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Brincar: o brinquedo
e a brincadeira
na infância
APRESENTAÇÃO 7
III. O BRINCAR COM AS MÚLTIPLAS LINGUAGENS NA EDUCAÇÃO INFANTIL – Marina Célia Moraes Dias 73
Brincar: o brinquedo
e a brincadeira
na infância
Fundação Volkswagen Coordenadora do Projeto
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mo tempo, devem ser respeitados e precisam ser discutidos para que se tornem
claros e a condução do trabalho seja transformadora. Sabemos que não há prática
sem teoria, mesmo quando não se tem clareza de quais são as concepções.
Temos cada vez mais estudos, pesquisas e documentos oficiais volta-
dos à infância que reconhecem a necessidade de a criança brincar para se de-
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senvolver plenamente. Mas é preciso entender o que é próprio da brincadeira
O uso de recursos lúdicos para ensinar é válido, já que a brincadeira é uma rica
possibilidade que a criança tem de conhecer o mundo, mas o professor precisa
ter clareza de que atividade didática, ainda que lúdica e prazerosa, é diferente
do livre brincar da criança e não o substitui de forma alguma.
É preciso formar, portanto, o educador e a educadora que brincam,
que compreendem a importância da ludicidade, pois “nada será feito em favor do
Formação de professores jogo se os professores não se interessarem diretamente por ele” (ANDRADE,
do município de São 1991, p. 30). Logo, é preciso recuperar o lúdico dentro do educador adulto e buscar a
Paulo, 2005.
compreensão da brincadeira da criança.
Para compreender o brincar infantil é preciso olhar a criança brincando na
escola e também fora dela, pois nesta última situação ainda estão preservadas as prin-
cipais características do brincar: a espontaneidade, a escolha dos parceiros, dos temas,
dos objetos. No entanto, como nos diz Madalena Freire (1996), é preciso olhar com
atenção e presença. Um olhar que envolve a escuta e o desprender-se de nossos es-
tereótipos, daquilo que gostaríamos de ver e ouvir.
Formação de professores É preciso que haja na escola espaço, tempo e liberdade para a criança decidir
do município de São o que, como e com quem brincar. O adulto pode ser um convidado dessa brincadeira
Carlos, 2008. ou apenas um espectador. Ele permite que a criança brinque, sem conduzi-la nem
abandoná-la, proporcionando tempo, espaço e mostrando-se disponível para as ne-
cessidades das crianças. Também deve haver o momento em que o educador participa
ativamente convidando as crianças para um jogo, propondo desafios, incentivando a
brincadeira. É imprescindível, no entanto, lembrar-se sempre de que as brincadeiras
existem anteriormente à escola e assim devem preservar seu caráter repousante e di-
vertido e tomar cuidado para que esses momentos não se tornem fazeres pedagógicos
disfarçados de brincadeira.
Outro desafio do Projeto Brincar tem sido o adequado equacionamento das
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condições para que as atividades propostas se desenvolvam. A concretização desse
Embora a Declaração Universal dos Direitos da Criança tenha sido publicada em 1959
pela ONU, somente com a Constituição Federal de 1988, fruto do processo de demo-
cratização da sociedade brasileira, afirma-se em nosso país a concepção da criança como
sujeito de direitos.
Esses direitos estão expressos:
No capítulo II
Dos Direitos Sociais
Art. 60. São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a se-
gurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência
aos desamparados, na forma desta Constituição. (grifo nosso).
E, no capítulo III
Da Educação, da Cultura e do Desporto
Art. 208, ao tratar do dever do Estado com a educação, ressalta no item IV “o aten-
dimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade”.
A afirmação desse direito torna-se mais concreta com a publicação em 1990 do
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Política Nacional de Educação Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). No artigo 30 diz:
Infantil (1994); Educação Infantil
no Brasil, situação atual (1994); “A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa
Por uma política de formação do
profissional de Educação Infantil humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes,
(1994); Critérios para o atendimento por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar
em creches (1995); Educação Infantil:
bibliografia anotada (1995); Propostas
o desenvolvimento físico, metal, moral, espiritual e social, em condições de liberdade
pedagógicas e currículo em Educação e de dignidade.”
