos. Sentiram-se encorajados, contudo, quando
William James, o brilhante e considerado filósofo-psicólogo de Harvard, entrou em
contacto com eles, em 1885, com a espantosa notícia de que encontrara uma médium de
verdade, por intermédio da qual conversara com parentes seus, comprovadamente
mortos.
O testemunho de pessoa dotada de mentalidade tão aberta à critica não podia ser
ignorada, e abriu-se um novo capítulo na busca de provas para a parapsicologia.
A Sra. Leonore Piper não era, exatamente, a imagem de uma espírita prodigiosa. Era
uma senhora casada da classe média, que levava, em Boston, uma vida eminentemente
normal. Seu relacionamento com o movimento

24
espírita só ocorreu depois que ela estava às voltas com alguns problemas médicos, em
decorrência de um acidente. Seu sogro sugeriu que ela fosse consultar um famoso
clarividente cego de Boston, a fim de ouvir a sua opinião sobre o tratamento
conveniente. Foi durante a primeira consulta que algo de estranho aconteceu. A Sra.
Piper mais tarde explicou que estava sentada, ouvindo o médium, quando o rosto dele
pareceu ir se tornando cada vez menor, como se estivesse se afastando, até que perdi a
consciência de onde me encontrava. Ao que parece, ela entrou espontaneamente em
transe, o que a surpreendeu, pois, até então, não demonstrara interesse pelo espiritismo.
O fato é que ela passou a freqüentar as sessões do Dr. Cocke, e não tardou a descobrir
que também ela tinha qualidades mediúnicas. Dentro em pouco, ela se tornou a
sensação da comunidade espírita, pois, durante os seus transes, os seus clientes se
mostravam capazes de entrar em contacto com amigos e parentes mortos.

A Sra. Leonore
Piper foi uma das
médiuns que provou
a comunicação
espírita, de maneira
satisfatória para
William James.
(Biblioteca Mary
Evans)

25
A Sra. Piper contava então apenas 25 anos de idade, e a sua desabrochante
mediunidade provavelmente não teria chamado a atenção científica se não fosse aquele
afortunado incidente. A sogra de William James ouviu falando a seu respeito, visitou-a
e ficou tão impressionada com o seu desempenho, que chamou para o fato a atenção do
genro. James e sua esposa procuraram a Sra. Piper pouco depois, e ficaram estarrecidos
com as corretas mensagens que receberam.
James participou de várias sessões com a Sra. Piper, de 1885 a 1886, e vários dos
incidentes que testemunhou o impressionaram de modo espeicial. Durante uma das
sessões, por exemplo, o psicólogo e seu irmão foram advertidos que sua tia (então
residente em Nova York) acabara de morrer naquela madrugada, às 12,30 horas. James
nada sabia a respeito, porém mais tarde escreveu: “Ao chegar em casa, uma hora mais
tarde, encontrei um telegrama dizendo: Tia Kate faleceu alguns minutos depois da
meia-noite.”
A Sociedade naturalmente ficou impressionada com casos tais como esse de modo
que, em 1887, resolveu entrar em ação. Foi enviado a Boston um de seus mais
competentes investigadores, a fim de estudar o caso in loco e apresentar um relatório a
respeito. Richard Hodgson era um pesquisador correto e imparcial, mas também
apaixonadamente dedicado às investigações psíquicas. Partiu para Boston, e acabou
dedicando os dezoito anos seguintes de sua vida ao estudo da mediunidade da Sra.
Piper.
Richard Hodgson fora para os Estados Unidos a fim de assumir a direção do ramo
norte-americano da Sociedade de Pesquisas Científicas, que William James a ajudara a
organizar. Seus planos consistiam em participar ele próprio das sessões da Sra. Piper,
registrar as ocorrências, estudar todas as circunstâncias e certificar-se se a médium não
estava secretamente colhendo informações sobre os seus clientes. Chegou mesmo a
encarregar detetives de segui-la, e fez questão que a médium não soubesse os nomes de
muitas pessoas que a consultavam. Apesar dessas medidas rigorosas, a qualidade da
mediunidade da Sra. Piper continuou impressionante. Bastava-lhe sentar-se com algum
cliente para, após algumas pequenas convulsões, entrar em transe e, dentro em pouco,
uma curiosa personagem, que dizia se chamar Dr. Phinuit, falava por seu intermédio e
atuava como mestre-de-cerimônias na sessão. Hodgson jamais se impressionou muito
com o Dr. Phinuit, que praticamente não sabia se expressar em francês e jamais pôde
apresentar uma versão aceitável de sua própria vida terrena. Na realidade, Phinuit
parecia ser uma parte destacada da mente da própria Sra. Piper, ou, pelo menos, era essa
a opinião de Hodgson. Apesar, contudo, de suas credenciais duvidosas, o Dr. Phinuit
mostrava-se muitas vezes brilhante na transmissão de mensagens verídicas dos mortos.

26
Mais tarde, Hodgson informou que, em sua primeira sessão em casa da Sra. Piper, o
Dr. Phinuit descrevera corretamente e falara em nome de alguns de seus próprios
amigos já falecidos. Em particular mencionou o nome correto de um antigo colega de
estudos. “Ele diz que vocês freqüentaram a escola juntos”, revelou o mensageiro a
Hodgson. “Ele pula e ri. Diz que levava a melhor com você. Teve convulsões ao lutar
contra a morte. Morreu com uma espécie de espasmo. Você não estava lá.” Todas essas
triviais informações eram corretas, e alertaram o Dr. Hodgson para o fato de estar diante
de um caso potencialmente de grande importância.
As comunicações que se seguiram ao aparecimento de seu velho amigo o
impressionaram ainda mais. Hodgson era australiano, e, muitos anos antes de se mudar
para a Inglaterra, apaixonara-se por uma moça, que não desposara, porém, e que havia
falecido muito tempo antes das sessões espíritas. Hodgson ficou atônito, quando Phinuit
começou a descrever a moça, e a transmitir várias mensagens pessoais, que, mais do que
qualquer outra coisa, convenceram Hodgson da autenticidade do poder mediúnico da
Sra. Piper.
Apesar da notável natureza da prova, o Dr. Hodgson não ficou certo de que se tratava
realmente de contacto com os mortos. Era verdade que as mensagens pareciam vir do
mundo dos mortos, e que o pesquisador passou meses fiscalizando as sessões de outros
clientes cujas experiências pessoais se inclinavam na mesma direção. No entanto, à
semelhança de tantos outros fundadores da Sociedade, Hodgson se viu envolvido no
mesmo velho debate da telepatia versus comunicação espírita, que estava prejudicando
o estudo das aparições. Sem dúvida, era razoável supor que as mensagens da Sra. Piper
vinham dos mortos, mas também era possível que ela estivesse lendo as mentes dos
participantes da sessão e colhendo todas as informações pertinentes. Tais informações,
argumentava o pesquisador, poderiam ser usadas para elaborar personificações perfeitas
(mas fictícias) do morto. Essa linha de raciocínio era tentadora, uma vez que o principal
controle da Sra. Piper também parecia falso. Não foi preciso um salto muito grande na
fé e na lógica para presumir que todos os espíritos que se manifestavam regularmente
através da médium tinham raízes psicológicas em sua própria mente. Hodgson a
princípio adotou esse ponto de vista, que sustentou em seu primeiro relatório principal
sobre o caso.
Ele não foi a única pessoa a receber tais mensagens evidentes, uma vez que muitos
dos participantes das sessões espíritas com os quais esteve em Boston admitiram êxitos
semelhantes. Assim, a fim de examinarem a Sra. Piper em condições mais rigorosas,
Hodgson e seus colegas resolveram levá-la à Inglaterra, a fim de que se apresentasse
pessoalmente à

27
Sociedade de Pesquisas Psíquicas. Os pesquisadores da Sociedade ficaram realmente à
vontade para observá-la atentamente. A viagem serviu também para assegurar que a Sra.
Piper não recebia informações secretas acerca dos antecedentes das pessoas que a
consultavam, pois não estivera antes na Inglaterra e não lhe era possível ter acesso a tais
informações. Os consultantes eram, no caso, naturalmente os próprios pesquisadores.
A Sra. Piper viajou para a Inglaterra em 1889, e foi recebida no cais por F.W.H.
Myers e Oliver Lodge, um destacado físico da Universidade de Liverpool e um dos
mais esclarecidos dirigentes da Sociedade de Pesquisas Psíquicas. Os dois controlaram
todos os movimentos da médium e mesmo, com o seu consentimento, abriram a sua
mala e se certificara de que ninguém lhe estava fornecendo informações. A despeito
dessas dificuldades, a Sra. Piper realizou sessões espíritas para a Sociedade, e Liverpool
e em Cambridge, com grande sucesso.
Seria impossível entrarmos em grandes detalhes acerca daquelas importantes sessões.
Lodge talvez tenha sido o que mais se impressionou com a Sra. Piper, em parte devido
às suas próprias experiências com ela, em um relato feito por Lodge acerca de um
incidente ocorrido durante um de suas primeiras sessões. Não se deve esquecer que se
trata na realidade apenas de um episódio que ocorreu durante uma sessão muito
prolongada.

Aconteceu que um dos meus tios residentes em Londres, um homem muito idoso, e
um dos três únicos sobreviventes de uma família muito numerosa, tinha um irmão
gêmeo, falecido havia vinte anos ou mais. Interessei-o de um modo geral pelo assunto,
e escrevi-lhe pedindo para me mandar alguma relíquia de seu irmão. Pelo correio da
manhã de certo dia, recebi um interessante relógio de ouro que seu irmão usava e de
que gostava muito; e naquela mesma manhã, sem que ninguém da casa tivesse visto o
relógio ou soubesse de sua presença, entreguei-o à Sra. Piper quando se encontrava em
estado de transe.
Quase que imediatamente me foi dito que o relógio tinha pertencido a um de meus
tios — um que gostava muito de Tio Robert, o nome do sobrevivente — que o relógio se
encontrava então em poder do mesmo Tio Robert, com o qual ele estava ansioso para
se comunicar. E, depois d alguma dificuldade, e muitas tentativas malsucedidas, o Dr.
Phinuit disse o nome, Jerry, diminutivo de Jeremiah, e afirmou, enfaticamente, com se
uma terceira pessoa estivesse falando: “Este é meu relógio, Robert meu irmão e estou
aqui. Tio Jerry, meu relógio”...
Tendo assim ostensivamente entrado em comunicação, por esse ou aquele meio, com
o que devia ser um parente morto, o qual eu conhecera apenas ligeiramente, em seus
últimos anos, já cego, mas a respeito de

28
cuja vida pregressa eu nada sabia, observei-lhe que, para que Tio Robert ficasse certo
de sua presença, deveria revelar alguns fatos triviais de sua infância, todos os quais eu
lhe transmitiria exatamente.
Ele concordou plenamente com a idéia, e durante várias sessões seguintes passou a
instruir ostensivamente o Dr. Phinuit a mencionar uma série de pequenas coisas que
permitiria a seu irmão reconhecê-lo...
O Tio Jerry relembrou episódios tal como uma ocasião em que os meninos nadaram
juntos em uma enseada, com risco de se afogarem; um gato que mataram no terreno de
Smith; a posse de uma pequena carabina e de uma pele comprida, como uma pele de
cobra, que ele não achava estar em posse de Tio Robert.
Todos esses fatos foram mais ou menos completamente verificados.

O único problema com as provas tais como essas era que a Sra. Piper costumava
segurar as mãos dos consultantes. Alguns céticos sugeriam que o consultante poderia
transmitir informações à espírita, por meio de movimentos musculares inconscientes e
sutis. Essa idéia foi sustentada principalmente por Andrew Lang, um dos primeiros
membros da Sociedade para Estados Psíquicos e pioneiro no estudo da antropologia e
do folclore, que manteve prolongada discussão com Lodge sobre a questão, nas
publicações da Sociedade. Lang encarava a Sra. Piper com ceticismo, porém mesmo ele
admitiu finalmente que a referência à pele de cobra antes citada era boa demais para ser
desprezada.
Vários dos dirigentes da Sociedade puderam trabalhar com a Sra. Piper durante a sua
viagem. Elaboraram juntos um relatório sobre o seu trabalho, no qual chegaram a quatro
conclusões principais: (1) que não havia motivo para se suspeitar da boa fé ou
honestidade da Sra. Piper; (2) que a Dr. Phinuit era provavelmente uma personalidade
da própria mente da espírita; (3) que muitas vezes ele forçava sua entrada em algumas
das sessões, mas que (4) podia proporcionar farta quantidade de material altamente
probante. Os pesquisadores, contudo, não se arriscaram a afirmar que as mensagens
vinham dos mortos. A esse respeito se achavam inteiramente divididos. Sir Oliver
Lodge preferia a sua hipótese a qualquer outra, acerca da fonte das comunicações da
Sra. Piper, mas a hipótese telepática ganhava terreno, e alguns pesquisadores a
aceitavam.
Mesmo, porém, sem chegarem a acordo acerca da fonte das comunicações da Sra.
Piper, os dirigentes da Sociedade para Pesquisas Psíquicas não se descuidaram de
estudar as suas formidáveis habilidades. Em 1890, ela regressou a Boston, onde
continuou a trabalhar sob os auspícios de Hodgson. Embora os motivos não sejam
claros, parece que então a qualidade de sua mediunidade estava melhorando. Algumas
de suas sessões eram

29
tão impressionantes, que a hipótese telepática teria de ser muito ampliada para explicá-
las. Essa, sem dúvida, era a opinião do Reverendo S. W. Sutton e de sua senhora, que
participaram pela primeira vez de sessões com a Sra. Piper em 1893. O que o casal
esperava era se comunicar com filhinha Katherine, que morrera apenas seis semanas
antes. Os Sutton eram pessoas inteligentes e levaram consigo um taquígrafo,
providenciado pelo Dr. Hodgson, de modo que ainda temos uma anotação estenográfica
completa do que transpirou durante a crítica sessão de 8 de dezembro, ocasião em que
vários membros já falecidos da família Sutton, inclusive a do casal, falaram por
intermédio da Sra. Piper. A sessão foi de tanta importância para se compreender a
psicologia da mediunidade da Sra. Piper, que é transcrita abaixo uma versão publicada
da sessão.
A sessão começou com a Sra. Piper segurando as mãos do taquígrafo. Logo depois,
ela entrou em transe, e então a Sra. Sutton segurou suas mãos. Não levou muito tempo
para que o enigmático Dr. Phinuit conseguisse apresentar a filha do casal. Os Sutton
puderam ouvir então o guia chamando a criança para se aproximar, e depois ele falou,
como se fosse a filha. Era freqüente a comunicação daquela maneira. Ele tomou uma
medalha e uma tira com botões que os Sutton haviam colocado na mesa da sessão,
depois falou:

Dr. Phinuit Anotações da Sra. Sutton


Quero isso. Quero morder isso. Ela costumava morder isso. Os botões
Depressa, quero pô-los na boca... também. Morder os botões era proibido.
Ele imitou exatamente o seu modo
travesso.
Quero que ela fale com vocês. Quem é Não conhecemos. Meu tio morreu anos
Frank no corpo? antes. Gostávamos muito dele. É possível
que Phinuit tenha confundido e meu tio
esteja tentando se comunicar.
Está aqui uma senhora que Minha amiga, Sra. C., morreu de tumor
desencarnou com um tumor nas ovariano.
estranhas.
Ela está com a criança... Está trazendo O nome de seu irmão George.
para mim. Quem é Dodo? Fale comigo
depressa. Quero que você chame Dodo.
Diga a Dodo que estou feliz. Não
chorem mais por minha causa.
(Phinuit leva as mãos ao pescoço.) Não Ela sentia muita dor na garganta e na
sinto mais nada na garganta. Papai, língua.
fale comigo. Não pode me ver? Não
estou

30
morta, estou vivendo. Estou feliz com Minha mãe morrera há muitos anos.
vovó.

(Phinuit passa a falar por si mesmo.)


Estão aqui mais dois. Um, dois, três
aqui... o mais velho e o mais moço que Está correto.
Kakie. É um menino. O que veio Ambos eram meninos.
primeiro.

A pequena chama a senhora de titia. Não sua tia.


Queria que você visse essas crianças.
(Dirigindo-se ao Sr. Sutton.) Você fez
muito bem ao corpo. (À Sra. Sutton.)
Ele é um bom homem. A língua desta
pequena estava muito seca? Ela está
me mostrando a sua língua. Seu nome é A sua língua estava paralisada e a fez
Katherine. Ela se chama de Kakie. sofrer muito.
Desencarnou por último. Está correto.
Diga a Dodo que Kakie está no corpo
espiritual. Onde está o cavalo? O
grande, não o cavalinho. Papaizinho, Eu lhe dei um cavalinho. Provavelmente
me leva para fora (para andar a se refere a um carrinho e cavalo de
cavalo). (Falando por Katherine.) brinquedo.
Estão vendo Kakie? As lindas flores
que puseram em mim estão aqui Phinuit descreve os lírios do vale, que
comigo. Tomei as suas almazinhas e foram colocados em seu caixão.
guardei-as comigo. Papai, quero andar
a cavalo. Todos os dias vou ver o
cavalo. Gosto daquele cavalo. Vou Ela pediu isso durante toda a sua doença.
andar a cavalo. Estou com você todos Perguntei se ela se lembrava de alguma
os dias. coisa depois que foi trazida para baixo.
Eu estava muito quente, minha cabeça
estava muito quente. Correto.

Foram recebidas outras mensagens, e Kakie se referiu à sua irmã Eleanor pelo nome.
Depois, para grande surpresa dos Sutton, o guia começou a cantar uma canção que fora
cantada para a menina antes de sua morte. A menina pediu aos pais que cantassem com
ela, e o casal atendeu ao pedido. Enquanto estava cantando, ouviram uma vozinha
infantil saindo da boca da médium e entoando as palavras exatas. Foram cantadas duas
estrofes, antes de se prosseguir a sessão. Depois, a menina cantou, por intermédio da
médium, outra canção que aprendera em vida. Parecia que a criança estava falando
diretamente através da Sra. Piper e não mais se

31
utilizando do guia. O que impressionou os Sutton foi o fato de serem aquelas duas
canções as únicas que a menina sabia inteiramente. Nesse ponto, Phinuit reapareceu e a
sessão continuou:

Dr. Phinuit Anotações da Sra. Sutton


Cadê Dinah? Quero Dinah. Dinah era uma velha boneca de pano
preta, que não estava conosco.
Quero Bagie. Apelido de sua irmã Margaret.

Quero que Bagie traga Dinah para


mim. Quero Bagie. Quero Bagie o
tempo todo. Diga a Dodo, quando o
virem, que gosto muito dele. Querido
Dodo. Ele costumava caminhar
comigo. Costumava me carregar. Correto.

Dodo cantou para mim. Era um corpo


horrível. Agora um corpo bonito. Diga Nós chamamos sua bisavó de Marmie,
a avó que gosto muito dela. Quero que mas ela sempre a chamou de Grammie.
ela saiba que vivo. Minha avó sabe Tanto a avó quanto a bisavó estavam
disso, Marmie... Bisavó, Marmie. vivas então.

Quando surgiam provas dessa espécie, o Dr. Hodgson começou a duvidar da idéia de
que a telepatia era capaz de explicar as manifestações da Sra. Piper. Até mesmo o de
certo modo discutível, mas vivamente simpático, Dr. Phinuit começou a se impor.
Somente depois, porém, que morre um dos próprios amigos de Hodgson, e começou a
se comunicar com ele por intermédio da Sra. Piper, foi que ele afinal mudou de todo a
sua opinião sobre a mediunidade da mesma. Isso ocorreu em 1892, durante uma fase
crucial daquela mediunidade.
Antes de 1892, a mediunidade de Sra. Piper se caracterizava por duas coisas. Ela
sempre transmitia as suas mensagens falando em estado de transe e a sua transição para
aquele estado era acompanhada por convulsões e espasmos. Foi a fase de mediunidade
dominada pela sempre presente personalidade do Dr. Phinuit, para desconforto dos
pesquisadores que o consideravam apenas como uma subpersonalidade da médium. Em
1892, porém, a Sra. Piper começou a se tornar capaz (sob a direção de Hodgson) de
escrever automaticamente, o que dentro em pouco substituiu as palavras pronunciadas
durante o estado de transe. A transição para o estado de transe também se tornou mais
fácil e tranqüila naquela fase. A verda-

32
deira mudança no transe ocorreu, todavia, com uma nova personalidade que substituiu o
Dr. Phinuit como guia espiritual. George Pellew (que Hodgson chamou de George
Pelham em seus escritos sobre o caso) era um jovem amigo dos pesquisadores, dado a
estudos filosóficos. Ele participou uma vez de uma sessão com a Sra. Piper, antes de sua
morte, e ficou muito preocupado com os problemas da mediunidade em estado de
transe. Sua morte ocorreu em 1892, em conseqüência de um acidente, e não passou
muito tempo antes que ele começasse a se comunicar por intermédio da Sra. Piper.
Dentro em pouco ele assumiu inteiramente o controle do estado de mediunidade da
mesma.
O aparecimento do controle de Pelham também anunciou uma nova dimensão na
qualidade da mediunidade, que se tornou mais focalizada e consistentemente probante.
Hodgson também usou o espírito de Pelham para verificar a possível base espírita de
toda a mediunidade. Nos meses seguintes, ele levou às sessões 150 pessoas, 30 das
quais tinham conhecido Pelham em vida. O espírito de Pelham reconheceu
perfeitamente 29 delas. Seu único lapso ocorreu quando deixou de reconhecer uma
moça que conhecera quando criança. A maior parte dos participantes das sessões pôde
conversar com o espírito de Pelham, como se ele próprio estivesse ali em carne e osso, e
a qualidade de suas muitas conversas em transe foi certamente igual à das sessões de
Pelham. Hodgson ficou tão impressionado com essa nova personalidade, que escreveu
outro relatório sobre a Sra. Piper, em 1898, no qual expôs os motivos que o levaram a se
converter à teoria espírita.
A história subseqüente da mediunidade da Sra. Piper não é menos imponente ou
dramática. Ela sofreu as mais diversas mudanças de controle, e, quando o Dr. Hodgson
morreu de repente, em 1905, passou posteriormente a se comunicar por intermédio dela.
A mediunidade da Sra. Piper começou a se deteriorar em 1911, e ela perdeu de todo o
estado de transe, embora a escrita automática continuasse durante alguns anos mais. Ela
realizou sessões ainda na década de 1920, e morreu em 1950.
Talvez se admita hoje que toda a questão da sobrevivência pode ter sido baseada na
mediunidade da Sra. Piper. Mesmo, porém, com tão elevada qualidade comprobatória,
alguns dos componentes da velha guarda da Sociedade de Pesquisas Psíquicas ainda se
mostravam céticos quanto à hipótese espírita. Vários de seus guias, por exemplo, ainda
continuavam a ser personagens fictícias, e mesmo os mais dignos de crédito — que
deveriam conhecer melhor — sustentavam a legitimidade dos que eram flagrantemente
fictícios. Mesmo o altamente considerado Pelham não conseguia discutir questões
filosóficas muito bem, por intermédio da Sra. Piper, apesar de se tratar de matéria a que
era muito afeiçoado quando em

33
vida. Foi com esperança de esclarecer alguns desses problemas que a Sociedade estava
sempre à procura de novos e eficientes médiuns. Essa tendência foi, de certo modo,
fortuita, uma vez que muitos dos fundadores da Sociedade estavam começando a passar.
Surgiu uma nova geração de pesquisadores para continuar o seu trabalho.

Correspondência-Cruzada

F.W.H. Myers morreu em 1901, um ano depois da morte do Professor Henry


Sidgwick. A morte de Gurney ocorrera alguns anos antes, tragicamente, talvez por
suicídio. A direção da Sociedade de Pesquisas Psíquica caiu nas mãos de um grupo de
novos intelectuais, chefiados por Alice Johnson, protegida pela esposa do Professor
Sidgwick, e J. C. Piddington, erudito e advogado que cedo dedicou toda a sua atenção
às pesquisas psíquicas. Esses pesquisadores ocuparam-se em estudar a mediunidade da
Sra. Piper, mas também se interessando por várias outras médiuns que entraram em
cena. Entre essas se destacava a Sra. Margaret Verrall, esposa de um professor de
Cambridge, e sua filha Helen. Ambas estavam bem a par do trabalho da Sociedade de
Pesquisas Psíquicas antes de manifestarem sua própria mediunidade. A Sociedade
também se dedicou ao estudo dos escritos automáticos da irmã de Rudyard Kipling na
Índia, que identificava apenas como Sra. Holland nos relatórios a seu respeito. Na
realidade, ela entrou em contacto com a Sociedade quando se viu, de repente, recebendo
mensagens automaticamente escritas do sobrevivente F.W.H. Myers. A última do grupo
de novas médiuns foi uma mulher chamada apenas de Sra. Willet nos relatórios e que
era a mais talentosa do grupo. Foi somente anos depois de sua morte que foi revelada a
sua identidade, como sendo a da Sra. Winifred Coombe-Tenant, destacada estadista
britânica em vida. Foi altamente satisfatório o fato de ter a Sociedade encontrado tantas
médiuns talentosas, pois se viu que os falecidos fundadores da Sociedade estavam
ansiosos para se comunicarem do além.
Não era de se surpreender que aqueles eminentes intelectuais quisessem entrar em
contacto com os seus colegas, mas foi surpreendente a natureza de suas comunicações.
Algumas vezes, uma das espíritas, trabalhando sozinha em casa, rabiscava uma
mensagem pouco inteligível, mas que parecia estar relacionada com o que uma das
outras estava escrevendo ao mesmo tempo. Essas mensagens muitas vezes pareciam vir
do falecido Myers. Piddington e Johnson constataram, dentro em pouco, que curiosos
quebra-cabeças eram transmitidos através das mensagens, uma vez que,

34
quando elas eram juntadas, revelava-se uma importante comunicação. Tais quebra-
cabeças foram imediatamente denominados correspondência-cruzada e representaram
um capítulo muito importante na literatura da mediunidade em transe. Continuaram
durante anos, e davam a impressão de que Myers estivesse lançando mão de um meio
bem pessoal de mostrar a sua continuada sobrevivência aos colegas que deixara para
trás.

A Sra. Margaret
Verrall foi a
protagonista das
correspondências
cruzadas, que,
afirmava, eram
escritas
deliberadamente por
uma única
personalidade: a de
F. W. H. Myers,
então recém-
falecido. (Biblioteca
Mary Evans)

35
Algumas das correspondências-cruzadas se tornaram enormemente complexas, uma
vez que Myers tinha o hábito de resumir seu material e citações da literatura clássica
grega e romana. A maioria das médiuns ignorava aquela espécie de literatura, mas
Myers era uma autoridade no assunto, de sorte que a sua escolha foi, sem dúvida, muito
a propósito. Um dos casos mais fáceis de ser seguido foi o dos túmulos dos Medicis,
que o soi-disant Myers comunicou por intermédio de várias médiuns da Sociedade, em
1906. A correspondência-cruzada surgiu quando a Sra. Holland se encontrava visitando
a Inglaterra, naquele ano. Alguns de seus escritos particulares daquele período
continham mensagens de Myers alusivas a morte, sono, sombras, amanhecer, noite e
madrugada. Não foram dadas chaves para se saber o significado daqueles temas, a não
ser o nome de Margaret (Verrall), que foi acrescentado.
Alusões tão crípticas sugeriam que havia nas obras uma correspondência-cruzada;
assim, depois de se informarem acerca dos escritos, Alice Johnson e Piddington
trataram de verificar os escritos que outras médiuns estavam enviando. Como a Sra.
Piper também se encontrava na Inglaterra, naquela ocasião, J.G.P. Piddington realizou
com ela outra sessão alguns meses depois e ela disse as seguintes palavras, ao voltar de
transe: “cabeça demore... louro por louro. Digo que dou isso a ela pelo lauro. Adeus”.
Ela viu também a aparição de um negro. Isso realmente não fazia muito sentido, de
maneira que Piddington realizou outra sessão com a Sra. Piper, no dia seguinte. Durante
a sessão, Myers se comunicou diretamente e explicou que a chave da críptica mensagem
podia ser encontrada examinando-se os escritos da Sra. Verrall. (Não se deve esquecer
que havia uma alusão a essa mesma mensagem nos incipientes escritos da Sra.
Holland.) Constatou-se que o desencarnado Myers estava um pouco por fora, pois as
seguintes alusões ao quebra-cabeça se encontravam nos escritos da Sra. Verral feitos em
Cambridge. Ela seguiu o tema dos louros, escrevendo certo dia: “Túmulo de
Alexandre... folhas de louro são emblemas, louro para a fronte do vencedor”. Também
a Sra. Holland ainda estava sob a influência do suposto Myers, pois, pouco depois que
chegaram os escritos da Sra. Verrall, ela escreveu, certa noite: “Escuridão, luz, sombra,
a cabeça de Alexander Moor”. Deve se notar que nenhuma das espíritas estava em
contacto com qualquer das outras.
Há pouca dúvida de que aquelas mensagens estavam inter-relacionadas embora
tivessem pouco sentido para o leitor moderno. Os dirigentes da Sociedade de Pesquisas
Psíquicas, porém, eram versados em literatura e história clássicas, e as alusões tinham
muito sentido para eles. A explicação final ocorreu quando a Sra. Willett entrou em
contacto com a Socie-

36
dade, para apresentar alguns de seus escritos automáticos, que continham as palavras:
“Túmulo Laurenciano, Alvorecer e Crepúsculo”.
Tornou-se aparente que todas aquelas mensagens se referiam ao túmulo da família
Medicis na Itália... J.G. Piddington explica, em seu relatório sobre a correspondência-
cruzada, que o louro era o emblema de família de Lorenzo, o Magnífico, que foi
patriarca dos Medicis. Outros símbolos esculpidos nos túmulos da família representam
o amanhecer e o

F. W. H. Myers
com seu filho
Harold.
(Biblioteca Mary
Evans)

37
crepúsculo. A alusão a Alexandre não era muito estranha, uma vez que outro membro
da família foi Alessandro de Medicis. Era chamado O Mouro, por causa de sua
ascendência mulata, e foi enterrado secretamente em um túmulo da família.
Uma interpretação do episódio, portanto, é que o falecido Myers usou o seu
conhecimento a respeito dos túmulos para introduzir um quebra-cabeça literário nos
escritos das médiuns. Tratava-se de um tipo de conhecimento em que Myers era muito
versado, mas que não estava ao alcance da cultura de algumas das espíritas.
O caso dos túmulos dos Medicis é, na verdade, bem simples. Algumas das outras
correspondências-cruzadas foram muito mais complexas e levaram anos para se
completarem. O apogeu das correspondências-cruzadas ocorreu, provavelmente, em
1906, quando a Sra. Piper ainda se encontrava na Inglaterra. Durante uma das sessões
com ela, Piddington dirigiu uma mensagem especialmente elaborada a Myers, que
estava preparado para recebê-la. Expôs a Myers, por intermédio da Sra. Piper: “Estamos
cientes do esquema de correspondências-cruzadas que enviaste por intermédio de
várias médiuns e esperamos que continue com ele. Procura dar a A e B duas
mensagens diferentes, entre as quais não seja discernível relacionamento algum.
Depois, o mais cedo possível, entrega a C uma terceira mensagem que revele as
sugestões ocultas.” Também propôs que Myers mostrasse suas alusões à
correspondência-cruzada, assinando os escritos pertinentes com um triângulo inscrito
em um círculo.
Ora, essa mensagem revestiu-se de uma característica muito importante, pois foi lida
em latim ciceroniano à médium já em estado de transe. A Sra. Piper, naturalmente, não
sabia latim e especialmente um dialeto tão obscuro, mas o idioma era bem familiar a
Myers quando em vida. A mensagem foi respondida com a informação de que fora
compreendida.
Passaram-se apenas algumas semanas para o desencarnado Myers ditar sua
complicada correspondência-cruzada. Entre 17 de dezembro e 2 de janeiro, começaram
a aparecer nos escritos da Sra. Verral e sua filha alusões aos temas de estrelas,
esperança e poesia de Robert Browning. Essas alusões tiveram pouco sentido para
Piddington, até que ele recebeu uma mensagem em uma sessão com a Sra. Piper, em
Londres, no sentido de “procurar Estrela, Esperança e Browning”. As alusões se
mostraram então perfeitamente compreensíveis, quando Piddington tratou de procurar
em Browning e verificou que a correspondência-cruzada se referia a temas contidos no
poema Abt Vogler.
As correspondências-cruzadas continuaram durante anos, começando a decair na
década de 1910. Os dirigentes da Sociedade de Pesquisas Psíquicas as consideraram
como provas muito convincentes da sobrevivên-

38
cia, embora se mostrassem muito problemáticas para o estudioso moderno A maior
dificuldade das correspondências-cruzadas é a necessidade de se ter conhecimentos
clássicos muito amplos para apreciá-las devidamente. Escrevendo em 1972, o Dr.
Robert Thouless — psicólogo britânico, que é uma autoridade no problema da
sobrevivência — chegou a ponto de dizer que “se essa foi uma experiência imaginada...
do outro lado do túmulo, acho que deve ser considerada como uma experiência muito
mal imaginada. Forneceu uma grande quantidade de material cujo valor probante é
muito difícil de ser julgado e acerca da qual as opiniões variam”.
O veredito do Dr. Thouless é bastante severo, mas corresponde à opinião de muitos
pesquisadores contemporâneos. De qualquer modo, é importante notar que os
pesquisadores que estudaram as correspondências-cruzadas mais intensamente
acabaram por ver nelas uma forte e quase irrefutável prova da vida após a morte. A
única exceção foi o cético Frank Podmore, que acreditava que as mesmas poderiam ser
explicadas pela telepatia entre as médiuns. Atribuiu especialmente à Sra. Verral como
fonte da divulgação, uma vez que era a única das médiuns que tinha bom conhecimento
dos clássicos.

Novas Circunstâncias nas Pesquisas Sobre a Mediunidade

O declínio da mediunidade da Sra. Piper e da correspondência-cruzada em geral,


depois de 1910, não impediu o progresso das pesquisas sobre a sobrevivência na Grã-
Bretanha. Simplesmente encerrou um capítulo das pesquisas, ao mesmo tempo que
outros se iniciavam. Os pesquisadores psíquicos tornavam-se mais requintados e
começavam a compreender que necessitavam de novos caminhos para explorarem a
natureza da mediunidade pelo transe. A oportunidade surgiu em 1915, quando Sir
Oliver Lodge chamou a atenção da Sociedade de Pesquisas Psíquicas para uma outra
grande médium. Era uma mulher nascida na Inglaterra que, em transe, revelava uma
guia chamada Feda, que, por sua vez, dizia ser natural da Índia, onde morrera ainda na
infância. Por mais improvável que isso pudesse parecer, as pesquisas com a talentosa
médium se estenderam pelas duas décadas seguintes e mesmo depois.
A Sra. Gladys Osborne Leonard nasceu em 1882. Durante a infância teve visões e
encontros paranormais, mas, como acontece com tantas outras espíritas, a sua
mediunidade só se manifestou quando ela começou a participar de experiências de
inclinação de mesa, no porão de um teatro

39
onde trabalhava como atriz. Seguiu-se o transe e, em 1915, ela começou a se tornar
famosa nos círculos espíritas de Londres. Um amigo de Sir Oliver Lodge e sua esposa
assistiam a uma das sessões espíritas de que ela participava, naquele mesmo ano, e
ficaram tão impressionados que recomendaram ao físico. Lodge, depois de ser
informado sobre as qualidades da Sra. Leonard, assistiu a uma das sessões espíritas, e
ele e sua esposa receberam um certo número de comunicações comprobatórias de seu
filho, que fora morto na guerra. A peça probante mais impressionante foi a descrição de
uma fotografia, que o morto afirmava ter sido tirada dele com o seu pelotão. Essa
fotografia chegou pelo correio, algum tempo depois da sessão espírita.

A Sra. Gladys
Osborne Leonard
deu mais de setenta
sessões
convencendo a
Sociedade de
Pesquisas Psíquicas
de que as suas
qualidades
psíquicas eram
verdadeiras.
(Biblioteca Mary
Evans)

40
Lodge estava plenamente familiarizado com a psicologia da mediunidade graças à
sua prolongada associação com o trabalho com a Sra. Piper, mas coube a novos e mais
inovadores pesquisadores explorar as possibilidades oferecidas pela mediunidade da
Sra. Leonard.
Provavelmente, as mais notáveis séries de experiências feitas com a Sra. Leonard
foram empreendidas pela conhecida escritora Ann Radclyffe-Hall, que fazia parte,
então, da Sociedade de Pesquisas Psíquicas, e Una, Lady Troubridge, em 1919. O
principal espírito comunicador foi o de uma falecida amiga de Miss Radclyffe-Hall, à
qual os relatórios se referem apenas pelas iniciais (A.V.B.). As duas investigadoras
participaram de sua primeira sessão com a Sra. Leonard em sua casa, no dia 19 de
agosto, e Feda, então, descreveu uma mulher com cerca de 60 anos, que estava
querendo se comunicar. Também descreveu as feições fisionômicas da mulher e o seu
penteado. Esses dados foram suficientes para Miss Radclyffe-Hall identificar o espírito,
pois sua amiga morrera pouco antes, aos 57 anos de idade. O espírito de A.V.B. também
se manifestou na sessão seguinte, quando Feda explicou que a comunicadora “às vezes
olhava de soslaio para as pessoas, sem mover a cabeça, e estava olhando daquela
maneira então”. Essas eram características de Miss A.V.B. em vida, e as participantes
da sessão ficaram muito impressionadas.
Talvez a mais impressionante das sessões foi a realizada no dia 22 de novembro. O
espírito de A.V.B. aproveitou aquela ocasião para enviar um grupo de mensagens
comprobatórias acerca de uma viagem às Ilhas Canárias que ela e Miss Radclyffe-Hall
tinham feito certa vez. O espírito descreveu cenas de suas aventuras juntas, e finalmente
mencionou que ilhas haviam visitado. Citemos algo do registro da sessão:

Feda Sabe alguma coisa a respeito de uma ilha, que não fica longe daqui?
M.R.H. Sim, sei algo a respeito de uma ilha.
Feda Disse de súbito: “Ilha, ilha, ilha”. Fica mostrando a Feda uma faixa de
terra estendida no meio da água e diz: “É uma faixa de terra estendida
na água?”
M.R.H. Sim, é uma ilha.
Feda Ela diz que é um lugar chamado Ter... ter... terra... Oh! Feda não
consegue entender de todo, mas ela diz que é um lugar chamado Ter...
Te... não. Feda não consegue entender, mas começa Te... É Tener...
Tener... Ten... Ten... Como, senhora?

41
M.R.H. Tener está certo.
Feda Teneri... Teneri... i... i... fe... fe... ife... Tenerifer. Ela diz que não
concorda com “fer”. Diz que Tener está certo. Diz que cortando a
última “er” está certo.
Feda (Em voz baixa: Tenerife, é Tenerife!) Ela continua dizendo que é uma
ilha, é uma ilha, diz ela, e diz que é um belo lugar, ela diz: “Tenerife!”
Sabe? Ela se manifestou de súbito. Diz que está exasperada porque a
senhora não está compreendendo. Pensa que Feda está atrapalhando.
Agora está dizendo que há um lugar chamado M. de novo... Masager...
Masager... Madaga... Maza

M.R.H Maza está certo, Feda.


Feda Mazaga... Mazager... Mazagi... Mazagon... (Aqui omitimos vários outros
esforços por parte de Feda para pronunciar o nome, que afinal terminou
com Mazagal.)
M.R.H. Não, não é bem Mazagal, Feda.
Feda Mazagan!
M.R.H. Está certo, Feda.

Mazagan era o nome de uma cidade de Marrocos que as duas amigas tinham visitado
a caminho das Ilhas Canárias.
Durante uma sessão posterior, Miss Radclyffe-Hall fez uma pergunta teste.
Perguntou a Feda (por intermédio da médium) se o espírito comunicante podia se
lembrar da palavra poon. Feda imediatamente respondeu que a comunicante estava
rindo e respondeu que a palavra era usada para significar um estado ou condição. Essa
resposta correta levou a consultante a pedir ao espírito para citar outra palavra que
tinham inventado. Feda pareceu ter alguma dificuldade em receber a palavra da
entidade, de modo que o assunto foi posto de lado no momento. Na sessão seguinte,
porém, Feda interrompeu de súbito o que estava dizendo, para exclamar: “Sporkish!
Sporkish. Ela diz que é a síntese de poon”.
Estava certo. As duas amigas tinham inventado aquelas palavras como um código
particular, para designar as pessoas de quem gostavam ou que achavam cacetes.
As sessões realizadas por Miss Radclyffe-Hall e Una, Lady Troubridge, para
entrarem em contacto com Miss A.V.B. duraram dois anos. O espíri-

42
to comunicador chegou mesmo a adquirir a capacidade de controlar diretamente a
médium, que muitas vezes falava com as mesmas características vocais da falecida.
Esse aspecto dramático da mediunidade da Sra. Leonard não foi um caso isolado, pois
participantes de muitas sessões espíritas, naqueles anos, se comunicaram com parentes
mortos por intermédio direto da médium. Todo o comportamento da Sra. Leonard se
alterava naquelas ocasiões, e ela assumia as características vocais e mesmo físicas das
pessoas desencarnadas. A semelhança impressionava profundamente muitos dos
participantes das sessões.
Embora os relatórios de Radclyffe-Hall fossem extremamente corretos, pouco
contribuíram realmente para o problema da sobrevivência. A despeito da excelente
qualidade da mediunidade da Sra. Leonard e das provas, os céticos continuavam
sustentando que a informação crucial poderia ter sido telepaticamente derivada da
mente dos próprios participantes das sessões. Era evidente que se tornava necessário um
novo método no estudo da mediunidade, e isso surgiu quando C. Drayton Thomas,
clérigo britânico e membro ativo da Sociedade de Pesquisas Psíquicas, começou a
trabalhar com a Sra. Leonard, em 1917. Reunindo-se regularmente com a médium em
sua casa, ele recebeu volumosas mensagens de seu pai e de sua irmã já falecidos.
Drayton Thomas também instituiu um tipo de prova peculiar com o espírito de seu pai,
que se tornou conhecida como prova do livro e que abriu um novo capítulo nas
pesquisas para se provar a sobrevivência psíquica. Em tais experiências, Drayton
Thomas pedia ao espírito para examinar psiquicamente livros que se encontravam, ou
em um embrulho fechado, ou em sua própria biblioteca. A sua idéia era a de forçar o
espírito a fornecer informação que não podia ser furtada da própria mente do
consultante.
As experiências deram ótimo resultado. Uma das provas mais espetaculares desse
gênero ocorreu durante uma das primeiras sessões de Drayton Thomas com a Sra.
Leonard, quando ele ouviu algumas pancadas peculiares na casa. Seu primeiro
pensamento foi de que pudessem ser tentativas por parte de seu pai para entrar em
comunicação com ele. Participou de uma sessão com a Sra. Leonard e não tardou a ter
uma explicação do mistério. Feda — sem qualquer iniciativa por parte do consultante
— a iludiu espontaneamente ao incidente e explicou que ela fora uma das que batera na
casa do clérigo. Em seguida, Feda trouxe o pai de Drayton Thomas, que comunicou
uma mensagem bastante críptica, por intermédio de Feda. Nessa mensagem, disse ao
filho para regressar para casa e encontrar um volume “...atrás da porta do seu
escritório, na segunda prateleira a contar do chão e o quinto livro a partir da esquerda.
Quase no alto da página 17, encontrará palavras que parecem indicar o que Feda
estava

43
tentando dizer quando bateu em seu quarto”. E o espírito acrescentou: “Agora que você
está ciente da tentativa de Feda, verá o inequívoco ajustamento daquelas palavras com
o fato”.
O clérigo mal pôde esperar o momento de voltar para casa, a fim de ver se seu pai e
Feda estavam certos. O livro que encontrou no lugar indicado era um volume de
Shakespeare. A página indicada continha uma passagem muito adequada de Rei
Henrique IV, que dizia: “Não te responda rei com palavras, mas com pancadas”.
Sucessos tais como esse foram numerosos, e a sua eficiência não poderia ser
explicada como decorrente de mera coincidência. De fato, alguns pesquisadores da
Sociedade — estimulados pelo sucesso de Drayton Thomas — realizaram experiências
com a prova do livro entre eles, sem conseguirem qualquer êxito prático. Drayton
Thomas mais tarde expandiu as experiências fazendo com que o espírito de seu pai
predissesse palavra e trechos que apareceriam em jornais do dia seguinte. Também
essas experiências foram altamente bem-sucedidas.
Os resultados indicaram, sem sombra de dúvida, que a Sra. Leonard possuía
extraordinária capacidade psíquica. Drayton Thomas também conseguiu demonstrar que
a simples telepatia não poderia explicar muitas da comunicações que o espírito de seu
pai transmitia. Ele favoreceu, assim, uma interpretação espírita das comunicações.
Olhando-se, porém, atualmente, para aquelas experiências, partindo-se de uma
perspectiva mais moderna, a opinião de Drayton Thomas parece um tanto abalada.
Durant aqueles anos críticos, os pesquisadores não compreenderam, infelizmente, que
um médium pudesse se apoiar na clarividência e precognição tão facilmente como na
telepatia. Assim, os céticos contemporâneos podiam facilmente argumentar que a Sra.
Leonard apenas se utilizava de seus próprios poderes psíquicos para ler os livros e
jornais e depois colocar a informação na boca de seus (autoproclamados)
comunicadores.
É difícil se refutar esse tipo de argumentação, que não explica, contudo, a curiosa
psicologia da prova do livro. Drayton Thomas conseguiu mostrar que o espírito de seu
pai alcançava seus maiores êxitos quando aludia a livros que tinham sido os seus
prediletos em vida. Essa descoberta parece se ajustar muito mais à hipótese espírita. Se
a Sra. Leonard estivesse se valendo de seus próprios poderes psíquicos durante os testes,
teria tido o mesmo resultado com qualquer dos volumes.
O Reverendo C. Drayton Thomas tratou de explorar vários outros aspectos da
mediunidade da Sra. Leonard. Ele chegou finalmente à conclusão que a melhor maneira
de pôr à prova a mediunidade consistia em separar completamente os consultantes da
sessão propriamente dita. Isso o levou a criar o que chamou de consultas por
procuração, quando ficava

44
com a médium, na ausência dos clientes. Ele se limitava a mostrar a designação e
explicar a Feda que estava fazendo uma consulta para uma pessoa ausente que desejava
entrar em contacto com um determinado espírito. O que esperava é que Feda pudesse
introduzir o indivíduo desejado, mesmo em condições tão rigorosas. Os resultados
combinados de muitas sessões desse gênero, realizadas por Drayton Thomas, e mais
tarde pelo secretário de Sir Oliver Lodge, não se mostraram prejudicados pelo processo.
As mais destacadas sessões daquele gênero foram objeto de relatório da Sociedade de
Pesquisas Psíquicas em 1935, e consistiram em uma série de sessões nas quais o clérigo
atuou como representante de um estranho que lhe havia escrito. O missivista desejava
entrar em contacto com um neto, que morrera apenas um mês antes.
Drayton Thomas a princípio se mostrou cético, pois não achava que um espírito tão
jovem pudesse falar através da médium. Suas dúvidas se dissiparam prontamente.
Bobbie Newlove conseguiu se comunicar com a ajuda dos controles psíquicos, e, dentro
em pouco, enviou uma série de mensagens verídicas ao avô. Entre essas mensagens
estava a correta descrição de um saleiro em forma de cachorro que ele possuíra em vida,
uma roupa que usara certa vez e até mesmo o nome da rua onde estava situada a sua
escola. A descrição mais impressionante foi de alguns canos que atravessavam um
campo perto da escola, onde o menino gostava de brincar. Tais canos foram
posteriormente localizados e pareceu provável que o menino tivesse adoecido por ter
bebido a água estagnada que vazava dos canos.
Na fase final de sua mediunidade, a Sra. Leonard apresentou finalmente o que pode
ser considerado como a prova definitiva da sobrevivência. Os participantes podiam
ouvir uma terceira voz falando na sala de sessões, muitas vezes transmitindo
informações a Feda (que controlava diretamente as palavras normais da médium).
Aquela voz era, ocasionalmente, bem alta, e foi muitas vezes apanhada pelo gravador,
novo recurso mecânico adotado, que servia para se registrar permanentemente a
mediunidade da Sra. Leonard. As gravações que ouvi são extremamente
impressionantes, uma vez que a voz direta é alta e clara, e uma voz masculina, sem
dúvida alguma. (Tais gravações foram feitas durante uma das sessões de Drayton
Thomas e a voz direta é atribuída a seu pai.) A voz algumas vezes parece com a de uma
terceira pessoa que estivesse no aposento e fala freqüente e desinibidamente durante a
sessão.
A Sra. Leonard continuou as suas sessões até a década de 1940. Sua morte ocorreu
em 1968.

45
A despeito de todas as provas, nenhuma solução final do problema da sobrevivência
resultou do estudo da mediunidade. A tentação da hipótese telepática cedo se
reencarnou como a teoria do super-ESP (percepção extra-sensorial), que argumenta que
o médium pode utilizar ilimitados poderes de telepatia e de clarividência para apresentar
as suas personalidades secundárias como entidades espíritas. Algo próximo da hipótese
super-ESP foi mesmo parcialmente demonstrado em 1921, quando S.G. Soal, destacado
pesquisador psíquico britânico, realizou uma série de sessões com a Sra. Blanche
Cooper, no Colégio Britânico de Ciências Psíquicas, em Londres, conseguindo entrar
em contacto com um antigo colega de estudos, chamado Gordon Davis, que transmitiu
um certo número de mensagens verídicas. As provas de comunicação espírita foram
impressionantes, porém mais tarde se verificou que o comunicador ainda estava vivo.
Pesquisas posteriores revelaram que a médium descreveu detalhes da casa para a qual
aquele cavalheiro só se mudou posteriormente.*
Na década de 1930, as pesquisas sobre a sobrevivência se tornavam cada vez mais
decepcionantes. A impossibilidade de se encontrar uma prova definitiva da vida depois
da morte, porém, não constituía a razão primordial de estar a questão da sobrevivência
sobrepujada por outras áreas da pesquisa. Apesar de sua importância no problema da
sobrevivência, as pesquisas psíquicas também se dedicaram ao estudo da percepção
extra-sensível. Pesquisas experimentais no terreno dos fenômenos de telepatia,
clarividência e precognição alcançaram então o primeiro plano da parapsicologia.
Ocorreu naquela década o aparecimento do programa de parapsicologia na Universidade
Duke, em Durham, Estado da Carolina do Norte onde J.B. Rhine provocou sensação no
mundo científico com as suas novas descobertas. Usando simples processos estatísticos,
Rhine mostrou que muitas pessoas podiam revelar as leis da probabilidade recorrendo à
ordem de símbolos geométricos gravados em cartões. Seus dados e deduções
revolucionaram todo o campo. Testes de percepção extra-sensorial dentro em pouco se
multiplicaram em muitas academias e universidades

*
Como S. G. Soal posteriormente falsificou os resultados de suas experiências de percepção extra-
sensorial na Universidade de Londres, alguns pesquisadores se mostram céticos quanto à veracidade de
todas as suas afirmações e de todos os seus relatórios. Há, no entanto, alguma confirmação independente
de que as comunicações de Gordon Davis foram recebidas como Soal as registrou. Gordon Davis também
sustentou a verdade de tudo, até a sua morte, na década de 1960. Também deve ser notado que os outros
casos de comunicação espírita ocorreram posteriormente e podem ser encontrados na literatura.

46
norte-americanas, e alguns membros da jovem guarda da Sociedade de Pesquisas
Psíquicas chegaram a abandonar as salas de sessões espíritas, em troca do laboratório. A
parapsicologia jamais seria a mesma.
Embora as pesquisas experimentais tenham passado para o primeiro plano da
parapsicologia, isso não quer dizer que a questão da sobrevivência tenha sido
considerado como assunto definitivamente arquivado. Ao contrário, as pesquisas sobre
a sobrevivência vêm progredindo, lenta, mas seguramente, desde a década de 1970. O
renascimento do interesse pela questão foi, sem dúvida, despertado pelas pesquisas
iniciais decorrentes do caso da herança de Kidd, de que já se falou. Se examinarmos o
desenvolvimento da parapsicologia em seu primeiro século de existência, verificaremos
que grandes progressos foram feitos no estudo da questão da sobrevivência. Os
primeiros pesquisadores psíquicos demonstraram que o problema da imortalidade
humana pode ser encarado crítica e cientificamente. Também demonstraram que certas
formas de fenômenos psíquicos se relacionam diretamente com a questão. Esses
fenômenos — primordialmente aparições e mediunidade em transe — puderam ser
usados ura legitimar a presunção a priori de sobrevivência.
Houve apenas dois senões. Em primeiro lugar, os fundadores da Sociedade de
Pesquisas Psíquicas verificaram que o estudo do problema da sobrevivência era muito
mais complicado do que imaginavam. Em segundo lugar, não conseguiram eles chegar a
um consenso acerca dos critérios que teriam de ser adotados para que o problema
ficasse autorizadamente resolvido.
Hoje, cem anos depois do início das pesquisas psíquicas, os parapsicólogos ainda se
encontram às voltas com aqueles mesmos problemas. Assim, quando o problema da
sobrevivência se tornou de interesse de pesquisadores, no começo da década de 1970,
tiveram de explorar novas direções, em busca de provas da imortalidade do homem.

47
*
* *

48
2
A Mente Fora do Corpo
O seguinte relato foi escrito em 1965 por um jovem da Califórnia:

Certo dia, no verão de 1965, cheguei de um curso de verão e, como de hábito, deitei-
me na cama e tirei os sapatos. Era um desses dias muito quentes, em que as moscas
ficam zumbindo ao redor da gente, e procurei cochilar um pouco. Quando me deitei,
porém, uma estranha sensação me dominou. Percebi que não podia me mover e que o
meu corpo todo estava tremendo, como se carregado de uma corrente elétrica. Depois,
tive a impressão de estar flutuando. Fechei os olhos, a fim de fluir com a sensação e,
dentro de dois segundos, senti-me flutuando acima do meu corpo. Não podia ver
claramente, embora tudo no quarto parecesse envolto em uma névoa cor-de-rosa. Logo
que compreendi que estava inteiramente fora do meu corpo, me vi de pé, junto de minha
casa. Tentei caminhar até a porta, mas não consegui. Tremi por algum tempo e,
momentos depois, me vi de novo em minha cama.

Na ocasião, o jovem pensou que havia passado por uma experiência verdadeiramente
sui generis. Estava enganado, pois milhares de pessoas têm experimentado a mesma
coisa. Alguns experimentam a sensação quando doentes ou perto da morte, enquanto
com outros ela ocorre quando caem de uma bicicleta, são atropelados ou sofrem outros
acidentes que põem a vida em perigo. Por outro lado, algumas poucas pessoas (como o
jovem a que acabamos de nos referir) experimentam a sensação sem qualquer agente
catalisador. Simplesmente lhes acontece tal coisa, quando estão descansando ou
repousando. Trata-se, porém,de uma experiência que jamais será esquecida por quem
passou por ela. Pesquisas recentes indicam que

49
a maior parte das pessoas que experimentaram tal sensação a acha agradável e gostaria
de experimentá-la de novo. É, também, uma experiência muito comum, e inquéritos
realizados recentemente, tanto nos Estados Unid como na Inglaterra, indicam que uma
de cada cinco pessoas experimentará sensação semelhante em sua vida. Poucas pessoas,
contado, se mostram capazes de se tornarem aptas a deixarem o corpo à sua vontade.
Tais pessoas existem, no entanto, e, nos últimos anos, vários parapsicólogos de
destaque as têm vivamente convidado a provar suas qualidades em laboratório.
Quando o Dr. Garden Murphy se dirigiu à justiça de Arizona, no processo de Kidd,
em 6 de junho de 1967, trouxe à baila o assunto da experiência de saída do corpo.
“Trata-se de experiências — explicou — que ordinariamente duram poucos minutos, às
vezes horas, nas quais uma pessoa, em via de regra adormecida ou em estado de coma,
tem a impressão de sair do seu corpo, andar às vezes até milhas de distância do mesmo,
podendo olhar para trás e ver a casa em que o corpo se encontra...”
Acrescentou o psicólogo que, “em tais condições, o indivíduo é realmente visto por
outros. Há alguns poucos casos em que a experiência acarreta a visibilidade para
outro indivíduo, que vê a pessoa, não onde seu corpo se encontra no leito de enfermo,
mas fora, ao ar livre”. O Dr. Murphy ficou intrigado com esses relatos. Sugeriu que a
presença fora do corpo talvez produzisse alguma espécie de efeito material no ponto de
sua projeção, e que tal fenômeno poderia concorrer para a solução do problema da
sobrevivência. Demonstraria, com efeito, que possuímos alguns aspectos da mente que
podem deixar o corpo existir separado deles.

O corpo astral deixando o corpo físico, de acordo com os relatos de Sylvan Muldoon sobre as suas
experiências fora do corpo. (Biblioteca Mary Evans)

50
Esse ponto de vista era de há muito defendido pelos partidários da teoria da
sobrevivência. Parece lógico concluir que, se a mente pode funcionar afastada do corpo
durante certo tempo, também poderia ser capaz de funcionar fora dele
permanentemente. Por isso é que alguns pesquisadores se interessam pela experiência
fora do corpo, certos de que o estudo desse fenômeno é de suma importância para o
problema da sobrevivência. Os dados apresentados no capítulo anterior demonstram a
imensa dificuldade de se mostrar que os mortos podem entrar em contacto com os vivos
diretamente. As experiências fora do corpo nos oferecem a possibilidade de resolver o
problema da sobrevivência, mostrando que os vivos possuem a capacidade inata de
sobreviverem ao choque da morte.
É por isso que a pesquisa da natureza das experiências da mente fora do corpo se
tornaram de importância primordial na questão da sobrevivência. A chave da questão
em jogo é muito simples: A saída para fora do corpo é uma forma verdadeira de
fenômeno psíquico? E, se assim é, algo realmente objetivo ou identificável deixa, de
fato, o corpo durante a experiência? Provadas essas duas possibilidades, chega-se
automaticamente à conclusão de que a experiência fora do corpo será afinal usada para
sobrepujar a morte.

Experiências fora do Corpo

Os parapsicólogos têm se interessado pelas experiências fora do corpo desde o tempo


de F.W.H. Myers, mas apenas há bem poucos anos a atenção se voltou para a
exploração dos seus parâmetros. O tópico jamais se tornou o ponto focai de um sério
esforço investigativo, porque não se quadrava perfeitamente na concepção severa da
parapsicologia adotada na década de 1930. Os pesquisadores induziam saídas do corpo
em seus examinados através da hipnose e tentavam fazer com que seus corpos astrais
liberados produzissem ruídos ou afetassem balanças muito sensíveis. Tentaram mesmo
fotografar a duplicata humana. Foi alcançado considerável sucesso, mas é muito difícil
avaliar hoje tal pesquisa. A primeira tentativa de estudar o fenômeno cientificamente,
mais recentemente, ocorreu em 1965, quando o Dr. Charles Tart, psicólogo da
Universidade da Califórnia, em Davis, voltou sua atenção para o assunto. Seu interesse
surgiu quando uma jovem o procurou, dizendo que experimentava a sensação de sair do
seu corpo durante a noite. A reação de Tart foi sugerir que ela cortasse alguns
pedacinhos de papel, escrevesse números neles, colocasse-os

51
em uma caixinha, os misturasse bem e, antes de se deitar, pegasse um deles, sem olhar o
número nele escrito, e o colocasse em um lugar do quarto fora do alcance de sua vista.
Tart explicou-lhe que, para provar a realidade de sua sensação, ela deveria tentar ver o
número, quando fora do corpo. Poderia, então, avaliar até que ponto era eficiente a sua
visão fora do corpo, e, com isso, documentar a sua experiência.
Quando a moça o procurou de novo, alguns dias depois, informando que fora bem-
sucedida, o Dr. Tart ficou ainda mais intrigado. E, dentro em pouco, teve oportunidade
de submeter a jovem a uma série de exames em seu laboratório especializado na
universidade.
As experiências eram muito simples. Todas as noites, durante quatro dias, Miss Z
(como o Dr. Tart a identificou em seu relatório) ia ao laboratório e procurava dormir ali.
O laboratório dispunha de um divã, onde Misi Z se deitava, depois de ser ligada a
eletrodos, por sua vez ligados a um polígnato, que registrava as ondas cerebrais e outras
atividades fisiológicas durante o sono. Uma saliência se estendia da parede, por cima do
divã, e cada noite era colocada ali pelo psicólogo um papel onde estava escrito um
número de cinco algarismos. Miss Z era instruída para dormir e, durante a noite, se via
fora do corpo, flutuava e memorizava o número. Um interfone ligava a câmara do sono
a outra sala adjacente, com equipamentos, onde um pesquisador dirigia a experiência,
de modo que a jovem pudesse comunicar o número imediatamente.
Nada de interessante aconteceu durante as três primeiras noites, mas a quarta sessão
foi coroada de retumbante sucesso. Pouco depois de seis horas da manhã, a paciente
chamou no interfone, anunciando que tinha saído do corpo, e disse o número do
pesquisador. Citou corretamente todos os cinco algarismos. E mais sugestivo ainda foi o
que as ondas cerebrais estavam mostrando naquele momento crítico. O
eletroencefalograma revelou que, pouco antes de chamar no interfone, Miss Z saíra do
sono normal para um estranho e inclassificável estado letárgico, que não situava
exatamente nem no sono nem na vigília. Isso sugeriu ao Dr. Tart que algo mais que uma
simples percepção extra-sensorial explicava o sucesso da paciente.
Mais tarde, soube-se que o número na saliência da sala poderia ser lido acendendo-se
uma lanterna elétrica e vendo-se o seu reflexo em um relógio que ficava acima dele.
Não houve prova, contudo, de que a paciente soubesse daquilo ou levasse uma lanterna
elétrica para o laboratório, e é provável que o menor movimento de sua parte afetasse os
eletrodos ligados ao seu corpo.
De um modo geral, os parapsicólogos deram pouca atenção ao traba-

52
lho do Dr. Tart, que foi formalmente anunciado em 1968. Quando, porém, o legado de
Kidd atribuído à Sociedade de Pesquisas Psíquicas (e subseqüentemente à Fundação de
Pesquisas Psíquicas), os pesquisadores das duas instituições começaram a reconsiderar
o problema da saída do corpo. Talvez seguindo as sugestões do Dr. Murphy,
admitissem que poderia ser mais eficiente enfrentar o problema da sobrevivência
pesquisando com pessoas vivas do que expandindo os velhos métodos da mediunidade.
A questão passa ser a de demonstrar que possuímos a capacidade de sobrevivermos, e
não se o contacto com os mortos pode ser estabelecido diretamente.
O resultado disso foi que, nos anos seguintes, ambas as entidades dedicaram muito
tempo, energia e dinheiro estudando o problema da experiência fora do corpo (EFC). O
objetivo era encontrar um meio de demonstrar que algum aspecto da mente é suscetível
de deixar o corpo durante a experiência fora do corpo. Uma vez que tal descoberta
poderia ser considerada uma prova da existência da alma, a pesquisa estaria bem dentro
do espírito (desculpem o trocadilho) do testamento de Kidd.

Estudos Sobre a Natureza da Visão Fora do Corpo

As pesquisas sobre o assunto foram iniciadas na Associação Americana de Pesquisas


científicas pelo Dr. Karlis Osis, por muito tempo diretor de pesquisas da organização. O
Dr. Osis já se interessava antes pelas pesquisas daquela natureza e o dinheiro de Kidd
lhe deu a oportunidade de que necessitava para dedicar todo o seu tempo àquele
trabalho. Depois de se inteirar do assunto, através de leituras, chegou à conclusão de
que o melhor meio de enfrentar o problema seria estudando a natureza da visão fora do
corpo. Raciocinou que a vista fora do corpo deveria obedecer aos princípios que regem
a visão física, que é muito diferente das vagas e fragmentárias mensagens espíritas.
Esperava mostrar que o paciente da EFC poderia ver de maneira muito mais consistente
do que seria de se esperar em um paciente no espiritismo. Também esperava provar que
a vista na EFC seria limitada pelos fatores que interferem na visão comum.
Por sorte, o Dr. Osis não teve de esperar muito tempo antes de poder pôr à prova as
suas idéias. A oportunidade surgiu quando começou a experiência com Ingo Swann, um
dos mais pitorescos adeptos do espiritismo, há muito tempo residente em Nova York.

53
Ingo Swann é um ex-funcionário das Nações Unidas, louro, bem apessoado,
apreciador de um charuto, que se tornou muito conhecido no país por suas qualidades
psíquicas. É também um artista profissional. Descobriu que podia sair do corpo quando
era criança e foi operado para ablação das amígdalas. Anos mais tarde, já adulto,
aprendeu a controlar aquele especialíssimo talento. Verificou que não somente podia
projetar um elemento de sua mente completamente fora do corpo, como também
continuar, ao mesmo tempo, inteiramente consciente. Para pôr em prática a sua rara
qualidade, Swann se limita a sentar-se em uma confortável espreguiçadeira, em via de
regra fumando um bom charuto, libera parte de sua mente, e depois, muito à vontade,
conta ao pesquisador o que está vendo enquanto a sua mente flutua.
O Dr. Osis e sua assessora Janet Mitchel realizaram uma série completa de
experiências com Swann, na Sociedade Americana de Pesquisas Psíquicas, em 1972.
Para os primeiros testes, foi especialmente preparada uma sala na sede da Sociedade.
Swann deitava-se na espreguiçadeira, ligado a um polígrafo e era convidado a projetar
sua mente para o teto e ler em uma plataforma semelhante a uma caixa nele suspensa.
Na caixa eram colocadas duas figuras perto uma da outra, e Swann tinha de olhar para
uma delas, descrevê-la e depois girar a plataforma e olhar para a outra figura.
Posteriormente era convidado a desenhar o que vira. Foram feitas várias experiências
usando o mesmo processo, mas figuras diferentes eram usadas em cada prova.
Não é difícil descobrir a racionalidade de tais testes. Se eram colocados três objetos
perto uns dos outros na plataforma, Osis queria saber se Swann via todos eles, e na
devida perspectiva de uns com relação aos outros. Osis acreditava que isso mostraria
que a EFC é um fenômeno muito diferente da telepatia e da clarividência normais, uma
vez que tais qualidades raramente são muito precisas. Tal coisa, ao contrário, mostraria
que algo, realmente, sai do corpo durante a experiência.
O mínimo que se pode dizer é que Swann atuou sensacionalmente. Em uma das
experiências, ambas as leituras se compunham de formas geométricas. Uma era um
coração vermelho invertido, com um abridor de envelope preto colocado por cima, e a
outra um olho de boi tricolor com um pedaço cortado. Swann, enquanto fora do corpo,
pôde ver e depois desenhou ambas as figuras corretamente. Não confundiu uma com a
outra. Seu desenho do olho de boi foi tão preciso, que pôs o pedaço cortado na posição
correta. Só cometeu um erro, invertendo a ordem das cores dos anéis que compunham o
olho de boi. No caso do coração, ele dese-

54
O espiritualista americano Ingo Swann obteve espetacular sucesso visitando os alvos (desenhos com
números 37 e 40), durante uma viagem fora do corpo, depois desenhando o que vira (ao lado, a traço).
(Biblioteca Mary Evans)

55
nhou uma figura oval, com um objeto semelhante a uma faca ablonga por cima.
Também designou as cores corretamente.
Swann também se mostrou capaz de apresentar algumas surpresas por sua própria
conta durante aquelas experiências. Osis e seus auxiliares não tardaram a constatar que a
visão fora do corpo de Swann podia se mostrar tão precisa que, às vezes, percebia nas
figuras certos aspectos que nem eles próprios tinham notado. Swann descreve um desses
incidentes em se livro autobiográfico To Kiss Earth Good-Bye.

Durante a experiência de 3 de março, quando a caixa foi cuidadosamente revestida


por dentro com papel branco, a pessoa encarregada fazer a figura inadvertidamente
não cobriu as letras impressas do lado de dentro. Essa parte impressa foi vista mas não
lida por mim, quando procurei, nervosamente, perceber o que havia na caixa. Depois
de ter sido do completada a experiência, mas antes que a caixa fosse descida e
examinada, a pessoa encarregada de arrumar a caixa declarou, muito excitada, que a
experiência devia ter fracassado, pois não havia matéria impressa na caixa. Revidei,
dizendo que eu vira o impresso lá e que portanto ele devia estar lá. Para decepção de
todos, quando a caixa foi descida e examinada, lá estava o impresso, exatamente como
eu senti que tinha visto.

A fim de pôr à prova a relação entre a visão e a visão física, Osis criou um novo teste
para os seus pacientes. Mais uma vez, ele esperava mostrar que algo real da mente deixa
o corpo durante a experiência. Com a ajuda de alguns dos seus colaboradores, criou um
dispositivo denominado caixa de visualização ótica, que consistia em simples caixa
preta, montada em uma espécie de estrado. Tinha três pés de altura por dois de largura,
e, bem no meio dela, estava aberto um curioso orifício. Quem olhasse para dentro da
caixa veria uma roda dividida em quatro segmentos diferentemente coloridos. A caixa
se achava também aparelhada com um projetor de slides que, quando ativado, parecia
projetar várias imagens em um quadrante escolhido. Digo parecia projetar porque a
superposição da imagem na roda era, na realidade, uma ilusão de ótica.
Essa ilusão de ótica constituía, na verdade, a chave de todo o teste. Osis acreditava
que o paciente, olhando pelo orifício da caixa, quando fora do corpo, deveria ser capaz
de ver corretamente a ilusão de ótica, da mesma maneira que poderíamos, se
olhássemos para dentro da caixa com os nossos olhos físicos. Acreditava também que a
pessoa que se utilizas simplesmente da clarividência para olhar a caixa psiquicamente
não perceberia de modo algum a ilusão.

56
Para o teste da caixa mágica, Osis recrutou outro médium para cobaia, Alex Tanous,
um homem de olhos escuros, ar misterioso, ex-professor de teologia em Maine e que se
tornou a segunda estrela de Osis no programa da EFC. Ao contrário de Swann, no
entanto, Tanous realmente afirma que projeta uma imagem fantasmagórica de si
mesmo, e que essa duplicata tem sido vista ocasionalmente por outras pessoas, quando
projetada.
A princípio, Tanous fracassou inteiramente no teste da caixa, para grande decepção
de Osis, mas foi o próprio Tanous que descobriu qual era problema: “Quando comecei a
trabalhar com a caixa ótica”, lembrou mais tarde, “eu não podia ver a imagem objetiva,
porque não tinha altura suficiente, ou, pelo menos, o meu outro eu não tinha altura
suficiente. O orifício na frente da caixa ótica ficava mais ou menos à altura dos olhos
em uma pessoa de estatura média. Meu eu projetado, o meu corpo astral, como
constatei, quase não tem altura. É uma pequena bola de luz. Eu não podia olhar no
orifício, a não ser que me espichasse, a não ser que measse na ponta dos pés e, mesmo
assim, não pude ver bem”.
O Dr. Osis e seu assistente construíram uma plataforma para o corpo astral de
Tanous, e, sem sombra de dúvida, o paciente se tornou, de súbito, mais bem-sucedido
em suas tentativas de ver o interior da caixa!

Experiências para Localizar o Ego Fora do Corpo

Enquanto se realizavam todos esses trabalhos em Nova York, outras experiências


sobre o mistério da EFC se processavam no Estado da Carolina do Norte. Ali, contudo,
as investigações tomaram um rumo bem diferente das da Sociedade de Pesquisas
Psíquicas. Na década de 1970, a Fundação de Pesquisas Psíquicas era uma entidade
pequena e ainda nova, que funcionava em duas pequenas casas de madeira, perto da
Universidade Duke. A despeito da modéstia de suas instalações, a Fundação passou dois
anos realizando sensacionais pesquisas sobre a natureza da experiência fora do corpo. O
fato mais curioso é que a Fundação focalizou toda a sua atenção para uma única pessoa,
em suas investigações.
Keith Harary, apelidado Azul, entrou em contacto com a Fundação em 1973. Acabara
de se matricular na Universidade Duke, quando ficou sabendo que a Fundação estava
procurando pessoas que se acreditavam capazes de sair do seu corpo voluntariamente.
Como tivera experiências nesse sentido desde criança, ofereceu prontamente os seus
serviços. A sua afir-

57
mação de que conseguia sair de seu corpo voluntariamente despertou imediatamente o
interesse dos investigadores da Fundação de Pesquisas Psíquicas. O Dr. Robert Morris,
então Diretor de Pesquisas da Fundação, foi prontamente encarregado de organizar e
dirigir as experiências. Naturalmente, o empenho de Morris era constatar se Azul
conseguia realmente sair de seu corpo, como afirmava.
Na primeira fase das experiências, Morris determinou que Azul permanecesse em
uma dependência administrativa da Fundação, enquanto seus auxiliares penduravam
grandes letras de papelão em outra casa, situada a cerca de dezoito metros de distância.
A tarefa de Azul consistia em deixar o seu corpo, ir à outra casa e depois informar o que
vira lá. A fim de fazer as suas viagens psíquicas, Azul teria apenas de deitar-se, ficar
bem calmo e depois fazer com que a sua mente saísse do corpo. Habitualmente, ficava
dentro de uma cabine fechada, pois não gostava de ser visto enquanto estava procurando
fazer com que a mente saísse do corpo. Contudo, a fim de se manter em constante
contacto com os pesquisadores, Azul avisava Morris por um interfone quando sentia
que se encontrava na iminência de sair do seu corpo. Dava outro sinal, quando voltava,
alguns minutos mais tarde. Imediatamente depois que Azul voltava ao seu corpo, Morris
mandava que ele contasse o que vira durante a sua viagem psíquica.
Foram realizados vários desses estudos com objetivos, e Azul foi mais ou menos
bem-sucedido; os pesquisadores da Fundação não tardaram a perceber que a EFC não
era um assunto muito fácil e muito simples. Algumas vezes, Azul informava o que vira
com notável precisão, enquanto em outras falhava lamentavelmente. No entanto,
revelou ele próprio um ou dois truques psíquicos.
Assim, por exemplo, durante um teste, a única pessoa que deveria ficar na casa onde
estavam as letras de papelão era Joseph Janis, um dos pesquisadores da Fundação. Sem
que Azul soubesse, no entanto, outro pesquisador, um voluntário chamado Jerry Posner,
entrara na sala, durante a prova, para fazer companhia a Joseph. Embora Azul não
tivesse conseguido ver as letras direito, durante a experiência, imediatamente notou a
presença de uma segunda pessoa na sala, e comunicou ao Dr. Morris
O caso não parou por aí, todavia. Depois de terminada a experiência, Posner afirmou
ter visto a aparição de Azul na sala em que estava! A ocasião em que Posner viu a
aparição correspondia àquela em que Azul fazia a tentativa de sair do corpo. Esse
inesperado incidente alertou os pesquisadores para o fato de que talvez Azul fosse mais
capaz de ver pessoas do que as letras. Isso sugeriu a idéia de mudar a natureza das
experiências.
Para a nova série de testes, os pesquisadores da Fundação foram ins-

58
Keith Harary, o Azul, preparado, a fim de que os pesquisadores pudessem acompanhar as suas
tentativas de sair do corpo. (Biblioteca Mary Evans).