Infantil (1996); Subsídios para
credenciamento e funcionamento de E no artigo 60
instituições de EI (1998); Referencial
Curricular Nacional para a Educação “Na interpretação desta Lei, levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige,
16 Infantil (1998); Diretrizes Curriculares as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a con-
de Educação Infantil (1999).
dição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento.”
Fernanda Ribeiro
criança e seu entendimento de aprendizagem in-
fantil e outras atividades, apoiando a aprendizagem
de cada criança, mas também aprendendo com ela
(MOSS, 2007, p. 246-247).
No Projeto Brincar, o trabalho de formação inicia-
se recuperando as memórias de infância dos participantes e,
ao longo dos encontros, é dada forte ênfase à vivência de
brincadeiras e à troca de experiências dos envolvidos, além
de embasamento teórico sobre o tema. Formação de professores
Roger Bastide (1947) nos inquieta quando fala que “para poder estudar a no Cenpec, 2007.
criança é preciso tornar-se criança (...) é preciso viver o brinquedo”. Também nes-
sa linha Blackstone (2001) afirma que “é muito importante tomarmos consciência do
remanescente da mentalidade infantil no nosso corpo. Se conhecermos a história da
nossa dor, da nossa infância e a maneira como tendemos a projetá-la sobre as situações
atuais, podemos tornar nosso comportamento mais flexível”. 19
relacionados. Acreditamos que uma vez “in-corporadas” (trazidas para o corpo) essas
brincadeiras e o que elas nos proporcionam damos um primeiro passo para uma mu-
dança efetiva da prática.
Nelson Toledo
gestos são muito parecidos, ou até mesmo iguais, porém a música que a acompanha
traz uma letra relacionada a assuntos específicos de um determinado tempo ou lugar.
A neurociência também vem nos revelando uma série de conhecimentos
sobre o funcionamento do cérebro e seu desenvolvimento, reafirmando, entre outras
coisas, a importância dos estímulos propiciados pelas brincadeiras para um desenvol-
vimento sadio. Durante o desenvolvimento de uma brincadeira, determinadas áreas
cerebrais são estimuladas propiciando o seu amadurecimento.
Entre as diversas contribuições teóricas, vamos nos deter mais em dois cam-
pos de conhecimento: o da Psicologia do desenvolvimento e o da Teoria Psicanalítica.
Wallon
Wallon (1879-1962) dedicou-se ao estudo da psicogênese da pessoa buscan-
do entender de que forma o ser humano se mobiliza e é mobilizado para se constituir
como sujeito social.
Para Wallon o homem é geneticamente social: é na relação com o outro que
as ações das crianças vão ganhando significado. É nos movimentos de outrem que toma-
rão forma os primeiros movimentos do bebê. Suas necessidades têm de ser atendidas,
compensadas, interpretadas. Suas manifestações de mal-estar ou bem-estar tendem a
suscitar nas pessoas que o cercam intervenções úteis ou desejáveis. Nesse processo, gra-
dativamente essas manifestações vão se tornando intencionais. O ser humano é, desde
o início, um ser social preocupado em construir-se a si mesmo: observa-se, explora seu
corpo, verifica os próprios limites físicos antes de entregar-se à tarefa de explorar o mun-
do externo. Wallon considera o período inicial do psiquismo infantil como um estado de
indivisão entre seu próprio corpo e o mundo exterior. Aos poucos, pelas interações com
outras pessoas, a criança vai se diferenciando daqueles que a cercam, construindo seu Emei Carmem da Silva,
São Paulo, 2009.
próprio eu, sem excluir, no entanto, a presença do outro.
O grande eixo da teoria do desenvolvimento de Wallon é a
questão da motricidade. Na atividade muscular identifica duas funções:
12
Cada autor usa uma
denominação diferente: jogo,
brincadeira e brinquedo. Sobre
Sobre o brincar, Wallon afirma que o jogo12 tem uma finalidade em si mesmo
24
isso ver boxe na p. 22. e pressupõe a livre escolha. Uma vez imposto, perde o caráter de jogo.
Vygotsky
Na visão de Vygotsky (1896-1934), o ser humano constrói o mundo e a si
mesmo, faz-se na história, ao mesmo tempo que faz a história.
Vygotsky, com seus estudos, buscava entender a formação e a evolução
dos processos psicológicos humanos. Nessa busca, vale-se do conceito de media-
ção, processo por meio do qual as funções psicológicas superiores de pensamento,
tais como atenção voluntária, memorização ativa, pensamento abstrato, comporta-
mento intencional, ações conscientemente controladas, se desenvolvem. Segundo
ele, dois elementos são responsáveis pela mediação: o instrumento (material), que
regula as ações sobre os objetos e auxilia nas ações concretas, e o signo, ou instru- 25
Para Vygotsky a brincadeira (ou brinquedo, tal como aparece nas traduções
de seus textos para o português) origina-se de desejos que não podem ser imediata-
mente realizados. Ao brincar, a criança cria uma situação imaginária e essa característica
é o que define a brincadeira. A ação que ocorre nessa situação imaginária, portanto,
é o brinquedo. Para esse autor o “faz de conta” não é uma subdivisão da brincadeira,
mas é a brincadeira por excelência. Para ele a imaginação é definidora da brincadeira
e assim temos a sua clássica frase: “O brinquedo é a imaginação em ação”. Quando a
criança é muito pequena, os objetos “ditam” as ações para ela (a criança vê um chaveiro
e quer balançá-lo; ou o interruptor provoca a ação de ascender e apagar a luz). Com o
surgimento da linguagem, a criança começa a imaginar, e os objetos vão perdendo sua
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força determinadora, a criança começa a brincar. Nesse momento, por exemplo, um
Município de
Caçapava, 2006. Piaget
Piaget (1896-1980) preocupou-se, em seus estudos, com os aspectos rela-
cionados ao desenvolvimento da inteligência e deu ênfase ao papel ativo do sujeito.
A concepção de homem de Piaget é a de um sujeito em atividade, que constrói seu co-
nhecimento através das interações com o meio. A interação organismo-meio acontece
através de dois processos simultâneos: a organização interna e a adaptação. Vejamos o
que isso significa.
Ao nascer, o indivíduo recebe como herança uma série de estruturas biológicas
– sensoriais e neurológicas – que permanecem constantes ao longo da sua vida (fatores
invariantes). São essas estruturas biológicas que vão predispor o surgimento de certas
estruturas mentais, os esquemas. O esquema é uma estrutura cognitiva, com padrões
organizados de comportamento. São exemplos de esquemas: sugar, pegar, puxar, seriar,
Nelson Toledo
classificar. No início o bebê olha um objeto; mais tarde pode pegá-lo; depois o utiliza
como instrumento; num outro estágio a ação concreta dá lugar à ação interiorizada.
Piaget distingue quatro fatores principais para o desenvolvimento humano:
28
maturação, experiência física e lógico-matemática, transmissão social e o processo de
30
Acervo pessoal de
América Marinho
dos possíveis significados do brincar não possuíam um claro enunciado descritivo
sobre essa atividade. E é isso que ele se propõe a fazer, trazendo importante
contribuição sobre o papel da brincadeira na constituição da subjetividade.
Winnicott
Para Winnicott, cada ser humano traz um potencial inato para amadurecer
e se integrar. Porém, o desenvolvimento desse potencial dependerá de um ambiente
facilitador que forneça os cuidados de que a criança precisa, sendo que, no início, esse
ambiente é representado pela “mãe suficientemente boa”. Segundo esse autor, a mãe
suficientemente boa é aquela que efetua uma adaptação ativa às necessidades do bebê,
uma adaptação que diminui gradativamente, segundo a capacidade deste em lidar com
a frustração (WINNICOTT, 1975, p. 25). A adaptação da mãe às necessidades do
bebê dá a ele a ilusão de que existe uma realidade externa correspondente à sua pró-
31
pria capacidade de criar (idem, ibidem, p. 27). 13
A esse respeito ver Klein, M. 1997.
Não se trata, porém, de uma mãe perfeita ou de uma supermãe, mas sim
de um adulto que exerce a função materna, aceita e acolhe o bebê atendendo às suas
necessidades. Segundo Oliveira (2009), Winnicott entende que, quando o pai cuida
do filho, na fase em que o bebê não se distingue do meio ambiente, sua função é
igualmente materna. Ou ainda que, no início da vida do bebê, a função do pai é apoiar
a mãe, juntamente com a família e a sociedade, para que ela possa desempenhar essa
tarefa tão complexa e delicada que é participar da emergência de um sujeito.