59
truídos para permanecerem no centro de meditação da entidade, dura todo o tempo da
experiência. O centro era um pequeno prédio, logo atrás dos dois prédios
administrativos da Fundação, dos quais era separado por um gramado. Azul era, então,
levado para outro prédio, colocado em uma pequena cabine fechada, e convidado a ir ao
centro, ver quem se encontrava lá e, depois, mencionar os seus nomes aos
pesquisadores. Azul, naturalmente, ignorava completamente quais dos dez ou doze
pesquisadores se encontravam no centro. Não obstante, ele se saiu muito bem no
primeiro teste. Não somente revelou quem se encontrava no centro, como revelou
exatamente onde cada voluntário se achava sentado!
Embora a exatidão tivesse diminuído nos testes seguintes, os pesquisadores da
Fundação ficaram muito impressionados com o fato de, na ocasião, algumas das pessoas
sentadas na sala terem visto a aparição de Azul ou notado a sua presença de outra
maneira. O horário dessas identificações em geral coincidia com os das tentativas EFC
de Azul. Até o Dr. Morris notou a presença de Azul! Assim, em vez de resolverem o
mistério da EFC, os pesquisadores da Fundação se viram envolvidos por ele.
Como acontece com muitas outras pessoas sensíveis, Azul adora animais. Uma vez
que ele parecia tão eficiente em afetar as pessoas com a sua presença fora do corpo, os
pesquisadores da Fundação tiveram uma idéia maravilhosa para a seguinte experiência
de grandes proporções. Se Azul podia, de certo modo, afetar seres humanos com a sua
presença, que aconteceria em se tratando de animais? Segundo a tradição, os animais
reagem de maneira estranha em uma casa mal-assombrada e quando vêem fantasmas e
coisas parecidas. Os pesquisadores da Fundação imaginavam como eles reagiriam
diante do fantasma de um vivo. Assim, dois gatinhos foram recrutados, não muito
voluntariamente, para as próximas experiências, sendo batizados, muito adequadamente,
como Espírito e Alma.
Para os testes seguintes, Robert Morris utilizou o que é chamado prancha de
atividade animal. Trata-se de uma prancha dividida em vários quadrados iguais.
Colocando-se o animal na prancha, o pesquisador pode registrar a sua taxa de atividade
normal, observando quantos quadrados atravessa e quantas vezes ele faz um barulho
durante um determinado período de tempo. O plano de Morris consistia em ver se os
gatos reagiam ou agiam de maneira diferente quando Azul os visitasse mentalmente,
uma ocasião qualquer. A experiência na realidade foi complexa, e apenas um dos gatos
foi usado. Eis como tudo foi feito:
Azul foi levado primeiro para uma sala experimental do hospital da Universidade
Duke, situada cerca de oitocentos metros da Fundação Pesquisas Psíquicas. Um
pesquisador ficou em sua companhia, enquanto

60
outro ficou com o gato, no laboratório da Fundação. O pesquisador que ficou com o
gato somente foi avisado que, durante a experiência, um telefone tocaria na sala quatro
vezes. Cada toque iniciava uma experiência de dois a três minutos, tempo em que o
pesquisador deveria prestar toda a atenção no gato; somente em duas ocasiões, contudo,
Azul se projetava realmente até o animal. Durante as outras duas, ele meramente
pensava em deixar o corpo, ou nada acontecia. O pesquisador que tomava conta do gato
não tinha idéia de em qual dos quatro períodos Azul faria as suas tentativas. Sua tarefa
consistia unicamente em observar o gato e anotar o seu comportamento durante aqueles
quatro períodos.
A experiência foi repetida várias vezes, e os resultados foram impressionantes. O
gato invariavelmente ficava agitado quando era posto na plataforma. Pulava e miava
constantemente. No entanto, todas as vezes que Azul se projetava até ele, o animal se
acalmava de súbito, ficando imóvel e sem miar. A mudança de seu comportamento às
vezes era tão acentuada, que o pesquisador que estava tomando conta do animal pouco
tinha de fazer quando Azul efetuava as suas visitas.
As experiências do gato foram realizadas também com diversos animais. Eu,
pessoalmente, cheguei em Durham para atuar como conselheiro nos testes no verão de
1943, quando as experiências com o gato estavam sendo completadas. Foi muito
discutido pelos pesquisadores como se deveria processar a nova fase das pesquisas.
Falou-se em usar menos animais domésticos, uma vez que os animais selvagens se
mostrariam mais vigilantes e se sentiriam ameaçados por uma presença invisível.
Alguns m nós achavam que tais animais reagiriam, portanto, mais fortemente em face
de um visitante fora do corpo. Não levou muito antes de encontrarmos um objeto
adequado para os nossos testes. Mr. Graham Watkins, outro conselheiro de pesquisas,
se dedicava a estudos sobre animais, tendo preferência pelas cobras. Orgulhou-se e
regozijou-se em apresentar a cobra mais incrível que vi em toda a minha vida. Não
havia dúvida de que odiava o homem, e não cessava de dar botes, quando qualquer
pessoa se aproximava dela. Watkins nos ofereceu a cobra emprestada (juntamente com
as luvas para pegá-la!), a fim de ser usada nas experiências.
Para o primeiro teste, um grupo de pesquisadores levou Azul ao hospital da
Universidade Duke, depois de terem acertado os seus relógios com o meu. Fiquei na
sede da Fundação, juntamente com um voluntário. O prédio em que estávamos
colocados dispunha de uma cabine isolada, com uma janela de observação. A cobra e
sua gaiola foram colocadas ali, enquanto eu observava os seus movimentos através da
janela. A experiência foi semelhante à do gato. Limitei-me a observar a cobra e anotar o
seu

61
comportamento, enquanto esperava o telefone do laboratório tocar, o que constituía o
sinal de um período experimental de três minutos. Na hora seguinte, o telefone tocou
quatro vezes, e Azul tentou se projetar para nós duas vezes. Não tínhamos idéia de qual
dos dois períodos constituiria verdadeiro período experimental.
No decorrer da experiência, a cobra só teve uma reação esquisita. Antes do teste e
durante o primeiro período experimental, o animal se manteve calmo, apenas
serpenteando tranqüilamente dentro da gaiola. Depois, passou a se mostrar mais agitada,
no começo do segundo período experimental. Para meu espanto, ela deslizou, erguendo-
se, em um lado da gaiola e pareceu disposta a atacar. Mordeu a gaiola furiosamente e
depois, da mesma maneira misteriosa, se acalmou de novo, não tendo apresentado
outras situações inabituais durante o resto da experiência.
Quando os pesquisadores da Fundação trouxeram Azul de volta laboratório naquela
noite, comparamos os tempos. Verificou-se que a primeira tentativa EFC de Azul
ocorrera durante o segundo período crítico. Ele nos explicou como simplesmente
deixara o seu corpo, nos viu, tentou chamar a nossa atenção e depois projetou-se na
gaiola com a cobra. O tempo em que Azul disse ter estado com o réptil e o da forte
reação animal coincidiram quase exatamente.
Devo acrescentar que tentamos realizar de novo a experiência alguns dias depois,
mas a cobra resolveu não cooperar de modo algum. Antes mesmo do teste começar, ela
se enroscou e dormiu. Não consegui acordá-la, de modo que a experiência fracassou.
As experiências que acabo de descrever são apenas alguns exemplos de vários testes
realizados pela Fundação para pôr à prova a capacidade EFC de Azul. A questão
crucial, naturalmente, era provar que realmente Azul saía do corpo, como afirmava. Foi
um problema que, mesmo depois de dois anos de investigações, não pôde ser resolvido
para satisfação de todos. O Dr. Robert Morris se mostrou cético quanto à significação
geral e implicações da pesquisa. Na sua opinião, era teoricamente possível que as
pessoas e animais que notaram a presença de Azul estivessem reagindo a mensagens
psíquicas (isto é, telepáticas ou talvez psicocinéticas) emitidas por ele, e nada mais. Eu,
por outro lado, não pude aceitar essa reencarnação da hipótese do superpsiquismo, já
que acho que isso não poderia explicar a coerência do comportamento do gato. O
número de impressionantes identificações da presença de Azul fora do corpo também
par incompatível com a idéia do superpsiquismo.
Houve, mesmo, sugestivos indícios de que Azul podia mesmo produzir efeitos físicos
nos lugares onde se projetava. Assim, por exemplo, du-

62
rante uma experiência, ele se aproximou de um termistor situado em um dos prédios da
Fundação, quando se projetou, de outro prédio. Ele se aproximou duas vezes, e em
ambas as vezes o polígrafo registrou queda de temperatura. Infelizmente Azul não pôde
provocar esse efeito de forma categórica.
Desse modo, todo o trabalho da Fundação de Pesquisas Psíquicas terminou em uma
atmosfera de incerteza. Sem dúvida, ficou a impressão de que uma parte da mente de
Azul deixava o seu corpo durante a EFC, mas nenhuma das experiências pôde ser
considerada como uma prova 100 por cento.
Tanto as pesquisas empreendidas pela Associação Americana de Pesquisas Psíquicas
como pela Fundação de Pesquisas Psíquicas terminaram dois anos depois de terem sido
iniciadas. O motivo é muito simples: o dinheiro do legado de Kidd acabou, e ambas as
instituições tiveram de ir em busca de outros financiadores... e de outros projetos. Em
1975, as pesquisas regulares de parapsicologia sobre a EFC quase haviam se tornado
uma coisa do passado. Os pesquisadores tinham feito quase tudo que podiam fazer para
isolar a EFC como um fenômeno objetivo, e não meramente como uma alucinação
espírita conducente. Alguns de seus dados eram compatíveis com a hipótese da mente
projetada, mas muitos dos pesquisadores ficaram decepcionados com a inconsistência
dos resultados. Se alguém estava realmente atuando fora do corpo, por que não poderia
fazer com que as pessoas sempre reagissem à sua presença, ou esse alguém sempre
visse os objetos colocados em pontos distantes? Ninguém deu uma resposta satisfatória
a essa embaraçosa pergunta. Felizmente, contudo, as pesquisas sobre a natureza da EFC
não terminaram daquela vez — mas assumiram dimensões novas e muito mais vastas.
Essa nova investigação, porém, não partiu da parapsicologia convencional.

63
*
* *

64
3
Documentação da Experiência Perto-da-Morte
Quando foi publicado o livrinho de Raymond Moody, Life after Life, em 1975,
ninguém imaginou que iria se tornar um bestseller. Foi lançado por uma obscura editora
de Atlanta, Estado da Geórgia, e continha vários relatos, não sensacionalistas, de
pessoas que tinham morrido, mas reviveram posteriormente. Em tais relatos, as pessoas,
invariavelmente, contavam como tinham deixado o seu corpo, sobrevivido à morte,
viajado até um estranho e maravilhoso paraíso e voltado, com relutância, aos seus
corpos. Talvez tenha sido essa maneira otimista de encarar a experiência da morte, que
venceu o tabu que sempre reveste o assunto, a responsável pelo entusiástico
acolhimento ao livro de Moody e outros estudos semelhantes que se seguiram.
Realizaram-se simpósios sobre o assunto nas convenções anuais, tanto da Associação
Parapsicológica como na Associação Psicológica Americana, e até mesmo uma
sociedade de médicos foi organizada para investigar o fenômeno perto-da-morte
(PDM).
Depois da publicação do livro de Moody, centenas de pessoas têm falado acerca de
suas próprias experiências. Esses casos representam um crescente conjunto probatório,
mostrando que o após vida é apenas um momentâneo afastamento. Assim, por exemplo,
em agosto de 1979, o boletim Anabiosis, órgão da Associação Internacional de Estudos
Perto-da-Morte, com sede no Estado de Connecticut, publicou um impressionante
relato.
O jovem missivista explicou que enfrentara a sua experiência PDM em conseqüência
de um terrível acidente. Estava colocando algumas compras no porta-malas de seu
carro, quando este foi batido por outro carro, e ele ficou preso entre os dois veículos.
Foi imediatamente levado para um hospital e conduzido para a sala de cirurgia, onde
perdeu a consciência.

65
“Algum tempo depois — escreveu — houve um súbito clarão e me vi flutuando
acima do meu corpo físico. Pude ver os cirurgiões me operando. Havia também uma
enfermeira sentada em minha frente, bem acima da minha cabeça. A sensação seguinte
que tive foi quando alguém pôs as suas mãos em meus ombros. Tive a impressão de que
estava sentado em algo que se movia através de um túnel.”

Este quadro,
mostrando a alma
de um homem
deixando o corpo
no momento de
sua morte, foi
executado por G.
Parlby, sob a
direção do
espiritualista
Hewat Mackenzie,
e mostra a corda
prateada que
apareceu em
muitas
experiências.
(Biblioteca Mary
Evans)

66
A carta continua, com o missivista contando que se viu depois avançando ele próprio
pelo túnel, indo afinal descansar em um ambiente nevoento. Pôde notar pessoas que se
moviam, e ouviu uma bela música. Afinal, algo luminoso aproximou-se dele,
interrogou-o acerca de sua vida e disse-lhe para voltar ao seu corpo. Ele acordou mais
tarde, atravessando o túnel de regresso.
“Foi a mais bela experiência da minha vida”, informou. Essa é a reação de muitas
pessoas que passaram pela experiência PDM.
Casos desse tipo vêm despertando muita atenção. Até mesmo os jornais diários os
estão noticiando. Caso semelhante ao aqui citado foi noticiado pelo Times de Los
Angeles, de 30 de março de 1983, que relata o que aconteceu com um jovem homem de
negócios de Hollywood.
Dan O’Dowd, co-proprietário de uma empresa de vídeo de Los Angeles, quase foi
morto, quando, dirigindo na Auto-Estrada da Costa do Pacífico, que atravessa o litoral
do sul da Califórnia, seu carro foi atirado fora da pista por um motorista embriagado,
em 27 de agosto de 1979. Disso resultou uma série de cinqüenta operações, nas quais o
jovem executivo foi praticamente recomposto, pedaço por pedaço. Sua experiência
perto-da-morte ocorreu durante uma operação particularmente grave, que durou quinze
horas, no Centro Médico Cedars-Sinai, em Beverly Hills. Estava deitado na mesa de
operações, quando, segundo relatou,

...de repente despertei, mantendo-me imóvel e vendo a máquina cardíaca (monitor)


formando uma linha reta. Estava bem acordado, embora soubesse que tinha os olhos
fechados. Era como ver imagens na televisão. Depois, subi e fiquei olhando para mim
mesmo, de cima para baixo. Eu estava pairando sobre o meu corpo, a uma altura de um
pé e meio (45 centímetros) a seis pés (um metro e oitenta centímetros).

Ficou estarrecido quando ouviu um dos médicos anunciar, de súbito, a sua morte. O
executivo aparentemente teve a sua experiência perto-da-morte durante um acidente de
cirurgia.
O’Dowd se encontrou em seguida em um corredor próximo, onde os seus parentes
estavam reunidos, e ouviu, incredulamente, o médico anunciar que a operação falhara.
Dentro em pouco, ele se encontrou de novo na sala de operações, onde os médicos ainda
tentavam salvá-lo, apesar do próprio pessimismo. Enquanto ele os olhava estarrecido, os
médicos aplicavam ao seu corpo dispositivos contra a fibrilação, na esperança de
conseguirem reativar o coração.
— “Um sujeito — ele explicou aos repórteres — manobrava o apare-

67
lho, e um outro aplicou gel, e eu, olhando de cima para baixo, me vi terrivelmente
morto. Depois, aplicaram os choques. Da primeira vez, nada. Da segunda, comecei a
recuar e logo pude me sentir sendo puxado para a anestesia. E para fora”.
O empresário, de 32 anos, viveu para contar a história. Seus parentes ainda se
lembram como os médicos lhes disseram que o coração havia parado e que estavam
fazendo tudo para salvá-lo, mas era duvidoso que conseguissem. Seu médico, Dr.
Mohammed Ataik, da Cedars Sinai, também ficou intrigado com o incidente.
— Não quero desmenti-lo — declarou ele ao Times — mas, do ponto de vista
médico, não tenho explicação.
Episódios de quase morte como esse são surpreendentemente comuns. Depois de
estudar mais de uma centena deles, Moody mostrou que uma pessoa que passou pela
experiência perto-da-morte atravessa diversas fases. Na maior parte dos casos, o doente
ou vítima de acidente em geral experimenta um momento de paz, quando compreende
que morreu; muitas vezes ouve ruídos de colisão; sente-se deixando o seu corpo e
viajando rumo a uma brilhante luz branca e, às vezes, experimenta uma lembrança
instantânea da vida anterior, antes de entrar no além. Nesse ponto, a experiência
geralmente termina, uma vez que a testemunha, ou regressa automaticamente ao seu
corpo, ou é mandada voltar por alguém que encontra no além.
Muitos dos seguidores da obra de Moody acreditam que casos tal como o aqui citado
provam virtualmente que sobrevivemos à morte. As provas, porém, não são tão claras
assim. Durante os últimos sete anos, houve várias tentativas de desacreditar o trabalho
de Moody, enquanto vários outros cientistas procuravam repetir as suas descobertas.
Disso resultou uma controvérsia científica quase tão fascinante quanto as deduções
originais de Moody. Presentemente, os pesquisadores chegaram à conclusão de que o
estudo da experiência perto-da-morte não é tão simples e bem definido quanto o
entusiasmo inicial de Moody julgava ser.
Um dos mais contundentes críticos da argumentação de vida após a morte tem sido o
Dr. Robert Kastenbaum, psicólogo da Universidade de Massachusetts e diretor da
revista Omega, uma das mais prestigiosas publicações que tratam do estudo psicológico
da morte. Kastenbaum está pessoalmente interessado no problema da vida após a morte,
e organizou mesmo um simpósio sobre a experiência perto-da-morte, em recente
reunião da Associação Psicológica Americana, mas não deixou, por isso, de dirigir
vários ataques contra o movimento vida-após-a-vida. Escrevendo em 1977, na revista
Human Behavior (Comportamento Humano), Kastenbaum sa-

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lienta que nem todos que sofreram a morte clínica experimentaram a sensação EFC.
Tais estados fora do corpo se mostram muito infreqüentes, argumenta o psicólogo, e,
portanto, não temos o direito de deduzir, de dados tão limitados, que o fenômeno é uma
experiência humana universal. Salienta ainda o fato de algumas pessoas que estiveram
às portas da morte experimentaram sensações de todo diferentes daquelas mencionadas
por Moody e outros. Muitas pessoas não deixam seu corpo quando se dá a morte clínica,
mas permanecem nele conscientes, embora pareçam se encontrar em estado de coma ou
mortos.
“A existência de outros tipos de relatos vindos de além da fronteira da morte ou da
quase-morte não desacredita a qualidade dos relatos que tanto interesse despertam
presentemente”, escreveu Kastenbaum, “mas torna difícil aceitar a conclusão, tirada
por alguns, que o processo do falecimento é, geralmente, agradável.” O Dr.
Kastenbaum não acredita que tais incidentes demonstrem a existência de uma vida após
a morte.
As opiniões de Kastenbaum tiveram eco em outros críticos, que acusaram os
partidários da vida-após-a-vida de basearem seus pontos de vista sobre a alegria da
morte em um punhado de relatos anedóticos. Salientam os críticos que, antes de serem
aceitos como válidos os dados de Moody, seria necessário consultar um grande número
de pessoas que passaram por situações semelhantes, a fim de se verificar se se tratava de
uma experiência comum, ou meramente de anomalias, ocorridas com meia dúzia de
pessoas, e que foram destacadas do conceito devido à sua semelhança. Felizmente,
levantamentos objetivos foram realizados desde então, e seus resultados muito
concorreram para confirmar as conclusões iniciais de Moody.

Documentação da Experiência Perto-da-Morte

Tal estudo foi empreendido pelo Dr. Michael Sabom, cardiologista da Escola de
Medicina da Universidade Emory, no Estado da Geórgia, e sua assistente, Sarah
Kreutziger, que, em março de 1976, começaram a interrogar pessoas que haviam
experimentado a morte clínica. Conversaram, ao todo, com 100 pacientes do hospital:
71 homens e 29 mulheres, que haviam escapado da morte por pouco. Verificaram que
61 por cento haviam experimentado a clássica sensação PDM de tipo estreitamente
relacionado com os anunciados pelo Dr. Moody, em 1975. Os pacientes ti-

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nham estado à morte em conseqüência de vários motivos, inclusive para da cardíaca,
acidente e mesmo suicídio.
“Os pormenores desses sessenta e um por cento são surpreendentemente
semelhantes”, escreveram Sabom e Kreutziger, no número do quarto trimestre de 1978
de Theta, revista dedicada a pesquisas sobre a questão da sobrevivência após a morte. E
acrescentaram: “Durante a experiência autoscópica, todos os pacientes notaram uma
sensação de flutuação, de estarem fora do corpo, diferente de qualquer outra antes
experimentada. Enquanto destacado do corpo físico, o paciente observava seu próprio
corpo claramente”.
Os muitos casos de Sabom e Kreutziger são virtualmente idênticos aos tipos de
experiências anunciadas por Moody. Um dos tais relatos foi feito por um guarda de
segurança, que sofrerá anteriormente um infarto do miocárdio, quando em tratamento
em um hospital.
“Não pude mais agüentar a dor”, disse ele aos pesquisadores. “Então tudo ficou
escuro, negro. Depois de algum tempo, eu estava... flutuando. Pude olhar para baixo, e
nunca havia notado que o chão era coberto de ladrilhos brancos e pretos. Reconheci eu
mesmo ali, recurvado em uma posição de feto.”
O guarda olhou então com bastante calma, enquanto um médico tentava revivê-lo,
estimulando eletricamente o coração.
“Tive a impressão” — continuou — “que eu tinha de escolher entre tornar a entrar
em meu corpo e assumir o risco de permitir que os médicos me ressuscitassem, ou ir
para frente morrer, se é que já não estava morto. Sabia que me achava em perfeita
segurança, se meu corpo morresse ou não. Eles me atingiram uma segunda vez.
Reentrei em meu corpo.”
O paciente não chegou a ver uma brilhante luz branca, nem viajou de verdade no
além. Mas alguns dos pacientes de outros pesquisadores passaram por tal experiência.
Como resultado de sua pesquisa, Sabom e Kreutziger concluíram que as experiências
PDM constituíam ocorrências verdadeiras. Salientaram que o fenômeno era muito
diferente do tipo de alucinações produzidas por incisões no lobo temporal, drogas,
despersonalização psicológica (quando o indivíduo se sente afastado do corpo em
virtude de esgotamento nervoso) ou alucinações patológicas autoscópicas (ver a si
mesmo). O que descobriram, contudo, foi que as pessoas que tinham passado pela
experiência PDM, dela saíam com a certeza de que iriam afinal sobreviver à morte. Mas
a importância dessa pesquisa não parou aí, de modo algum.

70
O Estudo dos Encontros Perto-da-Morte Verídicos

O Dr. Michael Sabom encontra-se presentemente trabalhando no Centro Médico da


Administração de Veteranos de Atlanta. Tendo sido convidado a falar em um simpósio
especial sobre a experiência perto-da-morte, na reunião anual da Associação Psicológica
Americana de 1981, em Los Angeles, ele relatou as pesquisas que iniciara depois de ter
completado a investigação descrita. Explicou o Dr. Sabom que, embora a princípio
estivesse primordialmente interessados pelos pacientes cardíacos nos hospitais em que
trabalhava, não tardou a começar a colher informações de outras fontes. O que o
impressionou singularmente, à medida que colhia informações sobre um número de
casos cada vez maior, foi como alguns de seus pacientes cardíacos, assim como outros,
assistiam realmente às operações a que eram submetidos e/ou ressurreições, durante sua
experiência fora-do-corpo (FDC). Impressionou-o o fato de muitos de tais informantes
terem visto e descrito minuciosamente muitos fatos que estavam além do conhecimento
médico ao leigo em geral. A partir de então, o Dr. Sabom começou a publicar relatos de
vários outros casos.
Um dos relatos diz respeito a um vigia noturno de 52 anos, no norte da Flórida, que
apresentava sérios distúrbios cardíacos e foi internado no centro médico da
Universidade da Flórida em novembro de 1977, para exames e subseqüente cirurgia. O
Dr. Sabom ainda se encontrava estagiando no hospital naquela ocasião, e pôde
acompanhar de perto o incidente. O paciente sofreu uma experiência PDM durante uma
operação anterior e uma segunda em janeiro de 1978, durante a cirurgia de coração
aberto.
A experiência do vigia foi típica. Segundo contou, perdeu a consciência depois de
anestesiado, e recuperou-a durante a operação, que passou a ver, mas de um ponto
situado a cerca de 60 centímetros acima de seu corpo. Esse ponto privilegiado lhe
permitiu ver tudo que estava acontecendo. Falou ele sobre a sensação de ser “como que
uma outra pessoa na sala” e ver os dois médicos operando o seu próprio corpo e o
costurando, depois de terminada a intervenção. Sua perspectiva sui generis também lhe
possibilitou fazer pormenorizadas observações sobre a própria cirurgia. Viu os médicos
enfiarem uma seringa no coração, por duas vezes. Notou também que a sua cabeça
estava coberta por um lençol, e ficou surpreendido ao ver quanto era difusa a luz da
sala.
O vigia noturno também se mostrou surpreso com o aspecto do coração e de como
ele se mostrava durante a intervenção cirúrgica.

71
“Tinham instrumentos de todas as espécies fincados na abertura” lembrou, quando
Sabom o entrevistou...

Acho que se chamam grampos, grampeado por toda a parte. Fiqu admirado, porque
pensava que devia haver sangue por toda a parte, na verdade, não havia muito
sangue... E o coração não é como pensei que fosse. É grande. E isso depois que o
médico já tinha tirado uns pedacinhos dele. Não tem a forma que pensei que tinha. Meu
coração tem uma forma parecida com a do continente africano, largo em cima e
afinado para baixo. Em forma de feijão, eis outro modo de descrevê-lo... Talvez o meu
tenha um formato esquisito... (A superfície) era cor-de-rosa e amarela. Achei que a
zona amarela fosse o tecido gorduroso ou coisa semelhante. Uma zona geral para a
direita ou esquerda era mais escura que o resto, em vez de ser da mesma cor.

O paciente se interessou em observar a cirurgia com coração aberto e ouviu os


médicos discutindo os processos que estavam prevendo ou executando. Discutiram
acerca de um desvio, examinaram um vaso superdilatado, e até mesmo torceram o
coração, para examiná-lo mais facilmente. O paciente chegou a notar que um dos
médicos estava calçando um determinado tipo de sapatos e que outro tinha uma
manchinha de sangue embaixo da unha.
O Dr. Sabom ficou tão intrigado com esse relato e com a sua entrevista em geral, que
foi consultar o arquivo e leu o relatório do cirurgião sobre a operação. Verificou que a
descrição do paciente constituía uma descrição, espantosamente exata para um leigo,
dos processos realmente usados durante a intervenção cirúrgica. Fora usado um retrator
auto-retentor, o paciente era portador de um aneurisma que descolorira parte do seu
coração, que fora revirado durante a operação. Mesmo a seringa que tinha sido inserida
desempenhou um papel na operação. Tinha sido usada para retirar ar do coração... e por
duas vezes.
O que mais impressionou o médico da Geórgia foram os detalhes técnicos incluídos
no relato do vigia. Não pareciam, de modo algum, estarem ao alcance de um leigo
inculto, e isso constituía um indício de que a experiência perto-da-morte representava
um fenômeno mais significativo do que a maior parte dos médicos admitia até então. A
curiosidade do Dr. Sabom se aguçou ainda mais quando ele acompanhou o caso de uma
mulher do Estado de Missouri, que fora submetida a uma cirurgia em um disco lombar,
em 1972. Também ela assistira à sua operação, quando se encontrava fora do corpo, e
mais tarde a descreveu minuciosamente. O mais

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interessante nesse caso é que a paciente viu o chefe da equipe de cirurgia fazendo a
operação, quando pensava que seria o seu médico-assistente. Somente mais tarde ela
ficou sabendo que o cirurgião-chefe dirigira a operação e, embora nunca o tivesse visto
antes, ela o reconheceu imediatamente, quando o viu durante a convalescença.
Diante de tais fatos, o Dr. Sabom se dedicou entusiasticamente a estudar os relatos de
experiências PDM, nas quais os sobreviventes descreviam os processos médicos usados
durante a operação e a ressurreição. Esses relatos vinham primordialmente de cardíacos,
uma vez que a especialidade do Dr. Sabom era a cardiologia. Na opinião daquele
médico, se tais observações se mostrassem corretas, aqueles casos especialíssimos
serviriam para documentar a existência, autenticidade e natureza psíquica da
experiência perto-da-morte. O cardiologista conseguiu, até agora, recolher trinta e dois
casos de indivíduos que viram o seu próprio corpo perto-da-morte, e seis vítimas de
paradas cardíacas em particular apresentaram específicos e exatos detalhes acerca de
suas ressurreições. O número não é grande, mas a importância do fato reside na
qualidade dos casos.
Um dos casos investigados pelo Dr. Sabom foi o de uma dona-de-casa de 60 anos,
que fora hospitalizada com problemas na coluna vertebral. Estava sentada na cama,
quando teve um ataque cardíaco e perdeu os sentidos. Voltando à consciência apenas
alguns momentos depois, ela se viu ao lado de seu próprio leito e contemplando os
esforços que estavam sendo feitos para revivê-la. Uma enfermeira correu até junto do
seu corpo inerte, e uma turma de médicos passou a socorrê-la, batendo-lhe no peito,
introduzindo um I.V. (equipamento intravenoso), aplicando uma injeção, tomando o
pulso e examinando os olhos. Enquanto fora do corpo, a paciente também prestou
atenção no equipamento usado pelos médicos. Viu o que chamou de máquina de
respirar, assim como um carrinho com “uma porção de coisas em cima”. Esse carrinho
ficou junto do equipamento I.V. Também ouviu um médico dizer à enfermeira que ela
devia ser levada para a U. T. I. (Unidade de Tratamento Intensivo), e viu os seus
pertences serem retirados das gavetas e colocados em sacolas e malas.
Quando afinal o Dr. Sabom conseguiu entrevistar a mulher em questão, interessou-se
principalmente pela descrição do carrinho de equipamentos feito pela paciente e
perguntou se os médicos tinham tirado dele alguns instrumentos. A mulher respondeu
que não, mas acrescentou: “a máquina de respirar puseram em meu rosto. É um troço
em forma de cone, que ficou em cima de meu nariz. Não deixaram muito tempo, mas
tiraram logo. Acho que pensaram que era inútil”.
A fim de confirmar a experiência da paciente, o Dr. Sabom entrou

73
em contacto com o hospital onde ela fora tratada e leu o relatório sobre a emergência,
que confirmou tudo que a mulher dissera, embora ela jamais tivesse tido acesso aos
arquivos do hospital. A conclusão do pesquisador foi a de que a descrição da
ressurreição cardíaca tinha sido extremamente realista do ponto de vista médico: o
funcionamento do I.V., a massagem cardíaca externa, a administração de oxigênio por
meio da máscara, a verificação das pulsações da carótida e a reação pupilar, e a coleta e
registro dos objetos pessoais. Sabom, porém, não parou ali. Teve curiosidade de
verificar a informação da testemunha de que tomara uma injeção no começo da tentativa
de recuperação. O registro do hospital também anotara tal fato. Fora aplicada à paciente
uma injeção de glicose concentrada, diante da possibilidade de ter ela entrado em coma
em conseqüência de deficiência de açúcar no sangue.
O Dr. Sabom recebeu uma descrição ainda mais impressionante ressuscitação de um
lavrador de 46 anos, de uma cidadezinha da Geórgia, vítima de parada cardíaca. Ele
teve uma parada cardíaca durante um ataque do coração que sofreu em janeiro de 1978.
Estava hospitalizado na ocasião, de modo que se encontrava em perfeitas condições,
durante a experiência perto-da-morte, de observar as providências que foram tomadas
para salvar a sua vida. Sabom o entrevistou em janeiro de 1979, quando os
acontecimentos ainda estavam claros em sua memória. O paciente lembrava vivamente,
não somente da experiência PDM, como dos acontecimentos que a provocaram.
— Senti-me mal — contou ao cardiologista, no começo da conversa — Desci da
cama e fiquei de pé junto dela, e isso é a última coisa que me lembro, até ficar
flutuando junto do teto.
O paciente se viu, então, deitado na cama. Ao lado do leito se encontravam o médico,
sua mulher e uma terceira pessoa que não reconheceu. Sua esposa estava chorando, mas
a atenção do lavrador logo se voltou para os esforços que estavam sendo feitos para
salvá-lo. Passivamente, viu uma enfermeira com uma máquina para conter a fibrilação,
que colocou nele “umas coisas que dão choque”, como se referiu às almofadas da
máquina. Depois, o corpo saltou quase 30 cm, quando a carga elétrica se fez sentir, e o
choque fez abortar a sua experiência fora-do-corpo. Ele teve a impressão de que estava
sendo forçado a voltar para o seu corpo e metido à força dentro dele.
Depois de ouvir esse breve relato, o Dr. Sabom insistiu com o informante para que
fornecesse mais detalhes acerca do uso das almofadas da máquina contra a fibrilação
que lhe salvara a vida. A testemunha continuou a explicar como vira a enfermeira
esfregar as almofadas depois de

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pegá-las, e como ligara a corrente elétrica, por meio de um comutador situado do lado
direito do aparelho ao qual as almofadas estavam ligadas. Todos tinham sido advertidos
para se afastarem, acrescentou.
Mais uma vez, os registros do hospital foram examinados e documentada a
veracidade do relato do paciente. O Dr. Sabom ficou particularmente impressionado
com a descrição que ele fez das almofadas para combater a fibrilação, uma vez que
tinham sido descritos certos processos relacionados com o seu uso que somente podiam
ser conhecidos por quem tivesse conhecimentos de medicina. As almofadas eram
untadas com um lubrificante e rotineiramente esfregadas uma na outra, exatamente
como o paciente contou, a fim de que o lubrificante ficasse bem espalhado, facilitando o
contacto com a epiderme. O paciente também revelou com exatidão os lugares do seu
corpo onde as almofadas tinham sido colocadas.
Como o paciente vira a sua esposa chorando no quarto, o Dr. Sabom também a
entrevistou, e ela confirmou a versão do marido, contando como o vira vomitar logo
antes de ficar inconsciente. Ela só começara a chorar depois que achou que o marido
perdera a consciência do que lhe estava acontecendo.
A esposa do paciente se mostrou muito impressionada com todo o caso,
especialmente quando o seu marido lhe contou tudo que vira, depois de haver,
aparentemente, perdido a consciência. O relato do marido, disse ela a Sabom, estava
bem de acordo com o que ela própria se lembrava, inclusive das tentativas de salvá-lo,
fazendo com que o seu coração batesse de novo.

Verificação da Experiência Perto-da-Morte

Em face dos casos que estudara, o Dr. Sabom foi se tornando cada vez mais
convencido de que a experiência perto-da-morte não podia ser considerada alucinação
ou sonho. Por outro lado, porém, se sentia atormentado por uma dúvida. Não estariam
aqueles pacientes fantasiando e sonhando com o que seria uma ressurreição cardíaca,
baseados em leituras anteriores, programas de televisão ou outros meios de informação
sobre o assunto? Tratava-se de uma possibilidade bem real, uma vez que algumas das
principais testemunhas já haviam sofrido mais de um ataque cardíaco. Era possível que
tivessem adquirido algum conhecimento das técnicas e equipamentos médicos
utilizados no caso, em suas internações

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hospitalares anteriores. A maior parte das testemunhas negou tal conhecimento, mas
Sabom não podia, de modo algum, ter certeza de que os cientes não haviam captado as
informações, ainda que inconscientemente.
A fim de investigar essa possibilidade, o Dr. Sabom realizou um estudo mais
esclarecedor. Começou entrevistando veteranos pacientes cardíacos, acerca de seus
conhecimentos com as técnicas da reativação do coração. Alguns de tais pacientes
haviam sido submetidos a operações de coração aberto ou sofrido ataques cardíacos que
implicavam várias formas de tratamento. Assim, a maioria deles tivera pelo menos a
oportunidade observar o uso de monitores cardíacos, aparelhos para combater a
fibrilação e outros equipamentos semelhantes. Convidou-se cada paciente a imaginar
que estava assistindo a um tratamento de vítimas de parada cardíaca e descrevê-lo, da
maneira mais pormenorizada que fosse possível. As entrevistas foram gravadas e depois
analisadas.
Os resultados foram arrasadores. Quase todos os pacientes cardíacos desconheciam
os processos.
O erro mais comum era a crença alimentada pelos pacientes de que era tentada a
respiração boca-a-boca. Esse recurso, na verdade, raramente é tentado nos hospitais, que
contam com métodos mais eficientes de respiração artificial. Os pacientes em geral
também não sabiam descrever como se processava a passagem de ar da vítima para
facilitar a respiração e se mostravam confusos acerca da maneira com que é feita a
massagem no coração, e como o aparelho para combater a fibrilação é descarregado.
Apenas três dos pacientes de Sabom apresentaram descrições aceitáveis do processo de
tratamento, mas mesmo nesse caso os conhecimentos técnicos eram limitados. O Dr.
Sabom concluiu desse estudo que mesmo os pacientes cardíacos veteranos não têm uma
idéia correta do tratamento para as paradas cardíacas. As suas conjecturas eram muito
menos corretas do que os relatos dos pacientes que, de fato, tinham assistido àqueles
processos durante a sua experiência fora do corpo.
Em conseqüência disso, o Dr. Sabom não dá importância à idéia de que as pessoas
que passaram pela experiência PDM estão sonhando com as suas ressurreições, devido
a contato anterior com as técnicas de reanimação cardíaca. “Deve ser procurada outra
explicação para tais fatos” é a sua simples conclusão.
O fato de serem incrivelmente minuciosas as observações de sobreviventes de
situações perto-da-morte foi demonstrado por um caso relatado ao Dr. Sabom por um
piloto da força aérea reformado, residente na Flórida. O aviador sofreu um sério ataque
de coração em 1973 e teve uma parada cardíaca na manhã seguinte, quando estava se
recuperando em um hos-

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pital. A parada parece ter ocorrido quando o paciente estava dormindo. Sua primeira
lembrança do estado perto-da-morte vem de quando se encontrava de pé, ao lado do seu
corpo. Um grupo de médicos entrava correndo. A descrição da maneira com que os
médicos o fizeram reviver estava repleta de extraordinários pormenores.
— A primeira coisa que fizeram — contou o aviador — foi dar uma injeção no I.V.,
o anel de borracha que usam para a compressão. Recebi muita lidocatína por meio
daquele dispositivo, porque eu tinha uma arritmia. Levantaram-me e me colocaram na
prancha. Foi então que (o médco) começou a fazer massagem no meu peito, e não
machucou, embora quebrasse uma costela. Não senti dor.
Depois, veio a administração de oxigênio, que o paciente acompanhou, vendo e
ouvindo.
— Primeiro — continuou o piloto — me deram oxigênio com aqueles tubinhos no
nariz, depois os tiraram e puseram uma máscara, que cobre a boca e o nariz. Um troço
com pressão. Eu me lembro que, em vez de estar lá o oxigênio, o troço estava
assoviando como se estivesse sob pressão. Parece que alguém ficou segurando o troço
a maior parte do tempo.
O paciente descreveu ainda a máscara como “uma espécie de máscara de plástico de
cor verde-clara”. Estava presa ao tubo que levava o oxigênio. Ele também se lembrava
do aparelho para combater a fibrilação e como olhou para o seu medidor com toda a
atenção. O medidor, explicou, era quadrado, com dois ponteiros. Um ficava em uma
posição fixa, colocada pela enfermeira, enquanto o outro subia e descia na escala. O
segundo ponteiro “parecia subir bem devagar”.
— Não subia depressa como um amperímetro ou um voltímetro — explicou o
aviador. — O outro ponteiro permaneceu parado durante as tentativas para reativar o
coração.
O paciente também descreveu que o ponteiro subia cada vez mais no medidor, antes
que os sucessivos choques elétricos tivessem sido aplicados ao corpo. Concluiu
apresentando uma minuciosa descrição do aparelho para combater a fibrilação e dos
métodos específicos usados para a aplicação de suas almofadas ao corpo.
Não somente a descrição dos processos de reanimação do coração foi extremamente
correta, como foi impressionante a sua precisão ao falar dos ponteiros, sem dúvida
alguma fora do alcance de quem não tivesse conhecimento direto do aparelho. De fato,
as máquinas usadas na década de 1970 tinham dois ponteiros em seus marcadores. Um
deles ficava imóvel, porquanto era usado para pré-selecionar a quantidade de
eletricidade descarregada no paciente. O outro ponteiro indicava que a máquina estava
sendo

77
carregada para alcançar a quantidade pré-escolhida, e, assim, se pouco a pouco para
cima. Tais máquinas foram hoje substituídas por modelos mais modernos, mas a
reconstituição feita pelo piloto estava perfeitamente de acordo com a máquina usada
naquele tempo para o tratamento da parada cardíaca.
Teria, porém, o piloto visto um daqueles instrumentos em funcionamento em alguma
ocasião anterior? O paciente negou que conhecesse antes o aparelho, e Sabom ficou
muito impressionado com o fato de não atribuir o aviador grande importância à sua
experiência. Até hoje, ele insiste que nada há de extraordinário naquilo!
— Não mudei as minhas idéias acerca da vida, da morte, do além ou de qualquer
outra coisa — disse ele ao Dr. Sabom.
Uma vez que o ex-piloto da força aérea não tinha interesse em usar a sua experiência
para provar coisa alguma, é improvável que estivesse mentindo deliberadamente para se
mostrar particularmente impressionante.
Os casos resumidos neste capítulo representam apenas alguns poucos de muitos
incidentes semelhantes que o Dr. Sabom recolheu. Poderiam ser citados mais casos,
alguns deles com minuciosidade, mas diferem muito pouco dos que já foram aqui
mencionados. Todos esses incidentes levam à conclusão de que as pessoas que
passaram pela experiência perto-da-morte, durante uma parada cardíaca — ou qualquer
outra situação de emergência médica — ficam realmente cientes do que lhes está
acontecendo, tomam conhecimento dos processos utilizados para revivê-las e do que
dizem os médicos durante a intervenção. Pesquisas subseqüentes feitas pelo Dr. Sabom
e seus colegas também demonstraram que o nível técnico do que viram e ouviram é bem
superior ao nível elementar de informação que a maioria das pessoas tem sobre as
técnicas padronizadas usadas no tratamento das paradas cardíacas. Parece haver pouca
dúvida de que a investigação do Dr. Sabom é, provavelmente, a mais importante linha
de provas que a experiência perto-da-morte não pode ser atribuída a anormalidades
cerebrais, alucinações resultantes da falta de oxigênio no cérebro ou a alguma obscura
anormalidade psicológica. O Dr. Sabom também rejeita possibilidade de tais relatos
serem atribuídos a criações subconscientes, liberações endórficas do cérebro, pressão
sobre o lobo temporal, ou outras causas fisiológicas. Tudo indica que aqueles eventos
são o que parecem ser: a consciência se afasta do corpo, em conseqüência do choque da
morte.
Assim, pode a experiência perto-da-morte representar realmente a primeira fase da
libertação da alma, saindo do corpo?