Segundo esse autor, é fundamental, para a constituição do “self” (eu), o modo
como a mãe coloca o bebê no colo, carrega-o, toca, manipula, aconchega, fala com ele.
A capacidade das mães em dedicar a seus filhos a atenção de que precisam, atendendo
suas necessidades de alimentação, higiene, acalento ou simples contacto,
cria condições para a manifestação do sentimento de unidade entre duas
pessoas. A confiança na mãe cria uma união entre ela e o bebê. Segundo
Winnicott (1975, p. 71), a brincadeira começa aqui.
O brincar não está dentro, nem fora do indivíduo. Há um espaço
potencial entre o bebê e a mãe, que varia bastante conforme as experi-
ências de vida do bebê em relação à figura materna (idem, ibidem, p. 63).
O bebê e o objeto estão fundidos um no outro. A visão que o bebê tem
2.2.3 Conclusões
Embora com diferentes enfoques, tanto a Psicologia do desenvolvimento
34
quanto a Psicanálise enfatizam a importância da brincadeira para o ser humano.
3.1 O espaço
As instituições para a primeira infância devem ser locais para provocação e confronta-
ção, discordâncias e indocilidade, complexidade e diversidade, incerteza e ambivalência,
mantendo o pensamento crítico aberto, o deslumbramento e assombro, a curiosidade
e diversão, aprendendo com adultos e também com crianças sobre perguntas para as
quais as respostas não são conhecidas. (MOSS, 2007, p. 246.)
As crianças nos fascinam pelos momentos que transformam em únicos, ainda que os
repitam (também a repetição nos dá o pulso do tempo da infância). Ao mesmo tempo,
nos exigem o direito a suficiente tempo para que saibamos esperá-las sem pressas,
antecipações, nem estimulações precoces, desnecessárias e violentas. Esperá-las na
dilatação do tempo e, paradoxalmente, sem tempo. Desta forma, os instantes se fazem
completos, prazerosos, preciosos e consistentes. (CABANELLAS et al, 2007, p. 11.)
EM Profa Lúcia
Maria Vilar Barbosa, 3.3 A rotina
Lorena, 2009.
No encontro entre tempo e espaço configura-se a rotina. Rotina não
significa um dia a dia monótono, mas estruturado de modo que haja rituais mar-
cando determinados momentos, que certos tipos de atividade tenham sua pe-
riodicidade determinada (diária, semanal, quinzenal) e que se imprima certo ritmo
Maria Lúcia Medeiros
Nelson Toledo
a possibilidade de entrar em contato com seu mundo interno, seus desejos, seus
anseios e receios. Nunca é demais lembrar que a criança não precisa estar o tempo
todo em atividade, nem interagindo ativamente com seus pares. A observação, o
recolhimento e mesmo a percepção da necessidade de descansar são grandes e
importantes aprendizados.
Faz parte da rotina também momentos dirigidos, em que o adulto traz pro-
postas estruturadas, com encaminhamentos escolhidos tendo em vista determinados
objetivos. Os momentos dirigidos, por oferecer novas possibilidades, conhecimentos,
informações, ampliam as possibilidades de escolhas futuras das crianças.
41
É importante não perder de vista que apenas parte do tempo da criança será
vivido dentro das instituições de Educação Infantil.
Assim, se por um lado o fato de ser atendido em uma instituição específica é
parte da vida em comunidade, por outro, é preciso considerar a necessidade de usu-
fruir outros espaços, como o quintal, a rua, a praça, os espaços culturais e de lazer.
Sabemos que as crianças são atendidas por outras instituições além das es-
colares. A escola coexiste com outras instituições e equipamentos públicos de aten-
dimento à criança. Isso implica promover a integração entre experiências escolares
e não escolares.
O fortalecimento da relação da escola com a comunidade deve ser um ponto
forte. Trazer a comunidade para dentro da escola ou sair com a escola para fora de
seus muros são ações que enriquecem o trabalho educacional. Para isso é importan-
te convidarmos mães, pais, outros familiares e moradores para compartilharem suas
experiências culturais com as crianças e a equipe escolar. Esse movimento possibilita
conhecer e integrar as práticas culturais locais à educação escolar e estreita vínculos
entre cultura da escola e as práticas vivenciadas pelos alunos fora dela.