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Como médico e cientista, Sabom conclui em seu livro Recollections of Death:

... Não posso, naturalmente, afirmar que a experiência perto-da-morte indique o que
se dá no momento da morte final do corpo. As experiências ocorreram nos momentos
de declínio da vida. As pessoas que as relataram não foram trazidas de volta da morte,
mas salvas em um ponto muito perto da morte. Assim sendo, a rigor, tais experiências
são com a proximidade da morte, e não com a própria morte. Como suspeito que a
experiência PDM é o reflexo de uma separação entre a mente e o cérebro, não posso
deixar de indagar por que tal separação ocorre em um ponto perto-da-morte. Poderia a
mente, que se separa do cérebro físico, ser, em essência, a alma que continua a existir
depois da morte do corpo, de acordo com algumas doutrinas religiosas?

Mais Luz Sobre a Experiência Perto-da-Morte

Um estudo semelhante foi recentemente empreendido pelo Dr. Kenneth Ring, da


Universidade de Connecticut. Durante um período de mais de dois anos, Ring
entrevistou 102 sobreviventes de casos perto-da-morte. Duirante esse trabalho, o
pesquisador, do mesmo modo que o Dr. Sabom, esperava descobrir se os dados de
Moody eram corretos, e ver se poderia determinar como uma pessoa que passou pela
experiência a reproduz. Inicialmente, ele constatou que 41 por cento dos entrevistados
apresentavam a reação PDM clássica. Mas também notou que o conteúdo de tais
experiências ocorria de maneira progressivamente declinante. Expliquemo-nos. Para a
finalidade de sua pesquisa, Ring classificava a experiência PDM como contendo cinco
elementos centrais. Esses elementos consistiam em: (1) sensação de paz no começo do
encontro, (2) sensação de que saiu do corpo, (3) entrada na escuridão, (4) visão de uma
luz, (5) entrada na luz. Ring considerou-os como as fases da experiência. Foi
classificando os relatos de acordo com essas fases, que ele descobriu uma progressão
declinante no fenômeno. Assim, por exemplo, 60 por cento das testemunhas
experimentavam uma sensação de paz por ocasião da morte, ao passo que apenas 40 por
cento experimentavam a sensação de sair do corpo. E somente de 10 a 15 por cento
percebiam uma luz ou nela penetravam, quan-

79
do viajavam para o além. Isso parecia indicar que, quanto mais per pessoa chega da
morte, tantas mais fases atravessa.
Ring também descobriu que há ligeiras diferenças entre as experiências PDM e a
maneira com que a pessoa morre, ou mesmo experimenta a sensação PDM. As vítimas
de enfermidades parecem mais inclinadas a experimentar a sensação PDM, ao passo que
as vítimas de acidentes estão na outra categoria. As tentativas de suicídio são as mais
prováveis de provocar a sensação PDM. As pessoas que passam por violentas
manifestações PDM são as que experimentam com mais freqüência uma real lembrança
panorâmica da vida. Ring também fez a fascinante descoberta que as pessoas que se
consideram religiosas não estão mais sujeitas a experimentar a sensação PDM do que as
agnósticas!
Tanto o Dr. Ring como o Dr. Sabom mostraram, com os seus escritos, que os dados
que coletaram não somente confirmam as descobertas iniciais de Moody, como
demonstram a probabilidade de que haja uma vida depois da morte. Trata-se de uma
sensacional conclusão que movimentou muitos membros do mundo médico. No
entanto, até mesmo as cuidadosas pesquisas realizadas por médicos altamente
qualificados não passaram sem contestação. Há ainda várias questões que têm de ser
resolvidas, antes que as descobertas de Ring, Sabom e Moody possam servir de prova
da existência de uma vida no além. A principal dessas é que não há um meio de
determinar se as pessoas que entrevistaram estiveram realmente mortas. É
extremamente difícil precisar o momento exato da morte. O fato de tais pessoas terem
sobrevivido pode indicar, em primeiro gar, que elas não estiveram realmente tão perto
da morte. A expressão morte clínica é, de certo modo, impressionista, e não precisa.
Aplica-se, em via de regra, aos indivíduos cujo coração parou momentaneamente no
decorrer de operações ou em conseqüência de ataques cardíacos. Trata-se, porém, de um
critério questionável para se basear um diagnóstico de morte.
Um critério mais rigoroso é o exame das ondas cerebrais. O cérebro de um indivíduo
que acabou de morrer não produz qualquer atividade elétrica. Submetido a um exame
eletroencefalográfico, tal indivíduo não apresentaria ondas cerebrais. Infelizmente,
poucas das vítimas da morte clínica são submetidas a tal exame.
Os críticos também salientam que, quando o paciente se aproxima da morte, é muito
possível que seja atacado de anoxia — falta de oxigênio no cérebro. Esse estado causa
alucinações, e pode provocar a experiência perto-da-morte. O fenômeno poderia,
portanto, não passar de uma alucinação momentânea, nada tendo a ver com a questão da
vida e da morte.
Essas duas objeções — que não sabemos se as testemunhas PDM es-

80
tavam realmente mortas e se a experiência foi provocada pela anoxia — são
extremamente difíceis de serem refutadas. Em maio de 1979, no entanto, a Associação
Internacional de Estudos Perto-da-Morte anunciou ter encontrado un médico em Denver
que coligira dados suficientes para demolir ambas aquelas objeções! Essa nova prova
mostra que a experiência perto-da-morte é, de fato, uma verdadeira separação entre a
mente e o corpo.
O Dr. Fred Schoonmaker, cardiologista-chefe do Hospital St. Luke, se interessava
pelo problema perto-da-morte desde 1961. Somente em 1979, porém, ele apresentou os
dados. Nesse meio tempo, estudara bem mais de 1.000 casos de morte clínica no
decorrer de sua prática, e constatou que 60 por cento dos pacientes que tinham tido
morte clínica em conseqüência de paradas cardíacas relataram a experiência PDM.
Embora não tivesse tentado fazer uma avaliação formal daqueles dados, e não tivesse
seguido nenhum método científico ao coligi-los, o Dr. Schoonmaker coligira
cuidadosamente o máximo possível de informações médicas e descritivas. Tais dados
representam a melhor informação médica sobre o assunto já coligida. Em muitos casos,
as testemunhas de Schoonmaker foram tratadas por um grande conjunto de dispositivos
fisiológicos na ocasião em que passaram pela experiência PDM. O médico de Denver
reunira vários relatos de PDM que tinham ocorrido em ocasiões em que podia ser
cientificamente demonstrado que não havia falta de oxigênio indo para o cérebro.
Também estudou pacientes que tinham tido morte clínica quando submetidos ao
eletroencefalograma e recolhera 55 casos nos quais os pacientes que tinham apresentado
eletroencefalograma plano, isto é, ausência de atividade elétrica no cérebro, e que
relataram experiência PDM. De acordo com todos os critérios médicos, aqueles
indivíduos se encontravam irreversivelmente mortos, por ocasião de suas experiências.

O Problema das Experiências Perto-da-Morte Negativas

Embora vários investigadores tenham repetido as experiências de Moody, nem todos


anunciaram dados semelhantes. Um dos investigadores que apresentou relatos diferentes
é o Dr. Maurice Rawlings, cardiologista do Estado de Tennessee, que colheu várias
informações sobre experiências perto-da-morte de todo diferentes do tipo de episódios
pacíficos, agradáveis, transcendentais, anunciados por Moody, Sabom e Ring. Alguns
dos relatos do cardiologista são de experiências terríveis, o que le-

81
vou Rawlings, um devoto cristão, a acreditar que eles mostram a real existência do
inferno.
Rawlings encontrou pela primeira vez esse tipo de experiência perto-da-morte
quando estava tentanto reviver um de seus pacientes que sofrera uma parada cardíaca. O
paciente começou a gritar que estava no inferno. Desde então, Rawlings colecionou
muitos exemplos de experiências PDM infernais. Uma de suas correspondentes, por
exemplo, experimentou tal sensação depois de um ataque do coração. Eis o que ela
contou ao médico:

Lembro-me que fiquei sem ar e depois devo ter desmaiado. Em seguida, me lembro
que estava entrando em uma sala escura e vi em uma das janelas um gigante enorme,
com um rosto grotesco, que estava me espiando. Em torno da janela corriam pigmeus
ou elfos, que pareciam estar com o gigante. O gigante me chamou para ir até junto
dele. Eu não queria, mas tive de ir. Fora, estava escuro, mas pude ouvir o choro de
pessoas em torno de mim. Sentia coisas se movendo em torno dos meus pés. Enquanto
andávamos por aquele túnel ou porão, as coisas iam ficando pior. Lembro-me que
comecei a chorar. Depois, não sei porque, o gigante me soltou e me mandou voltar.
Senti que estava sendo poupada. Não sei por quê.
Depois me lembro de estar no leito do hospital. O médico me perguntou se eu usava
drogas. Disse-lhe que não tinha aquele hábito e que o caso era verdadeiro. Ele mudou
toda a minha vida.

Em seu livro Beyond Death’s Door (Além da Porta da Morte), Rawlings informa que
uma quinta parte dos pacientes ressuscitados após uma parada cardíaca relatava
experiências PDM desagradáveis. Muitos deles se esquecem da experiência, acrescenta.
Devido a essa experiência pessoal, Rawlings se mostra extremamente crítico em relação
aos outros investigadores da vida-após-a-vida. Na sua opinião, a maior parte das
pessoas que têm uma experiência PDM desagradável bloqueia em sua mente a
lembrança da mesma. Como a maior parte dos investigadores só entrevista as
testemunhas semanas, ou mesmo meses, depois de suas mortes clínicas, Rawlings
acredita que os seus dados sejam suspeitos. Acha que os seus próprios dados são mais
objetivos e completos, uma vez que, como cardiologista atuante, podia coligir os dados
tão logo os pacientes se recuperavam.
Rawlings, por sua vez, tem sido criticado por outros pesquisadores, que argumentam
que as suas experiências infernais são na realidade manipuladas, alucinações produzidas
pela mente das testemunhas como reação

82
à violenta agressão física, como as pancadas no peito e o estímulo elétrico, que faz parte
das técnicas normais de ressurreição.
De qualquer maneira, os dados de Rawlings não podem ser desprezados em mais ou
menos. O Dr. Charles Garfield, psicólogo do Instituto de Pesquisas do Câncer da Escola
de Medicina da Universidade da Califórnia, em São Francisco, também tem recolhido
dados indicando que a morte nem sempre é uma experiência agradável. O Dr. Garfield
estudou 173 pacientes terminais de câncer, alguns dos quais tiveram experiências muito
desagradáveis quando se aproximavam da morte. Embora muitos diziam ter ouvido uma
música celestial e visto uma forte luz, outros diziam ter visto figuras demoníacas e
imagens de pesadelo. Em conseqüência, Garfield concluiu que nem todo o mundo
experimenta uma morte tranqüila e resignada. Ao contrário de muitos outros
pesquisadores do PDM, contudo, ele não acredita que a experiência indique
necessariamente que iremos invariavelmente sobreviver à morte. Na sua opinião, tudo
não passa de visões que ocorrem quando se entra em um estado alterado de consciência.
Esses estados mentais podem pouco ter a ver com o processo físico da morte.
Não se pode deixar de concordar com o Dr. Garfield, quando ele diz que o estudo da
experiência PDM de modo algum é claro e definitivo. Por outro lado, as experiências
desagradáveis observadas por Garfield e Rawlings parecem anômalas mesmo em
comparação com os dados colhidos por eles próprios, além de não serem mencionadas
de modo algum por outros pesquisadores. E nem podem necessariamente servir de
prova contra a crença na vida após a morte. Muitos mestres espíritas e religiosos
ensinam que pode haver diferentes planos no além, alguns dos quais são mais inóspitos
do que os outros. Talvez algumas poucas pessoas desventuradas tenham entrado em
contacto com os planos inferiores, acerca dos quais místicos como Emmanuel
Swedenborg já falavam no século XVIII.
O que é interessante é que tantos médicos e cientistas — Garfield é exceção —
tenham saído de suas pesquisas acreditando em uma vida depois da morte, mesmo que
não tenham iniciado o estudo do fenômeno PDM com tal intuito. O estudo da
experiência PDM poderá muito bem ser a disciplina que finalmente unirá a ciência e a
religião em uma causa comum.

83
*
* *

84
4
Contacto Espontâneo com os Mortos
O drama começou em 21 de fevereiro de 1977, quando a polícia de Chicago
encontrou o corpo de Teresita Basa, de 48 anos, estendido no chão apartamento no
décimo quinto andar de um edifício onde morava. Fora apunhalada e o corpo estava
parcialmente queimado. Teresita Basa, natural das Filipinas, viera para os Estados
Unidos na década de 1960 e era difícil se pensar em um motivo para o crime. Ela
trabalhava como terapeuta de respiração no Hospital Edgewater na zona norte de
Chicago e era querida pelos seus colegas de trabalho. A princípio, a polícia achou que o
assassinato poderia ter sido praticado pelo namorado da vítima, mas afastou a idéia,
depois de interrogá-lo. Não havia uma pista qualquer.
A alma, espírito, fantasma, ou seja o que for, de Teresita Basa estava inquieto, e
outro ato do mistério se desenrolou quatro meses mais tarde, em casa do Dr. José Chua,
médico filipino, cuja esposa trabalhara no Hospital Edgewater por ocasião do crime. O
Dr. Chua ficou surpreso, certa noite, vendo sua mulher, inexplicavelmente, entrar em
estado de transe, quando se encontravam na localidade vizinha de Skokie. Madame
Chua foi até o quarto de dormir, deitou-se, e começou a falar em seu idioma nativo.
— Falou em tagalong (um dialeto filipino), mas com um estranho sotaque espanhol
— explicou o médico, mais tarde. — Disse “Akoy (sou) Teresita Basa”.
O Dr. Chua confessou que ficou assustadíssimo, quando ouviu Teresita explicando
que fora assassinada por um colega de trabalho, chamado Allan Showery, e o motivo
fora roubar as suas jóias. A Sra. Chua saiu do transe depois que a voz estranha terminou
de dar o seu recado, mas não teve a mínima lembrança do rápido episódio. O Dr. Chua
ficou sem saber o que fazer.

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Fosse quem fosse que estava dominando Madame Chua, o fato é que era persistente.
Poucos dias depois, ocorreu outro daqueles peculiares transes. Dessa vez, a voz se
queixou de que Showery continuava de posse das jóias e que oferecera um anel de
pérola à mulher com quem vivia. Uma terceira comunicação ocorreu alguns dias depois,
e o Dr. Chua resolveu, afinal, chamar a polícia.
Os inspetores encarregados do caso, Joseph Stachula e Lee Epplen, se mostraram
céticos, mas não queriam desprezar qualquer pista que lhes fosse oferecida. As fontes
normais de informação tinham falhado, de maneira que se entenderam com os Chua, ao
mesmo tempo incrédulos e esperançosos. O fato é que trabalharam com eficiência
profissional. Chegando ao apartamento do médico, a primeira coisa que perguntaram foi
se Teresita Basa alegava ter sido estuprada pelo assassino. O Dr. Chua respondeu
negativamente, explicando que a voz só falara em assassinato. Os investigadores
ficaram impressionados com a resposta, pois a sua pergunta fora uma armadilha.
Sabiam, pelo laudo da autópsia, que Teresita Basa morrera virgem. Em seguida, os
Chua falaram sobre Showery e as jóias.
“Até hoje”, — escreveu mais tarde o detetive Stachula — “não sei se acredito mesmo
que a informação tenha sido obtida daquele modo. Não obstante, tudo era
perfeitamente verdadeiro.”
Realmente. Trabalhando de acordo com as informações prestadas pelo Dr. Chua e o
autoproclamado fantasma de Teresita Basa, a polícia de Evanston começou a focalizar a
sua atenção em Showery. Uma busca em seu apartamento resultou na descoberta das
jóias e o anel de pérola foi encontrado enfeitando a mão de sua amante. Showery foi
detido, confrontado com as provas, e assinou uma confissão, admitindo o roubo e o
homicídio. O caso foi oficialmente encerrado em agosto.
O estranho caso da morta que denunciou o seu próprio assassino provavelmente
ficaria desconhecido, se não tivesse sido divulgado pela imprensa filipina de Chicago. A
reportagem do Philippine Herald bateu com o nariz na porta enquanto tentou obter
informações da polícia, mas o seu redator-chefe, Gus Bernardes, que conhecia os Chua,
pôde explorar a história a fundo, e acabou sabendo de vários de seus aspectos psíquicos,
muito curiosos. Ficou sabendo, por exemplo, que vários empregados do hospital tinham
se queixado do comportamento da Sra. Chua na semana que precedeu a revelação do
caso. Ela costumava entrar em transe no hospital e cantava com voz de Teresita, o que
assustava muito os seus colegas. O Herald noticiou o caso em seu número de 16 de
agosto, mas o fato só se tornou conhecido pelo grande público quando, em 5 de março
de 1978, o Tribune de Chicago o publicou na primeira página. Realizava-se, então, o
jul-

86
gamento de Allan Showery, o que fez reviver o interesse pelo caso. O testemunho dos
Chua foi muito comentado, o que levou a logo entrarem em campo os crentes e os
céticos.
O problema era que a Sra. Chua conhecia Teresita Basa muito bem... ou, pelo menos,
muito melhor do que admitira para a polícia. Ficou também esclarecido que ela
conhecia e detestava abertamente Allan Showery. Essas revelações levaram um porta-
voz do hospital a sugerir que as mensagens espíritas da Sra. Chua não passavam de
truques de que ela lançava para para expressar as suas próprias suspeitas.
— Acho que ela podia saber alguma coisa a respeito de Showery, mas que
arriscaria a própria vida e a vida de seu marido, se recorresse diretamente à polícia —
disse o porta-voz à imprensa, sugerindo também que a Sra. Chua poderia ter visto
Showery com alguma das jóias.
Essa hipótese, todavia, não explica vários aspectos interessantes do caso. Em
primeiro lugar, houve o fato curioso de toda a personalidade da Sra. Chua ter começado
a mudar algum tempo antes do recebimento das mensagens, no verão de 1977. Embora
fosse ordinariamente uma empregada correta e disciplinada, acabou sendo despedida do
hospital, devido às súbitas e inexplicáveis mudanças em sua conduta, que se seguiam
aos estados de transe.
As acusações do porta-voz também não explicam por que os Chua não se limitaram a
fazer uma denúncia anônima pelo telefone à polícia. Diante de um crime tão sério e
inexplicado, sem dúvida a polícia se apressaria a investigar a procedência de qualquer
denúncia verossímil.
Novas provas do aspecto psíquico do caso vieram à luz em 1979, quando os Chua
colaboraram para a publicação de um livrinho sobre o episódio. O casal acabou
admitindo que as comunicações espíritas do verão de 1977 foram, realmente,
conseqüência de um desafio. Durante a investigação que se seguiu imediatamente ao
homicídio, a Sra. Chua disse aos seus colegas de trabalho que o espírito de Teresita
poderia procurá-la, se a polícia não conseguisse descobrir o assassino. Ela testemunhara
uma aparição da morta pouco tempo depois do crime, e as mensagens espíritas foram o
resultado de uma crescente invasão de sua personalidade pela de Teresita.
O caso do assassinato de Teresita Basa e seu fantástico desenlace se encerraram, e
apenas os seus aspectos psíquicos continuam controvertidos.
Casos de vítimas de assassinatos que voltam do túmulo para denunciarem os
assassinos podem parecer dessas histórias de defunto que costumam ser contadas junto
das fogueiras de acampamentos. A história do casal Chua e sua estranha viagem espírita
parece mais um conto de Edgar Allan Poe que um estudo de pesquisas psíquicas. No
entanto, o caso do

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regresso do espírito de Teresita Basa não é o único nos anais da ciência psíquica, pois
vários episódios semelhantes ocorreram desde fins do século passado. A revelação
espírita representou, por exemplo, papel decisivo no julgamento que se seguiu à morte
de uma jovem recém-casada em 1897, no Estado da Virgínia Ocidental. A vítima, Zona
Heaster Shue, foi encontrada morta pelo marido, um ferreiro, junto da escada da casa, e
o corpo foi enterrado logo, sem qualquer exame médico. Nem todos estavam
convencidos de que a morte fora acidental, especialmente quando a mãe de Zona
começou a receber visitas do espírito da filha, dizendo que tinha sido assassinada. As
autoridades municipais de Greenbier Valley ordenaram a exumação do corpo e
verificaram que havia fratura nas vértebras cervicais. O viúvo foi preso imediatamente e
acareado com a sogra. A Sra. Heaster declarou que sua filha lhe aparecera por quatro
noites seguidas, explicando que o marido a espancara violentamente, porque ela não
havia feito o jantar. O júri, em dez minutos apenas, decidiu pela culpabilidade do viúvo.
Um caso ainda melhor documentado foi publicado pelo Professor James Hyslop, da
Sociedade Americana de Pesquisas Psíquicas, em 1911. Sua investigação referia-se ao
caso da Sra. Rosa Sutton, residente em Portland, Estado de Oregon, que começou a
receber visitas de seu filho morto em 1907. Ele era tenente em Annapolis e, ao que
parecia, suicidara-se, depois de uma briga com oficiais seus colegas. O seu fantasma
começou a aparecer para a mãe, repetidamente, dizendo que ele fora espancado e depois
assassinado pelos outros oficiais. A aparição descrevia pormenorizadamente onde ele
fora ferido. A exumação do cadáver comprovou que o jovem fora espancado
exatamente como a aparição contava, mas ninguém foi acusado como assassino.
Um caso mais recente dessa natureza foi revelado pela UPI (agência de notícias
internacional), em 1970, quando Mr. Romer Troxell, de 42 anos, residente em
Livittown, no Estado da Pennsylvania, foi a Portage, no Estado de Indiana, a fim de
receber o corpo de seu filho, que fora assassinado. O corpo fora encontrado à margem
de uma estrada, sem qualquer documento de identificação. A voz do jovem assassinado
se fazia ouvir na mente de Mr. Troxell, a partir do momento em que ele e sua esposa
chegaram à cidade de carro. Ele declarou à polícia que a voz do filho o levara até o
assassino, quando ele percorria a cidade, procurando o carro roubado do filho. A voz lhe
dissera aonde ir, e ele não tardou a localizar o veículo. — Fiz uma volta e segui o carro
por um quarteirão — explicou. — Quis provocar uma batida no carro, mas Charlie me
aconselhou que não fizesse isso.

88
Assim, ele se limitou a seguir o carro, até que o motorista o parou e desceu. Troxell o
abordou e ficou conversando com ele, enquanto outro parente ia chamar a polícia. Mais
tarde, as autoridades policiais prenderam o motorista, de acordo com as suas próprias
informações confidenciais... informações essas que jamais tinham transmitido a Mr.
Troxell.
— Charlie me deixou depois que apanhamos o assassino — disse Troxell. —
Charlie está em paz agora. Mas a polícia estava na pista do assassino. Eu só soube
disso quando me mostraram o que fora descoberto com a investigação. Mas, quando
ouvi meu filho me guiando, tratei de agir. Talvez o Senhor quisesse que fosse assim.

Provas da Freqüência do Contato Subjetivo com os Mortos

Romer Troxell, a Sra. Rose Sutton e a Sra. Chua, todos eles acreditavam estar diante
da presença dos mortos. Nenhum deles duvidou, por um momento, de que estavam
experimentando um contacto direto com o mundo de além-túmulo. Sem dúvida, é
possível que os estados de transe da Sra. Chua fossem episódios psicológicos, durante
os quais o seu subconsciente expressava as suas bem fundadas suspeitas quanto a
Showery. Também é possível que Mr. Troxell e a Sra. Sutton conseguissem os seus
contactos post mortem em virtude de sua profunda necessidade de acreditarem que a
morte não é o fim, talvez reforçada por informação conseguida telepaticamente. Mas,
por outro lado, poderiam aqueles episódios representar contactos reais com os mortos?
Essa é uma idéia que pode parecer antiquada e incabível, hoje em dia; trata-se,
porém, de uma hipótese que tem sido seriamente considerada, quando nada porque
casos semelhantes são surpreendentemente comuns. Embora nem todos os casos sejam
espetaculares como os aqui citados, há uma comprovação crescente de que o contacto
com os mortos — ou, pelo menos, experiências que são tidas como tal comunicação —
é relativamente freqüente em nossa cultura.
Os psicólogos chegaram a essa conclusão no começo da década de 1970, quando
começaram estudar a psicologia da morte e do pesar provocado pela morte. O Dr. Dewi
Rees publicou o seu primeiro estudo de grande porte em 1971, quando discutiu as
alucinações da viuvez na revista British Medical Journal. Foi um pioneiro. Rees
interrogou 293 viúvos e viúvas acerca de suas experiências após a morte de seus
cônjuges, e verificou

89
que quase metade dos mesmos (47%) acreditava que estivera em contacto momentâneo
com eles. Tais contactos não somente surgiam imediatamente após a morte, esclareceu
Rees, mas, às vezes, mesmo muitos anos depois. Alguns dos episódios tinham
influência telepática, ao passo que outros consistiam indiscutivelmente em aparições.
Era evidente que estava sendo descoberta uma nova dimensão psicológica (?) do
problema da viuvez. Quando se tornaram conhecidos os resultados obtidos por Rees,
pesquisadores da Universidade do Estado de Wayne os acharam tão intrigantes que
resolveram repetir o estudo. Obtiveram dados semelhantes.
Aqueles pesquisadores pioneiros não acreditavam que os seus consultados
estivessem realmente se comunicando com os mortos. Preferiram acreditar que tinham
pela frente um aspecto psicológico especial do pesar causado pela viuvez. Infelizmente,
pesquisando sobre o caso, o Dr. Richard Kalish e um colega da Universidade do Sul da
Califórnia, em 1974, não conseguiram demonstrar que o trauma da viuvez induz tais
mudanças psicológicas severas. O Dr. Kalish não encontrou diferença entre as viúvas
que entrevistou e um grupo correspondente de mulheres idosas. Seu único achado
significativo foi constatar, mais uma vez, que os viúvos e viúvas afirmavam com muita
freqüência ter tido contacto com os mortos. Não há, porém, um simples dado em seu
estudo que possa sugerir qualquer hipótese que explique por quê.
Um dos problemas que apresenta o estudo do Dr. Kalish foi uma questão que ele não
podia examinar na época. As autoridades psicológicas e médicas que estudavam a
psicologia do trauma da viuvez, naqueles anos de pioneirismo, partiam de uma premissa
discutível, uma vez que acreditavam que o contacto com os mortos era um fenômeno
reduzido às pessoas que haviam se enviuvado recentemente ou que eram muito idosas.
O que não levaram em consideração foi que o contacto com os mortos é freqüentemente
mencionado por todos os segmentos do público em geral. Essa descoberta ocorreu no
fim da década de 1970, e tem sido confirmada várias vezes. O estudo básico foi, mais
uma vez, o trabalho do Dr. Richard Laish e de David K. Reynolds, que realizaram as
suas entrevistas no sul da Califórnia. Foi entrevistada uma faixa transversal da
sociedade, na esperança de se verificar como as diferenças culturais afetavam as
opiniões sobre a morte e o além-túmulo. Os dois pesquisadores entrevistaram 434
adultos, de origem negra, japonesa, mexicana e branca (européia) e depois classificaram
os dados encontrados segundo a idade, a raça e o sexo.
Os pesquisadores fizeram descobertas surpreendentes. Mais de 50 por cento das
mulheres entrevistadas pretendiam ter tido contactos post-mortem, e mais de um terço
dos homens também respondeu afirmativamente. As

90
experiências, na maior parte das vezes, ocorriam em sonhos, mas os sonhos eram
descritos pelos entrevistados de maneira muito mais viva do que a habitual. Também
foram mencionadas visitas de mortos por meio de vozes, aparições ou por sua presença
psicologicamente sentida.
Essa última sensação era um tanto diferente da experiência da viuvez, em que é
freqüentemente mencionada a impressão de “estar sentindo a sua presença”. Os
psicólogos também notaram que as experiências que lhes foram mencionadas eram mais
freqüentemente agradáveis do que amedrontadoras, e que, nas raras ocasiões em que
outra pessoa estava presente, tal pessoa compartilhava a experiência.
Foi uma admissão surpreendente, mas que não chegou a ser levada em consideração
pelos psicólogos, quando afinal interpretaram as suas descobertas, uma vez que
estavam, obviamente, mais interessados no aspecto demográfico. Evidenciou-se que a
cultura não influenciou a expressão das experiências, uma vez que Kalish e Reynolds
constataram que todos os grupos étnicos apresentaram casos típicos semelhantes. A
descoberta mais significativa foi a de que os negros e mexicanos-americanos
apresentavam maior percentagem de contacto com os mortos do que os caucásios ou
orientais. Os dois primeiros grupos também tiveram experiências mais aterrorizadoras e
mencionaram maior número de contactos visuais e auditivos. (Essas duas feições talvez
sejam interdependentes, uma vez que uma descoberta pode ter provocado a outra.)
Apesar de seu pioneirismo, o estudo Kalish/Reynolds foi — de um modo geral —
um tanto falho em suas conclusões. A predisposição na revelação dos dados pode ter
representado um papel significativo sobre o conjunto das estatísticas, problema que os
psicólogos pouco fizeram para explorar ou mesmo para reconhecer. Concluíram que o
grau de cultura afetava, sem sombra de dúvida, a experiência subjetiva de contacto com
os mortos, sem levar em consideração o fato de certos grupos da cultura americana
apenas informarem os seus contactos mais prontamente. Também pode ser que pessoas
de diferentes antecedentes étnicos e sociais se mostrem mais dispostas a falar de tais
experiências, ou, por outro lado, mais inclinadas a racionalizá-las. Os dois psicólogos
deveriam ter levado em consideração tal possibilidade, uma vez que a atual moda da
experiência (isto é, a forma que assumiu) não variava com quaisquer fatores
demográficos. Evidentemente, estavam diante de um fenômeno de faixas culturais.
Os dois pesquisadores californianos sequer encontraram qualquer correlação entre o
vigor das crenças religiosas das testemunhas e a verossimilhanças de suas informações
sobre contactos post-mortem. Na verdade, as pessoas consultadas que não se
consideravam especialmente religiosas

91
revelavam contactos espontâneos com os mortos mais freqüentemente que os religiosos
devotos. Os menos cultos respondiam mais vezes positivamente, mas é provável que tal
fato tenha resultado de um importante elemento variável, suscetível de provocar
confusão, que descreverei mais tarde. Os pesquisadores também constataram,
surpreendidos, que “... as pessoas que se enviuvaram ou perderam entes queridos não
participaram, em grande proporção, das experiências, como prevíramos”. A única
exceção foi o subgrupo negro.
Em resumo: não pôde ser encontrada uma base puramente psicológica para aquelas
experiências. Isso, no entanto, não impediu o Dr. Kalish de afastar pessoalmente a
realidade metafísica das experiências de contacto post-mortem. Sua conclusão final foi:
“Não acredito que aquelas pessoas tenham se comunicado com os mortos”.
Acrescentou que acreditava “serem as experiências vívidas e pareciam muito reais, não
se tratando de sonhos, nem havendo indícios de distúrbios emocionais”. O que re
sentam, então, tais contactos?
“São sinais”, explicou Kalish, “que a intensidade da perda do ente querido ou outra
experiência é muito grande e muito profunda, e que as associações anteriormente
formadas com a pessoa morta são extremamente fortes.” Sua conclusão é que o suposto
contacto surge na própria mente da testemunha.
A despeito de suas conclusões pessoais, o trabalho pioneiro do Kalish ajudou a
esclarecer esse aspecto da psicologia da morte. É claro que o “contacto com os mortos”
é uma sensação muito comum e que tais experiências ocorrem em diversas culturas,
sendo expressadas de maneira muito semelhante e por pessoas de todas as faixas etárias.
Isso contesta a idéia de que tais experiências resultem primordialmente da privação de
um ente querido. Os dados de Kalish/Reynolds, contudo, não são os únicos. Resultados
semelhantes foram obtidos quando um grupo de pesquisadores de Chicago repetiu o
trabalho de Kalish/Reynolds. Foi verificado que 25 por cento das quase mil e
quinhentas pessoas entrevistadas informaram ter tido contactos espontâneos com os
mortos. As pessoas mais velhas e as adolescentes se mostravam particularmente
inclinadas a contar as suas experiências. Os pesquisadores também constataram (como
seu antecessores) que os negros se mostram particularmente inclinados a revelar os seus
contactos post-mortem e que os judeus e protestantes as revelam mais do que os
católicos. Ao contrário dos seus colegas da Califórnia, porém, os pesquisadores de
Chicago estavam bem conscientes de que as suas constatações podiam representar
meros artefatos. A experiência dos viúvos e viúvas não afetava os dados, embora mais
uma vez se tivesse

92
a impressão de que as pessoas menos cultas experimentassem mais facilmente ou
falassem mais sobre a experiência do que as pessoas mais cultas. Os pesquisadores
puderam mostrar que tais conclusões eram ilusórias. Explicavam-se porque, em nossa
cultura, as pessoas mais idosas, que se mostram mais dispostas a revelar tais
experiências, são tipicamente menos instruídas que os norte-americanos mais jovens.

Contatos Post-Mortem Espontâneos

Se houve quaisquer problemas flagrantes naquelas investigações, foram antes de


natureza experimental do que estatística. Nem os pesquisadores da Califórnia, nem os
de Illinois, pareciam realmente muito interessados no conteúdo das respostas obtidas.
Não se preocuparam com as dimensões humanas do que aprendiam. Estiveram aquelas
pessoas realmente em contacto com os mortos, ou não? A resposta a essa pergunta
crucial não pode ser respondida através de estatísticas, mas somente através de um
estudo dos casos.
O problema foi, em parte, corrigido em 1980, quando Julian Burton resolveu estudar
a mesma questão de um ponto de vista mais humanista. Burton estudava o doutorado
em psicologia, quando resolveu usar seus dados como base para uma tese de doutorado,
tendo explicado que essa idéia surgira em conseqüência de uma dramática experiência
pessoal. Sua mãe morrera em abril de 1973, aos 67 anos de idade, depois de sofrer um
ataque cardíaco.
“Eu e minha mãe éramos muito afeiçoados um ao outro”, escreveu ele mais tarde.
“Em setembro, a maior parte da família, mais conformada, voltara às suas atividades
normais.”
Não estavam, porém, rompidos os laços entre o Dr. Burton e sua mãe.
“Em uma noite de setembro — continuou ele — eu e minha mulher estávamos
recebendo alguns parentes em nossa casa. Eu me encontrava na cozinha, descascando
um abacaxi, quando ouvi, à minha direita, passos que julguei ser de minha mulher.
Virei-me, para perguntar-lhe onde se achava uma determinada vasilha, quando percebi
que ela caminhava para a esquerda, fora de meu campo de visão. Virei-me para lá, a
fim de repetir a pergunta, e vi minha mãe parada lá. Estava perfeitamente visível, e
parecia anos mais moça do que por ocasião de sua morte. Usava um vestido
transparente azul-claro, debruado com um fio de seda, que eu nunca vira antes...”

93
Mal ele chamou, a visão começou a desaparecer, pouco a pouco. “Na manhã
seguinte — continua a narrativa do Dr. Burton — procurei minha irmã Jean, e contei-
lhe o que me havia acontecido. Ela ficou muito nervosa, e começou a chorar,
perguntando por que seria que minha mãe não aparecera para ela. Fiquei aborrecido
com isso, e perguntei-lhe se ela estava acreditando no que eu lhe contara, e, sem
demora, minha irmã disse que sabia ser a verdade. Por que tinha tanta certeza? Ela
respondeu que ela e minha mãe tinham saído para fazer compras, duas semanas antes
de minha mãe sofrer o ataque e fora então que ela experimentara o vestido azul-claro
que eu tinha visto. Embora minha mãe tivesse gostado muito do vestido e o mesmo lhe
ficasse muito bem, ela não tivera coragem de pagar 200 dólares por ele.”
Em conseqüência daquela aparição foi que, aos 42 anos de idade, Burton resolveu
fazer o curso de doutorado.
“A aparição de minha mãe me deu a idéia de fazer a pesquisa”, — admitiu. “Achei
que muitas pessoas tinham experiências semelhantes para relatar.”
Assim sendo, Burton organizou um questionário, perguntando aos entrevistados se já
haviam sido visitados pelos mortos, qual era o seu relacionamento com os fantasmas, a
natureza das experiências, se essas se repetiram, etc. Primeiramente entregou o
questionário a grupos de pesquisas psíquicas da região de Los Angeles, mas não tardou
a mudar a sua estratégia, quando notou a percentagem extraordinariamente alta de
respostas afirmativas. Ficou desconfiado de que os consultados tinham se deixado
influenciar por seu interesse em questões psíquicas, e, desse modo, enviou os
questionários aos departamentos de psicologia de três escolas de Los Angeles. Ainda
assim, cinqüenta por cento dos estudantes informaram ter tido contactos post-mortem!
O Dr. Burton já colheu, até agora, 1.500 respostas, e acrescentou importantes dados aos
obtidos nas pesquisas anteriores na Califórnia e em Illinois. Também verificou que as
pessoas mais velhas se mostram mais dispostas a revelar tais contactos, embora isso não
seja, de modo algum, seu monopólio. A maior parte das experiências consistia de
contactos durante o sono ou sensações subjetivas, embora também fossem mencionadas
visões e aparições. Essas experiências foram evidentemente sensacionais, uma vez que
60 por cento das pessoas entre as idades de 16 e 60 anos mudaram com base nelas a sua
atitude em face da morte.
De qualquer modo, o que realmente impressionou Burton foram os próprios casos.
Alguns eram semelhantes ao seu próprio caso pessoal,
“Quando eu me achava prestes a completar a minha tese” — escreveu

94
ele mais tarde — “estava trabalhando em casa, ao mesmo tempo em que minha
governanta Lita Canalaes fazia a limpeza e arrumação. Era uma mulher de 30 e poucos
anos, que me contou dois casos, um dos quais acontecido quando se encontrava em
minha casa.
“Certo dia, quando estava arrumando o meu quarto de dormir, Lita ouviu um
assovio. Achando que era algum operário que estivesse olhando do lado de fora da
janela (embora eu morasse no terceiro andar), ela continuou a trabalhar. O assovio se
fez ouvir de novo. Quando olhou, ouviu uma voz de mulher, que a chamou duas vezes
pelo nome. Lita olhou nos outros aposentos e não viu pessoa alguma. Apesar de ter se
arrepiado de medo, acabou se esquecendo do caso, até chegar à sua casa, onde
encontrou uma carta vinda de El Salvador, anunciando a morte de sua melhor amiga. A
mãe de sua amiga escreveu que um par de sapatos que Lita lhe mandara de presente
chegou três horas antes de sua morte. A notícia fez com que Lita se lembrasse que,
quando eram adolescentes, ela e sua amiga costumavam chamar uma à outra
assoviando. A clareza e simplicidade desse relato são semelhantes às de muitos outros
que ouvi e li no decorrer da minha pesquisa.”

Outro caso foi relatado a Burton por um jovem ginasiano, e dizia respeito à morte de
uma tia-avó. Não se trata, evidentemente, de um grau de parentesco suscetível de
produzir laços de afeto muito estreitos, e em conseqüência, uma experiência psicológica
aparentemente anômala.

Fiquei sabendo de sua morte logo que cheguei em casa, vindo do colégio. Tinha de
andar depressa, porém, para ir à lição de catecismo. Subi até o meu quarto para
apanhar o livro, e, quando já ia pegá-lo, parei e olhei em torno. Uma mulher um tanto
transparente estava sentada na outra cama, com as mãos trançadas no colo, sorrindo
para mim. Eu nunca estivera com ela, desde que tinha seis meses apenas, mas, não sei
como, tive certeza de que era minha tia, que acabara de morrer. Tínhamos nos
correspondido com ela durante anos, e ela ainda se correspondia com sua irmã, com a
qual morávamos. Compreendi o que estava acontecendo, mas não tive medo, pois fiquei
dominado por um profundo sentimento de afeto. Nada havia de ameaçador ou
perturbador na experiência. Fiquei inteiramente imóvel, procurando guardar na
memória os detalhes de sua aparência, do vestido que trazia, etc. Quaiuio a visão
desapareceu, desci paia o andar de baixo e contei a minha mãe e minha irmã o que
acontecera. Se alguma vez tive medo, agora já não tenho. Acredito firmemente em
alguma espécie de vida depois da morte. Não tenho certeza se, algum outro

95
membro da família que tivesse passado pela experiência, diria a mesma coisa.

Foi significativa a maneira com que o Dr. Burton encarou os seus dados. Na sua
opinião, as experiências tais como a sua própria e outras que coligiu com muita
freqüência não são anunciadas. Muitas pessoas — ele argumenta — têm medo de serem
tidas como insanas se contarem os seus encontros com os mortos. Esse problema foi
agravado, salienta o psicólogo, pelos profissionais da saúde mental, que procuram negar
a validade de tais episódios. As experiências são, em via de regra, consideradas como
tentativas das pessoas “de se agarrarem ao morto ou como alucinações provocadas
pelo sofrimento, por ter perdido um ente querido”.
E Burton pergunta: “Mas temos o direito de fazer isso? Espero que outros
investiguem esse fenômeno e juntem as suas informações ao crescente acervo de provas
no sentido de que tais experiências são normais e comuns. Talvez futuramente a
sensacional e amedrontadora natureza das ‘histórias de defuntos’ cederá lugar à
constatação de que receber visitas dos mortos pode se tornar uma junção banal da vida
quotidiana”.
A despeito da natureza muito emotiva e freqüentemente impressionante daquelas
experiências humanas, o cético continua a ter pretexto para negá-las. Com efeito,
poucos casos são tão verídicos como os do Dr. Burton, e menos ainda da qualidade que
teria impressionado os fundadores das pesquisas psíquicas, há cem anos. Como salienta
o Dr. Burton, a maior parte dos relatos pode ser facilmente posta de lado, como simples
fantasias de pessoas geralmente entregues ao sofrimento acarretado pela perda de um
ente querido. Mesmo os casos mais complexos, em que algum fator psíquico
desempenha um evidente papel, podem ser reduzidos a “essas explicações mundanas”.
Assim, por exemplo, talvez o Dr. Burton tenha usado uma simples clarividência,
enquanto inconscientemente provocava a aparição de sua mãe, e assim por diante. As
pesquisas sobre a sobrevivência tropeçam em tais questões, as mesmas que confundiam
os primeiros pesquisadores, na época vitoriana.

Contato com os Mortos Através dos Sonhos

É significativo que a maior parte dos pesquisadores interessados em contactos


espontâneos com os mortos tenha verificado serem os contactos

96
através dos sonhos o modo mais comum de expressão. Trata-se, contudo, da forma de
contacto post-mortem suscetível de ser mais facilmente contestada. Tal fato não levou,
contudo, os pesquisadores a abandonar completamente essa linha de investigação. O
falecido Dr. Robert Crookall, cientista britânico que sacrificou sua aposentadoria a fim
de se dedicar às pesquisas acerca da sobrevivência, argumentou longamente que alguns
contactos oníricos podem ser instigados por inteligências sobreviventes. Defendeu esse
ponto de vista em seu livro Dreams of High Significance (Sonhos de Grande
Significação), aparecido em 1974.
A Sra. Helen Solem, de Portland, Estado do Oregon, reabriu, recentemente, a
questão, apresentando uma grande coleção de tais casos. A Sra. Solem divide
presentemente o seu tempo entre a sua profissão de contadora e as pesquisas acerca da
sobrevivência, tendo iniciado o seu estudo sobre os sonhos em 1983, em conseqüência
de suas próprias experiências oníricas. Não tardou a começar a recolher relatos de outras
pessoas, e hoje conta com um considerável acervo de materiais. Meu interesse pelos
estudos da Sra. Solem se originou das minhas providências para publicação de casos
verídicos de contacto com os mortos. Quando fiquei sabendo que a pesquisadora de
Portland iniciara o seu trabalho, providenciei para que ela examinasse casos que
incluíam a comunicação de material probante. Vários desses casos foram depois
encaminhados à revista Fate, de cuja redação faço parte como consultor.
Alguns dos relatos coletados pela Sra. Solem eram relativamente simples. Uma
senhora idosa contou à pesquisadora que, em 1906, teve um sonho em que ouviu um
irmão já falecido conversando com ela. A voz lhe informou que ela precisava fazer uma
importante escolha: entre sua filha mais moça (então com um ano e meio) e a criança
que estava esperando. A voz era muito firme, e a mulher, com relutância, escolheu a
criança que estava para nascer. O desfecho do sonho ocorreu três semanas depois,
quando a menina caiu de uma varanda, machucou a cabeça e morreu.
“Quando relata esse episódio”, explicou a Sra. Solem, “ela acredita que o mesmo a
ajudou naquele transe difícil.”
A advertência concorreu para que ela conservasse o seu juízo perfeito, evitando que
o sofrimento a arrasasse.
Naturalmente, o cético irá auferir que talvez — se se acreditar que a experiência
tenha sido realmente psíquica — a própria mente da mulher gerou a predição. Seria uma
presunção razoável, mas nem todos os casos da Sra. Solem são tão facilmente
explicados.
Em outro relato, uma mulher do Estado de Connecticut contou que seu falecido
sogro lhe apareceu durante o sono, no dia seguinte ao do seu

97
enterro. Seu intuito era lhe informar acerca de uma caderneta de banco secreta
escondida em seu quarto, correspondente a um saldo de 2.800 dólares. O seu próprio
marido ridicularizou a idéia, até que, depois de uma busca, a caderneta foi encontrada, e
o saldo existente no banco era mesmo o mencionado no sonho.
Outro desses casos bastante complexos foi relatado por uma dona-de-casa, à qual a
Sra. Solem só se refere por seu primeiro nome, Gwen.
“Até a morte de minha mãe, em 1959, não me lembro de ter sonhado com pessoas
mortas”, ela contou. “Fiquei, porém, extremamente chocada com a morte de minha
mãe, aos 49 anos de idade apenas. Muitas vezes, depois disso, ela apareceu em meus
sonhos, principalmente quando eu estava preocupada ou aborrecida com alguma
coisa.”
Gwen não tardou a descobrir que podia pedir conselhos a sua mãe, e que a figura que
aparecia nos sonhos respondia prontamente.
Uma noite, por exemplo, ela sonhou com uma sala cheia de caixões de defunto e,
intuitivamente, compreendeu que seu pai ia morrer. Assustou-se, mas sua mãe apareceu
e a consolou, prometendo ajudar o seu ex-marido no transe da morte. O desfecho do
drama ocorreu alguns dias depois, quando um seu irmão telefonou do Estado da
Virgínia, para comunicar-lhe que seu pai fora hospitalizado. Estava passando mal do
coração, e os médico queriam fazer uma operação de ponte de safena. Gwen sabia que a
operação seria infrutífera, mas queria que o pai tivesse todas as oportunidades possíveis.
Não foi surpresa para ela saber, quatro dias depois, que ele havia morrido... mas não
ficou sabendo da morte por intermédio do hospital ou de sua família. De manhã bem
cedo, sua mãe lhe apareceu em sonho e lhe disse que tudo terminara. Gwen levantou-se,
e viu que eram sete horas. Somente mais tarde, telefonaram do hospital, avisando que
seu pai morrera às 7,10 daquele dia.
Quando foi se deitar depois do enterro, alguns dias mais tarde, Gwen imaginou se
veria o pai em sonho e conversaria com ele. Sua mãe lhe apareceu de novo, e explicou
que o pai só poderia aparecer mais tarde, quando tivesse se ajustado à sua nova
existência espiritual. O contacto através do sonho só se deu quatro meses depois.
É opinião da Sra. Solem que algo mais que um simples sonho está se manifestando
em tais casos. “Algumas autoridades”, ela argumenta, “acreditam que a atividade do
sonho é apenas um modo de restaurar o equilíbrio emocional, livrando-nos da tensão
do dia. Quando, porém, vem, através do sonho, uma informação clara, direta e até
então desconhecida, tem de ser mais do que isso... É possível que tais sonhos venham
com a ajuda de algo superior dentro de nós mesmos, mas, quando os mortos apa-

98
recem em nossos sonhos, parece lógico concluir que está se manifestando um ativo
relacionamento mútuo.”
Trata-se, sem dúvida, de uma séria dificuldade. Será jamais possível determinar onde
termina a atividade da mente de um e começa a de uma inteligência externa? Este é o
problema que os pesquisadores enfrentam, quando tentam avaliar as experiências
subjetivas humanas, sempre tão complexas e sutis.

Outras Formas de Contato Post-Mortem

Alguns pesquisadores começaram a estudar a literatura das visões no leito de morte,


para ajudar a resolver a questão. Tais casos representam uma importante adição à
literatura das provas da sobrevivência, mas não podem ser discutidos aqui senão
resumidamente.
Pacientes na iminência da morte muitas vezes têm visto aparições de mortos que vêm
saudá-los e conduzi-los para o outro lado. Os primeiros pesquisadores psíquicos
recolheram mesmo alguns casos em que o moribundo via um amigo que ele não sabia
que havia falecido recentemente. Esses casos, porém, são muito raros. A verdadeira
revelação surgiu nas décadas de 1960 e 1970, quando o Dr. Karlis Osis e a Sociedade
Americana de Pesquisas Psíquicas conseguiram mostrar que muitos daqueles
moribundos não sofriam de moléstia alguma ou se encontravam submetidos a qualquer
tipo de tratamento suscetível de provocar o surgimento de alucinações. Posteriormente,
o Dr. Osis e seu colega Dr. Erlendur Haraldson, da Universidade de Reykjavik, na
Islândia, puderam mostrar que as visões no leito de morte constituem um fenômeno
cultural. O ponto significativo é que, mais uma vez, a investigação psicológica mostrou
que o contato subjetivo com os mortos (através de visões, sonhos ou presenças
percebidas) simplesmente não pode ser explicado por qualquer mecanismo normal
conhecido.
O Dr. Osis admitia mesmo que tais casos não podem servir como prova incontestável
da vida após a morte, no entanto. Sua emergência poderia resultar de alguns fatores
psicológicos indefinidos. Assim, ele tratou de se voltar ao estudo das aparições em
geral, na esperança de encontrar alguma prova da sobrevivência. O caso a que ele se
refere com mais orgulho foi um bastante complexo, que comunicou à 26ª Convenção
Anual da Associação Parapsicológica, na Universidade Fairleigh Dickinson, em 1983.

99
O Dr. Osis começou a sua apresentação aventando a possibilidade de nem todas as
aparições representarem a manifestação de um mesmo cesso psíquico. “Salientei em
outra ocasião”, lembrou à audiência, “as experiências de aparições se tornam muito
mais explicáveis quando admitimos interpretações especiais de cada uma das diferentes
espécies de tais aparições, em vez de juntá-las todas, como se fossem da mesma
natureza fundamental”. E acrescentou: “O caso presente é de um tipo de experiência de
aparição em que o aparecido parece ter uma intenção própria”. Foram palavras
corajosas, acerca de um fenômeno atualmente de moda entre os parapsicólogos que
exploram a controvérsia da sobrevivência.
Uma vez que as pessoas de que tratava a comunicação insistiram em ser mantidas em
absoluto anonimato, o Dr. Osis teve de disfarçar as suas identidades. O caso girou em
torno da morte de um homem de negócios casado, de idade mediana, chamado Leslie,
pai de quatro filhos. A outra dramatis persona, no caso, foi um filho do morto, Rusty,
que também morrera, ainda criança, dezoito meses antes. A morte de Leslie ocorreu em
1982, quando caiu, no sul dos Estados Unidos, o avião particular que ele estava
pilotando. Ainda é desconhecida a causa do acidente, do qual a família tomou
conhecimento no dia seguinte. Além do seu próprio pesar, a maior preocupação dos
membros da família foi com a idosa mãe de Leslie, Marge, que se encontrava ela
própria às voltas com problemas de saúde. Receava-se que a notícia da morte do filho
lhe causasse um choque que não poderia suportar. Uma amiga da família participava
daquela preocupação. Sendo muito devota, pediu à própria mãe — que tinha a mesma
idade da mãe de Leslie — que rezasse pela alma que partira. Aquela mulher sabia que a
mãe de Leslie era materialista, não acreditando em coisa alguma psíquica ou espiritual.
Assim, rezou diretamente pelo morto e pediu-lhe que aparecesse à sua mãe, como sinal
de sua existência continuada. Também pediu, em suas preces, que, como um sinal
pessoal para ela própria, Leslie aparecesse de mãos dadas com o filho recentemente
morto. A mulher não falou com pessoa alguma, a não ser o marido, a respeito de suas
rezas, e repetiu o pedido por três vezes, nos dois dias seguintes.
Marge se encontrava em seu quarto, dez horas depois das preces terem sido
concluídas, quando despertou de súbito, vendo dois vultos juntos de sua cama.
“Era Leslie com o menino”, disse ela mais tarde ao Dr. Osis. “E Leslie estava
segurando a mão do menino. Estavam nos pés de minha cama, olhavam um para o
outro. Eu estava então bem acordada. Eles estavam con-

100
tentes; estavam felizes por terem encontrado um ao outro, por estarem juntos agora. E
queriam que eu soubesse disso. Senti isso”. Ela explicou ainda ao Dr. Osis:

Eles eram sólidos. Havia uma espécie de névoa em torno deles, como se fosse uma
nuvem cinzenta. Mas eram sólidos, ambos. O quarto estava escuro; a luz elétrica vinha
de fora, através da veneziana... mas não iluminava suficientemente para vê-los. Há
muito movimento na rua onde moro. A qualquer hora que seja, estão passando
caminhões e ônibus. Naquele momento não havia barulho, tudo estava excluído, como
se o mundo tivesse parado. E não havia mais ninguém no mundo, a não ser nós três...
Senti como se eles estivessem penetrando em mim, trazendo a vida para dentro de
mim. Ele estava me devolvendo a vida. E essa foi a sensação mais duradoura; jamais,
jamais a esquecerei. Jamais aconteceu antes e jamais tornará a acontecer. Creio que
ambos vieram aqui para me trazer a paz de espírito. Realmente me ajudaram muito,
isso aconteceu realmente. Não venci o pesar, mas aquilo me tornou capaz de atravessar
os momentos difíceis sem morrer, porque estava muito desanimada. Tentei pretidê-los
por mais tempo, mas eles foram-se embora... Foram ficando menores e desapareceram.

Não foi, porém, apenas Marge que recebeu naquela noite uma visita fantasmagórica.
Uma sobrinha de Leslie, de seis anos apenas, que morava a 160 Km de distância, soube
da morte do tio e viu a sua aparição três horas antes da visita a Marge. Mais tarde, ela
contou ao Dr. Osis: “Eu estava acordada e de pé, quando vi uma nuvem em meu quarto
e Leslie e Rusty de mãos dadas. Estavam muito parecidos...” É interessante observar
que a mulher que havia rezado para Leslie nada sabia a respeito da menina, e sequer
sabia que ele tinha sobrinhas.
Na opinião do Dr. Osis a hipótese de telepatia tinha de ser posta de lado no caso, uma
vez que Marge não poderia reagir a uma mensagem telepática várias horas depois que
ela fora emitida. Também seria estranho que a sobrinha tivesse reagido a tal mensagem,
uma vez que não conhecia a mulher que rezou. E nem pode se admitir que ela tenha
interceptado a mensagem dirigida à velha, uma vez que recebeu a mensagem três horas
antes dela. As duas nem eram sequer muito íntimas.
A apresentação desse caso à Associação Parapsicológica terminou com uma
conclusão e uma advertência. “Um único caso não pode decidir a questão da
sobrevivência”, decidiu o Dr. Osis. “Diferentes estudiosos interpretarão os dados de
maneira diferente, cada um de acordo com seu

101
próprio sistema de crença. As características manifestas desse caso certamente não dão
a idéia de que as aparições são imagens estáticas, destituídas de consciência. Parecem
estar indicando algo muito mais poderoso e intencional.”
Assim, quando a parapsicologia entra em seu segundo século de atividade, os
pesquisadores que estudam a questão da sobrevivência parecem ter voltado ao ponto de
partida. Do estudo dos encontros na vida real com o desconhecido, eles pesquisaram
através das esferas da mediunide no transe, das experiências fora do corpo, das visões
no leito de morte e das situações perto-da-morte, a fim de demonstrarem a imortalidade
do homem. Parece, agora, que os parapsicólogos se encontram, mais uma vez,
focalizando as experiências de aparições, como a mais promissora fonte de estudos.

102
5
Vozes de Espíritos Gravadas: Ilusão ou Solução?
Desde que a parapsicologia se tornou uma ciência, os estudiosos do assunto vêm
especulando se não se poderia estabelecer um canal instrumental ou eletrônico de
comunicações entre os vivos e os mortos. Tanto Thomas Edison como Guglielmo
Marconi afirmavam que poderia ser construída uma máquina ligando perfeitamente o
mundo material e o psíquico. Chegaram mesmo a traçarem esboços de projetos nesse
sentido. Um telefone psíquico chegou a ser construído na década de 1920, mas não foi
bem recebido pelos pesquisadores psíquicos. Do mesmo modo que aconteceu com o seu
inventor, a invenção não tardou a ser esquecida. Na década de 1940, um excêntrico
holandês lançou, na Inglaterra, o projeto de um rádio espírita, que também não passou
de projeto.
Embora, depois de 1920, ninguém tenha mais pensado em um telefone psíquico, não
faltaram exemplos de vozes dos mortos se terem feito ouvir espontaneamente em rádios,
alto-falantes de gravações e, mais recentemente, em gravações eletromagnéticas. E esse
último fenômeno — o de poderem as vozes dos mortos serem apanhadas e gravadas —
tem constituído um dos tópicos mais controvertidos da parapsicologia contemporânea. É
uma discussão que continua muito acalorada.
Esse fenômeno chamou pela primeira vez a atenção do mundo em 1959, quando
Freidrich Jurgenson, ex-cantor de ópera e cinematografista, de 60 anos, anunciou que
conseguira gravar a voz de sua mãe já falecida, e afirmava, mais, que qualquer pessoa,
utilizando os processos adequados, poderia gravar a voz dos mortos em seus próprios
gravadores. É questão controvertida saber como Jurgenson fez a sua descoberta, uma
vez que ele próprio apresentou duas versões para o caso. Na década de 1960, Jurgenson
disse que descobrira casualmente o fenômeno da gravação da voz, quan-

103
do estava gravando cantos de pássaros em seu quintal. Ao ensaiar a gravação, afirmou,
descobrira a voz de sua mãe, gravada entre os cantos pássaros. Naturalmente, Jurgenson
ficou surpreso com o incidente, e procurou repeti-lo sistematicamente, gravando cantos
de pássaros ou simplesmente deixando o gravador ligado quando conversava
normalmente com os amigos e parentes vivos. Muitas vezes, disse ele, encontrou outras
vozes nas gravações, quando as experimentava. Às vezes, tais vozes chamavam as
pessoas presentes no local, e ocasionalmente, mesmo, faziam comentários sobre a
conversa anterior!
Em 1973, contudo, em uma entrevista à revista espírita de Londres Psychic News,
Jurgenson apresentou o que era, presumivelmente, uma versão mais completa de sua
descoberta.
“Acho muitíssimo difícil descrever exatamente como levei a cabo aquelas
experiências”, disse ele aos repórteres. “Sem que houvesse motivo algum, de repente me
veio um desejo irresistível de estabelecer contato eletrônico com algo ou alguém
desconhecido. Era uma sensação estranha quase como se eu tivesse aberto um canal
para algo que ainda se achava oculto e queria ser revelado. Lembro-me que, ao mesmo
tempo, me sentia cético, divertido e curioso.”
Esse intuitivo desejo irresistível ocorreu no outono de 1958, mas foi somente em
julho de 1959 que a idéia prosperou. Como disse Jurgenson a Psychic News:

Depois de uma enervante experiência durante a gravação do canto do tentilhão


sueco, quando desconfiei que o meu gravador se estragara durante a viagem da cidade
para o campo, compreendi que a confusão na gravação não podia ser explicada como
coincidência. Algumas semanas depois, fui a uma pequena floresta e tentei outra
experiência. Naturalmente, não fazia idéia do que estava procurando. Pus o microfone
na janela. A gravação que fiz correu sem incidentes. Quando foi tocada, ouvi a
princípio alguns pássaros chilreando à distância, depois se fez silêncio. De repente,
vinda não sei de onde, ouvi uma voz, uma voz de mulher, falando em alemão: “Friedel,
querido Friedel, está podendo me ouvir?”
Era como se a locutora estivesse fazendo um esforço tremendo para falar, e a voz
parecia ansiosa. Mas não tive a menor dúvida de que fora a voz de minha mãe que me
chamara. Minha mãe morrera quatro anos antes, na Suécia. Foi assim que tudo
começou.

As afirmações de Jurgenson, por mais estranhas que fossem, causa-

104
ram pouco impacto sobre a parapsicologia internacional. Embora a sua descoberta
levasse jornais a noticiá-la com alarde, praticamente nenhum estudioso credenciado da
parapsicologia a levou a sério. Uma vez que a maioria dos parapsicólogos na década de
1960 estava muito mais interessada em experiências mecânicas do que em estudar o
contacto psíquico com os mortos, a comunidade psíquica ignorou as revelações de
Jurgenson. Apenas um parapsicólogo se dignou de se entender com Jurgenson
pessoalmente. W.G. Roll, diretor de projetos da Federação de Pesquisas Psíquicas, com
sede em Durham, Estado da Carolina do Norte, visitou, durante uma semana, Jurgenson,
em sua casa nos arredores de Estocolmo, em 1964. Jurgenson se prontificou a oferecer
ao visitante uma série de demonstrações, e Roll escreveu um relatório, Vozes Espíritas
de Freidrich Jurgenson em nome da Fundação. Ao se julgar pelo relatório, os testes de
Roll foram moderadamente bem-sucedidos.
Para cada sessão, Jurgenson tomou uma fita virgem, colocou-a no aparelho e o
deixou funcionando com o microfone ligado, enquanto todas as pessoas que se
encontravam na sala travavam uma conversa despreocupada. O gravador foi detido com
intervalos freqüentes e posto de novo em funcionamento.
“Em quatro ocasiões, houve alguns leves sons indistintos, que poderiam, contudo,
facilmente ter sido produzidos pelos presentes”, escreveu Roll. Depois

...uma voz de homem pareceu dizer a palavra sueca beratta (dizer ou relatar),
durante uma pausa da conversa. Nenhum de nós se lembrava de ter dito ou ouvido
aquela palavra durante a conversa. Foi muito distinta.
Quando realizamos quatro testes adicionais... F.J. disse, com sua voz normal na
gravação: “Podemos esperar um pouco”. Foram ouvidas três pancadas, seguidas pela
palavra warten (esperar, em alemão), que foi ouvida muito claramente... finalmente
ouviram-se claramente seis pancadas, divididas em três pares, e parecia que foi dito: ta
de retta kontakt (faça contato certo, em sueco), mas as palavras não foram claras...

Depois de ter descoberto a manifestação da voz gravada, Jurgenson anunciou ter


inventado vários outros métodos para tal gravação O pesquisador sueco presentemente
grava fitas diretamente do rádio. Liga o equipamento de gravação em um rádio
previamente sintonizado em determinada freqüência, sem estação, grava durante alguns
minutos e depois verifica o resultado. Algumas vezes, afirma Jurgenson, são ouvidas
vozes muito

105
claras falando no meio do barulho de fundo. Outras vezes, diz Jurgenson, vozes
humanas falando em uma freqüência comercial quando gravadas são habilmente
distorcidas e recompostas pelas vozes-espíritos, de maneira a transmitirem novas
palavras e mensagens. As vpzes, presumivelmente,: falam na ocasião com uma mistura
de idiomas.

A História das Pesquisas da Voz Gravada

Na realidade, contudo, Jurgenson de modo algum descobriu o fenômeno da voz


gravada. Enquanto realizava as suas experiências na Suécia, investigações semelhantes
se processavam, havia dois anos, nos Estados Unidos, e iam ser anunciadas pelo
parapsicólogo Eaymond Bayless e o espírita Attila von Szalay, que, acidentalmente,
descobriram um fenômeno de voz gravada em 1956. Os dois levaram a cabo as
pesquisas, conjuntamente, até a década de 1960, e reiniciaram o trabalho na década de
1970, quando me juntei a eles. Art (como chamamos von Szalay) está atualmente com
setenta e poucos anos e acha-se, de certo modo, afastado das investigações, mas o
trabalho de Bayless e von Szalay constitui indutbitavelmente o mais importante capítulo
na história das pesquisas da voz gravada.
Bayless teve pela primeira vez a idéia do esforço conjunto quando Art, que
conhecera por intermédio de amigos comuns, contou que, às vezes, ouvia vozes
independentes (vozes produzidas pelo ar rarefeito) lhe falando, quando se encontrava
sozinho. Notou pela primeira vez essas vozes em 1938, quando ouviu a voz de um filho
falecido chamando o seu nome — contou a Bayless. Em 1941, ele tentou gravar a voz
em um velho gravador de 78 r.p.m., mas sem sucesso. Raymond Bayless ficou tão
impressionado pela revelação de Art, que resolveu levar adiante aquela linha de
investigação, esperando conseguir afinal gravar aquelas vozes psíquicas. sabia, então,
que iria acidentalmente ajudar a descobrir o efeito voz-gravada.
Raymond iniciou o seu primeiro projeto, com a duração de três anos, arrendando um
estúdio em Hollywood (que ainda existe até hoje, acima da famosa esquina da Livraria
Pickwick, no cruzamento do Hollywood Boulevard com McCalden Place), onde
construiu um pequeno recinto de madeira ou gabinete, não muito diferente de um
armário de roupa. Den-

106
tro, colocou, na boca de um megafone, um microfone ligado per um fio a um alto-
falante e um gravador, fora do recinto. Desse modo, os pesquisadores podiam ouvir
quaisquer ruídos ou vozes produzidos dentro do gabinete, quando se achavam sentados
em qualquer lugar do estúdio. Todas as experiências, naturalmente, foram gravadas.
Nos primeiros testes, Art sentou-se dentro do gabinete, e, em alguns momentos,
Raymond podia ouvir vozes sussurradas vindas do alto-falante. A fim de certificar-se de
que não era o próprio Art que estava produzindo as vozes, Raymond realizou vários
testes adicionais. Art ficou sentado do lado de fora do gabinete. Não havia dúvida de
que as vozes sussurradas vinham através do alto-falante mesmo quando o recinto de
madeira se encontrava inteiramente vazio! Von Szalay e Bayless utilizaram esse
processo para gravar várias fitas com as vozes. Somente algumas semanas depois,
todavia, descobriram que, algumas vezes, apareciam nas fitas vozes que não tinham
sido ouvidas no alto-falante. Essa importantíssima descoberta foi feita em 5 de
dezembro de 1956. Assim informou Raymond em relato sobre as vozes de von Szalay,
publicado na revista da Sociedade Americana de Pesquisas Psíquicas:

Para essa experiência particular, Mr. von Szalay ficou sentado sozinho no gabinete,
durante quinze minutos. Acreditando que nada acontecia, ele saiu do gabinete.
Rodamos, então, a fita, sem esperamos ouvir coisa alguma, mas ficamos surpresos,
ouvindo uma voz dizer distintamente: “Este é G.” Quando eu me encontrava sentado
do lado de fora, ouvindo través do alto-falante, não ouvira absolutamente nada.
Resolvi, então, fazer certos testes com o sistema de amplificação e nós ambos
ficamos parados a alguns centímetros de distância da porta do gabinete, que estava
fechada, podendo cada um ver perfeitamente o outro, e Mr. von Szalay dava pequenos
assovios, com curtos intervalos. Houve pelo menos seis ou sete assovios em resposta e,
no fim da seqüência, responderam assovios duplos. Estávamos a menos de 90 cm de
distância de cada um e podíamos nos observar reciprocamente de maneira perfeita. A
sala estava normalmente iluminada, e a fraude, em tais condições, era de todo
impossível.

A experiência de 5 de dezembro demonstrou, de maneira conclusiva, que von Szalay


era capaz, não somente de produzir vozes desencarnadas, mas, de algum modo, fazê-las
aparecer diretamente também na gravação. Assim sendo, Raymond decidiu levar a cabo
uma experiência mais rigoro-

107
sa, para provar a existência das vozes de von Szalay. Para o teste pioneiro, arranjou uma
caixa de papelão vertical, na qual colocou o microfone e o alto-falante que, por sua vez,
estava ligado por um fio ao aparelho gravador, colocado a vários pés de distância. Os
pesquisadores, depois, sentaram-se a uma jarda (uma jarda equivale a 914 mm) de
distância da caixa, ligaram o gravador, e o desligavam e tornavam a ligar de vez em
quando. Foram ouvidas na gravação três vozes diferentes, mas tão confusas, que não
puderam ser decifradas. (Encontrei muitas vezes esse tipo de recepção com von Szalay.
As vozes psíquicas eram quase tão altas como a nossa própria voz, mas tão confusas,
que não podiam ser entendidas. Qualquer pessoa familiarizada com um sistema de
gravação de má qualidade reconhecerá a semelhança.)
Raymond passou a uma experiência ainda mais rigorosa. Cobriu a caixa que continha
o microfone com um pesado sobretudo de pele de carne e tudo foi colocado em uma
outra caixa bem grande. As caixas foram penduradas no teto do gabinete, enquanto
Szalay e Raymond se sentavam lado de fora. Um fio ligava o microfone ao aparelho
gravador, também colocado fora do gabinete. Os resultados foram igualmente
satisfatórios e os dois pesquisadores conseguiram gravar vozes humanas.
Mais tarde, naquela mesma noite, depois de Raymond ter se retirado, Art decidiu
continuar ele próprio as experiências, sentando-se no gabinete com o aparelho de
gravação funcionando, e interrompendo-o de vez em quando. Como não ouvira
qualquer voz independente enquanto se acha no gabinete, naturalmente pensou que a
experiência fracassara de todo, mas, quando tocou a fita, ouviu uma voz de mulher
dizendo bem alto “Cachorro-quente, Art!” A voz foi mesmo acompanhada por uma
sonora gargalhada. Von Szalay compreendeu que, embora a voz tivesse sido gravada,
não fora captada por seus ouvidos. Aquela voz também tinha para ele uma significação
especial. Anos antes, durante a depressão, ele havia namorado uma moça, em Nova
York, e os tempos estavam tão difíceis que, sem dinheiro para irem a um restaurante,
eles costumavam, na hora do jantar, comer um cachorro-quente, que custava apenas
alguns níqueis. Freqüentemente, brincavam acerca de tais jantares e diziam um ao outro
que sempre se lembrariam deles. Nunca mais Art tivera notícia de sua antiga namorada,
que presumivelmente estava morta.
Embora tivessem anunciado ao público o resultado de seus trabalhos em 1959,
Bayless e von Szalay, do mesmo modo que Jurgenson, não conseguiram despertar o
interesse dos círculos parapsicológicos. Nenhum deles recebeu sequer uma carta
pedindo informações, depois que o relato de suas experiências foi publicado pela revista
da Sociedade Americana de Pesquisas Psíquicas.

108
O Trabalho de Konstantine Raudive

Hoje, todavia, o quadro mudou-se um pouco. Em 1970, um cientista letão residente


na Alemanha, Dr. Konstantine Raudive, causou sensação nos círculos parapsicológicos
de língua inglesa, com o livro Breakthrough (Rutura), que fora anteriormente publicado
na Alemanha. Raudive trabalhara pessoalmente com Jurgenson e afirmava ter
conseguido ele próprio obter aquelas vozes misteriosas em gravações... e estava
disposto a demonstrar o fato para quem quisesse. Anunciou ainda várias outras coisas
acerca de seus próprios efeitos de voz gravada, muitos dos quais quase coincidiam com
algumas das descobertas de Jurgenson. Dizia, por exemplo, que as vozes muitas vezes
falavam com uma poliglota mistura de idiomas; que respondiam a perguntas diretas, se
eram interrogadas durante as sessões de gravação, e que qualquer pessoa — espírita ou
não — podia gravar tais vozes, se se esforçasse paciente e diligentemente. No entanto,
Raudive condenava a técnica de microfone aberto, tantas vezes empregada por
Jurgenson (embora a tivesse usado em uma ocasião) e preferia fazer as gravações
diretamente de um aparelho de rádio sintonizado para uma freqüência sem estação.
Quer dizer: mais uma vez, a sua técnica de gravação foi copiada de Jurgenson. Esse
método, contudo, apresentou alguns problemas. Como as vozes eram habitualmente
fracas, os céticos deduziram que Raudive estava meramente captando fragmentos de
programas radiofônicos comerciais. E não foi muito alvissareiro o fato de,
acidentalmente, ter ele captado uma transmissão da Rádio de Luxemburgo!
Tal hipótese, embora repetida muitas vezes por seus críticos, não explica, realmente,
a ampla escala dos efeitos de vozes gravadas de Raudive. É verdade que, se às vezes ele
gravava irradiações erroneamente consideradas como vozes gravadas, em muitas
ocasiões as suas vozes mereciam bem esse nome. Até mesmo muitos de seus críticos
tiveram de admitir tal coisa. Assim, por exemplo, o Trinity College, de Cambridge,
Inglaterra, concedeu, em 1970, uma bolsa de estudos para pesquisas psíquicas a um
jovem químico, David Ellis, a fim de investigar as vozes de Raudive. Embora Ellis
jamais chegasse a uma conclusão acerca da paranormal idade do fenômeno da voz
gravada, admitiu, escrevendo no número de fevereiro de 1974 da revista Psychic:

Quando o Dr. Raudive estava presente, as vozes às vezes se referiam diretamente


aos outros participantes, mas outras vezes se dirigiam sobre-

109
tudo ao Dr. Raudive (apelidado “Kosti”). Há alguns comentários interessantes quando
ele está ausente. A gravação pode começar com “Precisamos de Kosti” ou
“Precisamos de Kosti aqui”, ou uma voz pode explicar: “Escondemos Kosti”.

Konstantine
Raudive, o
psicólogo letão
que colaborou na
criação de um
aparelho
destinado a
provar que os
mortos se
comunicam com
os vivos por meio
de vozes gravadas
(Biblioteca Mary
Evans)

110
Antes de sua morte, que ocorreu recentemente, Raudive concordou em ser
cientificamente examinado em muitas ocasiões, e participou de algumas demonstrações
experimentais em toda a Europa. Quando a empresa editora britânica Colin Smythe Ltd.
estava pensando em lançar uma edição inglesa de seu livro, Raudive viajou para a Grã-
Bretanha, a fim de mostrar a seus editores em perspectiva como realizava as suas
experiências. Os resultados dessa viagem foram, no mínimo, interessantes, e uma
experiência sob controle foi realizada, em 13 de dezembro de 1969, por Colin Smythe e
Peter Bander, em um estúdio de gravação de Londres. A idéia que um engenheiro de
som, bem a par da arte e dos problemas das delicadas técnicas de gravação,
supervisionasse a experiência. Foi escolhido David Stanley, profissional de grande
competência, e as experiências se realizaram em seu estúdio. A princípio, Raudive
pareceu ter dificuldades em captar as vozes naquele ambiente estranho, e várias sessões
de gravação redundaram em completo fracasso. Não foi, porém, o fim de tudo. Peter
Bander disse o seguinte, em seu prefácio ao livro Breakthrough:

Durante a meia hora seguinte, alguns de meus convidados conversaram com o Dr.
Raudive sobre questões técnicas, e um deles disse que a única prova que então estava
disposto a aceitar teria de ser, de algum modo, bem clara: se, por exemplo, uma voz
dissesse o nome de uma pessoa presente. Como era altamente improvável que tal nome
estivesse flutuando no ar transmitido por alguma estação de rádio, isso provaria que a
voz estava procurando um contato deliberado.
Entrementes, Mr. Stanley desligou as quatro polegadas adicionais de fio do diodo e
ligou o diodo original ao eixo de entrada do rádio, pondo o gravador em movimento.
Creio que a fita estava rodando apenas há dois minutos (àquela altura tínhamos usado
a quarta fita, porque usávamos uma nova de cada vez que púnhamos o aparelho para
funcionar), quando o Dr. Raudive pediu a Stanley para tocar a gravação de novo. Com
cerca de vinte pessoas conversando e desejando umas às outras feliz Natal, foi
surpreendente ver quatro delas correndo de repente até o aparelho de som. Ali,
claramente e sem sombra de dúvida, uma voz ritmada, com duas vezes a rapidez da voz
humana, disse: “Raudive lá”. Mr. Stanley foi talvez o mais surpreso de todos, pois,
como explicou, não podia haver qualquer voz na gravação. Lá estava a voz, contudo, e
dizendo o nome da pessoa mais interessada em tudo.

Uma coisa que se tem de deduzir é que a capacidade de conseguir

111
efeitos de vozes-gravadas em fita eletromagnética é contagiosa. Depois que publicaram
Breakthrough, tanto Bander como Smythe vêm fazendo eles próprios tais gravações.

As Pesquisas Sobre a Voz-Gravada Presentemente

As primeiras experiências de Raudive, Jurgenson e von Szalay fazem hoje parte da


história do psiquismo. No entanto, muitas pessoas ainda alimentam idéias errôneas
acerca do fenômeno. Assim, por exemplo, tais vozes não são, como dizem alguns
críticos, meramente articulações fugazes e fortuitas. Às vezes, apresentam mensagens
longas e claras, em resposta a determinadas perguntas. As vozes de Von Szalay se
mostram inclinadas a fazer diretamente comentários pertinentes acerca de Art ou dos
que participam de uma sessão em sua companhia. Dois exemplos desse fenômeno,
tirados das gravações de dois pesquisadores diferentes, provam tal fato.
No dia 20 de setembro de 1971, Raymond Bayless e sua esposa faziam uma refeição
ligeira na cozinha de seu apartamento, na zona Oeste de Los Angeles, quando
Raymond, que se achava muito mal-humorado naquele dia, disse à sua mulher,
Marjorie, que gostaria de se separar do resto do mundo. Marjorie replicou, falando ao
marido a respeito de um amigo que realmente se separara do resto da humanidade e se
tornara um recluso (Esta palavra foi realmente usada no decorrer da conversa.) A reação
de Raymond era previsível... disse que tinha inveja do tal homem.
Sem que os Bayless soubessem, Art estava fazendo experiências com seu gravador
em seu próprio apartamento, situado a cerca de 24 km de distância, em Van Nuys, na
Califórnia. No mesmo momento em que Raymond e Marjorie conversavam, Art gravou
uma voz dizendo: “Bayless se tornou virtualmente um recluso”.
Um caso ainda mais surpreendente provocou manchetes nos jornais da Europa! O Dr.
Franz Seidl, engenheiro austríaco, que foi um dos colaboradores originais de Raudive,
ainda se encontra ativamente empenhado nas pesquisas de voz-gravada e consegue ele
próprio gravar vozes psíquicas. Em resultado de seu trabalho com Raudive, contudo,
Seidl, no fim da década de 1960, começou a defender o ponto de vista de que devia
haver um meio mais eficiente de buscar as vozes nas gravações do que as técnicas de
rádio ou microfone aberto, que o seu mentor estava usando.