Também são ricas as ações que levam as crianças a usar outros espaços du-
rante o período escolar. Realizar passeios e promover brincadeiras em praças e parques
públicos, levar as crianças à biblioteca, ao cinema e ao teatro, são ações que ampliam o
universo cultural da criança. Desse modo, promovem-se a divulgação e a valorização dos
locais que a comunidade dispõe, articulando-os às escolas e tornando-os verdadeiros
espaços de convivência e aprendizagem.
42
Vídeo
A Casa, o Corpo, o Eu. Casa Redonda Centro de Estudos: São Paulo, 1999.
Brincando com os elementos. Casa Redonda de Estudos: São Paulo, 2000.
48
Para trabalhar, uma mulher com filhos pequenos realiza prodígios de organi-
zação, e seu horário de trabalho é traçado pelo avesso das responsabilidades
domésticas (...). Ou, então, traça o horário de seus filhos pelo avesso do
seu, impondo involuntariamente às crianças um tempo integral de atividades
múltiplas, possivelmente úteis, mas que privam a infância dos insubstituíveis
tempos livres em que a criança por si mesma vai descobrindo o mundo.
financeiros para isso, sem nos esquecermos de que, mesmo não dispondo,
estão igualmente sujeitas ao forte apelo da mídia.
Nos espaços coletivos, a composição do acervo explicita a pro-
posta lúdica. Ela é nítida e pode ser percebida tanto pelos itens incluídos
como por aqueles excluídos, tanto por sua qualidade e quantidade quanto
pela maneira como é apresentado e está disponibilizado às crianças. Nesse
sentido, a seleção e a organização dos brinquedos devem ser estudadas,
discutidas e, só depois, concretizadas. Quantas e quantas vezes começa-
mos de trás para a frente!
Compor um acervo supõe critérios e cuidados objetivos e subjetivos.
Ter, perder, reencontrar, fazer, desfazer, refazer de outra maneira, criar, descriar,
recriar as relações com os seres e com as coisas infindavelmente, eis o que pare-
ce sempre novo e fascinante nos jogos dos humanos em busca de seu prazer e
da conquista em si mesmos de possibilidades sempre renovadas (1999, p. 115). EM Profa Lúcia Maria Vilar
Barbosa, Lorena, 2009.
Um dia essa criança descobre que ter um brinquedo nas
mãos atrai os seus pares, porque “sabe” que um brinquedo nas mãos é
mais brilhante que um brinquedo na caixa. A disputa é uma das formas
de entrar em contato com outras crianças. Há um momento em que
ela não distingue o que “é ela” do que “é dela”. Por isso, a retirada do
objeto provoca o choro de uma amputação. As sutilezas desses primei-
ros anos são encantadoras e nos desafiam na sua compreensão.
No faz de conta, que desabrocha riquíssimo de imagens, o
adulto tem importante papel, como nos revelam os pincéis de Bandet
e Sarazanas: 67
jogar pode nos levar – ou nos trazer – para além da brincadeira, mas, mesmo
que isso não aconteça de forma explícita, não será nunca apenas brincar, só
jogar. Rir, aceitar limites, organizar uma tarefa, concentrar-se, disputar, es-
tar atento, sentir frio na barriga, raciocinar, pensar, gargalhar, competir com
os outros e consigo próprio, ser curioso, ter prazer, cooperar, descobrir-se
na relação com os outros, ser ágil, surpreender-se com a atitude do outro,
emocionar-se... Difícil esgotar a riqueza de contribuições que os jogos po-
dem trazer para o desenvolvimento humano de seres pequenos, médios ou
grandes (ANDRADE, 2008, p. 61).
Toda esta história começou com a professora querendo saber todas as brin-
cadeiras do mundo. Do que poderiam ter sido os fios das suas memórias, fomos
trançando a evolução do brincar. Com isso, percebemos a necessidade de conhecer a
criança que brinca. Sem esse conhecimento, as brincadeiras correm o risco de se de-
sencontrarem das crianças. O desinteresse dos pequenos é, com frequência, um bom
sinal de que não fizemos a escolha mais acertada. A adequação é fundamental quando
68
pensamos um repertório de brincadeiras para crianças.