112
Como é engenheiro mecânico, acabou inventando um pequeno aparelho chamado
psicofone, um receptor de rádio em miniatura acoplado a um alto-falante. (Quaisquer
vozes captadas pelo instrumento serão assim automaticamente amplificadas, e
simultaneamente gravadas.) O trabalho de Seidl foi divulgado com estardalhaço pela
imprensa, quando ele anunciou que as vozes lhe tinham dado informação sobre um
seqüestro que a polícia não conseguia descobrir.
Seidl teve idéia de fazer a estranha experiência no verão de 1970, quando a imprensa
noticiou o desaparecimento de uma moça, durante uma viagem de férias em que ficara
acampada. Seidl resolveu interrogar as vozes sobre o paradeiro da jovem e recebeu esta
resposta no psicofone, durante a sessão de gravação seguinte: “Emmanua in mare cum
dimetiatis Paolo”. Os pais da moça entraram em contato com Seidl e admitiram
publicamente que um dos participantes do acampamento em que sua filha estivera era
um jovem italiano chamado Paolo.
Infelizmente, o caso não teve solução, de maneira que não se ficou sabendo se a
mensagem de Seidl era pertinente. De qualquer maneira, o episódio serviu para mostrar
que vozes gravadas — qualquer que seja a sua natureza — são capazes de responder a
perguntas que lhe são feitas, com explicações ou comentários compreensíveis. Aqueles
incidentes nos ajudarão a aprender alguma coisa sobre a natureza das vozes. Vozes
capazes de dizer os nomes dos pesquisadores ou dar respostas a determinadas perguntas
não podem ser meramente emissões de estações de rádio!
Infelizmente, não se pode negar que, em sua maior parte, as vozes espíritas gravadas
são vagas, caprichosas e às vezes dificilmente decifradas. Esse é, sem dúvida alguma, o
motivo de jamais ter sido esse campo de pesquisa incluído na parapsicologia
convencional. Outro problema que apresenta é que a qualidade dos resultados não
parece depender do equipamento usado. O habitual número reduzido de vozes e a
pequena duração de suas falas são os mesmos, quer se use um aparelho Sony portátil,
quer um aparelho de 5.000 dólares, e também isso tem desanimado os possíveis
pesquisadores.
O fato de ser a maioria das vozes espíritas admitidamente raras e acentuadamente
obscuras tem levado muitos pesquisadores a imaginar se não poderá ocorrer, de uma
hora para outra, uma rutura, um progresso sensacional que torne mais fácil e mais ampla
aquela forma de contato com os mortos. E isso nos leva diretamente àquilo que é, sem
dúvida, a mais recente e sensacional novidade no campo da pesquisa da voz-gravada,
isto é, os comentários acerca de Mr. George Meek e de sua máquina Spiricom.

113
Em fins de 1982, George Meek, um homem de negócios aposentado, residente no
Estado da Carolina do Norte, anunciou que, desde 1971, estava trabalhando em uma
linha de pesquiisas sobre o assunto. Naquele ano, ele abriu em Filadélfia um laboratório
particular, em colaboração com William J.O’Neill, um engenheiro eletrônico amador,
que passou anos construindo uma máquina, graças à qual, segundo dizia, podiam ser
ouvidas vozes dos mortos. O’Neill acabou revelando que entrara em contato com o Dr.
George Mueller, físico norte-americano falecido em 1967 e que lhe transmitiu
informações sobre a sua vida. As comunicações regulares por intermédio daquela
máquina (que não tardou a ser denominada Spiricom) foram conseguidas inicialmente
em outubro de 1977 e têm sido recebidas desde então. Consistem em conversas,
habitualmente iniciadas pelo Mueller, quando a máquina é deixada em funcionamento, e
que se prolongam por tempo considerável. Meek somente anunciou a sua descoberta
quando achou que a sociedade estava madura para isso, e se encontrava em condições
de vender o aparelho para uso doméstico. Seu anúncio publicado com grande destaque
pela maior parte da imprensa psíquica destacando-se as reportagens publicadas pela
Psychic News da Grã-Bretanha e pela New Realities dos Estados Unidos. Muitos
pesquisadores empenhados na investigação da voz espírita consideram o trabalho de
Meek/O’Neill como a rutura há tanto tempo esperada.
Conheço Mr. Meek há alguns anos, embora não intimamente, e os nossos encontros
têm sido infreqüentes e casuais. Mas o conheço bastante para saber que é um homem
honesto e corajoso. No entanto, quando recebi um maço de informações sobre as suas
investigações, não pude deixar de me sentir cético. As fitas com as vozes gravadas que
ele me ofereceu impressionavam mal, e quando falei com ele pelo telefone, ruíram por
terra quaisquer esperanças que eu ainda poderia acalentar com o Spiricom. As vozes
soavam exatamente como as vozes sintéticas que se pode produzir com facilidade no
aparelho adequado, e muitas vezes usavam palavras que estavam bem de acordo com a
maneira de falar peculiar ao próprio William O’Neill. Aquilo me pareceu
tremendamente suspeito. Fiquei mais desconfiado ainda quando George me confessou
que, durante todos os anos em que trabalhara com o engenheiro, jamais ouvira as vozes
no Spiricom. O’Neill sempre as ouvia e as gravava quando se encontrava sozinho.
Naturalmente, agora que todo o caso do Spiricom se tornou público, talvez os
pesquisadores, como é o meu próprio caso, investiguem pessoalmente as alegações de
O’Neill e suas conversas com o falecido Dr. Mueller. Fiquei sabendo, então, que o
contacto com o Dr. Mueller fora perdido

114
(de maneira suspeita?) pouco antes de Mr. Meek tê-lo revelado ao público.
À luz dessas revelações, há motivo para acreditar que o suposto contato de William
O’Neill com a voz do Dr. Mueller não tenha passado de uma fraude, e tem-se de chegar
à conclusão de que aquele indivíduo esta tapeando o seu benfeitor.

O Fenômeno da Voz Gravada Como Prova da Sobrevivência

As vozes que os pesquisadores de boa fé gravaram são realmente de mortos? Eis a


verdadeira questão em jogo. Um número considerável de provas indica que sim. Assim,
por exemplo, muitos investigadores que estudam o fenômeno puderam reconhecer as
vozes produzidas em suas gravações. Jurgenson tem certeza de que a primeira voz que
gravou foi a de sua mãe. Do mesmo modo, Szalay gravou uma voz falando em húngaro,
que tanto ele como Raymond afirmam que se parece com a de seu falecido pai. Quando
Colin Smythe e Bander começaram as suas experiências, Bander identificou o primeiro
sussurro que seu colega conseguiu como a voz de sua mãe. Às vezes, tais vozes chegam
a dizer os seus próprios nomes, como que tentando se identificar.
No entanto, outra, e muito diferente, explicação para as vozes foi oferecida pelo Dr.
Hans Bender, psicólogo alemão que dirige uma divisão de parapsicologia na
Universidade de Freiburg. Bender investigou pessoalmente tanto Jurgenson como
Raudive, e chegou mesmo a fazer regravações de seus trabalhos. Essas gravações não
apenas provaram que Jurgenson e Raudive tinham recebido vozes humanas nas
gravações, como também que eles apanhavam várias vozes no decorrer de uma sessão.
Bender, todavia, não acredita que tais sons articulados sejam realmente produzidos
pelos mortos. Argumenta que as vozes são, na realidade, fenômenos psicoquinéticos
dominados pela mentalidade inconsciente dos próprios pesquisadores. Em outras
palavras, ele acredita que Raudive, Jurgenson e outros têm (ou tinham) o poder de
projetar inconscientemente alguma espécie de energia de sua mente, capaz, por sua vez,
de manipular os impulsos magnéticos produzidos pelo aparelho gravador. Essas
manifestações psíquicas, por sua vez, formam vozes artificiais na fita magnética. Ou
talvez, argumenta Bender, a mente grave diretamente as vozes na fita magnética.

115
Naturalmente, a base do argumento de Bender repousa em uma questão crucial. Os
efeitos gravados são produzidos por vozes parafísicas independentes realmente falando
no microfone, mas inaudíveis para os ouvidos humanos? Ou serão, como Bender sugere,
efeitos psicoquinéticos gravados diretamente na fita magnética ou através do
microfone? Essa questão levou um certo número de pesquisadores a estudar a mecânica
real das vozes gravadas, e surgiu uma variedade de soluções.
Um dos primeiros investigadores que se dedicaram a esse problema foi Raymond
Bayless. Como Art produzira vozes independentes, assim como vozes gravadas,
Raymond concluiu, naturalmente, que as últimas eram apenas uma forma rara das
primeiras. (Devemos nos lembrar de que as vozes de Art podem, às vezes, ser ouvidas
bem nitidamente no alto-falante, embora ele se sentasse a uma boa distância do
microfone.) Para verificar a hipótese, Raymond levou a cabo uma experiência simples.
Realizou série de sessões curtas com von Szalay, durante as quais deixou,
alternadamente, o microfone aberto ou bloqueado com material pesado. Como
esperava, Art não conseguiu produzir as vozes-gravadas quando o microfone se
encontrava obstruído. O fato leva à dedução de que Art não pôde gravar vozes
diretamente na fita magnética, mas que uma voz semelhante à voz humana está
realmente falando ao microfone, quando se produzem as gravações.
As conclusões de Raymond, no entanto, foram contestadas por outros investigadores.
Richard Sheargold, engenheiro e parapsicólogo britânico, está, presentemente, seguindo
alguns dos caminhos abertos por Jurgenson e Raudive. Acredita, ao contrário de
Bayless, que o fenômeno da voz-gravada é de natureza eletrônica e ocorre quando a
interferência produzida no rádio — ou no próprio gravador quando é deixado
funcionando — é reorganizada por meio de algum processo psíquico, para formar sons e
palavras com sentido. Sheargold acha-se empenhado em demonstrar essa hipótese por
meio de uma série de experiências que está acabando de completar. Em primeiro lugar,
sintoniza o rádio para uma freqüência sem estação, liga o gravador, e verifica se não foi
gravada voz alguma. Depois, usa, pelo mesmo processo, uma segunda fita magnética
virgem e faz a gravação ao mesmo tempo que procura entrar mentalmente em contato
com as vozes dos espíritos. Sheargold verificou que várias vozes são gravadas na
segunda fita, durante esse processo, e deduziu que algo da interferência era
sistematicamente redistribuído para formá-las. As suas pesquisas também parecem
confirmar a idéia de Jurgenson de que, às vezes, a palavra humana, quando gravada,
será reorganizada por vozes

116
de espíritos e levadas a apresentarem palavras e mensagens com sentido.
As experiências de Sheargold, no entanto, estão cheias de lacunas. Pôde ser
argumentado que aquelas vozes secundárias são, na realidade, produzidas por alguma
voz independente, através do microfone, durante o processo da regravação. Até agora,
Sheargold não aperfeiçoou a experiência a fim de eliminar tal possibilidade.
William Welch, conhecido autor de scripts de Hollywood, recentemente falecido,
também achava que as vozes-gravadas eram de natureza eletromagnética. Welch, que
iniciou as suas próprias investigações depois de ter trabalhado com von Szalay, baseava
o seu ponto de vista em um fato um tanto estranho ocorrido durante uma de suas
experiências com gravações, em 1973. Quando reproduzindo uma sessão de gravação,
descobriu gravada em uma parte da fita magnética uma voz que não fora gravada.
Assim, o que devemos concluir dessas descobertas freqüentemente contraditórias?
Parece evidente, pelo menos para mim, que as vozes dos espíritos (sejam vozes dos
mortos ou alguma parte arrancada do nosso Id) podem se utilizar de qualquer processo
que lhes seja acessível, quando procuram colocar a sua voz na gravação. Podem não
estar limitadas por uma só estratégia. Algumas vozes podem ser produtos parafísicos, ao
passo que outras podem muito bem ser impressões psicoquinéticas e/ou
eletromagnéticas. Naturalmente, contudo, tal fato não resolve o problema mais
importante: Aquelas vozes são, realmente, de pessoas mortas ou apenas produtos
psíquicos de nossa própria mente?
Ambas as possibilidades são igualmente plausíveis. Não deixa, porém, de ser
interessante o fato de todos os pesquisadores estreitamente relacionados com o estudo
do fenômeno — Raudive, Jurgenson, Welch, Seidl, Bayless e von Szalay —
acreditarem que as vozes emanam do mundo dos nortos. Apenas Sheargold discordou.
Até mesmo o Professor Genhard Frei, teólogo católico e parapsicólogo que, antes de
morrer, estudou, durante muitos anos, os trabalhos de Raudive, foi forçado a admitir que
“tudo que li e ouvi me obriga à suposição de que somente a hipótese de vozes
pertencentes a personalidades transcendentais pode explicar de maneira perfeita esse
fenômeno”.
Talvez, porém, ainda seja muito cedo para se perder muito tempo imaginando quem
ou o que produz tais vozes. A esse respeito, talvez o comentário mais sensato tenha sido
feito pelo Dr. Walter Uphoff, professor universitário aposentado e atualmente
empenhado em pesquisar o problema, no Estado de Wisconsin: “A minha curiosidade
fundamental acerca

117
das vozes é o fato de que elas existem mesmo. Quero saber, em primeiro lugar, como
foram parar ali e como estabilizar o contato”.
As perguntas de Uphoff poderão ser respondidas em breve. Presentemente, estão
sendo feitas pesquisas sobre o assunto nos Estado Unidos, Itália, Alemanha, Áustria e
outros países europeus, por dezenas de investigadores. A rutura está próxima. E,
quando ocorrer, talvez sejam afinal esclarecidas as questões levantadas por Bayless,
Sheargold, Welch, Raudive e outros.
Na verdade, a explicação talvez já tenha surgido. A minha própria ligação, bem
estreita, com tais pesquisas, resumidamente exposta neste capítulo, me leva a acreditar
que essa nova pesquisa sobre o contato eletrônico com os mortos tem muita significação
quando relacionado com um fenômeno afim, um fenômeno tão estranho e inacreditável,
que tive de vencer muitos de meus próprios preconceitos para estudá-lo.

118
6
Telefonemas dos Mortos?
A esposa de Ronald Beard faleceu em março de um ano não esclarecido da década de
1960, e Beard, escritor profissional, viajou por via aérea para Roma, na esperança de se
recuperar o trauma emocional causado por sua morte. Embora, porém, o corpo de sua
esposa estivesse bem enterrado em um cemitério britânico, Beard não ouvira dela a
última palavra (na acepção literal da expressão). O incidente ocorreu em certa manhã,
quando ele estava dormindo a sesta em seu quarto no hotel de Roma. O telefone tocou
inesperadamente, e, pegando o fone, Beard ficou petrificado, ao ouvir a voz de uma
telefonista interurbana, anunciando uma chamada de pessoa para pessoa, por parte de
sua senhora! Momentos depois, uma voz fantasmagórica começou a falar no telefone.
Era, sem sombra de dúvida, a voz de sua esposa, recitando um de seus próprios poemas.
A voz foi se calando aos poucos, até se fazer completo silêncio.
Essa pequena seqüência desempenha um papel chave no romance de Anthony
Burgess, Beard’s Roman Women, escrito em 1976. Burgess, mais conhecido como autor
de A Clockwork Orange (Laranja Mecânica) e Earthly Powers, estrutura o seu romance
em torno do dilema do personagem principal, em face de uma série de telefonemas
fantasmagóricos de sua falecida mulher. O livro é vivo e colorido, mas é um romance.
Ou será mesmo?
Quando ouvi falar pela primeira vez a respeito do livro de Burgess, fiquei intrigado.
Tendo terminado um trabalho de muitos anos sobre a voz de espíritos gravada, eu e
Raymond Bayless estávamos começando a levar mais a sério todas as informações que
havíamos ouvido — sem dar importância — por parte de pessoas que acreditavam
firmemente ter recebido telefonemas de pessoas mortas. É natural, portanto, que o
romance de Bur-

119
gess me levasse a imaginar se as experiências de Ronald Beard seriam totalmente
fictícias, ou se a idéia a respeito delas não teria vindo a Burgess devido a algum fato
realmente acontecido, de que ele tivesse tomado conhecimento, ou talvez, mesmo,
refletisse uma experiência pessoal.
Escrevi a Burgess. Passaram-se várias semanas, antes que, em um breve bilhete
vindo de Mônaco, onde residente, o escritor confirmasse a minha suspeita. Admitiu que
telefonemas psíquicos tinham acontecido com ele, justamente como conta no romance.
Na realidade, o romance é uma espécie de autobiografia disfarçada. Burgess classificou
de terrível chateação a série de telefonemas, revelando o mesmo sentimento
ambivalente de Beard diante dos contatos psíquicos.
A despeito da atitude bastante desdenhosa de Burgess em face dos telefonemas de
sua falecida esposa, a maior parte das pessoas que recebem telefonemas dos mortos
experimentam, segundo relata, reações que vão do temor quase religioso até o choque. É
provavelmente por isso que poucas pessoas têm relatado tais telefonemas aos
parapsicólogos. Fiquei, sim, muito surpreendido ao verificar, quando comecei a coletar
um número cada vez maior de tais relatos, como são os mesmos comuns e
diversificados.

Pesquisando Telefonemas dos Mortos

Ouvi falar pela primeira vez desses telefonemas fantasmas há vári anos, em 1967,
quando comecei a explorar o campo da parapsicologia. Uma conhecida me falou de uma
sua amiga que recebera um enigmático telefonema, afirmando que a voz era exatamente
igual à de seu filho, que morrera em conseqüência de um desastre de motocicleta, cerca
de dois meses antes. A voz apenas dissera seu próprio nome e o de sua mãe, e logo o
telefone ficara mudo.
Na ocasião, para falar a verdade, não levei o caso muito a sério. Pareceu-me
semelhante a inúmeros outros casos que ouvira contar. No entanto, no decorrer dos dez
anos seguintes, fui ouvindo um número cada vez maior de relatos dessa natureza, e me
sentindo totalmente incapaz de explicá-los, ou de rejeitá-los.
Assim, por exemplo, em abril de 1977, meu colega e amigo Raymo Bayless recebeu
um telefonema do Dr. John Medved, conceituado médico

120
de Los Angeles, que antes já entrara em contato com vários parapsicólogos, na
esperança de que algum pudesse ajudá-lo no estranho drama de que participara.
Raymond assegurou ao Dr. Medved que já soubera de muitas pessoas que haviam
recebido telefonemas de mortos, e, talvez tendo ficado mais à vontade diante dessa
franca admissão, o médico nos relatou o seu caso, de maneira bastante pormenorizada.
O episódio ocorrera em julho de 1974, poucos dias depois da morte sua mãe. Ela
sempre fizera questão de ser enterrada na cidade natal família, no Estado de Idaho, e
Medved viajara para lá, a fim de tratar dos funerais. No dia seguinte ao do seu regresso
para casa, recebeu um telefonema da mãe, às seis e meia da manhã.
— Eram exatamente seis e meia — contou Medved — e pensei que era cedo
demais para me estarem importunando.
De qualquer maneira, levantou-se da cama e correu até o telefone, que ficava no
corredor próximo, e junto ao qual sempre havia lápis e papel para fazer anotações.
— Quando eu disse “Alô!” — continuou o médico — a voz no telefone disse
“Johnny!” Era uma vozinha esquisita, e pensei que fosse uma de minhas irmãs. Parecia
desanimada, como se estivesse querendo contar alguma dificuldade.
O Dr. Medved pediu à pessoa para dizer qual era o problema, mas a voz se limitou a
repetir o seu nome, de um modo muito estranho: John-n-n-n-y-y-y”. E, como continuou
a nos relatar:

Eu repeti: “O que é? Do que se trata?” Não sei se a voz disse Johnny de novo, mas
eu já estava ficando muito nervoso. O que a voz me disse em seguida foi; “É você,
Johnny querido?” A essa altura, fiquei sem saber se se tratava de um trote, ou não sei o
que foi, mas falei mais alto: “Quem é?” Repeti a pergunta, e a voz disse: “Sua mãe”.

Depois de concluir o relato do seu estranho caso, o Dr. Medved explicou que a voz
do telefone tinha o timbre exato da voz de sua mãe! Não podia haver dúvida a esse
respeito. O Dr. Medved também nos disse o nome de um hóspede da casa a quem
contara o fato, logo depois do telefonema. Procuramos essa testemunha, que de fato
confirmou que o Dr. Medved lhe havia falado sobre o estranho telefonema, e ainda
parecia estar, então, muito abalado.
Naturalmente, os céticos poderão considerar o telefonema do Dr. Medved como uma
simples fraude. Alguém que o conhecia, e sabia de seu

121
sofrimento, poderia ter passado um trote, imitando a voz da mãe, para brincadeira cruel
e de péssimo gosto. Como, porém, se pode explicar uma voz que fala no telefone, não
somente com o timbre exato da voz da pessoa morta, mas também usando frases ou
transmitindo uma mensagem típica de tal pessoa?
Um caso desse tipo, a respeito do qual pude conversar com a protagonista cerca de
três anos após o incidente, me foi comunicado por uma dona-de-casa do Estado de
Oklahoma, Sra. Mary Meredith, que me vira em um programa de TV, em que fui
entrevistado sobre o assunto. A Sra. Meredith ainda se mostrava nervosa para contar seu
estranho caso a quem quer que fosse, mas acabou me fazendo uma descrição completa
de um incidente ocorrido pouco depois de uma operação a que fora submetida em 1977.
Eis o seu relato:

Fui operada no dia 22 de agosto de 1977. Voltei para casa uma semana depois, e,
naturalmente, havia muita correspondência me esperando. Uma das cartas era de
minha mãe, que mora em Kentucky, contando a morte de minha prima Shirley, que
morava em Louisville, naquele Estado. O telefone tocou quando eu estava na cozinha,
e, quando atendi, disseram do outro lado da linha: “Alô, Mary, é Shirley Jean.”
Perguntei: “Quem?” E a voz repetiu: “É Shirley Jean”. A voz era igualzinha à da minha
prima, que tinha um ligeiro sotaque sulino. Naturalmente, fiquei transtornada. A
princípio achei que fosse mesmo ela, depois vi que não podia ser, e respondi: “Que
espécie de gente é você? É doente? Que espécie de gente é você para passar um trote
destes?” E desliguei.
Fiquei tão nervosa, que fui me deitar de novo. Mas o telefone tornou a tocar, e fui
atender. A mesma voz se fez ouvir, e disse: “Mary, é Shirley Jean. Você está passando
bem?”
Consegui me dominar e perguntei: “Estou. Como é que você sabe que estive
doente?” E ela respondeu: “Eu estava no hospital com você”. Repliquei-lhe que ela não
podia ter estado, e ela insistiu que estivera, sim.
Durante todo o tempo em que conversamos — ambas as vezes — ora eu ouvia a sua
voz muito alta, ora quase desaparecendo. Era realmente enervante. Afinal, minha
prima disse: “Depois eu chamo outra vez, Mary”. Houve um barulho no telefone e tudo
acabou. Ela se calou.
Fiquei pensando no caso depois. Tinha certeza de que ninguém em Oklahoma sabia
que eu tinha uma prima chamada Shirley Jean, ou que alguma de minhas primas mora
em Kentucky. Na verdade, todos os parentes moram em Kentucky. Assim, acho que
aconteceu comigo uma coisa esquisitíssima.

122
A Sra. Meredith não pensou mais no caso, até que me viu sendo entrevistado na TV a
respeito dos trabalhos em que eu e Raymond estávamos empenhados. Foi um alívio
para ela encontrar alguém com quem pudesse conversar, e, assim, ela me procurou.
Quando me encontrei com a Sra. Meredith, alguns meses depois, ela me confirmou que
ela e a prima tinham sido amigas íntimas e que de modo algum poderia ter se enganado
a respeito da voz que lhe falara pelo telefone. Também confirmou que o telefonema
viera — de maneira bem significativa — exatamente na mesma ocasião em que lera a
notícia da morte da prima. Essa impressionante e significativa coincidência não poderia
ter ocorrido por acaso. Indicava uma intenção determinada por parte de quem chamou.
Outro caso sensacional me foi contado por uma famosa atriz de Hollywood, que me
falou confidencialmente e me pediu para não revelar a sua identidade. O incidente
ocorreu quando Miss Adams (como a chamarei aqui) tinha 8 anos e morava no Texas.
No Dia de Ações de Graças ela foi, com sua família, passar o feriado em casa de uma
família amiga. O ambiente, porém, não era muito festivo, porque, dois anos antes, uma
filha do casal, que estava cursando a Universidade, morrera vítima de um acidente de
carro. A moça costumava passar em casa o Dia de Ações de Graças, e era natural que
seus pais e irmãos se sentissem um tanto tristes naquele dia. Tudo, no entanto, corria
bem, quando o telefone tocou. Miss Adams atendeu, e como nos contou:

Ouvi uma telefonista de interurbano dizer: “Um telefonema a pagar”. Em seguida,


disse o nome da amiga de minha mãe e depois o nome de sua filha. (Em outras
palavras: o telefonema era dirigido à amiga, e a telefonista disse a Miss Adams que
quem estava telefonando era a filha morta.) Fiquei um tanto aturdida, apesar de muito
criança, mas disse: “Um minutinho” e fui chamar a amiga de minha mãe. Fiquei junto
dela, porque ouvira o nome, e achei que podia ser alguém dando um trote. Ela ouviu o
telefone, empalideceu terrivelmente e desmaiou.
Mais tarde, ela contou o que acontecera. Houve muita confusão, mas fiquei sabendo
que ela ouvira a voz da filha, que estava morta havia dois ou três anos. A moça disse a
mesma coisa que dizia sempre, antes de ir passar o feriado com a família: “Mamãe, sou
eu. Preciso de vinte dólares para ir aí”.
A mãe sempre mandava os vinte dólares. Ela afirmou ter reconhecido a voz.
Telefonaram para a companhia telefônica, mas essa informou que não houvera
nenhuma chamada interurbana.

123
O fato da suposta ligação interurbana não ter sido cobrada constitui um aspecto
perturbador no caso. Mostra que tais chamadas não são chamadas normais, no sentido
literal da palavra. Todas as ligações normais entre duas partes são feitas pela companhia
telefônica. Ao contrário, parece que as chamadas de pessoas mortas são feitas pela
manipulação do telefone em que é recebida a chamada.
Esse fenômeno é ilustrado de maneira mais clara pelo caso que foi relatado por um
senhor de Ohio, que testemunhara um daqueles telefonemas fantasmas quando era
criança e morava em uma fazendinha com sua avó. Como o telefone da fazenda era
usado por muitos moradores do lugar, sem sequer pedirem licença, a avó do nosso
informante mandou desligá-lo, certo dia. Na noite seguinte, no entanto, o telefone tocou.
Era uma ligação interurbana de uma amiga da família, na Virgínia Ocidental, dizendo
que “tudo estava bem”, que ela “iria partir” e que “ouviriam mais notícias dela dentro
de poucos dias”.
— A voz era cava e parecia vir de muito longe — explicou o informante.
Naturalmente, a avó do nosso informante ficou perplexa com o telefonema, e
imediatamente se comunicou com a companhia telefônica, para reclamar, porque o
aparelho não fora desligado, como pedira.
— À tarde, apareceu um funcionário da companhia, que mostrou à minha avó que
o fio em torno do poste não estava ligado. Depois entrou em casa e mostrou que o fio
estava também desligado.
O desfecho do caso daquele estranho e aparentemente impossível telefonema
ocorreu, como fora predito pela voz, alguns dias depois, quando chegou uma carta
anunciando o falecimento da amiga da família. Morrera no mesmo momento em que se
fizera a ligação telefônica.
Esse fenômeno, em que o telefonema ocorre no momento aproximado da morte de
quem fala, tem sido observado em vários casos... mesmo em outros países, e não nos
Estados Unidos. Isso mostra que algumas características que temos isolado são
universais no fenômeno de telefonemas de pessoas mortas.

Informações Coligidas por Outros Pesquisadores

No começo de outubro de 1980, dois colegas nossos nos escreveram acerca de


experiências psíquicas realizadas na Itália. O Dr. G.M. Rinaldi

124
e sua esposa, de Bolzano, tinham iniciado o estudo de casos de telefonemas de pessoas
mortas muito semelhantes aos que vínhamos pesquisando nos Estados Unidos desde
1977. Ele e sua esposa haviam pessoalmente examinado o caso da Sra. Emma
Portocalschi, de Turim, que recebera um telefonema fantasma em 18 de agosto de 1977.
Segundo ela revelou, seu marido morrera naquele mesmo dia, em conseqüência de um
câncer no pâncreas. A morte ocorreu às quatro da manhã, de sorte que ela já havia
voltado para casa, quando veio o telefonema, às sete horas. Ela ainda não havia se
deitado e estava bem despertada e alerta quando o telefone tocou. A voz de seu marido
se fez ouvir imediatamente. — Emma — perguntou a voz, com um tom que indicava
perplexidade. — Por que ainda está em casa? Estou esperando você.
A mulher ficou tão chocada, que largou o fone, o que a levou mais tarde a lamentar o
seu gesto. O fato significativo do telefonema é que ela costumava visitar o marido no
hospital e ajudar a enfermeira, todos os dias, às sete horas da manhã. Convém notar,
mais uma vez, como as mensagens transmitidas nos telefonemas, por mais breve que
sejam, são significativas, tanto para quem recebe como para quem chama.
Poderia alguém estar passando um trote desalmado na Sra. Portocalschi? Parece
improvável. O Dr. Rinaldi salientou, em seu relato sobre o caso, que Emma “afirma ter
ouvido uma voz clara, normal, inconfundivelmente a de seu marido. Estava sozinha em
casa, sem pessoa alguma que pudesse falar e perturbá-la quando estava ouvindo o
telefonema”.
Tem-se de admitir que todos os telefonemas fantasmas mencionados até aqui foram
bastante banais. As vozes não puderam falar mais que algumas palavras e o que
disseram não foi muito esclarecedor. Nem todos os telefonemas de pessoas mortas,
contado, são tão fragmentários. Às vezes, eles resultam conversas mais demoradas, que
parecem perfeitamente normais, e que podem se prolongar até por meia hora. São,
todavia, muito mais raras do que as breves intervenções mencionadas nos casos
anteriormente expostos. Representam, porém, um formidável aspecto do mistério dos
telefonemas fantasmas, e um aspecto que não pode ser ignorado.
O mais interessante caso dessa espécie não foi diretamente colhido por nós, mas
revelado por Susy Smith em seu livro The Power of Mind (O Poder da Mente). Miss
Smith, conhecida autora de vários livros sobre paranormalidade, entrevistou
pessoalmente as duas pessoas que tinham conversado com a voz fantasma. Essas
pessoas, Bonnie e C.E. MacConnel, de Tucson, no Estado de Arizona, apresentaram um
relato minucioso

125
do incidente. (Ambos morreram posteriormente.) O caso é um tanto enrolado.
Os MacConnell tinham uma velha amiga chamada Enid Johlson, escritora e
filantropa. Infelizmente, quando chegou à velhice, a generosidade da Sra. Johlson a
reduziu a uma precária situação financeira, a tal ponto que ela não podia pagar as
despesas com o tratamento de sua abalada saúde. Acabou tendo constantemente de
mudar de um hospital para outro A sua única esperança era conseguir escrever outro
livro, idéia que os MacConnell apoiavam calorosamente. O livro, contudo, não chegou a
ser escrito, e o casal MacConnell acabou perdendo o contato com a amiga.
Vários meses depois, no começo de uma noite de domingo, de 1971, teve de novo
notícia de Enid, quando recebeu um telefonema seu. Os dois cônjuges ficaram surpresos
ao ouvi-la, e surpresos também pelo fato de sua voz se mostrar jovem e vibrante, como
a Enid de vinte anos antes. Enid contou que fora transferida para o Asilo Judaico
Artesão de Tucson. A Sra. MacConnell lembrou-se, durante a conversa, que faltavam
poucos dias para o aniversário de Enid, e se ofereceu para levar-lhe uma garrafa de
vinho de presente.
— Não estou precisando disso agora — replicou Enid, que continuou falando sobre
a maneira com que estava sendo tratada, o livro que não terminara e concluiu, afinal,
dizendo que nunca se sentira tão feliz.
A conversa, de que ambos os MacConnell participaram, durou cerca de trinta
minutos.
Na sexta-feira da mesma semana, a Sra. MacConnell resolveu conversar de novo
com a amiga, e telefonou para o tal asilo. Foi quando sofreu o grande choque. A
telefonista do estabelecimento explicou que Enid Johlson falecera no domingo anterior,
às 10,30 da manhã, isto é, várias horas antes de terem os MacConnell recebido o seu
telefonema. Não podia haver erro acerca da hora da morte, e nenhuma dúvida, também,
acerca do misterioso telefonema.

Estudando a Natureza dos Telefonemas

Quando iniciamos o estudo de casos semelhantes de conversas telefônicas fantasmas


demoradas, ficamos, a princípio, intrigados. Por que, por exemplo, seriam elas tão
raras? O caso dos MacConnell faz parte apenas de meia dúzia de casos do mesmo
gênero que podemos coligir. Também

126
tínhamos curiosidade de saber por que os fantasmas telefônicos jamais diziam qualquer
coisa a respeito de suas próprias mortes. Pareciam deliberadamente dispostos a fazer
com que os ouvintes percebessem que estavam falando com pessoas que viviam e
respiravam. O caso Johlson MacConnell era típico nesse sentido. Enid não admitiu que
estava morta, mas, não obstante, criou um obstáculo à pretensão do casal de visitá-la por
ocasião de seu aniversário.
A resposta a essas perguntas só veio alguns meses depois de termos começado,
seriamente, a colher dados sobre telefonemas fantasmas. A chave surgiu quando
observamos que o casal MacConnell não sabia que Enid Johlson estava morta, quando
recebeu o telefonema. Sob esse aspecto, o caso é diferente dos que nos foram contados
pelo Dr. Medved e por Patricia Adams. Naqueles casos, as pessoas souberam
imediatamente que tinham entrado em comunicação com um morto. Com essa idéia na
mente, tratamos de reavaliar todos os casos que tínhamos registrado (mais de cinqüenta
naquela ocasião), e encontramos uma disposição bem coerente, que diferenciava os
telefonemas fantasmas fragmentários dos que envolviam uma conversa demorada.
Quando o ouvinte sabia que estava falando com o espírito de uma pessoa morta, o
telefonema era, invariavelmente, curto e confuso. Em caso contrário, a conversa podia
se prolongar por meia hora.
O caso relatado por Mary Meredith nos causou certo embaraço. Tomamos
conhecimento dele depois de termos terminado a nossa análise. O caso não se mostrava
como um daqueles telefonemas breves e confusos que ocorriam quando o ouvinte sabia
da morte da pessoa, mas não se tratava também de um telefonema muito prolongado.
Poderia ser prolongado, uma vez que a Sra. Meredith lutou contra a idéia de reconhecer
que o telefonema viera de uma pessoa morta.
A disposição que descobrimos acerca da duração dos telefonemas pode explicar
prontamente porque, nos casos de contatos telefônicos demorados, as vozes fantasmas
jamais falam a respeito de sua própria morte. Parece razoável presumir que os
telefonemas só ocorrem quando entram em jogo vários fatores psíquicos, dentro das
mentes de quem comunica e de quem recebe a comunicação. Assim, por exemplo, todas
as pessoas cujos casos mencionamos se encontravam em estado de espírito passivo —
dormindo, tendo acabado de se levantar, descansando em casa à noitinha, etc. —
quando receberam os telefonemas. Em outras palavras: as pessoas se encontram
relaxadas, mental e fisicamente, quando ocorrem os telefonemas. Esse fator pode
concorrer, em primeiro lugar, para tornar o contato psíquico possível. Há muito os
parapsicólogos sabem que os esta-

127
dos mentais caracterizados pelo repouso e ausência de preocupações bons condutores
psíquicos. Isso pode ser verdade para o estado de espírito que deve prevalecer para que
ocorra um telefonema dos mortos. O motivo de serem tão curtos, em sua maior parte, os
telefonemas dos mortos, se deve ao fato de ficar a pessoa muito nervosa quando
compreende o que está acontecendo. Essa agitação mental pode destruir as condições
psíquicas que tornaram possível o começo do contato.
Ora, essa agitação não ocorre no caso em que a pessoa ignora que aquele com quem
está falando já morreu. E, assim, podem conversar durante vários minutos. Os autores
dos telefonemas fantasmas podem, assim, deliberadamente, evitar que seja conhecida a
sua própria morte, a fim de que sejam prolongados os seus contatos psíquicos. Em um
dos nossos casos, de fato, o telefonema foi interrompido no momento que a pessoa que
recebia o telefonema tentou estimular a outra a admitir a sua própria morte.
Fiquei sabendo desse caso pelos protagonistas, o casal Joe Bonneau, muito pouco
depois de ocorrido, de modo que o incidente ainda estava bem vivo em sua memória,
quando me foi relatado. Aconteceu na tarde domingo, 18 de novembro de 1979, em casa
do casal, na cidade de Portland, Estado de Oregon. A Sra. Bonneau se encontrava na
cozinha, parando um lauto jantar para comemorar o feriado da Ação de Graças,
enquanto Mr. Bonneau estava na sala de jantar, junto da mesa, quando recebeu o
telefonema. O primeiro sinal de que algo inesperado iria acontecer ocorreu quando a
campainha do telefone tocou por um momento e depois parou. A campainha não tocou
de novo, mas Bonneau, impulsivamente, pegou o fone... mesmo depois de esperar
alguns segundos. O que ouviu o excitou tremendamente. Era a voz de sua irmã já
falecida, procurando por ele. Antes que pudesse se dominar, ele perguntou à irmã como
estava. Seguiu-se esta breve conversa.
— Estou bem — respondeu a voz. — É você, Joe?
— Sim, é Joe. Quem é você? — redargüiu Bonneau, surpreso.
A voz respondeu dando o nome exato:
— Sou Mary.
Nesse momento, Bonneau compreendeu o que lhe estava acontece
— Meu Deus! — exclamou. — É bom ouvir a sua voz. Onde é que você está? O
que está fazendo?
Nesse ponto, porém, a estática interrompeu a ligação. Bonneau disse à voz que não a
estava podendo ouvir, e ela replicou:
— Eu sei. Tenho de ir, mas quero conversar com você.

128
A voz se calou, mas Bonneau não desligou logo. Só pôs o fone no gancho quando se
convenceu de que a conversa não iria continuar mesmo.
Como me explicou ele mais tarde, a voz era clara e cheia, mas logo que ele lhe
perguntou de onde estava falando e lhe pediu para se identificar melhor, a estática
interrompeu a ligação. Mr. Bonneau continua inteiramente convencido de que a voz era
a de sua irmã, sendo reconhecível com facilidade. Até hoje, ele não sabe explicar por
que o telefone tocou só uma vez... e por que, apesar disso, ele atendeu.
A idéia de que aqueles telefonemas falham muitas vezes devido ao nervosismo
excessivo das pessoas a quem são dirigidos é admitidamente hipotética e um tanto
redundante. Mas explica por que parece haver dois tipos de telefonema dos mortos, e
por que o segundo tipo ocorre quando a pessoa desconhece a natureza das chamadas. Se
a Sra. MacConnell não tivesse telefonado para o Asilo Judaico alguns dias depois do
telefonema de Enid, jamais saberia que participara de uma sensacional manifestação
psíquica.

Problemas da Prova

Como podemos ter certeza de que os telefonemas dos mortos vêm mesmo dos
mortos, e não de alguma outra fonte? Isso pode parecer uma pergunta bem estranha,
mas é muito importante. Há, realmente, duas explicações possíveis, muito diferentes,
para aqueles telefonemas fantasmas. A primeira é que os mortos podem,
ocasionalmente, entrar em contato com os vivos graças à manipulação de equipamento
eletromagnético. Mas há também outra explicação possível. Será que, graças aos
poderes da nossa própria mente, nós próprios produzimos tais telefonemas?
Sabemos que a mente possui notáveis habilidades psicoquinéticas (ou poder da mente
sobre a matéria). Tem o poder de mover objetos físicos, levitar mesas, curar os
enfermos e — segundo descobertas recentes — produzir comunicações por meios
mecânicos. E, às vezes, podemos empregar tais habilidades inconscientemente. As
manifestações por meios mecânicos, por exemplo, ocorrem quando alguém, em uma
família às voltas com atribulações, utiliza inconscientemente seu poder da mente sobre a
matéria para produzir toda a sorte de perturbações fantasmas. Os móveis se movem,
como que espontaneamente; ouvem-se barulhos estranhos, objetos aparecem e
desaparecem na casa, misteriosamente. Se esse agente

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é afastado da família ou se adormece, as assombrações param. No entanto, a própria
pessoa raramente percebe que é ela própria que está produzindo o fenômeno, pois o seu
poder está sendo dirigido por uma parte da mente profundamente oculta no
inconsciente.
À luz desse fato, o de que todos nós possuímos habilidades psicoquinéticas, há a real
possibilidade de que a nossa mente possa manipular, eletromagnética e psiquicamente,
um sistema telefônico e produzir um telefonema fantasma.
A idéia pode parecer estranha, mas há algumas provas de que nós, os vivos, podemos
produzir telefonemas fantasmas em certas ocasiões. Posso falar a respeito por
experiência própria, uma vez que eu mesmo produzi um de tais telefonemas. O
incidente ocorreu em 1975. Eram quatro horas de uma bela tarde de quinta-feira, e eu
me encontrava deitado em um divã, na sala de estar, pensando em dar um telefonema
para um psicólogo meu conhecido do Instituto de Neuropsiquiatria da Universidade da
Califórnia. Na realidade, não cheguei a telefonar, apesar da intenção de fazê-lo. Mais ou
menos às seis horas, no entanto, sofri o maior choque de minha vida, quando veio um
telefonema do Instituto e do gabinete do próprio psicólogo para quem eu tencionava
telefonar. Quem falou foi o seu assistente de pesquisas, dizendo que “estava
respondendo ao meu pedido”. Quando lhe perguntei sobre o que estava falando, ele me
disse que, às quatro horas, eu havia telefonado, dando o meu nome e pedindo para me
telefonarem! Um trabalhador voluntário atendera ao telefone e anotara o recado.
Em 1975, eu não sabia tirar proveito dessa experiência, uma vez que foi bem depois
que comecei a me interessar seriamente pelo mistério dos telefonemas fantasmas.
Quando, porém, iniciei os estudos sobre telefonemas dos mortos, passei a encontrar
muitos casos quase idênticos ao meu. Um desses incidentes me foi relatado por meu
amigo Jerome Clark, redator da revista Fate:

O incidente ocorreu em uma tarde de sábado, de 1975. Eu e um amigo, Dr. Benton


Jamison, estávamos sentados em meu apartamento, em Moorhead, Estado de
Minnesota, conversando, quando o telefone tocou. Atendi. A pessoa que se achava do
outro lado da linha, e cuja voz reconheci imediatamente, se identificou como Mary,
uma amiga de minha mulher. Minha mulher, Penny, tomava conta dos dois filhinhos de
Mary, de vez em quando, e Mary indagou se ela poderia tomar conta dos meninos
naquela noite, pois pretendia sair. Expliquei que Penny viajara para visitar seus pais e
só voltaria no dia seguinte. Mary não escondeu a sua decepção, e a conversa ficou por
aí.

130
Quando a esposa de Jerome regressou, o marido lhe falou sobre o telefonema, e ela
imediatamente telefonou para Mary, que ficou surpresa, e negou que tivesse telefonado.
Realmente, pensara em telefonar, durante toda a tarde, mas acabara desistindo. Quando
Penny, a mulher de Jerry, disse que, no telefonema, “Mary” manifestara expressamente
a sua decepção, a verdadeira Mary afirmou que jamais faria tal coisa.
— Concordei — disse Clark. — Na ocasião, fiquei um tanto surpreso com a sua
reação.
O Dr. Jamison, pessoalmente, confirmou todo o episódio.
Em face desses casos intencionais, como passaremos a chamá-los, não podemos
presumir, automaticamente, que os telefonemas fantasmas venham os mortos. Se uma
pessoa viva pode produzir uma voz fantasma, semelhante à sua própria voz, em um
telefonema interurbano, parece, pelo menos teoricamente, possível que possa também
imitar a voz dos mortos em telefonemas. Quando eu e Raymond Bayless começamos a
estudar os telefonemas dos mortos, não imaginávamos realmente que conseguiríamos
resolver o problema. Não obstante, à medida que fomos colhendo cada vez mais dados,
verificamos que os mesmos mostravam que tais telefonemas são, na verdade,
provocados pelos mortos, e não pela utilização inconsciente do poder psíquico dos
vivos.

Telefonemas dos Mortos e a Questão da Sobrevivência

Antes de mais nada, não se pode esquecer que a maioria dos telefonemas fantasmas
são dirigidos a pessoas que sabem que quem está chamando já morreu. Muitos dos
nossos casos ocorreram depois que a pessoa que chamava no telefone já havia morrido
há seis meses ou até mesmo mais. Nada menos de 22 por cento dos nossos casos se
incluem nessa categoria. Não nos parece que houvesse razão prática ou psicológica para
que uma pessoa inconscientemente motivada produzisse um telefonema fantasma
depois de tanto tempo. Outros casos, ao contrário, são semelhantes ao daquele ocorrido
em Ohio, quando o telefonema ocorreu no momento exato em que a pessoa que
telefonou estava morrendo. Imaginamos se, em tais casos, a pessoa não teria,
inconscientemente, recebido uma mensagem telepática sobre a morte, e produzido um
telefonema do morto psicoquineticamente, a fim de revelar a informação ao seu
consciente. Essa hipótese,

131
contudo, não pode explicar por que um número tão considerável de telefonemas dos
mortos ocorre meses depois da morte de quem telefona e quando somente a pessoa
morta tem motivo para provocar o contato.
Outro indício para explicar a origem dos telefonemas é o fato de observar nos mortos
a tendência de telefonarem em dias que tiveram (têm) significação psicológica, ou para
eles próprios, ou para os seus amigos e parentes. Nada menos de dez por cento dos
nossos casos ocorrera em dias emocionalmente significativos.
Um dos casos mais notáveis do fenômeno nos foi comunicado pela Sra. Mary Cahill,
dona-de-casa de Nova York, que recebeu um telefonema de sua filha morta, no Dia das
Mães de 1943. Havia seis meses que a moça morrera. A Sra. Cahill já havia,
anteriormente, comunicado o caso à revista Fate, mas conseguimos um relato
independente do episódio. O telefonema ocorreu no princípio da noite, quando a Sra.
Cahill estava ouvindo um programa de rádio. A voz, que ela reconheceu imediatamente
como a da filha que morrera, só pôde dizer:
— Alô, mamãe! Como está passando? Está me ouvindo? Alô, mamãe!
Depois disso, a linha se encheu com o murmúrio de diversas vozes. A Sra. Cahill
pôde ouvir a voz da filha perguntando, entre a estática, se a estava ouvindo, e depois
tudo se silenciou.
Esses casos em aniversários levam à convicção de que os telefonemas não
acontecem por acaso, mas são comunicações cuidadosamente planejadas pelo próprio
morto. Também indicam uma definitiva motivação, embora isso possa se aplicar tanto à
pessoa que chama como a que atende à chamada.
A narração da Sra. Cahill também é interessante pelo fato de ter ela ouvido várias
vozes misturadas falando na linha. É uma coisa que aparece, embora não
freqüentemente, nos casos que recolhemos. Esse estranho fenômeno pode indicar que
aqueles telefonemas vêm do mundo dos mortos. Parece plausível admitir-se que, se se
abre um canal entre os vivos e os mortos, muitos espíritos tentem aproveitá-lo para
entrarem em contato com os vivos. Ao mesmo tempo, não parece verossímil que, se
uma pessoa viva produzir uma chamada telefônica, a vá poluir com a interferência de
outras vozes fantasmas.
O nosso estudo sobre os telefonemas dos mortos ainda se encontra na infância.
Evidentemente, não podemos ter a pretensão de havermos resolvido os muitos mistérios
apresentados por aqueles contatos enigmáticos. Não sabemos exatamente, por exemplo,
como são feitas as ligações, quem é mais inclinado a recebê-las e em que ocasiões
ocorrem com mais

132
freqüência. Uma coisa, porém, é certa: tais telefonemas não são tão raros como se
poderia pensar. Têm sido revelados casos ocorridos desde a década de 1920, e é cada
vez maior o número de pessoas dispostas a revelarem as suas experiências.
Infelizmente, até hoje poucos parapsicólogos se dispuseram a estudar esse sensacional
fenômeno. Na verdade, a maioria deles pode achar que se trata de um fenômeno
estranho demais, embora não seja mais singular do que qualquer outro tipo de
manifestação psíquica.

133
*
* *

134
7
Reexame da Reencarnação
De todas as muitas concepções da vida após a morte que têm surgido desde tempos
imemoriais, a reencarnação é talvez a mais perene. Muitas culturas primitivas aceitam a
doutrina, que hoje é melhor especificada nos ensinamentos de várias doutrinas orientais.
Por tradição, as pesquisas sobre a reencarnação têm sido conduzidas dentro do plano
da sobrevivência em geral. A idéia de que cada pessoa humana possui uma alma que
pode reaparecer na Terra graças a alguma espécie de transmigração, representa uma
forma específica de sobrevivência depois da morte. O fato de ser tal processo uma lei
universal, ou de ocorrer pela vontade do morto, não constitui, realmente, a questão
fundamental. O que é importante é que a reencarnação acarreta a sobrevivência de nossa
memória e personalidade além da morte física, ainda que em uma estrutura
conceitualmente diferente daquela com que estamos acostumados. A prova da
reencarnação também implica diretamente um estado mais convencional de
sobrevivência pessoal, pelo menos por um tempo limitado. Nos casos que resumiremos
neste capítulo, passaram-se meses ou mesmo anos, muitas vezes, entre a morte da
personalidade original e sua suposta reencarnação. Esse espaço de tempo prolongado
certamente implica a ocorrência, durante o hiato, de alguma forma de sobrevivência
pessoal.
A reencarnação não é, portanto, uma doutrina intrinsecamente oposta à idéia da
sobrevivência pessoal. Ao contrário, significa que tal estado de existência
necessariamente a precede. A reencarnação é, portanto, uma parte intrínseca e
importante da questão da sobrevivência.
Até recentemente, a reencarnação era considerada, pela maior parte dos ocidentais,
como um conceito exótico, associado a certas religiões não cristãs, destacadamente o
hinduísmo e o budismo. Ultimamente, contudo,

135
muitas pessoas do Ocidente, que sequer já ouviram falar da doutrina, têm relatado
experiências de reencarnação.
Assim, por exemplo, a carta seguinte me foi enviada por uma jovem, moradora no
Estado da Virgínia, que não acreditava na reencarnação, mas passou a acreditar em
conseqüência de uma experiência própria. Para ela, a reencarnação não é uma doutrina
abstrata que aceite como um ato de fé, mas uma realidade viva.
Em certo dia de 1971, ela e uma amiga estavam viajando de carro para Baltimore,
saindo de Patterson, em Nova Jersey, Estado para onde acabara de se mudar, vinda do
Tennessee, e que não conhecera antes, e, de acordo com as suas próprias palavras:

Quando estávamos nos aproximando da barreira de pedágio de Nova Jersey,


experimentei uma sensação estranha como se aquela paisagem me fosse muito
conhecida... Virei-me para Joanne e disse:
— Como você sabe, nunca estive aqui antes, mas acho que a cerca de uma milha
(1.600 metros), na estrada, há uma casa em que já morei.
Quando seguimos depois da barreira (rumo ao norte), tudo me era familiar... as
velhas casas, e comecei a descrever o que iríamos ver, antes que víssemos.
Passaram-se aproximadamente três milhas (5 quilômetros), e eu disse à minha
amiga que, depois de uma curva, iríamos chegar a uma cidadezinha; era muito perto
da barreira. Eu lhe disse que as casas eram pintadas de branco, com dois pavimentos e
muito perto umas das outras... e que eu sentia que havia morado ali quando tinha seis
anos de idade e que costumava sentar com minha avó na varanda da frente. As
recordações me dominaram e pude me lembrar de que me sentava no balanço, na
varanda da frente, e de minha avó abotoando minhas botinas. Eu sozinha não
conseguia.
Quando chegamos à cidade, reconheci a casa imediatamente, mas o balanço não
estava mais na varanda... mas, quando morei ali com minha avó, afirmei à minha
amiga, lembrava-me de haver sentado no balanço e lembrava-me também de minha avó
caminhando dois quarteirões pela rua comigo, até um bar, que tinha um balcão de
mármore muito alto, e aonde eu gostava muito de ir, para tomar limonada. Quando
seguimos pela ruazinha, conduzi minha amiga até o bar. Ainda lá estava, ou melhor, o
prédio ainda estava lá, igual ao que era, mas rodeado por um tapume de tábuas, de
modo que não pude olhar para dentro.

136
O que poderia ter sido um sensacional desfecho para o incidente foi prejudicado pelo
crescente nervosismo da amiga em face do que estava acontecendo. O caso, de qualquer
maneira, teve um fim bem intrigante:

Quando lá estávamos, fiquei sabendo que morrera quando tinha 6 ou 7 anos de


idade... e tentei fazer com que Joanne me levasse ao cemitério onde eu estava
enterrada. Ela, porém, ficou tão apavorada que não quis ir. Quando estávamos saindo
da cidade, eu lhe disse:
— A uns três quarteirões daqui, há uma pequena colina, e é lá que fica o cemitério,
onde me enterraram.
Era verdade. Lá estava o cemitério, como o descrevi. Voltamos à barreira de
pedágio e de lá a Patterson... e ainda sei que certa vez, no começo deste século, eu vivi
e morri ali.

O que há de mais impressionante nesse relato é que ele é verídico e a experiência


provocou lembranças que não podiam já se encontrar na memória da jovem
protagonista.
Relatos parecidos com o caso aqui citado não são raros, embora nenhum
parapsicólogo acadêmico tenha se dado ao trabalho de estudar as provas da
reencarnação. As pesquisas acerca de recordações espontâneas da vida passada só
vieram a público em 1979, quando o Dr. Frederick Lenz, psicólogo de San Diego,
publicou o livro Lifetimes, no qual relata e analisa grande número de incidentes
semelhantes. Coligiu mais de cem casos e chegou à conclusão de que as lembranças
espontâneas da vida passada costumam ocorrer em sonhos, durante a meditação, através
de experiências déjà vu(*) e em visões em estado de vigília. Esses últimos casos são os
mais característicos. A pessoa, em via de regra, tem a impressão de estar sendo
transportada para o passado, para a sua vida anterior.
Lenz também constatou que alguns de tais casos eram verídicos. O seguinte é um
caso típico constante de seus arquivos, que foi relatado por uma jovem senhora, que
tinha menos de vinte anos por ocasião do incidente:

O fato aconteceu quando eu tinha apenas 17 anos. Estava em casa, tomando conta
de minha irmãzinha. Meus pais tinham saído para comemorarem seu aniversário de
casamento. Achava-me na cozinha, fazendo o jantar, quando senti um barulho muito
forte dentro da cabeça. O baru-

(*)
Sensação que uma determinada situação do passado se repetindo (nota do tradutor).

137
lho foi se tornando cada vez mais forte, e fiquei apavorada. O ruído não vinha de fora,
mas de dentro de mim. Tudo começou a escurecer e pensei que ia morrer. O que me
lembro em seguida é de estar em um rochedo, junto do mar. Olhava as ondas batendo
nos rochedos abaixo de mim, ouvia o seu rumor, e sentia o cheiro da maresia. Virei as
costas e comecei a caminhar pelo campo que ficava atrás de mim. O sol estava alto e
eu me sentia bem disposta e feliz. Estava voltando para junto do meu rebanho de
ovelhas, que deixara no pasto. Enquanto caminhava, ia cantando uma canção
predileta, até que cheguei à crista do morro. Pensei em muitas cidades gregas, que
gostaria de visitar algum dia. Sentei-me no meio do rebanho, recostei-me e continuei
cantando. Então, a visão terminou e me vi de novo na cozinha.
Não podia fazer idéia do que acontecera comigo, mas imaginei se tratar de um
devaneio muito vivo, de um sonho acordada. No entanto, vários anos depois, estando de
férias da academia, fui à Europa, e um dos países onde estive foi a Grécia. Fiquei
fascinada com algumas das cidadezinhas costeiras. Certo dia, passeando de carro com
alguns amigos, seguimos por um trecho de caminho à beira-mar, e me senti dominada
por emoções conflitantes, mas uma coisa era certa; eu queria descer do carro. Pedi aos
meus companheiros para pararem um pouco; descemos e fomos contemplar o mar, à
beira da estrada. E vi, então, exatamente o mesmo cenário que vira em minha visão na
cozinha, vários anos antes. Virei as costas e me afastei do carro e dos meus amigos.
Caminhei com uma finalidade, como se conhecesse o caminho. Subi a estrada, através
de um campo, e comecei a galgar uma encosta. Cheguei ao alto e olhei em torno.
Reconheci o lugar onde estivera com o rebanho, na visão. Era exatamente como me
lembrava. Minha memória estava repleta de imagens de lugares e cenas, e vi que
regressara à casa. Embora fosse inexplicável, senti que vivera ali em outro tempo.
Voltei para junto de meus amigos no carro contei-lhes o que sentira. Eles, porém,
pareceram não estar entender e acabei desistindo de explicar.
O trabalho de Lenz, todavia, não se limitou a colecionar tais incidentes. Também os
analisou, minuciosamente, e, em resultado de suas pesquisas, descobriu um modelo ao
qual se ajustam todos os casos. Segundo ele, as pessoas que vão se lembrar de sua vida
anterior passam por uma síndrome fenomenológica que culmina com o aparecimento da
lembrança da vida passada. Em primeiro lugar, a pessoa costuma sentir o corpo mais
leve, e cores vivas começam a dançar diante de seus olhos. Em seguida, ela experimenta
uma sensação de euforia, ou mesmo de êxtase, durante

138
o qual há uma vibração no ambiente em que se encontra. Nesse ponto, afinal, surge a
lembrança da outra vida, e a pessoa habitualmente se vê transportada através do tempo a
uma cena de sua vida anterior. A cena dura apenas alguns momentos antes de se apagar.
A pessoa se sente, então, de volta ao Século XX, possivelmente com a impressão de que
tivesse saído de um transe. O Dr. Lenz não afirma que essa progressiva fenomenologia
acompanha todas as recordações da vida anterior, mas que elementos dessa síndrome
costumam acompanhar a maior parte de tais incidentes.
Terá Lenz isolado uma síndrome específica de reencarnação semelhante ao
isolamento feito por Moody da síndrome do encontro perto-da-morte? (Veja-se Capítulo
3). Se o efeito de Lenz constitui uma parte real da reencarnação, será fácil repetir a sua
experiência. Assim pensando, resolvi efetuar essa mui necessária repetição. Comecei
escrevendo a duas revistas que publicam matérias sobre a paranormalidade, pedindo aos
leitores que me enviassem pormenores de suas experiências de reencarnação, se as
tivessem. Das respostas, pude selecionar vinte casos satisfatórios de lembranças de uma
outra vida. A maioria dos meus correspondentes tratou de casos de sonho, mas diversos
outros tinham tido visões. Também foram mencionadas algumas informações sobre
situações déjà vu.
Os resultados de meu estudo foram variados. Consegui coligir muitos casos que
correspondiam precisamente ao tipo anunciado por Lenz, especialmente os estranhos
casos de visões ambulantes. Pelo menos cinco casos estavam provados, isto é, tratava-se
de informação em sonho ou visão posteriormente confirmada. Uma das correspondentes
sonhou que estava morrendo na mão de invasores vikings, e mais tarde descobriu que os
chefes nórdicos usavam um anel exatamente igual ao que ela vira nas mãos de seu
marido antes que também ele fosse morto. Um homem tivera extremas experiências
déjà vu, quando estava lendo a biografia do General Ouster, e mais tarde verificou,
graças a nova leitura, que se confirmavam muitos fatos que lhe tinham vindo à mente
por intuição. Não obtive, porém, nenhum caso que satisfizesse o efeito de Lenz. Talvez
os meus exemplos fossem insuficientes para revelar tal padrão, ou talvez Lenz tenha
agrupado seus casos de modo algo preconcebido para ajustá-los a um determinado
padrão. O fato é que se torna necessária uma investigação mais sistemática para resolver
o problema.
A despeito das perguntas sem resposta em minhas pesquisas, fiquei suficientemente
impressionado com a qualidade dos casos que recolhi para reavaliar os meus pontos de
vista sobre a reencarnação. Infelizmente,

139
o problema é que os relatos contêm muitas informações suscetíveis de verificação. São
fenômenos breves e efêmeros, e um cético pode desprezá-los, como alucinações ou
ilusões. Sem dúvida, o trabalho do Dr. Lenz e a minha própria tentativa de repetição só
podem ser encarados dentro de um contexto mais amplo das pesquisas em andamento
sobre a questão da reencarnação.

Memória Extracerebral

O maior acervo de provas a favor da doutrina da reencarnação foi coligido pelo Dr.
Ian Stevenson, psiquiatra e parapsicólogo da Universidade de Virgínia, que vem
colhendo casos de memória extracerebral desde a década de 1960. Memória
extracerebral é um neologismo que se refere aos casos em que uma pessoa, em via de
regra uma criança, parece lembrar de ter vivido uma outra vida. Tais pessoas não
somente se lembram da vida anterior, como, às vezes, podem a ela se referir com
riqueza de detalhes e muita precisão, mesmo quando dizem ter vivido em culturas
estranhas e durante muitos diferentes períodos da história. Até agora, Stevenson já
publicou nada menos de quatro livros discutindo os casos que investigou pessoalmente.
A grosso modo, os tipos de prova coletados por Stevenson se distribuem em três
categorias gerais. Em primeiro lugar, os casos em que a criança meramente se lembra de
uma vida passada e de detalhes dispersos da mesma. Em segundo lugar, estão os casos
em que a criança aparentemente herdou traços ou características físicas de sua prévia
encarnação. É comum, por exemplo, a criança nascer com deformidades físicas ou
manchas naturais na pele semelhantes às da pessoa original.
Um caso típico da simples lembrança da vida passada é o de Indika Guneratne, um
cingalês nascido em 1962. Stevenson iniciou sua investigação sobre o caso em 1968 e
publicou o resultado na revista da Associação de Pesquisas Psíquicas.
Indika começou a falar aos dois anos e um ano depois passou a descrever uma vida
passada como um ricaço, residente em Matara, uma cidade situada na costa sul de Sri
Lanka. Entre as suas recordações estavam a de uma bela mansão de que era dono, um
carro Mercedes Benz que também possuía e de suas terras e seus elefantes de estimação.
O pai de Indika, G.D. Guneratne, resolveu verificar as alegações do filho, e descobriu

140
que, realmente, vivera em Matara um homem rico que correspondia à descrição do
menino. As investigações, contudo, não foram levadas adiante. Foi Stevenson quem se
encarregou disso, quando esteve na Índia e em Sri Lanka. O cientista teve, então,
oportunidade de examinar muitas declarações de Indika, que o seu pai havia
cuidadosamente anotado. Os dados pareciam corresponder a um rico negociante de
madeira, K.G.J. Weerasinghe, dono de elefantes, que vivera em Matara e falecera em
1960. Entre dados pertinentes sobre a sua vida, Indika disse que ele era rico, que sua
casa ficava perto de uma estação ferroviária, que ele tinha um criado chamado
Premdasa, era dono de vários elefantes e tivera uma discussão séria com seu cunhado.
Realizando investigações em Matara, Stevenson confirmou a maior parte das
afirmações de Indika. Mas ocorreram também alguns erros. Weerasinghe era dono de
um elefante, não de muitos, e não tivera nenhum carro Mercedes Benz. É interessante
observar que Indika sabia até o número de registro do carro. Stevenson descobriu que o
número correspondia realmente a um Mercedes, mas de propriedade de um homem que
morava em uma cidade perto de Matara! No entanto, levando-se em consideração o fato
de ser a memória humana muito falha e caprichosa, os poucos erros das recordações de
Indika não são de molde a prejudicar a veracidade do caso, em seu conjunto.
A despeito das divergências, as recordações de Indika eram 90 por cento corretas,
quando aplicadas à vida e morte de K.G.J. Weerasinghe. A informação mais notável foi
se lembrar do nome de seu antigo criado, Premdasa, que fora chofer de Weerasinghe.
Prova ainda melhor do que os simples casos de lembrança são aqueles em que a
criança nasce com a marca ou deformidade relacionada com a vida anterior. Stevenson
encontrou muitos desses casos. Talvez o mais interessante seja o estranho caso de
Corliss Chotkin Júnior, um índio do Alasca, nascido em 1948, e que se lembrava de ter
sido anteriormente um seu parente distante, Victor Vincent, que morrera em 1946.
Durante a sua vida, Victor Vincent, que era um índio tlinget puro sangue aceitava a
reencarnação como coisa indiscutível, uma vez que essa era a crença generalizada de
sua tribo. Pouco antes de morrer, ele disse à sobrinha que, indo morrer em breve, se
encarnaria, voluntariamente, no filho dela. Corliss Chotkin Júnior nasceu dezoito meses
depois da morte de Vincent. E, se examinarmos o caso devidamente, temos de concluir
que a predição de Vincent estava certa. Corliss Júnior nasceu com duas manchas na pele
muito esquisitas: uma, muito grande, à direita do nariz, bem embaixo do olho,

141
e a outra nas costas. Ambas estavam colocadas nos lugares exatos em que Vincent fora
desfigurado por cicatrizes cirúrgicas!
Além disso, Corliss se lembrava de sua vida anterior como Vicent. Quando chegou
aos treze anos de idade, recebeu o nome tribal de Vincent, perguntou mesmo aos pais se
se lembravam de sua “promessa”, e lhes contou muitos pormenores de sua vida anterior,
a maior parte dos quais ignorada por eles.
Corliss contou aos pais, por exemplo, que, em certa ocasião, quando era Vincent e
estava navegando, o seu barco ficara sem combustível. Para chamar a atenção, vestira
um uniforme do Exército de Salvação e conseguira deter um vapor que passava.
Somente estudando pormenorizadamente a vida do parente, os Chotkin puderam
confirmar aquele pequeno episódio.
Nesse meio tempo, Corliss começou a adquirir várias características da personalidade
e traços físicos aparentemente herdados de Vincent. Mostrou o mesmo gosto do tio-avô
em mexer com motores e o modo de caminhar do velho.
A prova mais forte, porém, da reencarnação se encontra nos casos em que a criança
nasce com uma habilidade aparentemente trazida de uma vida anterior. Uma dessas
habilidades é o idioma. Um idioma só pode ser aprendido pelo contato, pela prática,
pela repetição e pela percepção cognitiva. Aprender um idioma se parece com aprender
a andar de biccleta ou a nadar. Não é fácil, dependendo de tentativas e de erros. Não é
coisa que se possa fazer instantaneamente. No entanto, há alguns casos de criancinhas
que, relembrando de sua vida anterior, também falam línguas estrangeiras, com as quais
jamais estiveram em contato. Vejamos um de tais casos, anunciado recentemente no
Brasil, onde foi descoberto por Hernani Andrade, um dos mais destacados
parapsicólogos sul-americanos.
Viviane Silvino nasceu em São Paulo, em 1963. Embora brasileira de nascença, a
menina causou assombro aos pais e avós quando começou a misturar palavras italianas
em suas conversas. Mesmo antes de chegar aos dois anos, chamava a irmã de mia
sorella e a boneca de bambola. Ambas essas expressões estavam corretamente
aplicadas. Certa vez, quando a mãe de Viviane explicava à sua lavadeira que não
conhecia ninguém que falasse se italiano, a menina exclamou: “Io parlo”, isto é “Eu
falo”. A menina começou mesmo a usar obscuras palavras e expressões italianas nas
conversas quotidianas.
Assim escreve o jornalista inglês Guy Lyon Playfair, que estudou o caso nos próprios
arquivos de Andrade, em seu livro The Unknown Power:

142
Certa vez, Sílvia (Viviane) calçou os sapatos de sua mãe e começou a caminhar pela
casa. Quando a avó lhe disse para parar com o barulho, ela retrucou: “Não me amole,
estou fazendo uma pestadura”. A palavra nada significa em português, mas em italiano
quer dizer pé duro ou pisar com força, que era realmente o que ela estava fazendo.
Outra vez, vendo a irmãzinha em seu carrinho de bebê, Sílvia observou que ela era
losca, isto é, vesga.

Foi somente depois de haver introduzido palavras italianas em seu vocabulário que
Viviane realmente começou a se lembrar de sua vida anterior. Até então, a única
indicação de que a menina estava sendo atormentada pelas lembranças de uma outra
vida era o inexplicável medo de aviões que mostrava. Finalmente, porém, a menina se
lembrou de uma vida em Roma, e, então, ofereceu os nomes específicos de várias das
pessoas suas amigas naquele tempo, contou incidentes de sua vida e relembrou,
dramaticamente, bombardeios aéreos da cidade. Isso mostrava que tivera a sua vida
anterior durante a Segunda Guerra Mundial, o que explicava o seu pavor por aviões.
Infelizmente, não tiveram êxito, até agora, as tentativas para identificar a vida
passada de Viviane na Itália. Isso não é de se admirar, devido ao fato de terem sido
destruídos muitos registros públicos durante a horrível guerra que flagelou a Europa na
década de 1940. Mas a curiosa capacidade da menina de falar o italiano não pode ser
desprezada facilmente pelos céticos.
Muitas pessoas estão convencidas de que esses casos do tipo de reencarnação, como
os chama Stevenson, constituem uma prova inequívoca em apoio à doutrina do
renascimento, e se todos os casos de memória extracerebral fossem claros e nítidos
como os três aqui citados, talvez essa conclusão se justificasse. Mas não são. Pesquisas
subseqüentes levadas a abo pelo Dr. Stevenson indicam que a questão é muito mais
complexa o que pode parecer à primeira vista. Muitos casos de memória extracerebral
são complicados por tantas irregularidades e paradoxos, que a “simples” reencarnação
não é suficiente para explicá-los.

Casos que Não Podem Ser Explicados Como Simples Reencarnação

Um caso desse tipo é o de Said Bouhamsy, amplamente investigado por Stevenson.


Bouhamsy era druso, acreditava na reencarnação e morreu o Líbano em 1943, vítima de
um desastre rodoviário. Seis meses depois,

143
sua irmã deu à luz um menino que, quando aprendeu a falar, as primeiras palavras que
disse foram os nomes dos filhos de Bouhamsy. O menino também descreveu o desastre
de caminhão que pusera fim à sua vida anterior e mostrou um pavor por caminhões que
se prolongou por muitos anos. Era um esplêndido exemplo de recordação de uma outra
vida, mas surgiu uma contradição. Em 1958, em uma cidade a uma distância de apenas
25 milhas, nasceu um menino chamado Imad Elawar. Também ele, a partir dos dois
anos de idade, começou a se lembrar de uma vida anterior, aparentemente a de Said
Bouhamsy! Lembrava-se do acidente de caminhão, lembrava-se de quantos filhos
tivera, etc. E mostrava, também, pavor por caminhões. Além disso, falava de uma ex-
amante, chamada Jumile, que como Stevenson averiguou mais tarde, não fora amante de
Bouhamsy, mas de um primo seu.
Temos, portanto, o caso em que duas crianças se lembram da mesma vida anterior.
Não se trata, sem dúvida, de um simples caso de encarnação.
E temos, ainda, o intrigante caso de Jasbir Lal Jat, um menino indiano de três anos e
meio que, depois de quase morrer de varíola, em 1954, espontaneamente começou a
falar acerca de uma vida anterior como Sobha Ram, que morava em uma aldeia vizinha.
Ele contou que o nome de seu pai era Shanka e que morrera por ter comido doces
envenenados uma festa de casamento (o que o fizera cair de uma carroça) e muitos
outros incidentes verdadeiros da vida de Ram. Levado de sua casa, na província indiana
de Uttar Pradesh, reconheceu corretamente vários de seus antigos parentes e conversou
com eles minuciosamente acerca de sua outra vida. Todos esses detalhes foram
verificados e confirmados por Ian Stevenson, durante uma viagem que fez à Índia, em
1961.
Estaríamos, assim, de novo, diante de um belo exemplo de reencarnação... se não
fosse o decepcionante fato de Sonha Ram não ter morrido antes de Jasbir nascer. O
desastre que matou Ram ocorreu quando Jasbir já andava pelos três anos e tanto.
Como explicar esse estranho caso? Trata-se de um exemplo de legítima
reencarnação? Possessão de espírito? Transmigração de alma? Terá Jasbir morrido
mesmo de varíola, e o seu corpo reanimado pela alma de Sobha Ram? De qualquer
maneira, tais ocorrências nos alertam para o fato de que os casos de memória
extracerebral de modo algum constituem uma prova indiscutível da reencarnação. Os
dados colhidos nesses casos não são suficientemente claros, e estão repletos de
paradoxos, que não podem ser ignorados.

144
Há ainda uma outra questão que poucos pesquisadores da reencarnação se deram ao
trabalho de estudar, e que, no entanto, tem importância capital para qualquer
interpretação que se possa querer aplicar aos casos de memória extracerebral. As
crianças falam acerca de vidas anteriores com mais freqüência nos países em que é
aceita a doutrina da reencarnação. Esse fenômeno pode ser semelhante à maneira com
que as crianças de nossa própria cultura muitas vezes criam companheiros de brinquedo
imaginários(*). Na maior parte dos casos, tais lembranças são histórias forjadas, que
não resistem à investigação. Assim, o fenômeno da lembrança de outra vida pode ser
intrinsecamente psicológico. Qualquer hipótese concernente aos casos de reencarnação
deve ser capaz de explicar porque algumas manifestações desse fenômeno são
comprobatórias e outras não. Os pesquisadores como Stevenson concentraram a sua
atenção apenas nas primeiras, e assim apresentam ao público um quadro unilateral de
um enigma multifacetado.
O Professor C.T.K. Chari, parapsicólogo, que pertence ao corpo docente da
Academia Cristã de Madrasta, na Índia, é de opinião que todos os casos de recordação
de uma outra vida são fundamentalmente psicológicos, frutos da exposição da criança à
doutrina da reencarnação. É muito admissível, porém, acredita, que, em raras ocasiões,
uma criança dotada de percepção extra-sensorial pode, clarividente e
inconscientemente, fornecer informações verdadeiras acerca de um indivíduo
recentemente falecido, enquanto se cria em sua mente uma fantasia de renascimento.
Essa teoria geral é engenhosa e pode, na verdade, explicar porque alguns casos de
memória extracerebral são comprobatórios e outros não. Pode também explicar
esquisitices, como as dos casos de Jasbir e Said Bouhamsy. Infelizmente, a teoria do
Professor Chari não explica os casos em que as crianças nascem com manchas ou outros
sinais na pele herdados de sua encarnação anterior, nem como uma criança pode falar
um idioma que nunca lhe foi ensinado. Tais fatos escapam aos limites da percepção
extra-sensorial tal como a conhecemos.

(*)
Com muita freqüência, os estudiosos do psiquismo chegam à conclusão de que os companheiros de
brinquedo imaginários são legítimas aparições, e, como tal, representam uma forma de fenômeno
psíquico. As pesquisas, contudo, revelam que as crianças imaginam tais companheiros a fim de praticar
sua habilidade verbal e que se trata de um fato de natureza puramente psicológica.

145
Como se vê, encontra-se em um impasse, presentemente, o problema de se saber se
os casos de lembrança de uma outra vida podem ou não servir de prova da
reencarnação. Os pesquisadores que acreditam na reencarnação não podem explicar as
anomalias de seus dados; os céticos não podem explicar os aspectos mais
comprobatórios do mistério do renascimento. O que necessitamos, portanto, talvez não
sejam mais pesquisas sobre os casos do tipo de reencarnação, mas outro método de
encarar a questão da reencarnação, talvez um modo de explorar, deliberada e
sistematicamente, a vida anterior de alguém, presumindo-se, é claro, que esse alguém
tenha tido tal vida. Estará no hipnotismo esse método?