R e f e r ê n c i a s
ANDRADE, Cyrce M. R. Junqueira de. A formação lúdica do professor. Programa Salto
para o Futuro/TV Escola. Série Jogos e Brincadeiras: desafios e descobertas. Brasília/
Rio de Janeiro, maio, 2008 (2a edição). Disponível em: http://www.tvebrasil.com.br/
saltoparaofuturo.
BANDET, Jeanne; SARAZANAS, Réjane. A Criança e os brinquedos. Lisboa: Editorial
Estampa, 1973.
70 BONDIOLI, Anna. A dimensão lúdica na criança de 0 a 3 anos e na creche. In: BON-
71
Fábio Meirelles
da importância do brincar e da construção de vínculos entre
adulto e criança, no processo de apropriação da linguagem
e construção do pensamento.
Inventar histórias com objetos do cotidiano estimula
a capacidade inventiva e dá novos instrumentos para a criança
brincar sozinha. Enquanto brinca, a criança fala consigo mesma,
comentando a brincadeira, animando brinquedos, ou despren-
dendo-se deles para seguir outros indícios, num jogo imagi-
nário onde uma coisa puxa a outra. Esses indícios podem ser
uma simples palavra, um objeto, uma pessoa que aparece, um telefone ou campainha
que toca e desencadeiam o enredo de novas brincadeiras para a criança. Uma criança,
após lanchar, pega a casca de uma banana e começa a inventar uma história de um
75
polvo que nadava sossegado e encontra um tubarão (tesoura disponível no espaço
76
EM Samira Savoldi, 2008.
Carmiatto Munhoz
Desenhar concretiza material e visivelmente a experiência de existir; obedece às
Maria Helena
necessidades do sistema nervoso, afinado a um desejo de significação e afirmação
do eu no mundo (DERDYK, 1989). “Quando a criança pinta, o mundo encolhe-
se até as dimensões de uma folha de papel, a folha transborda os seus limites e
torna-se o mundo” (STERN, 1986).
É desenho também a maneira que a criança organiza o seu espaço lúdico: CEMEI Benedicta
Sthal Sodré, 2008.
É desenho a maneira como organiza as pedras e folhas ao redor do castelo de areia,
ou como organiza as panelinhas, os pratos, as colheres na brincadeira de casinha.
Entendendo por desenho o traço no papel ou em qualquer superfície, mas tam-
bém a maneira como a criança concebe o seu espaço de jogo com os materiais de
que dispõe. (...) É a possibilidade de conhecer aquela criança através de uma outra
linguagem: o desenho do seu espaço lúdico. As bonecas sentadas no chão e os
carrinhos enfileirados falam sobre a criança que os arrumou. Contam sobre o seu
projeto... Para melhor conhecer a criança, é preciso aprender a vê-la. Observá-la
enquanto brinca: o brilho nos olhos, a mudança de expressão do rosto, a movimen-
tação do corpo. Estar atento à maneira como desenha seu espaço, aprender a ler a
maneira como escreve a sua história (MOREIRA, 1987, p. 16).
O tempo do desenho, da pintura ou da construção plástica corresponde a um
tempo próprio da criança, um tempo mental e emocional onde prevalece o ritmo individual
da execução. No jogo da linguagem plástica, o tempo e o espaço são transformados e se 81
submetem às atividades do sujeito-criança.
O homem cria não apenas porque quer ou porque gosta, mas porque pre-
82
cisa; ele só pode crescer enquanto ser humano coerentemente ordenando,
BATTAGLIA, Stela M. Fazio; DIAS, Marina Célia Moraes. A criança e a literatura. São
Paulo: USP; PEC – Formação Universitária/Municípios – Semanas Presenciais, 2007.
BORBA, A. M. O brincar como um modo de ser e estar no mundo. In: Ensino Funda-
mental de nove anos: orientações para a inclusão da criança de seis anos de idade. MEC/
SEB. Brasília: FNDE, Estação Gráfica, 2006.
STERN, A. Uma nova compreensão da arte infantil. Lisboa: Livros Horizonte, 1986.
CD
84
CAYMMI, D. Acalanto. Meus momentos. Salvador: Euterpe/Odeon, 1959.