Prova Pela Regressão Hipnótica

Não é uma idéia nova a de usar a hipnose para fazer com que uma pessoa regresse a
uma vida anterior. De fato, é quase impossível se dizer quando surgiu esse processo.
Sabemos que vários pesquisadores psíquicos franceses utilizavam essa técnica no
princípio deste século. Não obtiveram, porém, resultados muito conclusivos.
Talvez o primeiro caso moderno de lembrança da vida passada espontânea obtida
por meio da hipnose tenha sido registrada por William McDougall, psicólogo da
Universidade de Harvard, nos primeiros anos deste século. McDougall não tinha o
menor interesse pela reencarnação, mas era especialista em hipnose, e o incidente em
questão ocorreu quando ele estava realizando pesquisas sobre o estado hipnótico, na
Universidade de Oxford, Inglaterra. Durante uma experiência com um jovem
particularmente hipnotizável, o mesmo anunciou que era um carpinteiro egípcio e
contou que lhe haviam atribuído o encargo de esculpir figuras em uma tábua destinada a
um túmulo faraônico. Descreveu com certa minúcia as imagens que estava criando, e
que abrangiam uma águia, uma mão com uma insígnia em forma de ziguezague, um
deus com uma coroa branca e uma figura representando os mundos superior e inferior.
Nada disso impressionou muito McDougall, até nove meses depois, quando o
arqueólogo inglês Sir Flinders Petrie, que trabalhava com a Sociedade de Exploração
Egípcia, anunciou que acabara de escavar o cenotáfio de um obscuro rei da Primeira
Dinastia. Todos os símbolos descritos pelo paciente de McDougall foram encontrados
no cenotáfio. Comparando as datas, McDougall verificou que a sessão de hipnotismo
fora realizada mais

146
ou menos na mesma ocasião em que Petrie fazia as suas primeiras descobertas.
Outro eminente psicólogo inglês, Sir Cyril Burt, já falecido, assistiu à experiência de
McDougall e escreveu, mais tarde, que o estudante hipnotizado “afirmava nada
conhecer sobre o Egito antigo além do que havia na Bíblia”. Como era cego, as suas
leituras eram muito restritas e ele nada sabia, portanto, a respeito do Egito antigo.
McDougall jamais pôde explicar o mistério daquele caso. Sua única conclusão foi a
de que, ou o jovem havia, inconscientemente, forjado a história com fragmentos de
informações esparsas sobre os símbolos egípcios que recebera durante anos, (mas que
esquecera conscientemente), ou havia recebido uma mensagem telepática de Petrie.
Em poucas palavras, este é todo o problema, quando se tenta determinar a
autenticidade das recordações de uma vida anterior, provocadas hipnoticamente. Parece
haver pouca dúvida que, quando hipnotizadas, algumas pessoas podem apresentar
relatos minuciosos e convincentes acerca da vida anterior que supostamente tiveram em
épocas e lugares distantes. Mas serão mesmo verdadeiras lembranças de vidas passadas?
Ou não passam de pequenas fantasias que a mente inconsciente pode produzir, juntando
informações anteriormente obtidas, perdidas para a memória consciente, mas
armazenadas nos recessos da mente? Esse fenômeno se chama tecnicamente
criptomnesia, que significa memória oculta. Os parapsicólogos também chegaram à
conclusão de que as pessoas hipnotizadas se tornam muitas vezes excelentes portadores
de percepção extra-sensorial. Assim sendo, é também possível que uma pessoa
hipnotizada inconscientemente se utilize da telepatia e da clarividência para apresentar
informações verdadeiras, quando arquiteta uma fantasia sobre uma vida anterior.
Essas questões foram aventadas pela primeira vez em 1956, quando muitos
parapsicólogos começaram a discutir abertamente se o hipnotismo pode ser
legitimamente empregado em uma pesquisa sobre a reencarnação. Foi naquele ano que
Morey Bernstein, homem de negócios e hipnotizador amadorista, causou sensação com
o seu livro The Search for Bridey Murphy, que contava como uma pacata dona-de-casa
do Estado de Colorado, Virgínia Tighe (chamada Ruth Simmons no livro), se lembrara
de sua vida como Bridey Murphy, na Irlanda do Século XIX, em uma série de sessões
de regressão. Durante aquelas sessões ela lembrara o nome de diversos parentes e de
lugares históricos e até mesmo falara com sotaque irlandês. Logo que o caso chegou ao
conhecimento da imprensa, surgiam tentativas para que se descobrisse alguma coisa
sobre a vida de Bridey na

147
Irlanda. Os resultados desses esforços foram publicados nas revistas Life e American, e
uma série de reportagens sobre “à procura de Bridey Murphy” ficou a cargo da cadeia
de jornais Hearst. O resultado foi que, ao passo que alguns lugares e algumas pessoas
mencionadas pela Sra. Tighe durante os seus transes foram encontrados, outros
elementos de sua versão pareciam não passar de dramatizações de experiências infantis,
tiradas de sua própria vida ou lembranças enterradas em sua mente. Até mesmo o nome
que Bridey mencionava como sendo o de seu marido, Sean Brien MacCarthy, era quase
um anagrama do nome Morey Bernstein!
O mistério Bridey Murphy continua, mas o caso serviu para advertir os
investigadores em potencial sobre as enormes dificuldades de que se revestem as
tentativas de explicar as recordações de uma outra vida por meio do hipnotismo. E isso
explica por que muito pouca coisa a respeito das pesquisas sobre a reencarnação com
ajuda da hipnose foi publicada de 1956 até hoje. Até mesmo o Dr. Ian Stevenson,
provavelmente a maior autoridade na questão da reencarnação, desaconselha o uso da
hipnose como instrumento de pesquisa em tal campo.
A situação, porém, começou a mudar nos últimos anos. Mais uma vez, pelo menos
alguns poucos pesquisadores estão recorrendo à hipnose como método para
investigações sobre a reencarnação. E algumas dessas novas investigações chegaram a
algumas revelações desagradáveis... pelo menos para os céticos!
Um desses pesquisadores foi o falecido Arnold Bloxham, hipnotizador inglês que
sempre se interessou pela reencarnação. Bloxham começou as suas pesquisas sobre
encarnação em 1940, mais ou menos, e continuou a pesquisar até a sua morte. A BBC
acabou se interessando pelo seu trabalho e filmou um documentário sobre o assunto.
Em resultado, o produtor da BBC, Jeffrey Iverson, teve o cuidado de verificar as
lembranças de vários dos pacientes de Bloxham.
A estrela de Bloxham era uma jovem senhora chamada Jane Evans, que, durante o
curso de várias sessões, conseguiu se lembrar de nada menos de sete vidas diferentes.
Entre elas, uma vida em York, no Século III, outra como judia no Século XII também
em York, uma no Século XV na França, outra ainda como dama de companhia de
Catarina de Aragão no Século XVI, uma sexta vez como criada no tempo da Rainha
Ana e, finalmente, como freira em um convento no Estado de Maryland (E.U.A.). A
Sra. Evans não fora, inicialmente, hipnotizada por Bloxham como participante das
pesquisas sobre a reencarnação, mas para se tratar de um reumatismo por meio do
hipnotismo. Era uma paciente, e não uma colabora-

148
dora. Bloxham, porém, logo observou que ela lhe poderia ser muito útil em suas
pesquisas, e assim começou uma investigação que durou alguns meses.
A mais sensacional lembrança das vidas anteriores de Jane foi como judia no Século
XII. Durante as sessões, ela descrevia a situação política daquele tempo, que acabou
provocando o massacre da população judaica de York, em 1190, a sua família e a
maneira com que ela e os parentes usavam os distintivos que os identificavam como
judeus. Historicamente, todas as informações eram corretas ou coerentes com o que os
historiadores conhecem a respeito daqueles tempos sombrios da história da Inglaterra.
Assim, por exemplo, em 1215, as autoridades eclesiásticas de Roma anunciaram que
todos os judeus teriam de usar, nos países católicos, insígnias que os identificassem,
embora tal prática já estivesse muito difundida antes do começo do Século XIII. Jane
também se lembrava, com impressionante minuciosidade, de vários hábitos dos judeus e
dos motins antijudaicos da Inglaterra, incluindo informações bastante obscuras sobre as
tradições do tempo a respeito da agiotagem dos judeus. Ela chegou a mencionar
especificamente a estreita relação, em tal atividade, das comunidades judaicas nas
regiões de York e Lincoln, o que também está de acordo com os fatos históricos.
Não se pode pensar que as informações que a Sra. Evans costumava revelar quando
hipnotizada fossem conhecidas pelos leigos. Em sua maior parte, tais informações
tiveram de ser verificadas consultando-se o Professor Barrie Dobson, autoridade em
história dos judeus na Universidade de York.
O ponto culminante do caso de Jane foi a sua impressionante e minuciosa descrição
do grande massacre de judeus em 1190, quando o anti-semitismo da população de York
tornou-se tão sério, que acabou provocando uma carnificina. Bandos de desordeiros
invadiram as casas dos judeus, assassinando os moradores e roubando os seus bens.
Afinal, a maior parte da população judaica de York foi eliminada. Jane chegou a
descrever como os judeus acabaram matando os próprios filhos, para não permitirem
que caíssem vítimas dos habitantes de York. Jane terminou a sua história contando
como se refugiara com os filhos em uma igreja de York, escondendo-se em uma cripta,
onde foram encontrados e assassinados.
O Professor Dobson, que pôde ouvir as gravações dos relatos de Jane, declarou mais
tarde a Jeffrey Iverson que a sua noção dos fatos históricos era impressionantemente
correta e que muitas de suas informações eram conhecidas por poucos historiadores
profissionais. Ele também conseguiu

149
identificar a igreja onde Jane se escondera com sua família, graças a detalhes do relato,
como sendo a igreja de Sta. Maria, em Castlegate, que ainda existe até hoje.

O massacre de
judeus em York, no
ano de 1190 foi um
espetáculo
impressionante,
alegadamente
relembrado por
Jane Evans,
paciente de Amold
Bloxham, como
tendo ocorrido em
uma sua vida
anterior (Biblioteca
Mary Evans)

150
Há, porém, um senão na narrativa de Jane. A igreja de Sta. Maria não tem uma cripta
ou porão, ou, pelo menos, era o que se pensava quando se realizou a experiência de
Bloxham. De fato, a maior parte das igrejas inglesas do Século XII era construída sem
cripta. No entanto, uma reviravolta ocorreu, no caso de Jane Evans, seis meses depois
de haver o Professor Dobson analisado as gravações de Bloxham, quando operários,
trabalhando na restauração da Igreja de Sta. Maria descobriram que o templo tinha uma
cripta, e que essa cripta fora, segundo parecia, construída antes de 1190!
Também é interessante, como observou o Professor Dobson, o fato de Jane Evans se
lembrar de pormenores obscuros do massacre de 1190, e, ao mesmo tempo, omitir
qualquer menção aos mais conhecidos (e, portanto mais acessíveis aos seus superficiais
conhecimentos históricos) acerca daquela mancha negra da história da Grã-Bretanha.
Infelizmente, nem todos os casos de recordação de uma vida passada por meio da
hipnose resistem a um exame pormenorizado. O próprio caso de Jane Evans não é cem
por cento aceitável. Bloxam conseguiu que ela revivesse a lembrança de uma outra vida
em Roma antiga, mas todas as informações que ela deu foram depois encontradas em
um romance que lera pouco tempo antes! E Melvin Harris, em seu livro The
Unexplained, argumenta, de maneira convincente, que todas as suas lembranças podem
ser atribuídas à criptomnesia, conclusão aceita por Dobson e Iverson. Há, porém, outro
tipo de prova para a doutrina da reencarnação ultimamente alcançada pela hipnose... e
que é, possivelmente, mais importante.

A Xenoglossia e os Casos de Reencarnação

Um modo muito diferente de pesquisar a reencarnação por meio da hipnose consiste


em verificar se a pessoa é capaz de falar um idioma que desconhece. Trata-se de um
fenômeno revelado em raras ocasiões por algumas poucas pessoas que se lembram
espontaneamente de uma outra vida. Denominada, tecnicamente, xenoglossia, raramente
se mostra durante a regressão hipnótica, mas recentemente vieram à luz dois casos que
merecem exame cuidadoso.
O primeiro, amplamente noticiado, foi o caso de Delores Jay, uma dona-de-casa da
Virgínia, cuja história foi publicada em quase todos os

151
jornais dos Estados Unidos. Foi detidamente examinado pelo Dr. Ian Stevenson, que
ficou bastante impressionado até o ponto de publicar um relatório sobre o caso na
Revista da Sociedade Americana de Pesquisas Psíquicas, em 1976. O Reverendo Carroll
Jay, pastor metodista e marido de Delores, mais tarde escreveu um livro inteiro sobre o
caso, Gretchen, I Am, que apresenta mais detalhes acerca da investigação.
O estranho caso de Delores Jay começou em 1970, quando o Rev. Jay, experiente
hipnotizador, estava tratando de uma dor nas costas de sua esposa. Certa noite, depois
de ter adormecido, ela de súbito murmurou: “Gretchen, ich bin”, que, em alemão, quer
dizer: “Gretchen, sou eu”. Jay resolveu, então, submeter a esposa à hipnose, e, sempre
que hipnotizada, ela se tornava, invariavelmente, “Gretchen Gottlieb”. Afinal, Gretchen
falou a respeito de sua vida no Século XIX, na Alemanha. Só falava em alemão, e
explicava que fora assassinada em uma floresta, quando contava apenas dezesseis anos
de idade. As suas comunicações eram, em via de regra, feitas por meio de frases curtas e
gramaticalmente incorretas. Ian Stevenson soube do caso em 1971, e começou as suas
próprias investigações em setembro daquele ano. Stevenson, que estudou alemão
sozinho e fala o idioma fluentemente, conversou pessoalmente com Gretchen em várias
ocasiões e obteve respostas corretas a várias perguntas que lhe fez.
Também coligiu depoimentos de vários visitantes cujo idioma natal era o alemão e
que haviam interrogado Gretchen naquele idioma, durante as sessões de hipnotismo. A
Sra. Jay também foi submetida a um detector de mentira, enquanto negava ter estudado
alemão, e passou na prova sem dificuldade.
Apesar de todos esses fatores, é extremamente difícil analisar o caso. Stevenson, por
um lado, ficou grandemente impressionado. Em seu relatório de 1976, por exemplo, ele
salienta que a Sra. Jay introduzira 237 palavras alemãs, no decorrer das sessões de
hipnotismo. (Em outras palavras: ela usara 237 vocábulos que não tinham sido
anteriormente usados em sua presença por qualquer um dos observadores alemães que a
entrevistaram, enquanto ela se achava hipnotizada). Stevenson também ficou
impressionado pela boa vontade do casal Jay, permitindo que o caso fosse amplamente
investigado. No entanto o psiquiatra da Virgínia não está convencido que se trate
realmente de reencarnação. Em seu trabalho publicado na Revista da Associação
Americana de Pesquisas Psíquicas, ele argumenta que a possessão espírita pode
também ser uma explicação para o caso de Gretchen Gottlieb, embora não explique por
que a hipnose teve de ser usada para provocá-la.

152
A minha opinião sobre o caso não é tão positiva quanto a de Stevenson. Depois de ter
estudado, atentamente, os relatos publicados sobre o caso de Gretchen Gottlieb, o meu
veredito é antes negativo. Parece-me que se trata, ou de criptomnesia ou de fraude.
Pode parecer cruel fazer a acusação de fraude, em particular por terem os Jay se
mostrado sempre dispostos a colaborar com os investigadores científicos. Essa hipótese,
no entanto — apesar de rejeitada por Stevenson — não pode ser posta de lado sem mais
nem menos. O próprio Rev. Jay admite, candidamente, em seu livro, que, em certa
ocasião, ficou sabendo que sua mulher havia sub-repticiamente comprado um dicionário
alemão e deliberadamente simulou uma sessão de regressão. Há, além disso, muitos
outros aspectos do caso Gretchen Gottlieb que o tornam suspeito, entre eles podemos
citar:

1. Todos os fatos históricos relembrados por Gretchen ou eram falsos, ou não puderam
ser comprovados. O próprio Stevenson menciona esse fato embaraçoso em seu
relatório.

2. Gretchen não fala o alemão com fluência. Era gramaticalmente errado e, às vezes,
mal pronunciado.

3. Às vezes, Gretchen respondia a perguntas que lhe eram feitas em alemão de maneira
incoerente, mostrando que, na verdade, não entendera o que fora perguntado.

4. Com muita freqüência — e desajeitadamente também — Gretchen evita usar verbos


em suas frases. Quando os usa, invariavelmente fala usando o tempo presente e tem
o cuidado de evitar o pretérito e o futuro, mesmo quando o sentido da frase os
exijam.

Esse quarto ponto me parece o mais suspeito de todos, uma vez que a conjugação dos
verbos constitui a maior dificuldade para se dominar um idioma estrangeiro. Uma
pessoa que simule um caso de xenoglossia, consciente ou inconscientemente,
provavelmente terá dificuldade de usar os tempos dos verbos corretamente e evitará usá-
los ou recorrerá às suas formas mais simples. É isso exatamente o que Gretchen faz, de
maneira sistemática. E, se combinarmos o alemão mal falado de Gretchen com os seus
parcos conhecimentos dos fatos históricos, temos de concluir que o resultado de tudo
isso dificilmente resultaria em um caso de reencarnação.

153
Um caso mais interessante foi recentemente revelado pelo Dr. Joel Whitton,
psiquiatra de Toronto, Canadá. Whitton vinha estudando a questão da regressão a uma
vida anterior desde 1973, como um fenômeno meramente psicológico. Certamente, não
esperava se ver diante de um caso de xenoglossia. Mas isso ocorreu em 1976, quando
começou a hipnotizar um psicólogo de 30 anos, cuja identidade ainda não foi revelada.
O paciente de Whitton se lembrava de duas vidas, assim como de fragmentos dos
idiomas que falava em tais encarnações. A primeira vida de que se lembrava era como
um viking, que vivera lá pelo ano 1000 da nossa era. Ao contrário do que acontece com
a maior parte das pessoas hipnotizadas, em tais circunstâncias, contudo, o psicólogo não
assume uma outra personalidade, literalmente, durante a sua encarnação como viking.
Ao contrário, vê imagens de sua vida passada e ouve seu alter ego lhe falando e dando
as respostas às perguntas feitas pelo hipnotizador. No decorrer de várias sessões, o
psicólogo disse várias palavras em norsk, um idioma antigo, precursor do islandês
moderno. E interessante observar que, quando foram traduzidas aquelas palavras, se
verificou que a maior parte delas se referia ao mar e à vida marítima. São, naturalmente
as palavras que seriam de se esperar de um viking reencarnado. Também eram usadas
algumas poucas palavras que pareciam ter raízes sérvias ou russas.
Até agora, no entanto, o psicólogo não apresentou uma personalidade secundária
completa, como nos casos de Bridey Murphy da Sra. Tighes ou de Gretchen Gottlieb da
Sara Jay.
O psicólogo de Whitton também se lembrou de uma vida que viveu como homem na
Mesopotâmia, cerca de 625 da nossa era. Durante essa fase de sua regressão, conseguiu
escrever alguns poucos trechos, no idioma que falava ou em que escrevia durante a sua
existência. Esses escritos foram recentemente identificados por Indrahim Pourhadi,
especialista em idiomas do Oriente Próximo da Biblioteca do Congresso de
Washington, como o palavi sassanida, uma língua muito antiga que era falada na
Mesopotâmia, durante o Século VII e que não tem parentesco com o iraniano moderno.
O Dr. Whitton ainda não publicou um relatório pormenorizado de suas experiências
com o psicólogo anônimo, assim como nada esclareceu sobre os relatos sobre as vidas
anteriores e sobre os dados históricos com eles relacionados. No entanto, do ponto de
vista da comprovação, o caso de Whitton representa um exemplo particularmente
convincente da hipótese da reencarnação. O fato do indivíduo hipnotizado falar e
escrever duas

154
línguas obscuras e mortas torna o caso bem mais impressionante do que os outros
exemplos de xenoglossia.
Em conclusão: pode o hipnotismo ser usado para estudar o problema da
reencarnação? E, se pode, até que ponto a técnica é eficiente?
As provas — como acontece com os casos de memória extracerebral — são
contraditórias. Há certos indícios de que a hipnose pode contribuir para a lembrança de
uma vida passada, mas esses indícios estão sujeitos a muitas interpretações diferentes. É
difícil, particularmente, julgar o papel que a criptomnesia e a percepção extra-sensorial
representam em tais recordações. E a maioria dos hipnotizadores que estudaram a
questão não obteve resultados muito bons. O Dr. Whitton trabalhou durante vários anos,
e com dezenas de pessoas excepcionalmente hipnotizáveis, antes de encontrar um caso
mais satisfatório.
Há indícios, contudo, de que o estado de espírito provocado pela hipnose pode ser a
chave da reencarnação, mais do que a própria técnica. A hipnose produz uma alteração
no estado de consciência. Há indícios de que pacientes voluntários, levados a essa
alteração do estado de consciência, estão particularmente propensos a se lembrarem de
uma vida anterior. Tal estado mental pode ser induzido com a utilização do que é
chamado de imaginação dirigida. Essa técnica tem sido usada recentemente, com
sucesso, segundo se anuncia, pela Dra. Helen Wambach, psicóloga da Califórnia que a
aplicou a um grupo de várias pessoas, e que relatou as suas pesquisas no livro Reliving
Past Lives (Revivendo Vidas Passadas). A Dra. Wambach em primeiro lugar provoca
um relaxamento físico e mental nos pacientes e depois os dirige, por meio da sugestão,
através de sua vida presente, por uma viagem em que acabam chegando às suas vidas
passadas. Somente o tempo dirá se as pessoas assim dirigidas estão realmente se
lembrando de uma vida passada ou apenas fantasiando. Um modo mais heterodoxo de
abordar o problema da reencarnação foi acidentalmente descoberto pelo Dr. Stanislav
Grof, psiquiatra tcheco radicado nos Estados Unidos, como um subproduto de suas
pesquisas sobre o LSD. Em seu livro Realms of the Human Unconscious (Aspectos do
Inconsciente Humano), ele relata que alguns de seus pacientes se lembram,
espontaneamente, de vidas anteriores como parte de suas experiências com o LSD, e, às
vezes, apresentavam informações muito pormenorizadas sobre aquelas vidas.
Seja o que for que haja de verdade ou de ficção acerca da doutrina da reencarnação,
certamente não faltam pesquisadores e técnicas a explorando. É de se esperar que, em
tempo oportuno, nos apresentem conclusões menos ambíguas contra ou a favor da
sobrevivência depois da morte.

155
*
* *

156
8
Algumas Idéias Pessoais
Nenhum estudioso do campo psíquico pode investigar o problema da sobrevivência
após a morte sem chegar a algumas conclusões pessoais. Os parapsicólogos raramente
concordam muito uns com os outros, e a questão da sobrevivência não faz exceção.
Alguns poucos pesquisadores rejeitam decididamente tal idéia, ao passo que outros se
mostram a ela favoráveis. A maioria dos parapsicólogos, contudo, prefere permanecer
simples (e prudentemente) agnóstica. Devido à própria natureza da controvérsia,
qualquer conclusão a que chegue um estudioso do assunto tem de ser parcialmente
subjetiva e totalmente individual.
A questão da sobrevivência apresenta, na realidade, dois aspectos bem distintos, uma
vez que a existência de alguma espécie de vida depois da morte não implica,
necessariamente, que seja possível a comunicação entre os mortos e os vivos. Assim, a
controvérsia pode ser dividida em: o aspecto propriamente dito da sobrevivência e seu
corolário espírita. Pessoalmente, acredito que o último constitui o campo mais fecundo
para ser explorado, uma vez que os dados coligidos a seu respeito afetam criticamente o
primeiro.
Os meus próprios sentimentos são decididamente favoráveis à idéia da
sobrevivência, embora já não tenha a mesma confiança em minha posição que tinha há
dez anos. Acumulam-se cada vez mais as provas no sentido de que as experiências fora
do corpo raramente são verídicas; que os sobreviventes perto-da-morte podem estar
reagindo a insinuações do auditório (representado por médicos e enfermeiros) quando
têm a sensação de que as suas almas saíram do corpo, e que as visões no leito de morte
podem ser experiências psicológicas, arquétipos. Essa tendência de se encarar a questão
com rigor e ceticismo certamente não diminuiu a impor-

157
tância daqueles fenômenos, mas nos faz chegar à conclusão de que devemos manter o
nosso espírito crítico bem afiado. Uma boa lição pode ser aprendida com a massa de
pesquisas acumulada pelo estudo da experiência fora do corpo, durante os anos que se
seguiram ao legado de Kidd. Se não serviram para outra coisa, as pesquisas pelo menos
mostraram que a experiência fora do corpo não é um fenômeno claro e nítido. Algumas
das provas sugeriram diretamente que certos aspectos da mente podem deixar o corpo,
temporariamente; mas os resultados de outras investigações não conseguiram isolar
coisa alguma consistente e mensurável acerca de tal “aspecto”. Raramente se encontra
algo rigorosamente delineado na parapsicologia, e esse é um dos motivos de ter
permanecido controvertida há tanto tempo, a questão da sobrevivência.
Que espécie de dados, então, podem servir de prova da sobrevivência? Muitos
pesquisadores acreditam que nenhuma linha de comprovação ou nenhum caso isolado
podem provar a validade da hipótese da sobrevivência. A prova, argumentam, só pode
ser avaliada como um todo, como um complexo entrelaçado de fatos, dados e casos.
A questão crucial que pesquisadores enfrentam hoje é a mesma que alguns
parapsicólogos enfrentaram na década de 1880, assim como os da década de 1920.
Existem casos que não podem ser explicados como resultado de nossa própria
capacidade de percepção extra-sensorial? A hipótese de estados de superpercepção
extra-sensorial implica o fato de nosso poder de percepção extra-sensorial não ser
constrangido por quaisquer fatores de limitação. Pode ter acesso a qualquer espécie de
informação ou complexo de informações existentes em qualquer parte do mundo, no
passado ou no presente. A informação, então, pode ser processada inconscientemente
antes de ser apresentada à consciência, por meio de uma mensagem espírita. As
comunicações espíritas, transes e visões no leito de morte podem, portanto, ser
projeções de nossa própria mente, cuidadosamente estruturada por meio da coleta de
informações psíquicas.
A idéia de que possuímos uma superpercepção extra-sensorial não passa de uma
hipótese, e que tem sido muito criticada ultimamente. Há, contudo, muitos indícios de
que a percepção extra-sensorial pode ser bem-sucedida em tarefas de laboratório muito
complexas. Assim, embora a idéia de uma superpercepção extra-sensorial possa parecer
extravagante, o fato é que está logicamente relacionada com o que os parapsicólogos
têm aprendido acerca do sexto sentido. Por esse motivo, prefiro adotar o ponto de vista
de que a prova definitiva da sobrevivência repousa apenas em dois tipos de casos:

158
1. Casos espontâneos de contato post-mortem em que a motivação das comunicações
depende mais do agente morte que da pessoa que recebe a comunicação.

2. Casos em que a pessoa receptora revela, subitamente, habilidades que o morto


possuía. Não há prova de que a percepção extra-sensorial possa ser utilizada para
se adquirir uma habilidade. Tal percepção ê um canal de informação, ao passo que
uma habilidade só pode ser adquirida pela prática.

Na rica literatura parapsicológica existem dois casos clássicos satisfazendo esses


critérios, e um bom argumento a favor da sobrevivência pode ser encontrado em
qualquer deles.
Provavelmente, o caso mais sensacional de contato espontâneo com os mortos foi o
de Chaffin Will, anunciado em 1927. O relato dizia respeito à herança de James L.
Chaffin, do Estado da Carolina do Norte, falecido em 1921. Pelos termos do seu
testamento, os seus bens passariam a seu terceiro filho (Marshall), o que virtualmente
deserdava a viúva e os outros filhos. O testamento fora escrito, e testemunhado, em
1905. Os termos do testamento foram executados, mas em 1925 — quatro anos depois
de sua morte — o fantasma de Chaffin começou a aparecer a um de seus outros filhos,
James Chaffin Júnior. O fantasma aparecia junto ao leito do jovem, vestindo um velho
sobretudo, que o morto freqüentemente usara em vida. Só falou da segunda vez que
apareceu. “Você encontrará meu testamento no bolso de meu sobretudo”, disse a
aparição. Esse sobretudo estava em poder de um outro irmão. Seu forro foi
descosturado, e nele encontrado um bilhete manuscrito, que dizia apenas: “Leiam o
capítulo 27 do Gênese, na velha Bíblia de meu pai”. Novamente se procedeu uma
busca. A Bíblia foi encontrada em poder da viúva de Chaffin e examinada na presença
de duas testemunhas insuspeitas. Ninguém se surpreendeu quando foi ali encontrado um
testamento manuscrito datado de 1919. O testamento dividia os bens igualmente entre
os filhos de Chaffin. Foi apresentado à justiça, confirmado, e os bens de Chaffin
redistribuídos. Sua autenticidade era tão incontestável que a família de Marshall não
pôde contestá-la.
A típica argumentação contrária à sobrevivência nesse caso é que James Chaffin
Júnior simplesmente ficou sabendo da existência do segundo testamento graças à
clarividência. Sua mente inconsciente teria, então, produzido a aparição, como um
veículo graças ao qual a informação era transmitida à consciência. Essa hipótese pode
parecer interessante, mas, na rea-

159
lidade, não explica muitos dos principais aspectos do caso. Assim, por exemplo, não
explica por que a informação só surgiu quatro anos depois da morte de Chaffin e não
logo depois que os termos do primeiro testamento se tornaram conhecidos, ocasião em
que James Chaffin Júnior mais precisaria conhecê-la. Também não esclarece por que o
suposto poder extra-sensorial de Chaffin Júnior focalizou o bolso do sobretudo, e não a
Bíblia, diretamente. E por que a mensagem confundiu o recado que se encontrava no
sobretudo com o próprio testamento. Como se viu, a aparição disse que o testamento se
encontrava no bolso do sobretudo, o que não constituiu a verdade exata. Alguns
comentaristas não dão atenção ao fato de, mesmo depois de ter sido encontrado o
testamento, o fantasma de James Chaffin ter aparecido uma última vez. Segundo parece,
esse fato estava relacionado com a injustiça cometida contra a sua família.
Ora, se presumirmos que James Chaffin estava realmente falando do além túmulo,
todos os fatos estranhos do caso se esclarecem. Sabemos que a memória é muitas vezes
frágil e que duas lembranças evidentemente relacionadas podem, facilmente, se tornar
confusas, com o tempo. O falecido Chaffin podia facilmente ter feito confusão entre o
testamento e o recado que deixara no bolso do sobretudo. Na verdade, essa pequena
confusão somente pode ser explicada se admitirmos que a personalidade sobrevivente
de James Chaffin foi a fonte de informação. A teoria da sobrevivência também pôde
explicar por que o fantasma apareceu depois de haver sido encontrado o testamento,
quando Chaffin Júnior já não tinha necessidade ou motivação para lançar mão do
fantasma. O morto podia simplesmente ignorar que o testamento válido já se encontrava
em poder da família,
Muitos desses mesmos fatores de motivação podem ser encontrados no caso de
Teresita Basa, em que a personalidade sobrevivente da assassinada tinha mais motivo
para querer que se fizesse justiça do que provavelmente tinha a Sra. Chua. Essa senhora
não conhecia Teresita muito bem, e nem sequer estava trabalhando no hospital quando
as importantes mensagens foram recebidas. Não estava, portanto, ameaçada pelo
assassino, que ainda era empregado do hospital.
Vamos voltar a atenção agora para o caso do segundo tipo de que se falou. São raros
os casos de pessoas que adquirem de súbito habilidades pouco comuns, depois de terem,
supostamente, entrado em contato com os mortos. Poucos casos semelhantes aparecem
na literatura sobre o assunto, mas alguns deles são extremamente impressionantes. Há,
na literatura mais antiga sobre a mediunidade, relatos sobre médiuns que, em estado de
transe, começaram a falar de súbitos idiomas estrangeiros. Eram

160
idiomas familiares aos comunicadores que falavam por seu intermédio, mas de todo
desconhecidos pelos médiuns. Esse fenômeno costumava ser mais noticiado pela
imprensa espírita do que mencionados nos relatórios oficiais da Sociedade de Pesquisas
Psíquicas, de modo que a mediunidade poliglota não foi corretamente documentada,
como deveria ter sido. Não obstante, alguns poucos casos ainda podem ser examinados
com espírito crítico.
Hoje mesmo, não faltam pessoas dotadas de habilidades habituais herdadas de
contatos espíritas:

1. Rosemary Brown é uma dama inglesa que, às vezes, compõe excelente música,
tutelada por grandes compositores europeus do passado. Tem pouca cultura
musical, e, no entanto, muitos musicólogos têm se impressionado com a qualidade de
suas composições.

2. Emma Conti é uma italiana que recebe poesia do espírito de Emily Dickson. Já
ganhou quarenta e seis prêmios literários, muito embora não tenha sequer cursado
uma escola secundária.

3. Mattew Manning é hoje mais conhecido como curandeiro psíquico. Quando seus
poderes se manifestaram, antes dos vinte anos de idade, na Inglaterra, ele começou
a pintar quadros belos e bem acabados, no estilo de vários artistas mortos.

O problema, em todos esses casos, é o mesmo. A psicologia sabe relativamente


pouco acerca de nossa capacidade criativa, ou da natureza da criatividade inconsciente,
de maneira que é virtualmente impossível localizar a verdadeira fonte daquele inspirado
poder. Só pelo fato de alguns psíquicos acreditarem que as suas criações vêm do mundo
do espírito, isso não tem de ser necessariamente a verdade. Deve se salientar, todavia,
que tanto Rosemary Brown como Emma Conti têm recebido mensagens comprobatórias
de seus contatos espíritas.
De qualquer modo, existe, nos anais históricos da ciência psíquica, um caso muito
semelhante, que supera esse problema.
O famoso caso Thompson/Gifford data de 1905. Frederic Thompson nasceu no
Estado de Massachusetts, em 1868, e tinha o ofício de ourives. Também pintava, como
distração, aos domingos, mas não passava de um pintor medíocre. Em 1905, ele sentiu a
sua mente e o seu corpo invadidos por uma inteligência estranha. Foi tomado de um
intenso desejo de desenhar e pintar e, dentro em pouco, começou a atribuir aquela
compulsão

161
a seu alter ego, que dizia ser Mr. Gifford. Adotou esse nome por causa de Robert Swain
Gifford, conhecido paisagista, que ele encontrara duas vezes antes no campo, perto de
New Bedford. As suas compulsões eram freqüentemente acompanhadas pela visão de
paisagens que serviam de modelos para os seus quadros. Algumas de suas produções
artísticas de então eram superiores a tudo que fora criado pelo seu limitado talento
artístico, mas foi somente depois que soube da morte de Gifford, que Thompson
começou a se preocupar com a sua sanidade mental. Quando descobri que as suas
estranhas compulsões tinham surgido pouco depois da morte de Gifford, procurou o Dr.
Hyslop, da Sociedade Americana de Pesquisas Psíquicas, em Nova York. Hyslop não
ficou demasiadamente impressionado com a história de Thompson e, a princípio, achou
que o caso se prendia mais ao campo da psicologia anormal do que ao das pesquisas
psíquicas. Apesar disso, o seu interesse foi suficiente para levá-lo a examinar mais
pormenorizadamente as alegações de Thompson. Interessando-se primordialmente pelas
produções artísticas, em 1907 ele tomou vários quadros e desenhos de Thompson para
uma análise mais profunda.
Aquelas pinturas se transformaram no ponto central do caso, pois diversos peritos em
arte que as viram e espontaneamente admitiram sua semelhança com a obra do falecido
R. Swaim Gifford. O verdadeiro desfecho do episódio, porém, ocorreu quando Hyslop e
Thompson começaram a estudar a vida e a obra do artista falecido. Acabaram
descobrindo que alguns dos desenhos então em mãos de Hyslop combinavam com
pinturas inacabadas deixadas pelo artista por ocasião de sua morte, e que ainda se
encontravam em poder de sua viúva, que jamais as tinha mostrado em público. A viúva
conservara aquelas pinturas em sua velha residência, uma ilha particular, junto à costa
da Nova Inglaterra. Alguns dos desenhos de Thompson mostravam, como se verificou
depois, trechos da ilha.
O estranho caso de Frederic Thompson é complexo demais para ser resumido em
poucas linhas. O Professor Hyslop estava também, durante aqueles meses, fazendo
experiências com diversos médiuns, em Boston, Nova York e na Virgínia. Começou a
receber mensagens de R. Swain Gifford, ao mesmo tempo em que Frederic Thompson
era subitamente presa de estranhas experiências fora do corpo. Parecia que o artista
falecido estava tentando provar a sua identidade através de todos os canais disponíveis.
A minha própria opinião acerca desse caso extraordinário é bem clara. Ainda se
admitindo a possibilidade de Frederic Thompson ser dotado de extraordinários poderes
psíquicos, parece não haver motivo para ele ter assumido a personalidade de Gifford, de
maneira tão súbita e tão estra-

162
O desenho de Frederic Thompson, apenas esboçado, se parece com o quadro inacabado de Swain
Gifford, 1907. (Biblioteca Mary Evans)

nha. O artista falecido teria um motivo muito forte para continuar a sua obra,
escolhendo, naturalmente um colega pintor (medíocre), cuja mão poderia guiar mais
facilmente. É também difícil compreender por que Thomp-

163
son começou a experimentar sensações fora do corpo naquele tempo, embora tal coisa
seja perfeitamente explicável se supusermos que Gifford estava tentando dominá-lo e
possuí-lo. O relacionamento com a súbita intromissão de Gifford em sua vida também
explica o súbito entusiasmo artístico de Thompson.
Relatos impressionantes de casos semelhantes da volta de espíritos se encontram
com destaque na primitiva literatura das pesquisas psíquicas. É, sem dúvida, uma pena
que sejam raros hoje em dia casos do mesmo valor. Isso pode se explicar pelo fato de
não estarem os parapsicólogos modernos interessados em investigar tais casos, como
fizeram os pioneiros. Posso facilmente imaginar o que faria hoje um pesquisador diante
de afirmações semelhantes às de Frederic Thompson. O caso pareceria
extravagantemente psicopatológico. O fundo psíquico daquele episódio só se revelou
porque Hyslop decidiu explorá-lo a fundo, apesar de seu ceticismo inicial. Os
pesquisadores de hoje raramente têm tempo ou disposição para examinarem tão
cuidadosamente tais casos. É certamente interessante e revelador observar que nem um
só parapsicólogo investigou o caso de Teresita Basa, mesmo depois que ele se tornou
conhecido em todo o país!
Podemos dizer que o único pesquisador contemporâneo interessado em estudar casos
relacionados com a questão da sobrevivência é o Dr. Ian Stevenson, da Universidade da
Virgínia. Como, porém, o seu interesse se volta para os casos tipo reencarnação, tem
sido mínima a sua contribuição para outros setores das pesquisas sobre a sobrevivência.
Recentemente, contudo, ele e seu colega, Dr. Satwant Pesricha, apresentaram um
trabalho sobre um terceiro caso em que somente a teoria da sobrevivência parece
oferecer uma explicação aceitável. O relato diz respeito aos estranhos transes de Uttara
Huddar, professora e administradora em Nagpur, na Índia. Desde 1973, ocorrem, às
vezes, com Uttara, estranhos fenômenos, em que ela assume a personalidade e se torna
uma mulher chamada Sharada, que viveu na Bengala, no século XIX. Os transes duram
de poucas horas a vários dias, e Sharada revela muitos pormenores sobre a sua vida e os
seus parentes. Cuidadosas pesquisas genealógicas comprovaram que muitos dos nomes
por ela mencionados designam pessoas que realmente existiram em Bengala, há muitos
anos atrás. É extremamente duvidoso que a Sra. Huddar possa ter tido acesso a tais
informações. Além disso, Sharada fala em bengali, dialeto diferente do marata, falado
pela Sra. Huddar. Especialistas afirmaram que Sharada fala o dialeto correntemente e
usa um vocabulário compatível com o que se usava no século XIX, Segundo parece, a
Sra. Huddar tinha, anteriormente, algum conhecimento do bengali escrito, mas não da
linguagem falada.

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As descrições da morte e da sobrevivência atravessam todas as fronteiras culturais; esta gravura
anônima chinesa mostra o corpo astral separado do físico, mas ainda ligado a ele por um cordão.
(Biblioteca Mary Evans)

O caso de Sharada, ainda em observação, está destinado a tornar-se um clássico. O


único problema é saber se se trata de um exemplo de reencarnação ou de uma legítima
possessão espírita. O Dr. Stevenson preferia a primeira hipótese, mas qualquer decisão
no caso seria arbitrária. O importante é que está implicada uma forma de sobrevivência,
seja uma ou outra a explicação.
Apesar de tais casos, não penso que a controvérsia sobre a sobrevivência

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seja definitivamente resolvida por qualquer caso isolado ou linhas isoladas de futuras
pesquisas. Creio que o exemplo real da sobrevivência está escondido nos ricos arquivos
e na rica literatura histórica do campo. É interessante notar que dois dos três casos
expostos neste capítulo datam de bem mais de cinqüenta anos, do apogeu das pesquisas
acerca da sobrevivência. Os exemplos e os estudos feitos durante aqueles dias
superaram muito o trabalho dos parapsicólogos de hoje. Embora os meus pontos de
vista tenham vacilado muito com o correr dos anos, ainda considero a hipótese da
sobrevivência a explicação mais satisfatória para alguns daqueles casos. Recorrer,
contudo, meramente à minha opinião pessoal, no sentido de que acaba de fato
sobrevivendo à morte, não oferece, tem-se de reconhecer, uma explicação final. Leva
apenas a uma série de perguntas ainda mais desafiadoras e difíceis:
Que aspecto da personalidade realmente sobrevive?
Possuímos uma alma, ou apenas um complexo de traços e impulsos da personalidade
é liberado com a morte?
Sobrevivemos à morte permanentemente, ou sofremos um segundo mais completo
aniquilamento?
Qual é a natureza do outro mundo?
Estes são aspectos verdadeiramente essenciais da questão da sobrevivência, mas são
aspectos acerca dos quais a parapsicologia tem pouco direito de comentar. Lançam
alguma luz sobre eles, revelações modestas, mas preciosas, contidas na literatura
passada e presente que trata do assunto.
Para mim, o maior mistério da controvérsia acerca da sobrevivência é justamente
essa impenetrabilidade fundamental. Devido à sua própria natureza, acho muito
duvidoso que jamais o problema seja resolvido para satisfação geral. Só chegará essa
ocasião quando descobrirmos um método confiável de entrar em contato com os mortos,
e esse dia provavelmente jamais chegará. A mente humana é, à evidência, um
instrumento demasiadamente complexo e inconsistente para ser usada em tal mister,
mas, não parece, pelo menos por enquanto haver outra perspectiva no horizonte.
Segundo tudo indica, o que acontecer com a parapsicologia será explorar ainda mais o
sistema de provas de que já se utiliza. Ainda precisamos aprender muita coisa acerca da
mediunidade, das experiências fora do corpo e perto-da-morte, das visões no leito de
morte dos casos do tipo de reencarnação. Talvez algum dia, surgirá um caso de contato
post-mortem tão sensacional que não precisemos discutir mais se sobrevivemos ao
choque da morte. Sinceramente, porém, não posso dizer se isso será mesmo uma
possibilidade ou não passa de mero devaneio, um momentâneo exercício de especulação
e otimismo.
Os argumentos em prol da sobrevivência são impressionantes, mas ainda não estão
provados.

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